Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1645/23.6BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:11/07/2024
Relator:FILIPE CARVALHO DAS NEVES
Descritores:CITAÇÃO
PRESCRIÇÃO
DECLARAÇÃO EM FALHAS
Sumário:I – A falta de citação, em sede de processo de execução fiscal, é uma nulidade insanável do mesmo, como resulta do disposto no art.º 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, quando a mesma possa prejudicar a defesa do interessado.
II – Ao citando é imposto o ónus de alegação e prova sobre o não conhecimento do ato, por motivo que lhe não é imputável (cf. art.º 190.º, n.º 6 do CPPT), e não sobre a sua efetivação ou não que incumbe à AT.
III – Da conjugação das disposições constantes do n.º 3 do art.º 19.º da LGT e do art.º 43.º, n.º1 do CPPT resulta que impende sobre os sujeitos passivos a obrigação legal de comunicarem o respetivo domicílio fiscal à Administração Tributária, bem como qualquer alteração do mesmo.
IV – É ineficaz a mudança de domicílio enquanto não for comunicada à Administração Tributária.
V – As circunstâncias normativamente fixadas que impõem a emissão da declaração em falhas fazem cessar o efeito duradouro da citação enquanto causa de interrupção da contagem do prazo de prescrição, o que significa que se iniciará novo prazo de prescrição, geralmente de oito anos, tão-logo se verifiquem as circunstâncias elencadas no art.º 272.º do CPPT.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contra-Ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul



I – RELATÓRIO

J… veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 08/04/2024, que julgou improcedente a reclamação judicial apresentada contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Loures – 3, de 21/07/2023, que indeferiu o pedido de verificação da prescrição das dívidas de Imposto sobre o Valor Acrescentado («IVA»), Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares («IRS») – retenção na fonte, Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas («IRC») e de Imposto Único de Circulação («IUC»), dos anos de 2007, 2008 e 2009.

Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões:

