Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 317/11.9BEALM |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 04/28/2022 |
| Relator: | CRISTINA FLORA |
| Descritores: | DECLARAÇÃO OFICIOSA ART. 112.º DO CIRC |
| Sumário: | I - Nos termos da alínea b), do n.º 1 do art. 83.º do Código do IRC (CIRC), a falta de entrega da declaração de IRC dentro do prazo estipulado no art. 112.º do CIRC, conduz à emissão de uma liquidação oficiosa; II - Nesse contexto, caso a AT conceda um prazo suplementar ao contribuinte para apresentar a declaração de IRC em falta, fazendo jus ao princípio da colaboração previsto no art. 59.º da LGT, esse prazo conta-se por referência à respetiva notificação, e não a partir da data da emissão da liquidação oficiosa. |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I…, S.A., com os demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada, que julgou improcedente a impugnação judicial por si apresentada, contra a liquidação de IRC, relativa ao ano de 2009. A Recorrente, apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões: «CONCLUSÕES 1ª - Em 16.11.2010 a ora Impugnante recebeu da Direção Geral dos Impostos o Aviso n.º 001467425, datado de 12.11.2010. 2ª - Do dito aviso consta que: “ (…) o não cumprimento desta obrigação (…) implica a emissão de uma liquidação oficiosa nos termos da alínea b) do n.º1 do artigo 83.º do Código do IRC (CIRC) (…)”. E, continua: “Esta liquidação oficiosa fica, no entanto, prejudicada se, no prazo de 15 dias vier a ser apresentada a declaração em falta, a qual deverá ser obrigatoriamente enviada via Internet. 3ª - A liquidação que fica prejudicada é (e só poderia ser) aquela que seja emitida nos termos da alínea b) do n.º1 do artigo 83.º do CIRC, Por conseguinte, aquela que, como dispõe o artigo 83.º, n.º 1 b) “ (…) é efetuada até 30 de Novembro do ano seguinte àquele a que respeita (…). 4ª - A liquidação oficiosa foi enviada para a Impugnante em 10.12.2010 e por esta recebida em 13.12.2010, conforme se provou pelo doc.4. junto com a petição inicial. Este documento não foi impugnado pela AT, consta dos autos e não foi objeto de análise concreta, o que contraria a afirmação constante a fls.5 da Sentença recorrida onde se afirma: “A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.” E, 5ª - Embora só notificada em 13.12.2010, a liquidação tem a data de 30.11.2010. 6ª - A Impugnante apresentou a Declaração Modelo 22, pela Internet em 15.12.2010, (cfr. ponto 5 dos Factos Provados, a fls.4 da Sentença ora recorrida). Ou seja, 7ª - Em boa-fé, a Impugnante interpretou a notificação que afirma textualmente “Esta liquidação oficiosa fica, no entanto, prejudicada se, no prazo de 15 dias vier a ser apresentada a declaração em falta, a qual deverá ser obrigatoriamente enviada via Internet, como querendo dizer que após efetuada a liquidação oficiosa, dispunha de 15 dias para apresentar via internet a declaração em falta. Aliás, procedimento idêntico existe no Código do IVA. Acresce que, 8ª - Se tivermos em conta a data daquela notificação da AT (16.11.2010): à data de 30.11.2010, (data da liquidação oficiosa), sempre a Impugnante estaria em prazo para apresentar a declaração, em falta, mesmo na interpretação da AT. Isto porque, na interpretação da AT, os 15 dias completar-se-iam a 1 de Dezembro de 2010. Ou seja, se A Impugnante apresentasse em 1 de Dezembro a declaração em falta, a liquidação oficiosa ficaria prejudicada, ou seja, seria anulada. 9ª - Assim, em qualquer das interpretações do texto da notificação ocorreria uma liquidação oficiosa que teria de ser prejudicada. 10ª - Nestas circunstâncias, a notificação que afirma textualmente “Esta liquidação oficiosa fica, no entanto, prejudicada se, no prazo de 15 dias vier a ser apresentada a declaração em falta, a qual deverá ser obrigatoriamente enviada via Internet” pode, em boa-fé, ser interpretada, como o foi efetivamente pela Impugnante, no sentido de que o prazo de 15 dias se contava a partir da liquidação oficiosa (a ser prejudicada). 11ª - A Sentença recorrida é totalmente omissa quanto à apreciação da prova testemunhal que foi produzida: consta apenas no RELATÓRIO que: “Foi realizada audiência de inquirição de testemunhas” Contudo, 12ª - No Ponto III – FUNDAMENTAÇÃO da Sentença recorrida no que aos factos Provados e não provados respeita, ou seja, na apreciação da prova para decisão sobre a matéria de facto não se faz qualquer análise concreta à prova realizada em audiência, sendo a Sentença totalmente omissa a esse respeito. Ora, 13ª - No decurso do julgamento – inquirição de testemunhas – foram testemunhados fatos relevantes para a decisão da causa, mormente para a correta interpretação dos próprios documentos juntos pelo que a sua não apreciação gera, como se demonstrará, a nulidade da Sentença recorrida. 