Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 70/22.0 BEPDL |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 12/06/2022 |
Relator: | PATRÍCIA MANUEL PIRES |
Descritores: | LEILÃO ELETRÓNICO VENDA DE BENS PENHORADOS VALOR BASE DE VENDA VALOR PATRIMONIAL TRIBUTÁRIO VALOR DE MERCADO |
Sumário: | I-Da conjugação dos normativos 248.º e 250.º, ambos do CPPT, resulta que, regra geral, a venda de bens penhorados é concretizada mediante leilão eletrónico, correspondendo o valor base de venda a 70 % do VPT, ressalvada a situação em que se mostre evidente que o valor de mercado dos bens é manifestamente superior ao VPT. II-Promana, assim, um procedimento específico, estritamente vinculado, e sem qualquer margem de discricionariedade, que apenas permite a ab-rogação do regime regra em situações perfeitamente patenteadas, ou seja, utilizando-se a formulação constante na lei, em situações “evidentes” da qual resulta que o valor de mercado é “manifestamente” superior ao VPT. III-O Relatório de Avaliação tem fundamento na Lei nº 153/2015, de 14 de setembro, não podendo ser preterido em razão da junção de um documento “opinativo”, realizado por uma sociedade de mediação imobiliária sem credenciação para a realização de avaliações oficiais e idóneas, e sem consagração legal. IV-A consideração da regra geral do VPT em nada pretere o princípio da proporcionalidade, porquanto o mesmo apresenta-se como uma medida adequada e necessária, tendo, ademais, no caso vertente, sido facultada a demonstração de que a consideração do VPT se encontrava, significativamente, desfasada do valor de mercado, realidade que, in casu, redundou num plano diametralmente oposto. V-O ato reclamado, ainda que de forma sucinta, enuncia os pressupostos de facto e de direito atinentes ao efeito, convocando, expressamente, para efeitos de fundamentação do valor de venda judicial em leilão eletrónico, o artigo 248.º, nº2, do CPPT, o qual, por seu turno, remete para o consignado no artigo 250.º do CPPT, entendendo-se, por isso, que a aludida fundamentação permite percecionar que foi adotada a regra geral, na medida em que o parecer de avaliação cifrava-se em valor inferior ao VPT, logo formalmente fundamentado. |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | I-RELATÓRIO M…, LDA, veio interpor recurso jurisdicional dirigido a este Tribunal tendo por objeto sentença proferida pelo Mmª. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, através do qual julgou improcedente a reclamação de atos do órgão da execução fiscal deduzida contra o despacho que fixou o valor base de venda do prédio penhorado no processo de execução fiscal n.º 2992201701008099, em € 309.248,24. A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: A. O presente recurso é interposto da Sentença proferida em 30.09.2022, a qual julgou improcedente a reclamação judicial deduzida contra o ato de fixação do valor base de venda do imóvel penhorado na execução fiscal sub iudicio. B. Em síntese, o tribunal a quo sumarizou do seguinte modo a sua pronúncia: "(1) A administração tributária deu inteiro cumprimento às prescrições dos artigos 248.° e 250.° do CPPT para a determinação do valor do prédio penhorado; (2) Constatando que o valor atribuído por perito especializado era inferior ao resultante do regime regra do VPT, fixou este último, em decisão que é, neste sentido, favorável à reclamante; (3) Não foram requeridos quaisquer esclarecimentos a endereçar ao perito especializado, mas antes que se aceitasse o valor decorrente da informação da imobiliária, o que não é legalmente possível, pelo que não se violaram quaisquer trâmites procedimentais devidos; (4) O ato reclamado tem fundamentação de facto e de direito suficiente e bastante". C. Ora, ressalvado o devido respeito, a Recorrente não pode sufragar tal entendimento, e desde logo porquanto o desiderato do legislador vai no sentido claro de que deve prevalecer, como valor de venda do imóvel, o seu valor de mercado, sob pena de estar-se a autorizar um camuflado «confisco», D. Ao permitir-se uma venda por valor significativamente menor (para mais, quando a própria lei fiscal consente que a venda se possa realizar por 70% de tal montante). E. Por outro lado, ainda, se é verdade que a AT fez uso do mecanismo previsto no n.° 2 do artigo 250.° do CPPT, fazendo intervir um perito para determinar a avaliação do imóvel, não menos verdade é que a aqui Recorrente imediatamente reclamou de tal avaliação. F. E reclamou precisamente de tal avaliação porque a mesma se socorreu de critérios sem apego legal e/ou qualquer justificação, ao que acresce que tal avaliação se baseou em pressupostos de facto completamente errados. G. Com efeito, e ao contrário do preconizado no relatório de avaliação, e na própria conjetura do Tribunal recorrido, não se percebe como foi realizada uma avaliação in loco e foram apenas identificados quatro armazéns, quando realmente existem cinco armazéns construídos e erigidos no prédio em causa (pese embora, um deles não esteja licenciado). H. Acresce que, tal como enfatizado pela Reclamante, logo que foi notificada do relatório do perito, a mesma contestou a validade de tal alegada avaliação, impugnando os seus pressupostos de facto, critérios empregues e falta de fundamentação, apresentando vários motivos para a sua rejeição, que aqui se reproduzem para os devidos efeitos legais: "M…, LDA., Executada no processo de execução fiscal identificado em epígrafe, tendo sido notificada do "relatório de avaliação", (...) vem, ao abrigo do princípio do contraditório e pronúncia, sem sua defesa, expor e requerer o seguinte: A avaliação requerida pela Executada (...) visa o apuramento rigoroso do valor de mercado/transação justa do bem imobiliário em causa. O relatório ora notificado não cumpre com tal pressuposto, e desde logo porquanto está viciado nos seus pressupostos e/ou métodos empregues. Em primeiro lugar, e ao contrário do ali mencionado, não se trata de terreno em que se encontram construídos 4 armazéns, mas sim terreno composto por 5 armazéns. Em segundo lugar, não se alcança o fundamento e viabilidade dos critérios elencados no ponto (5.1.5), nem o seu apoio legal, desconhecendo-se que lucro/risco é aquele a que é atribuída uma margem de 5%, assim como não é inteligível, nem legalmente aceitável, a imputação de uma depreciação imobiliária de 70%, porque na verdade não está definitivamente em causa, com a presente avaliação, a mensuração ou determinação de um qualquer valor contabilístico do imóvel, mas sim o seu valor de transação ou de mercado, a praticar no âmbito de uma venda livre e imediata. Desconhece-se igualmente das razões de aplicação da própria taxa de 70%, que não surge fundamentada. Igual crítica vale para o método de mercado adotado, porque se desconhece inteiramente que critérios legais e fundamentos foram acolhidos para determinar aquele preço unitário de 150,00m2, assim como nem sequer vê refletido o valor do próprio terreno, mas aparentemente só o valor das ditas construções dos armazéns. Termos em que se requer a V. Exa. que o valor proposto no relatório de avaliação não seja aceite pelo órgão da execução fiscal para efeitos de determinação do valor base de venda executiva, dado que não reflete o seu valor justo de venda (ou valor de mercado e/ou transação), nem está minimamente fundamentado, na lei, o valor assim apurado, devendo antes se considerar o valor proposto pela Executada, tendo por base a realizada por mediadora imobiliária, traquejada com o preço de mercado da realidade imobiliária subjacente". I. A despeito de iniciado tal procedimento de avaliação, sucede que a lei não foi obviamente aplicada, dentro da sua letra e sobretudo dentro do seu espírito (n.° 2 do artigo 250.