«I. O presente recurso é interposto da Sentença que julgou improcedente a Reclamação Judicial n.º 1645/23.6 BELRS, do Tribunal Tributário de Lisboa em que o Recorrente reclamou contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa de 21 de julho de 2023 que indeferiu um pedido de reconhecimento das seguintes dívidas;
II. O Recorrente invocou, na petição inicial, a falta de citação do Recorrente para os processos de execução fiscal revertidos contra si em que era devedora originária a sociedade M... INDÚSTRIA DE MADEIRA, S.A.
III. Como efeito, a Administração Tributária invoca que citou o ora Recorrente para aqueles processos de execução fiscal na “Rua P…, 2…-6…” e a Sentença recorrida deu como assente este facto, o que resulta de uma errada apreciação da matéria de facto, o que determinou uma incorreta aplicação do direito.
IV. Na verdade, o Recorrente logrou demonstrar que não poderia ter sido citado naquela morada, uma vez o seu domicílio fiscal não era na “R. P…, 2…-6… Ourém”, mas Rua d… 2…-6…, Ourém.
V. Na verdade, o ora Recorrente logrou demonstrar que a R. P… tem vários números de polícia, facto esse que ficou demonstrado através da junção do documento n.º 7, a fls. 301 dos autos, e correspondente ao Despacho n.º 3727/2011, do Gabinete do Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações, Mapa de Áreas IC19 – Lanço Fátima (A1) / Ourém (Albiturel);
VI. Este documento, que foi desconsiderado pela Sentença recorrida na fixação dos factos dados como provados, fica demonstrado que a Rua d… tem vários números de polícia. Importa recordar que, conforme resulta da matéria de facto dada como provada os ofícios de citação foram todos endereçados, bem como os respetivos registos coletivos dos CTT para a “R. P…, 2…-6… Ourém”, conforme se pode verificar nos pontos 2, 5, 8, 11 e 13. Em face do exposto, e nos termos previstos no artigo 662.º, n.º 1 do CPC, deverá, pois, acrescentar-se o ponto 3. aos factos dados como provados que: “A Rua d…, 2…-6… Ourém tem vários números de polícia.”. Do mesmo modo, deverão integrar os factos não provados: “Não foi demonstrado que o Sr. J… tenha sido citado para os processos de execução fiscal enunciados no parágrafo 2. da Sentença”.
VII. De acordo com o artigo 191.º, n.º 3, do CPPT, sob a epígrafe “Citações por via postal”,
na redação em vigor em 2010, data em que foram tentadas as citações do ora Recorrente para os processos de execução fiscal estabelecia que “Nos casos não referidos nos números anteriores, bem como nos de efectivação de responsabilidade subsidiária, a citação será pessoal.”.
VIII. Estabelece, por seu turno, o artigo 233.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil (“CPC”), sob a epígrafe “modalidades de citação”, na redação à data dos factos, que “A citação pessoal é feita mediante: b) Entrega ao citando de carta registada com aviso de recepção, seu depósito, nos termos do n.º 5 do artigo 237.º-A, ou certificação da recusa de recebimento, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo;”.
IX. A sentença recorrida entendeu, em síntese, que ficou demonstrado que o ora Recorrente foi citado na “R. P…, 2…-6… Ourém” porque os avisos de receção foram assinados por L… e por M…, pais do Recorrente.
X. Estabelece o artigo 163.º, do CPPT, na redação introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, sob a epígrafe “Requisitos dos títulos executivos”, estabelecia que “São requisitos essenciais dos títulos executivos: d) Nome e domicílio do ou dos devedores;(Redacção dada pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro) [Anterior alínea c)]
XI. Conforme resulta dos factos dados como provados, dos ofícios de citação dos processos de execução fiscal e dos avisos de receção consta a seguinte morada “R. P…, 2490-618 Ourém”. Ou seja, dos ofícios de citação e dos avisos de receção não resulta a morada completa do Recorrente, ainda que se entendesse, no que não se concede, ser este o domicílio fiscal do Recorrente, pois, como demonstrado, a R. P… tem, como demonstrado, vários números de polícia, pelo que evidentemente o ora Recorrente não se poderia considerar citado para uma morada que nem sequer está completa, pois, não tem o número de polícia, elemento, naturalmente essencial ao título executivo, pois, a mera identificação da rua do domicílio do Requerente, sem indicação do número de polícia, é equiparável à falta de indicação do domicílio fiscal do ora Recorrente.
XII. Sendo que, de acordo com o artigo 195.º, do CPC “Há falta de citação: e) Quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável.”
XIII. No caso concreto, evidentemente que a entrega dos ofícios citação numa morada incompleta, ainda que assinados pelos seus pais do Recorrente, prejudica os direitos de defesa, o qual aliás desconhecendo essas alegadas citações nada fez para se defender.
XIV. Importa sublinhar que, mesmo que se entenda, no que não se concede, que o ora Recorrente não tinha alterado o seu domicílio fiscal para a Rua d…, …, P…, 2…-6…, Ourém, a sua residência nesta morada resulta dos factos dados como provados (ponto 19 dos factos dados como provados), pelo não residindo na rua – R. P…, 2…-6…, Ourém, é evidente que aquelas citações não chegaram ao seu conhecimento, razão pela qual o ora Recorrente não reagiu contra nenhuma daquelas citações.
XV. A Sentença parece partir do pressuposto, manifestamente infundado, que se os avisos de receção foram assinados pelos pais do Recorrente, os mesmos lhe comunicaram o seu teor, pois, essa conclusão resulta de um salto de raciocínio que não assenta em nenhuma evidência concreta, pelo contrário, pois, conforme resulta dos factos dados como provados as alegadas citações não foram enviadas para a residência do ora Recorrente e, bem assim, resulta dos autos que o ora Recorrente não reagiu contra nenhuma das citações.
XVI. Deverá, pois, concluir-se que, contrariamente ao que concluiu a Sentença recorrida, o ora Recorrente não foi citado para os processos de execução fiscal, nos termos legais, pelo que a citação para aqueles processos de execução fiscal não produziu o efeito interruptivo do prazo de prescrição, nos termos previstos no artigo 49.º, n.º 1, da LGT.
XVII. Assim sendo, deverá concluir-se que estando em causa processos de execução fiscal instaurados para cobrança coerciva de dívidas dos anos de 2007 a 2014, impõe-se a conclusão de que decorridos mais de 10 anos, mesmo relativamente à dívida mais recente, as mesmas já prescreveram.
XVIII. Não obstante esta conclusão sempre se imporia, uma vez que as dívidas em apreço deveriam ter sido declaradas em falhas em 2010 e 2014 pelo órgão de execução, as quais apenas não foram declaradas em 2010 e 2014 por flagrante violação do disposto no artigo 272.º, alínea a), do CPPT.
XIX. A Sentença concluiu que o efeito interruptivo decorrente das citações para os processos de execução fiscal n.ºs 34922006010227352 e apensos, 3492200801124579, 3492200901021680 e 349220901044478 manteve, desde as citações para aqueles processos de execução fiscal mas que “cessa quando o processo for declarado extinto”.
XX. Determina o artigo 176.º, do CPPT, sob a epígrafe “Extinção do Processo”, que “O processo de execução fiscal extingue-se: c) Por qualquer outra forma prevista na lei.”.
XXI. Sendo que, de acordo com o artigo 272.º, do CPPT, sob a epígrafe “Declaração em falhas”, “Será declarada em falhas pelo órgão da execução fiscal a dívida exequenda e acrescido quando, em face de auto de diligência, se verifique um dos seguintes casos: a) Demonstrar a falta de bens penhoráveis do executado, seus sucessores e responsáveis solidários ou subsidiários;
XXII. Mesmo admitindo, no que não se concede, que o ora Recorrente foi citado para os processos de execução fiscal em apreço em 9 de março de 2010 e 2 de outubro de 2014 (cfr. pontos 3., 6., 9., 12. e 14 dos factos dados como provados), nunca se poderá aceitar o entendimento da Sentença segundo o qual o despacho proferido, em 28.10.2019, pelo Chefe de Serviço de Finanças de declaração em falhas no PEF n.º 3492200601027352 e apensos, o efeito duradouro resultante da citação deixou de existir, pelo que se iniciou em 29.10.2019 novo prazo de prescrição, pelo que “a prescrição não se verificou para o PEF n.º 3492200601027352 e apensos, nem à data do requerimento apresentado pelo Reclamante, nem à presente, bem como também não se verificou para os PEF n.ºs 3492200801124579, 3492200901021680 e 349220901044478, por força do efeito interruptivo da citação, ocorrida em 09.03.2010, nos termos acima exposto.” (cfr. pág. 22 da sentença recorrida), pelo que, por maioria de razão concluiu que nenhum dos demais processos se encontra prescrito porque o órgão de execução fiscal não determinou a declarações em falhas dos demais processos de execução fiscal.
XXIII. Em suma, a Sentença recorrida entende que a declaração em falhas não é um poder-dever que recai sobre o Chefe do Serviço de Finanças (órgão de execução fiscal) que instaurou as execuções fiscais, mas antes uma prerrogativa subjetiva, podendo o Chefe do Serviço de Finanças decidir ou não, a sua declaração, podendo inclusivamente declarar, como aconteceu no caso vertente, em falhas uma dívida e não as demais, sem que nenhum facto dado como provado evidencia a razão deste comportamento apenas justificável pela utilização discricionária da declaração em falhas.
XXIV. Por outras palavras, a Sentença recorrida entende que compete ao órgão de execução fiscal determinar se o prazo de prescrição deverá retomar a sua contagem ou não e, se assim não o entender, não declarar em falhas dívidas com mais 15 anos, manipulando, deste modo, o decurso do prazo de prescrição.
XXV. Não pode, contudo, aceitar-se esta interpretação do artigo 272.º, alínea a), do CPPT efetuada pela Sentença recorrida porque resulta, inequivocamente, de uma errada interpretação daquela disposição legal.
XXVI. Relembremos, que, de acordo com os factos dados como provados (cfr. ponto. 3 dos factos dados como provados pela Sentença recorrida), o início do prazo de prescrição iniciou-se em 1 de janeiro de 2007, para as dívidas mais antigas e em 1 de janeiro de 2010 para as dívidas mais recentes.
XXVII. Contrariamente ao entendimento da Sentença recorrida, a lei determina que será (não que poderá ser) declarada em falhas pelo órgão de execução fiscal a dívida exequenda, quando, em face de auto de diligência, se verifique um dos seguintes casos “Será declarada em falhas pelo órgão da execução fiscal a dívida exequenda e acrescido quando, em face de auto de diligência, se verifique um dos seguintes casos: Demonstrar a falta de bens penhoráveis do executado, seus sucessores e responsáveis solidários e subsidiários.”.
