Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 697/21.8BEALM |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 06/26/2025 |
| Relator: | ÂNGELA CERDEIRA |
| Descritores: | IVA DEDUÇÃO IMPUGNAÇÃO JUDICIAL RECLAMAÇÃO GRACIOSA OBJECTO DA IMPUGNAÇÃO CORRECÇÕES TÉCNICAS DÚVIDA FUNDADA |
| Sumário: | I - A impugnação judicial de indeferimento de reclamação graciosa tem por objeto imediato a decisão da reclamação e por objeto mediato os vícios imputados ao(s) ato(s) de liquidação. II - Anulada a decisão de indeferimento liminar da reclamação graciosa, impõe-se ao tribunal que conheça os vícios imputados ao(s) ato(s) de liquidação porque deriva do artigo 111.º, n.º s 3 e 4, do CPPT uma preferência absoluta pelo meio judicial de impugnação frente aos meios administrativos. III - No domínio das correcções técnicas ou aritméticas, o nº 1 do artigo 100º do CPPT determina que “sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto, deverá o acto impugnado ser anulado”. IV - A dúvida relevante nunca se poderá considerar fundada se assentar na ausência ou inércia probatória da parte onerada com a prova. V - Tendo sido apreendidos documentos à ordem de processo de inquérito cujo paradeiro se desconhece e não se descortinando qualquer possibilidade de saber, sem analisar a documentação apreendida, quais as máquinas adquiridas e reparadas neste período e vendidas posteriormente, não poderia a AT, neste contexto, proceder à determinação do valor real dos bem sujeitos a tributação, sem saber com segurança mínima quais as compras cuja faturação foi apreendida. |
| Votação: | C/ VOTO DE VENCIDO |
| Indicações Eventuais: | Subsecção Tributária Comum |
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| Decisão Texto Integral: | I – RELATÓRIO
A......., doravante Recorrente, na qualidade de responsável subsidiário da devedora originária “C......., Lda.” veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, em 12/02/2024, que julgou improcedente a impugnação judicial apresentada contra a decisão de indeferimento tácito do recurso hierárquico interposto da decisão de indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra as liquidações adicionais de IVA referentes aos períodos de janeiro de 2003, fevereiro de 2003, março de 2003, abril de 2003, maio de 2003, julho de 2003, novembro de 2005 e ano de 2006, e correspondentes juros compensatórios, no montante global de €346.098,66. Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES: A) - O Impugnante pretende obter por via da impugnação a anulação da decisão que indeferiu a reclamação graciosa, por forma a que a Administração Tributária, nos termos da reclamação apresentada e do disposto nos artºs 68º e segs. do CPPT, se pronuncie sobre os actos de liquidação com os quais o Impugnante não concorda. B) - A decisão judicial recorrida, que revoga o despacho de indeferimento da reclamação, tem de produzir os efeitos próprios da anulação que declarou, sob pena de estarmos perante uma decisão inconsequente, o que não é legal nem admissível, nomeadamente, face ao artº 163º do CPA. C) - A consequência da anulação do mencionado despacho não pode ser outra que não a remessa à Administração Fiscal da reclamação graciosa, a fim de esta se pronunciar nos termos a que está obrigada, de acordo com o princípio consagrado no artº 56º, nº 1 da LGT. D) - Para o caso de se entender que o Tribunal da 1ª Instância pode decidir sobre a legalidade das liquidações impugnadas, importa referir que, em face da apreensão pela Polícia Judiciária da documentação da C....... no âmbito do processo nº227/02.0TAPDL, a empresa diligenciou, sem sucesso, junto das entidades competentes, a devolução dos documentos apreendidos. E) - O Requerente, na petição inicial, ao indicar os meios de prova, requisitou ao Tribunal Judicial de Ponta Delgada a devolução à Parque Mecânico de toda a documentação apreendida no âmbito do processo nº227/02.0TAPDL. F) - O artº 186º, nº 1 do Código de Processo Penal (CPP) impõe que os objetos apreendidos, logo que se mostre desnecessário manter a apreensão para efeitos de prova, devem ser restituídos a quem de direito. G) - Em face da informação prestada pelo Tribunal da Comarca de Ponta Delgada, no sentido de que não só a documentação solicitada se extraviou, como o próprio processo à ordem do qual a mesma foi apreendida não se conseguiu localizar, o Recorrente viu coartada a possibilidade de recuperar a contabilidade da C....... e, bem assim, de demonstrar que a sociedade ficou privada da informação e dos elementos que lhe permitiam apresentar com verdade e rigor as contas do IVA relativas aos períodos em causa. H) - Entende o Recorrente que considerar válidos os atos de liquidação impugnados, com base na falta de prova produzida pelo Impugnante, quando a ausência de prova resulta de um flagrante incumprimento de uma obrigação a que o Tribunal de Ponta Delgada estava adstrito, configura uma situação de claro abuso do direito, o que torna ilegítimo o seu exercício - artº 334º do Código Civil. I) - O Estado, "pessoa" a que se reconduz tanto a Administração Tributária como as Instâncias Judiciais, e, neste caso, o Tribunal de Ponta Delgada, que não acatou a obrigação de restituir a documentação apreendida no processo nº227/02.0TAPDL, não pode prevalecer-se desse incumprimento para considerar que o Recorrente não fez prova de que a C......., como consequência direta da apreensão, tivesse ficado privada da informação e dos elementos que lhe permitiam apresentar com verdade e rigor as contas relativas ao IVA em causa. J) - Acresce que, nos termos do artº 342º, nº 2 do Código Civil, o facto do Tribunal de Ponta Delgada não ter restituído à Parque Mecânico os documentos aprendidos, como era sua obrigação, impossibilitando o Recorrente de fazer a referida prova, faz com que, quanto a esta matéria de facto, o ónus da prova se inverta, sendo à Administração Tributária que compete provar o contrário, o que não logrou fazer. L) - Este Venerando Tribunal já foi chamado a apreciar e a decidir sobre a mesmíssima situação relativamente a outra empresa que funcionava nas instalações da C......., denominada P........, Lda., no âmbito do Pº 155/14.7BEALM, tendo decidido pela procedência da impugnação. M) O facto de terem sido ou não apresentadas as declarações periódicas do IVA pela C......., relativamente aos períodos em causa, não isenta a Administração Tributária do cumprimento dos princípios da justiça, da imparcialidade (artº 22º da LGT) e do inquisitório (artº 58º da LGT), entre outros, a que está sujeita a sua atividade. N) O Impugnante deduz a presente impugnação na sequência da reversão das dívidas da C......., operada em 12/04/2010 pela Administração Fiscal, e no exercício do direito de defesa que lhe assiste na qualidade de responsável subsidiário, de acordo com o preceituado no artº 22º, nº 5 da LGT, pelo que, em consequência do incumprimento da obrigação de restituição da documentação à C......., o Recorrente ficou coartado do seu legítimo direito de defesa. O) Forçoso é, pois, reconhecer, que o imposto a que se referem os actos de liquidação impugnados foi indevidamente liquidado, porquanto viola as normas de incidência tributária, o que constitui fundamento de impugnação judicial, nos termos do disposto no artº 99º, al. a) do CPPT. P) A decisão recorrida, sendo, todavia, douta, viola por erradas interpretação e aplicação as anteriormente citadas normas legais e as mais ao caso aplicáveis. Nestes termos, e nos mais que V. Exas., Venerandos Desembargadores, doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao recurso, e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, com as legais consequências. Assim se fará J U S T I Ç A !!!!!”
