Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 554/11.6BELRS |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 07/11/2024 |
| Relator: | TERESA COSTA ALEMÃO |
| Descritores: | ART. 199.º N.º 2 E 4 E 169.º N.º 6 E 7 DO CPPT PENDÊNCIA DE APRECIAÇÃO DO REQUERIMENTO DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA PROSSECUÇÃO DA EXECUÇÃO FISCAL COMPENSAÇÃO; PAGAMENTO COERCIVO |
| Sumário: | I – Prevendo a lei – art. 199.º n.º 2 e 4 e 169.º n.º 6 e 7 do CPPT (na redacção da Lei n.º 3-B/2010, de 28-04) – a possibilidade de o executado poder indicar bens à penhora para garantir a dívida exequenda, e tendo sido feito o requerimento de prestação de garantia dentro do prazo que a lei lhe conferia (com a impugnação), não poderia o órgão de execução fiscal ter feito prosseguir a execução, aplicando os reembolsos no pagamento da dívida, sem antes ter tomado uma posição, que sempre teria que ser expressa, sobre essa questão. II - Ao ter assim agido violou, de forma evidente, o regime das citadas normas, o que tem como consequência a ilegalidade das compensações efectuadas e aqui questionadas. |
| Votação: | Unanimidade |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO A Fazenda Pública, inconformada, veio interpor recurso da sentença, proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 17 de Outubro de 2016, que julgou extinta a instância, resultante da impugnação judicial apresentada contra as liquidações de IRC de 2002, 2003 e 2004 e IVA de 2004, por R........, contribuinte n.º 16.........., na qualidade de revertido da execução fiscal instaurada originariamente contra C..........., Lda., por inutilidade superveniente da lide, condenando a AT a restituir ao Impugnante os montantes objecto de compensação. A Recorrente termina as alegações de recurso formulando as conclusões seguintes: « I - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, julgou extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide não imputável às partes, condenando a AT a restituir ao impugnante os montantes objecto de compensação porque considerou que, tendo sido citado o impugnante em 13/12/2010, as compensações foram operadas em momento posterior, pelo que não terão outra função que não a de garantia da dívida exequenda, nos termos do art.° 199.°, n.° 4 do CPPT, pelo que atenta a declaração da prescrição da dívida exequenda e declarada extinta a execução fiscal, ter-se-á de devolver o montante compensado. II - Neste âmbito, o thema decidendum, consiste em saber se estavam ou não contemplados os requisitos do art.° 89.° do CPPT para que a compensação se operasse, uma vez que os processos executivos não estavam garantidos. III - Na douta sentença foi dado comprovado que, (i) os montantes de reembolsos de IRS dos anos de 2010, 2011 e 2012 devidos ao impugnante foram pela Administração Tributária aplicados no pagamento das quantias em cobrança nas execuções fiscais; (ii) em 05/12/2014 as dívidas em cobrança das execuções fiscais identificadas foram declaradas prescritas por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Loures-1 e que,(iii) a impugnação foi deduzida em 15/03/2011. IV - Aos factos dados como provados a Fazenda acrescenta os seguintes: (i) A dívida exequenda não se encontrava garantida; (ii) Em 12/05/2011, o Serviço de Finanças de Loures 1 compensou o PEF n.° 1520200401051563, com o reembolso de IRS, relativo a Mod. 3, de 2010, no montante de € 915,82; (iii) Em 01/08/2012, o Serviço de Finanças de Loures 1 compensou o PEF n.° 1520200501009460, com o reembolso de IRS, relativo a Mod. 3, de 2011, no montante de € 788,44 e (iv) Em 25/09/2013, o Serviço de Finanças de Loures 1 compensou o PEF n.° 1520200501009460, com o reembolso de IRS, relativo a Mod.3, de 2012, no montante de € 194,11. V - O art.° 89 ° do CPPT estipula que “1 - Os créditos do executado resultantes de reembolso, revisão oficiosa, reclamação ou impugnação judicial de qualquer acto tributário são aplicados na compensação das suas dívidas cobradas pela administração tributária, excepto nos casos seguintes: (...) b) Estar pendente qualquer dos meios graciosos ou judiciais referidos na alínea anterior ou estar a dívida a ser paga em prestações, desde que a dívida exeauenda se mostre garantida nos termos do artigo 169;” (sublinhado nosso) VI - O art° 169° do CPPT consagra que "1 - A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, (...) desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.° ou prestada nos termos do artigo 199.° ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente.” (sublinhado nosso) VII - Em face dos normativos supra mencionados, o impugnante deduziu a impugnação judicial em Março de 2011 e a compensação só foi efectuada em Maio de 2011, Agosto de 2012 e Setembro de 2013, ou seja, para além do prazo para deduzir impugnação. VIII - Para Lopes de Sousa, a compensação de dívidas de tributos por iniciativa da AT depende, portanto, dos seguintes requisitos: (i) Haver um crédito a favor de um contribuinte de que seja devedora a administração tributária, que esteja em fase de execução; (ii) Que esse crédito resulte de reembolso, ou de revisão oficiosa, ou de reclamação graciosa ou de impugnação judicial, ou outro meio administrativo ou contencioso; (iii) Que esse contribuinte seja simultaneamente devedor de tributos; (iv) Não estar a dívida garantida ou, estando-o, não estiver pendente reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução fiscal relativa à dívida do contribuinte, nem estar a dívida a ser paga em prestações. IX - Ora, os requisitos da compensação foram cumpridos pela AT. X - O Ac. do STA de 08/08/2012 estipulou no seu sumário que “I - A compensação por iniciativa da AT apenas poderá ser efectuada no âmbito de uma execução fiscal depois de esgotadas as possibilidades de impugnação administrativa e judicial do acto de liquidação e de oposição à execução que a lei concede ao executado. II - Era essa a melhor interpretação da lei no domínio da redacção inicial do art. 89.°, n.° 1, do CPPT e que foi inequivocamente vertida na letra do preceito na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 3-B/2010, de 18 de Abril (Lei do Orçamento do Estado para 2010), aplicável à situação sub judice. III - Assim, é ilegal o acto de compensação efectuado pela AT antes de esgotados os prazos para reclamação graciosa e para impugnação judicial da liquidação que deu origem à dívida exequenda, como decorre da alínea a) do n.° 1 do art. 89.° do CPPT. XI - Considerando por um lado, que o imperativo legal de cobrança coerciva nasce a partir do momento em que se iniciou o incumprimento (após o decurso do prazo de pagamento voluntário) e, por outro, os créditos do executado para com a Administração Tributária são obrigatoriamente aplicados na compensação das suas dívidas à mesma entidade, verificados os restantes condicionalismos legais. XII - A compensação efectuada é legítima porque a AT cumpriu o exigido por lei, designadamente o disposto no art.° 89.° do CPPT, já que, no momento da compensação não se mostravam os processos de execução fiscal em causa suspensos, nos termos do disposto no art.° 169.° do mesmo diploma. XIII - A suspensão da execução fiscal, proibida nos casos não previstos da lei (cfr. art.° 36.°, n.° 3 da LGT), assume um carácter claramente excepcional, designadamente, se se tiver em conta os estritos termos e exigências reveladas pelos princípios da vinculação à lei na actividade administrativa tributária e da indisponibilidade dos créditos fiscais e proibição da concessão de moratórias no seu pagamento, mormente se estiverem vencidos, afastando quaisquer juízos de oportunidade daquela mesma actividade. XIV - É o que decorre, afinal, da al. b), do n.° 1, do art.° 89.° do CPPT, a contrario, o qual impõe que a Administração Tributária efectue a aplicação de um crédito do executado na compensação das suas dívidas tributárias, desde que a dívida não se mostre garantida nos termos do art.° 169.° do CPPT ou não tenha sido concedida a isenção de prestação de garantia nos termos do art.° 52.°, n° 4, da LGT, mesmo que esteja pendente processo judicial. XV - A compensação controvertida é assim legalmente admissível, diante do disposto no art.° 89.° do CPPT, pois sobre o impugnante impendia uma dívida fiscal, reconhecida num acto idóneo à promoção da sua cobrança em relação à sua pessoa, sendo, por esse facto, legalmente exigível e podendo a qualquer momento ocorrer um facto extintivo da prestação tributária em dívida, como seja, a compensação efectuada. XVI - Destarte, reunidos os pressupostos exigidos por lei para que a compensação operasse impunha-se à Administração Tributária, como fez, a obrigação de efectuar a compensação na dívida cuja execução não se encontrava garantida. XVII - Ao decidir-se como se decidiu, sempre com o devido respeito pelo labor do Tribunal a quo, a douta sentença sob recurso incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito, porque fez errada interpretação e aplicação dos normativos legais supra citados, devendo ser revogada por outra, sob pena de violação do art.° 89.°, n.° 1, al. b) do CPPT. Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a Impugnação improcedente, com as devidas consequências legais. PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA» **** O Recorrido R........, notificado para o efeito, apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: « I Ao julgar ilegais as compensações coercivamente operadas pela Fazenda Pública, com a consequente devolução das quantias indevidamente compensadas ao recorrido, bem andou a douta decisão a quo, a cujas razões de facto e de direito, o mesmo adere; Sem contender, sempre se dirá, II Admitindo o artigo 40°, n° 2 da LGT, como forma de extinção da relação jurídica e prestação tributária, a compensação, nos casos expressamente previstos na lei e sem prejuízo do disposto no artigo 853°, n° 1, al. c) do CC, haverá que observar, no respeito pelo artigo 847° deste mesmo Código e como um dos requisitos cumulativos à verificação da compensação, ser o crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material, ou seja, fundada em razões de direito substantivo; III Assim, uma vez pendente a presente impugnação judicial (deduzida em 15-03-2011), sustentada na invocada inexistência do facto tributário, e, portanto, em razão de direito substantivo, a compensação