Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:9729/16.0BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:06/30/2022
Relator:VITAL LOPES
Descritores:EXECUÇÃO DE SENTENÇA
JUROS INDEMNIZATÓRIOS
JUROS DE MORA
CUMULAÇÃO
QUESTÕES NOVAS
Sumário:I - Na redacção dada pelo art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de Novembro, dispõe o n.º 8 do art.º 22.ºdo Código do IVA: «Os reembolsos de imposto, quando devidos, serão efectuados pela Direcção-Geral dos Impostos até ao fim do 3.º mês seguinte ao da apresentação do pedido, findo o qual poderão os sujeitos passivos solicitar a liquidação de juros indemnizatórios nos termos do art.º 43.º da lei geral tributária».
II - O acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, do Supremo Tribunal Administrativo de 7 de Junho de 2017, proferido no processo com o nº.279/17, uniformizou jurisprudência no sentido de que "face ao preceituado no n.º 5 do art. 43.º da LGT, na redacção dada pela Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro, é admissível a atribuição cumulativa de juros indemnizatórios e de juros moratórios, calculados nos termos deste preceito legal, sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo".
III - Porém, se os juros de mora peticionados recaem unicamente sobre o montante de juros indemnizatórios que não foram pagos à exequente com as quantias objecto do pedido de reembolso de IVA, não se verifica o pressuposto da cumulação de juros (indemnizatórios e de mora) sobre a mesma quantia.
IV - Os recursos visam o reexame, por parte do tribunal superior, de questões precedentemente resolvidas pelo tribunal a quo e não a pronúncia do tribunal ad quem sobre questões novas, salvo de conhecimento oficioso.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL
1 – RELATÓRIO

Da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa proferida em 15 de Setembro de 2014, nos autos de Execução de Sentença n.º 270/04-A, constante de fls. 110 a 126, rectificada e reformada por despacho de 27/04/2016, constante de fls.220/221, recorrem:
1. A Exequente, Fundação C..., aqui identificada como 1.ª Recorrente;
2. A Executada, Autoridade Tributária e Aduaneira, aqui identificada como 2.ª Recorrente, que interpôs recurso subordinado.

A 1.ª Recorrente, apresentou alegações, que culmina com as seguintes e doutas conclusões:
«
A) Deve ser incluído no quadro da alínea B) da matéria de facto assente o pedido de reembolso de imposto, no montante de € 23 083,78, identificado no quadro da alínea A) com a data de 30/11/94.
B) Na alínea i) da decisão, a sentença não indicou o termo final de contagem dos juros indemnizatórios que incidem sobre a quantia do reembolso pedido na declaração periódica de Junho de 1994 e não efectuado, no montante de € 37 767,53, devendo dessa alínea passar a constar que os juros indemnizatórios devem ser calculados até ao dia em que for efectuado o reembolso do imposto.
C) Dado que a Executada pagou, depois de instaurada a execução, cerca de 80% da quantia exequenda, as custas a cargo da Exequente, de acordo com o julgamento da sentença sobre a proporção em que as duas partes decaíram, devem ser fixadas em 10% do seu valor total, por força do disposto nos arts. 527º, nº 1 e 2 e 536º, nº 4 do CPC.
D) Os elementos que a sentença diz estarem previstos no Despacho Normativo n^ 342/93 e terem sido apresentados pelo Exequente nas datas indicadas na alínea B) da matéria de facto assente - elementos que são as cartas do serviço de Contabilidade da Exequente juntas aos autos pela Executada e que se encontram a fls. 78 a 82 - não estão previstos naquele diploma, que não faz referência alguma a cartas da natureza das atrás referidas ou a documentos semelhantes.
E) Tais cartas são irrelevantes para determinação da data a partir da qual devem ser contados os juros indemnizatórios a que a Exequente tem direito, data que, de harmonia com o disposto no art. 22º, nº 8 do CIVA (na redacção em vigor à data dos factos em causa), é a do último dia do terceiro mês seguinte à apresentação dos pedidos de reembolso do imposto, devendo os juros ser calculados às taxas legais em vigor nos períodos a que respeitam.
F) Os juros moratórios peticionados pela Exequente não respeitam ao mesmo período temporal dos juros indemnizatórios, nem têm por finalidade ressarcir os mesmos prejuízos, além do que não são verificam no caso impedimentos legais ao pedido de juros sobre juros.
G) O direito da exequente a ser indemnizada pela mora no pagamento dos juros indemnizatórios tem fundamento no princípio fundamental do Estado de Direito que assegura aos cidadãos o direito a serem indemnizados dos prejuízos resultantes de actos ou procedimentos ilícitos da Administração Pública, direito expressamente consagrado no art. 22º da Constituição da República.
NESTES TERMOS, e nos mais que Vossas Excelências doutamente suprirem, deve a sentença:
a) Ser rectificada e a decisão sobre custas ser reformada;
b) Ser revogada no que respeita à data a partir da qual devem ser contados os juros indemnizatórios e quanto ao direito da Exequente a juros moratórios, cujo pedido deve ser julgado procedente.».

