Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 153/21.4BCLSB |
![]() | ![]() |
Secção: | CT |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 03/30/2023 |
![]() | ![]() |
Relator: | VITAL LOPES |
![]() | ![]() |
Descritores: | DECISÃO ARBITRAL IMPUGNAÇÃO PRONÚNCIA INDEVIDA OMISSÃO DE PRONÚNCIA DISPOSITIVO DE TIPO CONDENATÓRIO |
![]() | ![]() |
Sumário: | I - Os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais arbitrais para os T. C. Administrativos, consistem na impugnação de tal decisão, consagrada no artº.27, com os fundamentos que se ancorem nos vícios de forma expressamente tipificados no artº.28, nº.1, alíneas a) a d), do RJAT correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos Tribunais tributários, nos termos do plasmado no artº.125, nº.1, do C.P.P.T., com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do artº.615, nº.1, do C. P. Civil. II - A declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação compreende-se na competência do Tribunal Arbitral (art.º 2.º, n.º 1 al. a) RJAT) e, posto que a pretensão anulatória daqueles actos seja precedida de impugnação administrativa, não se encontra abrangida nas excepções ao âmbito da vinculação da Administração tributária previstas, nomeadamente na alínea a) do art.º 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 12 de Março. III - A decisão de suspender ou não a instância perante a existência de causa prejudicial não é sindicável em sede de impugnação da decisão arbitral. IV - A nulidade do acórdão por omissão de pronúncia só acontece quando o acórdão deixa de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão dessa questão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra. V - só ocorre omissão de pronúncia invalidante da decisão relativamente a questões processuais “que as partes tenham submetido” (art.º 608/2 do CPC) à apreciação do Tribunal, não relativamente a questões ou excepções que, não tendo sido alegadas pelas partes, são de conhecimento oficioso. |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL 1 – RELATÓRIO A Exma. Senhora. Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, vem, ao abrigo do disposto no artigo 27.º e 28.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (doravante RJAT), aprovado pelo D.L. n.º10/2011, de 20 de Janeiro, impugnar a decisão arbitral proferida no processo n.º153/2021–T, pelo Tribunal Arbitral Colectivo constituído junto do Centro de Arbitragem Administrativa (doravante CAAD). A Impugnante termina as alegações da impugnação formulando as seguintes Conclusões: «1ª) A decisão arbitral ora impugnada ao ter deliberado julgar totalmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência, ao entender: “A- Julgar improcedente a excepção da incompetência suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira; B- Indeferir o requerimento de suspensão da instância formulado pela Autoridade Tributária e Aduaneira;” cometeu, pronúncia indevida, uma vez que excedeu a competência, em razão da matéria, do Tribunal Arbitral. 2ª) Na verdade, a competência dos tribunais arbitrais é, desde logo, circunscrita às matérias indicadas no n.º 1 do artigo 2.º do RJAT. Estabelece aquela norma que: «1 - A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões: a) A declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta; b) A declaração de ilegalidade de atos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de atos de determinação da matéria coletável e de atos de fixação de valores patrimoniais.» (sublinhados nossos). 3ª) Por outro lado, a competência dos tribunais arbitrais também depende dos termos da vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais constituídos nos termos do RJAT, cfr. art. 4º do RJAT. 4ª) Nos termos das als. a) e b) da Portaria nº 112-A/2011, ficam excluídas do âmbito da vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais as “ pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131º a 133º do Código de Procedimento e de Processo tributária”, bem como, “pretensões relativas a atos de determinação da matéria colectável e actos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indirectos, incluindo a decisão do procedimento de revisão” 5ª) Inexiste, pois, qualquer suporte legal que permita que sejam proferidas pelos tribunais arbitrais condenações de outra natureza que não as decorrentes dos poderes fixados no RJAT. 6ª) Pese embora o presente p.p.a venha interposto na sequência de um indeferimento de uma reclamação graciosa, tendo em conta a causa de pedir, o que está em causa é obter do Tribunal arbitral uma condenação da AT a reconhecer às então requerentes a verificação das condições de aplicação do regime especial de Tributação dos Grupos de Sociedades, ao exercício de 2018, mormente saber se os artigos 112.º, 113.º do Código das Sociedades Comerciais, igualmente aplicáveis às operações de cisão, pelo disposto no artigo 120.º, todos do CSC, permitem que a data de produção de efeitos jurídicos possa ser fixada em data posterior à data da inscrição do registo comercial. 7ª) Como as então requerentes referem no art. 144.º do ppa: «o que acarreta a reposição da aplicação do RETGS ao Grupo V…. no período de tributação de 2018 e a consequente anulação das Autoliquidações». 8ª) E é este efectivamente o direito que as então requerentes pretendem ver ser-lhe reconhecido e que ao presente Tribunal importava apreciar, isto é, a reposição da aplicação do RETGS ao grupo. 9ª) E que assim o é resulta até do facto de o Tribunal arbitral ter analisado tal questão, admitindo que esta era no fundo a única que importava considerar. 