° do CPPT), porque o que estava efetivamente em causa com a realização da dita avaliação era a determinação rigorosa do valor justo de mercado do bem imobiliário em causa. J. E não é pelo facto da AT a ter (também) desconsiderado (uma vez que na verdade tal avaliação não apresentava fidedignidade ou comparabilidade alguma), regressando ao critério do valor patrimonial tributário, que se cumpriu com o pressuposto identificado pelo legislador de promover a avaliação do justo valor. K. Na realidade, a lei exige que seja alcançado e determinado o valor venal do bem, ou apurado o seu valor justo de transação, e neste conspecto é certo que ficou claramente por demonstrar que o valor patrimonial tributário corresponde, afinal, ao valor justo do imóvel (com cinco armazéns nele construídos), apenas porque uma avaliação erradamente realizada apurou um valor ainda inferior a este último. L. Se porventura a avaliação realizada pelo perito tivesse respeitado os critérios da justa determinação do valor do imóvel penhorado (não com base no preço de custo de construção, mas com base no preço de venda), e por força disso fosse idoneamente mensurável e comparável, então, no limite, se superior, poderia ser aceite o valor patrimonial tributário. M. Mas nada disto ocorreu, sabendo-se até de antemão que, regra geral, e tal facto é notório e do conhecimento público, o valor patrimonial tributários dos imóveis está (expressivamente) abaixo do seu valor de mercado ou de transação. N. Ora, não apresentando o relatório suportado pelo perito nomeado um valor condizente com a justeza do montante venal ou preço de mercado do bem imobiliário em causa, não se pode ter por satisfeito o desiderato ínsito no artigo 250.°, n.° 2, do CPPT, O. Sob pena de autorizar-se, sem qualquer comprovação fiável, que o valor patrimonial tributário é, neste caso, efetivamente o valor superior - e só este a lei reserva como sendo o eleito para efeitos de fixação do valor base de venda. P. Aliás, sempre o princípio da descoberta material e do inquisitório, princípios práticos tão estimados no ordenamento jus-tributário (cf. artigo 58.° da LGT e artigo 50.° do CPPT) impõem, inexoravelmente, que se chegue à mesma conclusão, i.e., que a busca pela determinação do valor de mercado seja feita com critérios de verdade, objetividade e rigor. Q. E não pode deixar de se aplicar o princípio da proporcionalidade contido no artigo 18.° da CRP, ele mesmo arvorando-se como pedra angular da defesa do direito de propriedade e da justa venda coerciva dos bens penhorados, sob pena de estarmos perante um «confisco». R. E perante a crítica fundamentada ao relatório do perito, sempre se impunha à AT a realização de uma segunda perícia, ou pelo menos uma reavaliação pelo mesmo perito (até porque este ignorou [como é possível?] parte da realidade edificada no prédio em causa), ou no limite, o esclarecimento da avaliação promovida em face das questões colocadas pela proprietária-executada, S. Mas nada disto sucedeu, nem sequer se completando o procedimento de avaliação do bem imobiliário, com resposta fundamentada às questões pertinentes levantadas pela proprietária-executada, tendo a AT, de chofre e sem mais, rapidamente estabelecido como critério o valor patrimonial tributário, como sendo o justo - solução contrária à filosofia plasmada no n.° 2 do artigo 250.° e no artigo 50.° do CPPT, no artigo 58.° da LGT e artigos 18.°, n.° 2, e 62.° da CRP. T. Com efeito, a AT, não apenas não confrontou o perito com tais pedidos de esclarecimentos legítimos e pertinentes formulados pela Executada, a fim de aferir da bondade da avaliação promovida, conforme se lhe impunha U. Como igualmente decidiu prosseguir, mas sem fundamentar, com a fixação do valor base de venda indexado ao valor patrimonial tributário, em flagrante violação do disposto nos artigos 152.° e 153.° do CPA, até porque tal valor, nem reflete o proposto pela Executada, nem projeta o valor de avaliação indicado pelo perito nomeado. V. Tendo ainda e simultaneamente anunciado que «responderá» à aqui Recorrente sobre o seu requerimento que versava sobre a discussão em torno do valor de venda, mas sem informar quando, sendo certo que, com esta pronúncia, toma já decisão definitiva sobre tal questão... W. Numa manifestação de violação do dever de boa fé (cf. artigo 10.° do CPA), e postergação do dever de decidir [questão pendente e prévia] - cf. artigo 13.° do CPA. X. E apenas a conclusão do procedimento de avaliação, podia ter tido lugar, e ancorada na fundamentação factual e normativa que entendesse dar, a prolação da decisão de fixação do valor base de venda, porque tal procedimento estava na verdade unicamente dirigida para o apuramento do valor venal do bem imobiliário. Y. Ao proceder ao arrepio daquela devida tramitação prévia e necessária, assim como fundamental, inter alia, o despacho reclamado violou o consignado nos artigos 10.°, 114.°, n.° 2, alínea a), 151.°, n.° 1, alínea d), 152.° e 153.°, todos do CPA, artigos 58.° e 77.° da LGT, 50.° e 250.°. n.° 2, in fine, do CPPT, 18.°, 2 e 62.° da CRP, Z. E ao ter secundado tal entendimento, a sentença recorrida, permitindo que o procedimento de avaliação não fosse concluído, não fosse depurado dos erros materiais na sua génese (desconsiderando, inclusivamente, a existência de um armazém totalmente construído e edificado). AA. A assumido/defendido que bastaria à AT indicar, sem mais e a posteriori, o valor patrimonial tributário para o (artificialmente, e sem prova suficiente) igualar ao valor justo de mercado, incorreu na violação de tais identificadas normas, não se podendo manter na ordem jurídica, BB. Com efeito, não pode é autorizar-se que a AT, sem concluir um procedimento de avaliação (interrompido), e sem demonstrar efetivamente que o valor patrimonial tributário selecionado é superior ao valor de mercado do bem imóvel, possa erigir aquele como sendo o valor justo a considerar-se, pois nesse caso a lei não foi cumprida, CC. Exatamente porque não existe qualquer presunção «legal» de que o valor patrimonial tributário exprime o valor de mercado dos bens imobiliários (bem pelo contrário), e tal prova (que competia à AT realizar) ficou por fazer- se. Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com o mui douto amparo de V. Exas., requer-se, pelos fundamentos ex ante expostos, a revogação da sentença recorrida, e nessa medida, determinar-se a ilegalidade do ato reclamado, com a consequente obrigação da AT de repetir a promoção de um procedimento de avaliação fidedigno e completo para apuramento do valor justo e de mercado do bem imóvel penhorado nos presentes autos, com todas as necessárias consequências legais, assim se fazendo a devida e costumeira JUSTIÇA.” *** A Recorrida produziu contra-alegações, com as seguintes conclusões: “A) A sentença recorrida considerou todas as questões colocadas, e respondeu cabalmente ao peticionado, com justa fundamentação de facto e de Direito, tendo sopesado cuidadosamente os aspetos a abordar; B) A recorrente pretende afirmar que (1) a atuação da Autoridade Tributaria e Aduaneira não respeitou o plasmado no artigo 250.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT); e (2) que houve falta de fundamentação do ato praticado pela AT; C) Embora sem concretizar qual a parte da sentença em que julga ter ocorrido erro de julgamento, vem referir novamente o que antes afirmou na petição inicial; que o procedimento de avaliação não foi completado, que o que requereu não foi atendido, que o ato não está fundamentado, e que padece de um erro por existirem cinco armazéns e não quatro. D) Evidentemente, o Tribunal a quo concluiu de modo diferente: «(1) A administração tributária deu inteiro cumprimento às prescrições dos artigos 248.º e 250.