Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 9721/16.5BCLSB |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 11/28/2019 |
Relator: | ANA PINHOL |
Descritores: | MÉTODOS INDIRECTOS; CRITÉRIO DE QUANTIFICAÇÃO; FUNDAMENTAÇÃO. |
Sumário: | I. O dever de fundamentação que recai sobre a Administração Tributária, no caso de tributação por métodos indiciários, incide não só sobre a indicação dos motivos por que entende que a contabilidade do contribuinte não merece credibilidade e se mostra impossível a quantificação directa e exacta da matéria tributável, mas também deve indicar os factos conhecidos de que partiu e que lhe permitiram, à luz das regras de experiência, segundo critérios de razoabilidade e tendo em conta as concretas circunstâncias do exercício da actividade, fixar o critério de quantificação da matéria tributável. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO I.RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA recorre para este TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO da sentença do TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DE LISBOA que julgou procedente a impugnação judicial que a sociedade «O.........., LDA.» ali havia deduzido contra os actos de liquidação adicional de IRC, dos exercícios de 1996 e 1997, e respectivos juros compensatórios, tudo no montante global de € 62.168,10. A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «I. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou a impugnação judicial procedente, determinando em consequência a condenação da "...Fazenda Publica mo pedido de anulação das liquidações de IRC dos exercícios de 1996 e 1997 com os n°s 2001 ..........59 e 2001 ..........60, ambas de 18.06.2001.". II. Examinadas as questões suscitadas pela Impugnante, veio o Tribunal a quo a considerar que todas elas deveriam improceder com a excepção da alegada falta de fundamentação, pelo que assim determinou a procedência da impugnação, e originou o presente recurso. III. Não se conformando com tal decisão, é entendimento da AT que a sentença recorrida, mormente a parte que origina o presente recurso, padece de erro na apreciação da prova produzida nos autos, isto é, errou ao considerar não devidamente fundamenta a fixação de percentagem aplicada para determinação da margem bruta de vendas. IV. Assim vejamos, em relação à decisão de que aqui se recorre, ou seja, a alegada falta de fundamentação relativa a percentagem aplicada a determinação da matéria colectável considerou o decisor que "Revertendo ao caso dos autos, temos que a A.T., invocou que a "determinação da matéria colectável com recursos a métodos indirectos foi efectuada com base em elementos existentes nos serviços, extraídos de diversas ourivesarias do Distrito de Lisboa, onde foram recolhidos preços de compra e venda apuradas, ambos sem IVA, existentes em cada uma das ourivesarias, tendo sido calculada a margem bruta s/as vendas de cada uma delas, sendo posteriormente calculada a margem bruta do universo em causa". Conclui assim a A.T. que, através da utilização deste método, a margem bruta de vendas a aplicar à Impugnante seria a de 68,73%." V. Considerou ainda que "... na verdade, ate nos podemos questionar se, de facto, a A. T. efectuou aquele apuramento de 68,73%, uma vez que não existe qualquer elemento comprovativo da situação invocada, e não existindo, caso a aceitássemos mesmo sem qualquer justificação de facto efectiva, então caso a A.T, invocasse uma margem de 80%, 90% ou 100%, sempre a mesma seria também de aceitar sem mais. Ora tal conclusão mostra-se de tal modo gritante em termos de razoabilidade, que é de reprovar.". VI. Com o intuito de fundamentar a decisão tomada no que concerne à determinação do percentual a aplicar as margens bruta de vendas para determinação da matéria colectável, comunicou a A.T. que a "determinação da matéria colectável com recursos a métodos indirectos foi efectuada com base em elementos existentes nos serviços, extraídos de diversas ourivesarias do Distrito de Lisboa, onde foram recolhidos preços de compra e venda apuradas, ambos sem IVA, existentes em cada uma das ourivesarias, tendo sido calculada a margem bruta s/ as vendas de cada uma delas, sendo posteriormente calculada a margem bruta do universo em causa". Conclui assim a A. T. que, através da utilização deste método, a margem bruta de vendas a aplicar à Impugnante seria a de 68,73%." VII. Entendeu o tribunal a quo pelas razões aqui já expostas, e melhor explicadas na sentença de que se recorre, que tal fundamentação não se afigura como suficiente. VIII. Ora tem vindo a jurisprudência a considerar que "A fundamentação dos actos administrativos traduz a exigência de externação das razões ou motivos determinantes da decisão administrativa, tendo como objectivos essenciais os de habilitar o destinatário a reagir eficazmente contra a respectiva lesividade, e assegurar a transparência e imparcialidade das decisões administrativas." IX. Observando o teor da petição inicial do impugnante, é nosso entendimento que tais objectivos foram amplamente conseguidos pela argumentação apresentada pelos serviços da Administração Tributaria. X. Razão pela qual, em nossa opinião, o tribunal a quo errou na decisão tomada. XI. Aliás, encontrando-se em análise nos presentes autos fixação de matéria colectável resultante por recurso a métodos indirectos, e sendo que a necessidade de recorrer a tais métodos não é sequer questionada pela impugnante, deveria o tribunal a quo se ter fixado num eventual excesso de percentagem apurada pelos serviços. XII. Aliás, decorre dos termos da lei que incumbe á A.T. demonstrar a necessidade de recurso a métodos indirectos e ao contribuinte o ónus de comprovar que de tal método resultou quantitativo exagerado ou superior ao efectivamente devido, XIII. É nossa convicção que a aqui já citada fundamentação cumpre os objectivos a que se destina, porquanto a mesma apresenta-se de uma forma expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto que levam a decisão; clara, permitindo, através dos seus termos, que se apreendam com precisão os factos com base nos quais se decidiu; suficiente, por possibilitar à impugnante um conhecimento concreto da motivação do acto, ou seja, as razões de facto e de direito que determinaram os serviços a actuarem como actuaram, e congruente, de modo que a decisão constitua conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão. XIV. Pelo que, em nossa opinião, não se verificando omissão ou insuficiência de fundamentação, impunha-se ao tribunal que a questão determinante da decisão final fosse a de apurar se havia existido excesso de imputação de matéria colectável, o que se não verificou, ate porque o impugnante não alegou que fosse suficiente para o demostrar. XV. Ora, perante o que se deixa dito, forçoso é, salvo melhor entendimento, concluir que as liquidações impugnadas não incorrem no vício que lhe é assacado,