10ª ) Por outro lado, contrariamente ao entendido pela Decisão arbitral, existiu um acto administrativo decidindo a cessação do RETGS conforme consta da matéria de facto dada como provada: “U) Em 04-12-2019, a V…-RTL interpôs recurso hierárquico da decisão contida neste ofício n.º 11043; V)O recurso hierárquico referido na alínea anterior foi indeferido por despacho de 18-12- 02020, proferido pela Senhora Subdirectora da Autoridade Tributária e Aduaneira, com os fundamentos que constam do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido (parte do processo administrativo com a designação «indef+RH.pdf»); W)A V…-R… impugnou a decisão de indeferimento do recurso hierárquico através de acção administrativa que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé com o n.º 154/21.2BELLE (documento n.º 1 junto pela Autoridade Tributária e Aduaneira com a sua Resposta); XI) As Requerentes apresentaram declarações de rendimentos Modelo 22 relativas ao exercício de 2018 de substituição conformes com a posição da AT, efectuando autoliquidações que deram origem às seguintes liquidações emitidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira (…) 11ª) Assim, existe um acto administrativo que define a situação jurídica das ora impugnadas, o qual inclusive é objecto de uma acção administrativa que corre termos no TAF de Loulé. 12ª) Donde, a condenação peticionada implica que se analise, não qualquer acto de liquidação e sua (i)legalidade, mas antes, a questão dos efeitos no tempo de uma cisão/fusão. Ou seja, a questão que se impunha ao Tribunal analisar não tinha a ver com a apreciação da legalidade de qualquer liquidação, mas antes, com uma questão em matéria fiscal, a qual suscitou a pronúncia da AT e a emissão de uma decisão expressa definindo a situação jurídica das ora impugnadas. 13ª) A tudo isto acresce que a decisão de reclamação graciosa sendo posterior à decisão do recurso hierárquico é meramente confirmativa da posição da AT já assumida em sede de recurso hierárquico. 14ª) Assim, uma vez que a decisão de indeferimento da reclamação graciosa é o objecto imediato do pedido de pronúncia arbitral e a mesma não tem qualquer conteúdo inovatório face à decisão já tomada pela AT sobre a matéria, apenas confirmando tudo quanto a AT já tinha decidido em sede de recurso hierárquico, o Tribunal Arbitral tinha que ter decidido pela confirmatividade do acto e, deste modo, concluir pela inimpugnabilidade do acto. 15ª) Como bem ficou delimitado no âmbito da acção arbitral e se escreve no voto de vencido: “ O que está em causa nos presentes autos é, no fundo a decisão da AT de negar o reconhecimento da existência de um Grupo de sociedades para efeitos fiscais, no ano de 2018, cuja legalidade o presente Tribunal se considera competente para conhecer, quando anteriormente com os mesmos fundamentos a Requerente utilizou o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (TAF), onde se encontra pendente uma ação administrativa:” 16ª) Ou seja, o Tribunal Arbitral reconheceu a sua competência para conhecer de uma questão que implica o reconhecimento de um direito, a qual já havia sido objecto de uma decisão administrativa, por via do indeferimento de um recurso hierárquico, sendo este o acto que define a situação jurídica das oras impugnadas e que as mesmas deviam atacar visando a sua anulação da ordem jurídica. 17ª) Donde, não só o pedido de pronúncia arbitral não consubstancia o meio próprio, o que, no caso, redunda na própria incompetência do Tribunal Arbitral, para reconhecer o direito que as mesmas pretendem obter, ou para, em alternativa, à acção administrativa, condenar a AT à prática de um acto devido. 18ª) Como também, o Tribunal Arbitral, decidiu conhecer do pedido de pronúncia arbitral ignorando, o que não podia desconhecer, a relação de confirmatividade entre o acto impugnado no pedido de pronúncia arbitral (decisão de indeferimento da reclamação graciosa) e a decisão de indeferimento do recurso hierárquico ( objecto da acção administrativa que corre termos no TAF de Loulé). 19ª) Pelo que, o Tribunal Arbitral ao se ter considerado como competente para apreciar a (i) legalidade da decisão de reclamação graciosa, foi para além da sua competência material, tendo incorrido em pronúncia indevida, quer porque a questão em causa extravassa a competência do tribunal arbitral, quer porque o acto que foi objecto da presente acção arbitral era inimpugnável contenciosamente, o que acarreta a anulação da decisão arbitral ora impugnada. Sendo tal circunstância suficiente para a anulação da decisão arbitral por pronúncia indevida , ainda que assim não se entenda, sem conceder: 20ª) É indubitável que foi levado ao conhecimento do Tribunal Arbitral a coexistência de dois meios processuais, o pedido de pronúncia arbitral, apresentado contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa e a acção administrativa deduzida contra a decisão de indeferimento do recurso hierárquico, o que implicava quer a eventual existência de uma excepção de litispendência quer a eventual necessidade de uma eventual suspensão da instância arbitral. 21ª) Efectivamente, tendo em conta que o acto que definiu a situação jurídica das ora impugnadas é a decisão proferida em sede de recurso hierárquico, somente a anulação do despacho do Recurso Hierárquico poderá determinar a anulação das autoliquidações efectuadas pelas impugnadas, na sequência do entendimento da AT. 22ª) Acresce que a fundamentação daquelas duas decisões é igual, porquanto a AT, na decisão de indeferimento da reclamação graciosa admite que a situação das ora impugnadas já tinha sido analisada em sede de recurso hierárquico e que já tinha sido definida no âmbito do mesmo, pelo que, apenas se limita a reproduzir a fundamentação que consta do indeferimento do recurso hierárquico. 