A Recorrida ATA apresentou contra-alegações, que culmina com as seguintes e doutas conclusões:
«
A) A douta sentença ora recorrida ao ter decidido que o cálculo dos juros indemnizatórios eram devidos desde o fim do terceiro mês após a data da entrega dos elementos a que alude o Despacho Normativo 342/93, que não eram devidos, no caso, quaisquer juros de mora, bem como, ao ter determinado que as custas ficam a cargo da AT e da exequente, na proporção do decaimento, fixada em Vi para cada, fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos, pelo que, deve ser mantida.
B) Antes de mais e quanto ao pedido de rectificação da sentença, a fls..., o mesmo improcede uma vez que não há qualquer erro de escrita ou de cálculo, qualquer inexactidão devida a omissão ou lapso manifesto, no conteúdo decisório constante da alínea i), pág. 17, da mesma.
C) Igualmente, improcede o pedido de reforma, quanto a custas, formulado pela então exequente e ora recorrente.
D) Efectivamente, a sentença recorrida condenou ambas as partes, e bem, ao pagamento de custas numa proporção de V2 para cada, que também se afigura correcta, atendendo ao disposto nos artigos 527° e 536° do CPC.
E) É que, ambas as partes no processo, exequente e executado ficaram vencidos, em proporções iguais.
F) A exequente e ora recorrente, contrariamente ao que pretende fazer crer no presente recurso jurisdicional, não ganhou a causa quanto ao pedido de atribuição de juros indemnizatórios. E nem houve qualquer inutilidade superveniente da lide face ao pagamento da quantia de €558.323,75 a título de juros indemnizatórios, uma vez que a exequente e ora recorrente continua a contestar que essa mesma quantia corresponda à totalidade dos juros indemnizatórios devidos.
G) Deste modo, se atentarmos em que a ora recorrente decaiu quanto ao modo de contagem de tais juros e quanto ao pedido de pagamento de juros de mora e que a AT só decaiu quanto ao pedido de pagamento da quantia de €37.767,53, então se a proporção de metade não está correcta, só se poderia concluir que a exequente decaiu em mais de metade do pedido, pelo que, se houvesse lugar a uma outra proporção no processo, eia sempre seria maior para a exequente e não o contrário.
H) Quanto ao modo de contagem dos juros indemnizatórios determinado em ii) da sentença ora recorrida, esta decidiu, e bem, que a executada fez prova de que a remessa dos elementos previstos no Despacho Normativo n° 342/93 apenas ocorreu nas datas referidas na alínea B) da matéria de facto.
I) E os documentos que estão juntos ao processo e que foram juntos pela AT e ora recorrida, a fls..., dos autos, referem expressamente que, em conformidade com o Despacho Normativo em referência, que foi identificado como sendo o Despacho Normativo n° 342/93, junto enviamos os movimentos de reembolso de...
J) O que corresponde e faz prova quanto ao cumprimento da obrigação de remessa dos elementos previstos no Despacho Normativo.
L) Donde, a ora recorrente faz uso de uma argumentação completamente infundada no que se refere a esta questão, que não tem um mínimo de correspondência quer nos factos que se encontram provados por virtude dos documentos juntos pela AT aos autos, quer no direito.
M) Assim, atendendo a que o prazo de pagamento dos reembolsos se encontrava determinado no então art. 22° n° 8 do CIVA, conjugado com o n° 8 do Despacho Normativo n° 342/93, de 30/10, como a data de cumprimento do disposto nos n°s 2 e 4 do mesmo despacho, nada há a apontar à sentença, a fls..., quando determina que os juros devem ser pagos desde o fim do terceiro mês após a data da entrega dos elementos a que alude o Despacho Normativo n° 342/93.
N) Quanto aos juros de mora, é evidente que a ora recorrente também não tem qualquer razão, uma vez que a mesma na petição de execução cumulou, efectivamente, o pedido de juros índemnizatórios com o de juros de mora.
O) E, como se decidiu, e bem, na sentença recorrida, acompanhando a jurisprudência uniforme nesta matéria, tais juros não são cumuláveis.
P) Não podem, na verdade, os juros moratórios incidir sobre os juros Índemnizatórios, ainda que estes últimos juros não lhe tenham sido pagos no prazo
legal.
Q) Donde, a sentença recorrida fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos quando decidiu indeferir o pedido de pagamento de juros de mora formulado pela exequente e ora recorrente.
Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exas., improcede o recurso jurisdicional interposto pela recorrente da sentença a fls..., devendo a mesma ser mantida, quanto ao decidido em ii) e iii) da mesma, cálculo dos juros indemnizatórios, quanto ao indeferimento do pedido de pagamento de juros de mora, bem como, quanto à condenação em custas, tudo com as devidas consequências legais.».