Regularmente notificada do presente recurso, a Recorrida não apresentou contra-alegações. *** O DIGNO MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO (DMMP) neste TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. *** Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Ponderando o teor das conclusões do recurso e tendo presente que as mesmas definem o respectivo objeto - ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso - as questões a apreciar são as seguintes: - A sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por violação do disposto no artigo 163º do Código do Procedimento Administrativo, ao não determinar, em consequência da anulação do despacho que rejeitou liminarmente a reclamação graciosa, a remessa da mesma à Administração Fiscal, a fim de esta se pronunciar nos termos a que está obrigada? - A sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, ao considerar válidos os actos de liquidação de impugnados, por não ter sido demonstrado pelo Impugnante, aqui Recorrente, o erro nos pressupostos de facto imputado às liquidações?
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: a) A C....... é uma sociedade cuja atividade consiste na compra de equipamentos de movimentação de terras (cilindros, escavadoras, motoniveladoras, bulldozers, pás carregadoras) que posteriormente revende a clientes (cf. depoimento das testemunhas J........ e M...........); b) Os equipamentos ou são revendidos no estado em que foram adquiridos ou são objeto de trabalhos de recuperação e posteriormente revendidos (cf. depoimento das testemunhas J........ e M...........); c) No ano de 2003, foram emitidas pela C....... as seguintes faturas: “(texto integral no original; imagem)” (cf. fls. 89 a 297 (194 a 209) e fls. 300 a 444 (1 a 11) do SITAF); d) Em 15.07.2003, pelo ofício n.º 18144, foi dirigida à C....... pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação sob o assunto “Imposto sobre o Rendimento Declaração Modelo 22 Exercício de 2001”, com o seguinte teor: (cf. fls. 89 a 297 (180) e fls. 300 a 444 (118) do SITAF); e) Na mesma data, pelo ofício n.º 18145, foi dirigida à C....... pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação sob o assunto “Notificação Imposto sobre o Valor Acrescentado”, com o seguinte teor: (cf. fls. 89 a 297 (181) e fls. 300 a 444 (119) do SITAF); f) Com referência ao ano de 2003, a C....... não submeteu as declarações periódicas de IVA (facto confessado no artigo 27.º da petição inicial e que se extrai de fls. 89 a 297 do SITAF); g) Em 26.04.2004, pelo ofício n.º 12037, foi dirigida à C....... pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação sob o assunto “Imposto sobre o Rendimento Declaração Modelo 22 Exercícios de 2001 e 2002”, com o seguinte teor: (cf. fls. 89 a 297 (182) e fls. 300 a 444 (120) do SITAF); h) Na mesma data, pelo ofício n.º 12038, foi dirigida à C....... pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação sob o assunto “Notificação Imposto sobre o Valor Acrescentado”, com o seguinte teor: (cf. fls. 89 a 297 (184) e fls. 300 a 444 (122) do SITAF); i) Em 09.09.2004, foi dirigida ao Impugnante pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação com referência à C......., sob o assunto “Imposto sobre o Rendimento Declaração Modelo 22 Exercícios de 2001, 2002 e 2003”, com o seguinte teor: (cf. fls. 89 a 297 (186) e fls. 300 a 444 (124) do SITAF); j) Na mesma data, foi dirigida ao Impugnante pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação com referência à C......., sob o assunto “Notificação Imposto sobre o Valor Acrescentado”, com o seguinte teor: (cf. fls. 89 a 297 (188) e fls. 300 a 444 (126) do SITAF); k) Em 21.11.2005, foi emitida pela C....... à S..........., Lda. a fatura n.º 611, no valor de € 48.400,00, com o seguinte descritivo: “Navio Denominado Ilha de S. Jorge Ano de Construção 1943 Comprimento fora a fora 51,99 m com a matrícula P..........., registado na Capitania de Ponta Delgada, que se entra junto à Muralha do Poço do Bispo que é vendido no estado e local onde se encontra, sendo o reboque pago pela firma vendedora até Alhos Vedros ao estaleiro do Sr. Batista” (cf. fls. 300 a 444 (134) do SITAF); l) Com referência ao ano de 2005, a C....... não submeteu as declarações periódicas de IVA (facto confessado no artigo 27.º da petição inicial e que se extrai de fls. 89 a 297 e 300 a 444 do SITAF); m) Em 02.06.2006, pelo ofício n.º 16201, foi dirigida a S........... pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação, na qualidade de TOC da C......., sob o assunto “Falta de Entrega de Declarações”, com o seguinte teor:
(cf. fls. 89 a 297 (178) e fls. 300 a 444 (116) do SITAF); n) Em 12.06.2006, deu entrada na Direção de Finanças de Setúbal requerimento subscrito por S..........., sob o assunto “Falta de Entrega de Declarações C....... (…)”, com o seguinte teor: (cf. fls. 89 a 297 (179) e fls. 300 a 444 (117) do SITAF); o) Pelo ofício n.º 28168, de 31.08.2007, foi dirigida à C....... pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação sob o assunto “Notificação – Apresentação de Elementos Contabilísticos”, remetida por correio registado com aviso de receção com a referência RS851296085PT, com o seguinte teor: “(texto integral no original; imagem)” (cf. fls. 89 a 297 (128 a 132) e fls. 300 a 444 (66 a 70) do SITAF); p) O aviso de receção referente à comunicação mencionada na alínea que antecede foi objeto de devolução, não assinado (cf. fls. 89 a 297 (128 a 132) e fls. 300 a 444 (66 a 70) do SITAF) q) Na mesma data, pelo ofício n.º 28169, de 31.08.2007, foi dirigida ao Impugnante pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação sob o assunto “Notificação – Apresentação de Elementos Contabilísticos”, remetida por correio registado com aviso de receção com a referência RS 851296071PT, com o seguinte teor: “(texto integral no original; imagem)” (cf. fls. 89 a 297 (133 a 137) e fls. 300 a 444 (71 a 75) do SITAF); r) O aviso de receção referente à comunicação mencionada na alínea que antecede foi objeto de devolução, não assinado (cf. fls. 89 a 297 (133 a 137) e fls. 300 a 444 (71 a 75) do SITAF); s) Pelo ofício n.º 28169, de 31.08.2007, foi dirigida ao Impugnante pela Direção de Finanças de Setúbal comunicação sob o assunto “Notificação – N.º 5 do Artigo 39.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário”, remetida por correio registado com aviso de receção com a referência RS 851296638PT, com o seguinte teor:
(cf. fls. 89 a 297 (138 a 141) e fls. 300 a 444 (76 a 79) do SITAF); t) O aviso de receção referente à comunicação mencionada na alínea que antecede foi objeto de devolução, não assinado (cf. fls. 89 a 297 (138 a 141) e fls. 300 a 444 (76 a 79) do SITAF); u) Em 11.10.2007, foi emitido pela Divisão de Inspeção Tributária III da Direção de Finanças de Setúbal o Relatório de Inspeção Tributária, relativo à ação inspetiva efetuada com referência ao ano de 2003 da sociedade C......., Lda., ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI……. (cf. fls. 89 a 297 (103 a 122) do SITAF); v) No âmbito da ação inspetiva a que se refere a alínea u) que antecede, foram efetuadas correções aritméticas em sede de IVA, no valor de € 282.881,29, com os seguintes fundamentos:
“(texto integral no original; imagem)” (cf. fls. 89 a 297 (103 a 122) do SITAF); w) Em 08.04.2008, foi emitido pela Divisão de Inspeção Tributária III da Direção de Finanças de Setúbal o Relatório de Inspeção Tributária, relativo à ação inspetiva efetuada com referência aos anos de 2004 e 2005 da sociedade C......., Lda., ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI…….. e OI……. (cf. fls. 300 a 444 (49 a 64) do SITAF); x) No âmbito da ação inspetiva a que se refere a alínea w) que antecede, foi efetuada uma correção aritmética em sede de IVA, no valor de € 8.400,00, com os seguintes fundamentos: “(texto integral no original; imagem)” y) Em 05.06.2008, foi remetida pelo mandatário do Impugnante ao Chefe de Secretaria dos Serviços do Ministério Público de Ponta Delgada comunicação dirigida ao Senhor Procurador do Ministério Público de Ponta Delgada, no âmbito do processo de inquérito n.º 227/02.0TAPDL, requerendo “(…) a restituição ao ora requerente de todos os documentos contabilísticos apreendidos no âmbito do presente processo, nas instalações sitas no Alto da Guerra, lote ………, V......., em Setúbal, uma vez que se trata de documentação relevante para efeitos fiscais” (cf. fls. 53 a 56 do SITAF); z) Na mesma data, foi remetida pelo mandatário do Impugnante ao Diretor da Polícia Judiciária de Setúbal comunicação com referência ao processo n.º 227/02.0TAPDL, requerendo “(…) a restituição ao ora requerente de todos os documentos contabilísticos apreendidos no âmbito do presente processo, nas instalações sitas no Alto da Guerra, lote ……., V......., em Setúbal, uma vez que se trata de documentação relevante para efeitos fiscais” (cf. fls. 57 a 60 do SITAF); aa) Em 12.04.2010, foi determinada pelo Serviço de Finanças de Setúbal-1 a reversão contra o Impugnante dos seguintes processos de execução fiscal, instaurados para cobrança coerciva de dívidas de IVA e juros compensatórios da C......., Lda.: (cf. fls. 32 a 52 do SITAF); bb) Encontra-se registado no sistema informático da Autoridade Tributária e Aduaneira que o Impugnante se teve por citado da reversão para os processos de execução fiscal a que se refere a alínea aa) que antecede em 13.09.2010 (cf. fls. 89 a 297 (33) do SITAF); cc) Em 11.01.2011, foi remetido por fax ao Serviço de Finanças de Setúbal-1 requerimento subscrito pelo mandatário do Impugnante denominado de “reclamação graciosa”, com referência aos atos de liquidação que identifica como “IVA: Janeiro/Fevereiro/Março/Abril/Maio e Julho de 2003 e Novembro de 2005” (cf. fls. 89 a 297 (11 a 20) do SITAF); dd) Em 23.08.2011, no âmbito do procedimento de reclamação graciosa n.º 22………., foi elaborada pela Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal “Informação” em que se concluiu que “(…) a presente reclamação deve ser indeferida”, atenta a circunstância de “(…) o prazo para apresentação da reclamação terminou em 2010/01/11, data em que a petição foi enviada via fax” (cf. fls. 89 a 297 (35 a 38) do SITAF); ee) Sobre a “Informação” referida na alínea dd) que antecede recaiu o despacho de 24.08.2011 do Chefe de Divisão, com o seguinte teor: “Considero a informação junta como PROJECTO DE DECISÃO do processo de reclamação abaixo identificado. Notifique o reclamante para no prazo de 10 dias contados continuamente (…) exercer, querendo, o direito de audição (…)” (cf. fls. 89 a 297 (35) do SITAF); ff) Por carta registada com aviso de receção com a referência RM673805663PT, foi expedida comunicação dirigida ao mandatário do Impugnante pela Direção de Finanças de Setúbal, sob o assunto “Reclamação Graciosa 22……… Reclamante A.......”, destinada a remeter “(…) o projecto de decisão da reclamação graciosa (…)” (cf. fls. 89 a 297 (39 a 40) do SITAF); gg) Em 16.09.2011, no âmbito do procedimento de reclamação graciosa n.º 22…….., foi elaborada pela Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Setúbal “Informação” em que se concluiu que “(…) notificada, a reclamante não veio exercer o direito, pelo que, o projecto de decisão convertese em decisão definitiva e indefere-se o pedido, conforme proposto” (cf. fls. 89 a 297 (41 a 42) do SITAF); hh) Sobre a “Informação” referida na alínea gg) que antecede recaiu o despacho de 16.09.2011 do Chefe de Divisão, com o seguinte teor: “Considerando a informação junta torna-se definitivo o projecto de decisão e indefere-se o pedido” (cf. fls. 89 a 297 (41) do SITAF); ii) Por ofício de 26.10.2011, foi remetido pelo Serviço de Finanças de Setúbal-1 ao mandatário do Impugnante comunicação no âmbito do procedimento de reclamação graciosa n.º 22........, destinada a notificar “(…) que a reclamação acima indicada foi indeferida” (cf. fls. 89 a 297 (45) do SITAF); jj) Em 05.12.2011, foi remetido por fax para a Direção de Finanças de Setúbal requerimento subscrito pelo mandatário do Impugnante denominado de “recurso hierárquico” com referência a “Reclamação Graciosa n.º 22……..” (cf. fls. 89 a 297 (52 a 58) do SITAF); kk) Em 05.07.2012, no âmbito do procedimento de recurso hierárquico n.º 2232201110000077, foi elaborada “Informação” pela Direção de Serviços do IVA, em que se concluiu o seguinte: “Verificada a intempestividade da petição inicial, facto que obsta à apreciação do mérito da causa, deve desatender-se a pretensão invocada pelo Recorrente, propondo-se o indeferimento liminar do recurso hierárquico” (cf. fls. 89 a 297 (70 a 72) do SITAF); ll) Sobre a “Informação” referida na alínea kk) que antecede recaiu o Despacho do Subdiretor-geral de 12.07.2012 com o seguinte teor: “Concordo. Indefiro o recurso por intempestivo. Notifique-se para o exercício do direito de audição” (cf. fls. 89 a 297 (70) do SITAF); mm) Por ofício de 12.07.2012, foi dirigida pela Direção de Serviços do IVA ao mandatário do Impugnante comunicação sob o assunto “IVA – Exercício do Direito de Audição” (cf. fls. 89 a 297 (73) do SITAF); nn) Em 18.09.2012, no âmbito do procedimento de recurso hierárquico n.º 2232201110000077, foi elaborada “Informação” pela Direção de Serviços do IVA, em que se concluiu o seguinte: “Tendo em consideração o exposto, propõe-se o indeferimento liminar do recurso hierárquico em apreço” (cf. fls. 89 a 297 (78 a 80) do SITAF); oo) Sobre a “Informação” referida na alínea nn) que antecede recaiu o Despacho do Subdiretor-geral de 01.10.2012 com o seguinte teor: “Concordo. Indefiro liminarmente, como vem proposto pela DSIVA” (cf. fls. 89 a 297 (78) do SITAF); pp) Por ofício de 11.11.2013, foi dirigida pelo Serviço de Finanças de Setúbal-1 ao mandatário do Impugnante comunicação sob o assunto “Recurso Hierárquico N.º 223220110000077”, informando que “(…) foi negado provimento ao recurso hierárquico mencionado em epígrafe (…)” (cf. fls. 89 a 297 (81) do SITAF); qq) Em 11.02.2014, deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada impugnação judicial apresentada pelo Impugnante contra a decisão de indeferimento do recurso hierárquico a que se refere a alínea oo) que antecede, que correu termos sob o n.º 168/14.9BEALM (cf. consulta ao processo n.º 168/14.9BEALM no SITAF); rr) Em 30.04.2018, foi proferida sentença no processo que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada sob o n.