23ª) Donde, facilmente se conclui, que as então Requerentes intentaram junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, Ação Administrativa, com pedido e causa de pedir em tudo semelhante à ação arbitral. 24ª) Por outro lado, é o próprio Acórdão arbitral que admite, a pág.20, a existência de uma relação de prejudicialidade ao referir que: “ A apreciação da questão da legalidade das liquidações que são impugnadas no presente processo depende da solução que se der à questão da possibilidade da aplicação do RETGS em 2018, pois é o erro por não aplicação deste regime o único vício imputado às liquidações impugnadas. A apreciação da questão da aplicação do RETGS constitui um pressuposto necessário da decisão sobre a legalidade das liquidações, pelo que se verifica uma relação de prejudicialidade”. 25ª) Ora, em face do que vem dito supra, é indubitável que, a apreciação da legalidade do despacho que indeferiu a aplicação do RETGS com efeitos a 2018 é prévia à analise das liquidações que dela são mero efeito e que se discutem no tribunal arbitral. 26ª) Como se refere, e bem, no voto de vencido exarado na decisão arbitral ora impugnada: “ no presente caso não estão reunidos os pressupostos de aplicação, “à contrário”, do disposto no nº 2 do artº. 272º. do Código de Processo Civil (CPC), como também não me parece que um tribunal deva decidir da sua competência para prosseguir a lide em função da morosidade de outro, ou da amplitude da recorribilidade das decisões de cada um deles. A harmonia que deveria existir entre as decisões judiciais fica, deste modo, posta em causa. Sobre a mesma questão de direito, com base na mesma realidade fáctica e relativamente ao mesmo contribuinte, poderão assim vir a ser tomadas duas decisões, que tanto podem ser convergentes ou absolutamente divergentes.” 27ª) Donde resulta que, a instância arbitral sempre dependeria do julgamento prévio do ato administrativo em matéria tributária que, não comportando a apreciação da legalidade do ato de liquidação, define o direito que se lhe aplica. 28ª) Ainda que o Tribunal arbitral entendesse não se verificar a excepção da litispendência, ainda assim, as normas do art. 272º do CPC, 68º nº 2 e 111º do CPPT, implicavam que o Tribunal Arbitral concluísse pela suspensão da instância, uma vez que, nada permite concluir que a ação pendente no TAF de Loulé tenha sido intentada com o propósito, único (nem sem ser único) de obter a suspensão do presente processo. 29ª) Ora, o Tribunal Arbitral ao não ter decidido suspender a instância por meras questões, digase formais e que não resultam da lei, decidiu ser competente para apreciar a acção arbitral excedendo a sua competência, no caso concreto e cometendo, pois, pronúncia indevida. 30ª) Mais, uma interpretação como a que resulta da efectuada pelo Acórdão arbitral recorrido que se julgou competente para apreciar o pedido de pronúncia arbitral pese embora tenha admitido existir uma relação de prejudicialidade entre este e a acção administrative a correr termos no TAF de Loulé com base em argumentos como a eventual morosidade do processo ou a amplitude dos meios de recurso, viola o direito de acesso à justiça (artigo 20.º da CRP) e da legalidade [cf. artigos 3.º, n.º 2, 202.º e 203.º da CRP e ainda o artigo e 266.º, n.º 2, da CRP], como corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2 da LGT 31ª) Sendo constitucionalmente vedada, por força dos princípios constitucionais do Estado de direito e da separação dos poderes (cf. artigos 2.º e 111.º, ambos da CRP), bem como do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da CRP) e da legalidade [cf. artigos 3.º, n.º 2, 202.º e 203.º da CRP e ainda o artigo e 266.º, n.º 2, da CRP], como corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2 da LGT, a interpretação, ainda que extensiva, que amplie a vinculação da AT à tutela arbitral fixada legalmente, por tal pressupor, necessariamente, a consequente dilatação das situações em que esta obrigatoriamente se submete a tal regime, renunciando nessa medida ao recurso jurisdicional pleno [cf. artigos 25.º e 27.º da RJAT, que impõem uma restrição dos recursos da decisão arbitral].” 32ª) Efectivamente, os termos em que está redigido o n.º 1 do artigo 4.º do RJAT impõem a conclusão de que a vinculação da AT está continuamente dependente e delimitada pela vontade expressa na Portaria n.º 112-A/2011. 33ª) Donde, ao ter decidido conhecer do pedido de pronúncia arbitral, pese embora a admissão clara e expressa da existência de uma relação de prejudicialidade com uma acção administrativa, o Tribunal Arbitral excedeu a sua competência, cometeu pronúncia indevida, e ampliou o objecto fixado pelo legislador no que concerne à vinculação da AT à jurisdição arbitral o que também fere os princípios constitucionais invocados. 34ª) Determinou o Tribunal arbitral, ainda: “ G) Julgar procedente o pedido de reembolso e juros indemnizatórios formulado pela Requerente Clube de Golfe de V…, Lda, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsá-la da quantia de € 1.624,04, acrescida de juros indemnizatórios determinados nos termos do ponto 7.2. deste acórdão; H) Julgar procedente o pedido de reembolso e juros indemnizatórios formulado pela Requerente Resort B…, V…., Mediação Imobiliária, Lda e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsá-la da quantia de € 26.409,58, acrescida de juros indemnizatórios determinados nos termos do ponto 7.2. deste acórdão; I) Não tomar conhecimento do pedido de reposição das Autoliquidações Originárias das Requerentes relativas ao período de tributação de 2018 e apresentadas em junho de 2019”. 35ª) Ora, tal condenação ao reembolso das quantias em cima identificadas também excede a competência do tribunal arbitral face às circunstâncias do caso em concreto. 