14ª - Como bem refere ALBERTO DOS REIS, in Código do processo Civil Anotado, volume V, p.140: “A aludida nulidade abrange não só a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo n.º2 do artigo 123.º do CPPT, como a falta do exame crítico das provas, previsto no n.º3 do artigo 659.º do CPC”. No mesmo sentido, podem ver-se os Acórdãos do STA de 11-07-2001, processo n.º 25670; e de 12-02-2003, processo n.º 1850/02. 15ª - Como aponta, JORGE LOPES DE SOUSA, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Comentado e Anotado, 6ª Edição, Áreas Editora, 2011p.358: “Trata-se de uma exigência suplementar de fundamento de facto, não prevista no processo civil, que é a discriminação da matéria de facto não provada, cumulativamente com a matéria de facto provada. Assim, 16ª - A falta de discriminação da matéria de facto não provada no domínio do contencioso tributário, será equiparável à falta de indicação da matéria de facto provada, para efeitos da nulidade prevista no artigo 125.º do CPPT. Neste sentido, vejam-se: o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 06.06.2001 e ainda o Acórdão do Pleno da SCT de 07.05.2003, processo n.º 869/02, AP-DR de 07.07.2004, p.143. 17ª - Assim, quando a Sentença omite da fundamentação da matéria de facto a discriminação dos factos não provados e a razão e motivos da sua não apreciação, quando a mesma é relevante, como in casu, para a boa decisão da causa, deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação. Neste sentido, vejam-se os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 29.05.2002, processo 228/02, de 17.12.2003, processo 1471/03; de 26.01.2011, processo n.º 595/10 e de 24.02.2011, processo n.º 871/10. Esta tem sido a jurisprudência seguida, desde há muito, pelos nossos tribunais superiores, como atesta o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 03.06.1992, processo n.º 14284, AP-DR, de 22-02-1995, p.1787 onde pode ler-se: 1 – A falta de fixação específica e de julgamento na sentença, dos factos necessários à justa decisão da causa constitui nulidade de julgamento, a conhecer oficiosamente – artigo 712.º do CPC. 2 – Não concretiza tal fixação dar-se mera e remissivamente “como assente e provada a matéria fáctica alegada pelos recorrentes com base no teor dos documentos juntos e acordo das partes” (bold e sublinhados nossos). 18ª - A Sentença recorrida omitiu: a) A declaração de IRC apresentada em 15.12.2010 foi considerada certa após validação central conforme se provou documentalmente com o doc.6. junto com a p.i.; b) Tal documento não foi impugnado na Contestação. Assim, é errada a afirmação constante a fls.5 da Sentença recorrida onde se afirma: “A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.” c) Fez “tábua rasa” dos depoimentos prestados em audiência de inquirição de testemunhas, nem sequer se pronunciando sobre a mesma. 19ª - A Sentença omite qualquer apreciação á prova testemunhal quando é certo que: a) A testemunha, L…, Contabilista Certificado, independente, foi isento e claro ao afirmar que: “Mandatário da Impugnante: E apresentou a declaração em falta no prazo dos 15 dias? Testemunha L…: Eu apresentei no dia 15 de Dezembro. Mandatário da Impugnante: Portanto 15 dias a contar da data da liquidação oficiosa, apresentou? Testemunha L…: Apresentei informaticamente, a declaração de IRC foi validade, o que achamos um procedimento normal, mais uma vez, é o que acontece mais ou menos no processo de IVA, só que há uma liquidação no sistema, é entregue a declaração definitiva, ou pelo menos é a comunicação da empresa oficial foi o que aconteceu, o sistema validou, a declaração de IRC foi dada como válida, foi feito o pagamento de imediato, foi uma guia normal do IRC que também foi dado o pagamento e portanto entendi que mesmo, podemos dizer, quase em cima do prazo, que foram cumpridos os timings fiscais para que não fosse, não se tornasse definitiva aquela liquidação, que ainda por cima trazia um valor de IRC a pagar, que era incomparavelmente superior ao que alguma vez a empresa pagou, mas isso como lhe digo é outra questão.” (bold e sublinhado nossos. cfr. Transcrição integral da prova gravada que se junta como doc.1) 20ª – A mesma testemunha afirmou ter consultado o sistema informático da DGCI e verificado que a liquidação