º 168/14.9BEALM, na qual se determinou a anulação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico (cf. fls. 89 a 297 (84 a 92) do SITAF); ss) Em 15.10.2019, foi proferida decisão sumária no Tribunal Central Administrativo Sul de extinção da instância recursiva por inutilidade superveniente da lide, com referência ao recurso da sentença a que se refere a alínea rr) que antecede, “(…) uma vez que a pretensão recursiva se encontra totalmente satisfeita com o despacho rectificativo quanto a custas, que se considera parte integrante da sentença” (cf. fls. 89 a 297 (93 a 101) do SITAF); tt) Em 18.03.2021, o processo administrativo apenso ao processo n.º 168/14.9BEALM foi remetido ao serviço de finanças de Setúbal-1 (cf. fls. 284 do processo n.º 168/14.9BEALM no SITAF); uu) A presente impugnação deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada em 29.11.2021 (cf. fls. 19 a 21 do SITAF); vv) Em 02.02.2023, foi proferida sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou procedente a exceção dilatória de caducidade do direito de ação e, em consequência, absolveu a Fazenda Pública da instância (cf. fls. 510 a 519 do SITAF); ww) Em 01.06.2023, foi proferido acórdão pelo Tribunal Central Administrativo Sul que concedeu provimento ao recurso interposto pelo Impugnante, revogando-se a sentença recorrida e ordenando-se a baixa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada para que, após instrução dos autos e fixada a factualidade, se proceda ao julgamento de mérito, se a nada mais obstar (cf. fls. 565 a 580 do SITAF); xx) Em 24.11.2023, o Ministério Público – Procuradoria da República da Comarca dos Açores dirigiu informação ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, no âmbito do processo n.º 227/02.9TAPDL, com o seguinte teor: “(…) tenho a honra de informar V. Exa. que, tal como relatado anteriormente, não foi possível localizar o N/inquérito NUIPC 227/02.0TAPDL no Arquivo deste Tribunal. Mais se informa que não existe qualquer documento digitalizado no histórico no Citius do inquérito. De registar que foi proferido despacho de arquivamento a 25/09/2007, Visto em Correição e Remessa ao Arquivo a 27-06- 2012” (cf. fls. 614 a 617 do SITAF); yy) Em data que não se consegue concretizar, mas que terá sido entre os anos de 2004 e 2005, as instalações onde se situava o escritório da C....... foram objeto de uma busca efetuada no âmbito de um processo de inquérito judicial, a qual foi promovida por um conjunto de indivíduos que levaram consigo documentos dentro de sacos de plástico (cf. depoimento da testemunha M...........); zz) Nas mesmas instalações onde se situava o escritório da C......., funcionavam outras empresas (cf. depoimento da testemunha M........... e facto que se extrai de fls. 89 a 297 (103 a 122) e 300 a 444 (49 a 64) do SITAF).»
Consignou-se, ainda, na sentença recorrida, que «Não se considerou como provado, com relevância para a decisão da causa: i) Que os documentos apreendidos na busca referida na alínea yy) da factualidade dada como provada eram documentos bancários, folhas de obra, relativas às despesas e encargos com as reparações das máquinas, correspondência e documentos de tesouraria, referentes aos anos de 2003 e de 2005 da C........»
Em sede de motivação da matéria de facto consta, na referida sentença, o seguinte: «A convicção do Tribunal quanto à decisão sobre a matéria de facto baseou-se na análise da prova produzida nos autos, nomeadamente nos documentos juntos com os articulados, que não foram impugnados, e no processo administrativo instrutor, bem como no depoimento das testemunhas inquiridas J........, M..........., S........... e L........, conforme referido a propósito de cada ponto da factualidade acima dada como provada. O Tribunal deu como provados os factos constantes das alíneas a), b), yy) e zz) da factualidade dada como provada, com base no depoimento das testemunhas inquiridas. A testemunha J........ revelou conhecer o Impugnante e a sociedade C......., afirmando ter efetuado vários negócios com ambos. Depôs de forma espontânea e credível, ainda que genérica. Atestou que uma parte da atividade da C....... consistia na reparação de máquinas que posteriormente revendia. Quando questionado sobre se conhecia algumas das sociedades mencionadas no artigo 49.º da petição inicial como sociedades com as quais a C....... efetuava negócios, foi pelo mesmo afirmado que as conhecia como tal. No entanto, não soube asseverar com certeza se, nos anos de 2003 e 2005, celebrou algum negócio com a C......., ou se a C....... teve negócios com aquelas sociedades. O seu depoimento foi relevante, todavia, para dar como provados os factos constantes das alíneas a) e b) da factualidade dada como provada. A testemunha M........... afirmou que trabalhou na C....... nos anos em causa, sendo funcionário/encarregado na empresa. Revelou conhecimento da empresa e do local onde a mesma funcionava, confirmando que no referido local funcionavam também outras empresas, o que levou à fixação do facto provado constante da alínea zz) da factualidade dada como provada. Referiu ao Tribunal que, numa data situada entre os anos de 2004 e 2005, entraram uns indivíduos, que se considerou serem agentes da Polícia, nas instalações onde funcionava a C......., e levaram pastas que se encontravam no gabinete da contabilidade. A afirmação da testemunha de que houve uma apreensão de documentos, conjugada com os requerimentos apresentados pelo Impugnante junto da Polícia Judiciária e do Ministério Público com referência a documentação apreendida (cf. alíneas y) e z) da factualidade dada como provada) e a informação proveniente do Tribunal Judicial da Ponta Delgada (cf. alínea xx) da factualidade dada como provada), que atestam a existência de um processo de inquérito em que o Impugnante era arguido, levaram o Tribunal a dar como provado que ocorreu uma busca que estará na origem de uma apreensão de documentos relacionada com aquele processo de inquérito (cf. alínea yy) da factualidade dada como provada). Do depoimento da testemunha ficou, no entanto, a convicção no Tribunal de que a testemunha não terá assistido integralmente à dita busca, mas apenas à entrada e à saída dos indivíduos que efetuaram a busca, isto é, a testemunha não presenciou integralmente o que terá sido concretamente apreendido. Embora afirme que os documentos apreendidos pertenciam à contabilidade, tal não criou a convicção no Tribunal, atento o acima exposto, que se possa asseverar, sem dúvida, que os documentos em causa respeitassem à C....... e, mormente, aos anos de 2003 e 2005. Não obstante a alusão, no decurso do depoimento desta testemunha, ao navio “Ilha de S. Jorge”, como estando relacionado com a dita busca, o qual se encontra mencionado em fatura emitida pela Impugnante em novembro de 2005 (cf. alínea k) da factualidade dada como provada), a verdade é que, não havendo certeza quanto à concreta data em que ocorreu a apreensão e não se afigurando decorrer de nenhum outro elemento junto aos autos evidência dessa relação, tal também não serviu para dar como demonstrado que os documentos apreendidos respeitassem à C....... ou aos anos de 2003 e 2005. A circunstância de funcionarem naquele local outras empresas, como se deu como provado (cf. alínea zz) da factualidade dada como provada) e o intervalo temporal em que terá ocorrido a busca (cf. alínea yy) da factualidade dada como provada) – que terá sido posterior, pelo menos, a um dos anos aqui em causa nos autos -, aliadas ainda à circunstância de a C....... não ter submetido as declarações periódicas de IVA dos anos em causa e de constar que se encontra em incumprimento declarativo