36ª) Efectivamente, o que as então requerentes pretendiam era ver reconhecida a tributação segundo a aplicação do RETGS em 2018 e daí tenham pedido a reposição das Autoliquidações Originárias das Requerentes relativas ao período de tributação de 2018 e apresentadas em junho de 2019. 37ª) Nestes termos compete à AT e não ao Tribunal Arbitral, como até resulta do art. 24º nº 1 do RJAT, retirar todas as consequências da anulação das liquidações, uma vez que está em causa a tributação das ora impugnadas segundo o RETGS, ou não. 38ª) Ou seja, a anulação das liquidações passa pela reposição da tributação segundo o RETGS. 39ª) Donde, o Tribunal arbitral ao ter indicado expressamente os actos de execução a emitir pela AT, imiscuiu-se nas competências próprias da mesma, uma vez que cabe à AT determinar os actos de execução em concreto que podem passar, ou não, pela restituição daquela quantia em concreto pedida. 40ª) Tendo, igualmente, quanto a esta condenação cometido pronúncia indevida. Ainda que assim também não se entenda, sem conceder: 41ª) Em segundo lugar, relativamente ao fundamento previsto na al. c) do nº 1 do art. 28º do RJAT, excesso ou omissão de pronúncia, entende a ora impugnante que o Tribunal Arbitral incorreu em nulidade, uma vez que não se pronunciou sobre questão, a qual devia ter sido conhecida e decidida. 42ª) Na verdade, conforme já também resulta do que atrás ficou dito, verifica-se a existência de uma excepção, de conhecimento oficioso, que implicava, in casu, a absolvição da AT da instância, 43ª) A decisão de indeferimento da reclamação graciosa que constitui o objecto imediato do pedido de pronúncia arbitral, não tem qualquer conteúdo inovatório face à decisão já tomada pela AT sobre a matéria, apenas confirmando tudo quanto a AT já tinha decidido em sede de recurso hierárquico. 44ª) Assim, o acto que foi impugnado no Tribunal arbitral não possui qualquer conteúdo inovatório apenas confirma tudo quanto a AT já tinha decidido em sede de recurso hierárquico, donde o Tribunal Arbitral devia ter conhecido e decidido expressamente sobre uma eventual relação de confirmatividade dos actos e da excepção da inimpugnabilidade do acto. 45ª) Na verdade, estabelece o art.53ºdo CPTA que : “ 1- Não são impugnáveis os atos confirmativos, entendendo-se como tal os atos que se limitem a reiterar, com os mesmos fundamentos, decisões contidas em atos administrativos anteriores. 46ª) Pese embora o Tribunal Arbitral recorrido tenha colocado a questão de as autoliquidações, objecto da reclamação graciosa poderem constitui actos de execução do indeferimento do recurso hierárquico, o que na sua óptica constituiria limitação aos poderes do tribunal arbitral, e tenha determinado ouvir as partes sobre tal questão, contudo não equacionou a questão da excepção da inimpugnabilidade do acto considerando uma relação de confirmatividade entre a decisão de indeferimento da reclamação graciosa e a de indeferimento do recurso hierárquico. 47ª) Donde, devia o Tribunal Arbitral ter conhecido após notificação das partes para sobre ela se pronunciarem, da referida excepção. 48ª) Pelo que, também pela procedência do referido vício deve a decisão arbitral ora impugnada ser anulada. V - Do pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça: Atendendo ao facto de o valor do recurso ser superior a €275.000,00 requer-se que esse Venerando Tribunal se pronuncie e decida, a final, pela dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, atendendo a que estamos em sede de impugnação de decisão arbitral, que não há lugar à produção de prova testemunhal e que ao Tribunal se pede que analise e decida sobre questão que não se afigura revestir grande complexidade, cfr. art. 6º nº 7 do RCP. Termos pelos quais e, como o douto suprimento de V. Ex.as, incorrendo a decisão arbitral ora impugnada no vício de pronúncia indevida e/ ou omissão de pronúncia, deve a mesma ser julgada nula ou anulada, com todas as legais consequências. ». Não foram apresentadas contra-alegações. A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal foi notificada nos termos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aplicável “ex vi” artigo 27.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), tendo aposto o seu visto. Colhidos os vistos dos Senhores Juízes-Desembargadores Adjuntos, vêm os autos à conferência para decisão. 2 – FUNDAMENTAÇÃO Em sede factual deixou-se consignado na decisão arbitral: « (Imagem, original nos autos) ». De direito Como se deixou consignado no acórdão da SCT deste TCAS proferido em 18/04/2018, no proc.º121/17.0BCLSB, «O regime da arbitragem voluntária em direito tributário foi introduzido pelo RJAT, sendo que os Tribunais arbitrais têm competência para apreciar um conjunto vasto de pretensões, as quais vêm taxativamente elencadas na enumeração constante do artº.2, nº.1, do citado diploma. Mais se dirá que o Tribunal arbitral tem a obrigação de decidir em conformidade com o direito constituído e não com recurso à equidade (cfr.artº.2, nº.2, do RJAT). Os princípios processuais inerentes ao processo arbitral vêm referidos e elencados no artº.16, do RJAT, e, genericamente, são os mesmos princípios que se aplicam a um processo de partes, de que é exemplo o processo civil. No que toca à possibilidade de recorrer de uma decisão proferida por um Tribunal arbitral pode, desde logo, referir-se que esta é muito limitada. Assim, quando se tiver em vista controlar o mérito da decisão arbitral, isto é, o seu conteúdo decisório, o meio mais adequado para colocar em crise a decisão arbitral será o recurso. Com efeito, em conformidade com o que se dispõe no artº.25, nº.1, do RJAT, é possível recorrer directamente para o Tribunal