º do CPPT para a determinação do valor do prédio penhorado; (2) Constatando que o valor atribuído por perito especializado era inferior ao resultante do regime regra do VPT, fixou este último, em decisão que é, neste sentido, favorável à reclamante; (3) Não foram requeridos quaisquer esclarecimentos a endereçar ao perito especializado, mas antes que se aceitasse o valor decorrente da informação da imobiliária, o que não é legalmente possível, pelo que não se violaram quaisquer trâmites procedimentais devidos; (4) O ato reclamado tem fundamentação de facto e de direito suficiente e bastante»; E) A executada tinha apresentado um documento denominado «Informação/Opinião de valor», elaborado por uma sociedade imobiliária, onde se afirma que «A área construída é composta por 4 armazéns em bom estado de conservação e em pleno funcionamento» e que «o valor que apontamos como oportuno e indicado para o complexo é de 700.000,00 Assim apurado: - 150.000,00 para cada armazém; - 100.000,00 atribuídos ao logradouro por apresentar boas perspetivas de alargamento da construção para outras unidades de armazenamento» (realce nosso); F) Nos termos do n.º 2 do artigo 250.º do CPPT foi solicitada a emissão de parecer técnico de um perito especializado e registado na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, tendo este perito elaborado um relatório que determinou o valor de mercado do imóvel em €255.000,00; G) Determinou o Tribunal a quo que «Depois de notificar a ora reclamante e o seu mandatário do relatório exarado pelo perito, por ofícios de 11/01/2022 e 13/01/2022 (I do probatório), foi proferido, em 24/01/2022, despacho pelo chefe de divisão de Tributação e Justiça tributária da DF de Ponta Delgada que fixou para a venda o preço base de licitação em € 309.248,24, ou seja, 70% do VPT de € 441.783,20 correspondente ao direito detido pela executada, considerando que o valor resultante do Parecer Técnico é inferior ao VPT do imóvel a vender (J do probatório)». H) Apurou a sentença que «a reclamante, em 31/01/2022, através de correio eletrónico remetido para a DF de Ponta Delgada, pronunciou-se sobre o relatório de avaliação, apontando-lhe erros nos pressupostos e métodos empregues, tendo concluído a sua pronúncia formulando o seguinte pedido: Termos em que se requer a V. Exa. que o valor proposto no relatório de avaliação não seja aceite pelo órgão da execução fiscal para efeitos de determinação do valor base de venda executiva, dado que não reflete o seu valor justo de venda (ou valor de mercado e/ou transação), nem está minimamente fundamentado, na lei, o valor assim apurado, devendo antes se considerar o valor proposto pela Executada, tendo por base a avaliação realizada por mediadora imobiliária, traquejada com o preço de mercado da realidade imobiliária subjacente (K do probatório)», pelo que «ao contrário do que sustenta na presente reclamação, a reclamante não formulou qualquer pedido de esclarecimento a dirigir ao perito, mas antes requereu que o valor proposto no relatório não fosse aceite e se considerasse a avaliação da empresa imobiliária, que a executada havia remetido ao órgão de execução fiscal» (sublinhado nosso); I) Verificou o Tribunal a quo que «tal não é possível, face ao disposto no artigo 250.º do CPPT, pois que os prédios urbanos são avaliados para efeito de venda de uma de duas maneiras: ou pelo seu VPT; ou com recurso a parecer técnico de um perito especializado e registado na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, como aliás decorre dos n.ºs 1, alínea a) e 2 deste preceito. O que não pode suceder é a avaliação do prédio ser sustentada em parecer particular que o executado remete, pois que tal forma não tem qualquer consagração legal. E assim parece ser de concluir que, no que tange ao procedimento, a administração tributária deu inteiro cumprimento às prescrições legais. (1) Primeiro propôs a avaliação do prédio através do regime regra previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 250.º do CPPT; (2) A requerimento da executada, desencadeou a avaliação do prédio através de perito especializado e registado na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, (3) Considerando que o valor atribuído pelo perito no seu relatório foi inferior ao obtido pelo regime regra, ou seja, pelo VPT, determinou o valor base de licitação do prédio correspondesse a 70% do VPT, como impõem as regras dos n.ºs 1 e 5 do artigo 250.º do CPPT. Naturalmente que não podia ter dado deferimento ao requerido pela executada, de considerar o valor indicado na informação da imobiliária que fez juntar aos autos, por a lei o não consentir, como vimos. E assim a administração tributária não incumpriu qualquer trâmite procedimental, pois que nada que o impusesse lhe foi requerido, tendo ao invés dado inteiro cumprimento ao que está legalmente prescrito no artigo 248.º e 250.º do CPPT. Mais diremos que em parte alguma a lei determina que se o valor indicado pelo perito especializado for inferior ao que resultaria do VPT, será esta a ter em conta, pelo que a decisão reclamada, é neste sentido, favorável à reclamante». J) A recorrente não apontou erros de análise concretos à sentença do Tribunal a quo, nem em sede de factos comprovados, nem em termos de enquadramento e subsunção dos factos ao Direito, pretendendo apenas um novo julgamento sobre os fundamentos do requerimento que elaborou e dirigiu à Administração Fiscal, olvidando-se que apenas requereu que a Autoridade Tributária e Aduaneira acolhesse a avaliação particular que tinha entregue, elaborada por uma sociedade imobiliária, denominada «Informação/Opinião de valor», em detrimento do valor obtido pelo perito credenciado pela Comissão de Mercados de Valores Mobiliários; K) Evidentemente, não podia a Administração Fiscal ter comportamento diferente do que assumiu, sendo a (2) falta de fundamentação do ato praticado pela AT inexistente, porque o ato reclamando «tem a fundamentação necessária e bastante para que o seu destinatário, in casu, a ora reclamante, possa apreender o seu iter cognoscitivo e valorativo e o seu preciso sentido e alcance», conforme determinou o Tribunal a quo, pois «O ato impugnado refere expressamente os seus pressupostos de facto e de direito, a saber, porque a avaliação do perito foi inferior à que resulta do VPT, foi fixado como valor base o que resulta do VPT, nos termos do artigo 250º nºs 1- al. a), 2 e 5 do CPPT, indicando-se esse valor. Da mesma forma que na notificação se refere que o valor base foi fixado em € 309.248,24, de acordo com o determinado no n.º 2 do artigo 248.º do CPPT, donde se retira uma remissão direta para a alínea a) do n.º 1 e n.º 5 do artigo 250.º». L) A ora recorrente afirma uma vez mais que o relatório do perito apenas considerou a existência de quatro armazéns quando a realidade fáctica – alegadamente – consistiria em cinco armazéns, ponto em que anteriormente também tinha guindado os seus argumentos, aportando agora a novidade de o quinto armazém existir no terreno, sem ter a sua construção legalizada, o que nunca comprovou e é denegado pela «Informação/Opinião de valor», e pelos restantes elementos do processo, pois todos os elementos juntos, quer pela reclamante, quer pelo perito especializado registado na Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, apontam para a existência de apenas quatro armazéns, não tendo a reclamante produzido qualquer prova que negue este facto, pelo que a recorrente não detém qualquer fundamento para que veja a sua posição acolhida, devendo manter-se a decisão do Tribunal a quo nos seus exatos termos, por não padecer de qualquer mácula. Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exas., VENERANDOS DESEMBARGADORES, doutamente suprirão, deverá ser negado provimento ao presente recurso, sendo confirmada na ordem jurídica a sentença recorrida, assim se fazendo a costumada Justiça!” *** O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao presente recurso. *** Com dispensa de vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, vêm os autos à conferência para decisão. *** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos: A- Em 31/01/2017, em nome da ora reclamante, no Serviço de Finanças de Ponta Delgada, foi instaurado o processo de execução fiscal (PEF) n.º 2992201701008099, com base na certidão de dívida n.º 2017/143556, emitida em 31/01/2017, que atesta dívidas de IRC, de 2012, no montante de € 44.369,76, com data limite para pagamento voluntário em 11/01/2017. (Petição Inicial (51491) Documentos da PI (004257343) de 28/06/2022 20:02:29) B- Através da apresentação 1914, de 24/11/2017, na Conservatória de Registo Predial de Lisboa, foi registada a penhora, a favor da Fazenda Nacional, do prédio urbano inscrito, sob o artigo 7…, na matriz predial urbana da freguesia de Cabouco, município de Lagoa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagoa sob o n.º 459/19941206, propriedade da reclamante, no âmbito do PEF n.º 2992201701008099. (Requerimento (51630) Processo Administrativo "Instrutor" (004258290) Pág. 81 de 18/07/2022 13:28:41) C- Em 06/09/2021 pelo chefe de divisão de Tributação e Justiça tributária da Direção de Finanças (DF) de Ponta Delgada, foi proferido o seguinte despacho: No uso da competência delegada no ponto 3.13 do despacho de 2020.08.31, do Senhor Diretor de Finanças de Ponta Delgada, designo o dia 24-11-2021, nesta Direção de Finanças, pelas 10:00 horas (hora dos Açores), para a venda judicial nº 2992.2018.1, através da modalidade leilão eletrónico nos termos do artº. 248º.-1-2 CPPT, do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cabouco, Concelho Lagoa (Açores), sob o art.º 7…, penhorado nos autos, devendo os interessados enviar as suas propostas através do site www.e-financas.gov.pt/vendas, cujo leilão decorre durante os 15 dias anteriores e até às 10:00 horas (hora dos Açores) do dia designado para a venda. D- Em 28/10/2021, através de correio eletrónico, a reclamante apresentou requerimento dirigido ao Chefe do Serviço de Finanças (SF) do Ponta Delgada, com Assunto: Venda Judicial – artigo 248.º CPPT, que se dá por reproduzido e de que se extrai o seguinte:
(Petição Inicial (51491) Documentos da PI (004257344) Pág. 3 de 28/06/2022 20:02:29) E- Com data de 29/10/2021 foi elaborado ofício subscrito pelo chefe de divisão de Tributação e Justiça tributária da DF de Ponta Delgada, dirigido à reclamante, com Assunto: Venda Judicial – artigo 248.º CPPT, que se dá por reproduzido e de que extrai o seguinte: Compulsado o requerimento remetido por e-mail para esta Direção de Finanças em 28-10-2021, no qual é requerida a promoção da avaliação do imóvel penhorado nos termos do n.° 2 do artigo 250.° do CPPT. resulta que não foi junta qualquer prova que suporte o alegado, mormente quanto ao valor estimado de mercado num valor nunca inferior a € 700.000,00. F- Em 19/11/2021, através de mensagem de correio eletrónico, a reclamante, em resposta à comunicação referida no ponto anterior, veio juntar aos autos documento intitulado Informação / Opinião de valor, subscrito por entidade denominada S…, Unip., Ld.ª, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, do qual se destaca o seguinte: “IMÓVEL ARTIGO URBANO 2… G- Em 22/11/2021, por despacho do chefe de divisão de Tributação e Justiça tributária da DF de Ponta Delgada, foi acolhida a proposta de deferimento da pretensão da executada, determinando-se que o valor para venda do bem imóvel fosse apurado com recurso a parecer técnico de um perito especializado e registado na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, nos termos do n.º 2 do artigo 250.º do CPPT. (Petição Inicial (51491) Documentos da PI (004257344) Pág. 6 de 28/06/2022 20:02:29) H- Em 10/01/2022, pelo perito avaliador A…, com número de registo junto da CMVM AVFII/12/065, foi elaborado documento denominado Relatório de Avaliação, respeitante ao prédio referido em B, que se dá por reproduzido e de que se extrai o seguinte: 1. Introdução I- O Relatório de Avaliação referido no número anterior foi enviado à ora reclamante e ao seu mandatário, através dos ofícios da DF de Ponta Delgada n.ºs 410 00175, de 13/01/2022 e n.º 410 00102, de 11/01/2022, respetivamente. (Petição Inicial (51491) Documentos da PI (004257344) Pág. 35 de 28/06/2022 20:02:29 e Petição Inicial (51491) Documentos da PI (004257344) Pág. 33 de 28/06/2022 20:02:29) J- Em 24/01/2022 foi proferido despacho pelo chefe de divisão de Tributação e Justiça tributária da DF de Ponta Delgada, aposto sobre informação dos serviços, de que se extrai o seguinte: No uso da competência delegada no ponto 3.13 do despacho de 2020.08.31, do Senhor Diretor de Finanças de Ponta Delgada, designo o dia 03-03-2022, nesta Direção de Finanças, pelas 10:00 horas (hora dos Açores), para a venda judicial, através da modalidade leilão eletrónico nos termos do artº.248º.-1-2 CPPT, do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cabouco, Concelho Lagoa(Açores), sob o art.º 7…, penhorado nos autos, devendo os interessados enviar as suas propostas através do site www.e-financas.gov.pt/vendas, cujo leilão decorre durante os 15 dias anteriores e até às 10:00 horas (hora dos Açores) do dia designado para a venda. De acordo com o art.º 250º nºs 1- al. a), 2 e 5 do C.P.P.T. fixo para a venda o preço base para licitação em € 309.248,24, ou seja, 70% do V.P.T. de € 441.783,20 correspondente ao direito detido pela executada, considerando que o valor resultante do Parecer Técnico previsto no nº.2 da citada norma legal é inferior ao VPT do imóvel a vender. Publicite-se a venda, conforme o estipulado no art.º 249º do mesmo código, divulgando-se na Internet. Citem-se os credores com garantia real registados, caso existam bem como os credores desconhecidos e sucessores dos credores preferentes, nos termos dos nºs e 2 do art.º 239º do C.P.P.T., para reclamarem os seus créditos no prazo de 15 dias a contar da citação, conforme prescreve o artigo 240º do mesmo Código. K- Em 31/01/2022, através de correio eletrónico remetido para a DF de Ponta Delgada, a reclamante pronunciou-se sobre o relatório de avaliação, extraindo-se da sua comunicação o seguinte: M…, LDA., Executada no processo de execução fiscal identificado em epígrafe, tendo sido notificada do "relatório de avaliação", através do qual se apurou um valor de mercado do imóvel de €255.000,00, vem, ao abrigo do princípio do contraditório e pronúncia, sem sua defesa, expor e requerer o seguinte: L- Com data de 01/02/2022, a DF de Ponta Delgada elaborou ofício dirigido ao mandatário da reclamante, de que se extrai o seguinte: Fica por este meio notificado, na qualidade de mandatário da executada e proprietária do bem penhorado, com artigo matricial urbano n.º 7…, da freguesia de Cabouco, concelho de Lagoa (S. Miguel), no processo de execução fiscal suprarreferido, de que no dia 2022-04-02, pelas 10:00 horas (hora dos Açores GMT-1) e nesta Direção de Finanças, se irá decidir sobre a adjudicação do bem, por venda judicial em leilão eletrónico. *** A decisão recorrida consignou como factualidade não provada: “Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa.” *** Constando como motivação da matéria de facto que: “A decisão da matéria de facto efetuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, conforme é especificado nos vários pontos da matéria de facto provada.” *** III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada que julgou improcedente a reclamação deduzida contra o despacho que fixou o valor base de venda judicial em leilão eletrónico, do prédio penhorado no processo de execução fiscal n.