desde 2001 (cf. alíneas d) a j) e l) da factualidade dada como provada), também reforçam a convicção de que não é possível concluir, sem margem para dúvidas, apenas com base neste depoimento, que os documentos apreendidos respeitassem à C....... ou que pudessem respeitar aos anos de 2003 e de 2005. A testemunha S........... mencionou ter sido contabilista da C....... e conhecer o Impugnante. O depoimento da testemunha revelou imprecisão nos factos e nas datas, não permitindo também ao Tribunal formar a convicção de que, à data da busca, a documentação contabilística da C....... com referência aos anos de 2003 e/ou de 2005 se encontrava na sede da empresa. Com efeito, embora o seu depoimento revele algum contato e conhecimento dos assuntos da C....... e do Impugnante para lá do ano de 2001, os documentos juntos aos autos evidenciam que a testemunha terá afirmado, em 2006, ter deixado de colaborar como contabilista, o que julga que terá ocorrido no final de 2001/início de 2002 (cf. alíneas m) e n) da factualidade dada como provada) e que as declarações de rendimentos e as declarações periódicas de IVA deixaram de ser apresentadas desde 2001 (cf. alíneas d) a j) e l) da factualidade dada como provada), o que não permite concluir, sem margem para dúvidas, que a contabilidade da empresa C....... se encontrava organizada no escritório da sociedade à data da apreensão. Extraiu-se, todavia, do seu depoimento que a testemunha teve conhecimento de ter havido uma apreensão dos documentos, embora não tenha assistido à mesma. A testemunha L........, contabilista, afirmou ter sido contatado pelo Impugnante para recuperar a contabilidade da sociedade C......., o que terá ocorrido, aproximadamente, no ano de 2007. Afirmou ter pedido os documentos ao Impugnante, mas que essa documentação nunca terá aparecido, segundo lhe foi transmitido, e por esse motivo nada chegou a analisar ou a recuperar. Embora o seu depoimento se tenha afigurado credível, espontâneo e isento, não se retirou do mesmo, atento o acima exposto, outros factos a dar como provados para além dos que se enunciaram na factualidade dada supra como provada. Relativamente ao facto dado como não provado, como supra já se adiantou, o mesmo resulta da circunstância de a prova produzida não ter sido suficiente para o ter como demonstrado. Com efeito, embora se tenha dado como provada a realização de uma busca (cf. alínea yy) da factualidade dada como provada), não foi possível apurar o que foi apreendido, nem que os documentos respeitassem à contabilidade da C........ Efetivamente, na sequência de requisição efetuada ao Tribunal da Judicial da Ponta Delgada, veio a ser informado que o processo não se encontrava já disponível para consulta (cf. alínea xx) da factualidade dada como provada). Concatenados os documentos juntos aos autos com os depoimentos das testemunhas, também não foi possível dar tal facto como provado. Como supra se adiantou, a circunstância de funcionarem naquele local outras empresas, como se deu como provado (cf. alínea zz) da factualidade dada como provada) e o intervalo temporal em que terá ocorrido a busca (cf. alínea yy) da factualidade dada como provada) – que terá sido posterior, pelo menos, a um dos anos aqui em causa nos autos -, aliadas ainda à circunstância de a C....... não ter submetido as declarações periódicas de IVA dos anos em causa e de constar que não as submete desde 2001 (cf. alíneas d) a j) e l) da factualidade dada como provada), também reforçaram a convicção de que não é possível concluir, sem margem para dúvidas, que os documentos apreendidos respeitassem à C....... ou que pudessem respeitar aos anos de 2003 e de 2005. Atento todo o exposto, julgou-se tal facto como não provado» * IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO O Recorrente insurge-se contra a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou totalmente improcedente a Impugnação Judicial deduzida contra a decisão de indeferimento tácito do recurso hierárquico interposto da decisão de indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios referentes aos períodos de janeiro de 2003, fevereiro de 2003, março de 2003, abril de 2003, maio de 2003, julho de 2003, novembro de 2005 e ano de 2006, relativas à sociedade C......., Lda. (C.......) e exigidas no âmbito dos processos de execução fiscal n.º 22……. e apensos, que foram revertidos contra o Impugnante/Recorrente. Inicialmente importa referir que na petição inicial o então Impugnante suscitou a ilegalidade da decisão que indeferiu liminarmente, com fundamento em intempestividade, a reclamação graciosa que havia apresentado e imputou aos actos de liquidação impugnados o vício de errónea qualificação e quantificação do imposto. As potenciais invalidades do ato de liquidação e as eventuais invalidades de que possa padecer a decisão final proferida no âmbito de uma reclamação graciosa são questões distintas, e como tal foram tratadas, in casu, pelo tribunal de 1ª instância, pois ambas integram o objecto da acção. Efectivamente, conforme vem sendo entendido de modo uniforme e constante pelo STA, embora a decisão de indeferimento constitua o objeto imediato da impugnação judicial e o ato tributário de liquidação o seu objeto mediato, tal distinção é irrelevante, porque ambos integram o âmbito de conhecimento do tribunal (acórdãos STA de 07.06.2000 processo n° 21556; 16.06.2004 processo n° 1877/03, disponíveis em www.dgsi.pt). Também constitui entendimento pacífico na jurisprudência que os vícios do procedimento de reclamação graciosa apenas implicam a anulação da decisão de indeferimento e, nunca, a anulação do(s) ato(s) tributário(s) de liquidação anteriormente praticado(s) - cf. acórdão STA de 16.06.2004, processo n° 1877/03, disponível em www.dgsi.pt. Na verdade, trata-se de um vício ocorrido em momento posterior à efetivação da liquidação, que nunca poderia projetar efeitos invalidantes sobre um ato tributário que o antecede. Daí que, se for anulado o indeferimento da reclamação graciosa, por vício procedimental desta, caberá ao tribunal conhecer dos restantes vícios imputados ao(s) acto(s) de liquidação, uma vez que este é competente para conhecer, em tal impugnação, quer do indeferimento da reclamação quer dos vícios imputados à(s) liquidação(ões) - cfr. por todos, o acórdão do STA, de 20/5/2015, proc. nº 1021/14, disponível em www.dgsi.pt. Isto sucede, fundamentalmente, porque deriva do artigo 111.º, n.º s 3 e 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário uma preferência absoluta pelo meio judicial de impugnação frente aos meios administrativos. Chegando o legislador ao ponto de consignar que o objeto da reclamação graciosa é considerado para todos os efeitos, no âmbito do processo de impugnação. Sendo, assim, «atribuída ao tribunal competência para decidir todas as questões que tenham sido suscitadas administrativamente relativas ao acto judicialmente impugnado, mesmo que não tenham sido suscitadas na impugnação judicial» [cit. JORGE LOPES DE SOUSA, in «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», Volume I, Áreas Editora, 6.