Constitucional da parte da decisão arbitral que ponha termo ao processo e que recuse a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, bem como nos casos em que aplique uma qualquer norma jurídica cuja inconstitucionalidade seja levantada no decurso do processo. Por outro lado, admite-se ainda a possibilidade de recurso com fundamento em oposição de acórdãos [uniformização de jurisprudência], isto nos termos do que determinam os nºs.2 e 3, do artigo em apreço. Este recurso é endereçado à Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sempre que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida estiver em oposição, relativamente à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido ou pelo Tribunal Central Administrativo ou Supremo Tribunal Administrativo. Neste caso, os trâmites do recurso a observar são os do regime dos recursos para uniformização de jurisprudência, aplicando-se o disposto no artº.152, do C.P.T.A. Note-se que, em termos práticos, só há uma via de recurso: ou directamente para o Tribunal Constitucional, com fundamento em (in) constitucionalidade, ou directamente para o Supremo Tribunal Administrativo, em caso de oposição de acórdãos [uniformização de jurisprudência]. Pelo contrário, quando se pretenda controlar a decisão arbitral em si, nos seus aspectos de competência, procedimentais e formais, o meio adequado será já a impugnação da decisão arbitral (cfr. artºs.27 e 28, do RJAT). Nos termos da lei, a regra é que é possível que a decisão do Tribunal arbitral seja anulada pelo Tribunal Central Administrativo competente. Esta impugnação - que em bom rigor se trata de um recurso - deve ser deduzida, sob pena de não admissão por intempestividade, no prazo de quinze dias contados da notificação da decisão arbitral, ou da notificação referida no artº.23.º, do diploma em apreço. Porém, neste último caso, a decisão arbitral terá que ter sido proferida por Tribunal colectivo, cuja constituição tenha sido requerida nos termos do artº.6, nº.2, al. b), do RJAT. Já no que toca aos fundamentos da impugnação da decisão arbitral, vêm estes elencados no texto do artº.28, nº.1, do RJAT. São eles, taxativamente, os seguintes: 1-Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; 2-Oposição dos fundamentos com a decisão; 3-Pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia; 4-Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artº.16, do diploma. Ou seja, os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais arbitrais para os T. C. Administrativos, consistem na impugnação de tal decisão, consagrada no artº.27, com os fundamentos que se ancorem nos vícios de forma expressamente tipificados no artº.28, nº.1, e atrás elencados, correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos Tribunais tributários, nos termos do plasmado no artº.125, nº.1, do C.P.P.T., com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do artº.615, nº.1, do C. P. Civil. E se algumas dúvidas pudessem subsistir sobre o que se vem de afirmar, elas dissipar-se-iam por força dos elementos sistemático, teleológico e histórico, considerando, por um lado, o regime jurídico dos vícios em causa, tal como disciplinado pelo C.P.P.T., e, por outro, a intenção do legislador expressamente manifestada na parte preambular do diploma em causa, quando e ao que aqui releva, refere que “(…) A decisão arbitral poderá ainda ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo com fundamento na não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, na oposição dos fundamentos com a decisão, na pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia ou na violação dos princípios do contraditório e da igualdade de partes (…)”. Assim manifestando o legislador, de forma inequívoca, uma enumeração taxativa dos fundamentos de impugnação das decisões arbitrais para os T. C. Administrativos (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/2/2013, proc.5203/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 21/5/2013, proc.5922/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/9/2013, proc.6258/12; Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, pág.234 e seg.)» (fim de cit.). Como também tem sido entendimento deste Tribunal, a decisão arbitral poderá ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo com fundamento na pronúncia indevida. E no conceito de “pronúncia indevida”, para além do excesso de pronúncia, incluem-se as situações em que o tribunal arbitral funcionou de modo irregular ou em que excedeu a sua competência – vd., entre outros, o Acórdão deste TCA Sul, de 06/09/2016, tirado no proc.º09156/15. Feitos os considerandos julgados pertinentes, passemos ao caso em apreciação. Vem invocada pronúncia indevida na medida em que o Tribunal Arbitral se considerou competente para conhecer da legalidade da decisão de reclamação graciosa que negou à requerente (aqui impugnada), o reconhecimento da existência de um Grupo de sociedades para efeitos fiscais no ano de 2018, sendo que, com os mesmos fundamentos se encontra pendente no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé uma Acção Administrativa Especial intentada pela Requerente contra o acto de indeferimento do recurso hierárquico interposto da decisão de cessação da aplicação do RETGS ao Grupo V.... com efeitos a 31/12/2017, ao invés de a 31/12/2018; também porque o Tribunal Arbitral conheceu da legalidade de um acto confirmativo – como é a decisão de reclamação graciosa objecto do PPA relativamente à decisão de recurso hierárquico, objecto da Acção Administrativa Especial – que é inimpugnável contenciosamente; ainda, porque o Tribunal Arbitral decidiu não suspender a instância na pendência da Acção Administrativa Especial, como pedido pela ora Impugnante, pese embora ter reconhecido existir uma relação de prejudicialidade, assim excedendo a sua competência no caso concreto, o que também se reconduz a pronúncia indevida; e, por último, porque o Tribunal Arbitral condenou a ATA ao reembolso de quantias e juros, o que não se compreende no âmbito da sua competência, como até resulta do disposto no art.