Pugnando-se assim por acórdão que julgue verificado erro de julgamento e que em consequência, concedendo-se provimento ao recurso, declare a impugnação totalmente improcedente, porém, V. Exas. decidindo, farão a costumada JUSTIÇA» ** Não foram apresentadas contra-alegações. ** ** ** II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSODe acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do Recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. No caso trazido a exame, a questão a decidir consiste em saber a sentença laborou em erro ao considerar « não devidamente fundamentada a fixação de percentagem aplicada para determinação da margem bruta de vendas.». ** III. FUNDAMENTAÇÃOA. DOS FACTOS Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto nos seguintes termos: «A) A coberto das Ordens de Serviço n°s .....49, .....50 e .....51, de 10.03.1999, a Direcção Distrital de Finanças de Lisboa realizou acção de inspecção à impugnante com referência aos exercícios de 1995 a 1997 (cfr. fls. 102 dos autos). B) Como resultado da acção de inspecção mencionada na alínea antecedente, foi elaborado o correspondente relatório final em 04.10.2000, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (cfr. fls. 10 a 30 do PAT). C) Consta do Relatório mencionado na alínea antecedente o seguinte: "II - OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA A) Credencial e Período em Que Decorreu a Acção (...) B) Motivo, âmbito e extensão da acção inspectiva A inspecção teve origem na análise de pedido de reembolso, verificando-se aumento constante das existências e a falta de vendas para a actividade do ouro, resultando uma situação permanente de crédito de IVA ao longo dos exercícios. As margens brutas de vendas têm registado descidas ao longo dos exercícios em análise. - As facturas de compras e vendas não permitem testes correctos às margens por as mesmas apresentarem insuficiências de elementos na identificação de cada artigo. Os inventários, não se encontram devidamente referenciados, não permitindo assim identificar os artigos nem o preço de custo de cada um deles. O âmbito da inspecção é geral, aos exercícios de 1995 a 1997. C) Outras situações Vão ser utilizados elementos recolhidos das diversas ourivesarias do distrito de Lisboa, de forma aleatória, onde se verificou o custo de aquisição dos artefactos de ouro pelas as ourivesarias a diversos fornecedores, assim como o preço médio de mercado de artefactos em ouro. (...) IV - MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS 1 - EVOLUÇÃO DA EMPRESA - TRIÉNIO DE 1995 A 1997 Com base nas declarações Mod. 22 dos exercícios de 1995 a 1997, foram elaborados mapas comparativos "Demonstração de Resultados Líquidos Comparados", "Balanços Comparados" e "Mapa de Indicadores". Da análise comparativa à "Demonstração de Resultados Comparados", verificou-se, que na rubrica "Proveitos" a conta com maior expressão é "Vendas de Mercadorias" a qual representa em 1995, 99-%, 1996 100%, e 1997 98%, do total daqueles, registando acréscimos de 9% e de 7% em 1996 e 1997 respectivamente, quando comparados com o ano anterior. Em relação aos custos a conta mais significativa é "Custo das Existências Vendidas e Consumidas", a qual representa 70% do total daqueles, cuja percentagem é constante no triénio em análise. Em relação ao "Resultado Líquido do Exercício" registou em 1996 uma diminuição de (57%) em 1997 de (11%), quando comparados com ano anterior, Sendo a razão principal, destas diminuições as vendas serem insuficientes para os custos efectuados, já que em 1996 "F.S.E.", aumentaram em 21%, quando as vendas somente aumentaram 9% em comparação com o ano anterior. Em 1997, as vendas somente aumentaram 7%, enquanto "Custos c/ Pessoal" e "Custo das Existência? Vendidas", registaram cada deles um deles um acréscimo de 9%, conf, doc. fl. n°25. Do mapa de indicadores, constatou-se, que as margens brutas s/ vendas praticadas pelo sujeito passivo, foram de 29,4%, 29,31% e 28,81% de 1995 a 1997, respectivamente, sendo a "Rentabilidade das Vendas", de (1,53%) em 1995, 0,49% em 1996 e 0,38% em 1997, conf. doc. fl. n°26. Em relação aos "Balanços Comparados", no "Activo" a rubrica mais significativa foi de "Existências" que representou, 73% do total do "Activo" em 1995, registando um acréscimo de 17% e 24% em 1996 e 1997 respectivamente, conf. doc. fl. n°27. "Capital Próprio + Passivo", destaca-se "Dividas a Terceiros" dado representar 99%, sendo a conta mais significativa "Sócios", a qual corresponde a 70%, 68,5% e 61,2% em 19-95, 1996 e 1997, respectivamente, do total das dívidas. (...) 2.3 — EXISTÊNCIAS
2.3.1 - Inventários de 1995 a 1997 Os inventários apresentados pelo sujeito passivo não identificam a proveniência, dos artefactos de metais preciosos conforme determina o art°104° do Decreto-Lei n°391/79, apesar de cada artigo possuir um código atribuído pelo sujeito passivo, seguido da designação do produto, não é possível identificá-lo com as facturas de compra, dado as mesmas não possuem qualquer referência, mas somente se limitam a indicar que tipo de artigo (anel, pulseira, etc) mesmo quando diz respeito a jóias, o mesmo acontecendo com os documentos de vendas. As existências, é a rubrica do activo, mais significativa, as quais representam 73%, 82% e 85% em 1995, 1996 e 1997 respectivamente Em média nos exercícios em análise as existências têm registado um acréscimo de 20%. As existências em armazém em 31/12/99, foram de 40.718.478$00, que comparadas com as dos exercícios em análise, registaram um acréscimo de 82% em relação a 1995, de 55% em relação com 1996, e de 25% em relação a 1997. De facto as existências em armazém não podem referir-se somente à relojoaria como consta na contabilidade, porque mesmo que se admitisse não ter havido vendas, as compras são muito inferiores às existências em armazém, em cada um dos exercícios.