A 2.ª Recorrente, Autoridade Tributária e Aduaneira, apresentou recurso subordinado, cujas doutas alegações, conclui assim:
«
A) A fls. 110 a 126 dos autos foi proferida sentença nos presentes autos de execução de julgados, da mesma constando, na matéria de facto dada como provada, ponto III.1, alínea B) um quadro demonstrativo das datas em que a exequente procedeu à junção de documentos nos termos do Despacho Normativo n° 342/93 de 30/10.
B) Ora, no referido quadro na parte designada como: “Data da junção de documentos Despacho Normativo 342/93” consta que, quanto aos pedidos efectuados em
30/12/1993 e em 25/02/1994, a data de junção desses documentos é a data de, 17-02- 97.
C) Contudo, só por lapso manifesto, se fez constar no referido quadro tal data, uma vez que, de fls. 64, para onde se remete, resulta que a data correcta é, não 17-02-1997, mas sim, 17-12-1997.
D) Donde, deve tal lapso ser rectificado.
E) Por outro lado, a fls..., veio a sentença, a fls..., condenar a AT a proceder ao reembolso relativo ao período de 94-06 no valor de €37.767,53.
F) Considerou, para tanto, que em 15/3/07, a AT procedeu à restituição à exequente do pagamento das quantias objecto de pedido de reembolso identificado em A) dos factos dados como provados, no montante de €558.123,08, com excepção do pedido de reembolso referente ao período de Junho de 1994.
G) Ora, se bem que a AT nunca tivesse contestado o facto de que a então exequente havia formulado aquele pedido, circunstâncias supervenientes, das quais só agora teve conhecimento, levam a que a referida condenação da AT ao pagamento da quantia de €37.767,53 não esteja correcta e conforme à lei.
Efectivamente, como decorre do Doc. único que ora se junta, verifica-se que a quantia que a AT foi condenada a pagar à exequente e ora recorrida, após se proceder à análise da conta corrente da mesma, não é de €37 767,53, mas apenas de €7 804,75. Facto este que só se tornou perceptível quando a AT procedeu à realização dos actos materiais necessários à execução da sentença, a fls...
J) Pelo que, uma vez que a sentença a fls..., ao ter condenado a AT ao pagamento de €37.767,53 contém, efectivamente, um erro material quanto à quantia real que falta restituir à ora recorrida requer-se que seja corrigido tal erro e que a mesma seja revogada, nesta parte.
Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Ex.as, deve a sentença, a fls. 115, ser rectificada, por da mesma constar lapso manifesto ao se ter escrito na data da junção dos documentos, relativos aos pedidos de 30/12/1993 e de 25/02/1994 a data de “17-02-1997”, ao invés de “17-12-1997”, devendo a mesma ser também revogada, na parte em que condenou a AT a proceder ao pagamento da quantia de €37.767,53, devendo ser substituída por outra que reduza tal condenação ao montante de €7 804,75.

