Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 238/20.4BESNT |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 06/27/2024 |
| Relator: | TERESA COSTA ALEMÃO |
| Sumário: | I - No que concerne à presunção de veracidade das operações materiais que as facturas devem documentar, compete à Administração Tributária demonstrar os indícios sólidos da natureza fictícia do documento. II - A força probatória dos indícios reunidos será tanto maior quanto mais confluírem no mesmo sentido; III - O indício do movimento bancário assume frequentemente um papel decisivo para a prova da simulação; IV - Cumprido o respectivo ónus probatório, compete a quem a imputação de falsidade é feita contradizer essa prova, demonstrando que o acordo é verdadeiro ou, pelo menos, alegando factos que abalem os indícios de falsidade; V - Se a operação ou o preço são simulados não é admitido o direito à dedução do I.V.A. respectivo a fim de se não obter a dedução de um imposto que não foi suportado pelo sujeito passivo. |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO A Fazenda Pública veio interpor recurso da sentença proferida em 30 de Setembro de 2023 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por S... – Representações e Prestações de Serviços, S.A., contra as liquidações adicionais de IVA e respectivos juros compensatórios, relativas aos períodos de 8, 9, 10, 11 e 12 de 2013, 4, 5, 8, 11 e 12 de 2014 e 3, 6, 7 e 12 de 2015, quanto ao fornecedor T... – Sociedade de Representações e Assistência Técnica, Ld.ª, no valor total de € € 141.565,00, por ter entendido haver erro de julgamento de facto e de direito.
A Recorrente termina as alegações de recurso formulando as conclusões seguintes: “A. Vem o presente recurso reagir da douta sentença proferida em 2023-09-30, relativa ao processo n.º 238/20.4BESNT, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela Recorrida, das liquidações adicionais de IVA relativas aos exercícios de 2013, de 2014 e de 2015, no valor total de € 177.395,01 (cento e setenta e sete mil, trezentos e noventa e cinco euros e um cêntimos): B. No presente recurso, pretende-se que seja apreciado (a) o erro de julgamento de facto da douta sentença recorrida por entender insuficientes os indícios recolhidos pelos SIT para sustentar a simulação das faturas emitidas, e o subsequente (b) erro de julgamento de direito na anulação das liquidações adicionais de IVA, em violação da norma constante do n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA. C. A questão controvertida nos autos é determinar se as faturas emitidas pelo fornecedor T... à Recorrida, nos períodos de IVA de 2013/08, 2013/11, 2014/04, 2014/11, e 2015/06, no valor total de IVA de € 141.565,00 (cento e quarenta e um mil, quinhentos e sessenta e cinco euros), deduzido pela Recorrida, titulam operações reais. D. Determina a norma constante do n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA que “Não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura.” (sublinhado nosso). E. Sobre esta temática, tem sido Jurisprudência assente dos Tribunais Superiores que compete à AT demonstrar a factualidade subjacente à desconsideração das operações como genuínas (i.e., reunir os indícios que sugerem a falsidade das operações), competindo ao sujeito passivo a demonstração da efetividade das operações. F. Neste sentido, pronunciou-se o Pleno da Seção de Contencioso Tributário do STA em acórdão proferido no processo n.º 587/16, de 2016-03-16, bem como este Venerando Tribunal Superior nos acórdãos proferidos no processo n.º 463/08.6BESNT, em 2019-07-11, no processo n.º 60/10.6BESNT, em 2019-06-05, n.º 1729/14.1BELRA, em 2019-10-31, n.º 1380/10.5BELRS, em 2023-06-22, n.º 942/09.8BESNT, em 2022-09-15, todos disponíveis em www.dgsi.pt. G. A douta sentença recorrida considerou os indícios reunidos pelos SIT, em sede de procedimento inspetivo, constatando que “assentam em elementos reunidos em acção de inspecção efectuadas a terceiros, em concreto à T... e às sociedades que alegadamente forneciam aquela, nomeadamente as sociedades B..., Lda, C ..., Unipessoal, Lda, T ... Sociedade de Representações, Lda e T ..., Lda, assim como a elementos reunidos em acção de inspecção realizada à impugnante”, cf. fls. 19. H. No entanto, a recolha de elementos obtidos através de fiscalização cruzada não tem merecido censura por parte da Jurisprudência, desde que conciliados com elementos recolhidos junto do sujeito passivo, como sucedeu no caso concreto. Neste sentido, pronunciou-se este Venerando Tribunal no acórdão proferido no processo n.º 8959/15, em 2018-02-22, e no processo n.º 1729/14.1BELRS, em 2019-10-31, ambos disponíveis em www.dgsi.pt. I. Analisando os indícios recolhidos pelos SIT, concluiu o Tribunal a quo que “Perscrutando a fundamentação supra a que a ATA lançou mão, salta à vista que aquela é fundada, tal como invocado pela impugnante, em asserções subjectivas, conclusões e induções, sendo que não é possível através do relatório de inspecção alcançar como chegou a ATA a tais conclusões.”, cf. fls. 20 da douta sentença recorrida. J. Respeitosamente, é neste segmento e nos parágrafos imediatamente seguintes que a douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento de facto na análise da prova produzida. K. Foram cinco razões de facto que fundamentam a desconsideração do IVA deduzido pela Recorrida, quanto às faturas emitidas pela T...: (i) Ausência de estrutura operacional relevante da T... e seus alegados fornecedores, (ii) Desproporção dos custos de manutenção do edifício faturados pela T..., empresa não especializada, perante os custos de construção faturados por uma empresa especializada, (iii) Inexistência de qualquer contrato de manutenção com a T..., o que contrasta com a existência de contrato de construção com a empresa especializada, (iv) Existência de custos de manutenção do edifício faturados por outros fornecedores considerados mais adequados às necessidades do edifício, (v) Parte dos fluxos financeiros relativos ao pagamento das faturas emitidas pela T... foram entregues pela T... aos administradores e accionistas da Recorrida. L. Questiona-se o Tribunal a quo sobre o que seria a estrutura operacional relevante e como conheceu a AT esse facto. M. No relatório do procedimento inspetivo, consta que não é conhecida estrutura operacional à T... para prestar os serviços faturados, explica-se que, em sede de procedimento inspetivo próprio à T..., se apurou que os serviços faturados à Recorrida foram contratados às empresas B..., Unipessoal, Lda., C...Unipessoal, Lda., T ... Sociedade de Representações, Lda., e T ..., Lda, cf. fls. 156 e faturas juntas de fls. 299 a fls. 326 do procedimento de inspeção tributária. N. Por sua vez, quanto às fornecedoras da fornecedora da Recorrida constatou-se que, cf. fls. 156 e fls. 157 do procedimento de inspeção tributária, O. Estas sociedades não dispõem de qualquer estrutura operacional conhecida. P. Não se trata de determinar o que seria a “estrutura operacional relevante”, como refere a douta sentença recorrida, trata-se de existir uma estrutura. A realização dos serviços pressupõe a existência de recursos superiores a 0 (zero). Q. Respeitosamente, afigura-se que este conjunto de circunstâncias, reconduzido ao indício (i) ausência de estrutura operacional relevante da T... e seus alegados fornecedores, sugere que as operações entre a T... e as suas fornecedoras não são genuínas, refletindo-se na incapacidade da T... para prestar os serviços alegadamente contratados pela Recorrida. R. Se a T... não tem capacidade de prestar os serviços alegadamente contratados pela Recorrida, é sugestivo de que os serviços faturados não foram efetivamente prestados. S. Referiu o Tribunal a quo que “Adicionalmente a ATA conclui nos termos já elencados por considerar que há uma desproporção dos custos de manutenção do edifício facturados pela T..., empresa não especializada, perante os custos de construção facturados por uma empresa especializada, uns anos antes, mas o juízo de desproporção não é preenchido, não sendo possível alcançar em que medida aquela desproporção é relevante, não ponderando se é devida ao aumentos dos preços, ou à inexistência de alterações substanciais no imóvel construído. De todo o modo a desproporção não é qualificada nem caracterizada pela ATA e não passa de um juízo subjectivo da ATA. De seguida, a ATA considera que os custos de manutenção do edifício foram igualmente facturados por outros fornecedores, e reconhece a estes uma adequação para a prestação de tais serviços, que relaciona às necessidades do edifício, mas que não exterioriza, não referindo também por que conjunto de razões considera certos fornecedores mais adequado que a T... para execução das obras, nada referindo quanto à existência de contrato com estas entidades, sendo certo que também considera a falta de contrato com a T... como indício de falsidade dos serviços prestados, e nada referindo para demonstrar esse mesmo juízo de adequação, qual a estrutura operacional das demais entidades que facturaram serviços de manutenção do edifício;” (sublinhado nosso), cf. fls. 20 e 21 da sentença. T. As faturas emitidas pela T... à Recorrida constam de fls. 280 a fls. 284 do procedimento de inspeção tributária, resultando das mesmas que o descritivo dos serviços prestados é genérico e não permite a verificação exata do serviço alegadamente efetuado, não respeitando o disposto no artigo 36.º do Código do IVA nem o disposto na alínea c) do n.º 4 do artigo 23.