2.3.2 - Contagem física das Existências Foi efectuada uma contagem física- em 13 de julho, de 2000, de todas as jóias existentes na loja, sempre com a colaboração da sócia gerente, cujos elementos considerados- foram; quantidades, designação de cada peca, com identificação; dos metais preciosos, peso de cada uma delas, preço de compra e preço de venda (extraída da-etiqueta constante em cada peça), conf. doc. fIs n°s 28 a 30 Do controlo de jóias existentes em stock, verificámos que algumas delas apesar de se encontrarem na loja em Julho, de 2000, não constam nos inventários, conforme a seguir se enumera: -Jóia código 769 (Brincos de oura c/ safira e 11 brilhantes), adquirida em 1995, não consta nos inventários do ano de aquisição nem nos anos seguintes; -Jóia código 6104 (Anel ouro c/16 brilhantes), comprado em 1998, não constam nos inventários do ano de aquisição nem nos seguintes; - Jóia código 4271 (Anel ouro branco e amarelo c/14 brilhantes), não existindo na empresa a factura da respectiva compra - Jóia código 6704 (Anel ouro c/8 brilhantes não existindo na empresa a factura da respectiva compra. Para além desta situação existem outros, artigos que apesar de constarem no inventário, não existem as facturas de aquisição, que entre outros, é o casos dos artigos com os códigos 5084 a 5086, conf. fl. n°28. Da análise efectuada verificámos que os inventários foram sempre elaborados da mesma forma, apresentando, carência de elementos, pelo que se considera que os inventários não merecem credibilidade
2.3.3- Margem Bruta da Vendas Pela análise da contabilidade verificou-se-que as margens brutas s/C.E.V., foram de 41,64%, 41,46% e 40,46%, respectivamente de 1995 a 1997. No entanto existem diversas amostragens efectuadas por estes serviços a ourivesarias situadas no distrito de Lisboa, de forma aleatória, cuja margem bruta médias/custo, é de 68,73%. Esta margem foi apurada através dos preços-de compra e os preços de vendas ambos sem lVA, existentes em, cada uma das ourivesarias da amostra em causa, tendo sido calculada a margem bruta s/ vendas de cada uma delas, e calculada a margem média bruta das referidas ourivesarias. Quando foi efectuada a contagem física das jóias, foi calculada a margem bruta de vendas das mesmas, assim-coma de-outros-artigos, estes por amostragem tais como: relojoaria, pratas e ouro. No entanto dado a pouca- informação- das facturas de compras as quais- na sua grande maioria não possuem qualquer referência do tipo de artigos, havendo até alguns em que não existem documentos das compras, por um lado, e por outro as vendas em que só existe uma venda a dinheiro diária, onde é referido cada artigo sem qualquer elemento identificativo, com numeração sequencial, não sendo possível efectuar correctamente o controlo entre o preço de custo e de venda Do cálculo das margens brutas-de-vendas-das-jóias, verificou-se que a margem média apurada s/ preço de compra foi de 44,9%, conf doc. fl. n°30, não tendo sido incluídas para o referida cálculo as margens que apresentam valores significativamente mais elevados. Em relação á amostragem efectuada sobre os artigos de relojoaria, oura espraiar a margem média s/preço de compra foi de 49,82%, conforme doc. fl.31. De acordo com a informação dada pela sócia-gerente da empresa, as-margens, são constantes ao longo dos exercícios.
2.4- Vendas O sujeito passivo tem um terminal electrónica, não possuindo regista das operações no rolo interno da fita da máquina, por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, de- acordo com a disposto no n°2 da art°39° da CIVA, unicamente apresenta um resumo diário sem qualquer numeração, assim como uma venda a dinheiro diária, que apesar de possuir número não tem ligação com a referido resumo, nem sequer com as operações no rolo interno da fita da máquina, não sendo possível efectuar qualquer controlo das-vendas. A contabilização das vendas e do respectivo IVA liquidado, é feita através de resumos trimestrais, extraídos dos resumos diários não sendo possível testar qualquer montante, por não existirem outros elementos. As vendas passam todas pela conta "Caixa", sendo posteriormente efectuados depósitos em bancos, não se conseguindo saber a que vendas dizem respeito, já que não existem comprovativos dos valores constantes nos referidos depósitos. Apesar de existirem pagamentos por cartões, quer multibanco quer visa, não estão evidenciados na contabilidade, razão pela qual foi impossível efectuarem-se quaisquer testes de conformidade. As vendas foram distribuídas pelas diversas rubricas (ouro, prata e-relojoaria) na mesma percentagem das compras, já que na contabilidade foram registadas pelo total quando deveriam ter sido pelas respectivas rubricas.