º 24.º do RJAT, segundo o qual compete à AT retirar todas as consequências da anulação das liquidações, uma vez que está em causa a tributação das ora impugnadas liquidações segundo o RGTGS, ou não. Mais, vem invocada omissão de pronúncia na medida em que o Tribunal Arbitral não se pronunciou sobre a questão da eventual relação de confirmatividade dos actos e da excepção de inimpugnabilidade da decisão de relação graciosa objecto do pedido de pronúncia arbitral, em vista do estabelecido no art.º 53.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Apreciando. E a primeira questão que importa apreciar consiste em saber se o Tribunal Arbitral excedeu a sua competência material ao conhecer do PPA cujo objecto é a apreciação da legalidade de uma decisão de reclamação graciosa proferida em impugnação de actos de autoliquidação de imposto de rendimento (cf. pontos X), Y) e Z) da matéria de facto). A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é definida, em primeira linha, pelo artigo 2.º, n.º 1, do RJAT, que estabelece o seguinte: «1 - A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões: a) A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta; b) A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais; c) (Revogada.)». Em segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é limitada pela vinculação da Autoridade Tributária e Aduaneira que, nos termos do artigo 4.º, n.º 1, do RJAT, veio a ser definida pela Portaria n.º 112-A/2011, de 12 de Março, que estabelece o seguinte, no que interessa para os autos: « Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção das seguintes: a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário; b) Pretensões relativas a actos de determinação da matéria colectável e actos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indirectos, incluindo a decisão do procedimento de revisão; c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indirectos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação; e, d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efectuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira; e) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade da liquidação de tributos com base na disposição antiabuso referida no n.º 1 do artigo 63.º do CPPT, que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos do n.º 11 do mesmo artigo». Como se vê, a declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação compreende-se na competência do Tribunal Arbitral e, posto que a pretensão anulatória daqueles actos foi precedida de impugnação administrativa, não se encontra abrangida nas excepções ao âmbito da vinculação da Administração tributária previstas, nomeadamente na alínea a) do art.º 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 12 de Março. É, pois, manifesta a competência do Tribunal Arbitral para conhecer do PPA, cuja pretensão é anulatória da decisão de reclamação graciosa proferida em impugnação de actos de autoliquidação, nos termos do art.º 131.º do CPPT. Pretende a Impugnante, todavia, que os fundamentos da pretensão anulatória dirigida ao Tribunal Arbitral se reconduzem à apreciação da legalidade da decisão de não reconhecer à Requerente a existência de um Grupo de sociedade para efeitos fiscais com relação ao ano de 2018, fazendo cessar o regime especial em 31/12/2017, o que materialmente consubstancia um acto administrativo em matéria tributária, cujo tipo não se compreende na competência do Tribunal Arbitral. Não acompanhamos tal interpretação do regime legal. Com efeito, se a pretensão é anulatória de um acto de liquidação ou autoliquidação, cabe na competência do Tribunal Arbitral (art.º 2.º, n.º 1 al. a) do RJAT), independentemente dos fundamentos invocados. Mesmo a entender-se que as autoliquidações objecto do PPA assentam num acto administrativo em matéria tributária (de não reconhecimento do RETGS com referência ao ano de 2018) e que esse acto é susceptível de impugnação contenciosa autónoma, através de Acção Administrativa Especial, tal não afasta a competência do Tribunal Arbitral desde que em causa estejam, como estão, autoliquidações assentes naquele acto. Não descortinamos, pois, qualquer dilatação indevida das competências do Tribunal Arbitral. As questões colocadas pela Impugnante que se prendem com a natureza confirmativa do acto de reclamação graciosa das autoliquidações (objecto do PPA) relativamente ao acto de indeferimento do recurso hierárquico interposto da decisão de cessação da aplicação do RETGS ao Grupo V…. com efeitos a 31/12/2017, ao invés de a 31/12/2018 (objecto de Acção Administrativa Especial interposta pela Requerente no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé) e consequente inimpugnabilidade do acto de reclamação graciosa, bem como a questão de saber se deveria haver lugar, perante o reconhecimento da relação de prejudicialidade, à suspensão da instância arbitral na pendência da Acção Administrativa Especial que corre no TAF de Loulé, são questões de natureza processual, que não beliscam a competência do Tribunal Arbitral, antes a pressupõem. Com efeito, é pacifico na jurisprudência administrativa que a inimpugnabilidade do acto constitui excepção dilatória que obsta ao conhecimento do mérito da acção dando lugar à absolvição da instância, o que nada tem a ver com os pressupostos de competência material do Tribunal que as aprecia, ou devia apreciar. No que em particular respeita à questão de prejudicialidade, estabelece o art.