XXVIII. É, pois, inquestionável que o legislador não deixou, contrariamente ao que entendeu
Sentença recorrida, ao critério subjetivo do órgão de execução fiscal a definição de quando uma dívida é declarada em falhas, determinando que a mesma tem de ser declarada em falhas quando fique demonstrada, em face das diligências de penhora, nomeadamente, a falta de bens penhoráveis do executado, seus sucessores e responsáveis solidários e subsidiários.
XXIX. Em face dos factos dados como provados, mas há um facto que ficou provado em primeira instância e com relevo para a conclusão de que mal andou a sentença recorrida: o órgão de execução fiscal instaurou e alegadamente citou o ora Recorrente para os processos de execução fiscal enunciados no ponto 3 dos factos dados como provados na Sentença em 9 de março de 2010 e em 2 de outubro de 2014, mas decorridos mais de 14 anos e quase 10 anos, nos processos para os quais tentou a citação do ora Recorrente mais recentemente e apenas declarou em falhas, em 28 de outubro de 2019, as dívidas em cobrança coerciva no processo de execução fiscal n.º 3492200601027352.
XXX. Já os demais processos de execução fiscal permanecem pendentes, sem que o seu valor tenha sido cobrado pelo Estado, mas sem declaração em falhas, por assim decidiu o órgão de execução fiscal em clara violação do disposto no artigo 272.º, do CPPT, assim evitando a prescrição das dívidas em apreço.
XXXI. A Sentença recorrida entendeu que este procedimento da Administração Tributária é correto, ou seja, que o órgão de execução fiscal declara dívidas em falhas se e quando entender, podendo declarar apenas algumas dívidas, mantendo ad eternum o prazo de prescrição suspenso porque ainda poderá cobrar as dívidas. Esta interpretação da Sentença recorrida determinaria, na prática, que caberia ao órgão de execução fiscal determinar, por sua vontade, se uma dívida deveria ou não prescrever, pois, se entendesse, como parece ter sido o caso, que poderá vir a cobrar a dívida, a mesma se tornaria imprescritível porque nunca seria declarada em falhas. Como é evidente, se assim fosse, nenhuma dívida seria declarada em falhas porque poderia sempre haver a possibilidade de a mesma ser cobrada no futuro.
XXXII. Contudo, esta interpretação da Sentença recorrida não pode ser acolhida e não o é pela jurisprudência: “III. A declaração em falhas tem os seus pressupostos na lei (272.º do CPPT) e deve ocorrer quando os mesmos se verifiquem, não podendo a sua verificação estar dependente da vontade de quem num SF resolve declará-la (ou não), cumprindo conhecer se em momento anterior estava aquele em condições de emitir aquela.
(cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, no processo n.º 00235/23.8 BEPRT, disponível em www.dgsi.pt).
XXXIII. Esclarece, pois, a jurisprudência que a declaração em falhas, prevista no artigo 272.º, alínea a), do CPPT, é um poder/dever do órgão de execução fiscal, devendo ser declarada assim que verificados os respetivos pressupostos.
XXXIV. Sendo que a lei esclarece, claramente, quando são iniciadas as penhoras e, consequentemente, o momento a partir do qual é possível “Demonstrar a falta de bens penhoráveis do executado, seus sucessores e responsáveis solidários ou subsidiários” (cfr. artigo 272.º, alínea a), do CPPT).
XXXV. Sendo que estabelecia o artigo 169.º, n.º 1, do CPPT, na redação à data dos factos “A
execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente.(Redacção da Lei n.º 67-A/2007, de 31/12)”.
XXXVI. Determinava o n.º 2 da mesma disposição legal que “Se não houver garantia constituída ou prestada, nem penhora, ou os bens penhorados não garantirem a dívida exequenda e acrescido, será ordenada a notificação do executado para prestar a garantia referida no número anterior dentro do prazo de 15 dias.”, sendo que o n.º 3 da mesma disposição legal estabelece que “Se a garantia não for prestada nos termos do número anterior, proceder-se-á de imediato à penhora.”.
XXXVII. Acresce referir que o n.º 5 da mesma disposição legal, determinava que os n.ºs 1 a 3 do artigo 169.º do CPPT se aplicavam em caso de oposição judicial. Este enquadramento legal torna evidente que, não tendo o ora Recorrente contestado qualquer das dívidas, usando dos meios de defesa enunciados no n.ºs 1 e 5, do artigo 169.º, do CPPT, a Administração Tributária poderia (e deveria) ter penhorado os bens do Recorrente após decorridos os prazos de defesa sem que fosse prestada qualquer garantia.
XXXVIII. Mesmo que se assuma como critério de análise de contagem do prazo para declaração das dívidas em falhas, a citação mais recente verifica-se que o ora Recorrente não apresentou nenhum dos meios de defesa contra as citações ocorridas em 2 de outubro de 2014, pelo que evidentemente, teria de ter sido declaradas em falhas as dívidas mais antigas (citações ocorridas a 9 de março de 2010) a partir de 7 de julho de 2010 e no caso das dívidas mais recentes para as quais foi citado em 2 de outubro de 2014, a partir de 30 de janeiro de
2015, pois, estas eram as datas limite para apresentação de reclamações graciosas contra as dívidas em apreço, pelo que a sua apresentação, determinou a imediata penhora de bens do Recorrente.
XXXIX. Assim sendo, não se pode aceitar o entendimento da Sentença recorrida de que o facto de o órgão de execução fiscal não ter declarada as dívidas em falhas (com exceção de um processo de execução fiscal) não fez cessar o efeito duradouro da citação no prazo de prescrição.
XL. Deverá, pois, concluir-se que, contrariamente ao referido pela Recorrente, tendo sido contestada a legalidade ou exigibilidade de qualquer daquelas dívidas por parte do Recorrente, nomeadamente, através de reclamação graciosa, oposição judicial contra aqueles processos ou através de qualquer outro meio de defesa legalmente previsto, a Administração Tributária não estava impedida de cobrar aquelas dívidas, pelo contrário, estava investida desse poder, e, consequentemente, verificando a insuficiência de bens penhoráveis do executado, seus sucessores e responsáveis subsidiários, deveria ter declarado as mesmas em falhas.
XLI. Assim sendo, não restam quaisquer dúvidas de que o órgão de execução fiscal ao ter apenas declarado em falhas, e decorridos mais de oitos anos após a citação, o processo de execução fiscal 349220061027352 e apensos, incumpriu com a obrigação de declarar em falhas todas as dívidas nas datas supra mencionadas, uma vez que nada impedia o órgão de execução fiscal, pelo contrário, de efetuar todas as diligências de penhora para cobrar aquelas dívidas pelo que se, na ausência dessas diligências ou, em resultado das mesmas (o efeito é igual dado que é dado como provado que à data de hoje permanecem por cobrar) não foi possível satisfazer os créditos tributária impõe-se a conclusão (a única possível em face dos factos dados como provados) de que as dívidas deveriam ter sido declaradas em falhas em 2010 e no início do ano de 2015.
XLII. Com efeito, a interpretação preconizada pela Sentença recorrida, e naturalmente pela Administração Tributária, do artigo 272.º, nº 1, alínea a), do CPPT traduzir-se-ia numa absoluta arbitrariedade, permitindo ao órgão de execução fiscal declarar em falhas dívidas tributárias, se e apenas na medida em que considerasse justificável, o que é absolutamente contrário ao disposto no artigo 272.º, alínea a), do CPPT e violador do princípio da segurança jurídica que está subjacente à prescrição das dívidas tributárias.
XLIII. Sobre o ónus que recai sobre a Administração Tributária de declarar em falhas as dívidas logo que verificados os pressupostos legais consagrados no artigo 272.º do CPPT, esclarece a jurisprudência dos Tribunais Superiores através de acórdão muito recente que “II - Mal se entende que seja o próprio credor, contra quem corre o prazo de prescrição, aquele que tem o poder de, sem justificação aparente, declarar em falhas processos (com datas de citação próximas) com seis anos de diferença, com isso “controlando”, em termos que lhe são favoráveis, o retomar do prazo de prescrição da dívidas” (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 30 de março de 2023, no processo n.º 251/22.7 BEFUN, disponível em www.dgsi.pt).
XLIV. Em face da citada jurisprudência conclui-se que a Administração Tributária não respeitou o preceituado no artigo 272.º do CPPT, ou seja, embora estivessem reunidos, em abril de 2010 e depois a partir de novembro de 2014, os pressupostos para declaração em falhas das dívidas em cobrança coerciva naqueles processos de execução fiscal, optou por não declarar em falhas aquelas dívidas, pois, sabia que, deste modo, poderia impedir sine die a prescrição atuação que é viadora, como muito bem sublinha a jurisprudência citada, dos princípios da certeza e segurança jurídica.
XLV. Contudo, como demonstrado não poderá aceitar-se este entendimento, devendo, antes,
considerar-se que não tendo o ora Recorrente, como demonstrado, contestado as dívidas em apreço, após as citações ocorridas em 9 de março de 2010 e em 2 de outubro de 2014, e não tendo o órgão de execução fiscal, em clara violação do disposto no artigo 272.º, do CPPT, declarado as dívidas em apreço em falhas, deverá concluir-se que após o decursos dos prazos de contestação após a citação do ora Recorrente, o prazo de prescrição de 8 anos, previsto no artigo 48.º, n.º 1, da LGT retomou a sua contagem, o que impõe a conclusão de que, na presente data, e contrariamente ao que concluiu a Sentença recorrida, se encontram prescritas.
NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO APLICÁVEIS, SEMPRE COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVERÁ SER JULGADO TOTALMENTE PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO APRESENTADO PELA RECORRENTE, E ASSIM, RECONHECIDA A PRESCRIÇÃO DOS PROCESSOS REVERTIDOS CONTRA O RECORRENTE POR DÍVIDAS DA SOCIEDADE DEVEDORA ORIGINÁRIA M… INDÚSTRIA DE MADEIRA, S.A..».
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Regularmente notificada do despacho de admissão de recurso, a Recorrida não apresentou contra-alegações.
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O Digno Magistrado do Ministério Público («DMMP») neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de não ser concedido provimento ao recurso.