A Recorrida, Fundação C..., apresentou contra-alegações no recurso subordinado, que remata com as seguintes e doutas conclusões:
«
A) Por força do disposto nos arts. 651 e 425 do Código do Processo Civil, a junção com as alegações do recurso da informação da Direcção de Serviços de Cobrança de IVA, que o Recorrente classifica como documento, é legalmente inadmissível.
B) Por outro lado, a questão suscitada pelo Recorrente nas suas alegações, baseadas exclusivamente nessa informação, é uma questão nova, não submetida à apreciação do tribunal o quo, pelo que, conforme jurisprudência uniforme e há muito firmada, o Tribunal Central não pode dela conhecer.
C) Mesmo que as conclusões anteriores fossem improcedentes - o que se admite por mera cautela e dever de patrocínio - sempre teria de concluir-se que o recurso não merece provimento.
Com efeito,
D) As afirmações falsas, os erros e as contradições da informação citada, reproduzida ipsis verbis nas alegações do Recorrente, retiram-lhe toda a credibilidade, e a conclusão nela formulada não tem o menor fundamento.
E) Condenando a Fazenda Pública a proceder ao reembolso de € 37 767,53, a sentença sob recurso decidiu de acordo com a lei e os factos provados.
NESTES TERMOS, e nos mais que V. Exa doutamente suprirem, deve ser negado provimento do recurso subordinado, como se espera e é de
JUSTIÇA».

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu mui douto parecer concluindo que os recursos não merecerão provimento.

Com dispensa de vistos, dado estarem em causa questões sem complexidade e já tratadas pela jurisprudência deste tribunal, vêm os autos à conferência para decisão.

2. – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que das mesmas resulta serem as seguintes as questões a decidir: No recurso da Exequente: Indagar do direito da exequente ao pagamento cumulativo de juros indemnizatórios e de mora após o final do prazo de execução do julgado e, concretamente, se os juros de mora peticionados recaem sobre a mesma quantia sobre que são pedidos os juros indemnizatórios; No recurso subordinado da executada AT: Se as questões suscitadas no recurso são novas e, nessa medida, inadmissível o seu conhecimento na apelação.

3 – FUNDAMENTAÇÃO

De facto

A decisão recorrida deixou consignado em sede factual:
«
Considera-se assente a seguinte factualidade:
A) No período correspondente a Outubro de 1993 e Agosto de 1997 a exequente solicitou o reembolso de IVA:
    Identificação dos pedidos de reembolsos
Data/pedido
período
Número
valor
30-12-1993
93-10
930537680
    69.751,16
25-02-1994
93-12
930616400
    47.085,74
27-05-1994
94-03
940158010
    38.068,52
94-06
    37.767,53
30-11-1994
94-09
940434380
    23.083,78
27-02-1995
94-12
940534390
    57.501,52
25-05-1995
95-03
950157110
    18.499,54
28-11-1995
95-09
950441960
    59.415,33
26-02-1996
95-12
950530240
    34.764,57
15-05-1996
96-03
960288410
    28.258,54
27-08-1996
96-06
960265840
    29.932,81
17-02-1997
96-12
960518530
    64.227,86
14-08-1997
97-06
970284850
    62.307,60
18-09-1997
97-07
970520580
    16.984,41
10-10-1997
97-08
970562680
    8.241,71

Num total de € 558.123,07 - cf. fls. 81 do vol I do processo principal e fls. 189 do processo apenso n.° 80/2003;

B) A Exequente procedeu à junção de documentos nos termos do Despacho Normativo n.° 342/ 93 de 30/10 nas seguintes datas:
    Identificação dos pedidos de reembolsos
Data/pedido
período
valor
Data da junção de documentos Despacho Normativo 342/93
30-12-1993
93-10
69.751,16
17-02-1997
25-02-1994
93-12
47.085,74
17-02-1997
27-05-1994
94-03
38.068,52
31-12-1997
94-06
37.767,53
31-12-1997
27-02-1995
94-12
57.501,52
31-12-1997
25-05-1995
95-03
18.499,54
03-02-1998
28-11-1995
95-09
59.415,33
03-02-1998
26-02-1996
95-12
34.764,57
03-02-1998
15-05-1996
96-03
28.258,54
23-02-1998
27-08-1996
96-06
29.932,81
23-02-1998
17-02-1997
96-12
64.227,86
23-02-1998
14-08-1997
97-06
62.307,60
17-03-1998
18-09-1997
97-07
16.984,41
17-03-1998
10-10-1997
97-08
8.241,71
17-03-1998
- cf. fls. 64 a 68 dos autos;