º do Código do IRC. U. Em sede de procedimento inspetivo, apurou-se que, nos anos de 2002/2003, o custo de construção do centro de inspeção totalizou € 582.986,35 (quinhentos e oitenta e dois mil, novecentos e oitenta e seis euros e trinta e cinco cêntimos), e que entre 2011 e 2015, a Recorrida dispendeu quase 1,7 (um vírgula sete) vezes (€ 974.580,68) aquele valor em custos de conservação e reparação do centro de inspeções. V. A T... faturou à Recorrida mais de 1,4 vezes (um vírgula quatro vezes) o valor de construção do centro de inspeção automóvel, em custos de manutenção e reparação, ou seja, o valor de € 830.000,00 (oitocentos e trinta mil euros) teriam permitido à Recorrida a construção de um segundo centro de inspeção e ainda de mais de 40% (quarenta por cento) de um terceiro centro de inspeção automóvel. W. Já o custo de conservação e reparação do centro de inspeções faturado pelos demais fornecedores, no valor de € 151.580,68 (cento e cinquenta e um mil, quinhentos e oitenta euros e sessenta e oito cêntimos), cujas faturas disponíveis se encontram de fls. 328 a fls. 334 do procedimento inspetivo, afigura-se cobrirem as necessidades de reparação e/ou manutenção do centro de inspeções, correspondendo a certa de 25% (vinte e cinco por cento) do custo de construção. X. Atendendo ao descritivo das faturas, e às tabelas resumo constantes de fls. 162 a 164 do procedimento de inspeção tributária, os trabalhos realizados pelos fornecedores da Recorrida foram bastante exaustivos, incluindo trabalhos de reparação nas linhas, trabalhos de manutenção dos wcs, trabalhos de pinturas interiores e exteriores, trabalhos de reparação de portas e gradeamentos, trabalhos de eletricidade, instalação de painéis, trabalhos no estacionamento, entre outros. Y. Diferentemente, as faturas emitidas pela T... não permitem compreender o tipo de serviço prestado nem de que forma os serviços alegadamente prestados não duplicam, antes se articulam os serviços efetivamente prestados pelos demais fornecedores; nem permitem extrair qualquer ligação entre os trabalhos alegadamente prestados pela T... e o possível investimento da Recorrida na aquisição ou instalação de novas tecnologias no local ou a expansão do local da operação da Recorrida, cf. faturas constantes de fls. 280 a fls. 284 do procedimento de inspeção tributária. Z. A Recorrida preferiu pagar a uma entidade não especializada serviços de manutenção quase 5,5 (cinco vírgula cinco) vezes superior ao valor pago às entidades especializadas, o que, considerando a exaustividade dos serviços prestados pelos fornecedores especializados na manutenção do edifício, fica por esclarecer que serviços sobraram para ser prestados pela T.... AA. O Tribunal a quo relevou foi o circuito dos pagamentos, entendendo, porém, que se justificava apurar se esses pagamentos da T... poderiam ter outra fonte, cf. fls. 21 da douta sentença recorrida. BB. Efetivamente, o facto de o valor pago pela Recorrida à T... ser, posteriormente, depositado em contas bancárias dos acionistas da Recorrida e seus familiares, sugere que esse valor não se destinava ao pagamento do preço constante das faturas, o que indicia que as faturas não titulam operações genuínas. CC. Os fluxos financeiros iniciaram-se com o pagamento das faturas emitidas pela T... através de transferência bancária para a conta CCAM n.º 12016203.001, a partir da qual foram sacados diversos cheques cujos valores foram depositados em contas bancárias da titularidade dos acionistas da Recorrida e seus familiares, incluindo: DD. Sucede que a contabilidade da T... foi objeto de procedimento inspetivo; é da conjugação da prova reunida nos dois procedimentos inspetivos que foi possível reconstruir os fluxos financeiros descritos. EE. Ora, se existisse um documento justificativo dos pagamentos feitos pela T... aos acionistas da Recorrida, esse documento existiria na contabilidade da T..., para justificar o exfluxo. O que não sucede. FF. Respeitosamente, não se identifica que concreta diligência deveriam os SIT ter realizado, na opinião do Tribunal a quo, e não concretizaram. GG. De acordo com os indícios e factos reunidos no procedimento inspetivo, a AT logrou demonstrar a elevada probabilidade das faturas emitidas pela T... à Recorrida não titularem operações verdadeiras, cf. fls. 171 e 172 do procedimento de inspeção tributária, não tendo a Recorrida apresentado qualquer prova que permita concluir pela veracidade das operações. HH. Ao concluir de forma diferente, considerando os indícios coligidos insuficientes, afigura-se que a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto. II. Mais se afigura que, ao determinar a anulação das liquidações adicionais de IVA, a douta sentença recorrida permite à Recorrida a dedução de IVA resultante de operação violada, em violação da norma constante do n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA, incorrendo em erro de julgamento de direito. JJ. Pelo supra exposto, afigura-se à Recorrente que a douta sentença recorrida padece de (a) erro de julgamento de facto por entender insuficientes os indícios recolhidos pelos SIT para sustentar a simulação das faturas emitidas, e (b) erro de julgamento de direito na anulação das liquidações adicionais de IVA, em violação da norma constante do n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA, não devendo subsistir no ordenamento jurídico-tributário. **** A Recorrida, S... – Representações e Prestações de Serviços, S.A., notificada para o efeito, apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:
«A. Veio a Recorrente interpor recurso da sentença proferida nos autos em epígrafe, pelo TAF Sintra, que julgou totalmente procedente a impugnação das liquidações adicionais de IVA, dos exercícios de 2013, 2014 e 2015, que tiveram por base correções levadas a cabo pela AT, no montante de € 146.009,15, bem como as liquidações de juros compensatórios e moratórios na quantia de € 31.385,86, com a consequente anulação das liquidações em causa. B. Na sua motivação de recurso alegou, em suma, que “(...) a douta sentença recorrida padece de (a) erro de julgamento de facto por entender insuficientes os indícios recolhidos pelos SIT para sustentar a simulação das faturas emitidas, e (b) erro de julgamento de direito na anulação das liquidações adicionais de IVA, em violação da norma constante do n.° 3 do artigo 19.° do Código do IVA, não devendo subsistir no ordenamento jurídico-tributário”. C. Delimitando o objeto do recurso à apreciação das “(...) faturas emitidas pelo fornecedor T... à Recorrida, nos períodos de IVA de 2013/08, 2013/11, 2014/04, 2014/11, e 2015/06, no valor total de IVA de €141.565,00 (...)” D. Aceitando, procedência da impugnação quanto às correções relativas à dedução de IVA do fornecedor F... M..., pelo que, a temática quanto a este fornecedor não será analisada. E. Entende, porém, a Recorrida que não assiste razão à Recorrente, devendo manter-se a sentença nos exatos termos em que foi proferida pelo Tribunal a quo. F. Atento o teor dos vícios invocados pela Recorrida e o teor da contestação, o TAF Sintra fez a análise dos seguintes fundamentos invocados pela Recorrente: G. Tendo entendido, em síntese, que a alegada fundamentação da Recorrente assenta “(...) em asserções subjectivas, conclusões e induções, sendo que não é possível através do relatório de inspecção alcançar como chegou a ATA a tais conclusões". H. E que, “(...) perante os indícios encontrados a ATA podia intuir que as operações materiais não tinham sido realizadas, e seguindo tal intuição devia ter prosseguido a instrução necessária para circunstanciar as suas conclusões, o que não podia era pretender que, sem mais, se tivesse as liquidações por materialmente fundamentadas”, (negrito nosso) I. Decidindo, consequentemente, pela procedência “(...) do vício assacado ao acto quanto à falta de fundamentação substancial, vão os actos anulados, quanto às correcções relativas ao fornecedor T...". J. Não conhecendo dos demais vícios. K. No que respeita às alegações da Recorrente, vieram as mesmas insistir unicamente no desacordo relativamente ao que já foi decidido em sede de sentença, pretendendo vincar pretensões já conhecidas. L. Motivando o seu pedido, pugnou por uma decisão que que determinasse como suficientes os indícios coligidos no âmbito do procedimento inspetivos, e que, sendo suficientes, fundamentavam e justificavam as cinco razões de facto elencadas no ponto F das presentes conclusões, demonstrando, por isso, com elevada probabilidade que as faturas emitidas pela T... à Recorrida não titulavam negócios reais. M. Ora, quanto aos alegados indícios suficientes para prova do elencado na alínea i), do ponto F, das presentes conclusões, a Recorrente limita-se, uma vez mais, a invocar desconhecimento quanto à estrutura operacional da T... e dos seus fornecedores para realização de obras de recuperação das instalações da Recorrida. N. E os indícios em que se terá baseado para afirmar sobre uma tal ausência de estrutura, não decorrem do procedimento de inspeção levado a cabo nas instalações da Recorrida, tampouco se encontram plasmados no RIT. S. Não basta presumir aleatoriamente e sobre circunstâncias que, em boa verdade, nem fazem presumir, para depois a apelidar de conclusão. T. Relativamente aos indícios suficientes para prova do elencado nas alíneas ii) e iv), do ponto F, das presentes conclusões, a Recorrida relembra que desenvolve a atividade de inspeções de veículos, que é sujeita, anualmente, a auditorias essenciais à sua certificação e, bem assim, à prossecução daquela atividade. U. Sendo que, para manter a certificação, todos os anos se fazem obras de manutenção às instalações da Recorrida. V. Ora, resulta do RIT que, no período de 2002/2003, pela preparação do terreno para construção e pela construção do centro de inspeção foram pagas as quantias de € 183.790,00 e de € 585.986,35, respetivamente, totalizando € 766.776,35. W. Sendo que, para efeitos dos presentes autos, a Recorrente apenas considerou € 585.986,35. X. Entre 2011 e 2015, pela reparação e conservação nas instalações do centro, a Recorrida incorreu em gastos que totalizaram € 974.580,68, dos quais € 823.000,00 foram serviços prestados pela T..., e o restante corresponde a serviços prestados, à Recorrida, por outros fornecedores. Y. Entendendo, contudo, a Recorrente não estarem justificados gastos tão elevados nas obras de manutenção e reparação do centro de inspeção, bem como inexistir razão para que esses referidos gastos fossem superiores aos da construção do centro ocorrida uma década antes. Z. E, ainda, que, tendo sido faturadas despesas de reparação, remodelação e manutenção, de quantia inferior, a outros fornecedores que não a T..., seriam aqueles valores mais adequados aos serviços em causa, quando comparados com os serviços prestados pela T…. AA. Sem, contudo, enunciar quaisquer razões lógicas e devidamente fundamentadas que demonstrassem que as obras de reparação, remodelação e manutenção do centro tinham de ter sido feitas por valor inferior aos montantes em causa. BB. A Recorrente não alegou ou demonstrou concretamente quais possibilidades para que todas as obras de reparação, remodelação e manutenção pudessem ter custado à Recorrida um valor consideravelmente inferior. CC. Tal não aconteceu, nem se vislumbra possível admitir dos elementos dos autos, porquanto, em nenhum momento a Recorrente fez qualquer exercício de equacionar custos concretos às obras realizadas. DD. A Recorrente bastou-se em afirmar que entende mais adequados os valores em causa nas faturas dos fornecedores que quaisquer outros fornecedores que não sejam a T.... EE. Não logrando fundamentar por que razões se impunha que os valores gastos com a remodelação, reparação e conservação do centro de inspeção teriam de ser inferiores aos da construção do mesmo, ou, por que razão devia a Recorrida ter preterido dos serviços prestados pela T... em favor dos serviços prestados pelas outras entidades. FF. E, portanto, atendendo aos elevados montantes em causa e à alegada descrição genérica das faturas da T..., desconsiderando absolutamente as necessidades inerentes às obras necessárias em instalações da envergadura das da Recorrida, concluiu a Recorrente estar em causa um negócio simulado. GG. Quanto a este ponto, reitera-se, dos elementos contabilísticos da Recorrida resulta que o custo inicial de construção (que engloba desde construção a aquisição de equipamentos e máquinas, bem como, o pagamento das licenças necessárias ao desenrolar da atividade da Impugnante) foi superior a 1 (um) milhão de euros, mas quanto a essa informação, entendeu a Recorrente não fazer qualquer análise e/ou tecer qualquer comentário. HH. A Recorrente também não deu qualquer relevância aos períodos em que efetuaram as obras, o que, necessariamente, acarreta custos diferentes no que respeita a materiais de construção, dos equipamentos/máquinas, das licenças, de tudo quanto a Recorrida necessita obter para se manter em funcionamento ininterrupto. RR. Ora, equacionando os fluxos financeiros em causa, indicados supra, nos exercícios de 2013, 2014 e 2015, os acionistas da Recorrida terão recebido € 537.833,00, que não se confundem com os € 823.000,00, referentes aos custos das obras levadas a cabo pela T.... SS. Quanto às referidas entregas a Recorrente não questionou a Recorrida, tampouco logrou ou tentou investigar as características das referidas entregas, designadamente, quanto à identidade dos sujeitos envolvidos (que num caso são as sociedades e, noutro, distinto, são os sócios e acionistas) e quanto à coincidência (ou não) dos valores envolvidos. TT. Em suma, a Recorrente fundou a decisão com base na existência de fluxos financeiros entre contas diversas, tituladas por pessoas diversas, e em montantes não coincidentes com os que foram pagos pelas obras levadas a cabo pela T..., limitando-se, novamente, ao exercício da presunção de que se trata de um negócio simulado. UU. Não logrando provar ou demonstrar a existência de qualquer facto que sustente ou leve a presumir a existência dos alegados negócios simulados, apenas fazendo operar a presunção de que se trataria de simulação. W. Quanto à prova do elencado na alínea iii), do ponto F, das presentes conclusões, não veio a Recorrente contradizer o douto TAF Sintra quanto ao decidido a este propósito. WW. Tal como não justificou a razão de, por um lado, para a T... e seus fornecedores entender fundamental a existência de um contrato referente aos serviços prestados, e de, por outro lado, quanto aos fornecedores que considera mais adequados a realizar obras entender ser o contrato um elemento dispensável, porquanto, conforme referido, nada invocou quanto a esta última circunstância. XX. Pelo que, sempre se terá por aceite a parte da sentença que decide da não procedência do argumento que se prende com o fundamento elencado na alínea iii), do ponto F. YY. Pelo que, atendendo ao exposto, nem das alegações da Recorrente, nem do RIT, se extrai fundamento atendível que leve a presumir a existência de um negócio simulado e, bem assim, leve a Recorrente a desconsiderar a dedutibilidade do IVA e emitir as liquidações em causa. ZZ. Impondo-se, por isso, a procedência da decisão recorrida quanto à verificação do vício da falta de fundamentação substancial das correções relativas ao fornecedor T..., anulando-se, em consequência, as liquidações emitidas. AAA. Isto porque, acompanhando o entendimento do TAF Sintra, entende a Recorrida, os elementos trazidos, pela Recorrente, aos presentes autos não configuram indícios suficientes para as correções levadas a cabo. BBB. Verificando-se, portanto, que as referidas correções resultam de juízos conclusivos e presunções feitos pela Recorrente não consubstanciados em concretos elementos apurados em sede de diligências de prova, mormente, no RIT. CCC. Sendo certo que, bem sabe a Recorrente, é sobre ela que pende o ónus da prova (cfr. artigos 342.°, n.° 1, do CC e 74.°, n.° 1, da LGT). DDD. Portanto, in casu, é à Recorrente que “(...) cumpre demonstrar a existência de indícios que afastam a presunção de verdade do declarado pelo sujeito passivo. Perante a existência de tais indícios, da prova dos factos demonstrativos dos mesmos, cabe ao sujeito passivo a prova de que, apesar dos indícios reunidos e da sua validade, os factos titulados pelas facturas efectivamente se passaram, e que aquelas titulam com verdade os montantes e sujeitos relativos aos fornecimentos de bens e serviços, ou de compras efectuados". EEE. Ou seja, à Recorrente competia coligir os elementos internos suficientes, mormente através do RIT e de diligências de investigação em colaboração com a entidade fiscalizada, para lograr demonstrar o raciocínio lógico que a conduziu à conclusão de que estava em causa um negócio simulado. FFF. E só depois de ilidida a presunção constante no artigo 75.°, n.°1, da LGT, incumbiria à Recorrida o ónus da prova da realidade dos factos que defende. GGG. No mais, as conclusões da Recorrente sempre poderiam ser corroboradas por elementos externos recolhidos, por exemplo, em procedimentos de inspeções levados a cabo junto de alguma das entidades envolvidas. HHH. O que não podia era serem inexistentes os indícios coligidos junto da Recorrida, nomeadamente, os dispostos no RIT e, ainda assim, concluir-se como se concluiu pela correção das declarações e desconsideração da dedutibilidade do IVA. III. Mais, a Recorrida, em estrito cumprimento do dever de colaboração com a Administração, esclareceu alguns pontos do projeto do RIT que considerou convenientes, tendo-o feito por entender que o ónus da prova não precisava de se encontrar perfeitamente cingido à luz da regra geral do CC. JJJ. Todavia, não poderia a Recorrente fazer impender para a Recorrida, com tanta onerosidade, o deve de provar elementos relativos a terceiro como forma de provar que determinada factualidade teve lugar, que as operações existiram e que, por isso, o imposto suportado nas mesmas é dedutível. KKK. Sendo certo que a Recorrida sempre entendeu plenamente fundamentados os factos que legitimaram o seu direito à dedução do imposto, nos termos do artigo 19.,° do CIVA. MMM. Era expectável que fossem os factos fundamentos dados a conhecer em sede do relatório definitivo do procedimento de inspeção. NNN. Não só não sucedeu, como a própria conclusão, cujos fundamentos desconhecemos, serve de premissa para alcançar uma outra conclusão, mais grave, que culmina na simulação das operações. OOO. Donde resulta, que os indícios considerados suficientes pela Recorrente invocados como fundamentos das suas “razões de facto" para a realização das correções ora em causa, configuram “(...) ilações, juízos conclusivos e valorações da ATA, (...)” e levaram-na a agir de forma presuntiva, “(...) sem cuidar de obter elementos objectivos, mais vertendo no relatório de Inspecção asserções e conclusões cujos pressupostos não se conhecem nem são passiveis de confronto pela impugnante". PPP. Face ao exposto, não restam dúvidas do acerto da decisão recorrida, devendo, em consequência, julgar-se que a sentença não padece de qualquer erro de julgamento, de facto ou de direito, e concluir- se pela improcedência das alegações da Recorrente. QQQ. Devendo, em consequência, confirmar-se o teor da decisão recorrida. V. Pedido: Nestes termos, e nos melhores de direito, que V. Exas. doutamente suprirão, requer que seja julgado improcedente, por não provado, o recurso interposto pela Recorrente, mantendo-se a sentença recorrida nos exatos termos em que foi proferida pelo Tribunal a quo. Tudo com as devidas e necessárias consequências legais.»