2.5. - COMPRAS A conta "Compras" foi contabilizada pelas rubricas "Relojoaria", "Pratas" e "Ourivesaria", estando as contas “Existências" e "Vendas" contabilizadas pelo total, pelo que é impossível efectuar um controlo por cada uma das referidas rubricas. Nos exercícios de 1995 a 1997, a conta “Existências" refere unicamente como mercadorias em armazém "Relojoaria", o que não coincidem com os inventários dos respectivos exercícios, elaborados pelo sujeito passivo, uma vez que constam artigos de ourivesaria, prata e relojoaria. Como se verifica no quadro abaixo, a rubrica mais significativa é de ouro, seguindo-se a relojoaria, que em 1997 registou uma diminuição nas compras de 19%. O total das vendas é muito aproximado do total das compras, sendo em 1997, até menor que o total das compras. No tocante as existências em armazém, verifica-se em 1996 um acréscimo de 17,4% quando as compras somente aumentaram 3,3%. Em 1997 registou um aumento 24% quer nas existências quer nas compras. Não é possível existir um acréscimo de existências numa percentagem superior ao acréscimo das compras, como acontece no exercício de 1996. Tal significa que estão em stock mercadorias, que não existem facturas das respectivas compras, ou estão incluídos produtos que já foram vendidos. Em 1997 como as existências em armazém e as compras, registaram o mesmo aumento percentual, tal significa que todos os artigos comprados no referido ano, não foram vendidos, situação que não parece corresponder à realidade, uma vez que o sujeito passivo continua a adquirir mercadorias e a aumentar as existências em armazém. Unidade: Escudos
1) O sujeito passivo, encontra-se em situação permanente de crédito de IVA, até à presente data, sendo a principal causa, o aumento das compras de existências, não tendo as vendas aumentado na mesma proporção. 2) Os inventários apresentados pelo sujeito passivo, em cada exercício têm registado acréscimos superiores aos das compras, além de não permitirem a identificação dos elementos patrimoniais, detectámos alguns produtos que não constam nos mesmos, apesar de se encontrarem em armazém em 13/07/00, data em que foi efectuada a relação das jóias existentes na loja. 3) Os empréstimos de sócios, não foram devidamente esclarecidos, pelo que nos parece que os movimentos efectuados nesta conta são apenas operações contabilísticas, resultantes de omissão de proveitos. 4) Apesar de ter sido apurada a margem bruta de vendas de artigos de ouro prata e relojoaria, cuja amostragem foi retirada de artigos existentes na loja e da joalharia, onde foram relacionadas todas as jóias existentes, as mesmas não merecem credibilidade, por as facturas de compras donde foram extraídos os preços de compra, não referenciarem devidamente o tipo de artigos. Em alguns casos não existem facturas, não sendo passível efectuar controlo cruzado com as vendas, devido à falta de elementos dos documentos em causa. 5) Que a margem média bruta s/C.E.V., nos três exercícios em análise declarada pelo sujeito passivo foi de 41,18%, quando a existente nos serviços extraída de forma aleatória em diversas ourivesarias do Distrito de Lisboa, foi de 68,73%. 6) As vendas não possuem elementos justificativos, das mesmas, uma vez que a contabilização, é efectuada através de resumos trimestrais, não existindo fitas da máquina nem qualquer suporte documental, Apesar de existirem vendas a dinheiro uma por cada dia. Não é possível identificar com segurança a proveniência de todos os artigos de metais preciosos, existentes no estabelecimento. Todas as alíneas referidas encontram-se descritas pormenorizadamente nos pontos anteriores do relatório. Assim por todos os motivos apresentados, a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimonial e resultado efectivamente obtido, de acordo com o disposto no n°2 do artigo 75° da Lei Geral Tributária aprovada pelo Decreto-lei n°398/98 de 17 de Dezembro, pelo que recorremos à aplicação dos métodos indirectos, dada a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta, para a determinação da matéria tributável, nos termos dos art°s 87° a 89° da Lei acima mencionada. V - CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS 1 - INTRODUÇÃO A determinação da matéria tributável foi efectuada nos termos do artigo 52° do CIRC, e artigo 90° da lei geral tributária, nomeadamente em elementos que a administração tributária dispõe sobre as margens médias de lucro. Como na contabilidade somente as compras estão registadas pelas diversas rubricas (relojoaria, pratas, ouro e jóias), foram as vendas distribuirias pelas referidas rubricas, na mesma percentagem das compras. Para determinação do valor das vendas através dos métodos indirectos, ao total das compras de 1995 a 1997, foi aplicada a margem média bruta s/ preço de custo, de 68,73%, existente nos serviços como já foi referido em diversos pontos do relatório. O quadro a seguir demonstra como foram distribuídas as vendas pelas várias rubricas, assim como as compras.se encontram contabilizadas. Unidade: Escudos
2.1.-Exercício de 1995 Como a margem bruta de vendas é de 68,73% Total das Vendas presumidas -15.973,655$+(15.973.655$*0,6873)=26.952.348$ Total das Vendas declaradas = 16.566.820$ Valor das vendas presumidas a tributar 10.385.528$ Como a diferença das vendas a tributar é de 10.385.528$, implicou o IVA em falta à taxa de 17%, no montante de 1.765.540$. O IVA foi distribuído na proporção das bases tributáveis constantes nas declarações periódicas, em cada período de imposto, conf. doc. fl. n°32.