oficiosa havia sido eliminada do sistema, como decorre evidente do seguinte extrato da transcrição da sua inquirição: “Mandatário da Impugnante: Alguma vez ao consultar o sistema nesse período, depois de ter apresentado a declaração em falta, alguma vez verificou que tinha sido eliminado do sistema a liquidação oficiosa? Na Impugnação afirmamos isso porque obtivemos essa informação da Administração da empresa, mas que haveria sido eliminada a liquidação oficiosa, por que a certa altura não aparecia. Testemunha L….: (…) Na altura, o modelo 22 ficou dado como validado e eu de facto, a declaração oficiosa desapareceu do sistema, (…) , deixamo-la de ver, o que volto a dizer é um procedimento normalíssimo. Eu sei que não estamos a falar da mesma situação, mas é um procedimento normalíssimo em matéria de IVA, saem as liquidações oficiosas se dentro do prazo for entregue a declaração definitiva do contribuinte a liquidação oficiosa por assim dizer extingue-se.” (bold e sublinhado nossos. cfr. Transcrição integral da prova gravada que se junta como doc.1) Este facto de enorme relevância fez concluir, o Contabilista Certificado da empresa, pessoa mais envolvida na aludida liquidação de IRC (como decorre da sua primeira resposta á Mma. Juiz), pela regularidade total da situação tributária da Impugnante em matéria de IRC de 2009. 21ª - Igual entendimento, (coincidente com o texto do aviso doc.3, e o Contabilista Certificado da Impugnante, Dr. Luís Cardoso) foi dado pelo Revisor Oficial de Contas da Impugnante, P…, que também testemunhou tal facto em sede de audiência de Julgamento, como decorre do seguinte extrato da transcrição do seu depoimento: “Mandatário da Impugnante: Sr. Dr. P…, nós gostaríamos de que tomasse conhecimento, ou visse um documento que provavelmente já tem conhecimento, um documento que se encontra junto aos autos, que é o documento número 3, uma carta dirigida pela Administração Tributária à empresa advertindo-a de que não tinha apresentado a declaração anual de rendimentos, estava fora de prazo, iria ser submetida a uma liquidação oficiosa, essa liquidação ficaria sem efeito se dentro de quinze dias… gostaria que pudesse consultar a Sra. Dra. vai lhe facultar o acesso. Testemunha P… (ROC): Aqui é de que vai ser emitida uma liquidação oficiosa (…) Mandatário da Impugnante: Sabe que essa liquidação oficiosa é efetuada na falta da declaração em 30/11, com data de 30/11, e também sabe neste caso concreto sabe que foi isso que aconteceu e foi emitida? Testemunha P… (ROC): Sim foi isso que aconteceu, exatamente, e que entretanto depois foi entregue o modelo 22. Mandatário da Impugnante: P: No prazo de, sabe qual foi? Testemunha Pedro Cabrita (ROC): Não sei precisar a data, mas sei que, salvo erro 15 dias ou dentro do prazo. Mandatário da Impugnante: Portanto quanto a essa liquidação, o que é que aconteceu? Testemunha Pedro Cabrita (ROC): Ficaria sem efeito, Mandatário da Impugnante: Confirme se sim ou não: diria que se fosse apresentada nos 15 dias seguintes à emissão da liquidação oficiosa, ou seja até 15 de Dezembro estaria dentro do prazo é isso? Testemunha Pedro Cabrita (ROC): Sim é isso. Mandatário da Impugnante: Era só isso. 22ª – Pelo que, a interpretação a fls. 15 da Sentença recorrida, é claramente ilegal e inconstitucional, sem qualquer apoio na lei, como ressalta da própria argumentação expendida na Sentença recorrida que não faz alusão a qualquer norma que lhe permita tal entendimento. A interpretação defendida na Sentença recorrida não tem apoio na letra do documento n.º3 junto com a p.i. nem é compatível com o disposto na norma jurídica aplicável – artigo 83.º, n.º1 b) do CIRC. É uma interpretação que viola a lei diretamente e ofende os princípios constitucionais da tutela da confiança e da tributação pelo rendimento real (artigo 104.º, n.º2 da Constituição da República Portuguesa). 23ª - A interpretação feita pela AT ofende diretamente o artigo 104.º, n.º2 da CRP, porquanto ofende a exigência constitucional de que a tributação das empresas se faça pelo seu rendimento real. In casu, a Recorrente apresentou a declaração com os elementos relativos ao seu rendimento real. Declaração aceite e considerada certa, tida em conta e mantida para todos os legais efeitos. O que está errado e é inconstitucional é a manutenção da liquidação oficiosa impugnada porque além de não poder manter-se nos termos da lei (cfr. artigo 83.º, n.º1 b) do CIRC) não respeita o princípio da tributação pelo rendimento real, além do que, constitui um atentado à tutela da confiança e da segurança jurídica. 