Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 62/08.2BELLE |
Secção: | CA |
Data do Acordão: | 07/11/2024 |
Relator: | MARA DE MAGALHÃES SILVEIRA |
Descritores: | CADUCIDADE DO DIREITO DE AÇÃO NULIDADE DA SENTENÇA INSUFICIÊNCIA DA MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO |
Sumário: | I - Verificando-se que o suporte áudio das gravações da audiência de discussão e julgamento contém, de forma audível e percetível, os depoimentos das testemunhas, não se verifica nulidade processual nos termos do art. 201.º, n.º 1 do velho CPC. II - Para o efeito de constituir o termo inicial do prazo de caducidade de 132 dias previsto do referido art.º 255.º, terá de estar em causa uma decisão inequivocamente negativa relativamente à pretensão deduzida pelo empreiteiro, interrompendo-se este prazo com o pedido de tentativa de conciliação e só voltando a correr 22 dias depois da data em que o requerente recebeu documento comprovativo da impossibilidade de realização ou da inviabilidade da diligência. III - Não integra a causa de nulidade tipificada na al. d) do art. 668.º, n.º 1 do velho CPC a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados pela parte. IV - Não constitui nulidade da sentença, nos termos da al. b) do art. 668.º, n.º 1 do velho CPC, a deficiência na motivação da matéria de facto. V - A insuficiência na motivação da matéria de facto dada como provada, determinante da impossibilidade de apreciação do erro de julgamento de facto, impõe a remessa dos autos à 1.ª Instância, a fim de motivar a decisão da matéria de facto nos termos do art. 712.º, n.º 5 do velho CPC. |
Votação: | Unanimidade |
Indicações Eventuais: | Subsecção de CONTRATOS PÚBLICOS |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório T........, Lda., no decurso dos autos substituída por Massa insolvente de T........, Lda. (doravante Recorrida ou A.) instaurou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, a presente ação administrativa comum contra o Município de Monchique, (doravante Recorrente, Entidade Demandada ou ED), na qual, no âmbito do contrato de empreitada de obras públicas para a “Construção da Via de Interligação do IC1 – São Marcos da Serra à rede viária envolvente, EN 267 – Alferce” celebrado entre ambos, peticionou a condenação da ED no pagamento de “indemnização no montante de € 1 566 395,79, acrescida de juros vencidos e vincendos desde 17 de Janeiro de 2006”, em virtude dos sobrecustos que suportou pelo prolongamento da obra em relação ao inicialmente previsto e que resultou de vicissitudes imputáveis ao Município dono da obra. Em 29.12.2010 o Tribunal a quo proferiu despacho saneador no qual julgou improcedente a exceção de caducidade do direito de ação. Em 14.6.2011 o Tribunal a quo proferiu despacho fixando a matéria de facto assente e elaborando base instrutória. Por sentença proferida em 16 de abril de 2012, o referido Tribunal julgou parcialmente a presente ação improcedente e, em consequência, condenou a ED a pagar à A. “as seguintes quantias: a) € 14 707,63 referente a custos não ressarcidos com o projecto; b) € 1 045 662,06 referente a quebras de rendimento de mão de obra e equipamentos; c) € 319 730,48 referente a prolongamento de estaleiro; d) € 43 896,00 referente a imobilização da central betuminoso”, absolvendo-a “dos pedidos indemnizatórios referentes aos encargos de estrutura de 5% e a Lucros e imprevistos de 5%. Inconformada, o Recorrente/Entidade Demandada interpôs recurso para este Tribunal Central Administrativo Sul, apresentando alegações e concluindo nos seguintes termos, “1-Foi requerida a gravação da audiência de discussão e julgamento. O aqui Recorrente pretende recorrer de facto e de direito, para o efeito requereu as gravações efectuadas. “I. É responsabilidade do dono da obra o ressarcimento dos danos gerados pela insuficiência técnica e pelos erros das peças do projecto patenteadas a concurso (Art. 37.º n.º 1 RJEOP); “I. O Art. 2.º n.º 1 do CPTA impõe ao julgador o dever de decidir as pretensões que sejam regularmente deduzidas em juízo, à semelhança do disposto no Art. 660.º n.º 2 do CPC, por aplicação do Art. 1.º do CPTA que impõe o conhecimento das “questões que as partes tenham submetido à sua apreciação”. “1-Vem o aqui Recorrente, através de recurso subordinado, questionar a razão peia qual o Réu nos autos não foi condenado ou absolvido do pedido de juros efectuado.
“Não se provou: 50. Que a obra importava um custo de administração ou de estrutura de 5% do valor da obra, que sendo embora indirecto, foi suportado pela A., correspondente a 71,199,81 €. 51. Que o lucro esperado para esta empreitada fosse de 5% a fim de preservar o equilíbrio financeiro do contrato.