com crédito de reembolso de IRS do impugnante apenas poderia vir a ser validamente realizada e considerada eficaz se e quando o crédito da Administração Tributária viesse a ser reconhecido como válido, pois que, “Para poder operar a compensação, ambos os créditos devem ser exigíveis iudicialmente, o que não se verifica se um deles for litigioso, por estar dependente de decisão judicial ainda a proferir.” (Ac. TRL de 9-03-2006, Proc. 1561/2006-6, disponível in www.dgsi.pt); IV De modo que, e salvo o devido respeito por entendimento diverso, falha, desde logo, in casu, o preenchimento do requisito previsto no artigo 847°, n° 1, al. a) do CC para a operada compensação, exigência esta que que não se poderá considerar derrogada pela previsão do artigo 89°, n° 1, al. b) do CPPT, a qual deverá ser interpretada à luz do regime geral substantivo ali previsto, espelhando a finalidade do instituto da compensação e mantendo-se a exigência dos seus requisitos, em particular e no que ao caso importa, evitar o pagamento de uma dívida que possa ainda vir a ser declarada inválida; V Neste sentido, aliás, e reportando-se ao artigo 89°, n° 1, al.b) do CPPT, pronunciou-se o douto acórdão do STA de 10-10-2012, Processo 0923/12 (disponível in www.dgsi.pt), cujos fundamentos, por clarividentes, o recorrido se permite, em parte, transcrever: (...) “se a validade do crédito de quem se pretende valer da compensação é uma "validade provisória" ou uma "validade precária", no sentido de que só produz efeitos enquanto não for decidida reclamação ou impugnação, então os créditos não estão em condições de ser compensados. Em rigor, não há uma situação de compensação, porque contra o crédito que a Fazenda Pública tem sobre o executado, consubstanciado na dívida exequenda, pode proceder uma excepção peremptória de direito material, como acontece se o acto de liquidação ou de execução for anulado. A compensação de créditos é proibida porque, havendo possibilidade de ser declarada a invalidade do acto incorporado no título executivo, também há possibilidade de faltar um dos requisitos da compensação, o referido na alínea a) do n° 1 do artigo 847°do Código Civil, que consiste na validade, exigibilidade, e exequibilidade do contracrédito" VI Por conseguinte, e sendo manifesto que o pagamento a coberto de compensação por iniciativa da Administração Fiscal consubstancia um pagamento coercivo, não se podendo confundir ou equiparar a cumprimento ou pagamento espontâneo da dívida exequenda, as compensações em causa, efectuadas na pendência da impugnação judicial, não poderão ter outra função que não a de garantia, e não a de extinção parcial da dívida, o que decorre do próprio n° 4 do artigo 199° do CPPT (neste sentido, vide Rui Duarte Morais, Manual de Procedimento e Processo Tributário, Almedina, 2012, pág. 203); VII Além do que, ocorrida in casu a prescrição e atento o disposto nos n°s 1 e 2 do artigo 304° do CC, nada tendo o recorrido requerido quanto ao pagamento da dívida e tendo sido a Administração Tributária, por sua iniciativa, a optar pela compensação coerciva, obstáculos não há à verificação da prescrição e, como consequência, à anulação das compensações efectuadas, importando necessariamente a devolução das quantias compensadas ao contribuinte; Além do que, e em qualquer caso, VIII Não se poderá ignorar que, notificado pela Administração Tributária, através do ofício n° 20/322 de 15/06/2011 (fls. 38 do PAT), para, no prazo de 15 dias, prestar garantia idónea no valor de €1.899,86, o impugnante ofereceu e requereu que a garantia a prestar consistisse em hipoteca voluntária a constituir sobre o prédio rústico com o art. matricial n° 4….., sito na freguesia e concelho de Penalva do Castelo, solicitando ainda que, no deferimento do exposto, fosse ordenada a suspensão das diligências de penhora (requerimento dirigido ao SF Loures - 1 por via postal registada com a/r - RC833828825PT expedido em 6/07/2011), IX Requerimento este que não foi apreciado pela Administração Tributária; X Aliás, já em 12/05/2011, conforme salienta a Fazenda Pública nas suas alegações de recurso, ou seja, mesmo antes de o impugnante ter sido notificado para prestar garantia (ofício n° 20/322 de 15/06/2011) e encontrando-se já pendente a presente impugnação, operou no PEF n° 1520200401051563 a compensação com o reembolso de IRS de 2010, no montante de €915,82, sendo que as demais (compensações operadas no PEF 1520200501009460, em 1/08/2012, com o reembolso de IRS de 2011, no montante de €788,44, e em 25/09/2013, com o reembolso de IRS de 2012, no montante de €194,11) foram concretizadas, como dito, sem que tivesse sido apreciado o requerido pelo impugnante quanto à prestação de garantia; XI Ora, a este respeito e perfilhando o entendimento aí adoptado, permite-se o recorrido citar o douto acórdão do STA de 8/08/2012, aliás, referido pela Fazenda Pública: “Na verdade, enquanto estiver pendente o prazo para prestar garantia ou enquanto a AT não se tiver pronunciado sobre a garantia oferecida, não deverão ser praticados no âmbito da execução fiscal actos ofensivos do património do contribuinte, como é manifestamente a compensação por iniciativa da