2.2 - Exercício de 1996 Total das Vendas presumidas-16.502,689$+(16.502,689$*0,6873)=27.844.987$ Total das Vendas declaradas =18.046.606$ Valor das vendas presumidas a tributar 9.798.381$ Como a diferença das vendas a tributar é de 9.798.381$, implicou o IVA em falta à taxa de 17%, no montante de 1.665.725$. O IVA foi distribuído na proporção das bases tributáveis constantes nas declarações periódicas, em cada período de imposto, conf. doc. fl. n°32.
2.3.-Exercício de 1997 Total das Vendas Presumidas-20.462.318$+(20.462.318$*0,6873)=34.526.069$ Total das Vendas declaradas- =19.248.847$ Valor das vendas presumidas a tributar 15.277.222$ Como a diferença das vendas a tributar é de 15.277.222$, implicou o IVA em falta taxa de 17%, no montante de 2.597.128$. O IVA foi distribuído na proporção das bases tributáveis constantes nas declarações periódicas, em cada período de imposto, conf. doc. fl. nº32. VI – REGULARIZAÇÕES EFECTUADAS PELO S.P. NO DECURSO DA ACÇÃO INSPECTIVA Não aplicável ao caso em apreciação. (…) VIII -DIREITO-DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO Nos termos do art°60° da Lei Geral Tributária e artº60° do Regime Complementar de Procedimentos da Inspecção Tributária, foi notificado o sujeito passivo,-para no prazo de quinze dias exercer o direito de audição. O qual exerceu esse direito por escrito, cujos argumentos foram os seguintes: Ponto 1 - Refere que a notificação foi recepcionada pela pessoa que exerce funções de segurança, no centro comercial onde se encontra a sede que é o estabelecimento da empresa em causa, não lhe tendo sido dadas instruções para tal, tendo os representantes da empresa tido conhecimento em 18/09/00. Assim deste modo vem o sujeito passivo por em causa o prazo concedido para exercer o direito de audição, uma vez que considera, não lhe foi dado o prazo referido no art°60° da LGT. Ora, nos termos do nº1 do art°39º do CPPT, as referidas notificações presumem-se feitas no 3° dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil. O nº3 do art°39° do CPPT refere ainda "Havendo aviso de recepção considera-se na data em que ele for assinado e tem-se por efectuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue-ao-destinatário'' Deste modo o prazo de exercício do direito-de-audição foi de quinze dias, prazo máximo definido no art°60º da LGT e artº60º da RCPIT, o qual se considera nos termos do n°3 do artº39° devidamente notificado, tendo o prazo sido cumprido, apesar de ter sido assinado por um terceiro presente no domiciliado contribuinte, tendo sido entregue razão pela qual o sujeito passivo exerceu o direito à audição. Assim não pode ser concedido novo prazo, já que lhe foi dado o máximo ou seja quinze dias. Não podendo ser aplicado o artº68º do CPT, como aliás foi referido no direito de audição, já que o art°2° do Decreto-Lei n°433799 de 26 de Outubro, revogou o Código do Processo Tributária (CPT) a partir de 1 de Janeiro de 2000, data, que passou a vigorar o Código de Procedimento e de Processo Tributário. Ponto 2- Alínea A) De facto a actividade exercida não justifica o crédito permanente de IVA, uma vez que o mesmo é devido às compras de existências, significando assim que o IVA liquidado referente às vendas nunca foi superior ao IVA dedutível respeitante às compras de existências. A razão são os preços de venda praticados pelo sujeito passivo serem mais baixos resultantes das margens declaradas, serem inferiores às existentes nos serviços, tal como foi referido no ponto 2.3.3 do relatório. Acrescente-se-ainda que o sujeito passivo em análise até à presente, nunca esteve em situação devedora, sendo a causa principal as compras de mercadorias, não tendo o aumento de vendas conseguido absorver o crédito existente ao longo dos exercícios. Em relação aos empréstimos dos sócios o sujeito passivo diz não compreender a comparação com os rendimentos auferidos pelos mesmos, nos anos dessas entregas. Parece evidente e lógico, que só è possível efectuar empréstimos quando existem rendimentos, não nos parecendo ser o caso, já que pela a actividade comercial apresentou, sempre prejuízos no triénio em análise, nos rendimentos de trabalho dependente não foram suficientes para fazer face aos referidos empréstimos, tal como mencionado no ponto 2.2 do relatório. Exactamente por os empréstimos não se encontrarem apoiados em movimentos financeiros que justificassem tais empréstimos, mas tão sómente em documentos internos os quais foram efectuados por caixa, e não tendo o sujeito passivo comprovado a aplicação dos empréstimos, bem como qual a fonte dos mesmos, que nos leva a concluir tratar-se de operações contabilísticas, estando inerente a omissão de proveitos. Não foi no entanto demonstrado pelo sujeito passivo qual a fonte de rendimentos para realizar os referidos empréstimos. Na tocante às margens, apesar de ter sido efectuada uma amostragem das margens, a mesma foi efectuada tendo a socia gerente identificado cada produto com os constantes nas facturas de compras, não existindo no entanto qualquer referência comum, já que o código atribuído internamente não se encontra referenciado nas facturas quer de compra quer de venda, senda a-descrição de cada artigo insuficiente para a identificação de cada um deles. Pelo que as margens apuradas não foram calculadas com segurança e nem sequer com alguma precisão, por falta de elementos, quer nos custos de cada artigo quer nas vendas. No entanto o sujeito passivo não conseguia provar a rigor de cada um dos componentes para o cálculo das margens, pondo somente em causa todo o procedimento adoptado, não tendo justificado