III.3. Constatando-se a insuficiência do probatório para, face à causa de pedir alegada pelo Recorrente, se conhecer do objeto do recurso, nos termos do n.º 1 do art.º 662 do CPC ex vi art. 140.º do CPTA, procede-se ao aditamento da seguinte factualidade: “(texto integral no original; imagem)” - doc. 2 da p.i. 51. Em 26.1.2007 a A. apresentou requerimento ao R. de que se extrai, “(texto integral no original; imagem)” - doc. 3 da p.i.;52. Por ofício n.º 000676 datado de 23.2.2007 o R. respondeu nos seguintes termos, “(texto integral no original; imagem)” - doc. 6 da p.i.;53. Em 14.6.2007 a A. apresentou no Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes requerimento para marcação de tentativa de conciliação extrajudicial, relativamente à sua reclamação de sobrecustos no valor de 1.566.395,79 €. - cf. docs. 7 e 8 da p.i.; 54. Em 9.10.2007 foi lavrado pelo CSOP auto de não conciliação nos seguintes termos, “(texto integral no original; imagem)” - doc. 9 da p.i.;55. A presente ação foi instaurada em 29.1.2008. – fls. 1 dos autos. IV. Fundamentação de direito 1. Da nulidade processual por deficiência das gravações Nas alegações de recurso invocou a Recorrente a nulidade resultante de não constarem das gravações os depoimentos de M........, J........, F......... e P........., determinante da impossibilidade de recurso sobre a matéria de facto. Importa considerar que, já ao abrigo do velho CPC, se entendia que “as anomalias da gravação provenientes de erro técnico - omissão de gravação ou a gravação deficiente – não podem integrar o regime das nulidades processuais principais, porque tal irregularidade eventualmente cometida não está contemplada no elenco taxativo previsto nos artigos 193º a 200º do Código de Processo Civil, não podendo, contudo, deixar de integrar uma nulidade secundária, à qual será aplicável o regime decorrente do artigo 201.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. É que, a verificar-se uma anomalia na gravação da prova, poderá a mesma ter relevância para a decisão da causa, por ser susceptível de influir no exame e decisão da causa, podendo até impedir a parte de ver reapreciada a prova produzida, por via de recurso, o que é de todo insustentável.” (Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 26.3.2009, proferido no processo 1310/04.3TBMFR-2). Não se colocando nos autos a questão do prazo para a Recorrente invocar o vício de que eventualmente padece a gravação, quer porque “entendemos que não será exigível às partes que controlem a gravação efectiva dos depoimentos prestados em audiência logo nesse próprio acto processual” (Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 26.3.2009, proferido no processo 1310/04.3TBMFR-2), quer porque se mostra cumprido o prazo de 10 dias para arguição da nulidade secundária (art. 205.º, n.º 1 do CPC) – as gravações foram entregues em 23.5.2012 (fls. 1134 dos autos) e a nulidade arguida nas alegações de recurso apresentadas em 29.5.2012 (fls. 1136 dos autos) – cumpre conhecer da referida nulidade. Isto posto, aceite que “a omissão ou imperceptibilidade da gravação implicará necessariamente a repetição da prova, sempre que tal falha seja grave e, portanto, essencial ao apuramento da verdade, importa apurar – o que igualmente deveria ter sido apreciado pelo Tribunal a quo - se no caso vertente se verifica a apontada anomalia e se a mesma é susceptível de influir no exame e na decisão da causa.” (Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 26.3.2009, proferido no processo 1310/04.3TBMFR-2). Auditado o suporte áudio das sessões de audiência de julgamento realizadas verifica-se que, opostamente ao alegado pela Recorrente, se mostram integralmente contidos nas gravações, de forma audível e percetível, os depoimentos das testemunhas M........, J........, F......... e P.......... Assim, porque inexiste qualquer anomalia verificada na gravação da prova, apta a influir no exame e decisão da causa e impeditiva do direito da parte de ver reapreciada a prova produzida, não se verifica a apontada nulidade processual. 2. Do erro de julgamento de direito quanto à exceção de caducidade do direito de ação O Recorrente insurge-se quanto à decisão que recaiu sobre a exceção de caducidade do direito de ação sustentando, em suma, que, nos termos dos arts. 255.º e 256.º do Decreto-Lei n.º 59/99 (doravante RJEOP), tendo sido lavrado auto de receção provisória aceite no seu conteúdo, elaborada a conta final e não tendo havido lugar a reclamação atempada das decisões do Recorrente e da fiscalização da obra, tal traduz-se na aceitação das decisões tomadas e a caducidade do direito. Não sendo questionado nos autos a aplicação do Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas aprovado pelo DL n.º 59/99, de 2 de março, ao contrato de empreitada em causa nos autos, dispunha este diploma no art. 255.º que, “As acções deverão ser propostas, quando outro prazo não esteja fixado na lei, no prazo de 132 dias contados desde a data da notificação ao empreiteiro da decisão ou deliberação do órgão competente para praticar actos definitivos, em virtude da qual seja negado algum direito ou pretensão do empreiteiro ou o dono da obra se arrogue direito que a outra parte não considere fundado.” Refira-se que é entendimento uniforme que, para o efeito de constituir o termo inicial do prazo de caducidade de 132 dias previsto do referido art.º 255.º, terá de estar em causa uma decisão inequivocamente negativa (Ac. TCAN 01279/10.5BEBRG-A de 6.3.2015, Acórdãos do STA de 24.03.2004, processo n.º 01509/03 e de 05.12.2007, no processo n.º 649/07), pelo que “só com a decisão expressa (sua notificação) tomada pelo órgão competente do dono da obra se inicia o prazo de caducidade de 132 dias ali previsto para a instauração da ação, não se podendo falar da formação de ato tácito de indeferimento por aplicação do artigo 109º do CPA para efeitos de contagem de tal prazo.” (Ac. deste TCA Sul de 15.12.2016, P. 08498/12). Ou seja, para o efeito da caducidade do direito de ação, importa, como emerge expressamente do art. 255.