**** Notificado, o Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da procedência do recurso. **** Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que, no caso concreto, as questões fundamentais a decidir são as de saber se a sentença recorrida errou no seu julgamento de facto e de direito por ter entendido que a AT não tinha reunido indícios suficientes de que as facturas eram falsas e, assim, ter considerado não ter aplicação o disposto no art. 19.º n.º 3 do CIVA. **** Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta. **** II. FUNDAMENTAÇÃO II.1. De facto O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “1. De facto Com interesse para a decisão da causa, mostram-se provados os seguintes factos: a) A impugnante foi alvo de acção de inspecção, sendo plasmado no ponto 2.2. do relatório de inspecção, sob a designação “Motivo, âmbito e incidência temporal “A acção inspectiva, foi desencadeada para efeitos de análise das operações constantes das facturas que lhe foram emitidas pelo fornecedor T... – S... Rep. Assist. Tecnica, Lda NIPC 510.... (…)” (cfr. fls. do documento PAT fls. 139 e ss., SITAF 006244937); b) Lê-se do ponto 2.3.2.13, do relatório de inspecção, junto a estes autos, nos termos do despacho que antecede (cfr. documento de PAT fls. 156 e ss., SITAF 006244941): “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)”
“(texto integral no original; imagem)” (…) c) Lê-se do relatório de inspecção, além do mais, quanto ao (cfr. Relatório de Inspecção, fls 443 a 474): “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” “(texto integral no original; imagem)” III.1.2 Gastos NÃO CONTRIBUTIVOS para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC (FERNANDO LOUREIRO). Conforme referido no ponto "Faturação do Fornecedor F... M..., NIF: 150....", do capítulo II, o referido sujeito passivo emitiu faturação (recibo verde eletrónico), a título de trabalho de prospeção com vista ao alargamento da atividade da S... SA, nomeadamente através da instalação e exploração de novos centros de inspeção. Segundo nos foi informado, a empresa encontrava-se impedida de o fazer, devido a cláusula constante do acordo com o parceiro CIMA-Centro de Inspeção Mecânica em Automóveis, Lda em 13/12/1994. (…) III.2 IVA No subcapítulo anterior (IRC), enumerámos as despesas que com os fundamentos então indicados, não devem integrar os gastos de cada exercício. 1. Relativamente à faturação proveniente da empresa T... LDA, a qual como então se referiu, revela indícios de não titular operações reais, não permite legitimar a dedução do respetivo IVA, face ao disposto quer no n° 3 do artigo 19°, quer no artigo 20°, ambos do CIVA. 2. Relativamente à faturação do prestador de serviços F... M..., com o então se referiu no subcapítulo (IRC), os referidos gastos, não tendo contribuído para obter ou garantir os rendimentos, não são enquadráveis no n° 1 do artigo 23° do CIRC, e do mesmo modo, o IVA nesses documentos mencionado, não pode ser dedutível, face ao disposto no artigo 20° do CIVA. d) A impugnante foi alvo de liquidações de IVA, que se identificam nos termos seguintes (cfr. artigo 4.º da PI e 1.º da contestação, e documentos de fls. 24 a 37 dos autos): e) A impugnante foi alvo de liquidações de juros de mora, que seguidamente se identificam (cfr. artigo 5.º da PI e 1.º da contestação, e documentos de fls. 24 a 37 dos autos): **** “Não há factos alegados e não provados com interesse para a decisão da causa.” **** “Os factos provados assentam na análise crítica dos documentos juntos aos autos e não impugnados, conforme se indica em cada alínea do probatório.” *** Tendo em conta que a decisão da matéria de facto em 1.ª Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos, este Tribunal adita a seguinte factualidade, bem como completa a acima considerada provada, que reputa igualmente relevante para a decisão do recurso, aditando-se e completando-se, por isso, o probatório nos termos do art.º 662.º, n.º 1, do C.P.Civil (“ex vi” do art. 281.º, do C.P.P.Tributário), no seguintes termos: Adita-se um ponto b) 1. (entre o b) e c)), com o seguinte teor: b)1. O Relatório de Inspecção que se vem a transcrever tem, ainda, o seguinte teor: “2.3.2.13.9 Conclusão sobre as aquisições à T... LDA Tendo em conta os factos descritos sobre as aquisições da S... REPRESENTAÇÕES E PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS SA à T... LDA levantam-se duvidas sobre a respetiva veracidade considerando que: - Por um lado nem a T... nem os seus alegados fornecedores dispunham de capacidade operacional para prestar aqueles serviços. - Por outro lado, não existem factos que justifiquem por que razão os gastos de manutenção do centro de inspeções, construído em 2002/3, apenas dez anos depois, sejam muito superiores ao respetivo custo de construção. -Sendo certo que ao longo destes anos, são faturadas despesas de remodelação e manutenção do edifício, de valores reduzidos, mas que se revelam adequados à idade e situação do prédio, contrariamente aos valores faturados pela entidade T... LDA . Para se esclarecerem as dúvidas sobre a veracidade destas operações procedeu-se à analise dos movimentos financeiros que lhes estavam associados tendo-se verificado o seguinte: a) Para pagar os serviços que formalmente adquiriu à T... a S... efetuou as transferências bancarias, identificadas no quadro adiante reproduzido, que se destinaram à conta CCAM N° 12016302.001 da referida T.... b) A partir da análise das saídas da conta referida foi possível verificar que, em grande parte, os valores que saíram da S... para alegadamente pagar os fornecimentos da T... acabaram por ser entregues/devolvidos pelos sócios/gerentes desta aos acionistas/administradores da S..., conforme seguidamente se demonstra: (…) Conclui-se, face ao anteriormente descrito, que terminaram em posse dos responsáveis da S... SA, ou seus familiares, os seguintes valores que a empresa inicialmente havia transferido para o alegado fornecedor T... LDA:
As importâncias que alegadamente deveriam destinar-se ao pagamento dos serviços supostamente prestados/produzidos pelos fornecedores da T... e por esta refaturados à S... não tiveram como destino o pagamento dos referidos serviços faturados, mas sim, em grande parte, os acionistas da S... e, em menor parte a T... e os seus sócios/gerentes. Os fornecedores diretos da T... e indiretos da S... nada receberam em contrapartida dos alegados fornecimentos de serviços. Conjugando o facto dos alegados fornecedores, diretos da T... e indiretos da S..., não disporem de qualquer estrutura operacional, com os movimentos financeiros que lhes estão associados, resulta evidente que as alegadas aquisições de serviços da S... à T... correspondem a negócios simulados. Sob a capa dos referidos negócios simulados, o que em substância aconteceu foi a transferência para a esfera patrimonial dos acionistas/administradores da S... de valores que eram propriedade desta. Na esfera da S... a contabilização de faturas relativas a negócios simulados permitiu-lhe a redução significativa da matéria coletável em IRC e o correspondente imposto a pagar e ainda, pela dedução indevida de IVA, a diminuição do IVA a entregar. (…)” (cfr. Relatório de inspecção, que é doc. 005074031 e ss. do SITAF;
c) 1. O relatório de inspecção que se tem citado, tem, ainda, o seguinte teor: “(…) IX DIREITO DE AUDIÇÃO O "Projecto de Relatório de Inspecção”, foi enviado pelo ofício n° 22688 de 23-09-2019 (Registo postal n° RH104711879PT), para a morada/sede do respectivo sujeito passivo (RUA DE ..., AMADORA ...- 056 AMADORA). Aos 11/10/2019, deu entrada nestes serviços o direito de audição exercido pela sociedade, relativamente à notificação que para o efeito lhe foi efetuada. No ponto 4., manifesta a sua discordância pela não aceitação de gastos de IRC e deduções IVA, com base em faturação da empresa T ... LDA. Nos pontos 5 a 26 vem reafirmar que as obras objeto de faturação pela referida empresa, eram necessárias, e foram efetivamente realizadas. Acontece, que tendo este mesmo argumento sido apresentado no início da inspeção, conduziu à solicitação através de notificação de 17/10/2017, para comprovação das referidas operações, nomeadamente: “a) Informar de que forma conheceu a firma T... - SOC. REP. ASSIST. TÉCNICA, LDA, bem como se conheceu alguns trabalhos realizados pela mesma previamente à contratação pela S... REPRESENTAÇÕES E PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS SA; b) Provas documentais - contratos de empreitada, autos de medição, seguros de pessoal em obra, bem como quaisquer outros elementos que provem inequivocamente a realização das obras efetuadas pelo fornecedor T... - SOC. REP. ASSIST. TÉCNICA, LDA, NIPC: 510...; c) Informar tão pormenorizadamente quanto possível, relativamente aos materiais utilizados, nas obras, suas denominações e quantidades, bem como a sua proveniência e/ou respetivo fornecedor. d) Apresentar relativamente aos mesmos materiais, guias de transporte, guias de remessa, que se encontrem na sua posse, bem como quaisquer outros elementos que provem inequivocamente a compra e utilização dos mesmos; e) Identificação dos trabalhadores daquelas empresas, que executaram os serviços nas vossas obras, nos exercícios acima indicados, discriminando o n° de dias de trabalho, ano e obra; f) No caso de os trabalhadores não pertencerem ao quadro de pessoal daquele fornecedor, queira identificar o subempreiteiro a quem o mesmo recorreu para prestar os serviços contratados; g) Deve ainda informar, relativamente às obras faturadas pela T... LDA, porque motivo o seu custo foi considerado gasto do exercício, em vez de ter sido repartido pelos exercícios seguintes de acordo com a utilidade esperada das partes