ª edição 2001, pág. 670]. Ora, como se pode ler no acórdão do STA de 30/10/2019, processo 02453/05.1BEPRT 0402/18, “se o legislador pretendeu que os vícios imputados na reclamação graciosa ao ato de liquidação fossem apreciados na impugnação judicial entretanto deduzida contra o mesmo ato de liquidação, não poderia ter pretendido que a procedência de vícios formais imputados à própria reclamação graciosa desonerasse o tribunal de apreciar os vícios da mesma liquidação e que este devolvesse a decisão à Administração Tributária para os reapreciar”. Portanto, no caso dos autos, ao contrário do que defende o Recorrente, a consequência da anulação da decisão que indeferiu liminarmente a reclamação graciosa não era “a remessa à Administração Fiscal da reclamação graciosa, a fim de esta se pronunciar nos termos a que está obrigada, de acordo com o princípio consagrado no artº 56º, nº 1 da LGT”, mas sim o conhecimento pelo Tribunal da legalidade dos actos de liquidação de IVA impugnados, como se verificou na sentença recorrida. O que significa que o recurso não merece provimento, nesta parte. Em relação à segunda questão suscitada no presente recurso, há que assinalar, desse logo, que no presente recurso não é posto em causa o seguinte segmento da decisão recorrida: “Importa notar, como ponto prévio, que embora se refira na petição inicial apresentada pelo Impugnante que este se insurge contra todas as liquidações exigidas nos processos de execução fiscal que lhe foram revertidos (cf. artigos 3.º e 4.º da petição inicial), a verdade é que nada aponta, em concreto, quanto à liquidação de IVA do ano de 2006 exigida no âmbito do processo de execução fiscal n.º 22……. (cf. alínea aa) da factualidade dada como provada), circunscrevendo a sua argumentação quanto aos atos emitidos com referência aos anos de 2003 e 2005. Assim, nenhuma ilegalidade apontando, em concreto, quanto à aludida liquidação referente ao ano de 2006, nada haverá de apreciar quanto à mesma, havendo de apreciar, apenas, da eventual ilegalidade das liquidações emitidas quanto aos anos de 2003 e 2005.” Em conformidade, é de manter a decisão recorrida na parte em que julgou improcedente a impugnação judicial da liquidação de IVA referente ao ano de 2006. No que respeita às restantes liquidações de IVA impugnadas, importa atentar na fundamentação convocada pelo tribunal de 1ª instância para julgar improcedente o invocado vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto: “Resulta demonstrado nos autos que a sociedade C....... não entregou as declarações periódicas de IVA com referência aos anos de 2003 e 2005, nem prestou qualquer tipo de esclarecimento ou informação em sede de inspeção tributária (cf. alíneas d) a j), l) e o) a t) da factualidade dada como provada). Neste contexto, na ausência de apresentação de elementos contabilísticos e de documentos de suporte, assim como face ao incumprimento das obrigações declarativas, os serviços de inspeção tributária recorreram aos Anexos P das declarações anuais de informação contabilística e fiscal dos clientes da C......., apurando então a existência de IVA liquidado e não entregue ao Estado (cf. alíneas v) e x) da factualidade dada como provada). Ora, compulsadas as diligências efetuadas pelos serviços de inspeção tributária e a fundamentação aduzida para efetuar as correções, assim como as disposições normativas supra citadas, não se nos afigura ilegal a correção efetuada, tendo a administração tributária cumprido o ónus que sobre si impendia nesta matéria. Com efeito, demonstraram os serviços de inspeção tributária que a C....... liquidou IVA em faturas emitidas aos seus clientes, que não entregou ao Estado, pelo que efetuaram as aludidas correções aritméticas em sede de IVA. O Impugnante justifica a falta de apresentação das declarações numa alegada contenda com o contabilista, ocorrida no final de 2002, e na apreensão de documentos realizada nas suas instalações entre os anos de 2004 e 2005. (…) No que se refere, desde logo, à alegação de que não apresentou as declarações em razão de um desentendimento com o seu contabilista, tal situação, mesmo que tivesse ocorrido, não desculpabiliza a falta de apresentação das declarações, uma vez que a obrigação legal de apresentação das declarações periódicas de IVA (cf. artigo 29.º do Código do IVA) impende sobre o sujeito passivo, competindo-lhe assegurar forma de o efetuar. Donde improcede, por conseguinte, a aludida alegação. Já no que diz respeito à apreensão de documentos, como emerge do probatório, foi dado como provado que ocorreu, entre 2004 e 2005, uma busca nas instalações onde funcionavam os escritórios da C......., tendo sido levados documentos em sacos de plástico (cf. alínea yy) da factualidade dada como provada). Ficou também provado que, nas mesmas instalações, funcionavam escritórios de outras empresas (cf. alínea zz) da factualidade dada como provada). Não se deu, no entanto, como provado que os documentos respeitassem à C....... e aos anos de 2003 e de 2005 (cf. facto não provado). Com efeito, como se adiantou em sede de motivação da matéria de facto, do depoimento das testemunhas, conjugado com os demais elementos juntos aos autos, não foi possível extrair a conclusão de que os documentos apreendidos eram documentos bancários, folhas de obra, relativas às despesas e encargos com as reparações das máquinas, correspondência e documentos de tesouraria, referentes aos anos de 2003 e de 2005 da C........ Por conseguinte, também não se pode concluir que a C....... tenha ficado privada da informação e dos elementos que lhe tivessem permitido apresentar as declarações. Ora, no caso em apreço, afigura-se ao Tribunal que a falta de prova quanto ao acima exposto terá de ser valorada contra o contribuinte. Com efeito, atenta a falta de apresentação das correspondentes declarações periódicas de IVA, e não beneficiando a C....... de presunção de veracidade, nos termos do artigo 75.º da LGT, o ónus da prova dos factos invocados compete ao contribuinte, que teria assim de demonstrar o erro nos pressupostos de facto nas liquidações impugnadas, não se lhe bastando, por força da cessação daquela presunção, causar dúvida sobre o facto tributário. Para esse efeito, impunha-se que tivesse sido demonstrado, designadamente, que a contabilidade da C....... se encontrava organizada naquele local e que os documentos apreendidos eram referentes à contabilidade da empresa dos anos de 2003 e de 2005. No caso, não foi possível obter a documentação apreendida (cf. alínea xx) da factualidade dada como provada), nem foi possível obter essa comprovação através do depoimento das testemunhas inquiridas. Por conseguinte, a falta de prova leva a que não se considere verificado o erro nos pressupostos de facto imputado pelo Impugnante às liquidações impugnadas. (…) Não se ignora, cumpre notar ainda, o acórdão que, em circunstâncias muito semelhantes à destes autos, foi proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 04.06.2020, no âmbito do processo n.º 155/14.7BEALM, segundo o qual “Tendo sido apreendidos documentos à ordem de processo de inquérito cujo paradeiro se desconhece e não se descortinando qualquer possibilidade de saber, sem analisar a documentação apreendida, quais as máquinas adquiridas e reparadas neste período e vendidas posteriormente, não poderia a AT, neste contexto, proceder à determinação do valor real dos bem sujeitos a tributação (art.