º do RJEOP, a decisão expressa de rejeição da pretensão do empreiteiro e que, in casu, era de reposição do equilíbrio económico-financeiro do contrato. A aceitação pelo empreiteiro da receção provisória, da conta final ou de outras decisões tomadas pelo dono de obra ou pela fiscalização da obra releva, na realidade, quanto à (também) invocada (embora assim não expressamente qualificada) exceção peremptória de caducidade do direito (substantivo) reclamado nos autos, mas que, por se reportar ao mérito da ação (apenas) caberá apreciar no âmbito do imputado erro de julgamento de direito imputado à decisão recorrida, dependendo pois da motivação da matéria de facto que, a final, como veremos, se determinará. O prazo de 132 dias contabiliza-se nos moldes descritos no art.º 274.º RJEOP, ou seja, (i) não se inclui na contagem o dia em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr, (ii) o prazo começa a correr independentemente de quaisquer formalidades e suspende-se nos sábados, domingos e feriados nacionais, e, finalmente, (iii) o termo do prazo que caia em dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o acto não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o 1.º dia útil seguinte. O momento que determina o início da contagem do referido prazo de 132 dias é o da notificação do ato que denegou a pretensão indemnizatória, e a contabilização do prazo refere-se a dias úteis. Estabelece-se, ainda, no art. 264.º do RJEOP, epigrafado “Interrupção da prescrição e caducidade”, que “[o] pedido de tentativa de conciliação interrompe o prazo de prescrição do direito e de caducidade da respectiva acção, que voltarão a correr 22 dias depois da data em que o requerente receba documento comprovativo da impossibilidade de realização ou da inviabilidade da diligência.” A respeito da caracterização ou a implicação que o pedido de tentativa de conciliação trazia para o prazo de caducidade previsto no art. 255.º do RJEOP, mormente, se o que se dispunha no citado art. 264.º implicava uma interrupção ou, ao invés, uma suspensão daquele prazo, escreveu-se no Ac. do TCA Norte de 16.12.2010, proferido no processo 00355/06.3BECBR, “Tal questão não é nova tendo merecido já resposta uniforme em várias decisões dos tribunais superiores [cfr. Acs. STA de 06.04.1995 - Proc. n.º 028637, de 04.06.1996 - Proc. n.º 38736, de 17.03.204 - Proc. n.º 046978, de 11.11.2004 - Proc. n.º 0310/04 in: «www.dgsi.pt/jsta»], incluindo por este mesmo TCA Norte [cfr. nomeadamente, Ac. de 06.11.2008 - Proc. n.º 910/06.1BEBRG - inédito]. Assim, resulta mormente do sumário do acórdão do STA de 11.11.2004 (Proc. n.º 0310/04 in: «www.dgsi.pt/jsta») (decisão proferida é certo no quadro do RJEOP/93 mas cuja doutrina permanece válida para RJEOP/99 dada a similitude neste âmbito dos comandos legais em questão e que o próprio reconhece nos seus termos) que “… o pedido de tentativa prévia de conciliação extrajudicial interrompe o prazo de caducidade da acção de rescisão do contrato, implicando a inutilização de todo o tempo decorrido anteriormente e a contagem de um novo prazo a partir do momento definido na 2.ª parte do art. 235.º do DL 405/93 ...”. E da respectiva linha argumentativa extrai-se, com pertinência para a questão a dilucidar, que “… a presente acção estava sujeita a tentativa prévia de conciliação, nos termos do art. 231.º, subordinada ao procedimento contemplado no art. 232.º, sendo que, de acordo com o disposto no art. 235.º - epigrafado de «interrupção da prescrição e da caducidade» - «O pedido de tentativa de conciliação interrompe o prazo de prescrição do direito e de caducidade da respectiva acção, que voltarão a correr 22 dias depois da data em que o recorrente receba documento comprovativo da impossibilidade de realização ou da inviabilidade da diligência». Sendo a interrupção da prescrição ou da caducidade um instituto jurídico bem distinto da sua suspensão não faz qualquer sentido pretender-se que o legislador não aplicou o termo no seu verdadeiro sentido técnico-jurídico. O padrão que marca a distinção entre um e outro assenta no facto de a interrupção inutilizar o prazo já decorrido (art. 326.º do CC) enquanto a suspensão apenas paralisa o prazo que estiver a decorrer, que voltará a correr assim que se mostre esgotado o facto que a determinou (Almeida Costa, «Direito das Obrigações», 9.ª edição, págs.1045 e ss. e Mota Pinto, «Teoria Geral do Direito Civil», 3.ª edição, págs. 373 e ss. e 637 e ss.). É certo que a letra do preceito é equívoca, designadamente o 2.º segmento onde se diz que os prazos interrompidos «voltarão a correr 22 dias depois ...» o que é mais compatível com a suspensão do que com a interrupção. Contudo, a sua epígrafe - «Interrupção da prescrição e da caducidade» - e mesmo parte do texto - «o pedido de tentativa de conciliação interrompe o prazo» - não comporta qualquer dúvida e uma das interpretações possíveis do texto é também compatível com as características da interrupção. Acresce que, sabendo o legislador que interrupção e suspensão são duas realidades jurídicas distintas, com consequências opostas no domínio da contagem de prazos, é muito mais razoável aceitar-se que se exprimiu de modo algo confuso ao redigir parte do texto do preceito do que a escolher o instituto jurídico assinalado na sua epígrafe. De resto, a redacção dessa norma tem-se mantido inalterável nos 3 últimos diplomas sobre contratos de empreitada de obras públicas - arts. 231.º do DL 235/86, de 18.8, 235.º do DL 405/93, de 10.12 e 264.º do DL 59/99, de 2.3 - tendo este Supremo Tribunal afirmado, por diversas vezes, que, o que está em causa é uma verdadeira e autêntica interrupção do prazo, com todas as consequências legais daí decorrentes. Como pode ver-se no sumário do acórdão de 6.4.95, proferido no recurso 28637 «o pedido de tentativa de conciliação extrajudicial prévia a que obrigatoriamente estavam sujeitas as acções submetidas ao julgamento dos Tribunais Administrativos sobre interpretação, validade ou execução do contrato de empreitada de obras públicas, interrompe o prazo de caducidade da respectiva acção e não o suspende, de harmonia com as disposições conjugadas dos arts. 222.