C) Na sequência de acção de fiscalização externa foram efectuadas correcções técnicas decorrentes de deduções consideradas indevida que deram lugar, em 1/ 9/1998 à emissão das liquidações adicionais de IVA de 1993 a 1997 n.ºs 98155880, 98155882, 98155884, 98155886, 98155888 no montante de € 1.009.132,07 - cf. fls. 80 do vol I do processo apenso;

D) Através do ofício n.0 97907 de 18/9/1998 a exequente foi notificada de que, por despacho de 5/ 9/98, o pedido de reembolso de IVA no valor de € 558.123,08 foi deduzido a título de compensação nas dívidas de IVA apuradas no mesmo montante, permanecendo em dívida o valor de € 822.297,60 - cf. fls. 68 do vol I do processo apenso;

E) Não se conformando com tal decisão deduziu reclamação graciosa e do indeferimento desta, recorreu hierarquicamente;

F) Em 18/12/ 2002, ao abrigo do regime previsto no DL 248-A/ 2002, a Exequente efectuou o pagamento da quantia de € 464.808,23 correspondente às liquidações adicionais de IVA de 1993 a 1997 n.ºs 98155880, 98155882, 98155884, 98155886, 98155888 bem como do valor de € 13.799,25 respeitante a taxa de justiça - cf. fls. 10 dos autos;

G) Do indeferimento do recurso hierárquico identificado em E), proferido por despacho de 8/4/ 2003 a exequente deduziu em 11/ 9/ 2003 impugnação judicial que correu termos com o n.º 80/2003 onde foi requerida a anulação do despacho indicado em D) bem como das liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios referentes aos anos de 93 a 97 - cf. fls. 3 a 212 do processo apenso n.º 80/2003;

H) Por despacho de 26/ 9/ 2003 foi revogado o acto identificado em D), por ter sido omitida a audição previa, e em consequência foi julgada extinta a instância no processo identificado em G) - cf . fls. 223 e 242 do processo apenso n.º 80/ 2003;

I) Por despacho de 21/10/2003, após audição prévia, foi indeferido o recurso hierárquico, fundando-se a decisão no facto de a Exequente ter direito ao reembolso do IVA, contudo, por existirem em dívida liquidações oficiosas procedeu-se à sua compensação - cf. fls. 55 do processo apenso n.º 270/ 04;

J) Do acto de indeferimento do recurso hierárquico identificado em I), a exequente deduziu impugnação judicial que correu termos com o n.° 270/2004 onde foi requerida a anulação do referido despacho bem como das liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios referentes aos anos de 93 a 97 - cf. fls. 2 a 378 do processo apenso n.° 270/04;

K) Tal acção veio a ser julgada procedente pelo que, as liquidações identificadas em C) foram anuladas por decisão deste tribunal, de 25/7/2006, transitada em julgado - cf. fls. 440 do processo apenso;

L) Em 15/3/2007, a Administração Tributária procedeu à restituição à Exequente do montante de € 464.808,23 respeitante às liquidações adicionais anuladas e que se encontram identificadas em C) e € 13.799,25 referente a taxa de justiça respeitante ao processo de execução - cf. fls. 38 e artigo 6.° da petição de execução;

M) Na mesma data foi efectuado à Exequente o pagamento das quantias objecto de pedido de reembolso identificado em A) no montante de € 558.123,08, à excepção do pedido de reembolso referente a período de Junho de 1994 - cf. acordo (artigo 8.° e 10.° do requerimento executivo e fls. 65);

N) A presente acção executiva foi instaurada em 11/6/2007 - cf. fls. 1.

O) Em 16/10/2007 a Administração Tributária efectuou o pagamento do montante de € 558 323,75 a título de juros indemnizatórios - cf. fls. 36 a 44.».

Ao abrigo do disposto no art.º 662/1 do CPC adita-se ao probatório o seguinte facto, documentalmente comprovado como se indica:

P) Em 06/10/2006, a pedido da impugnante no processo principal, foi feita remessa dos autos ao órgão da administração fiscal competente para a execução da sentença (cf. fls. 449 a 453 dos autos principais).