AT, na medida em que o priva de um crédito a que tem direito sem para tal ter de consentir.”; XII Ademais, dispondo o n° 1 do artigo 169° do CPPT, no que agora releva, que em caso de impugnação judicial que tenha por objecto a legalidade da dívida exequenda, como se verifica, a execução ficará suspensa até à respectiva decisão, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195° ou prestada nos termos do artigo 199° ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, e não tendo o recorrido, no âmbito das execuções fiscais, constituído ou prestado garantia nos referidos termos, cumpriria à Administração Tributária, na sua tese e na prossecução do propósito de cobrança coerciva àquelas subjacente e emcumprimento do previsto no n° 7 do mesmo artigo 169°, proceder à penhora de bens em montante suficiente para assegurar satisfação da quantia exequenda e acrescido; XIII Não havendo, contudo, procedido à penhora e fundando-se na ausência de causa suspensiva dos processos de execução fiscal, a Administração Tributária operou as compensações em causa, defendendo que as mesmas não têm a função de garantia da dívida exequenda, entendimento, porém, que equivaleria, na prática e em violação dos princípios da legalidade e de acesso à justiça tributária, previstos, respectivamente, nos artigos 8° e 9° da LGT, a vedar ao recorrido a garantia e o direito à impugnação judicial da legalidade da dívida, a qual, antes mesmo da decisão do pleito se teria por parcialmente paga quando, na verdade, o recorrido não praticou qualquer acto nesse sentido; XIV Pelo que, também por esta via, os actos de compensação praticados deverão ser considerados ilegais, impondo-se a sua anulação e a devolução dos valores indevidamente compensados; XV Aliás e por último, cumpre sublinhar que já o acórdão do Tribunal Constitucional n° 386/2005 de 13 de Julho, embora pronunciando-se pela constitucionalidade do artigo 89° do CPPT quando interpretado no sentido de poder ser efectuada a compensação coerciva de créditos fiscais desde que a dívida se torna exigível, mesmo que o prazo de impugnação não se encontre esgotado e do contribuinte não ter sido citado para a execução fiscal nem notificado para prestar garantia, doutamente dispunha: “O contribuinte continua a ter a possibilidade de recorrer a esse meio de tutela jurisdicional para discutir a legalidade da liquidação sofrida e, por essa via, obter a anulação do acto tributário com as consequências que legalmente daí advêm - designadamente, com a restituição do indevidamente compensado, acrescido do pagamento dos legais juros indemnizatórios.” Em razão do exposto, XVI Não merece censura a douta decisão a quo, não tendo incorrido em qualquer erro ou violação de lei substantiva ou adjectiva, pelo que deverá, pois e salvo o devido respeito por entendimento diverso, manter-se inalterada, sendo negado total provimento ao recurso interposto, com o que se fará JUSTIÇA!» **** **** **** Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a Recorrente remate a sua alegação (art. 639.º do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, que se cinge à parte da sentença que ordenou a devolução dos valores de reembolsos de IRS compensados na execução fiscal, e as contra-alegações, temos que, no caso concreto, a questão fundamental a decidir é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento, de facto e de direito, por ter ordenado a devolução dos valores referidos. **** Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta. **** II. FUNDAMENTAÇÃO II.1. De facto Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos « 1) Em 13/12/2010 o impugnante foi citado nas execuções fiscais, n.°s 1520200401051563, 1520200501009460 e 1520200601050729, instauradas por dívidas de IRC, dos anos de 2002, 2003 e 2004, nos montantes de € 1.071,86, € 1.375,00 e € 1.718,75 e juros compensatórios, e de IVA de 2004, contra ele revertidas e originariamente instaurada contra "C..........., Lda." (cfr. processo administrativo apenso); 2) Os montantes de reembolsos de IRS dos anos de 2010, 2011 e 2012 devidos ao Impugnante foram pela Administração Tributária aplicados no pagamento das quantias em cobrança nas execuções fiscais identificadas no ponto anterior (cfr. fls. 86 e 116); 3) Em 05/12/2014 as dívidas em cobrança das execuções ficais identificadas no ponto 1) foram declaradas prescritas por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Loures-1 (cfr. fls. 943 a 96); 4) Em 15/03/2011 o foi deduzida a presente impugnação (cfr. fls. 2). **** Tendo em conta os fundamentos do recurso e a matéria julgada provada no tribunal recorrido, e levando em consideração que a decisão sobre essa matéria de facto se baseou, além do mais, em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal considera necessário completar um facto e aditar outro, já que tal se torna necessário para apreciação dos fundamentos do recurso e, assim sendo, nos termos do art. 662.º, n.º 1, do C.P.Civil, completa e adita a seguinte factualidade, nestes termos:
O ponto 2) do probatório passa a ter o seguinte teor: 2) Os montantes de reembolsos de IRS do Impugnante dos anos de 2010, 2011 e 2012 foram aplicados no pagamento das quantias em cobrança nas execuções fiscais identificadas no ponto anterior em 12-05-2011, 01-08-2012 e 25-09-2013 (cfr. fls. 86 e 116 e acordo – ambas as partes, Recorrente e Recorrido, referem estas datas);
Adita o seguinte facto: 5) As execuções fiscais nas quais estão em cobrança as dívidas aqui impugnadas não se encontravam garantidas (facto não controvertido, confirmado pelo projecto de reversão das dívidas contra o ora Impugnante, de fls. 38 do PA apenso). **** Como se viu, na sequência do reconhecimento oficioso por parte da AT da prescrição das dívidas impugnadas, o Tribunal recorrido julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide e condenou a AT a restituir ao Impugnante os montantes objecto de compensação. A FP não se conforma com o último segmento decisório, relativo à condenação da AT a devolver os valores objecto de compensação, já que, defende, os requisitos do art. 89.° do CPPT para que a compensação se operasse estavam reunidos, uma vez que a impugnação foi apresentada em Março de 2011, as compensações foram efectuadas em Maio de 2011, Agosto de 2012 e Setembro de 2013, o PEF não estava garantido e, como tal, não estava suspenso nos momentos das compensações. Por seu turno, o Recorrido defende que a decisão proferida foi a correcta; que, no caso, falha, desde logo, o preenchimento do requisito previsto no artigo 847.°, n.° 1, al. a) do CC para a operada compensação, exigência esta que que não se poderá considerar derrogada pela previsão do artigo 89°, n° 1, al. b) do CPPT; que, sendo manifesto que o pagamento a coberto de compensação por iniciativa da Administração Fiscal consubstancia um pagamento coercivo, não se podendo confundir ou equiparar a cumprimento ou pagamento espontâneo da dívida exequenda, as compensações em causa, efectuadas na pendência da impugnação judicial, não poderão ter outra função que não a de garantia, e não a de extinção parcial da dívida, o que decorre do próprio n° 4 do artigo 199.° do CPPT; que, notificado pela Administração Tributária, para prestar garantia idónea, o impugnante requereu que a garantia a prestar consistisse em hipoteca voluntária a constituir sobre o prédio rústico com o art. matricial n° 4831, sito na freguesia e concelho de Penalva do Castelo, solicitando a suspensão das diligências de penhora, requerimento que não foi apreciado pela Administração Tributária, pelo que não poderia esta praticar actos ofensivos do seu património sem proferir decisão quanto ao requerido. Antes de prosseguir no conhecimento do recurso, verifica-se que o Ministério Público no seu parecer, veio invocar, é certo, lateralmente, que “o meio próprio para a apreciação dos actos de compensação é a reclamação prevista no artigo 276.° do CPPT sendo que a haver facto modificativo/extintivo que determine a anulação ou extinção dos actos de compensação, a devolução das quantias compensadas deverão ser pedidas ao órgão de execução fiscal e, no caso de indeferimento, deverá recorrer-se à reclamação prevista no artigo 276° e seguintes do CPPT.” E, de facto, assim seria, se se tivesse que antender apenas ao acto objecto de contestação, de forma autónoma. Acontece, no entanto, que a sentença recorrida, a propósito da apreciação da extinção da instância por inutilidade da lide e das suas consequências, entendeu dever conhecer incidentalmente a questão da legalidade das compensações dos reembolsos do Recorrido, conhecimento esse que não foi objecto de recurso, o qual, de resto, se cinge, apenas, a esta questão. Não obstante o DMMP assumir um papel de relevo enquanto garante de legalidade, o mesmo só pode suscitar questões relacionadas com os pressupostos processuais se as mesmas não tiveram sido decididas e se, decididas, não tiverem transitado em julgado e, bem assim, relativamente aos pressupostos processuais do próprio recurso jurisdicional. Ou seja, se pretendia sindicar essa concreta impropriedade, então, o MP, aquando da notificação da sentença, teria de ter interposto recurso. Ora, não o tendo feito em sede e momento próprio, e tendo-se ambas as partes conformado com a expressa apreciação dessa matéria, não cumpre tecer quaisquer considerandos adicionais sobre a, eventual, inidoneidade e impropriedade deste meio para aferição da compensação (neste sentido, cfr. Ac. STA, 0960/17, de 30-11-2017, TCAS, 06618/13, de 11-07-2019 e TCAS, de 04770/01, de 01-03-2005). Assente que está esta questão, prossigamos, pois, na apreciação do recurso. A sentença recorrida fundamentou a decisão de devolução das quantias compensadas em execução fiscal no seguinte: “(…) Porém, importa analisar das consequências da extinção das execuções fiscais nas compensações feitas pela Administração Tributária, uma vez que o Impugnante solicita a sua devolução. A compensação é, como resulta da lei, um modus de extinção das obrigações pecuniárias ou referentes a coisas fungíveis entre pessoas que são simultaneamente credoras e devedoras (cfr. artigo 847.° do Código Civil) No caso em apreço, encontramo-nos em presença de créditos do Estado, pelo que a compensação só é permitida nos termos legalmente definidos, concretamente, nos artigos 89.° e 90.