º e 231.º, todos do DL n.º 235/86, de 18 de Agosto (hoje, arts. 226.º, 231.º e 235.º do DL n.º 405/93, de 10 de Dezembro» ou no de 4.6.96, emitido no recurso 38736, onde se afirma que «o pedido de tentativa prévia de conciliação extrajudicial interrompe o prazo de caducidade da acção de rescisão do contrato, implicando a inutilização de todo o tempo decorrido anteriormente e a contagem de um novo prazo a partir do momento definido na 2.ª parte do art. 231.º do DL n.º 235/86» (veja-se, ainda, no mesmo sentido, o recente acórdão de 17.3.04, proferido no recurso 46978) …”. Acolhendo e reiterando o entendimento exposto sob o ponto antecedente cumpre, agora, reverter ao caso sob apreciação e efetuar a subsunção jurídica do quadro factual apurado de molde a aferir do acerto da decisão judicial recorrida. É dado assente e aceite pelas partes que a presente empreitada se mostrava e mostra disciplinada pelo DL n.º 59/99, nomeadamente, pelo que ali se dispunha de forma concatenada nos seus arts. 255.º e 264.º. A A. foi notificada por ofício datado de 23.2.2007 da decisão de rejeição da sua pretensão de ressarcimento de sobrecustos a título de reposição do equilíbrio financeiro, apresentando o requerimento peticionando a tentativa de conciliação junto do Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes em 14.6.2007, ou seja, ainda dentro do prazo de 132 dias contado nos termos do art. 274.º do RJEOP. Com a dedução da tentativa de conciliação operou a interrupção do prazo de caducidade nos termos dos arts. 255.º e 264.º do RJEOP, inutilizando todo o prazo já transcorrido, só começando o prazo de 132 dias a correr 22 dias úteis depois da data em que o requerente recebeu o documento comprovativo da impossibilidade de realização da diligência de tentativa de conciliação. Mostrando-se interrompida a contagem daquele prazo de caducidade o mesmo, na sua totalidade, só voltou a iniciar-se 22 dias depois da data em que a A. foi notificada do auto de não conciliação em 9.10.2007. Daí que contados os 132 dias úteis previstos no art. 255.º do RJEOP uma vez decorridos os 22 dias úteis previstos no art. 264.º do mesmo diploma, temos que a instauração da presente ação em 29.1.2008, se mostra feita tempestivamente por ainda não decorrido aquele prazo e como tal não ocorreu a exceção de caducidade do direito de ação, tal como se concluiu com acerto na decisão judicial recorrida. 3. Das nulidades da sentença O Recorrente imputa nulidade à sentença aduzindo, em suma, que, em sede de contestação, invocou um conjunto de questões que não foram consideradas pela sentença recorrida e, bem assim, que da sentença não se consegue descortinar quais os meios de prova determinantes para a formação da convicção do Tribunal ou as razões que subjazem à demonstração da factualidade dada como provada, não se alcançando, também, em sede de fundamentação de direito o raciocínio do Tribunal, determinando a sua nulidade nos termos do art. 668.º n.º 1 als. d) e b) do velho CPC. O artigo 668.º, n.º 1, do velho CPC, sob a epígrafe, “Causas de nulidade da sentença”, preceitua que a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (al. b)) e o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões que não devia conhecer (al. d)). A nulidade da sentença a que se refere a al. d) deste normativo verifica-se quando ocorre o incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito nos artigos 95.º, n.º 1 e 3 do CPTA e 608, n.º 2 do CPC, e que se traduz em decidir todas as questões submetidas à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras. Esclarece-se que, como é jurisprudência pacífica, a causa de pedir, ou melhor, as questões a decidir, não se confundem com as razões ou argumentos de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. Pelo que apenas integra a nulidade prevista no citado normativo, a omissão de conhecimento das “questões”, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões. Tal nulidade não se verifica quando o que se reclama é que o Tribunal se debruce sobre os argumentos jurídicos invocados em defesa da posição que se sustenta, pois que a eventual não ponderação de algum argumento, tese ou doutrina esgrimidos pelos sujeitos processuais escapa ao vício decisório de nulidade, desde que a questão colocada seja efetivamente apreciada e decidida. Importa considerar que nos autos a A./Recorrida reclamava a condenação do R. ao pagamento, a título de reposição de equilíbrio económico-financeiro, dos sobrecustos que suportou com um conjunto de vicissitudes ocorridas na execução da empreitada a seu cargo e que conduziram a uma maior permanência em obra. Para tanto, a A. invocou um conjunto de factos dos quais alegou que emergiram os danos invocados e que imputou a atuações do R./Recorrente. Em sede de contestação o R. defendeu-se por exceção, invocando a caducidade do direito de ação, e por impugnação. Neste segmento impugnatório a defesa do R./Recorrente assenta, no essencial, na demonstração de que não assistem à A. os direitos reclamados porquanto os sobrecustos dos trabalhos a mais foram contemplados no seu preço, os factos invocados não afetaram o desenvolvimento da obra e os que conduziram à prorrogação do prazo de execução da empreitada são, na realidade, imputáveis ao empreiteiro. Ora, importa considerar que as questões que ao Tribunal a quo cumpria decidir eram, apenas, saber se a ação fora tempestivamente deduzida – o que este fez em sede de despacho saneador – e, no que respeita ao mérito, se à A./Recorrida assistia o direito à reposição do equilíbrio económico-financeiro da empreitada, sendo-lhe, consequentemente, pagos os sobrecustos que alegou ter incorrido e que imputou ao R.. Sobre esta questão pronunciou-se a sentença recorrida, considerando provada a matéria alegada pela A. – e, consequentemente, não acompanhando a versão trazida aos autos pelo R./Recorrente, - atribuindo o direito que esta reclamava, convocando o disposto no art. 196.