substituídas. h) Deve ainda indicar a identificação da(s) pessoa(s) que representava(m) a(s) referida(s) empresa(s) fornecedora(s)”. A qual obteve a seguinte resposta: Exmos. Srs., No âmbito da notificação em referência para efeitos de controlo tributário á nossa empresa informo o seguinte sobre as questões colocadas: a) Conheci a firma T... através do seu sócio Sr. C... M..., pessoa que conheço desde os anos 80, por via das funções por ele desempenhadas em várias empresas com as quais mantive relações profissionais, sendo que mantivemos sempre um contacto próximo mas estritamente profissional. Mais esclareço que o Sr. C... M... não é meu familiar nem tem relações familiares com qualquer dos sócios e/ou administradores desta empresa. b) Não temos estes elementos localizados de momento, mas estamos a envidar todos os esforços no sentido da sua localização, nomeadamente junto do empreiteiro. c) Não dispomos destes elementos, pois todos os materiais foram fornecidos pelo empreiteiro, d) Não dispomos destes elementos, e) Não dispomos destes elementos. f) Não dispomos destes elementos. g) de acordo com o que me foi transmitido foi considerada obra puramente de conservação, não sendo considerada plurianual, sendo que essa é uma questão técnico-contabilística sobre a qual não estou apto a dar um esclarecimento cabal. h) Conforme o transmitido em a), os contactos foram sempre estabelecidos através do Sr. C... M... (…) (páginas 64 e 65 do anexo) Concluindo-se então, que a S... desconhece por completo, nomeadamente a identificação de qualquer trabalhador presente em obra, bem como a proveniência dos materiais que afirma terem sido utilizados. Complementarmente, não foram apresentadas provas ou indícios da realização das obras objeto de faturação, acrescendo o facto de a quase totalidade das verbas alegadamente utilizadas para pagamento ao fornecedor, terem comprovadamente sido objeto de transferência via indireta para a esfera patrimonial dos detentores do capital da empresa. PROVA DOCUMENTAL (art° 29° do RCPITA) 2 - Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, consideram-se susceptíveis de revelar a situação tributária dos contribuintes os seguintes elementos: c) Os registos auxiliares da contabilidade; e) Outra documentação interna ou externa relativa às operações económicas e financeiras efectuadas com clientes, fornecedores, instituições de crédito, sociedades e quaisquer outras entidades, incluindo os extractos processados pelas instituições de crédito e sociedades financeiras, os contratos celebrados, os orçamentos sobre trabalhos realizados ou encomendados a terceiros, os estudos realizados ou encomendados a terceiros e as tabelas de preços estabelecidos; FORMALIDADES DAS FATURAS Dispõem os artigos 36° do CIVA e 23° n° 4 do CIRC, sobre regras específicas da faturação das operações comerciais. Como referido no projeto de relatório enviada ao sujeito passivo essas regras não foram respeitadas no presente caso. Mais se poderá dizer que as normas em questão, na sua generalidade têm normalmente fundamento na sua necessidade. No presente caso, ao não serem discriminados os serviços e os materiais utilizados, encontram-se prejudicada a função de controlo que incumbe aos serviços inspetivos da Autoridade Tributária. Deste modo não foi possível legitimar, quer as respetivas deduções de IVA, quer as deduções de gastos para efeitos de IRC, ao abrigo dos preceitos legais acima referidos. Por outro lado, tendo sido possível reconstituir os circuitos financeiros inerentes às alegadas operações, nomeadamente a transferência dos valores que se encontravam na empresa provenientes de acumulação de resultados, para a esfera patrimonial dos detentores do capital, não pela via normal de distribuição de lucros, operação sujeita a tributação em IRS, com retenção na fonte; nos termos dos artigos 6° n° 4; 5º n° 2, al. h) e 71°, n° 1 al. h) do CIRS, resultaram reforçados os indícios de que a faturação em causa não teve por base operações reais, realizadas pela empresa titular das faturas. (…)” (cfr. Relatório de Inspecção, que é doc. 005074031 e ss. do SITAF);
- A alínea e) do probatório passa a ter o seguinte teor: “e) Na sequência da inspecção que antecede, a impugnante foi alvo de liquidações de juros de mora, que seguidamente se identificam:
“(texto integral no original; imagem)” (cfr. artigo 5.º da PI e 1.º da contestação e documentos de fls. 1223, 1224, 1226, 1228, 1231 e 1234 do SITAF);
- Adita-se uma alínea e) 1. com o seguinte facto: “e)1. – Na sequência da inspecção que antecede, a Impugnante foi alvo de liquidações de juros compensatórios, que seguidamente se identificam:
“(texto integral no original; imagem)” (fls. 1222, 1225, 1227, 1229, 1230, 1232, 1233 e 1235 do SITAF); - aditam-se, ainda, os seguintes factos: f) Através do ofício n.º 016837, de 11-04-2016, a AT notificou a Impugnante para prestar os seguintes esclarecimentos: “(…) Fica essa empresa notificada (ao abrigo do artigo 29º do RCPIT), para no prazo de 10 dias enviar a estes Serviços de Inspeção, os seguintes elementos relativos ao exercício de 2013 do S.P. T... - SOC. REP. ASSIST. TÉCNICA, LDA. NIF: 510 039 502: a) Fotocópias da conta corrente, das faturas e dos meios de pagamento utilizados com o referido fornecedor; b) Provas documentais - Contratos de Prest. Serviços, autos de medição, identificação do pessoal em obra, bem como quaisquer outros elementos que provem inequivocamente a realização das obras/trabalhos pelo fornecedor antes referido; c) No caso dos trabalhadores não pertencerem ao quadro de pessoal daquela empresa, queira identificar o sub-empreiteiro a quem a T..., LDA., recorreu para prestar os serviços contratados. d) Deve ainda indicar/identificar a pessoa (da parte do fornecedor) que entregava a faturação em causa. (…)” (fls. 7 do doc. 005074058 do SITAF);
g) Na sequência da notificação que antecede a Impugnante apresentou, em 20-04-2026, a seguinte resposta: “Em resposta à v/ carta registada - RD 3091 7488 5 PT, do dia 11/04/2016, relativa ao processo ng 01201600738- 2013, a S... - Representações e Prestações de Serviços S.A., informa o seguinte relativamente à: a) Em anexo enviamos fotocópias da conta corrente, faturas e meios de pagamentos utilizados b) Não existem, porque a adjudicação foi pessoal c) Quanto aos trabalhadores, não foi feito o controle do pessoal, por nós. d) A pessoa que entregava a facturação era o Sr. C... M... (…)” (fls. 1 e ss. do doc. 005074059 do SITAF);
h) A AT, no âmbito da inspecção a que se referem as alíneas anteriores, notificou a Impugnante para prestar os seguintes esclarecimentos: “a) Informar de que forma conheceu a firma T... - SOC. REP. ASSIST. TÉCNICA, LDA, bem como se conheceu alguns trabalhos realizados pela mesma previamente à contratação pela S... REPRESENTAÇÕES E PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS SA; b) Provas documentais - contratos de empreitada, autos de medição, seguros de pessoal em obra, bem como quaisquer outros elementos que provem inequivocamente a realização das obras efetuadas pelo fornecedor T... - SOC. REP. ASSIST. TÉCNICA, LDA, NIPC: 510...; c) Informar tão pormenorizadamente quanto possível, relativamente aos materiais utilizados, nas obras, suas denominações e quantidades, bem como a sua proveniência e/ou respetivo fornecedor. d) Apresentar relativamente aos mesmos materiais, guias de transporte, guias de remessa, que se encontrem na sua posse, bem como quaisquer outros elementos que provem inequivocamente a compra e utilização dos mesmos; e) identificação dos trabalhadores daquelas empresas, que executaram os serviços nas vossas obras, nos exercícios acima indicados, discriminando o n° de dias de trabalho, ano e obra; f) No caso de os trabalhadores não pertencerem ao quadro de pessoal daquele fornecedor, queira identificar o subempreiteiro a quem o mesmo recorreu para prestar os serviços contratados; g) Deve ainda informar, relativamente às obras faturadas pela T... LDA, porque motivo o seu custo foi considerado gasto do exercício, em vez de ter sido repartido pelos exercícios seguintes de acordo com a utilidade esperada das partes substituídas. h) Deve ainda indicar a identificação da(s) pessoa(s) que representava(m) a(s) referida(s) empresa(s) fornecedora(s). (…)” (docs. 005074107 e 005074112 do SITAF);
i) A Impugnante, na sequência da notificação que antecede, apresentou, em 07-12-2017, à AT a seguinte resposta: “No âmbito da notificação em referência para efeitos de controlo tributário à nossa empresa informo o seguinte sobre as questões colocadas: Q. a) Conheci a firma T... através do seu sócio Sr. C... M..., pessoa que conheço desde os anos 80, por via das funções por ele desempenhadas em várias empresas com as quais mantive relações profissionais, sendo que mantivemos sempre um contacto próximo mas estritamente profissional. Mais esclareço que o Sr. C... M... não é meu familiar nem tem relações familiares com qualquer dos sócios e/ou administradores desta empresa. Q. b) Não temos estes elementos localizados de momento, mas estamos a envidar todos os esforços no sentido da sua localização, nomeadamente junto do empreiteiro. Q. c) Não dispomos destes elementos, pois todos os materiais foram fornecidos pelo empreiteiro. Q. d) Não dispomos destes elementos. Q. e) Não dispomos destes elementos. Q. f) Não dispomos destes elementos. Q. g) de acordo com o que me foi transmitido foi considerada obra puramente de conservação, não sendo considerada plurianual. Sendo que essa é uma questão técnico-contabilística sobre a qual não estou apto a dar um esclarecimento cabal. Q. h) Conforme o transmitido em Q.a), os contactos foram sempre estabelecidos através do Sr. C... M.... (doc. 005074112 do SITAF).