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Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente dos autos, vem o processo submetido à conferência desta Subsecção do Contencioso Tributário para decisão.

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II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações (cf. art.º 635.º, n.º 4 e art.º 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil - «CPC» - ex vi art.º 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário - «CPPT»), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objeto do recurso pelas conclusões das alegações do Recorrente, importa decidir se deve ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo que manteve na ordem jurídica o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Loures – 3, de 21/07/2023, que indeferiu o pedido de verificação da prescrição das dívidas fiscais de IVA, IRS – retenção na fonte, IRC e de IUC, dos anos de 2007, 2008 e 2009.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III.A - De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
«1. Contra a sociedade «M… INDUSTRIA DE MADEIRAS, SA» foram instaurados os PEF a seguir discriminados:
- Cf. certidões de dívidas e informação juntas ao doc. n.º 007798350 do SITAF.
2. Em 02.03.2010, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3492200601027352 e apensos (3492200701013750, 3492200701017837, 3492200701037048, 3492200701048589, 3492200701049232, 3492200701062182, 3492200701072145, 3492200701074300, 3492200701081861, 3492200801009362, 3492200801009680, 3492200801012061, 3492200801012428, 3492200801013947, 3492200801015125, 3492200801028170, 3492200801028863, 3492200801031112, 3492200801043340, 3492200801048309, 3492200801064258, 3492200801065084, 3492200801071114, 3492200801080326, 3492200801081683, 3492200801081993, 3492200801093401, 3492200801095234, 3492200801103709, 3492200801105450, 3492200801111906, 3492200801115251 e 3492200801116134), o órgão de execução fiscal endereçou ao Reclamante o ofício de “Citação (Reversão)”, registado com aviso de receção, para a morada sita na “R P… 2…-6… OUREM” – cf. citação constante do PEF junto ao doc. n.º 007877348 do SITAF.
3. Em 09.03.2010, o aviso de receção que acompanhou o ofício identificado no ponto anterior foi assinado por L… – cf. registo e A/R constantes do PEF junto ao doc. n.º 007877348 do SITAF.
4. Em 12.03.2010, o órgão de execução fiscal remeteu ao Reclamante ofício com a advertência de que foi citado pessoalmente, na data da assinatura do aviso de receção, para os PEF identificados em 1. e em 2. – cf. ofício constante do PEF junto ao doc. n.º 007877348 do SITAF.
5. Em 02.03.2010, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3492200801124579 o órgão de execução fiscal endereçou ao Reclamante o ofício de “Citação (Reversão)”, registado com aviso de receção, para a morada sita na “R P… 2…-6… OUREM” – cf. citação constante do PEF junto ao doc. n.º 007877342 do SITAF.
6. Em 09.03.2010, foi assinado por L… o aviso de receção que acompanhou o ofício identificado no ponto anterior – cf. registo e A/R constantes do PEF junto ao doc. n.º 007877342 do SITAF.
7. Em 12.03.2010, o órgão de execução fiscal remeteu ao Reclamante ofício com a advertência de que foi citado pessoalmente, na data da assinatura do aviso de receção, para o PEF identificado em 1. e 5 - cf. ofício constante do PEF junto ao doc. n.º 007877342 do SITAF.
8. Em 02.03.2010, no âmbito dos processos de execução fiscal n.ºs 3492200901021680 e 3492200901044478 o órgão de execução fiscal endereçou ao Reclamante o ofício de “Citação (Reversão)”, registado com aviso de receção, para a morada sita na “R P… 2…-6… OUREM” - cf. citação constante do PEF junto ao doc. n.º 007877344 do SITAF.
9. Em 09.03.2010, o aviso de receção que acompanhou o ofício identificado no ponto anterior foi assinado por L… - cf. registo e A/R constantes do PEF junto ao doc. n.º 007877344 do SITAF.
10. Em 12.03.2010, o órgão de execução fiscal remeteu ao Reclamante ofício com a advertência de que foi citado pessoalmente, na data da assinatura do aviso de receção, para os PEF identificados em 1. e 8. - cf. ofício constante do PEF junto ao doc. n.º 007877344 do SITAF.
11. Em outubro de 2014, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3492201301142127, o órgão de execução fiscal endereçou ao Reclamante o ofício de “Citação (Reversão)”, registado com aviso de receção, para a morada sita na “R D… 2…-6…OURÉM” – cf. ofício constante do PEF junto ao doc. n.º 007877340 do SITAF.
12. Em 02.10.2014, o aviso de receção que acompanhou o ofício identificado no ponto anterior foi assinado por M… - cf. A/R constante do PEF junto ao doc. n.º 007877340 do SITAF.
13. Em outubro de 2014, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3492201401012029 o órgão de execução fiscal endereçou ao Reclamante o ofício de “Citação (Reversão)”, registado com aviso de receção, para a morada sita na “R D… 2…-6… OURÉM” – cf. ofício constante do PEF junto ao doc. n.º 007877346 do SITAF.
14. Em 02.10.2014, o aviso de receção que acompanhou o ofício identificado no ponto anterior foi assinado por M…. - cf. A/R constante do PEF junto ao doc. n.º 007877346 do SITAF.
15. Em 19.10.2022, o Reclamante apresentou no Serviço de Finanças de Loures - 3 requerimento requerer a extinção dos PEF n.ºs 3492200701013750, 3492200701017837, 3492200701037048, 3492200701048589, 3492200701049232, 3492200701062182, 3492200701072145, 3492200701074300, 3492200701081861, 3492200801009362, 3492200801009680, 3492200801012061, 3492200801012428, 3492200801013947, 3492200801015125, 3492200801028170, 3492200801028863, 3492200801031112, 3492200801043340, 3492200801048309, 3492200801064258, 3492200801065084, 3492200801071114, 3492200801080326, 3492200801081683, 3492200801081993, 3492200801093401, 3492200801095234, 3492200801103709, 3492200801105450, 3492200801111906, 3492200801115251, 3492200801116134, 3492200801124579, 3492200901021680, 3492200901044478, 3492201301142127 e 3492201401012029 por verificação da prescrição – cf. doc. n.º 4 junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
16. Em 21.07.2023, o Serviço de Finanças de Loures – 3 prestou informação com o seguinte teor: “(…)




«Imagem em texto no original»






«Imagem em texto no original»