De direito

Começando a apreciação pelo recurso da Exequente, Fundação C..., constata-se que por despacho de 27/04/2016, a Mma. Juiz a quo rectificou os erros materiais e reformou a sentença quanto a custas no sentido propugnado pela recorrente no recurso (cf. pontos A), B) e C) das doutas Conclusões e alínea a) do pedido ali formulado, a fls.148/149 dos autos).

Embora a recorrida ATA tenha expressado nas contra-alegações a sua discordância quanto aos fundamentos da rectificação e reforma, a verdade é que, notificada daquele despacho de 27/04/2016 (vd. fls.224), proferido ao abrigo do disposto nos artigos 613/2 e 617/1 do CPC, não respondeu à alteração sofrida pela sentença, nos termos e para efeitos do disposto no art.º 617/3 do CPC, deixando consolidar o julgado na parte objecto de rectificação e reforma – cf. art.º 635/5 do CPC, segundo o qual, “os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo”.

Assim, o objecto do recurso interposto pela Exequente restringe-se à apreciação da questão subsistente, que consiste em indagar qual a data a partir da qual devem ser contados os juros indemnizatórios e se assiste à Exequente o direito aos juros moratórios peticionados. Vejamos.

Em causa estão pedidos de reembolsos de IVA efectuados pela recorrente com relação a períodos de 93-10 a 97-08 (vd. mapa do ponto A) do probatório).

Na redacção dada pelo art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de Novembro, dispõe o n.º 8 do art.º 22.ºdo Código do IVA: «Os reembolsos de imposto, quando devidos, serão efectuados pela Direcção-Geral dos Impostos até ao fim do 3.º mês seguinte ao da apresentação do pedido, findo o qual poderão os sujeitos passivos solicitar a liquidação de juros indemnizatórios nos termos do art.º 43.º da lei geral tributária».

Este número do art.º 22.º do CIVA, já teve as seguintes redacções:

Redacção anterior dada pelo art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 7/96, de 7 de Fevereiro:
«8 – Os reembolsos de imposto, quando devidos, deverão ser efectuados pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos até ao fim do 3.ª mês seguinte ao da apresentação do pedido, findo o qual poderão os sujeitos passivos solicitar a liquidação de juros indemnizatórios nos termos do artigo 24.º do Código de Processo Tributário».

Redacção dada pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 139/92, de 17 de Julho:
«8 - Os reembolsos de imposto, quando devidos, deverão ser efectuados pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos até ao fim do 3.ª mês seguinte ao da apresentação do pedido, findo o qual acrescerão à quantia a restituir juros contados dia-a-dia pela taxa constante da portaria a que se refere o n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 49.168, de 5 de Agosto de 1969, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 318/80, de 20 de Agosto, desde o termo do prazo para o pagamento do reembolso até à data de emissão do respectivo meio de pagamento ou da efectivação da competente transferência bancária, quando o atraso for imputável à administração tributária».

Entretanto, foram aditados ao art.º 22.º do CIVA, pelo art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 100/95, de 19 de Maio, os números 10, 11 e 13 que dispõem:

«10 - O Ministro das Finanças pode estabelecer, por despacho, de acordo com os critérios previstos no artigo 77.º, a obrigatoriedade de os sujeitos passivos apresentarem, juntamente com o pedido de reembolso, documentos ou informações relativos às operações que determinaram aquele pedido, sob pena de o reembolso não se considerar devido para efeitos do n.º 8».

«11 - Os pedidos de reembolso serão indeferidos quando não forem facultados pelo sujeito passivo elementos que permitam aferir da legitimidade do reembolso, bem como quando o imposto dedutível for referente a um sujeito passivo com número de identificação fiscal inexistente ou inválido ou que tenha suspenso ou cessado a sua actividade no período a que se refere o reembolso».

«13 – Das decisões referidas no n.º 11 cabe recurso hierárquico, reclamação ou impugnação judicial, nos termos previstos no artigo 87.º-A».

Com a publicação do Despacho Normativo n.º 342/93, de 93.10.30, foram estabelecidos procedimentos a seguir, quer pela administração tributária, quer pelos sujeitos passivos, no exercício do direito ao reembolso.