Estabilizada a matéria de facto, vejamos, então. ***** A sentença recorrida julgou a presente impugnação procedente e, consequentemente, anulou as liquidações impugnadas, por concluir ter havido “falta de fundamentação substancial” das correcções efectuadas quanto à desconsideração das facturas emitidas pela sociedade T... e F... M.... Analisado o recurso interposto, verifica-se que o mesmo incide apenas sobre as correcções relativas à sociedade T..., tendo-se a Recorrente conformado com as relativas ao prestador F... M.... Assim, quanto às correcções alvo de recurso, e tendo em conta as conclusões apresentadas, entende a Recorrente que, ao contrário do que ficou decidido na 1.ª instância, a AT reuniu indícios suficientes de que as facturas em causa não titulavam operações reais. Na sentença recorrida, nesta parte, foi decidido o seguinte: “(…) Do supra exposto, é possível concluir que as conclusões da ATA assentam em elementos reunidos em acção de inspecção efectuadas a terceiros, em concreto à T... e às sociedades que alegadamente forneciam aquela, nomeadamente as sociedades B..., Lda, C ..., Uinpessoal, Lda, T ... Sociedade de Representações, Lda e T ...irep, Lda, assim como a elementos reunidos em acção de inspecção realizada à impugnante, resumindo a FP na contestação, os seguintes fundamentos: - Ausência de estrutura operacional relevante da T... e seus alegados fornecedores; - Desproporção dos custos de manutenção do edifício facturados pela T..., empresa não especializada, perante os custos de construção facturados por uma empresa especializada; - Inexistência de qualquer contrato de manutenção com a T..., o que contrasta com a existência de contrato de construção com a empresa especializada; -Existência de custos de manutenção do edifício facturado por outros fornecedores considerados mais adequados às necessidades do edifício; - Parte dos fluxos financeiros relativos ao pagamento das facturas emitidas pela T... foram entregues por aquela aos administradores e accionistas da impugnante. Perscrutando a fundamentação supra a que a ATA lançou mão, salta à vista que aquela é fundada, tal como invocado pela impugnante, em asserções subjectivas, conclusões e induções, sendo que não é possível através do relatório de inspecção alcançar como chegou a ATA a tais conclusões. Veja-se a ATA afirma que há ausência de estrutura operacional relevante da T... e seus alegados fornecedores, mas nada refere sobre o que considera ser uma estrutura relevante, nada referindo quanto ao número de trabalhadores de cada uma das entidades aqui em causa ou sequer como investigou os dados relativos àquelas sociedades para conhecer a efectiva estrutura operacional: Foi à sede das inspeccionadas? Consultou os elementos que se encontram na ATA? Consultou os elementos da Segurança social? Notificou para ouvir os responsáveis daquelas ou os respectivos TOCs? Não sabemos, mas se o fez não plasmou no relatório de inspecção. Adicionalmente a ATA conclui nos termos já elencados por considerar que há uma desproporção dos custos de manutenção do edifício facturados pela T..., empresa não especializada, perante os custos de construção facturados por uma empresa especializada, uns anos antes, mas o juízo de desproporção não é preenchido, não sendo possível alcançar em que medida aquela desproporção é relevante, não ponderando se é devida ao aumentos dos preços, ou à inexistência de alterações substanciais no imóvel construído. De todo o modo a desproporção não é qualificada nem caracterizada pela ATA e não passa de um juízo subjectivo da ATA. De seguida, a ATA considera que os custos de manutenção do edifício foram igualmente facturados por outros fornecedores, e reconhece a estes uma adequação para a prestação de tais serviços, que relaciona às necessidades do edifício, mas que não exterioriza, não referindo também por que conjunto de razões considera certos fornecedores mais adequado que a T... para execução das obras, nada referindo quanto à existência de contrato com estas entidades, sendo certo que também considera a falta de contrato com a T... como indício de falsidade dos serviços prestados, e nada referindo para demonstrar esse mesmo juízo de adequação, qual a estrutura operacional das demais entidades que facturaram serviços de manutenção do edifício; Na verdade, o único indício com relevo que a ATA coligiu é relativo aos fluxos financeiros relativos ao pagamento das facturas emitidas pela T... foram entregues por aquela aos administradores e accionistas da impugnante, mas sem que melhor se caracterizem esses pagamentos, e se investigue, ou pelo menos se pondere, se aqueles poderiam ser relativos a qualquer outra realidade, as correcções relativas ao IVA deduzido relativo à as facturas emitidas à T..., têm de ser anuladas. Aqui chegados uma nota para referir que os indícios recolhidos pela ATA não eram de desprezar e deviam ter motivado uma actuação instrutória mais profunda, que evidenciasse as diligências realizadas, para então, se fosse o caso, a ATA concluir nos termos em que se concluiu, o que a ATA não podia era partir para uma actuação ablativa dos direitos do sujeito passivo, ao emitir liquidações adicionais de IVA, sem seguir os elementos encontrados também junto de terceiros, plasmando-os no relatório da aqui impugnante. Em suma, perante os indícios encontrados a ATA podia intuir que as operações materiais não tinham sido realizadas, e seguindo tal intuição devia ter prosseguido a instrução necessária para circunstanciar as suas conclusões, o que não podia era pretender que, sem mais, se tivesse as liquidações por materialmente fundamentadas. (…)” Entendemos nós que a apreciação feita não se pode manter. Como se viu, a decisão recorrida considerou que o ónus da prova quanto aos indícios da falsidade das facturas, a cargo da AT, não teria sido por esta cumprido. O direito à dedução constitui uma das principais características do IVA. O n.º 2 do artigo 1.º da Directiva do IVA (Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro), estabelece que “em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido directamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço”. Os artigos 167.º ao 192.º da Directiva regulam o direito à dedução. Os artigos 19.º a 26.º do CIVA disciplinam o direito à dedução do IVA. O n.º 2 do artigo 19.º do CIVA determina que “só confere direito a dedução o imposto mencionado nos seguintes documentos, em nome e na posse do sujeito passivo: a) Em facturas passadas na forma legal…”. O n.º 3 do mesmo preceito estatui que “não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura.” Neste sentido, as obrigações de facturação, que devem conter os elementos previstos no n.º 5 do artigo 36.º e n.º 2 do artigo 40.º do CIVA, assumem uma função central no CIVA, pois “…para além de fornecer uma série de informações à Administração Fiscal, possibilitando-lhe exercer um controlo mais eficaz, permite ao sujeito passivo exercer o seu direito à dedução”, cf. CLOTILDE CELORICO PALMA, Introdução ao Imposto sobre o Valor Acrescentado, Cadernos IDEFF, 6.ª ed., 2018, p. 272. Quanto à presunção de veracidade da facturação, dispõe o n.º 1 do artigo 75.º da Lei Geral Tributária que: “1 - Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos. 2 - A presunção referida no número anterior não se verifica quando: a) As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo; b) O contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária, salvo quando, nos termos da presente lei, for legítima a recusa da prestação de informações; c) A matéria tributável do sujeito passivo se afastar significativamente para menos, sem razão justificada, dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica previstos na presente lei. (…)” No que concerne à presunção de veracidade das operações materiais que as facturas devem documentar, tem sido entendimento reiterado da jurisprudência que compete à Administração Tributária demonstrar os indícios sólidos da natureza fictícia do documento. Cumprido o respectivo ónus probatório, compete a quem a imputação de falsidade é feita contradizer essa prova, demonstrando que o acordo é verdadeiro ou, pelo menos, alegando factos que abalem os indícios de falsidade em favor da presunção legal de veracidade. Se é certo que a existência de meras irregularidades na contabilidade não é suficiente para ilidir a presunção de veracidade dos documentos contabilísticos, cabe sempre à Impugnante alegar as razões que justificam as irregularidades contabilísticas ou factos que possam verosimilmente pôr em causa os indícios apontados pela Administração Tributária (cf. inter alia, Acórdãos TCA Sul, de 17-10-2019, proc. n.º 954/09.1BEALM; TCA Norte, 30.04.2019, proc. n.º 03271/06.5BEPRT; TCA Norte, 04-04-2019, proc. n.º 01406/07.0BEBRG; TCA Norte, 08.02.2018, proc. n.º 01981/08.1BEPRT; TCA Sul, de 26-06-2014, proc. n.º 07148/13; TCA Sul, 26.04.2014, proc. n.º 07141/13). Conforme sintetizado no acórdão do STA, de 27-02-2019, proc. n.º 01424/05.2BEVIS 0292/18: “III - Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar esses custos, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito de deduzir os custos ao lucro tributável) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.” A título de enquadramento, cabe-nos sublinhar que os indícios a apurar têm como ponto nuclear a intenção simulatória ou fraudulenta. Na medida em que a intenção fraudulenta respeita a eventos do foro interno, será a partir de presunções naturais/judiciais, auxiliadas pelas regras de experiência comum e técnicas, que os indícios de falsidade dos documentos serão apurados (artigo 351.º do Código Civil). Por outro lado, não é obrigatória a prova directa da causa simulandi (cf. acórdão TCA Norte, de 25-01-2018, proc. n.º 02318/06.0BEPRT). Os indícios de simulação, por corresponderem a eventos de foro interno, são revelados externamente através de outros elementos indiciários que apontam para a causa simulandi ou fraudulenta do documento. Para esse efeito, há que percorrer analiticamente os indícios aportados pela AT. Reunidos os indícios, a sua a força probatória será tanto maior quanto mais confluírem no mesmo sentido. Tendo presente este contexto, desçamos aos autos. De acordo com o relatório de inspecção (cfr. Alíneas b) a c)1.), a AT detectou que a Recorrida declarou aquisições de serviços ao fornecedor T..., nos anos de 2011 a 2015, no montante de € 823.000,00, não sendo conhecida estrutura operacional a este operador para produzir/prestar tais serviços. Esta empresa foi, também ela, objecto de procedimento inspectivo, no âmbito do qual foi verificado que os serviços em causa tinham sido formalmente fornecidos por quatro empresas, “que estão em situação de incumprimento fiscal estrutural; não dispõem de qualquer estrutura operacional conhecida; os gerentes formais são pessoas de diversas nacionalidades que não foi possível localizar; nos locais indicados como sede não foi possível contactar ninguém que tivesse alguma ligação com eles; a relação destes fornecedores da T... com esta, foi-se sucedendo no tempo em consequência da respectiva cessação oficiosa ou da existência de procedimento inspetivo; as faturas por eles emitidas não foram processadas por programa certificado e, em geral, não respeitam na integra, quer o disposto no artigo 36° do CIVA (nomeadamente a insuficiência de informação que permita o controlo e/ou verificação, quantificação e/ou valorização da obra efetivamente realizada), quer o disposto nos n°s 3 e 4 do art° 23° do CIRC; a T..., formalmente, pagou-lhes sempre a dinheiro.” A AT