(…).” – cf. doc. n.º 1 junto com a p.i.
17. Em 21.07.2023, a Chefe do Serviço de Finanças de Loures – 3 proferiu o seguinte despacho: “Visto o requerimento, compulsados os autos, concordo com a Informação que antecede, fundamenta e faz parte integrante do presente despacho, não reconheço a prescrição dos PEF ali identificados. Notifique.” - cf. despacho exarado na informação transcrita no ponto anterior.
18. Em 08.09.2023, deu entrada no Serviço de Finanças de Loures – 3 a presente Reclamação – cf. carimbo aposto na p.i.
Mais se provou que:
19. Em 02.05.2005, o Reclamante solicitou a renovação do bilhete de identidade, na CRCiv. Lisboa, tendo declarado residir na “R D… 2…-6… OURÉM” – cf. doc. n.º 5 junto com a p.i.
20. Em 09.03.2010, o domicilio fiscal do Reclamante era “R P… 2…-6… OUREM” – cf. doc. n.º 007798352 do SITAF.
21. O recetor dos documentos identificados em 3., 6. e 9. é o progenitor do Reclamante – por acordo.
22. Em 09.09.2011, o Reclamante solicitou “Pedido inicial de cartão de cidadão n.º 1…”, na CRCiv. Ourém, tendo declarado residir na “R D… 2…-6… OURÉM” – cf. doc. n.º 5 junto com a p.i.
23. Em 28.10.2019, foi proferido despacho de declaração em falhas para o PEF n.º 3492200601027352 – cf. informação junta como doc. n.º 1 com a p.i».
*
A decisão recorrida consignou como factualidade não provada o seguinte:
«Com interesse para a decisão da causa, inexistem factos não provados.».

*
Mais resulta consignado em termos de motivação da matéria de facto o seguinte:
«O Tribunal formou a sua convicção, quanto aos factos provados, na análise crítica dos documentos e informações oficiais juntos aos autos, não impugnados e que, atenta a sua origem e natureza, merecem credibilidade, assim como, na parte dos factos alegados pelas partes que, igualmente, não tendo sido impugnados, são também corroborados pelos documentos juntos aos autos, tudo, aliás, como indicado por referência a cada concreto ponto da materialidade assente.».

*
Da impugnação da decisão da matéria de facto

O Recorrente, nas conclusões n.ºs III. a VI. das alegações de recurso, vem impugnar a matéria de facto dada como provada e não provada na sentença recorrida, defendendo, na essência, que deve ser dado como provado que «A Rua d…, 2…-6… Ourém tem vários números de polícia.” e que deve integrar os factos não provados que «Não foi demonstrado que o Sr. J… tenha sido citado para os processos de execução fiscal enunciados no parágrafo 2. da Sentença».

Vejamos.

O art.º 662.º, n.º1 do CPC preceitua que «A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa».

A modificabilidade da decisão da matéria de facto tem como pressuposto necessário, nos termos da acima transcrita norma legal, que os factos a alterar ou aditar sejam relevantes e pertinentes para a decisão a proferir, tal como decorre, desde logo, da sua correlação com as possíveis soluções de direito para o litígio a dirimir.

Ora, quanto à alteração da matéria de facto assente pretendida pelo Recorrente, impõe-se concluir que entendemos que é de indeferir o requerido, porquanto a factualidade que o Recorrente pretende que seja consignada na decisão de facto não irá relevar para reapreciação do julgado pelo tribunal a quo. Ao Tribunal Central Administrativo assiste, efetivamente, o poder de alterar a decisão de facto tomada pelo tribunal a quo, mas desde que ocorram os pressupostos vertidos no art.º 662.º do CPC, designadamente, que a modificação da matéria de facto pretendida seja relevante para a decisão a tomar por este Tribunal.

E na situação em análise, pese embora venha alegado erro de julgamento quanto à decisão da matéria de facto nos termos acima melhor explicitados, não se vislumbra a pertinência da alteração preconizada pelo Recorrente. Com efeito, se bem interpretamos, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso, o Recorrente não logrou especificar como e em que medida esse alegado erro na decisão da matéria de facto é suscetível de conduzir a uma solução diferente da que foi encontrada no texto decisório, tendo em conta a correspondente motivação.

E quanto à pretendida alteração no que respeita à factualidade não provada, cumpre notar que a não citação do Recorrente para os PEF em causa é uma conclusão que deve ser extraída através da articulação entre a factualidade que integra o probatório e as normais legais ao caso aplicáveis, pelo que sendo a «citação» um conceito jurídico não pode, naturalmente, ser consignado em termos de factualidade não provada.

Em suma, a verdade é que quanto à factualidade assente a alteração pretendida se mostra impertinente, tendo em conta, designadamente, que o Recorrente não logrou indicar ou demonstrar o caminho a que conduziria a formulação apontada, o que seria essencial para que este Tribunal pudesse concluir pela sua alteração nos termos pretendidos. E quanto ao facto não provado que o Recorrente pretende aditar à decisão da matéria de facto, já se concluiu, de forma patente, que tal não se mostra viável, dado que se pretende verdadeiramente consignar uma conclusão jurídica.

Termos em que, o recurso não pode deixar de estar condenado, nesta parte, ao insucesso, pelo que se indefere a pretendida modificação da decisão da matéria de facto.

*
III.B De Direito

Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 08/04/2024, que julgou improcedente a reclamação judicial apresentada contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Loures – 3, de 21/07/2023, que indeferiu o pedido de verificação da prescrição das dívidas fiscais de IVA, IRS – retenção na fonte, IRC e de IUC, dos anos de 2007, 2008 e 2009.
Comecemos por apreciar as alegações relativas à falta de citação do Recorrente, que vem invocada para sustentar a sua posição quanto à verificação da prescrição das dívidas exequendas, e que constam das conclusões n.ºs I. a XVII das alegações de recurso.

Neste âmbito, alega o Recorrente, fundamentalmente, que não foi citado, dado que:

(i) tem o seu domicílio na rua d…, 2…-6… Ourém, e não no local para o qual foram endereçados os ofícios de citação;

(ii) a rua P… tem vários números de polícia, pelo que os ofícios de citação e os respetivos avisos de receção não possuem a morada completa;

(iii) não tomou conhecimento das citações, ainda que os avisos de receção em causa tenham sido assinados pelos seus pais.

Vejamos, então.

Adiantamos, desde já, que o decidido pelo Tribunal a quo não merece qualquer censura, tendo apreciado com acerto e clareza a factualidade relevante e o direito aplicável, concluindo, a final, que não ocorreu a alegada falta de citação.

Concretizando,

Nos termos da alínea b) do n.º 3 do art.º 191.º do CPPT A redação desta norma, assim como das restantes que serão indicadas no presente aresto, é a aplicável ao caso que agora nos ocupa., nos casos de efetivação de responsabilidade subsidiária, a citação será pessoal.

À citação pessoal aplicam-se as regras de citação previstas nos artigos 190.º e 192.º do CPPT, e, ainda, por remissão do n.º 1 da norma indicada em último lugar, a lei processual civil, em tudo o que não se mostre especialmente previsto ou regulado na legislação processual tributária.

A alínea b), do n.º 2 do art.º 233.º do velho CPC (atual artigo 225.º), estipula que a entrega ao citando de carta registada com aviso de receção constitui uma modalidade de citação pessoal. De notar que quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, presume-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário (cf. art.º 238.º, n.º1 do velho CPC).

Caso não sejam observadas as formalidades da citação previstas na lei e se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado, verifica-se uma situação de nulidade da citação (cf. art.º 198.º, n.ºs 1 e 4 do velho CPC). A nulidade da citação é suprível, tendo por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente (cf. artigo 165.º, n.º 2 do CPPT), aproveitando-se as peças úteis ao apuramento dos factos. Dito por outras palavras, verificando-se a nulidade da citação, a mesma pode ser suprida, designadamente, comunicando-se os elementos em falta, com salvaguarda dos direitos do citado, mormente, os direitos de defesa.

