Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:415/17.5BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:01/14/2020
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA
OPOSIÇÃO
EXTEMPORANEIDADE
Sumário:I – Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do CPC, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. O Tribunal a quoao ter julgado verificada a extemporaneidade da Oposição Judicial, nada mais tinha a conhecer, na medida em que o conhecimento do mérito da causa, nomeadamente, da ilegitimidade invocada, ficou prejudicado pela referida decisão.

II - Quando o oponente apresentou a presente oposição judicial já o prazo legal de 30 dias (art. 203º, nº 1, al.a) do CPPT) se encontrava largamente ultrapassado, pelo que bem andou a sentença recorrida quando considerou a mesma extemporânea.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul
l – RELATÓRIO

CLÁUDIO .........., vem recorrer da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou verificada a extemporaneidade da Oposição Judicial que deduziu a várias execuções fiscais contra si revertidas, depois de originariamente instauradas pelo Serviço de Finanças de Seixal …, contra a sociedade «S.......... LDA», para cobrança de IRS, IRC e IVA.

Nas suas alegações de recurso formula as seguintes conclusões:

i. Foi o oponente notificado da douta sentença onde julga a oposição apresentada pelo ora recorrente extemporânea e, em consequência, julga absolvida a Fazenda Pública.

ii. Contudo, não pode o ora recorrente concordar com a douta decisão proferida pelo douto tribunal da primeira instância.

iii. Com efeito, aquando da apresentação da oposição, o ora recorrente alegou a nulidade da notificação e a uma ilegitimidade passiva.

iv. E, apesar do douto tribunal “a quo” fazer menção à questão supra indicada, não se pronuncia de direito sobre a mesma, limitando-se a julgar procedente a caducidade do direito de acção suscitada oficiosamente pelo Tribunal.

v. Trata-se de uma questão essencial para a boa decisão da causa, estando a douta sentença em clara violação da lei.

vi. Uma vez que as nulidades são absolutas e, consequentemente, invocáveis a todo o tempo, cfr. decorre da lei e do melhor entendimento jurisprudencial e doutrinal.

vii. Assim, ao não ter conhecido o douto Tribunal das causas de nulidade de conhecimento oficioso, tem como consequência a nulidade da decisão por omissão de pronúncia (cf. art. 615.º, n.º 1, al. d), CPC).

viii. Ficou igualmente prejudicado o conhecimento da questão relativa à ilegitimidade passiva invocada, havendo uma omissão de pronúncia.

ix. O douto Tribunal ao não se pronunciar sobre a ilegitimidade passiva do ora recorrente, somente por considerar que a oposição é intempestiva, está a prejudicar, em larga medida, a ora recorrente.

x. Nestes termos, requer-se a revogação da douta sentença por outra que aprecie a questão suscitada pelo ora recorrente no que concerne à ilegitimidade passiva.

Termos em que com os mais de Direito doutamente supridos por V.ªs. Ex.ªs., se requer a procedência do presente recurso e assim, que se determine a revogação da sentença ora em crise, tudo em estrita conformidade com a tão douta e costumada JUSTIÇA!



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Não foram apresentadas contra-alegações.

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O Ministério Público, junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

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As conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr. arts. 639º do CPC).

Deste modo, apenas se pode pretender a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, o objecto do mesmo está circunscrito às seguintes questões:

- se a decisão recorrida padece de omissão de pronúncia;

- se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter julgado verificada a extemporaneidade da oposição.


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II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1. De Facto
Com interesse para a decisão da excepção de extemporaneidade da oposição consideram-se provados os seguintes factos:

1. Em 22 de Julho de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2015/.....53 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 66 dos autos;

2. Em 22 de Julho de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2015/.....29 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 66 dos autos;

3. Em 22 de Julho de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2015/.....45 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 66 dos autos;

4. Em 22 de Julho de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2015/.....37 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 67 dos autos;

5. Em 22 de Julho de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2015/.....70 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 67 dos autos;

6. Em 22 de Julho de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2015/.....88 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 67 dos autos;

7. Em 22 de Julho de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2015/.....10 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 68 dos autos;

8. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....45 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 69 dos autos;

9. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....72 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 70 dos autos;

10. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....37 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 71 dos autos;

11. Em 20 de Fevereiro de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....92 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 72 dos autos;

12. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....61 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 73 dos autos;

13. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....29 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 74 dos autos;

14. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....10 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 75 dos autos;

15. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....02 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 76 dos autos;

16. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....05 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 77 dos autos;

17. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....13 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 78 dos autos;

18. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....53 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 79 dos autos;

19. Em 14 de Outubro de 2014, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....65 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 81-v dos autos;

20. Em 8 de Junho de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2015/.....61 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 82 dos autos;

21. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....56 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 82 dos autos;

22. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....30 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 82-v dos autos;

23. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....48 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 82-v dos autos;

24. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....21 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 83 dos autos;

25. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....64 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 84 dos autos;

26. Em 12 de Maio de 2015, Cláudio .......... foi citado para o processo de execução fiscal n.º 3697-2014/.....80 – cfr. aviso de recepção assinado a fls. 85 dos autos;

27. A presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças do Seixal – … em 27 de Março de 2017 – cfr. averbamento do número e data de entrada a fls. 6 dos autos.

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Não resultam dos autos outros factos com relevância para a decisão da excepção em apreço e que, como tal, importe dar como provados ou não provados.
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Os documentos referidos, ou posições assumidas nos autos, que serviram de suporte à prova de cada um dos factos, não foram impugnados pelas partes e não há indícios que ponham em causa a genuinidade dos documentos.