refere que “o descritivo das referidas faturas da T... para a S..., é genérico e, por isso, não respeitam o estipulado no artigo 36° do CIVA, n° 5, al. b) nem no art° 23°, n° 4, al. c) do CIRC”. Seguidamente, a AT verificou quais tinham sido os custos de construção do Centro de Inspecções, em 2002 e 2003, de € 582.986,35, e comparou-os com os gastos de manutenção, entre 2011 e 2015, de € 974.580,68, dos quais € 823.000,00 adquiridos à T.... Por isso, foi analisar o descritivo das facturas dos outros prestadores de serviços, concluindo tratar-se de “normais despesas de conservação e manutenção das instalações”. A análise feita levou a AT a ter dúvidas sobre as aquisições de serviços à T... “considerando que: - Por um lado nem a T... nem os seus alegados fornecedores dispunham de capacidade operacional para prestar aqueles serviços. - Por outro lado, não existem factos que justifiquem por que razão os gastos de manutenção do centro de inspeções, construído em 2002/3, apenas dez anos depois, sejam muito superiores ao respetivo custo de construção. -Sendo certo que ao longo destes anos, são faturadas despesas de remodelação e manutenção do edifício, de valores reduzidos, mas que se revelam adequados à idade e situação do prédio, contrariamente aos valores faturados pela entidade T... LDA” Ora, ao contrário do entendimento da Recorrida, a apreciação e as dúvidas levantadas pela AT são perfeitamente plausíveis de acordo com os critérios e regras da experiência comum. Com efeito, embora possa haver uma justificação concreta, não é razoável que instalações contruídas de novo, passados cerca de 10 anos, necessitem de obras da envergadura (mais de uma vez e meia do valor) das que estão em causa nas prestações de serviços da sociedade T..., para mais, quando consta da contabilidade o fornecimento de serviços da mesma natureza por outros prestadores, embora de valores muito inferiores. E, por isso mesmo, a AT notificou, pelo menos, por duas vezes, a Recorrida para vir prestar esclarecimentos, nomeadamente, para juntar provas documentais, tais como contratos de empreitada, autos de medição, seguros de pessoal em obra, materiais utilizados nas obras, suas denominações e quantidades, bem como quaisquer outros elementos que provassem inequivocamente a realização das obras. Para além das facturas e documentos de pagamento, a Recorrida nada juntou ou esclareceu – cfr. alíneas, agora aditadas ao probatório, f) a i). Como, de resto, não o fez nesta impugnação, nunca tendo explicado concretamente o que realmente tinha sido feito por aquela empresa. Na verdade, analisada a p.i., apenas nos artigos 55º a 58º, 176º e 177º é referido o tema das instalações e das obras, mas de forma genérica, abstracta e conclusiva. Embora não valendo por si só, entende, por isso, o Tribunal tratar-se de um indicador importante da existência de dúvida sobre a veracidade dos serviços constantes das facturas. Por outro lado, a decisão recorrida labora em erro quando pega no resumo dos indícios feito pela RFP na sua contestação e os analisa como se fossem a fundamentação constante do relatório, sendo que é nesta que assentam as correcções feitas às liquidações. E nela não é qualificada a estrutura operacional da T... – ali é referido, simplesmente, tal como a Recorrente defende, que não é conhecida estrutura operacional, nem a esta empresa nem aos seus fornecedores. Ora esta asserção não se pode considerar subjectiva. De notar, também, que consta, claramente, do relatório, quanto aos fornecedores da T..., entre outras situações, que, nos locais indicados como sendo as suas sedes, os mesmos não eram conhecidos, nem tinha sido possível localizar os responsáveis legais dessas empresas, pessoas de diversas nacionalidades. Ou seja, está implícito que os serviços de inspecção se deslocaram aos locais em causa e tentaram chegar à fala com os responsáveis legais, não tendo logrado consegui-lo. Acresce que, para o que importa – conhecimento dos indícios de facturação falsa – saber como é que a AT verificou essa falta de estrutura das empresas ou que diligências fez para tentar contactar com os responsáveis legais não é condição para que a Recorrida se possa defender de tais constatações. Finalmente, como já acima se deixou dito, ao contrário do que ficou plasmado na decisão recorrida, a AT notificou a Impugnante para prestar esclarecimentos sobre os serviços a que se referiam as facturas, bem como para identificar os prestadores, entre outras situações, não tendo tais esclarecimentos sido prestados. Ou seja, trata-se, também ele, de um indício que conflui para a tese da falsidade das facturas. Além das diligências que antecedem, a AT procedeu à análise dos movimentos financeiros que estavam associados aos serviços em causa, tendo verificado que “terminaram em posse dos responsáveis da Recorrida, ou seus familiares, os seguintes valores que a empresa inicialmente havia transferido para o alegado fornecedor T... LDA.”: em 2013, dos € 301.350,00 transferidos, foram devolvidos € 245.000,00; em 2014, dos € 271.215,00 transferidos, foram devolvidos € 217.833,00; em 2015, dos € 184.500,00 transferidos, foram devolvidos € 75.000,00. O facto de a maior parte dos pagamentos relativos a estas facturas ter retornado para a esfera dos responsáveis legais da Recorrida e seus familiares não foi explicado por ela, sendo certo que, tendo sido notificada do projecto de relatório de inspecção onde consta este fundamento, nada veio dizer. E, quanto a este fundamento, a sentença recorrida refere que “Na verdade, o único indício com relevo que a ATA coligiu é relativo aos fluxos financeiros relativos ao pagamento das facturas emitidas pela T... foram entregues por aquela aos administradores e accionistas da impugnante, mas sem que melhor se caracterizem esses pagamentos, e se investigue, ou pelo menos se pondere, se aqueles poderiam ser relativos a qualquer outra realidade, as correcções relativas ao IVA deduzido relativo à as facturas emitidas à T..., têm de ser anuladas”. A Recorrente, quanto a este fundamento defende – diga-se, com razão – que não se vislumbra que diligências deveria a AT ter feito. Na verdade, nunca competiria à AT “ponderar se os pagamentos se referiam a qualquer outra realidade”, sendo vazia de conteúdo a frase de que tais pagamentos “melhor deviam ser caracterizados”. Quanto a este indício, a Recorrida refere que os valores não coincidem, mas não alega qualquer facto concreto, susceptível de explicar, refutar ou colocar em dúvida o verificado pela AT. O indício do movimento bancário “assume frequentemente um papel decisivo para a prova da simulação. (…) O normal é que o pagamento e movimento de dinheiro deixe um rasto documental e bancário, sendo fácil ao titular de uma conta bancária fazer prova dos movimentos da mesma. Esta prova pode ser dificultada pela pré-constituição de contas e transferência de quantias entre sucessivas contas, o que exige um trabalho acrescido na descoberta do rasto do dinheiro para descobrir se, afinal, o pretenso comprador não depositou o dinheiro com uma mão e o retirou com outra”, cf. Luís Filipe Pires de Sousa, Prova por Presunção no Direito Civil, pp. 237. Pergunta-se: por que motivo as quantias pagas regressaram à esfera dos representantes legais da Recorrida e seus familiares? Quanto a este indício, a Recorrida apenas mantém que os pagamentos estão demonstrados e que os valores que retornaram não são coincidentes, imputando à AT a não fundamentação da suspeita. Ora, o que a Recorrida alega é precisamente o que carece de demonstração e explicação. Os serviços, titulados nas facturas, estão formalmente corroborados nas transferências bancárias e pagamentos. Mas, segundo os indícios apurados pela AT, os movimentos bancários tiveram como propósito camuflar o que as facturas falsamente documentam, já que a maior parte dos valores retornaram aos responsáveis legais e familiares da Recorrida, sendo que o facto de os valores não coincidirem não é determinante, pois não se espera que as operações em análise sejam gratuitas para os que nela participaram. Na medida em que as movimentações bancárias constituem um modus operandi conhecido nos negócios simulados, com o fito de os comprovar, as movimentações aqui em apreço propendem para a ilisão da presunção de veracidade e da realidade subjacente a tais operações bancárias e, consequentemente, da materialidade titulada nas facturas, na medida em que a Recorrente não invocou qualquer facto concreto susceptível de abalar o indício. Sopesando todos os indícios relevados pela AT, resta concluir que tem razão a Recorrente, sendo que o conjunto de factos, anomalias e incongruências aportados são susceptíveis de contrariar as facturas através das quais a Recorrida deduziu o IVA. As razões invocadas pela AT sustentam-se em indícios objectivos, congruentes, contextualizados, em alguns casos particularmente robustos, e com evidência documental, escoradas em máximas de experiência e em inferências objectivas que permitem ilidir a presunção de veracidade prevista no artigo 75.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária. Conforme é referido pelo acórdão TCA Sul, de 04-02-2016, proc. n.º 09125/15, disponível em www.dgsi.pt, “se a operação ou o preço são simulados não é admitido o direito à dedução do I.V.A. respectivo a fim de se não obter a dedução de um imposto que não foi suportado pelo sujeito passivo. Mais se dirá que o utilizador da factura falsa que pagou o I.V.A. ao respectivo emitente não tem direito a deduzi-lo nos termos do preceito em exame, devendo interpretar-se a expressão “operação simulada” como querendo referir-se a qualquer operação total ou parcialmente inexistente.” Ilidida a presunção de veracidade, caberia à Recorrida abalar as evidências apresentadas pela AT, o que não logrou fazer. Não indicou quaisquer factos concretos que colocassem em dúvida os indícios apurados, no sentido de justificar um eventual erro nos pressupostos de facto ou de direito do RIT. A sentença que assim não concluiu não pode, por isso manter-se, devendo ser revogada, já que não há, como se viu, falta de fundamentação substancial das liquidações. Aqui chegados, em virtude do provimento do recurso e de acordo com o artigo 665.º, do C. P. Civil, aplica-se no processo vertente a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, nos termos da qual os poderes de cognição deste TCA incluem todas as questões que ao Tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, tudo ao abrigo do princípio da economia processual. E por isso, tendo ficado prejudicado o conhecimento, pelo tribunal recorrido, dos restantes vícios invocados, tem este Tribunal de o fazer, acrescentando-se que, desta intenção, foram as partes devidamente notificadas. Antes, porém, refira-se que, não tendo a RFP recorrido da decisão quanto às correcções efectuadas pela AT relativas a F... M..., nesta parte a decisão transitou em julgado. Assim, os vícios invocados e que não foram conhecidos são a falta de fundamentação formal das liquidações de imposto e dos juros compensatórios, bem como a falta de imputabilidade do retardamento nas liquidações, como prevê o artigo 35.º n.