Por seu turno, a falta de citação ocorrerá nas situações previstas no artigo 195.º do CPC (atual art.º 188.º), saber:

(i) quando o ato tenha sido completamente omitido;

(ii) quando tenha havido erro de identidade do citado;

(iii) quando se tenha empregado indevidamente a citação edital;

(iv) quando se mostre que foi efetuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste, tratando-se de pessoa coletiva ou sociedade;

(v) quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato, por facto que não lhe seja imputável.

A falta de citação, em sede de processo de execução fiscal, é uma nulidade insanável do mesmo, como resulta do disposto no art.º 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, quando a mesma possa prejudicar a defesa do interessado.

É ainda de ter em conta o disposto no n.º 6 do art.º 190.º do CPPT (que tem paralelo na alínea e), do n.º 1 do art.º 195.º do velho CPC), segundo o qual só ocorre falta de citação quando o respetivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do ato por motivo que lhe não foi imputável. Esta disposição do CPPT supõe que tenha sido praticado um ato de citação, com observância dos requisitos previstos na lei, sendo à Administração Tributária e Aduaneira («AT»), naturalmente, que incumbe demonstrar que ele foi efetuado. Ao citando, por outro lado, é imposto o ónus de alegação e prova sobre o não conhecimento do ato, por motivo que lhe não é imputável (cf. artigo 190.º, n.º 6 do CPPT).


Para se concluir pela falta de citação nos termos do citado art.º 190.º, n.º 6 do CPPT (como no art.º 195.º, n.º 1, alínea e) do velho CPC), não basta, assim, a alegação pelo destinatário de que não teve conhecimento do ato de citação: é ainda necessário que seja alegado e provado, não só que tal aconteceu, mas ainda que aconteceu devido a facto que não lhe é imputável. Expressão que deve ser interpretada em termos de causalidade objetiva, ou seja, quando a conduta do requerente em nada tenha contribuído para tal (cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13/07/2018, proferido no proc. n.º 1965/13.8TBCLD-A.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt). O ónus de alegação desses factos essenciais e respetiva prova recai, pois, sobre o visado, não cabendo ao tribunal substituir-se-lhe nessa incumbência, supondo ou concebendo factos concretos que pudessem ter relevo nessa matéria.

Feita a prova dessas circunstâncias – para cuja verificação, sublinhe-se, deve o tribunal usar de elevado grau de exigência –, verificar-se-á uma situação de falta de citação que, nos termos do disposto no art.º 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, consubstancia nulidade insanável do processo de execução fiscal, quando tal falta possa prejudicar a defesa do interessado (cf. Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, in Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, Coimbra Editora, 2.ª edição, 2008, volume 1.º, pág. 355, anotação 5 ao então art.º 195.º, com correspondência no atual art.º 188.º, norma paralela ao art.º 190.º do CPPT).

Acresce notar a circunstância de ser ineficaz a mudança do domicílio do sujeito passivo enquanto não for comunicada à AT, sendo obrigatória essa comunicação – cf. n.ºs 3 e 4 do art.º 19.º da LGT. A este propósito refere Lima Guerreiro, em anotação ao referido artigo, in LGT Anotada, Rei dos Livros, que «a não revelação da mudança de domicílio à Administração Tributária (…) determina a ineficácia da mudança perante a Administração Tributária (…)».

No mesmo sentido, o art.º 43.º do CPPT consagra, no seu n.º 2, a regra da inoponibilidade à AT da mudança de domicílio que não lhe tiver sido oportunamente declarada.

Aqui chegados, e tendo ficado exposto o direito aplicável, regressemos, então, ao caso concreto dos autos.

Como se deixou dito na sentença recorrida, para chamar o Recorrente aos PEF n.ºs 3492200701013750, 3492200701017837, 3492200701037048, 3492200701048589, 3492200701049232, 3492200701062182, 3492200701072145, 3492200701074300, 3492200701081861, 3492200801009362, 3492200801009680, 3492200801012061, 3492200801012428, 3492200801013947, 3492200801015125, 3492200801028170, 3492200801028863, 3492200801031112, 3492200801043340, 3492200801048309, 3492200801064258, 3492200801065084, 3492200801071114, 3492200801080326, 3492200801081683, 3492200801081993, 3492200801093401, 3492200801095234, 3492200801103709, 3492200801105450, 3492200801111906, 3492200801115251, 3492200801116134, 3492200801124579, 3492200901021680 e 3492200901044478 o Serviço de Finanças remeteu cartas registadas com aviso de receção para o domicílio fiscal daquele constante da base de dados da AT («R P… 2…-6… Ourem»), as quais foram rececionadas por seu progenitor em 09/03/2010 e 02/10/2010 (cf. pontos 2., 3., 5., 6., 8., 9., 20. e 21.).

As alegações do Recorrente no sentido de que já não residia na «R P… 2…-6… Ourem», local onde foram concretizadas as citações no âmbito dos PEF acima melhor identificados, não podem merecer provimento, já que sendo essa a morada do seu domicílio fiscal, bem andou o órgão de execução fiscal ao remeter para ali os ofícios de citação em referência, em cumprimento do normativo legal aplicável.

Como já se disse, impendia sobre o Recorrente a obrigação de participar oportunamente a alteração do seu domicílio fiscal à AT, pois, de harmonia com o preceituado nos art.ºs 19.º, n.º1, alínea a) da LGT e 43.º do CPPT, o domicílio fiscal das pessoas singulares, salvo indicação em contrário, é no local de residência habitual, sendo obrigatória a comunicação à administração fiscal do domicílio do sujeito passivo, assim como de qualquer alteração, sendo que não consta do probatório que o Recorrente tenha comunicado oportunamente à AT a alteração do local do seu domicílio fiscal.

E do preceituado no art.º 19.º n.º 6 LGT, não decorre que à AT caiba, por princípio, proceder a diligências investigatórias para conhecer qualquer eventual novo domicílio fiscal dos contribuintes, que não tenha sido comunicado. Neste sentido, por seu turno, o art.º 43.º do CPPT faz recair sobre os interessados em processos fiscais a obrigação de comunicarem no prazo de 20 dias, qualquer alteração do seu domicílio, sendo que o n.º 2 daquele preceito determinava como consequência da falta de tal comunicação, a não oponibilidade à AT, tal como o disposto no art.º 19.º, n.º3 da LGT.

E não havendo notícia nos autos de que tenha sido comunicada à AT qualquer alteração de domicílio fiscal, os ofícios de citação só poderiam ter sido remetidos, como foram, para o que constava do cadastro da AT, sendo, por isso, «ineficaz a mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária» - cf. o preceituado no art.º 19.º, n.º 3 da LGT a art.º 43.º, n.º2 do CPPT. Diga-se ainda, que o Recorrente não logrou alegar, e muito menos provar, que foi impossível comunicar à AT, no prazo legal, a alteração do local do seu domicílio fiscal.

Destarte, tendo o órgão de execução fiscal observado as regras legais exigidas para a citação, efetivando-a no domicílio fiscal que o Recorrente havia declarado à AT, a mesma deve ter-se por concretizada.
De igual forma, também não merece provimento o argumento de que a rua P… tem vários números de polícia: é que se tem vários números de polícia, o Recorrente deveria ter tido, oportunamente, o cuidado, o zelo e a diligência de comunicar à AT de forma completa o local do seu domicílio fiscal. Se não o fez, a responsabilidade dessa falta de comunicação é inteiramente imputável ao Recorrente.