° do C.P.P.T., atenta a natureza indisponível de tais créditos. Aos autos não foi trazido qualquer documento corporizando a declaração compensatória, havendo apenas a sua invocação em juízo (cfr. fls. 85 a 87). Porém, o órgão de execução fiscal notificado do requerimento de fls. de fls. 85 a 87, aceitou tais compensações. Nos termos do artigo 853.°, n.° 1, alínea c) do Código Civil, os créditos do Estado só podem extinguir-se por compensação quando a lei expressamente o autorize. Se atentarmos nos requisitos que condicionam a sua possibilidade destaca-se, desde logo, o facto da dívida não estar garantida ou, estando-o, não estiver pendente reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução fiscal relativa à dívida do contribuinte, nem estar a dívida a ser paga em prestações. De acordo com o preceituado no n° 1 do artigo 169° do CPPT « a execução fica suspensa até a decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda (..) desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195º (...)». Assim, do disposto no artigo 169.°, n.° 1 do C.P.P.T resulta a inadmissibilidade da compensação de dívidas por parte da Administração Fiscal antes da prolação da decisão definitiva sobre a questão suscitada em sede de impugnação judicial. Como refere Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, I vol., 2006, Áreas Editora, nota 9 ao artigo 89°, pág. 635 e 636 «(...) a proibição de efectuar a compensação se pender reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução da dívida exequenda exprime uma intenção legislativa de a compensação só se dever efectuar relativamente a dívidas sobre as quais não haja controvérsia.» Ora, a dedução da presente impugnação significa a existência de controvérsia acerca da dívida exequenda relativa às liquidações de IRC que a Administração Tributária pretende executar, sendo que a lei faculta ao executado o direito de na pendência do pleito, obstar a que a execução prossiga através da prestação de garantia. (…) Resulta do probatório que, no caso sub judice, o Impugnante foi citado para os termos da execução em 13/12/2010 e as compensações foram operadas em momento posterior, pelo que não poderão ter outra função que não a de garantia da dívida exequenda (cfr. artigo 199.°, n.° 4 do CPPT). Assim sendo, revela-se claramente ilegal as compensações operadas. Apesar de se considerar que o Impugnante devia ter apresentado requerimento endereçado ao órgão de execução fiscal solicitando a devolução das quantias em causa e em caso de indeferimento deduzir reclamação de acto do órgão de execução fiscal, entendemos que nada obsta que se conheça deste pedido no âmbito da presente impugnação. Face ao exposto, impõe-se concluir, sem mais delongas, em face da declaração de prescrição e da consequente extinção das execuções fiscais, que o Impugnante tem direito à devolução das quantias objecto de compensação pela Administração Tributária.” Vejamos, pois. O art. 89.º do CPPT, na redacção na altura vigente (Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril) dispunha que: “1 - Os créditos do executado resultantes de reembolso, revisão oficiosa, reclamação ou impugnação judicial de qualquer acto tributário são obrigatoriamente aplicados na compensação das suas dívidas à mesma administração tributária, excepto nos casos seguintes: a) Estar a correr prazo para interposição de reclamação graciosa, recurso hierárquico, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução; b) Estar pendente qualquer dos meios graciosos ou judiciais referidos na alínea anterior ou estar a dívida a ser paga em prestações, desde que a dívida exequenda se mostre garantida nos termos do artigo 169.º 2 - Quando a importância do crédito for insuficiente para o pagamento da totalidade das dívidas e acrescido, o crédito é aplicado sucessivamente no pagamento dos juros de mora, de outros encargos legais e do capital da dívida, aplicando-se o disposto no n.º 3 do artigo 262.º (…) 5 - A compensação é efectuada através da emissão de título de crédito destinado a ser aplicado no pagamento da dívida exequenda e acrescido. (…)” Nos termos do art. 169.º do CPPT, na redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010, de 28-04, “1 - A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente. 2 - A execução fica igualmente suspensa, desde que, após o termo do prazo de pagamento voluntário, seja prestada garantia antes da apresentação do meio gracioso ou judicial correspondente, acompanhada de requerimento em que conste a natureza da dívida, o período a que respeita e a entidade que praticou o acto, bem como a indicação da intenção de apresentar meio gracioso ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda. 3 - O requerimento a que se refere o número anterior dá início a um procedimento, que é extinto se, no prazo legal, não for apresentado o correspondente meio processual e comunicado esse facto ao órgão competente para a execução. (…) 6 – Se não houver garantia constituída ou prestada, nem penhora, ou os bens penhorados não garantirem a dívida exequenda e acrescido, é ordenada a notificação do executado para prestar a garantia referida no n.