24ª - Ao ter aceite a declaração da Impugnante como certa, mantendo-a e tendo-a em conta, a AT criou legítimas expectativas sobre a correta adequação do comportamento do contribuinte pelo que seria inconstitucional vir a AT, de surpresa, violar as expetativas de confiança criadas no contribuinte aplicando-lhe um regime contrário aquele que se baseia na lei Cfr. Artigo 10.º do (Novo) Código do procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, se verifica a proteção jurídica da confiança enquanto corolário da boa-fé, na constituição Cfr. Artigo 266.º, n.º2 da CRP que ora se transcreve: “Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem atuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé” e na própria jurisprudência do Venerando Supremo Tribunal Administrativo Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 08-09-2011, Proc. N.º 0267/11, e Acórdão do STA de 21-09-2011, ambos disponíveis em www.dgsi.pt Assim, 25ª Para que as legítimas expetativas da Impugnante não sejam defraudadas e haja, efetivamente, tutela da confiança, deverá a AT conformar-se com a declaração apresentada pela Impugnante e anular a liquidação oficiosa ora em crise. Acresce que, 26ª A liquidação é totalmente omissa dos fundamentos em que se baseia (cfr. artigo 36.º n.º 1 e 2 e 90.º n.º1 b) e c) do CIRC), pelo que a sua manutenção na Ordem Jurídica é até inconstitucional face ao disposto no artigo 268.º, n.º3 da Constituição da República Portuguesa “Os atos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos”. Sendo obrigatória a notificação do ato e sendo obrigatória a fundamentação do ato quando afete, como no caso, direitos ou interesses legalmente protegidos da Impugnante, a notificação da fundamentação é também ela obrigatória pois, nestes casos, faz parte do ato Neste sentido, vide JORGE LOPES DE SOUSA, in Código do Procedimento e de Processo Tributário, Vol., Anotado e Comentado, 6ª Edição, 2011, Áreas Editora, Lisboa, p. 353. . A eficácia dos atos está dependente da sua notificação com a respetiva fundamentação pelo que não deverá ser eficaz em relação ao notificado (artigos 77.º, n.º6 da LGT e 36.º, n.º1 do CPPT). In casu, é evidente a falta de fundamentação da liquidação oficiosa, pois nem se baseia na realidade (contabilidade da Impugnante) nem no rendimento presumido (ano anterior). Mesmo que se entendesse, como entende a própria AT, que a liquidação oficiosa em crise estava fundamentada, a verdade é que a fundamentação indicada pela própria Administração Fiscal (em sede de contestação – artigo 16.º), não é aquela em que a Sentença recorrida procura fundamentar a sua decisão. 27ª A Sentença recorrida, procura fundamentar a liquidação pela aplicação da determinação da matéria coletável segundo métodos indiretos mas não fundamenta, o recurso a este método e tratando-se de método subsidiário, a administração só poderia a ele recorrer se não puder ser aplicado o método direto e é manifesto que a AT dispunha dos elementos declarados pela Impugnante para liquidar o IRC devido pelo que não tinha nem tem fundamento para lançar mão de indicadores do regime simplificado que se afastam da situação tributária concreta da Impugnante e da tributação pelo rendimento real. Termos que deverá o Presente Recurso ser Julgado procedente, revogando-se a Sentença recorrida e substituindo-a por outra que anule a liquidação oficiosa de IRC de 2009 e da Compensação traduzidas nos documentos 1 e 2 juntos com a p.i. e ainda condene a AT na devolução do Imposto indevidamente cobrado, acrescido de indemnização e juros, custas e procuradoria (cfr. artigos 43.º, 53.º e 100.º da LGT e 171.º, n.º2 do CPPT) » A Recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações. **** Foram os autos a vista da Magistrada do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. **** II. FUNDAMENTAÇÃO A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto: «A)- Dos Factos PROVADOS Compulsados os autos e analisada a prova documental apresentada, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a decisão de mérito: 1. Em 20/07/2009 a Impugnante procedeu à entrega da declaração anual de IRC da qual consta na Demonstração dos Resultados por natureza um total de prestação de serviços no montante de € 3.696.133,99 (campo A0126) (cfr. doc. de fls. 124 a 143 dos autos); 2. Em 22/07/2009 a Impugnante procedeu à entrega da sua declaração anual de IRC referente ao exercício de 2008, da qual consta na Demonstração dos Resultados por natureza um total de prestação de serviços no montante de € 