º 83º/1 LGT), sem saber com segurança mínima quais as compras cuja faturação foi apreendida”. Verifica-se, todavia, que, diversamente do que sucede nestes autos, naqueles autos as declarações periódicas de IVA foram submetidas pela sociedade e a administração tributária foi confrontada em sede de inspeção tributária com a apreensão dos documentos, aspetos que, naquele caso, imporiam que tivesse realizado diligências para apurar quais os documentos apreendidos, como então se concluiu naquele acórdão. Não sendo, porém, o que sucede no caso ora em presença, em que as declarações periódicas não foram submetidas pela sociedade e a apreensão não foi suscitada em sede de inspeção tributária, levando-nos a considerar que idêntico entendimento não pode ser aqui adotado. (…)”. Inconformado com o assim decidido, o Recorrente apela para “as circunstâncias concretas do caso em apreço, nomeadamente, as que se prendem com o motivo pelo qual a sociedade C....... não entregou as declarações periódicas de IVA, relativas aos exercícios de 2003 e 2005”, salientando que o efeito das buscas realizadas pela polícia judiciária no âmbito dos autos de inquérito nº227/02.0TAPDL foi devastador na organização e funcionamento da empresa, pelo facto da C....... se ver privada, de um momento para o outro, de toda a documentação, designadamente, a contabilística, ficando dessa forma impossibilitada de cumprir as suas obrigações declarativas, mormente em sede de IVA, mais acrescentando que em face da informação prestada nos autos pelo Tribunal da Comarca de Ponta Delgada, no sentido de que não só a documentação solicitada se extraviou, como o próprio processo à ordem do qual a mesma foi apreendida não se conseguiu localizar, o Recorrente viu coartada a possibilidade de recuperar a contabilidade da C....... e, bem assim, de demonstrar que a sociedade ficou privada da informação e dos elementos que lhe permitiam apresentar com verdade e rigor as contas do IVA relativas aos períodos em causa. Entende o Recorrente que considerar válidos os atos de liquidação impugnados, com base na falta de prova produzida pelo Impugnante, quando a ausência de prova resulta de um flagrante incumprimento de uma obrigação a que o Tribunal de Ponta Delgada estava adstrito, configura uma situação de claro abuso do direito, o que torna ilegítimo o seu exercício - artigo 334º do Código Civil. Acrescenta que, nos termos do artigo 342º, nº 2 do Código Civil, o facto do Tribunal de Ponta Delgada não ter restituído à Parque Mecânico os documentos aprendidos, como era sua obrigação, impossibilitando o Recorrente de fazer a referida prova, faz com que, quanto a esta matéria de facto, o ónus da prova se inverta, sendo à Administração Tributária que compete provar o contrário, o que não logrou fazer. Refere, ainda, que este TCA-Sul já foi chamado a apreciar e a decidir sobre a mesmíssima situação relativamente a outra empresa que funcionava nas instalações da C......., denominada P........, Lda., no âmbito do Pº 155/14.7BEALM, tendo decidido pela procedência da impugnação, salientando que o facto de não terem sido apresentadas as declarações periódicas do IVA pela C......., relativamente aos períodos em causa, não isenta a Administração Tributária do cumprimento dos princípios da justiça, da imparcialidade (artº 22º da LGT) e do inquisitório (artº 58º da LGT), entre outros, a que está sujeita a sua atividade. Vejamos se lhe assiste razão. Como decorre do probatório, a sociedade devedora originária (C.......) dedicava-se à compra de equipamentos de movimentação de terras (cilindros, escavadoras, motoniveladoras, bulldozers, pás carregadoras) que posteriormente revendia a clientes. Na sequência da não submissão das declarações periódicas de IVA nos anos de 2003 e seguintes, foram realizadas acções inspectivas à referida sociedade, no âmbito das quais foi confirmada a emissão de facturas de venda a diversos clientes nos anos de 2003 e 2005, configurando situações de IVA liquidado e não entregue, nos termos do nº 1 do artigo 26º em conjugação com a alínea a) do nº 1 do artigo 40º, ambos do Código do IVA, na redacção em vigor à data dos factos, o que deu origem às liquidações de IVA impugnadas com fundamento em correcções meramente aritméticas. O Impugnante, chamado a responder pela dívida na qualidade de responsável subsidiário, não veio colocar em causa a ocorrência de tais operações tributáveis, alegando, contudo, que não foi considerado pelos serviços de inspeção tributária o IVA a deduzir decorrente das aquisições efetuadas pela C....... nesses mesmos períodos. E, a esse respeito, alegou que a C....... não apresentou as declarações periódicas de IVA por falta de elementos para proceder ao seu apuramento de forma correta, em razão de uma contenda com o contabilista no final do ano de 2002 e de uma apreensão de documentos que teria ocorrido em 2004, concluindo que as liquidações impugnadas padecem de erro por não corresponderem à realidade fiscal da C........ Da instrução dos autos resultou provado, além do mais, o seguinte: - Em data que não se consegue concretizar, mas que terá sido entre os anos de 2004 e 2005, as instalações onde se situava o escritório da C....... foram objeto de uma busca efetuada no âmbito de um processo de inquérito judicial, a qual foi promovida por um conjunto de indivíduos que levaram consigo documentos dentro de sacos de plástico; - Em 05.06.2008, foi remetida pelo mandatário do Impugnante ao Chefe de Secretaria dos Serviços do Ministério Público de Ponta Delgada comunicação dirigida ao Senhor Procurador do Ministério Público de Ponta Delgada, no âmbito do processo de inquérito n.º 227/02.0TAPDL, requerendo “(…) a restituição ao ora requerente de todos os documentos contabilísticos apreendidos no âmbito do presente processo, nas instalações sitas no Alto da Guerra, lote …, V......., em Setúbal, uma vez que se trata de documentação relevante para efeitos fiscais”; - Na mesma data, foi remetida pelo mandatário do Impugnante ao Diretor da Polícia Judiciária de Setúbal comunicação com referência ao processo n.º 227/02.0TAPDL, requerendo “(…) a restituição ao ora requerente de todos os documentos contabilísticos apreendidos no âmbito do presente processo, nas instalações sitas no Alto da Guerra, lote.…, V......., em Setúbal, uma vez que se trata de documentação relevante para efeitos fiscais” (cf. fls. 57 a 60 do SITAF); - Em 24.11.2023, o Ministério Público – Procuradoria da República da Comarca dos Açores dirigiu informação ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, no âmbito do processo n.º 227/02.9TAPDL, com o seguinte teor: “(…) tenho a honra de informar V. Exa. que, tal como relatado anteriormente, não foi possível localizar o N/inquérito NUIPC 227/02.0TAPDL no Arquivo deste Tribunal. Mais se informa que não existe qualquer documento digitalizado no histórico no Citius do inquérito. De registar que foi proferido despacho de arquivamento a 25/09/2007, Visto em Correição e Remessa ao Arquivo a 27-062012”. Tais factos, conforme bem considerou o Tribunal de 1ª instância, não se afiguram suficientes para considerar cumprido o ónus da prova que, in casu, recai sobre o contribuinte, nos termos do artigo 74º, nº 1 da LGT, ou seja, não demonstram a aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos de IVA com direito à dedução do imposto suportado. Tanto mais que não resultou provado “Que os documentos apreendidos na busca referida na alínea yy) da factualidade dada como provada eram documentos bancários, folhas de obra, relativas às despesas e encargos com as reparações das máquinas, correspondência e documentos de tesouraria, referentes aos anos de 2003 e de 2005 da C.......”