E pela mesma razão também não pode merecer acolhimento a alegação feita pelo Recorrente no sentido de que os ofícios de citação e os avisos de receção não possuem a sua morada completa, dado que tal, a ter sucedido, se deve à sua inércia.

Diga-se, ainda, que o Recorrente não logrou alegar e provar que não tomou conhecimento das citações para os PEF em causa, ainda que reconheça que os correspondentes avisos de receção foram assinados pelos seus pais, tendo tal ficado consignado na factualidade provada na sentença recorrida (cf. ponto 21.). Como acima se apontou, a presunção da citação prevista na lei pode ainda ceder na hipótese da prova do contrário por parte do interessado (cf. art.ºs 344.º, n.º 1, 349.º e 350.º, n.º 2 do Código Civil), ou seja, pelo convencimento jurisdicional, através da alegação e demonstração de que não teve efetivo e oportuno conhecimento das notas de citação por circunstâncias ficadas a dever a facto que lhe não é imputável. E a verdade é que, neste conspecto, o Recorrente limita-se a alegar de forma vaga e genérica que não tomou conhecimento das citações em referência, sem circunstanciar minimamente a razão pela qual os seus pais não lhe deram conhecimento das mesmas, não tendo, em sede judicial, logrado provar que tal não se deveu a facto que lhe é imputável.

Por último, e quanto aos PEF n.ºs 3492201301142127 e 3492201401012029 os ofícios de citação foram remetidos para a «R. d… 2…-6… Ourem» (cf. pontos 11., 12., 13. e 14. dos factos provados), local onde o Recorrente alegou residir, razão pela qual estas alegações, neste conspecto, são manifestamente improcedentes, tendo em conta o quadro normativo aplicável ao caso concreto acima delineado.

E por ser assim, como cremos que é, concluímos que não merecem provimento estas alegações do Recorrente atinentes à falta de citação para os PEF em referência.

Prosseguindo.

No âmbito das conclusões XVIII. A XLV., advoga o Recorrente, além do mais, que «as dívidas em apreço deveriam ter sido declaradas em falhas em 2010 e 2014 pelo órgão de execução fiscal, as quais apenas não foram declaradas em 2010 e 2014 por flagrante violação do disposto no artigo 272.º, alínea a), do CPPT).» e que «É, pois, inquestionável que o legislador não deixou, contrariamente ao que entendeu Sentença recorrida, ao critério subjetivo do órgão de execução fiscal a definição de quando uma dívida é declarada em falhas, determinando que a mesma tem de ser declarada em falhas quando fique demonstrada, em face das diligências de penhora, nomeadamente, a falta de bens penhoráveis do executado, seus sucessores e responsáveis solidários e subsidiários.».

Mais considera o Recorrente que «Mesmo que se assuma como critério de análise de contagem do prazo para declaração das dívidas em falhas, a citação mais recente verifica-se que o ora Recorrente não apresentou nenhum dos meios de defesa contra as citações ocorridas em 2 de outubro de 2014, pelo que evidentemente, teria de ter sido declaradas em falhas as dívidas mais antigas (citações ocorridas a 9 de março de 2010) a partir de 7 de julho de 2010 e no caso das dívidas mais recentes para as quais foi citado em 2 de outubro de 2014, a partir de 30 de janeiro de 2015, pois, estas eram as datas limite para apresentação de reclamações graciosas contra as dívidas em apreço, pelo que a sua apresentação, determinou a imediata penhora de bens do Recorrente.».

E, neste conspecto, conclui o Recorrente que «não se pode aceitar o entendimento da Sentença recorrida de que o facto de o órgão de execução fiscal não ter declarada as dívidas em falhas (com exceção de um processo de execução fiscal) não fez cessar o efeito duradouro da citação no prazo de prescrição.».

Na sentença recorrida foi alinhado, no que respeita a esta questão em concreto, o seguinte discurso fundamentador:

«Na situação em análise, atento o despacho proferido, em 28.10.2019, pelo Chefe de Serviço de Finanças de declaração em falhas no PEF n.º 3492200601027352 e apensos, o efeito duradouro resultante da citação deixou de existir, pelo que se iniciou em 29.10.2019 novo prazo de prescrição.
Assim, a prescrição não se verificou para o PEF n.º 3492200601027352 e apensos, nem à data do requerimento apresentado pelo Reclamante, nem à presente, bem como também não se verificou para os PEF n.ºs 3492200801124579, 3492200901021680 e 3492200901044478, por força do efeito interruptivo da citação, ocorrida em 09.03.2010, nos termos acima expostos.
De igual modo, resulta provado que o Reclamante foi citado na qualidade de responsável subsidiário, em 02.10.2014, nos processos de execução fiscal n.ºs 3492201301142127 e 3492201401012029, instaurados por dívidas de IUC, dos anos de 2008 e 2009.
Assim, verificada a interrupção dos prazos de prescrição em curso, por força da citação do aqui Reclamante ocorrida em 02.10.2014, há que concluir que quanto aos PEF n.ºs 3492201301142127 e 3492201401012029, também não ocorreu a prescrição, pelos motivos acima expostos.
Em conclusão, quando, como no caso sub judice, o prazo de prescrição foi interrompido pela citação, a cessação da eficácia do facto interruptivo é diferida para a data da decisão que ponha termo ao processo, sem prejuízo de dever equiparar-se a essa decisão aquela que declare a execução fiscal em falhas (Vide, neste sentido, entre outros, os acórdãos do STA, de 05.04.2017, proferido no processo com o n.º 304/17, de 31.01.2018, proferido no processo com o n.º 21/18, disponíveis em www.dgsi.pt). Assim, a interrupção decorrente da citação inutiliza todo o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo e obsta ao início da contagem do novo prazo enquanto o processo executivo não findar, motivo pelo qual os processos em causa nos presentes autos não se mostram prescritos, nos termos acima explicitados.
(…)
Revertendo ao caso dos autos, conforme refere o Acórdão acabado de citar, o interessado podia ter requerido ao órgão de execução fiscal que declarasse em falhas as dividas e acrescidos, e caso não se conformasse com o decidido, podia sempre reclamar judicialmente dessa decisão, nos termos do artigo 276.º do CPPT. Não o tendo feito, não pode, agora, querer que se considere que ocorreu a declaração em falhas nos anos de 2010 e 2014.
Por isso, não tendo o órgão de execução fiscal declarado as dívidas em falhas, à exceção das dívidas em cobrança no PEF n.º 3492200601027352 e apensos, não ocorreu a cessação do efeito duradouro da citação, que se consubstancia em não começar a correr novo prazo de prescrição enquanto não se puser termo ao processo de execução fiscal.
Termos em que o despacho reclamado, ao não reconhecer a prescrição, não padece de qualquer ilegalidade, devendo, por essa razão, improceder a presente reclamação, o que se determinará.».

Apreciando.

Dispõe o art.º 176.º, n.º1 do CPPT que o processo de execução fiscal extingue-se por pagamento, anulação ou qualquer outra forma prevista na lei.

Por seu lado, a secção X do capítulo II do mesmo diploma, com a epígrafe «Da extinção da execução», prevê as seguintes causas de extinção da execução fiscal:
(i) por pagamento coercivo;
(ii) por pagamento voluntário;
(iii) por declaração em falhas.