º do RJEOP, por entender que a maior dificuldade na obra, de que resultou o agravamento dos encargos e os danos da A., eram imputáveis ao R. (vd. fls 18 parte final, 19 e 20). Reitera-se que não integra a causa de nulidade tipificada na al. d) do art. 668.º, n.º 1 do CPC a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados por uma das partes, como são, no caso dos autos, os argumentos do R. e que este, no essencial, reproduz nos pontos 19 a 52 das suas conclusões. Pelo que se entende que a sentença não padece de nulidade por omissão de pronúncia. E, ademais, também não é nula a sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Com efeito, a nulidade contemplada na al. b) do mesmo art. 668.º, n.º 1 do CCP ocorre quando não se especifiquem os fundamentos de facto e de direito em que se funda da decisão e esta apenas se verifica quando exista absoluta falta de fundamentação, seja de facto ou de direito e não apenas fundamentação medíocre, deficiente, incompleta, errada ou não convincente. Com efeito, ao juiz cabe especificar os fundamentos de facto e de direito da decisão que profere, nos termos do disposto no art. 659.º, n.º 2 e 3, a fim de que esta decisão seja percetível para os seus destinatários e que estes, face à fundamentação exposta na sentença, possam impugná-la quer de facto (através do recurso previsto no art. 685.º-B do velho CPC) quer de direito. Como se escreveu no Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 2.11.2017, proferido no processo 42/14.9TBMDB.G1, “[N]ão basta que o juiz decida a questão posta; é indispensável, do ponto de vista do convencimento das partes, do exercício fundado do seu direito ao recurso sobre a mesma decisão (de facto e de direito) e do ponto de vista do tribunal superior a quem compete a reapreciação da decisão proferida e do seu mérito, conhecerem-se das razões de facto e de direito que apoiam o veredicto do juiz. Neste sentido, a fundamentação da decisão deve ser expressa, clara, suficiente e congruente, permitindo, por um lado, que o destinatário perceba as razões de facto e de direito que lhe subjazem, em função de critérios lógicos, objetivos e racionais, proscrevendo, pois, a resolução arbitrária ou caprichosa, e por outro, que seja possível o seu controle pelos Tribunais que a têm de apreciar, em função do recurso interposto. Todavia, ao nível da fundamentação de facto e de direito da sentença, como é lição da doutrina e da jurisprudência, para que ocorra esta nulidade “não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito” (nosso sublinhado). Neste sentido, que é o tradicionalmente perfilhado, referia J. Alberto dos Reis (4), a propósito da especificação dos fundamentos de facto e de direito na decisão, que importa proceder-se à distinção cuidadosa entre a “falta absoluta de motivação, da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.” (sublinhado nosso). Todavia, a nosso ver, no atual quadro constitucional (art. 205º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), em que é imposto um dever geral de fundamentação das decisões judiciais, ainda que a densificar em concretas previsões legislativas (cfr. art. 154º do C. P. Civil), parece que também a fundamentação de facto ou de direito gravemente insuficiente, isto é, em termos tais que não permitam ao respetivo destinatário a perceção das razões de facto e de direito da decisão judicial, deve ser equiparada à falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e, consequentemente, determinar a nulidade do ato decisório.”Feitas estas considerações, relativamente à fundamentação de facto, a alegação do Recorrente quanto à sua omissão incide, não sobre a discriminação dos factos provados e não provados, mas sim sobre a motivação. Sucede que, “como é sabido, não se pode confundir a motivação da sentença (artº 659 do CPC) com a fundamentação a que se reporta o artº 653, nº 2, do mesmo diploma legal. Aquela desdobra-se em fundamentação de facto e fundamentação de direito. Esta última, tem a ver com falta de motivação da prova, ou seja, a falta de análise crítica das provas e bem assim da especificação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, e que, a verificar-se, não consubstancia a nulidade prevista no citado artº 668, ou seja, não conduz à nulidade da sentença ou à anulação do julgamento mas levando tão somente a que o Tribunal da Relação, a requerimento da parte, faça remeter os autos à 1ª instância afim de aí ser suprida tal deficiência omissiva (cfr. artº 712, nº 4, do CPC, e nesse sentido vide ainda, por todos, Ac. RC de 2/3/99, in “www.dgsi.pt/jtrc”; Ac do STJ de 10/1/2002, in “Rev . nº 2705/01, 2ª sec., Sumários 1/2002”; Ac do STJ de 10/1/2002, in “Rev . nº 3294/01, 7ª sec., Sumários 1/2002”, Lopes do Rego in “Comentários ao Código de Processo Civil, Liv. Almedina, pág. 434” e Lebre de Freitas in “Código de Processo Civil Anotado, 2º Vol., Coimbra Editora, pág. 628”).” (Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 11.1.2005, processo 1862/04). Ora, a dissonância do Recorrente incide sobre a motivação, assentando na alegação de que não é possível descortinar quais os meios de prova que conduziram à formação da convicção do julgador, nem as razões pelas quais os factos foram ou não dados como provados. Donde, não estando em causa a falta na decisão dos fundamentos de facto que determinam a apontada nulidade, sem mais, impõe-se concluir pela não verificação da nulidade apontada. Também no que respeita à fundamentação de direito não assiste razão ao Recorrente. Não padecendo a sentença de nulidade nos termos da al. b) do art. 668.º, n.º 1 do velho CPC. Com efeito, pese embora a sua sumariedade, é perfeitamente claro que o Tribunal considerou que se verificaram, no desenvolvimento dos trabalhos, um conjunto de vicissitudes que entendeu imputáveis ao R. (fls. 18, 19 e 20), que levaram a que a empreitada tivesse tido uma duração superior à prevista e cuja maior permanência em obra acarretou prejuízos ao empreiteiro (fls. 19). Subsumindo a pretensão indemnizatória ao disposto no art. 196.