º 272.º do CPC, na parte que importa: « 1 - O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado. 2 - Não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens.» Se o Tribunal Arbitral, não obstante a existência de causa prejudicial, entende que não é de ordenar a suspensão da instância, tal decisão poderá estar inquinada de erro de julgamento, mas não vicia a decisão de nulidade por pronúncia indevida, que, como dissemos, compreende unicamente as situações de excesso de pronúncia e aquelas em que o Tribunal Arbitral funcionou de modo irregular. E o excesso de pronúncia gerador da nulidade prevista na 2.ª parte da alínea d) do n.º 1 do referido artigo 615.º do CPC só tem lugar quando o juiz conhece de pedidos, causas de pedir ou excepções de que não podia tomar conhecimento, nos termos da 2.ª parte do n.º 2 do art.º 608.º do CPC, o que manifestamente não é o caso porque a própria Impugnante reconhece nas alegações ter requerido ao Tribunal Arbitral a suspensão da instância, pretensão que foi indeferida. Passando agora à questão do dispositivo de tipo condenatório, vejamos. Deixou-se consignado no dispositivo do acórdão arbitral, nomeadamente e na parte que agora interessa: « ». Alega a Impugnante que compete à AT e não ao Tribunal Arbitral retirar todas as consequências da anulação das liquidações, como até resulta do art.º 24.º n.º 1 do RJAT, que dispõe: « A decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, alternativa ou cumulativamente, consoante o caso: a) Praticar o acto tributário legalmente devido em substituição do acto objecto da decisão arbitral; b) Restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito; c) Rever os actos tributários que se encontrem numa relação de prejudicialidade ou de dependência com os actos tributários objecto da decisão arbitral, designadamente por se inscreverem no âmbito da mesma relação jurídica de imposto, ainda que correspondentes a obrigações periódicas distintas, alterando-os ou substituindo-os, total ou parcialmente; d) Liquidar as prestações tributárias em conformidade com a decisão arbitral ou abster-se de as liquidar. A temática não é nova e já foi abordada em anteriores acórdãos deste TCAS, nomeadamente, no ac. de 05/22/2019, tirado no proc.º 7/18.1BCLSB, em que o Relator é o mesmo deste. Ali se consignou na parte que agora interessa para os autos: « Dissente a impugnante do segmento decisório em que é condenada no reembolso do montante de imposto pago (…). A competência dos tribunais arbitrais está fixada no art.º2.º, n.º1 alíneas a) e b), do RJAT, pelo que importará, desde logo, indagar se o pedido de condenação da AT “no reembolso à Requerente do montante de imposto pago (€ …)”, se compreende no âmbito da competência do tribunal arbitral para apreciar a declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta e a declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais. Uma leitura conjugada do disposto naquele art.º2.º do RJAT com o disposto no art.º10.º, n.º1, alínea a) do mesmo diploma, parece apontar no sentido de que a competência dos tribunais arbitrais corresponderá, salvo restrições legais, aos casos em que, no processo judicial tributário, os tribunais tributários conhecem das pretensões através do meio processual da impugnação judicial – artigos 97.º, n.º1 alíneas a) a f), 99.º e 102.º, n.º1, todos do CPPT. Como se sabe, em processo judicial tributário, é pelo pedido que se afere a adequação do meio processual ao fim por ele visado: se o pedido formulado pelo Autor não se ajusta à finalidade abstractamente configurada por lei para essa forma processual, ocorre erro na forma do processo (cf. Prof. Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, volume II, Coimbra Editora, 3.ª edição - reimpressão, págs. 288/289). Só que, estando os tribunais arbitrais limitados na sua competência material à apreciação de pretensões que se prendem com “a declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta” e “a declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais”, quaisquer outras pretensões – não compatíveis, em processo judicial tributário, com a forma processual da impugnação judicial – excedem o âmbito da sua competência, fixada no art.º2.º, n.º1 do RJAT. Ora, por força da consagração do princípio constitucional da tutela judicial efectiva (cf. artº.268.º, nº.4, da Constituição da República), o processo judicial tributário tem vindo a perder a sua natureza estrita de um contencioso de mera anulação e a conferir tutela a pretensões características de um contencioso de plena jurisdição. É que, como se diz no Acórdão deste tribunal de 06/08/2017, tirado no proc.º06112/12, aquele princípio constitucional “somente é alcançado se as sentenças puderem ter todos os efeitos necessários e aptos a proteger o direito ou interesse apreciado pelo Tribunal, assim não podendo limitar-se à mera anulação do acto tributário e podendo o processo de impugnação revestir uma natureza condenatória, caso o contribuinte solicite não só a anulação do acto tributário, mas também a devolução do montante pago acrescido dos respectivos juros” (sublinhado nosso). E para sustentar a natureza tendencial da impugnação como processo de plena jurisdição, aponta-se também no aresto em citação, “o princípio da economia processual que exige que se ponha fim ao litígio utilizando do processo judicial tudo o que puder ser aproveitado para basear uma decisão do Tribunal de onde sai logo uma definição da situação tributária concreta sob análise que não careça de qualquer nova pronúncia da Administração Tributária” e, ainda e por último, “razões ligadas ao