Preceitua o art.º 272.º do CPPT o seguinte:
«Será declarada em falhas pelo órgão da execução fiscal a dívida exequenda e acrescido quando, em face de auto de diligência, se verifique um dos seguintes casos:
a) Demonstrar a falta de bens penhoráveis do executado, seus sucessores e responsáveis solidários ou subsidiários;
b) Ser desconhecido o executado e não ser possível identificar o prédio, quando a dívida exequenda for de tributo sobre a propriedade imobiliária;
c) Encontrar-se ausente em parte incerta o devedor do crédito penhorado e não ter o executado outros bens penhoráveis».

Assim, é claro que a declaração em falhas é uma das causas de extinção da execução fiscal previstas na lei, sendo que a execução poderá prosseguir sem necessidade de nova citação e a todo o tempo, salvo ocorrência de prescrição, logo que haja conhecimento de que o executado ou outros responsáveis possuem bens penhoráveis (cf. art.º 274.º do CPPT).

A doutrina e a jurisprudência vêm entendendo ser de equiparar à «
decisão que ponha termo ao processo» (cf. art.º 327.º, n.º1 do Código Civil - «CC» - e art.º 49.º, n.º1 da LGT), a que declara a execução fiscal em falhas, tal como se pode extrair do sumário do acórdão do STA de 31/01/2018, exarado no proc.º 021/18, disponível em www.dgsi.pt, que, pela sua relevância e clareza, se transcreve:
«I - Embora o julgamento em falhas no processo executivo fiscal consista num arquivamento provisório, trata-se, inequivocamente, de uma decisão que põe termo ao processo o qual só prosseguirá nas específicas situações previstas no referido artº 274º do CPPT as quais se prefiguram como hipotéticas e indeterminadas temporalmente.
II - Sendo consabido que o elemento temporal é essencial e vital no instituto da prescrição ditado por razões de certeza e segurança jurídica tendo como principal destinatário o devedor tributário para o qual é uma garantia, evitando que possa, a todo o tempo, ser interpelado para o seu cumprimento.
III - A nosso ver qualquer interpretação no sentido de que para efeitos de aplicação do artº 327º nº 1 do C. Civil só deve entender-se a extinção do processo executivo, (como defende a recorrente) afigura-se-nos não ter sustentação na letra da lei e colidiria com as razões que presidem ao instituto da prescrição».

Como se consignou no acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte («TCAN») de 10/07/2021, tirado no proc. n.º 00333/21.2BEPNF disponível em www.dgsi.pt: «Tal como vem sendo repetidamente afirmado pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, é legal a aplicação do regime consagrado no art. 327.º, n.º 1, do Código Civil (normativo aplicável por fora do disposto na alínea d) do art. 2.º da L.G.T.), face ao ato interruptivo que se consubstancia na citação em processo de execução fiscal, o qual ostenta um efeito duradouro derivado do novo prazo de prescrição não começar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, sendo que no processo de execução fiscal também a declaração em falhas, prevista no art. 272.º, do C.P.P.T., se deve equiparar à dita decisão que põe termo ao processo.».

Contudo, do que acima se deixou dito não se pode retirar, como pretende o Recorrente, que este Tribunal, ou ao Tribunal a quo, se possa, sem mais, substituir o órgão de execução fiscal na identificação da oportunidade da emissão da declaração em falhas (rectius, da ocorrência das circunstâncias que determinam a sua emissão). É que apenas com a alegação e prova de factos pelo Recorrente que evidenciem o preenchimento da previsão do art.º 272.º, alínea a) do CPPT é que este Tribunal fica em condições de avaliar a legalidade da atuação (ou melhor, da inércia) do órgão de execução fiscal e, assim, aquilatar da sua produção de efeitos no reinício de contagem do prazo de prescrição.

É certo que, tal como o Recorrente alega, existe o risco de a execução fiscal se poder eternizar por mera inércia do órgão de execução fiscal, ao não proferir decisão a declarar a dívida exequenda em falhas, nos termos do art.º 272.º do CPPT, inviabilizando, assim, o decurso do prazo prescricional. No entanto, para evitar estas situações, o interessado pode, caso entenda que estão reunidos os pressupostos legais para tanto, suscitar junto do órgão de execução fiscal a questão da prescrição e da data em que ocorreram as circunstâncias que impõem a declaração em falhas da dívida exequenda e, caso não se conforme com o decidido, pode reclamar judicialmente dessa decisão, nos termos dos art.ºs 276.º e seguintes do CPPT.

Neste sentido, tal como se deixou apontado no acórdão do TCAN de 22/06/2023, proc. n.º 00235/23.8BEPRT, disponível em www.dgsi.pt, pode o interessado sindicar judicialmente a verificação dos efeitos temporais da declaração em falhas da dívida exequenda, para efeitos de contagem do prazo de prescrição, caso exista na execução fiscal elementos que permitam concluir, com a necessária certeza, que aquela deveria ter sido emitida em momento anterior.

Ainda quanto a este tema, o Supremo Tribunal Administrativo («STA») em acórdão de 28/02/2024, proferido no proc. n.º 01321/22.7BEPRT, disponível em www.dgsi.pt, referindo que «A declaração em falhas não constitui, pois, um acto susceptível de, por si só, produzir efeito jurídico algum que possa ser requerido pelo executado ou contra o qual este possa reagir judicialmente de modo autónomo; nas palavras de JOAQUIM FREITAS DA ROCHA, a declaração em falhas, que caracteriza com um acto de ordenação, da categoria de mero trâmite, «corresponde a um acto meramente declarativo em execução fiscal, que sendo decisivo na configuração do processo, não transporta, em si mesmo, efeitos jurídicos autónomos, limitando-se a atestar situações preexiste», sufragou o entendimento que «o Executado (…) alega que a declaração em falhas deveria ter sido emitida em data que (constituindo o dies a quo do novo prazo da prescrição, nos termos acima referidos) permitiria concluir que a obrigação tributária está prescrita, quer o órgão da execução fiscal quer o tribunal têm a obrigação de conhecer oficiosamente da prescrição».

Ora, no caso que agora nos ocupa não foi dado como provado na sentença recorrida, nem foi sequer alegado pelo Recorrente, qualquer facto relativo à sua situação patrimonial, enquanto devedor subsidiário, que permita concluir, com a certeza necessária, que se verifica o circunstancialismo normativo consignado na alínea a) do art.º 272.º do CPPT, ou seja que se verificou a falta de bens penhoráveis, e, assim, permita extrair a inferência que deveriam ter sido emitidas nos anos apontados pelo Recorrente (2010 e 2014) as declarações em falhas relativamente às dívidas exequendas.


E ainda que se considere que a declaração em falhas das dívidas exequendas do PEF n.º 34922006010227352 e apensos, emitida em 28/10/2019 (cf. ponto 23. da factualidade assente), deve, por maioria de razão, ser estendida aos restantes PEF, a verdade é que, tal como se concluiu na sentença recorrida, o prazo de prescrição de 8 anos, ao dia de hoje, ainda não transcorreu relativamente às dívidas mais antigas, que remontam ao ano de 2007 (cf. ponto 1. dos factos provados).

Donde concluímos que improcedem também estas alegações do Recorrente, razão pela qual o presente recurso jurisdicional não merece provimento, o que de seguida se decidirá.

*
IV- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 7 de novembro de 2024

(Filipe Carvalho das Neves)
(Isabel Fernandes)
(Susana Barreto)