º do RJEOP (fls. 19), considerou que a pretensão merecia provimento “salvo quanto aos encargos da estrutura e lucros esperados de 5%” (fls. 20), assim decidindo pela procedência parcial. A fundamentação constante da decisão recorrida é, pois, bastante para a decisão que ali era suposto ser proferida, sendo certo que é perfeitamente claro o enquadramento factual e o quadro normativo aplicável e subjacente à decisão, permitindo, pois, ao Recorrente exercer, de forma efetiva e cabal, a sua análise e a sua crítica, suscitando a sua reapreciação, como ora sucede nesta instância. Donde, não enferma a sentença das apontadas nulidades. 4. Do erro de julgamento de facto O Recorrente aponta o erro de julgamento de facto quanto aos factos dados como provados nos pontos 3 a 42, 44, 45 e 48 da sentença recorrida, aduzindo, em suma, que, a) Os factos dados como provados em 3 a 9, 19 a 22, 25 a 27, 33 e 34 e 36 a 39 não resultam de matéria analisada em sede de audiência de julgamento; b) Os factos dados como provados em 10 a 17, 23 e 24, 28 a 32, 40, 42, 44 e 48 não resultam do depoimento de qualquer das testemunhas inquiridas, nem se baseiam em documentos juntos aos autos; c) Os factos dados como provados em 18, 41 e 45 contrariam os depoimentos prestados em sede de audiência de discussão e julgamento; d) Não se logra alcançar a integração na factualidade provada dos pontos 35, 43, 46, 47 e 49. Considerando o disposto no art. 685.º-B do CPC ex vi arts. 1º e 140.º do CPTA, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão. Assim, o regime atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição total ou parcial do recurso: · Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados (cfr. art. 685.º-B, n.º 1, al. a), do CPC), os quais devem ser enunciados na motivação do recurso e sintetizados nas conclusões. · Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (cfr. art. 685.º-B, n.º 1, al. b), do CPC), sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 685.º-B do CPC. Ou seja, “quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição”. Sublinhe-se que a questão do alegado incumprimento dos ónus impugnatórios do julgamento da matéria de facto, é de conhecimento oficioso do tribunal ad quem, na medida em que o incumprimento pelo Recorrente dos ónus impugnatórios, previstos no art.º 685.º-B, n.ºs 1 e 2, do CPC, impede que a 2.ª Instância possa conhecer da impugnação do julgamento da matéria de facto operada, determinando a imediata rejeição do recurso quanto a essa impugnação (n.º 1, do art.º 685.º-B do CPC). Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que, salvo quanto aos factos 18, 41 e 45 da sentença recorrida relativamente aos quais o Recorrente não cumpriu o ónus de especificar os concretos depoimentos que afastam a demonstração daquela matéria factual – isto é, nas suas palavras, que contrariam os factos dados como provados naqueles pontos – e que, consequentemente, impunham decisão diversa, estando em causa a alegação da inexistência de meios de prova que demonstrem a factualidade dada como provada, entende-se que se mostram cumpridos os ónus impugnatórios. Pelo que caberia apreciar o imputado erro de julgamento quanto aos factos elencados em a), b) e c). Sucede que se constata uma patente insuficiência da motivação da matéria de facto que obsta a que este Tribunal conheça do erro de julgamento de facto. No Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 10.10.2023, proferido no processo 525/21.4T8LRA.C1, embora relativamente ao atual CPC mas com aplicação à regulação do velho CPC, deu-se nota que, “Em cumprimento deste dever de assegurar a todos os cidadãos um processo equitativo e justo, exige-se não só a indicação dos factos provados, como dos não provados e ainda, a indicação do processo lógico – racional que conduziu à formação da convicção do julgador, relativamente aos factos que considerou provados ou não provados, de acordo com o ónus de prova que incumbia a cada uma das partes, conforme o disposto no artº 607º, nº 4 do CPC. […] Especificados os factos provados e não provados, prossegue ainda Abrantes Geraldes, que “o dever de fundamentação (…) exige que “se estabeleça o fio condutor entre a decisão sobre os factos provados e não provados e os meios de prova usados na aquisição da convicção, fazendo a respectiva apreciação crítica nos seus aspectos mais relevantes. Por conseguinte, quer relativamente aos factos provados, quer quanto aos factos não provados, o juiz deve justificar os motivos da sua decisão, declarando por que razão, sem perda da liberdade de julgamento garantida pela manutenção do princípio da livre apreciação das provas (…), deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros, julgou relevantes ou irrelevantes certas conclusões dos peritos ou achou satisfatória ou não a prova resultante de documentos. É na motivação que agora devem ser inequivocamente integradas as presunções judiciais e correspondentes factos instrumentais (…). Se a decisão proferida sobre algum facto essencial não estiver devidamente fundamentada a Relação deve determinar a remessa dos autos ao tribunal de 1ª instância, a fim de preencher essa falha com base nas gravações efectuadas ou através de repetição da produção da prova, para efeitos de inserção da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto.” Refira-se que tendo os presentes autos seguido a tramitação regulada pelo anterior CPC, nos termos do art. 508.º-A n.º 1 al. e), 508.º-B n.º 1 al. a) e 511.º n.º 1 do CPC, foi, na sequência do saneamento dos autos (fls. 694 dos autos), elaborado despacho pela qual o Tribunal a quo selecionou a matéria de facto relevante que considera assente e a que constitui a base instrutória da causa (fls. 824 dos autos). Após a produção de prova, encerrada a discussão, ao abrigo do art. 653.º, n.