º 2992201701008099, em €309.248,24. Cumpre, desde já, relevar em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, que as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre analisar se a sentença padece de erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, na medida em que: - Foi preterido o regime e os pressupostos consignados no artigo 250.º do CPPT, desonerando-se a AT da finalização do procedimento de avaliação em curso; - Descurou a apresentação de reclamação quanto ao relatório do perito avaliador; - Interpretou, erradamente, a expressão quantitativa dos bens imóveis objeto de venda, violando, outrossim, princípios constitucionais basilares, mormente, da proporcionalidade e da boa fé; - Não foi ponderada, devidamente, a atuação da AT, a qual desrespeitou o princípio do inquisitório; - O despacho reclamado não se encontra formalmente fundamentado. Apreciando. De relevar, ab initio, que a Recorrente não impugna a matéria de facto, não requerendo qualquer aditamento por complementação, substituição ou supressão, ao abrigo do artigo 640.º do CPC, encontrando-se, nessa medida, a mesma devidamente estabilizada. Nessa medida, importa, então, atentar no convocado erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito. A Recorrente alega que não foi cumprido o regime normativo atinente ao efeito, desde logo porque o desiderato do legislador vai no sentido claro de que deve prevalecer, como valor de venda do imóvel, o seu valor de mercado, até porque admite-se a venda por valor significativamente menor, concretamente 70%. Mais advogando que, de todo o modo, foi desvirtuada a realidade imóvel em apreciação, na medida em que foram avaliados quatro armazéns, quando os mesmos são cinco, sendo, igualmente, negligenciada a apresentação de reclamação concernente ao relatório do perito. Adensando, ainda, que se a avaliação realizada pelo perito tivesse respeitado os critérios da justa determinação do valor do imóvel penhorado mediante atendibilidade ao preço de venda, por idoneamente mensurável e comparável, então, no limite, se superior, poderia ser aceite o VPT, não podendo, assim, dar-se por cumprido o plasmado no artigo 250.º, nº2, do CPPT. Sindica, in fine, a violação dos princípios do inquisitório, da proporcionalidade, da boa fé e bem assim a falta de fundamentação formal do ato reclamado. Dissente a Recorrida, propugnando pela manutenção da decisão na medida em que não se verificam nenhuma das aduzidas preterições e vícios, mormente, qualquer errónea interpretação dos pressupostos subjacentes à realidade imóvel em avaliação. Sufragando, outrossim, que a Recorrente descura que se limitou a apresentar um documento particular elaborado por uma sociedade de mediação imobiliária, denominado «Informação/Opinião de valor», o qual pretende, sem qualquer fundamento legal, que prevaleça ao valor obtido pelo perito credenciado pela Comissão de Mercados de Valores Mobiliários (CMVM). O Tribunal a quo, por seu turno, esteou a procedência com base nas seguintes conclusões: "(1) A administração tributária deu inteiro cumprimento às prescrições dos artigos 248.° e 250.° do CPPT para a determinação do valor do prédio penhorado; (2) Constatando que o valor atribuído por perito especializado era inferior ao resultante do regime regra do VPT, fixou este último, em decisão que é, neste sentido, favorável à reclamante; (3) Não foram requeridos quaisquer esclarecimentos a endereçar ao perito especializado, mas antes que se aceitasse o valor decorrente da informação da imobiliária, o que não é legalmente possível, pelo que não se violaram quaisquer trâmites procedimentais devidos; (4) O ato reclamado tem fundamentação de facto e de direito suficiente e bastante". Vejamos, então, começando por convocar o quadro normativo que releva para a apreciação da questão. Estatui, desde logo, o artigo 248.º do CPPT, com a redação conferida pela Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro, relativamente à venda de bens penhorados, e epigrafado de “regra geral”, que: “1 - A venda é feita preferencialmente por meio de leilão eletrónico ou, na sua impossibilidade, de propostas em carta fechada, nos termos dos números seguintes, salvo quando o presente Código disponha de forma contrária. 2 - A venda é realizada por leilão eletrónico, que decorre durante 15 dias, sendo o valor base o correspondente a 70 % do determinado nos termos do artigo 250.º.” Mais preceitua, o artigo 250.º do CPPT, com a redação conferida pela Lei n.º 7/2021, de 26 de fevereiro, sob a epígrafe de “valor dos bens para venda”, e na parte que, ora, releva, o seguinte: “1 – O valor base para venda é determinado da seguinte forma: a) Os imóveis urbanos, inscritos ou omissos na matriz, pelo valor patrimonial tributário apurado nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI); b) Os imóveis rústicos, pelo valor patrimonial atualizado com base em fatores de correção monetária, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, ou pelo valor de mercado, quando superior; c) Os móveis, pelo valor que lhes tenha sido atribuído no auto de penhora, salvo se outro for apurado pelo órgão da execução fiscal, podendo esse apuramento ser precedido de parecer técnico solicitado a perito com conhecimentos técnicos especializados. 2 - Sem prejuízo da determinação do valor dos bens imóveis para venda nos termos do número anterior, quando se mostre evidente que o valor de mercado dos bens é manifestamente superior ao apurado por aquelas regras, a requerimento do executado ou por iniciativa do órgão de execução fiscal pode ainda recorrer-se à determinação do valor com recurso a parecer técnico de um perito especializado e registado na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, seguindo-se a demais tramitação do processo.” Ora, da conjugação dos normativos supra expendidos, resulta que, regra geral, a venda de bens penhorados é concretizada mediante leilão eletrónico, correspondendo o valor base de venda a 70 % do VPT, ressalvada a situação em que se mostre evidente que o valor de mercado dos bens é manifestamente superior ao VPT. Deriva, assim, que o valor base de venda se coaduna, primacialmente, com o VPT, só podendo ser afastado caso seja evidente-mediante procedimento de avaliação, com densidade vinculativa, e materializado por entidade devidamente credenciada para o efeito- que o valor de mercado dos bens é manifestamente superior ao VPT. Feitas estas considerações iniciais, atentemos, então, se no caso vertente foram, conforme sustentado pela Recorrente, incumpridas as aludidas formalidades, e erroneamente interpretados os pressupostos de facto e de direito concatenados com a avaliação. Para o efeito, convoquemos a realidade fática que resultou provada e plasmada no probatório. Resulta assente que na sequência de instauração do processo de execução fiscal n.º 2992201701008099, respeitante à cobrança coerciva de dívidas de IRC, do exercício de 2012, no montante de € 44.369,76, e falta de cumprimento do mesmo, foi registada penhora, a favor da Fazenda Nacional, do prédio urbano inscrito, sob o artigo 7…, na matriz predial urbana da freguesia de Cabouco, município de Lagoa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lagoa sob o n.