próprio âmbito do contencioso tributário ou aos limites à plena jurisdição de um tal contencioso, os quais só serão de aceitar em relação àqueles domínios ou aspectos da acção administrativa em que a mesma plena jurisdição implique para o juiz tributário a prática de actos que afrontem o núcleo essencial da função administrativa, nomeadamente a intangibilidade do caso julgado administrativo ou o respeito pelas áreas em que a Administração Tributária goza de uma margem de livre apreciação na sua decisão (v.g. discricionariedade técnica)”. Nesta linha de entendimento, não se descortinam razões para restringir aos tribunais arbitrais a possibilidade – que se confere aos tribunais tributários em processo de impugnação judicial – de proferirem decisões de natureza condenatória, caso o contribuinte solicite não só a anulação do acto tributário, mas também a devolução do montante pago acrescido dos respectivos juros, desde que tal não implique para o tribunal arbitral a prática de actos que afrontem o núcleo essencial da função administrativa, nomeadamente a intangibilidade do caso julgado administrativo ou o respeito pelas áreas em que a Administração Tributária goza de uma margem de livre apreciação na sua decisão (cf. Carla Castelo Trindade, “Regime Jurídico da Arbitragem Tributária – Anotado”, Almedina, 2016, a págs.120 e ss.). Concluímos, pois, pela competência dos Tribunais Arbitrais para proferir condenatórias nas situações em que, como a dos autos, o contribuinte requerente solicite não só a anulação do acto tributário, mas também a devolução do montante de imposto pago acrescido dos respectivos juros indemnizatórios» (fim de cit.). Não existe, pois, pronúncia indevida por parte da decisão arbitral impugnada (artigo 28.º, nº1, al. c), do RJAT), improcedendo também este segmento da impugnação. Por fim, alega a Impugnante omissão de pronúncia porquanto o Tribunal Arbitral não se pronunciou sobre a inimpugnabilidade do acto objecto do PPA por confirmatividade, uma vez que não tem qualquer conteúdo inovatório face ao anterior acto de recurso hierárquico impugnado na Acção Administrativa Especial intentada no TAF de Loulé. Ora, esta questão da inimpugnabilidade do acto (que decidiu a reclamação graciosa das autoliquidações) por ter natureza confirmativa do anterior acto de indeferimento do recurso hierárquico que indeferiu o alargamento dos efeitos do regime especial do Grupo de sociedades ao ano de 2018 e o fez cessar em 31/12/2017, passando ao regime geral de tributação a partir de então, não foi colocada ao Tribunal Arbitral. O que foi excepcionado pela Impugnante na resposta ao PPA foi, por um lado, a incompetência do Tribunal Arbitral para conhecer de actos administrativos em matéria tributária, que na óptica da Impugnante é o que, em bom rigor, estava em causa na pretensão anulatória dirigida ao Tribunal Arbitral e, por outro, a existência de causa prejudicial a correr termos no TAF de Loulé em que fora impugnado, através de Acção Administrativa Especial e “com pedido e causa de pedir em tudo semelhante à presente acção arbitral”, um acto de indeferimento de recurso hierárquico. É certo que a inimpugnabilidade do acto é uma excepção dilatória de conhecimento oficioso, resultando da sua verificação a absolvição da instância, de acordo com o art.° 89°, n° 1, alínea e) do CPTA. No entanto, só ocorre omissão de pronúncia invalidante da decisão relativamente a questões processuais “que as partes tenham submetido” (art.º 608/2 do CPC) à apreciação do Tribunal, não relativamente a questões ou excepções que, não tendo sido alegadas pelas partes, são de conhecimento oficioso. Este fundamento da impugnação também não logra procedência. Face ao exposto, improcedem in totum os vícios assacados à decisão arbitral impugnada. * Quanto ao pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do disposto no artigo 6°, n.º 7 do RCP, nesta instância.O valor atribuído ao processo é de 1.691.391,66 Euros. Dispõe o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais que «[n]as causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.». Trata-se, portanto, de uma dispensa excepcional que, à semelhança do que ocorre com o agravamento previsto no nº 7 do art. 7º do mesmo Regulamento, depende de concreta e casuística avaliação pelo juiz e deve ter lugar aquando da fixação das custas ou, no caso de aí ser omitida, mediante requerimento de reforma da decisão — cf., neste sentido, o acórdão do Pleno da Secção do CT do STA, de 15/10/2014, tirado no proc. nº 01435/12. Ora, constata-se que, no caso, as questões decididas, não sendo simples nem já tratadas na jurisprudência, não se revestiram, porém, de especial complexidade e, por outro lado, a sua apreciação reclamou uma tramitação processual simples, potenciada pela adequada conduta processual das partes. Assim, considerando a concreta e casuística avaliação, assente nos supra apontados pressupostos que, no caso, se têm por verificados, a que acrescem ainda razões constitucionais de justiça e proporcionalidade, entende-se estar justificada a dispensa total do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida nesta impugnação, conforme o pedido formulado pela Impugnante ao abrigo do disposto no nº 7 do artigo 6º do citado Regulamento, ao que se provirá na parte dispositiva do acórdão. 3 - DECISÃO Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em: i) Julgar improcedente a presente Impugnação da decisão arbitral; ii) Dispensar as partes do pagamento do remanescente da taxa de justiça. Condena-se a Impugnante em custas. Lisboa, 30 de Março de 2023 _______________________________ Vital Lopes ________________________________ Luísa Soares ________________________________ Tânia Meireles da Cunha |