. Todavia, já não podemos acompanhar o tribunal recorrido quando afirma que “atenta a falta de apresentação das correspondentes declarações periódicas de IVA, e não beneficiando a C....... de presunção de veracidade, nos termos do artigo 75.º da LGT, o ónus da prova dos factos invocados compete ao contribuinte, que teria assim de demonstrar o erro nos pressupostos de facto nas liquidações impugnadas, não se lhe bastando, por força da cessação daquela presunção, causar dúvida sobre o facto tributário.” Com efeito, no domínio das correcções técnicas ou aritméticas, como é o caso, o nº 1 do artigo 100º do CPPT determina que “sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto, deverá o acto impugnado ser anulado”. É certo que a dúvida relevante nunca se poderá considerar fundada se assentar na ausência ou inércia probatória da parte onerada com a prova, especialmente do impugnante, sobre quem recai o dever de comprovar os factos constitutivos do direito alegado (artigo 342º, nº 1, do Código Civil) – cfr. acórdão do TCA-Norte de 03/02/2022, processo 00058/10.4BEBRG, disponível em www.dgsi.pt. Todavia, no caso dos autos, conforme decorre do probatório, o Impugnante/Recorrente encetou diligências no sentido de reaver a documentação que havia sido apreendida no âmbito do processo de inquérito n.º 227/02.0TAPDL, o que se veio a revelar impossível, subsistindo a dúvida se tais documentos poderiam respeitar à contabilidade da sociedade “C.......”, nomeadamente às máquinas adquiridas por esta nos períodos em causa nos autos, hipótese que se afigura plausível atenta a restante factualidade demonstrada nos autos. Assim, perante a dúvida acerca da existência de operações a montante que confeririam o direito à dedução do IVA, é de concluir que as liquidações impugnadas, com referência aos anos de 2003 e 2005, não se podem manter por se verificar que existe dúvida fundada sobre a quantificação do facto tributário operada pela AT, o que dita a anulação das liquidações, nos termos do nº 1 do artigo 100º do CPPT. Daí que, ao contrário do entendimento do tribunal de 1ª instância, é de acompanhar o decidido por este TCA-Sul no acórdão proferido em 04/06/2020, no processo n.º 155/14.7BEALM, disponível em www.dgsi.pt, segundo o qual “Tendo sido apreendidos documentos à ordem de processo de inquérito cujo paradeiro se desconhece e não se descortinando qualquer possibilidade de saber, sem analisar a documentação apreendida, quais as máquinas adquiridas e reparadas neste período e vendidas posteriormente, não poderia a AT, neste contexto, proceder à determinação do valor real dos bem sujeitos a tributação (art.º 83º/1 LGT), sem saber com segurança mínima quais as compras cuja faturação foi apreendida”.
Da dispensa do remanescente Considerando que a tramitação processual da presente ação não revestiu carácter complexo, não foram suscitadas questões jurídicas de complexidade superior à média e não foram suscitados incidentes ou questões dilatórias tendentes a dificultar a normal prossecução dos autos com vista à decisão final, nem se vislumbra qualquer censura à atuação processual das partes, este Tribunal entende ser de dispensar o pagamento do valor remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art.º 6.º do Regulamento das Custas Processuais.
Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, formulam-se as CONCLUSÕES: I. A impugnação judicial de indeferimento de reclamação graciosa tem por objeto imediato a decisão da reclamação e por objeto mediato os vícios imputados ao(s) ato(s) de liquidação. II. Anulada a decisão de indeferimento liminar da reclamação graciosa, impõe-se ao tribunal que conheça os vícios imputados ao(s) ato(s) de liquidação porque deriva do artigo 111.º, n.º s 3 e 4, do CPPT uma preferência absoluta pelo meio judicial de impugnação frente aos meios administrativos. III. No domínio das correcções técnicas ou aritméticas, o nº 1 do artigo 100º do CPPT determina que “sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto, deverá o acto impugnado ser anulado”. IV. A dúvida relevante nunca se poderá considerar fundada se assentar na ausência ou inércia probatória da parte onerada com a prova. V. Tendo sido apreendidos documentos à ordem de processo de inquérito cujo paradeiro se desconhece e não se descortinando qualquer possibilidade de saber, sem analisar a documentação apreendida, quais as máquinas adquiridas e reparadas neste período e vendidas posteriormente, não poderia a AT, neste contexto, proceder à determinação do valor real dos bem sujeitos a tributação, sem saber com segurança mínima quais as compras cuja faturação foi apreendida.
Decisão Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO e em consequência: - Manter a sentença recorrida na parte em que julgou improcedente a impugnação relativa à liquidação de IVA do ano de 2006 exigida no âmbito do processo de execução fiscal n.º 22………; - Revogar a sentença recorrida na parte restante e, nessa medida, julgar parcialmente procedente a Impugnação, anulando as liquidações de IVA com referência aos anos de 2003 e 2005.
Custas na proporção do decaimento que se fixa em 1% para a Recorrente e 99% para a Recorrida, sem taxa de justiça a cargo da AT nesta instância por não ter contra-alegado.
Registe e notifique.
Lisboa, 26 de junho de 2025 (Ângela Cerdeira)
(Rui A. S. Ferreira)
(Vital Lopes) (vencido, nos termos da declaração de voto junta) Voto Vencido – Não acompanho a posição que fez vencimento no entendimento de que recai sobre o sujeito passivo, nos termos do art.º 19/2 do CIVA, o ónus de demonstrar os requisitos do direito à dedução que se arroga relativamente ao IVA que liquidou a clientes e não entregou ao Estado e que viria a ser objecto de correcção oficiosa por via directa com base nas declarações entregues ao Fisco por esses mesmos clientes do sujeito passivo. É certo que se comprova factualmente (cf. ponto xx) do probatório) que a entidade judicial à ordem da qual foram apreendidos documentos do sujeito passivo deu por extraviado o processo em que se encontravam. No entanto, a meu ver, esse insucesso probatório, não esgota as possibilidades probatórias do impugnante, nomeadamente, mediante pedido de reforma da factura/ documento de despesa extraviado ao fornecedor emitente. A emissão de 2.ª via das facturas alegadamente extraviadas (cf. facto único não provado) possibilitaria ao sujeito passivo exercer o direito à dedução relativamente ao IVA liquidado oficiosamente (cf. pontos a) e b) do probatório). Uma vez que recai sobre o contribuinte o ónus probatório dos requisitos que conferem direito à dedução (art.º 19/2 do CIVA) e que este não esgotou as possibilidades probatórias com vista a esse desiderato, é meu entendimento que não há que fazer apelo ao art.º 100.º do CPPT (dúvida sobre o facto tributário), nem aos princípios da justiça e da proporcionalidade, os quais se estruturam como “ultima ratio” na protecção de bens jurídicos muito relevantes do ordenamento constitucional tributário que ficariam seriamente comprometidos com a aplicação estrita da norma a que se subsume a situação concreta apresentada. Assim, negaria provimento ao recurso e confirmaria a decisão recorrida. Vital Lopes |