Mostram os autos que embora a Exequente tenha apresentado pedidos de reembolso em determinadas datas (vd. ponto A) do probatório), só em momentos posteriores veio a instruir os pedidos com as cartas dirigidas à Direcção dos Serviços de Reembolso do IVA que constituem fls.78 a 82 dos autos de execução, onde expressamente refere que a informação é veiculada à AT em conformidade com o Despacho Normativo n.º 342/93 (vd. ponto B) do probatório).

A questão que a recorrente exequente vem agora colocar prende-se, no fundo, com a obrigatoriedade da instrução dos pedidos de reembolso com as informações que só posteriormente enviou à AT ou se, pelo contrário, a AT as exigiu praeter legem, não tendo, por conseguinte, a falta de remessa dessas informações com os pedidos de reembolso, virtualidade para obstar ao reembolso no prazo previsto no n.º 8 do art.º 22.º do Código do IVA (“…até ao fim do 3.º mês seguinte ao da apresentação do pedido”).

Só que, essa questão não pode ser apreciada e decidida em sede de execução de sentença.

Se a recorrente entendia que a AT lhe estava a exigir informação sem qualquer base normativa, deveria ter expressado o seu inconformismo nos autos principais de impugnação judicial, o meio declarativo próprio (art.º 22/13 do CIVA) e neste processo executivo, o tribunal daria execução ao que neste particular ali fora julgado.

Ou seja, não pode a execução exceder o âmbito do julgado anulatório, nem complementar o julgado.

Ora, a verdade é que a recorrente não invoca na questão da determinação da data a partir da qual devem ser computados os juros indemnizatórios qualquer desconformidade da decisão recorrida (que entendeu dever ser o fim do 3.º mês seguinte ao da data em que os pedidos foram instruídos pela ora recorrente com a informação enviada à AT) com o julgado anulatório, e só com esse fundamento poderia ver satisfeita a sua pretensão de cômputo dos juros nos termos previstos no n.º 8 do art.º 22.º do CIVA.

Neste modo de ver e salvo o devido respeito, não podendo ser discutida em sede executiva a legalidade da obrigatoriedade da instrução dos pedidos de reembolso com a informação só posteriormente enviada à AT, há que concordar com a decisão recorrida de que a data a partir da qual devem ser contados os juros deverá ser aquela que corresponde ao fim do 3.º mês seguinte ao da instrução dos pedidos de reembolso apresentados com a informação pertinente, de conformidade com o estatuído no n.º 8 do citado Despacho Normativo n.º 342/93: «O não cumprimento do disposto nos números 1, 2, 3 e 4 ou das alíneas b) e d) do n.°5 do presente despacho, bem como a remessa dos elementos aí previstos para além da data do envio da declaração periódica ao SIVA, determinam a suspensão do prazo de contagem dos juros previstos no n.°8 do artigo 22.° do CIVA».

Questão diversa, prende-se com o direito da recorrente aos juros de mora peticionados.

Vinha pedido o pagamento da quantia de 670.629,93€, “acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% contados a partir da data da notificação da P.I.”, que a sentença não reconheceu no entendimento de que os juros moratórios não incidem sobre o montante dos juros indemnizatórios, na linha do que então entendia a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, que cita.

Todavia, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo que cita não está de acordo com a jurisprudência mais recente e consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, expressada nos seus acórdãos do Pleno de 07/06/2017, de 01/02/2017 e de 05/26/2022, processos nºs 0279/17, 0285/16 e 01611/11.4BELRS-A, através dos quais o alto tribunal uniformizou jurisprudência no sentido de que "face ao preceituado no n.º 5 do art.º 43.º da LGT, na redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, é admissível a atribuição cumulativa de juros indemnizatórios e de juros moratórios, calculados nos termos deste preceito legal, sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo".

Em todo o caso, e salvo o devido respeito, tal controvérsia jurídica em torno da questão da cumulação de juros indemnizatórios com juros de mora sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo não assume relevância para o tema em discussão nos autos.