º 1 da LGT. Vejamos, pois, começando pela invocada falta de fundamentação formal das liquidações de imposto. Defende a Impugnante que o relatório de inspecção sofre do citado vício, “não sendo possível determinar que actos foram praticados no âmbito do procedimento, para no fundo alcançar as conclusões que retira o relatório de inspecção”, que “Não é possível o conhecimento preciso, de facto e de direito, que nunca se verifica, em descrito algum, referências a que actos recorreu a inspecção tributária para verificar da efectiva inexistência de contraprestação pelos serviços prestados” e que desconhece os actos que precisariam de esclarecimento adicional. Ora, do que acima se foi deixando dito quanto à fundamentação substancial do dito relatório, desde já se adianta que não tem razão a Impugnante ora Recorrida. Os requisitos da fundamentação encontram-se exaustivamente desenvolvidos pela doutrina e jurisprudência, a qual alerta para a necessidade de distinguir a fundamentação formal da fundamentação substancial. Segundo o acórdão do STA, de 20-02-2019, proc. n.º 0775/02.2BTVIS (cf. entre muitos outros, nomeadamente os acórdãos STA, de 14-03 2018, proc. n.º 0512/17; e STA de 08-11-2017, proc. n.º 01255/16, todos disponíveis em www.dgsi.pt), “I - As características exigidas quanto à fundamentação formal do acto tributário, são distintas das exigidas para a chamada fundamentação substancial: à fundamentação formal interessa a enunciação dos motivos que determinaram o autor a proferir a decisão com um concreto conteúdo; à fundamentação material interessa a correspondência dos motivos enunciados com a realidade, bem como a sua suficiência para legitimar a actuação administrativa no caso concreto (ou seja, esta deve exprimir a real verificação dos pressupostos de facto invocados e a correcta interpretação e aplicação das normas indicadas como fundamento jurídico).” A fundamentação deve ser expressa (traduzida na exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão), suficiente (permitindo o conhecimento da justificação e motivação da decisão, em função do tipo de acto a praticar), clara (ou inteligível), congruente (enquanto conclusão lógica das premissas de que parte) e contextual (referente à situação concreta em apreço), no sentido de permitir ao seu destinatário compreender, de forma cognoscível, os motivos da decisão adoptada, ora aceitando-a, ora recorrendo a outras vias de impugnação. Ou seja, para que o acto se encontre formalmente fundamentado é determinante a revelação do itinerário cognoscitivo e valorativo do autor do acto, no sentido de permitir a um destinatário normal, colocado na posição real do destinatário, saber porque se decidiu em determinado sentido e não noutro (Acórdão do STA, 8-10-2009, processo n.º 47.273/02; STA, 21-03-2006, processo n.º 742/03-20; STA, 29.09.2016., proc. n.º 0956/16; STA, de 21-06-2017, proc. n.º 068/17, todos disponíveis em www.dgsi.pt; cf. do mesmo modo, a jurisprudência citada em DIOGO LEITE DE CAMPOS/BENJAMIM SILVA RODRIGUES/JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4.ª ed., 2012, pp.675 e ss.). No caso dos autos, é inegável e não é controvertido – a Impugnante e ora Recorrida sabe bem disso, já que participou no procedimento de inspecção - que as liquidações tiveram por fundamento as conclusões alcançadas nesse procedimento de inspecção tributária, sendo os actos de liquidação o culminar, os actos finais de tal procedimento. As dúvidas levantadas pela Recorrida, de que “desconhece os actos que precisariam de esclarecimentos adicionais”, perante as notificações que lhe foram feitas (pontos f) e h) do probatório) são desprovidas de sentido. Assim como o são a invocação de que “desconhece, e por isso não se pode pronunciar, se foram verificados os serviços prestados e os movimentos financeiros”, já que o relatório refere, expressamente, que esses movimentos financeiros foram consultados, tanto na esfera da T... como na da Recorrida. Quanto aos serviços prestados, a dúvida levantada pela Recorrida era, precisamente, aquela que ela tinha de esclarecer em concreto, sendo que, de acordo com o relatório, não tinha sido possível localizar nenhum dos alegados prestadores de serviços à T.... Como acima se deixou explanado, se não se verificou a invocada falta de fundamentação substancial das liquidações, muito menos haveria a sua falta de fundamentação formal, já que, como se concluiu, os indícios de facturação falsa invocados pela AT foram suficientes para a inversão do ónus da prova. Não se divisa, por isso, qualquer obscuridade ou insuficiência na fundamentação do RIT. Da sua mera leitura é bem perceptível, estando explicadas de forma expressa, clara e congruente, as razões de facto que determinaram as correcções propostas. Consta também deste, como se referiu, a respectiva fundamentação/razões de direito, mediante a referência expressa, entre outros, ao artigo 19.º n.º 3 do CIVA, que é o regime legal aplicável. Conclui-se, assim, que um destinatário normal consegue conhecer o percurso cognoscitivo e valorativo que esteve subjacente às correcções em causa, bem como apreender o quadro fáctico-jurídico que as determinou. Improcede, por isso, a alegada falta de fundamentação dos actos de liquidação de imposto. Quanto aos juros compensatórios, a Recorrida invocou a falta de fundamentação das respectivas liquidações, bem como a não imputabilidade no atraso nas liquidações de imposto. Como já foi decidido pela jurisprudência dos tribunais superiores (cfr. Acórdão do Pleno do Contencioso Tributário do STA, proc. n.º 0632/14, de 21-01-2015), a responsabilidade por juros compensatórios tem a natureza de uma reparação civil e, por isso, depende do nexo de causalidade adequada entre o atraso na liquidação e a actuação do contribuinte, bem como da possibilidade de formular um juízo de censura à sua actuação (a título de dolo ou negligência). A factualidade em que há-de radicar o juízo de culpa, não pode ser outra que não aquela que subjaz ao apuramento de imposto entendido em falta, na exacta medida em que se integra neste, nos termos do n.° 8, do art. 35.º da LGT (cfr. Ac. do TCA Sul, proc. n.º 02020/07, de 11-11-2008). Ora, tratando-se de um caso de dedução indevida de IVA mencionado em facturas que não terão correspondido a serviços reais, não se vê como não considerar que a actuação da Recorrida, censurável nessa exacta medida, foi determinante e causa necessária do resultado da não liquidação, no momento correcto, do IVA correspondente ao que seria devido caso não tivesse havido tal dedução. Não se trata, como defende a FP na contestação, de um caso de diferentes leituras da mesma questão ou de posições ou interpretações divergentes mas defensáveis entre a AT e o contribuinte quanto ao enquadramento ou qualificação de determinada situação tributária (como, por exemplo, a nível de custos fiscais) ou de erro desculpável do contribuinte, casos em que se admitiria a não formulação de um juízo de censura à sua actuação, mas de uma conduta predeterminada e consciente quanto à obtenção do resultado fiscal falseado pretendido, sendo que tal conduta até configura uma conduta criminosa, tal como resulta do processo de inquérito na origem da consideração dos presentes autos como prioritários. Assim sendo, a impugnação tem de improceder, também, quanto ao fundamento da não verificação do requisito para a liquidação de juros compensatórios da imputabilidade no atraso na liquidação do imposto. Finalmente, quanto à falta de fundamentação formal das liquidações dos juros compensatórios, tem, também, tomado posição sobre a questão, abundante e reiteradamente, a jurisprudência dos tribunais superiores, com a qual este Tribunal concorda inteiramente, de que é exemplo o Acórdão do STA, de 30-11-2011, proc. n.º 0619/11, que aqui se transcreve nas partes mais impressivas: “(…) Como é sabido, as exigências de fundamentação variam conforme as circunstâncias concretas, designadamente o tipo de acto, a não participação do interessado no procedimento anterior ao acto ou, no caso da participação, a extensão desta. No que respeita aos juros compensatórios, admitimos que as exigências de fundamentação sejam reduzidas ao mínimo. Eventualmente, ainda que com algumas reservas, admitimos que nem sequer se exija a referência à norma legal ao abrigo do qual os juros foram liquidados, pois é do conhecimento geral que se o atraso na liquidação do imposto devido for imputável ao contribuinte há lugar à liquidação de juros compensatórios. (…) No entanto, há ainda uma declaração mínima que se nos afigura indispensável para que se cumpram as exigências legais de fundamentação que visam, afinal, que o contribuinte possa optar conscientemente entre o conformar-se com o acto, aceitando a sua legalidade, ou contra ele reagir administrativa ou contenciosamente. Nesse conteúdo mínimo da declaração fundamentadora deverá conter-se a referência ao montante de imposto sobre o qual foram liquidados os juros compensatórios, à taxa ou taxas aplicáveis e ao período de tempo em que tais juros são exigíveis (Neste sentido, o acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 11 de Fevereiro de 2009, proferido no processo com o n.º 1002/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Abril de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2009/32210.pdf), págs. 241 a 244, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/afda64de2d8db9438025755f0041b823?OpenDocument.). Só perante esses elementos o contribuinte poderá verificar se a liquidação foi ou não efectuada de acordo com a lei e o tribunal, se tal lhe for solicitado, poderá desempenhar a sua tarefa de sindicância dessa legalidade. (…)” Em suma, como também refere o STA no seu Acórdão de 29-02-2012, proc. n.º 0928/11, “A fundamentação de uma liquidação de juros compensatórios deve dar a conhecer, no plano factual, o montante do imposto sobre o qual incidem os juros, a taxa ou taxas aplicáveis e o período da sua contagem.”. Tendo em conta as exigências mínimas de fundamentação explanadas nos acórdãos citados, e regressando ao caso do autos, verifica-se que das liquidações de juros compensatórios (e também das liquidações de juros de mora), consta a seguinte fundamentação: “Juros calculados nos termos do art. 96º do CIVA e dos art. 35º e/ou 40º da Lei Geral Tributária, por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto ou por se ter verificado atraso ou insuficiência do pagamento, por facto imputável ao contribuinte. A sua contagem teve em conta a data em que foram enviados os pagamentos e ou, na sua falta ou insuficiência, a data de disponibilização de outros créditos.”. De tais liquidações consta ainda a indicação do valor base sobre que incide, o período de cálculo, a taxa e o respectivo valor (factos provados e) e e)1.). Há, assim, nas liquidações em análise a indicação dos elementos referidos: há a indicação do montante do imposto sobre o qual foram liquidados os juros compensatórios; há a referência à taxa aplicada na liquidação dos juros; há a menção das datas que foram consideradas como sendo as do início e do termo do prazo de contagem desses juros, para além da menção acima transcrita com as normas legais e a indicação do retardamento da liquidação por facto imputável ao contribuinte. Nestes termos, e sem necessidade de considerações adicionais, não sofrem as liquidações de juros de falta de fundamentação, pelo que a impugnação com este fundamento tem, também, que improceder. ***** III. DECISÃO Face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul, em: a) Conceder provimento ao recurso; b) revogar parcialmente a sentença recorrida, na parte objecto de recurso, relativa aos serviços prestados pela sociedade T...; c) Em substituição, nessa mesma parte, julgar improcedente a impugnação.
Custas pela recorrida por ter contra-alegado.
Lisboa, 27 de Junho de 2024 -------------------------------- [Teresa Costa Alemão] ------------------------------- [Rui Ferreira] -------------------------------- [Ana Cristina Carvalho] |