qualquer das afirmações que formulou. As existências em armazém encontram-se relatadas no ponto 2.3.1 do capítulo IV. Relativamente às deficiências encontradas as mesmas dizem somente respeito a alguns dos produtos, já que a análise foi efectuada por amostragem, mais uma vez o sujeito passivo contraria a conclusão emitida, sem no entanto comprovar e justificar a que menciona. Em relação à inexistência do registo das operações no rolo interno na fita de máquina, refere o n°2 do artº39º da CIVA, que os retalhistas são obrigados a emitir talão de venda previamente numerado, de acordo com o disposto no artigo 5° do Decreto-Lei n°198/90 de 19 de Junho, ou registo obrigatório das operações no rolo interno da fita da máquina Assim não se encontra a empresa a cumprir com o disposto na legislação em vigor, apesar, de possuir vendas diárias com numeração, e os valores coincidem entre si. No entanto não é possível testar aqueles montantes com os efectivamente registados e recebidos, por não existirem os rolos internos da máquina, nem extractos das vendas efectuadas diariamente, de modo a ser possível conferir-se o total de cada trimestre.
Alínea B) A determinação da matéria tributável com recurso a métodos indirectos foi efectuada com base em elementos existentes nos serviços, extraídos de diversas ourivesarias do Distrito de Lisboa, onde foram recolhidos os preços de compra e de vendas apuradas, ambos sem IVA, existentes em cada uma das ourivesarias, tendo sido calculada a margem bruta s/ as vendas, de cada uma delas, sendo posteriormente calculada a margem média bruta do universo em causa. Encontra-se no ponto 2.6 capítulo IV em síntese as razões do recurso à aplicação dos métodos indirectos. Não se trata nem de indicadores de actividade ad hoc, nem sequer da indicadores de base técnico científica, mas somente de informações existentes nos serviços, as quais foram recolhidas em empresas da mesma actividade do sujeito passivo inspeccionado, seleccionadas aleatoriamente. Não foi comprovado pela sujeita passivo quais as margens brutas que de facto pratica em cada um dos diversos tipos de produtos. Acrescente-se ainda que as margens brutas, da amostragem efectuada, que o sujeito passivo diz corresponderem à realidade dos factos, não são no entanto, coincidentes com as constantes nas declarações de rendimentos Mod. 22 de IRC. Pelo tudo o que já foi relatado, e atendendo que nos termos do artigo 39° do CPPT, foi devidamente notificado, tenda sida concedido o prazo máximo referido no art°60° da LGT e 60° do RCPIT, não existe qualquer irregularidade, pelo que não será concedido novo prazo. Como na audição não foram apresentados comprovativos dos factos relatados, mantêm-se todas as correcções consideradas no projecto de relatório.
IX - Propostas Pelo que foi exposto nos pontos anteriores deste relatório, propomos as seguintes correcções: Exercício 1995 a) IVA não liquidado no total de 1.765.540$00, com o recurso de métodos indirectos, referente a vendas à taxa de 17%. b) IVA indevidamente deduzido no total de 3.627$00, referente a outros bens e serviços, de correcções técnicas. Não se procedeu à liquidação adicional por o quantitativo ser inferior ao limite referido no n°5 do art°88° do CIVA. c) Correcções à matéria tributável, com recurso a métodos indirectos 10.385.528$00, e 177.731$00 de correcções técnicas. Exercício de 1996 d) IVA não liquidado no total de 1.665.725$00, com o recurso de métodos indirectos, referente a vendas à taxa de 17%. e) Iva indevidamente deduzido no total de 7.343$00, referente a outros bens e serviços, de correcções técnicas. Não se procedeu à liquidação adicional por o quantitativo ser inferior ao limite referido no n°5 do art°88° do CIVA. f) Correcções à matéria tributável, com recurso a métodos indirectos 9.798.381$00, e 43.196$00 de correcções técnicas. Exercício de 1997 g) IVA não liquidado no total de 2.597.128$00, com o recurso de métodos indirectos, referente a vendas à taxa de 17%. h) Iva indevidamente deduzido no total de 5.677$00, referente a outros bens e serviços, de correcções técnicas. Não se procedeu à liquidação adicional por o quantitativo ser inferior ao limite referido no nº5 do art°88° do CIVA. i) Correcções à matéria tributável, com recurso a métodos indirectos 15.277.222$00, e 165.875$00 de correcções técnicas. À consideração superior Lisboa, 4 de Outubro de 2000 A Inspectora Tributária "Texto integral no original; imagem" (E..........) D) Apresentado pedido de revisão da matéria colectável pela Impugnante, foi em 19.12.2000 elaborada a Ata n°209/2000 referente ao pedido de revisão, da qual consta não ter existido acordo entre os peritos intervenientes, conforme laudos dos mesmos constantes de fls. 67 a 81 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. E) Consta do Laudo do Perito da A.T. o seguinte: 5.2 - Em face do exposto e tal como foi dito no relatório, a contabilidade não evidência a verdadeira situação patrimonial da empresa nem os resultados efectivamente obtidos, propõe-se que os lucros tributáveis em IRC relativamente aos anos de 1995, 1996 e 1997, sejam alterados para os valores acima referidos. Relativamente ao ano de 1995 o lucro tributável de 10.816.831$00 foi corrigido para 6.578.407$00. Relativamente ao ano de 1996 o lucro tributável de 9.930.120$00 foi corrigido para 6.197.992$00. Relativamente ao ano de 1997 o lucro tributável de 15.516.672$00 foi corrigido para 8.914.839$00. G) Em 11.01.2001 e 24.01.2001 foram emitidas em nome da Impugnante as liquidações de IRC dos exercícios de 1996 e 1997, respectivamente com os n°s ..........53 