2.590.516,96 (campo A0126) (cfr. doc. de fls. 97 a 116 dos autos); 3. Em 16/11/2010 a Impugnante recepcionou um oficio do Serviço de Finanças da Moita, datado de 12/11/2010, referente ao exercício de 2009 e do qual consta o seguinte: ¯No sistema informático da Direcção Geral dos Impostos – DGCI não se encontra registada a vossa declaração de rendimentos Modelo 22 de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), relativa ao exercício de 2009, cujo termo do prazo de entrega ocorreu em 2010-05-31 (com excepção dos sujeitos passivos com períodos especiais de tributação). Sendo obrigatória a apresentação anual da referida declaração, o não cumprimento desta obrigação, para além de sancionada como contra-ordenação, nos termos do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), implica a emissão de uma liquidação oficiosa, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 83º do Código do IRC (CIRC), a qual terá por base o montante previsto no nº 4 do art. 53º do CIRC (o valor anual da retribuição mínima garantida) ou, quando superior, a totalidade da matéria colectável do exercício mais próximo que se encontre determinada. Esta liquidação oficiosa fica, no entanto, prejudicada se, no prazo de 15 dias, vier a ser apresentada a declaração em falta, a qual deverá obrigatoriamente enviada via internet, no Portal das Finanças (…) No caso de já ter sido regularizada a falta, queira considerar sem efeito esta comunicação.” (cfr. docs. juntos a fls. 13 e 38 do processo instrutor junto aos autos); 4. Em 30/11/2010 foi emitida a liquidação nº 2010 8 31 0011840 referente a IRC do exercício de 2009 da Impugnante da qual consta como Matéria colectável Regime Geral o valor de € 528.994,55 e sendo indicada uma colecta de € 130.686,14 e uma derrama de € 7.934,92 e ainda juros compensatórios no montante de € 2.780,01, ficando um valor a pagar de € 141.401, 04 (cfr. doc. junto a fls. 29 do processo instrutor e 6 dos autos); 5. Em 15/12/2010 a Impugnante procedeu à entrega de Declaração Modelo 22 de IRC referente ao exercício de 2009 da qual consta tratar-se da 1ª declaração do exercício, indicando no quadro 07, campo 201 (resultado liquido do exercício) € 49.580,20, no quadro 09, campo 311 (Matéria colectável) € 86.203,72, no quadro 10, campo 367 (Total a pagar) € 28.281,39 e no quadro 11, campo 410 (Total de proveitos do exercício) € 3.631.456,67 (cfr. doc. junto a fls. 25 a 28 do processo instrutor junto aos autos); 6. Em 02/02/2011 foi efectuada uma Compensação no montante de € 28.281,39, remanescendo o valor de € 113.119,65 de IRC a liquidar do exercício de 2009 (cfr. doc. junto a fls. 7 dos autos e 31 do processo instrutor junto aos autos). *** A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.»**** Conforme resulta dos autos a Meritíssima Juíza do TAF de Almada julgou improcedente a impugnação judicial.A Recorrente não se conforma com a mesma, suscita as seguintes questões a decidir no presente recurso: _ nulidade da sentença, nos termos do disposto no art. 125.º do CPPT, ser completamente omissa relativamente à apreciação da prova testemunhal da qual resultam provados factos relevantes para a decisão da causa, havendo falta de discriminação de factos provados e não provados (conclusões 11.ª a 21.º); _ erro de julgamento de facto porquanto a liquidação oficiosa foi enviada para a Impugnante em 10/12/2010, e por esta recebida em 13/12/2010, conforme documento n.º 4 (conclusões 1 a 5), e porque a sentença omitiu que a declaração de IRC apresentada em 15/12/2010 foi considerada certa após validação central conforme resulta do documento n.º 6, junto com a p.i. (conclusão 18.ª); _ erro de julgamento de direito, porque a sentença não faz referência a qualquer norma que lhe permita tal entendimento, uma vez que se tivermos em consideração a data da notificação da liquidação oficiosa, a Impugnante apresentou tempestivamente, no prazo de 15 dias, a Declaração Modelo 22 em 15/12/2010, uma vez que essa é a interpretação que deve ser dada à contagem do prazo considerando a notificação remetida (conclusões 6.ª a 10.ª), sendo inconstitucional, por ofensa ao disposto no art. 104.º, n.º 2, da CRP, porque a tributação das empresas se deve fazer pelo rendimento real, violando-se ainda as legítimas expectativas da Impugnante (conclusões 22.ª a 25.ª); _ erro de julgamento de direito, porquanto a liquidação enferma de falta de fundamentação, violando a lei e a Constituição (conclusão 26.ª), sendo que a fundamentação indicada na contestação da Fazenda Pública não é aquela em que a sentença fundamenta a sua decisão, não há fundamentação para o recurso a métodos indiretos (26.