É que as quantias objecto do pedido de reembolso do IVA, no montante de 558.123,07€, foram pagas em singelo à Exequente em 15/03/2007, apenas não foram pagos os juros indemnizatórios devidos desde o fim do 3.º mês seguinte ao da entrega dos elementos referenciados ao Despacho Normativo 342/93, de 30 de Outubro, que instruíram os pedidos de reembolso de IVA apresentados, até aquela data de 15/03/2007. E o que a recorrente exequente peticiona é juros de mora sobre o montante de juros indemnizatórios em falta, desde a notificação da P.I. de execução à executada, até efectivo e integral pagamento (vd. art.º 25.º da douta P.I).

Assim, são devidos à recorrente exequente juros indemnizatórios desde o fim do 3.º mês seguinte ao da entrega dos elementos referenciados ao Despacho Normativo 342/93, de 30 de Outubro, que instruíram os pedidos de reembolso de IVA apresentados, até 15/03/2007 (data em que foi efectuado à Exequente o pagamento das quantias objecto do pedido de reembolso, no montante de 558.123,08€).

E são devidos juros de mora sobre o montante de juros indemnizatórios em falta (que não foram pagos pela AT em simultâneo com o pagamento das quantias objecto do pedido de reembolso – cf. pontos A) e M) do probatório), desde o termo do prazo de execução espontânea do julgado 25/12/2006 que corresponde ao termo do prazo de três meses de execução espontânea do julgado anulatório – vd. pontos K) e P) do probatório e artigos 280/1 do CPPT (até 15/09/2006, férias judiciais, não correu o prazo judicial de 10 dias de recurso da sentença exequenda, que só transitou em 25/09/2006) e 175/1 e 176.º do CPTA, na redacção anterior à introduzida pelo DL n.º 214-G/2015, de 02 de Outubro, art.º 61/3 do CPPT –– até efectivo e integral pagamento.

A sentença incorreu em erro de julgamento quanto a esta parcela da decisão, pelo que terá de ser revogada e concedido provimento parcial ao recurso.
*

Prosseguindo agora com a apreciação do recurso subordinado interposto pela Fazenda Pública, constata-se que a peticionada rectificação do erro material da sentença com os fundamento vertidos nos pontos A) a D) das doutas conclusões, isto é, na indicação da data de entrega dos documentos a instruir os pedidos de reembolso do IVA apresentados pela Exequente e aqui recorrida em 30/12/1993 e 25/02/1994, que é 17/12/1997 e não 17/02/1997, como por lapso se fez constar, já encontrou plena satisfação no despacho rectificativo de 27/04/2016, constante de fls.220/221, não tendo a alteração introduzida na sentença sido impugnada pela recorrida (cf. art.º 635/5 do CPC).

Quanto ao segundo fundamento do recurso, é manifesto que o mesmo tem de improceder, pois basta atentar nas conclusões E) a J) para saltar á evidência que, tal como salienta a recorrida, não estamos perante qualquer erro material da sentença, suprível, mas sim perante factos novos que se prendem com o alegado erro na regularização da conta corrente da recorrida, questão que nunca antes foi trazida aos autos principais ou de execução para contestar o reembolso pedido pela recorrida em Junho/94 no valor de 37.767,53€ e, cujo conhecimento está vedado a este tribunal, porquanto, como é pacífico na jurisprudência, os recursos visam o reexame, por parte do tribunal superior, de questões precedentemente resolvidas pelo tribunal a quo e não a pronúncia do tribunal ad quem sobre questões novas, salvo de conhecimento oficioso.

Assim, decide-se não conhecer desta última questão do recurso, que, como se disse, esgota o objecto do recurso subordinado.

4 - DECISÃO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em:
1. Conceder parcial provimento ao recurso da Exequente e,
a) Condenar a AT no pagamento à Exequente de juros de mora, às taxas aplicáveis, sobre o montante dos juros indemnizatórios em falta desde o termo do prazo de execução do julgado (25/12/2006) até efectivo e integral pagamento.
b) No mais, confirmar a sentença recorrida.
2. Não conhecer do recurso interposto pela Fazenda Pública.

Condenação em custas:
Ø No recurso da Exequente, com valor atribuído ao recurso e não impugnado de 80.000€, em razão da sucumbência, que se fixa em 10% para a recorrente e 90% para a recorrida.
Ø No recurso subordinado da executada, cujo valor fixado (que corresponde ao contestado) é de 29.962,78€, a cargo da recorrente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 30 de Junho de 2022


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Vital Lopes



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Luísa Soares



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Tânia Meireles da Cunha