º 1 dentro do prazo de 15 dias. 7 – Se a garantia não for prestada nos termos do número anterior procede-se de imediato à penhora.” Por seu turno, o artigo 52.º da LGT, dispõe que: “1 - A cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros. 2 - A suspensão da execução nos termos do número anterior depende da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias. (…)” Antes de mais, e em face ao regime acabado de expor, é por demais evidente que a decisão recorrida errou quando referiu que “do disposto no artigo 169.°, n.° 1 do C.P.P.T resulta a inadmissibilidade da compensação de dívidas por parte da Administração Fiscal antes da prolação da decisão definitiva sobre a questão suscitada em sede de impugnação judicial.”. Como se viu, tal só assim será se a dívida estiver garantida ou se a penhora garantir a totalidade da dívida e do acrescido. Ou seja, tal como defende a Recorrente, a qual cita Jorge Lopes de Sousa, in CPPT Anotado e Comentado, Vol. I, 6.ª Edição, Áreas Editora, 2011, em nota ao art. 89.º, para que a compensação possa ocorrer por iniciativa da AT devem estar reunidos os seguintes requisitos: “- Haver um crédito a favor de um contribuinte de que seja devedora a administração tributária, que esteja em fase de execução; - Que esse crédito resulte de reembolso, ou de revisão oficiosa, ou de reclamação graciosa ou de impugnação judicial, ou outro meio administrativo ou contencioso; - Que esse contribuinte seja simultaneamente devedor de tributos; - Não estar a dívida garantida ou, estando-o, não estiver pendente reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução fiscal relativa à dívida do contribuinte, nem estar a dívida a ser paga em prestações.” No caso concreto, aparentemente, estavam reunidos os requisitos legais que permitiam à AT efectuar a compensação dos reembolsos do Impugnante com as dívidas em execução, já que, tal como resulta do probatório, os créditos do Impugnante existiam, assim como as dívidas contra ele revertidas e a execução não estava garantida. Acontece, porém, que, como resulta a final da p.i. de impugnação, o Recorrido pediu “a fixação de efeito suspensivo à impugnação, propondo-se prestar garantia adequada”. Não há notícia de que este requerimento tenha sido alvo de resposta por parte do Tribunal recorrido ou da AT (há apenas notícia de uma notificação, que teria sido feita em sede de reclamação graciosa, para que o Reclamante prestasse garantia, a qual não teria sido prestada). Como se viu, de acordo com os n.º 2 e 4 do artigo 199.º do CPPT (na redacção vigente), o executado, com a concordância da AT, pode prestar garantia mediante penhor ou hipoteca voluntária, ou mediante nomeação de bens à penhora, devendo, nos termos do n.º 6 da mesma norma, ser tais garantias apresentadas no prazo de 15 dias (prorrogáveis nos termos ali previstos) a contar da notificação da AT (v., também, art. 169.º n.º 6 e 7 do CPPT, na redacção da Lei n.º 3-B/2010, de 28-04). Só no caso de não ter sido prestada garantia no prazo ali previsto pode a AT fazer prosseguir o processo de execução fiscal, nomeadamente, penhorando bens do executado (ncfr. Art. 169.º n.º 7 do CPPT, na redacção vigente). Ou seja, a partir do momento em que, dentro do respectivo prazo, há um requerimento de prestação de garantia e de suspensão da execução em virtude da existência de processo susceptível de determinar tal suspensão, passou para a AT a obrigação de analisar tal idoneidade e, consequentemente, responder ao executado dando-lhe conta do sentido da decisão, não podendo prosseguir a execução, nomeadamente, compensando valores, sem que ao executado seja dado conhecimento dessa decisão. De acordo com o disposto no artigo 56.º da LGT, a AT está obrigada a pronunciar-se sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados por meio de reclamações, recursos, representações, exposições, queixas ou quaisquer outros meios previstos na lei pelos sujeitos passivos ou quem tiver interesse legítimo. Também na CRP (art. 268.º) esta obrigatoriedade da decisão, erigida em direito e garantia dos administrados, está, claramente, plasmada nos seguintes moldes: “1. Os cidadãos têm o direito de ser informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam directamente interessados, bem como o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas. (…)” E isto porque a AT, na sua actuação, embora sempre prosseguindo o interesse público, tem de respeitar os direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, subordinando tal actuação ao respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé (art. 266.º da CRP). Ora, prevendo a lei, nos termos vistos, a possibilidade de o executado poder indicar bens à penhora para garantir a dívida exequenda, e tendo sido feito o requerimento de prestação de garantia dentro do prazo que a lei lhe conferia (com a impugnação), não poderia o órgão de execução fiscal ter feito prosseguir a execução, como parece ter feito, aplicando os reembolsos no pagamento da dívida, sem antes ter tomado uma posição, que sempre teria de ser expressa, sobre essa questão. Ao ter assim agido violou, de forma evidente, o regime dos artigos 169.º e 199.