ª e 27.ª). Apreciando. Relativamente à invocada nulidade da sentença, nos termos do disposto no art. 125.º do CPPT, por aquela ser completamente omissa relativamente à apreciação da prova testemunhal da qual resultam provados factos relevantes para a decisão da causa, havendo falta de discriminação de factos provados e não provados (conclusões 11.ª a 21.º), adiante-se, desde já, que tal nulidade não se verifica. Sublinhe-se que a nulidade da sentença por falta de discriminação dos factos provados apenas se verifica quando a sentença é totalmente omissa quanto ao julgamento da matéria de facto, o que não sucede no caso dos autos. Na verdade, deve distinguir-se entre falta absoluta de motivação e motivação deficiente, medíocre ou errada, também é certo e é jurisprudência assente que esta nulidade só abrange a falta absoluta de motivação da própria decisão e não já a falta de justificação dos respetivos fundamentos; isto é, a nulidade só é operante quando haja total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão (cf. por todos, Ac. do STA de 04/03/2015, proc. n.º 01939/13). A insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade (cf. Alberto dos Reis, CPC anotado, Vol. V, 140.) Por isso, como salienta Jorge Lopes de Sousa devam “considerar-se como falta absoluta de fundamentação os casos em que ela não tenha relação perceptível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação”, já que esta se destina “a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão”, e, por isso, “quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação” (cf. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. II, 6.ª edição, Áreas Editora, 2011, anotações 7 e 8 ao art. 125.º, pp. 357 a 361.) Sucede que, in casu, a sentença está minimamente motivada, discriminam-se os factos provados, ainda que, ao contrário do que pretenderia a Recorrente, apenas com base na prova documental, que é referida concretamente em cada uma das alíneas dos factos provados, de modo a permitir a compreensão dos meios de prova que suportam a matéria de facto assente. Na verdade, pese embora na sentença recorrida não se faça menção expressa da irrelevância da prova testemunhal produzida para a prova dos factos relevantes para a decisão, a verdade é que é isso que resulta da leitura de toda a sentença, cujos factos provados assentam na prova documental, e que, refira-se, é suficiente para a decisão da causa. Efetivamente, não existe matéria de facto controvertida nos presentes autos, mas tão-somente divergência ao nível do direito, mais concretamente, relativamente à data em que começa a correr o prazo de 15 dias para a Impugnante apresentar a Declaração Modelo 22 que estava em falta. Para Impugnante, ora Recorrente, considerando o seu entendimento sobre a contagem do prazo, a apresentação da Declaração Modelo 22 foi tempestiva, o que afeta a ilegalidade da liquidação oficiosa. Ora, assim sendo, a questão fulcral nos presentes autos é de direito, e não de facto, sendo suficiente para a decisão da causa a descriminação de factos com base na prova documental produzida, que é suficiente, não se encontrando controvertidos quaisquer factos. Pelo exposto, improcede a nulidade invocada. Questão diversa é a de saber se existe erro de julgamento da matéria de facto discriminada na sentença recorrida, no sentido de saber se deviam ter sido dados como provados mais factos do que foram, porém, tal insuficiência na discriminação não configura nulidade da sentença, mas antes erro de julgamento. Contudo, quanto à prova testemunhal não se verifica o erro de julgamento de facto, porque, como supra exposto, a Meritíssima Juíza do TAF de Almada não de discriminar factos com base na prova testemunhal, uma vez que, para a decisão dos autos é suficiente a prova documental, sendo que nesta parte improcede a pretensão da Recorrente de ver dado como provados factos com base nesse meio de prova. Prosseguindo. Invoca ainda a Recorrente, com base na prova documental, o erro de julgamento de facto porquanto a liquidação oficiosa foi enviada para a Impugnante em 10/12/2010, e por esta recebida em 13/12/2010, conforme documento n.º 4 (conclusões 1 a 5), e porque a sentença omitiu que a declaração de IRC apresentada em 15/12/2010 foi considerada certa após validação central conforme resulta do documento n.º 6, junto com a p.i. (conclusão 18.ª). Cumpre, então, conhecer da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, uma vez que a Recorrente cumpriu minimamente o ónus previsto no art. 640.