º 4…/199…….. Em conformidade com a tramitação do processo executivo, a 6 de setembro de 2021, foi proferido despacho pelo chefe de divisão de Tributação e Justiça tributária da Direção de Finanças de Ponta Delgada, no qual se designava, entre o mais, o dia 24 de novembro de 2021, para realização da venda judicial do bem imóvel supra descrito, através da modalidade de leilão eletrónico, fixando-se como valor base para licitação o montante de €309.248,24, correspondente a 70% do VPT, de €441.783,20. Face à notificação do aludido despacho, a ora Recorrente, apresentou requerimento no qual alegava que a fixação do valor de venda se encontrava grosseira e ostensivamente desalinhada do valor de mercado, o qual se cifrava em valor não inferior a €700.000,00, requerendo, por conseguinte, que fosse promovida a avaliação do bem imóvel penhorado, em ordem à determinação do seu justo valor e de mercado, em cumprimento do consignado no n. º 2, do artigo 250. º, do CPPT. No dia subsequente e em resposta ao requerimento supra evidenciado, o órgão da execução fiscal -compulsada a inexistência de qualquer suporte documental que atestasse o valor de mercado do bem propugnado pela parte- concedeu prazo para junção de prova atinente ao efeito, tendo a Requerente, ora Recorrente, procedido à junção de documento intitulado “Informação/Opinião de valor”, subscrito por entidade denominada “S…, Unip., Ld.ª”, no qual alvitrava o valor de mercado em montante não inferior a €700.000,00. Por seu turno, a 22 de novembro de 2021, e conformidade com o peticionado pela Requerente, o órgão da execução fiscal promoveu que o valor de venda do bem imóvel fosse apurado com recurso a parecer técnico de um perito especializado e registado na CMVM, nos termos do n.º 2, do artigo 250.º, do CPPT, o que logrou efeito útil mediante a prolação, a 10 de janeiro de 2022, do respetivo relatório de avaliação pelo perito avaliador A…, com número de registo junto da CMVM AVFII/12/065, o qual mediante elenco de considerandos iniciais, e de acordo com as caraterísticas do imóvel, particularmente, localização, composição, caraterísticas, descrição, compartimentação dos bens imóveis em contenda e concreta atendibilidade ao ano e estado de construção, atestou o correspondente valor de mercado. Promanando ainda, neste e para este efeito, que para efeitos de avaliação foram utilizados o Método do Custo e o Método do Mercado, obtendo-se, em concreto, o valor de mercado de €255.315,94 e de €254.400,00, respetivamente. E bem assim que, o aludido Relatório de Avaliação foi notificado à Requerente, ora Recorrente, e ao respetivo mandatário legal. Tendo, nessa conformidade, sido proferido despacho pelo chefe de divisão de Tributação e Justiça Tributária da Direção de Finanças de Ponta Delgada, mediante informação instrutora, com a designação da data da venda judicial do bem em contenda, e concreta fixação do seu valor de venda a qual foi justificada, de facto e de direito, nela constando a expressa asserção que a fixação “em € 309.248,24, ou seja, 70% do V.P.T. de €441.783,20 correspondente ao direito detido pela executada” se encontra coadunada com a circunstância de que “o valor resultante do Parecer Técnico previsto no nº.2 da citada norma legal é inferior ao VPT do imóvel a vender.” Motivando, ulteriormente, a apresentação de requerimento, por parte da ora Recorrente, no qual peticionava que “[o] valor proposto no relatório de avaliação não seja aceite pelo órgão da execução fiscal para efeitos de determinação do valor base de venda executiva, dado que não reflete o seu valor justo de venda (ou valor de mercado e/ou transação), nem está minimamente fundamentado, na lei, o valor assim apurado, devendo antes se considerar o valor proposto pela Executada, tendo por base a avaliação realizada por mediadora imobiliária, traquejada com o preço de mercado da realidade imobiliária subjacente.” Tendo, in fine, e após a conclusão do aludido procedimento sido elaborado ofício dirigido ao mandatário da Recorrente, visando a notificação do agendamento de venda judicial em leilão eletrónico, para o dia 02 de abril de 2022, e fixação do valor de venda de prédio em €309.248,24, em ordem ao consignado no artigo 248.º, nº2 do CPPT. Ora, face à tramitação supra expendida ajuizamos que o Tribunal a quo terá interpretado adequada e acertadamente a realidade fática em contenda à luz do quadro normativo vigente, não procedendo os vícios arguidos pela Recorrente. Senão vejamos. Contrariamente ao alegado pela Recorrente, no caso em apreço foi, efetivamente, cumprido o regime normativo atinente ao efeito, porquanto a AT fixou, em primeira linha, e em conformidade com a regra geral consignada no citado normativo 248.º do CPPT, o valor do bem imóvel de acordo com o VPT determinado para o efeito, e em razão da percentagem plasmada na lei. Sendo que, face ao requerido pela Requerente, e por forma a aquiescer do concreto valor de mercado, primeiro concedeu prazo para a Requerente certificar e atestar o valor de mercado que entendia, “ostensiva e grosseiramente” desfasado do correspondente VPT, e posteriormente, cumpriu o regime consignado no artigo 250.º, nº2, do CPPT, requerendo a avaliação por entidade idónea para o efeito, concretamente por perito avaliador registado junto da CMVM. Ulteriormente, munido do relatório de avaliação que cifrava um valor de mercado de €255.000,00, e cotejando-o com o VPT, que no caso se cifrava em €441.783,20, fixou o valor do bem em €309.248,24, correspondente a 70% desse VPT, elucidando, de forma expressa, que tal determinação teve na génese, justamente, esse confronto e cotejo. Ora, atentando no supra descrito não se vislumbra qualquer irregularidade na fixação do aludido valor de venda do bem imóvel, o qual respeitou o respetivo regime legal. Note-se, neste concreto particular, que o desiderato do legislador se coaduna com a derrogação da fixação do valor do bem em função do VPT, apenas quando seja demonstrado, de forma idónea e fidedigna -mediante avaliação materializada por perito registado junto da CMVM- que ateste que é evidente que o valor de mercado dos bens é manifestamente superior ao VPT. Dir-se-á, portanto, que nos encontramos perante um procedimento específico, estritamente vinculado, e sem qualquer margem de discricionariedade, que apenas permite a ab-rogação do regime regra -como visto, fixação de acordo com o VPT e mediante atendibilidade do correspondente valor legal percentual- em situações perfeitamente patenteadas, ou seja, utilizando-se a formulação constante na lei, em situações “evidentes” da qual resulta que o valor de mercado é “manifestamente” superior ao VPT. Logo, contrariamente ao expendido pela Recorrente, os critérios positivados no citado artigo 250.º do CPPT, não impõe a consideração do valor de mercado, definindo, ao invés e por regra, em relação aos bens imóveis, a consideração do VPT e, excecionalmente, do valor de mercado. Por outro lado, e no atinente aos pressupostos de facto e contrariamente ao aduzido pela Recorrente, não se vislumbra, desde logo, que o relatório de avaliação tenha computado, erradamente, a realidade imóvel em avaliação, mormente, na sua expressão quantitativa, porquanto não resulta, de todo, demonstrado que os armazéns a avaliar se cifrassem em cinco e não em quatro, como ponderados pelo perito avaliador da CMVM. Note-se que, a inexistência dessa errada ponderação está, desde logo, em conformidade com o suporte documental carreado aos autos pela parte (alínea F), no qual existe expressa assunção da existência de quatro armazéns, e em clara desconformidade com o, ora, aduzido. Com efeito, do aludido documento consta, expressamente, a seguinte menção “a área construída é composta por 4 armazéns em bom estado de conservação e em pleno funcionamento.” Acresce, outrossim, que o perito avaliador certifica no aludido relatório que se deslocou ao local, concretamente, no dia 07 de janeiro de 2022, juntando as correspondentes fotografias, as quais permitem inferir nesse e para esse efeito, não tendo a Requerente, ora Recorrente, contestado e apartado tal realidade fática, mediante o correspondente e idóneo suporte documental atinente ao efeito. De sublinhar, in fine, que, de todo o modo, não pode lograr provimento a argumentação concatenada com a realidade física erigida se a mesma não se encontra, como aduz, licenciada. Com