º 2 do CPC, que dispõe que “a decisão proferida declarará quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador”, o tribunal proferiu despacho de decisão sobre a matéria de facto (fls. 965). É o seguinte o teor do despacho de fixação da matéria assente (despacho de 30.9.2011 a fls. 824 dos autos), a que correspondem os factos 1 a 9 da sentença recorrida: “I.1. Planeamento inicial da obra A) A R. adjudicou à A. a empreitada a que se referia o anúncio que publicou em data não apurada, designada "Construção da Via de Interligação do IC1 - São Marcos da Serra à rede viária envolventes EN267 — Alferce", que consistiu na execução do prolongamento da actual EN 267, a partir do cruzamento existente com a ligação a Alferce, desenvolvendo-se até ao cruzamento para Benafátima e São Marcos da Serra até à ligação ao IC1, numa extensão total de 18 700 m.B) A A. obrigou-se a executar essa empreitada de harmonia com o caderno de encargos pela quantia de Esc. 1.377.012.370$00 (mil trezentos e setenta e sete milhões doze mH trezentos e setenta escudos), a que acresceria IVA, conforme lista de preços unitários apensa à sua proposta, no prazo de 720 dias corridos a contar da consignação.C) A A. fez constar na sua proposta, que a R adjudicou, o seguinte: a) Uma lista discriminada, mês a mês, do número e categoria profissional de todos os meios humanos que afectaria à obra; b) Uma lista discriminada, por cada tipo de trabalho a executar, do número e espécie dos equipamentos que afectaria à obra, referindo também os meios humanos que iriam operar esses equipamentos; c) Uma lista discriminada dos mesmos equipamentos, consoante a espécie e número destes a afectar a obra, e indicação mês a mês do seu tempo de permanência em obra; d) Um plano de pagamentos, mês por mês, elaborado de acordo com a evolução prevista para a obra ao longo dos 720 dias previstos para a sua realização; - Doc. 1, fls. 36 a 45. D) A A. fez também constar na sua proposta, que a R. adjudicou, que "(...) por motivos de gestão e disponibilidade de meios, esta obra se reveste de especial interesse para esta empresa, peio que se decidiu apresentar um estudo de preços que constitui a nossa proposta refiectindo a limitação de margens a que nos impusemos"E) Nesse estudo junto com a proposta esclarecia-se o seguinte sobre o estaleiro:prevemos a implantação de um estaleiro principal perto da área central da obra, (...). No Estaleiro principal estarão centralizados os meios principais de produção bem corno todas as instalações centrais. Devido à extensão da obra será criado um estaleiro de apoio junto à construção da Passagem Inferior sob a Via Férrea, que se localizará dentro dos limites admissíveis da sua área de implantação. Os estaleiros principal e de apoio apresentarão o "iay-out" que a seguir se indica: • Escritório para o Empreiteiro: 140 m2 • Armazém / Ferramentaria: 160 m2 • Oficina: 120 m2 • Telheiro para Cofragens/Armaduras: 150 rn2 • Parque de materiais: 500 rn2 • Dormitórios, cantinas, vestiários e áreas de carácter social: 360 m2 • Laboratório de ensaios de betão, solos e betume: 150 m2 Os estaleiros serão dotados de redes de águas, esgotos, electricidade, telefone e fax e será instalada uma rede de rádio, constituída por central fixa e postos móveis, por forma a facilitar as comunicações entre estaleiros e as diversas frentes de trabalho I.2. O desenrolar dos trabalhos F) A consignação da obra ocorreu em 02.07.2001, esteve suspensa por determinação do dono da obra entre 03.07.2001 e 30.09.2001 e concluiu-se em 30.09.2004, tendo portanto durado 1216 dias em vez dos 720 previstos - Doc.s 15 e 16 juntos com a p.i.G) Para além da suspensão inicial, o prazo de conclusão da obra foi prorrogado ainda por seis vezes pelo dono da obra a requerimento da A.:a) Primeira prorrogação, até 30.09.2003; b) Segunda prorrogação, por carta DP/1009/2003 de 29 de Setembro de 2003, até 31.12.2003; c) Terceira prorrogação, por carta ref. EN-267-261-03 de 10 de Dezembro de 2003, até 12.03.2004; d) Quarta prorrogação, por carta DP/242/2004 de 11 de Março de 2004, até 12.072004; e) Quinta prorrogação, por carta EN-267-161-04 de 9 de Julho de 2004, até 30 de Setembro de 2004; f) Sexta prorrogação, por carta DP/799/2004 de 30 de Agosto de 2004, até 30.10.2004. H) Resultou frustrada uma tentativa de conciliação que a A. requereu em 14/06/2007 ao CSOPT ( INCI) - doc.7, 8 e 9 juntos com a p.i.I) A Autora dirigiu ao R. as comunicações a que se referem os artigos 61.º, 62.º, 68.º a 78.º e 80.º a 82.º da petição inicial”. E, tendo sido fixada a seguinte base instrutória (despacho de fls. 824 dos autos), “I.1. Planeamento inicial da obra Artigos 7° e 8° da p.i. I.2. O desenrolar dos trabalhos Artigos: 12°; 13°;14°; 15°;16°; 17°;20°, 21°; 22°; 23°;24°;25°; 26º;27º;28º;29º;30.º;31°; 32°;33°;34°;35°;37°;38°;39°;40°;41°; 42°; 43°; 44°, da p.i. I.4. Agravamento dos custos da A. a) Custos não ressarcidos com o projecto Art° 45°; b) Quebras de rendimento Art° 46.º; 47°;48°; 49° da p.i. c) Prolongamento de estaleiro Art° 52°; 53°; 54° d) Imobilização da central de betuminosas Art° 56°; 57° da p.i. e) e f) Encargos, lucros e imprevistos Art° 58°; 59° da p.i.” Mereceu a mesma do Tribunal a quo a seguinte resposta no despacho de fls. 965 dos autos, “I.1. Planeamento inicial da obra Artigos 7° e 8° da p.i. - Provados I.2. O desenrolar dos trabalhos Artigos: 12°; 13°;14°; 15°;16°; 17°;20°, 21°; 22°; 23°;24°;25°; 26°;27°;28°;29°; 31°; 32°;33°;34°;35°;37°;38°;39°;40°;41°; 42°; 43°; 44°, da p.i. - Provados I.4. Agravamento dos custos da A. a) Custos não ressarcidos com o projecto Art° 45° - provado b) Quebras de rendimento Art0 47°;48°; 49° da p.i. - Provados c) Prolongamento de estaleiro Art° 52°; 53°; 54° - provados d) Imobilização da central de betuminosas Art° 56°; 57° da p.i. - Provados e) e f) Encargos, lucros e imprevistos Art° 58°; 59° da p.i. - Não provado * Fundamentação da decisão de facto:Para a motivação das respostas dadas à matéria de facto controversa contribuíram os depoimentos das seguintes testemunhas, depoimentos estes que se conjugaram com os documentos nos autos: M........ - que era o Director de Produção da empresa, na data da obra e estava directamente em contacto com o Director da Obra. Além disso, participava nas reuniões com a fiscalização e com o Município. Depôs de forma credível, mostrando conhecimento directo dos factos. J... - eng° civil, era o Fiscal de obra por parte do Município de Monchique, na altura da obra. Referiu o bom relacionamento que sempre existiu entre o Município e os responsáveis da empresa. Referiu no entanto um elemento importante para a compreensão do que contribuiu para que a obra tivesse corrido mal - foi o facto de ter acontecido que, quando o projectista fez o projecto desta obra, ainda não estava feito o Projecto da Barragem de Odelouca, e não ter contado com o impacto da barragem na obra da estrada. Daí as suspensões da obra, a fim de se planear e estudar o que haveria de ser feito. Porém, tal facto não pode ser imputável ao empreiteiro, daí o sentido das respostas aos quesitos. F... - foi o encarregado da obra. Referiu a dificuldade em trabalhar com chuvas e terreno molhado. A existência de terras não compactadas, que provocam perigo de deslizamentos de terras. Daí o sentido das respostas aos quesitos. P......... - Director Técnico Comercial da Autora, na altura, e participou em algumas reuniões da obra. F. M. - eng° Civil, que igualmente confirmou a suspensão da obra e os movimentos de terras. Referiu o problema da estabilização dos taludes. Foi fiscal coordenado desde o princípio da obra e contribuiu igualmente para o sentido das respostas aos quesitos” Assim, no que respeita aos pontos 3 a 9 da sentença recorrida aos quais o Recorrente aponta o erro de julgamento, que correspondem aos factos D) a I) do despacho de fixação da matéria de facto assente (a fls. 801 dos autos), não existe qualquer indicação quanto à razão pela qual o Tribunal entendeu que tal factualidade se encontrava assente, seja por resultava de prova documental não impugnada ou de acordo das partes. No que respeita à fundamentação das respostas dadas aos artigos 7.º, 8.º, 12.º a 17.º, 21.º a 29.º, 31.º a 35.º, 37.º a 44.º, 47.º, 49.º e 56.º da p.i. (o questionário a fls. 824 remete para os artigos da p.i.) – que correspondem aos pontos 10 a 17, 19 a 40, 42, 44 e 48 da sentença recorrida -, o Tribunal a quo indica que para a sua prova contribuíram os depoimentos das testemunhas, limitando-se a, no essencial, revelar o seu nome e razão de ciência e indicar, sumariamente, alguns factos relatados pelas testemunhas, que terá conjugado com os “documentos nos autos” mas que não concretiza ou enuncia. Não se faz, relativamente a cada um dos factos dados como provados ou não provados, uma cabal análise crítica das provas, especificando-se os fundamentos tidos como decisivos para a convicção do julgador. Desconhece-se, aliás, porque razão o tribunal a quo valorou os depoimentos de umas testemunhas relativamente a outras e concretamente em que depoimentos ou documentos firmou a convicção relativamente à demonstração de cada um dos factos. Esta motivação é, manifestamente, insuficiente, impedindo que o Tribunal ad quem aprecie o erro de julgamento de facto que se mostra imputado à sentença recorrida, concretamente quanto aos factos dados como provados e vertidos nos pontos em 3 a 17, 19 a 40, 42, 44 e 48 da sentença recorrida e que na matéria de facto assente correspondem aos factos D) a I) e na base instrutória aos artigos 7.º, 8.º, 12.º a 17.º, 21.º a 29.º, 31.º a 35.º, 37.º a 44.º, 47.º, 49.º e 56.º da p.i. Dispõe-se no art. 712.º, n.º 5 do CPC que “[s]e a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa não estiver devidamente fundamentada, pode a Relação, a requerimento da parte, determinar que o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados ou repetindo a produção da prova, quando necessário; sendo impossível obter a fundamentação com os mesmos juízes ou repetir a produção da prova, o juiz da causa limitar-se-á a justificar a razão da impossibilidade.” Considerando o exposto, verificando-se que a matéria factual vertida em 3 a 17, 19 a 40, 42, 44 e 48 da sentença recorrida, à qual é apontada o erro de julgamento pelo Recorrente, é essencial para o julgamento da causa e não se encontra devidamente fundamentada, impõe-se determinar a remessa dos autos à 1.ª Instância, a fim de motivar a decisão da matéria de facto, especificando quais os depoimentos e documentos em que baseou a sua convicção e respetivas razões, relativamente a cada um dos factos dados como provados nas alíneas indicadas, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados ou repetindo a produção da prova, quando necessário. * Em face do exposto, mostra-se, nesta fase, prejudicada a apreciação do erro de julgamento de facto, do erro de julgamento de direito e da nulidade por omissão de pronúncia apontada no recurso subordinado. De igual modo, impõe-se relegar para final a decisão relativamente às custas. V. Decisão Nestes termos, acordam os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Sul, em a. Negar provimento ao recurso que respeita à nulidade processual, nulidades da sentença e erro de julgamento quanto à exceção de caducidade do direito de ação; b. Determinar a baixa dos autos à 1.ª Instância, a fim de motivar a decisão da matéria de facto quanto aos pontos 3 a 17, 19 a 40, 42, 44 e 48 da sentença recorrida – e que correspondem aos factos D) a I) da matéria de facto assente e aos artigos 7.º, 8.º, 12.º a 17.º, 21.º a 29.º, 31.º a 35.º, 37.º a 44.º, 47.º, 49.º e 56.º da p.i. identificados na base instrutória, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados ou repetindo a produção da prova, quando necessário. Mara de Magalhães Silveira Ana Cristina Lameira Jorge Pelicano (1)Na redação da Lei 63/2011 aplicável aos autos, a que, salvo expressa menção, nos referimos de ora em diante. (2)Atenta a data de instauração do recurso é aplicável o CPC antigo, ou seja, na redação do DL 329-A/95 de 12 de dezembro, alterado pela Lei 63/2011), sendo a este que doravante nos referimos (designadamente por referência a CPC velho). (3)Invocada no recurso principal pelo R. e no recurso subordinado pela A., ficando, neste último caso, a sua apreciação dependente do recurso principal. |