º do CPC. Efetivamente, no art. 5.º da p.i. a Impugnante, ora Recorrente, alegou que a liquidação oficiosa lhe foi enviada em 10/12/2010, e recebida a 13/12/2010, indicando como meio de prova o documento n.º 4. De igual modo, no art. 8.º da p.i., a Impugnante alegou que a declaração de IRC apresentada em 15/12/2010 foi considerada certa após validação central, indicando como meio de prova o documento n.º 6. Ora, analisada a matéria de facto discriminada na sentença, verifica-se o tribunal a quo não deu como provado, ou não provado tais factos, o que cumpria fazer, posto que, os factos foram alegados, e foi indicado e apresentado os respetivos meios de prova. Cumpre, então, valorar o documento n.º 4 e 6, e decidir se os factos alegados devem ou não ser dados como assentes, uma vez que, em abstrato, são relevantes para a decisão da causa, considerando a perspetiva de interpretação do direito que é feita pela Impugnante. Da análise do documento n.º 4, que consiste numa impressão informática da página web dos CTT, resulta que o objeto com o n.º RY516625351PT foi aceite em 10/12/2010 na estação dos CTT de “ACE – Pinheiro de Fora”, sendo a entrega do objeto conseguida em 13/12/2010 na Moita. Este documento não é impugnado pela Fazenda Pública, nem é contrariado por qualquer outro meio de prova junto aos autos e/ou ao processo administrativo. Conjugado este documento n.º 4, com o documento n.º 1, temos então que o objeto registado corresponde à liquidação oficiosa de IRC n.º 2010 8310011840, no valor de 141.401,04€. Por outro lado, da análise do documento n.º 6, que consiste num e-mail remetido eletronicamente à Impugnante, pela DGCI, mais concretamente, pelo serviço de declarações eletrónicas, resulta que a declaração de IRC entregue em 15/12/2010, foi considerada certa após validação central. Por conseguinte, e consideração a motivação supra exposta, cumpre aditar à matéria de facto os seguintes pontos: 7. A liquidação oficiosa de IRC n.º 2010 8310011840, no valor de 141.401,04€ foi remetida à Impugnante, sob o registo n.º RY516625351PT, em 10/12/2010, tendo sido recebida em 13/12/2010 na Moita. (cf. documento n.º 1 e documento 4, junto com a p.i.); 8. A declaração entregue pela Impugnante referida no ponto 5 da matéria de facto assente, foi considerada certa, após validação central, pelos serviços de declarações eletrónicas da DGCI (cf. documento n.º 6, junto com a p.i.) Estabilizada a matéria de facto, passemos então ao erro de julgamento de direito. Neste contexto, importa, desde logo, aquilatar do julgamento de direito, com o fundamento invocado pela Recorrente de que a liquidação enferma de falta de fundamentação, violando a lei e a Constituição, sendo que a fundamentação indicada na contestação pela Fazenda Pública não é aquela em que a sentença fundamenta a sua decisão, não há fundamentação para o recurso a métodos indiretos (26.ª e 27.ª). Antes de mais cumpre referir que resulta da p.i. que a questão suscitada foi a da invalidade da liquidação “porquanto não foi validamente notificada à impugnante, mormente por total omissão dos fundamentos em que se baseia” (art.19.º da p.i). Ora, considerando, e bem, a causa de pedir na sentença recorrida entendeu-se que a Impugnante confunde falta de notificação da fundamentação do ato com a fundamentação do mesmo, e nessa medida entendeu, que não estaria em causa a falta de fundamentação, mas tão-somente a falta de notificação da fundamentação, e nesse contexto conclui-se que tal vício não afeta a validade da liquidação, mas apenas com a sua eficácia. E na verdade, conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem afirmado uniforme e reiteradamente, a insuficiência ou falta de fundamentação da notificação do ato de liquidação não afeta a perfeição e validade desta (desde que aquela fundamentação exista e seja anterior ao ato de notificação), contendendo apenas com a sua eficácia, mas não podendo fundamentar a anulação do ato notificado (cf. acórdão do Pleno do STA, de 18/9/2013, proc. n.º 0578/13; bem como, entre muitos outros, os acórdãos do STA de 6/4/2011, proc. n.º 037/11, e 29/10/2014, proc. n.º 01381/12). Portanto, a eventual falta de fundamentação da notificação, ainda que se verificasse, não conduziria à anulação do ato tributário com fundamento no vício de forma por falta de fundamentação, prevendo a lei um regime específico para suprir falta ou insuficiência da fundamentação da notificação - o disposto no art. 37.º, n.