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Ao abrigo do art. 662º, nº 1, do CPC, adita-se o seguinte facto:
28. Os processos de execução fiscal referidos nos números 1. a 26. não estão apensados, cfr. Informação do Serviço de Finanças do Seixal …, a fls. 4 dos autos.
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II.2. De Direito

Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida decidiu julgar verificada a extemporaneidade da oposição e, em consequência, absolveu do pedido a Fazenda Pública.

Inconformado, vem o recorrente invocar a nulidade da decisão por omissão de pronúncia [cf. art. 615º, nº1, al.d), do CPC] uma vez que alegou a nulidade da notificação e uma ilegitimidade passiva, e que relativamente à nulidade invocada pelo ora recorrente as mesmas são invocáveis a todo o tempo, pelo que o não conhecimento oficioso das causas de nulidade tem como consequência a nulidade da decisão por omissão de pronúncia.

Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do CPC, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento.
Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente).

No presente recurso o recorrente não indica qual a notificação que considera nula, pelo que só após leitura da petição inicial, verificamos que se refere à citação «a pretensa citação em crise, não se assume, em perspectiva jurídica, como uma verdadeira citação. Razão pela qual, Deve a mesma ser declarada nula e substituída por outra que contenha de facto e de direito, os factos apurados, a convicção de como se dão os mesmos por provados e, consequentemente, subsumir os mesmos ao direito, assim culminando todo este processo, numa decisão legítima.», cfr. arts. 25º e 26º da p.i.

Ora, a nulidade/irregularidade da citação não constitui fundamento possível de processo de oposição à execução fiscal, antes sendo causa de pedir a examinar no âmbito de reclamação de decisão do órgão de execução fiscal, espécie processual prevista no artº.276 e seg. do CPPT, na sequência de requerimento dirigido à execução fiscal com esse objectivo, tudo conforme doutrina e jurisprudência devidamente sedimentadas (cfr.ac.TCAS -2ª.Secção, 23/4/2008, proc.2273/08; ac.TCAS - 2ª.Secção, 20/11/2012, proc.5991/12; ac.TCAS -2ª.Secção, 19/3/2013, proc.6349/13; Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, III volume, 6ª. edição, 2011, pág.369 e seg.).


O Tribunal a quo ao ter julgado verificada a extemporaneidade da Oposição Judicial, nada mais tinha a conhecer, na medida em que o conhecimento do mérito da causa, nomeadamente, da ilegitimidade invocada, ficou prejudicado pela referida decisão.


Atento o acabado de mencionar, não se vê que a decisão recorrida tenha omitido pronúncia e, nestes termos, improcede este fundamento do recurso.


Na senda do que já foi referido, e que nos escusamos de voltar a repetir, do mesmo modo, também não procede a invocação de que o recorrente invocou nulidades absolutas, sendo que as mesmas são invocáveis a todo o tempo. Mais uma vez o recorrente não explica ou avança com nenhum apoio normativo, jurisprudencial ou doutrinal às suas alegações, limitando-se a invocar este fundamento de recurso de forma genérica e totalmente desgarrada.

Por último, importa apreciar se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter julgado verificada a extemporaneidade da oposição.


Vejamos.


A citação é o acto pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr.art. 228º, do C.P.C. e arts. 35º, nº.2, e 189º, do C.P.P.T).


O prazo fixado para a dedução da acção, porque aparece como extintivo do respectivo direito (subjectivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de um certo direito, é um prazo de caducidade. E a caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade de actos praticados no âmbito de processo judicial) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (cfr. art. 333º, do Código Civil) e determina o indeferimento liminar da petição.


Concretamente, o prazo para deduzir oposição a execução fiscal é um prazo judicial, atento o disposto no art.20º, nº.2, do C.P.P.T. Com efeito, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, na sua globalidade, apesar de haver uma parte do mesmo que é processada perante órgãos da Administração Tributária (art.103º, nº.1, da L.G.T.). Tratando-se de prazo de natureza judicial, aplica-se-lhe o regime do Código de Processo Civil (cfr. art.20º, nº.2, do C.P.P.T), pelo que ele corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, mais se transferindo o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os Tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto (cfr.art.144º, nºs.1, 2 e 3, do C.P.C.).


Mais se dirá que o prazo para dedução de oposição é de trinta dias computado da data da citação pessoal, correndo o seu cômputo de forma independente havendo vários executados (cfr.artº.203, nºs.1, al.a), e 2, do C.P.P.T.).


Retomando ao caso concreto, conforme nºs 1 a 26 do probatório, o oponente, ora recorrente foi citado para os processos de execução fiscal em datas compreendidas entre 14 de Outubro de 2014 e 22 de Julho de 2015.
A petição inicial dos presentes autos de oposição às execuções fiscais identificadas nos nºs 1 a 26 do probatório, foi apresentada em 23 de Março de 2017, conforme nº 27 do probatório.

Face à factualidade acabada de expor, forçoso será concluir que quando o oponente apresentou a presente oposição judicial já o prazo legal de 30 dias se encontrava largamente ultrapassado, pelo que bem andou a sentença recorrida quando considerou a mesma extemporânea.

Uma última nota, para dizer que, conforme nº 28 do probatório, os processos de execução fiscal referidos nos números 1. a 26. não estão apensados. No entanto, nos presentes autos não nos iremos debruçar sobre essa questão, uma vez que tal como foi decidido no Acórdão do STA de 22/03/2017, Proc. 0895/16, disponível em www.dgsi.pt: «A questão da intempestividade da oposição é de conhecimento prévio relativamente à questão da não apensação das execuções».

Concluindo, nega-se provimento ao presente recurso e, consequentemente, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.



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III – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, e em consequência, manter a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.

Registe e notifique.

Lisboa, 14 de Janeiro de 2020


[Lurdes Toscano]


[Maria Cardoso]


[Catarina Almeida e Sousa]