efeito, para efeitos de avaliação do bem imóvel o que importa é a realidade que se encontra legalizada e licenciada para o efeito não podendo, naturalmente, ser relevadas realidades que não se encontram aptas e em conformidade. Mais importa relevar, neste concreto particular, que não se perceciona de que forma é avançado pela Recorrente que o relatório apresentado pelo perito nomeado não apresenta valor condizente com a justeza do montante venal ou preço de mercado do bem imobiliário em causa, na medida em que o Relatório de Avaliação expendeu, de forma circunstanciada os valores apurados, mediante a convocação de dois métodos distintos, concretamente, método de construção e método do mercado. Sendo completamente infundada a afirmação de que o Perito se socorreu de “critérios sem apego legal e/ou qualquer justificação”, bastando, para o efeito, uma leitura aturada do respetivo Relatório de Avaliação. Com efeito, atentando no mesmo, é desde logo, referenciado que “os armazéns são de construção tradicional, com alguns elementos em betão armado, cobertura em telha metálica, apresentando acabamentos modestos para o uso. Os armazéns apresentam um estado de conservação baixo carecendo de intervenções de reabilitação.” Explicitando, depois, detalhadamente os métodos adotados e os elementos computados para o efeito, justificando que através do método do custo, o valor do mercado do imóvel é calculado como o valor que teria se fosse construído de novo, no mesmo local, com os mesmos materiais e sujeito aos efeitos de vetustez visíveis à data da avaliação, enquanto no método de mercado, o mesmo permite a obtenção do valor do bem por recurso aos indicadores do mercado. Convocando, in fine, pormenorizadamente, os elementos computados para o efeito, e a concreta expressão final do valor apurado em cada um deles. Mais cumpre sublinhar que, o mesmo tem suporte e fundamento legal na Lei nº 153/2015, de 14 de setembro, mormente, no artigo 20.º do citado diploma legal, e respetivo anexo-aliás, em consonância com o nele, expressamente plasmado-. Pelo que, não pode lograr provimento a argumentação de que o Relatório de Avaliação não tem fundamento, e assenta em pressupostos erróneos, e menos ainda que o mesmo poderia ser preterido em razão da junção de um documento “opinativo”, realizado por uma sociedade de mediação imobiliária sem credenciação para a realização de avaliações oficiais e idóneas, e sem consagração legal. De relevar, neste particular, que de acordo com o artigo 2.º da Lei 153/2015, de 14 de setembro, só pode exercer a atividade de perito avaliador de imóveis quem estiver habilitado para o efeito através de registo na CMVM, sendo que se encontra, expressamente, consagrada incompatibilidade de exercício de funções aos peritos avaliadores de imóveis que prestem, em acumulação de serviços, consultoria ou de mediação imobiliária (artigo 19.º, alínea g), da aludida Lei). No caso vertente, a AT socorreu-se do trâmite previsto na lei, e requereu a avaliação mediante a convocação de perito registado junto da CMVM, inexistindo, assim, as aduzidas preterições. Sublinhe-se, ademais, que conforme resulta do probatório foi dada oportunidade à Requerente de juntar prova documental que atestasse o valor de mercado por si avançado, concretamente, em valor não inferior a €700.000,00, tendo a mesma se limitado a juntar o aludido documento, o qual, como visto, é inidóneo para o efeito, não podendo, naturalmente, granjear provimento a alegação atinente ao “traquejo”, no sentido de que deve ser considerado o “valor proposto pela Executada, tendo por base a realizada por mediadora imobiliária, traquejada com o preço de mercado da realidade imobiliária subjacente”. Carecendo, igualmente, de relevância a assunção de que é facto notório de que os VPT são inferiores aos valores de mercado, desde logo, porque a determinação do VPT é casuística, não podendo, per se, ser generalizada e mais ainda ser entendida como facto notório. No concernente, ainda, à aduzida preterição de formalidade essencial concatenada com a falta de conclusão do procedimento de avaliação e com a agilização da reclamação ulteriormente apresentada, cumpre referir que não assiste, igualmente, razão à Recorrente, e isto porque, face a todo o expendido anteriormente é por demais evidente que o procedimento de avaliação foi concluído com o aludido relatório, devidamente notificado à Requerente, ora, Recorrente, não prevendo a lei qualquer emanação de projeto de relatório de avaliação, ou realização de segunda perícia. Com efeito, nos aludidos procedimentos e conforme resulta expresso da letra do artigo 250.º do CPPT, o procedimento de avaliação é realizado, por regra, a pedido da parte, dando a AT início ao mesmo mediante convocação de perito registado junto da CMVM, o qual após nomeação, analisa o imóvel, adota os métodos que repute convenientes para a realidade imóvel em apreço, e elabora o competente relatório de avaliação o qual é notificado à parte. Ulteriormente, a AT cotejando os resultados do relatório de avaliação com o VPT determinado nos termos do CIMI, afere, casuisticamente, se a desproporção é evidente, donde se o valor de mercado dos bens é manifestamente superior ao VPT. Em caso afirmativo, adota o valor de mercado decorrente da avaliação, em sentido negativo, mantém a regra e adota o VPT, na cifra legal percentual. Ora, foi, exatamente, esse o procedimento adotado pela AT, sendo ainda de sublinhar que não só não se encontra prevista qualquer reclamação do relatório de avaliação, na medida em que qualquer ilegalidade atinente ao mesmo pode ser discutida contenciosamente no despacho que fixe o seu valor, como, in casu, e conforme resulta inequívoco do probatório, a Recorrente não apresentou qualquer reclamação limitando-se, tão-só, a peticionar que fosse desconsiderado o valor de avaliação e atendido o valor opinativo avançado pela sociedade de mediação imobiliária. E por assim ser não se vislumbram, de todo, as aduzidas preterições de formalidades legais. Subsiste, ora, por analisar as violações atinentes aos princípios convocados. Comecemos pelo princípio do inquisitório, o qual, na esteira de entendimento da Recorrente, se coaduna com a circunstância do princípio da descoberta da verdade material e do inquisitório, ditarem que a “busca pela determinação do valor de mercado seja feita com critérios de verdade, objetividade e rigor”, sendo que, no caso vertente, o VPT não pode ser entendido enquanto tal. Mas, mais uma vez, não assiste razão à Recorrente, desde logo porque a aludida alegação, mesmo a verificar-se, em nada traduziria a violação do aludido princípio o qual está concatenado com o poder/dever de instrução e materialização de todas as diligências tendentes ao apuramento da verdade material, as quais, face a todo o expendido anteriormente, foram, devida e legalmente, encetadas pelo órgão da execução em claro cumprimento do comando legal 250.