e ..........94, considerando como matéria colectável a apurada no relatório final da acção de inspecção, sem terem em consideração a decisão de fixação proferida no procedimento de revisão (cfr. Reclamações Graciosas n°s ...........4 e ...........2 apensas). H) A Impugnante apresentou em 03.04.2001 reclamações graciosas contra as liquidações identificadas na alínea antecedente, requerendo a correcção da matéria colectável em função do resultado do pedido de revisão efectuado (cfr. Reclamações Graciosas n°s ...........4 e ...........2 apensas). I) A Impugnante apresentou em 28.05.2001 a presente impugnação judicial (cfr. fls. 2 dos autos). J) Em 18.05.2001 foram emitidas em nome da Impugnante novas liquidações de IRC dos exercícios de 1996 e 1997 com os n°s ..........59 e ..........60, nos montantes a pagar de 16.514,36€ e 20.361,45€, tudo respectivamente, desta feita considerando como matéria colectável a apurada no procedimento de revisão da matéria colectável (cfr. fls. 47 e 48 dos autos). K) A A.T., no âmbito das correcções efectuadas em sede de métodos indirectos, não obstante possuir no seu sistema informático rácios de actividade apurados relativamente a empresas inseridas no mesmo sector de actividade da Impugnante, não os aplicou (acordo)». Consta ainda da sentença recorrida que: «Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos e no processo administrativo apenso» e que «O depoimento prestado pela testemunha arrolada pela Impugnante não relevou para a prova de qualquer facto tendo em conta, por um lado, o facto de apenas ter iniciado relações profissionais com a Impugnante em 2001, muito depois dos anos a que respeitam os exercícios em causa nos autos, independentemente do facto de ter afirmado ter revisto a contabilidade dos anos de 1995 a 1997, e por outro lado, por o seu discurso se revelar claramente genérico, apenas baseado na sua experiência como funcionário da A.T., em nada permitindo ao Tribunal tirar conclusões sobre as questões fundamentais para a decisão de mérito da impugnação». ** B.DE DIREITO A sentença sob recurso julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela ora recorrida contra as liquidações adicionais de IRC, referentes aos exercícios de 1996 e 1997, anulando-as, com fundamento na falta de fundamentação das concretas razões que presidiram à escolha do critério utilizado na quantificação da matéria tributável com recurso a métodos indirectos. Para assim decidir, considerou a sentença recorrida: «(…) a A.T. invocou que a "determinação da matéria colectável com recurso a métodos indirectos foi efectuada com base em elementos existentes nos serviços, extraídos de diversas ourivesarias do Distrito de Lisboa, onde foram recolhidos os preços de compra e de venda apuradas, ambos sem IVA, existentes em cada uma das ourivesarias, tendo sido calculada a margem bruta s/ as vendas de cada uma delas, sendo posteriormente calculada a margem bruta do universo em causa". Concluiu assim a A.T. que, através da utilização deste método, a margem bruta de vendas a aplicar à Impugnante seria a de 68,73%.(…) É que, na verdade, até nos podemos questionar se, de facto, a A.T. efectuou aquele apuramento de 68,73%, uma vez que não existe qualquer elemento comprovativo da situação invocada, e não existindo, caso a aceitássemos mesmo sem qualquer justificação de facto efectiva, então caso a A.T. invocasse uma margem de 80%, 90% ou 100%, sempre a mesma seria também de aceitar sem mais. Ora tal conclusão mostra-se de tal modo gritante em termos de razoabilidade, que é de reprovar. E mais reprovável se mostra quando os serviços inspectivos não se dão sequer ao trabalho de justificar por que razão, tendo ao seu dispor rácios referentes à área de actividade da Impugnante, não os aplicam. Ora, é assim evidente que a A.T. não fundamentou minimamente o critério utilizado para o apuramento da margem bruta das vendas, impossibilitando que quer o contribuinte, quer o Tribunal, o possam sindicar, o que equivale a dizer que, não sendo o mesmo demonstrado justificadamente, deve ser tido como critério de quantificação errado ou inadequado e tanto basta para inquinar a quantificação efectuada.» Como se vê das Conclusões I a XIV do respectivo recurso, a Fazenda Pública entende que a sentença errou quando considerou verificado o vício de falta de fundamentação do critério de quantificação utilizado pela Administração Tributária, com vista ao apuramento da matéria tributável. Neste quadro, a questão que cumpre apreciar neste recurso consiste em saber se o discurso verbalizado pela Administração Tributária, no que respeita ao critério utilizado para determinação da matéria tributável por métodos indirectos, padece, ou não, do vício de forma de falta de fundamentação, tal como o mesmo se encontra invocado na petição inicial. O direito à fundamentação, e o correspectivo dever por parte da Administração, decorre do n.º 3 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa: «Os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos». Por sua vez, também nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 77.º da LGT, «A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo as que integrem o relatório de fiscalização tributária». E, especificamente, quanto à tributação por métodos indiciários, o n.º 4 do mesmo artigo 77.