º do CPPT, o que tem como consequência a ilegalidade das compensações efectuadas e aqui questionadas. Neste sentido se tem pronunciado recorrentemente a jurisprudência dos tribunais superiores, de que é exemplo o Acórdão do STA de 15-02-2012, proc. n.º 089/12, numa situação similar, e cujo sumário, porque elucidativo, a seguir se transcreve parcialmente: “II - A violação pela administração tributária de um dever procedimental segundo as regras da boa fé, pode consistir em vício autónomo de violação de lei. III - A prática de acto de compensação de crédito por iniciativa da administração tributária, após a oportuna apresentação de requerimento para prestação de garantia e antes da sua apreciação, viola o princípio da boa fé que deve presidir à actividade administrativa (art. 6.º-A do CPA e art. 266.º da CRP), porque frustra a legítima expectativa de apreciação da pretensão, ancorada no princípio da decisão.” Com efeito, prossegue, ainda, o Acórdão citado, “(…) a actuação da AT, ao proceder à compensação após a apresentação tempestiva do requerimento para prestação de garantia idónea e antes de se pronunciar sobre o mesmo, viola o princípio da boa-fé, não por frustrar a expectativa de deferimento da pretensão, mas por frustrar a legítima expectativa de apreciação desse pedido, ancorada no princípio da decisão consagrado no art. 56.º da LGT ( (Diz o art. 56.º, n.º1, da LGT: «A administração tributária está obrigada a pronunciar-se sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados por meio de reclamações, recursos, representações, exposições, queixas ou quaisquer outros meios previstos na lei pelos sujeitos passivos ou quem tiver interesse legítimo».). (…) Seja como for, o que não pode permitir-se, sob pena de violação do princípio da boa-fé, é que a AT proceda à compensação da dívida exequenda com um crédito da Executada sem que previamente se pronuncie sobre a garantia por esta oportunamente oferecida em ordem à suspensão da execução até que esteja decidida a impugnação judicial que deduziu contra a liquidação da dívida exequenda. A não ser assim, ficaria ao arbítrio da AT o momento para apreciar a garantia oportunamente oferecida e, consequentemente, a suspensão da execução fiscal, no âmbito da qual poderia entretanto ir praticando diversos actos ofensivos do património do executado, em manifesto desrespeito pelo princípio da decisão. (…)” No mesmo sentido, cfr., também, Acórdão do STA, de 19-05-2010, proc. n.º 0344/10: “I - A penhora de créditos do devedor inscreve-se dentro dos poderes da entidade exequente de nomear bens à penhora, designadamente nos termos do n.º 4 do artigo 215.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário. II - No entanto, a penhora de créditos pelo órgão da execução fiscal, antes da pronúncia devida sobre a insuficiência de garantia prestada, apresenta-se violadora do princípio legal e constitucional da boa-fé que deve nortear a actuação da Administração Fiscal, e que consiste fundamentalmente na «confiança suscitada na contraparte», nos termos do artigo 6.º-A do Código de Procedimento Administrativo (e também do artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa).” E Acórdão do STA, de 24-10-2012, proc. n.º 01042/12: “I - É ilegal a constituição de penhor de créditos tributários determinada unilateralmente pela Administração tributária, após o contribuinte ter manifestado a intenção de impugnar a dívida exequenda e oferecido garantia para suspender a execução e estando pendente a apreciação da idoneidade da garantia oferecida. II - Tal actuação da Administração tributária configura-se como violadora do princípio da boa-fé. III - Embora a lei tributária permita à Administração, por sua iniciativa e independentemente de consentimento do respectivo titular, a constituição de penhor ou hipoteca legal para garantia (especial) dos créditos tributários e o n.º 1 do artigo 195.º do CPPT pareça permitir a constituição de penhor sempre que o interesse da eficácia da cobrança o torne recomendável, a Lei Geral Tributária - que logica e naturalmente prevalece sobre o disposto no CPPT-, exige que a constituição de tais garantias se revelem necessárias à cobrança efectiva da dívida –, necessidade essa que não se verifica nos casos em que o próprio executado, voluntariamente, se oferece para prestar garantia.” Assim, não há dúvida de que as compensações efectuadas pela AT, antes da decisão do requerimento do ora Recorrido de suspensão da execução e de prestação de garantia, são ilegais, o que tem como consequência a sua devolução na sequência da extinção da execução fiscal por declaração de prescrição das dívidas, tal como decidiu o Tribunal recorrido. A tudo quanto se deixa dito, acresce, ainda, que, de todo o modo, sempre nos encontrávamos perante pagamentos coercivos, que não voluntários, não constituindo o cumprimento de uma obrigação natural (art. 304.º do CC), e que, por esse motivo, reclamariam a devolução das quantias prescritas. A sentença que assim decidiu, embora com a presente fundamentação, merece, pois, ser confirmada. ***** III. DECISÃO Face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente (art. 527.º do CPC). Registe e notifique.
Lisboa, 11 de Julho de 2024
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