º, nº2, do CPPT. Ademais, e de acordo com as explanações atinentes à estrutura e metodologia adotada pelo perito em nada se pode convocar uma realidade que assente em critérios não conformes com a verdade, objetividade e rigor, bem pelo contrário, razão pela qual a opção pelo VPT mais não representa que o acatamento da regra geral por falta de demonstração da evidência de desconformidade do VPT face ao valor de mercado, o qual, como visto, in casu, ascende quase ao seu dobro. Mas, em igual sentido se propugnará no atinente à convocada violação do princípio da proporcionalidade, pois a alegação de que nos encontrarmos perante um “confisco”, que reclamava, no limite, a realização de uma segunda perícia, em nada pode traduzir a violação do princípio da proporcionalidade. Com efeito, o princípio da proporcionalidade ou princípio da proibição do excesso desdobra-se em três subprincípios, concretamente, o princípio da adequação, princípio da exigibilidade e o princípio da proporcionalidade em sentido restrito. Enquanto princípio da adequação significa que as medidas restritivas legalmente previstas devem revelar-se como meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei. Quanto ao princípio da exigibilidade este deve ser equacionado no sentido em que as medidas restritivas previstas na lei devem revelar-se necessárias, porque os fins visados pela lei não podiam ser obtidos por outros meios menos onerosos para os direitos, liberdades e garantias. E, por fim, o princípio da proporcionalidade em sentido restrito, significa que os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se numa “justa medida”, impedindo-se a adoção de medidas legais restritivas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins obtidos(1). De referir, neste âmbito, que o artigo 266.º, nº 2, da CRP consagra enquanto princípio material informador e conformador da atividade administrativa, implicando a juridicidade de toda a atividade da Administração (cfr. artigo 5.º, nº.2, do CPA). Ora, in casu, a consideração da regra geral do VPT em nada pretere o aludido princípio constitucional, porquanto o mesmo apresenta-se como uma medida adequada e necessária, tendo, ademais, no caso vertente, sido facultada a demonstração de que a consideração do VPT se encontrava, significativamente, desfasada do valor de mercado, realidade que, como vimos, redundou num plano diametralmente oposto. Aliás, o procedimento avaliativo visou, precisamente, eliminar qualquer desfasamento com o valor, efetivo, de mercado, suprimindo qualquer desproporcionalidade e obstando à adoção de um valor inferior que implicasse um sacrifício evidente ao sujeito passivo, carecendo, portanto, de qualquer fundamento e alcance a alegação atinente à realização de uma segunda perícia, de resto, sem base legal atinente ao efeito, e sem qualquer justificação no caso em apreço. Como aduzido, no Aresto do STA, prolatado no processo nº 0563/16, datado de 13 de julho de 2016, não se afigura “[d]e todo, o recurso ao VPT do imóvel como um critério irrazoável, antes um critério, por norma, adequado”. Destarte, o procedimento foi o legal, adequado, proporcional, sem violação de qualquer contraditório atinente ao efeito, e bem assim do convocado princípio da boa fé. Ademais, nesta circunstância não existiu, de todo, qualquer postergação do direito de decidir, conforme resulta perentório do probatório, sendo certo que qualquer irregularidade concatenada com a sua notificação-com a concreta falta de fundamentação de notificação- não contende com a sua validade, secundando-se, assim, o aduzido pelo Tribunal a quo no sentido de que se o “[d]espacho impugnado tem mais informação que a sua notificação, embora tal questão não releve para a validade do ato, sendo que o executado poderia sempre ter recorrido ao regime do artigo 37.º do CPPT.” Sendo ainda de adensar que se infere, de todo o supra exposto, que a atuação da AT representa a emanação dos princípios norteadores e fundantes do processo justo como sejam os princípios de cooperação, boa fé processual e colaboração. Subsiste, in fine, a análise da falta de fundamentação do ato reclamado. Neste âmbito, aduz a Recorrente que decidiu sem fundamentar, com a fixação do valor base de venda indexado ao VPT, em flagrante violação dos artigos 152.º e 153.º do CPA, até porque tal, nem reflete o proposto pela Executada, nem projeta o valor de avaliação indicado pelo perito nomeado. Ab initio, importa ter presente que a fundamentação é, desde logo, uma imposição constitucional, porquanto a CRP, no n.º 3, do seu artigo 268.º, garante aos administrados o direito a uma fundamentação expressa e acessível de todos os atos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos. Ao nível dos atos tributários, encontra-se, especificamente, previsto no artigo 77.º, da LGT, cujos n.ºs 1 e 2 determinam que: “1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária. 2 - A fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”. In casu, atentando no ato reclamado, entende-se que a fundamentação do mesmo é suficiente na medida em que se revela perfeitamente cognoscível para um destinatário normal, habilitando-o a reagir contra o ato. No caso vertente, o ato reclamado, ainda que de forma sucinta, enuncia os pressupostos de facto e de direito atinentes ao efeito, convocando, expressamente, para efeitos de fundamentação do valor de venda judicial em leilão eletrónico, o artigo 248.º, nº2, do CPPT, o qual, por seu turno, remete para o consignado no artigo 250.º do CPPT. Ora, face a todo o expendido anteriormente, entende-se que a aludida fundamentação permite percecionar que foi adotada a regra geral, na medida em que o parecer de avaliação, como já evidenciado anteriormente, cifrava-se em valor inferior ao VPT. Ademais, in casu, sendo manifestamente inferior o valor de mercado apurado pelo perito avaliador, por confronto com o VPT fixado, é inócua qualquer alegação atinente à sua desconsideração, porquanto naturalmente favorável à parte. Além disso, não obstante a fundamentação tenha de ser expressa, clara e congruente(2), a mesma varia de acordo com o ato em contenda. “[C]omo é consensual na jurisprudência, as exigências de fundamentação não são rígidas, variando de acordo com o tipo de acto e as circunstâncias concretas em que este foi proferido: o acto estará suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de destinatário normal – o bonus pater familiae de que fala o art. 487º nº 2 do C.Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo do seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual(3)”. E, in casu, há que ter presente todo o contexto e tramitação do procedimento, ou seja, que o ato de fixação redundou numa sucessão de atos, diligências e procedimentos legais de avaliação, que têm, necessariamente, de ser interpretados como um todo, os quais permitem, na presente situação, discernir os pressupostos em que assentou a aludida fixação. Até porque, tem um conteúdo em tudo correspondente ao que resulta dessa tramitação. Conclui-se, assim, que a Recorrente ficou na posse de todos os elementos que conduziram à fixação do valor da venda judicial por meio de leilão eletrónico, de modo a que seja possível apurar qual o percurso cognoscitivo e valorativo, conforme denuncia, desde logo, o teor do articulado inicial, pelo que improcede a arguida falta de fundamentação formal. De adensar, in fine, que são realidades não confundíveis, a falta de fundamentação do ato e a falta de fundamentação da notificação do mesmo, carecendo, por isso, do relevo invalidante que lhe é atribuído pelo Reclamante o aduzido em V) a X). Destarte, e em resposta ao thema decidendum, e sem necessidade de quaisquer considerandos adicionais, conclui-se que a interpretação conferida pela AT, e confirmada pelo Tribunal a quo, não padece dos arguidos erros de julgamento, mormente, dos artigos 10.°, 114.°, n.° 2, alínea a), 151.°, n.° 1, alínea d), 152.° e 153.°, todos do CPA, artigos 58.° e 77.° da LGT, 50.° e 250.°. n.° 2, in fine, do CPPT, 18.°, nº 2 e 62.° da CRP. E por assim ser, a decisão recorrida que manteve o ato reclamado não padece dos erros de julgamento que lhe são assacados, devendo, por isso, manter-se na ordem jurídica. *** IV. DECISÃO Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em : -NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO e manter a decisão recorrida. Custas a cargo da Recorrente. Lisboa, 06 de dezembro de 2022 (Patrícia Manuel Pires) (Jorge Cortês) (Luísa Soares) __________________________________ (1) Vide .J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 1º. Volume, Coimbra Editora, 2007, pág.392 e seg. |