º, refere que «A decisão da tributação por métodos indirectos, nos casos e com os fundamentos previstos na presente lei, especificará os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria tributável (…) e indicará os critérios utilizados na sua determinação”. Realce-se, ainda, que a fundamentação é um conceito relativo, variando em função do tipo concreto do acto e das circunstâncias em que o mesmo foi praticado, e que o grau de fundamentação exigível deverá estar directamente relacionado com o grau de litigiosidade existente, isto é, com a divergência existente entre a posição da Administração Tributária e a do contribuinte (vide, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 19.11.2014, proferido no processo n.º 0407/12, disponível em texto integral em www.dgsi.pt). As características exigidas quanto à fundamentação formal do acto tributário, (…), são distintas das exigidas para a chamada fundamentação substancial: à fundamentação formal interessa a enunciação dos motivos que determinaram o autor a proferir a decisão com um concreto conteúdo; à fundamentação material interessa a correspondência dos motivos enunciados com a realidade, bem como a sua suficiência para legitimar a actuação administrativa no caso concreto (ou seja, esta deve exprimir a real verificação dos pressupostos de facto invocados e a correcta interpretação e aplicação das normas indicadas como fundamento jurídico)». (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 20.02.2019, proferido no processo n.º 775/02.2BTVIS, disponível em texto integral em www.dgsi.pt) Do que vem dito, resulta, assim, que a Administração Tributária tem de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, por forma a que o contribuinte deles fique ciente, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissíveis para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada e que permitam extrapolar uma adequada ponderação da decisão. No caso em apreço, como resulta da leitura do Relatório de Inspecção, concretamente do ponto V (CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS), o critério de quantificação da matéria tributável (correcção das vendas) nele indicado foi o de aplicar a margem bruta de 68,73% sobre preço de custo, resultante de uma amostragem efectuada a 12 ourivesarias do Distrito de Lisboa. Sucede, porém, que em lado algum a Administração Tributária afirma directa ou indirectamente que a margem que aplicou na determinação da matéria tributável (68,73%) da Recorrida foi a praticada nos exercícios de 1997 e 1998, isto é, a relativa aos exercícios inspeccionados. Para além disso, atendendo que se tratava de apuramento por amostragem impendia sobre a Administração Tributária o dever de enunciar o universo dos produtos incluídos na mesma, para que se percebesse a semelhança das características da amostragem com a situação do sujeito passivo inspeccionado. Ora, tendo a determinação da matéria tributável por métodos indiciários de ser feita por aproximação à realidade que se procura apurar, é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação. Para tanto, a Administração Tributária tem de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias da atividade do contribuinte, conduzam à extrapolação dos factos conhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar. A Administração Tributária tem, assim, de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, de modo a que o contribuinte deles fique ciente e apto a discutir a valorimetria aplicada, isto é, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissíveis para a sua atividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada e que permitam extrapolar uma adequada ponderação da decisão. No caso concreto, tal como dissemos, e ora reiteramos, do Relatório de Inspecção e da Decisão da Comissão de Revisão apenas consta que a margem de 68,73% sobre o custo das existências vendidas, foi apurada em resultado de uma amostra obtida de forma aleatória a 12 ourivesarias do Distrito de Lisboa, sendo tais elementos complemente omissos quanto aos exercícios apreciados na amostragem e aos produtos que lhe serviram de referência. Do vindo de referir, não podemos deixar de concluir, que a Administração Tributária não fundamentou suficientemente as razões subjacentes ao critério de quantificação elencado no Relatório de Inspecção, em termos que permitam dar a conhecer as razões da decisão e para que a Recorrida ficasse habilitada possa provar que o critério utilizado é desadequado e/ou inadmissível para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributada quantificada. Com efeito, como bem refere o Ministério Público « Na verdade, a A.T. não esclarece de que forma chegou à conclusão de que a margem bruta de vendas deveria ser calculada em 68,73% (…) Isto é, a A.T. teria que mostrar quais as premissas que levaram àquela conclusão, sob pena de não se poder aquilatar da justeza da quantificação operada.». Improcedem assim, na totalidade as conclusões do recurso. IV.CONCLUSÕES I. O dever de fundamentação que recai sobre a Administração Tributária, no caso de tributação por métodos indiciários, incide não só sobre a indicação dos motivos por que entende que a contabilidade do contribuinte não merece credibilidade e se mostra impossível a quantificação directa e exacta da matéria tributável, mas também deve indicar os factos conhecidos de que partiu e que lhe permitiram, à luz das regras de experiência, segundo critérios de razoabilidade e tendo em conta as concretas circunstâncias do exercício da actividade, fixar o critério de quantificação da matéria tributável. V.DECISÃO Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida. Custas a cargo da Recorrente, sendo que delas está isenta, atenta a data da instauração da presente impugnação judicial. Lisboa, 28 de Novembro de 2019 Ana Pinhol Isabel Fernandes Catarina Almeida e Sousa |