º 1 do CPPT estabelece, no caso de notificação insuficiente, que o notificando possa optar entre o pedido de nova notificação em que seja suprida a insuficiência, ou a passagem de certidão que contenha os requisitos omitidos, sem qualquer pagamento. Se o interessado não fizer uso deste preceito legal, então, as irregularidades da notificação ficam sanadas (salvos as previstas no n.º 9 do art. 39.º do CPPT, cuja falta gera a sua nulidade), pese embora não fique sanado qualquer vício que possa enfermar o ato notificado – nesse sentido, cf. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário- anotado e comentado, Vol. I, 6.º Ed., Áreas Editora, 2011, p. 350). Portanto, nessa parte, a sentença recorrida, que no essencial, assim entendeu não enferma de erro de julgamento. Ora, apenas em sede do presente recurso é que a Impugnante vem trazer a questão da falta de fundamentação do ato de liquidação. Sucede que, tal questão não sendo de conhecimento oficioso, não poderá ser conhecida nesta sede por se tratar de questão nova. Com efeito, dispõe o n.º 1 do art. 627.º que “[a]s decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos.”, ou seja, o recurso é o meio processual que se destina a impugnar as decisões judiciais, e nessa medida, o tribunal superior é chamado a reexaminar a decisão proferida e os seus fundamentos. Conforme a jurisprudência da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo tem afirmado, reiterada e uniformemente, os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova, e por essa razão, regra geral, em sede de recurso, não se pode tratar de questões que não tenham sido apreciadas pela decisão impugnada, salvo questões novas de conhecimento oficioso e não decididas com trânsito em julgado (cf. Ac. do STA de 05/11/2014, proc. n.º 01508/12, de 01/10/2014, proc. n.º 0666/14, de 13/11/2013, proc. 1460/13, de 28/11/2012, proc. 598/12, de 27/06/2012, proc. 218/12, de 25/01/2012, proc. 12/12, de 23/02/2012, recurso 1153/11, de 11/05/2011, proc. 4/11, de 1/07/2009, proc. 590/09, 04/12/2008, proc. 840/08, de 2/06/2004, proc. 47978 (Pleno da Secção do Contencioso Tributário). Não obstante o supra exposto, importa emitir pronúncia quanto à questão da inconstitucionalidade por violação do art. 268.º, n.º 3 da CRP que é invocada pela Recorrente, uma vez que “Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados.” – cf. art. 204.º da CRP. Ora, pese embora a Recorrente invoque a violação daquele normativo Constitucional, não se alcança o sentido e extensão de tal invocação, porque a Recorrente não a concretiza, ou seja, não indica as normas ou qual a interpretação normativa violadora da Constituição. Na verdade, o que a Recorrente realmente pretende é por portas travessas que o presente tribunal conheça de questão nova que não foi invocada na p.i., enquadrando-a como uma questão de violação da constitucional, contornando, deste modo as regras processuais vigentes. Na verdade, a Recorrente não indica qual a norma, ou qual a interpretação normativa violadora da Constituição. O que diz é que o ato tributário (a liquidação) é violadora Constituição. Ora, efetivamente, os atos tributários devem estar fundamentados nos termos do art. 77.º, n.º 2, da LGT, norma que no procedimento tributário confere concretização ao n.º 3, do art. 268.º, n.º 3, da CRP. Ora, por um lado, não resulta evidente que a AT ou o Tribunal a quo na sentença tenham interpretado aquele preceito em desconformidade com a Constituição, e por outro lado, a Recorrente também não o evidencia nas suas conclusões de recurso. Ou seja, adotando uma posição antiformalista, mesmo admitindo que a inconstitucionalidade invocada pela Recorrente se reporta ao disposto no art. 77.º, n.º 2, da LGT, ainda assim, in casu, não se vislumbra (e sublinhe-se, nem a Recorrente concretiza) em que medida a AT, ou o tribunal a quo, aplicou uma norma violadora da Constituição, ou tenha interpretado aquela norma num sentido violador a Constituição e/ou os seus princípios. Portanto, não havendo concretização suficientemente densificada da inconstitucionalidade invocada, e não vislumbrado o tribunal que esta se verifique, nada mais resta, senão julgar improcedente tal fundamento de recurso. Pelo exposto, improcede este fundamento do recurso. Invoca ainda a Recorrente que a sentença não faz referência a qualquer norma que lhe permita o entendimento adotado. Por outro lado, a Recorrente tem o entendimento de que se tivermos em consideração a data da notificação da liquidação oficiosa, a Impugnante apresentou tempestivamente, no prazo de 15 dias, a Declaração Modelo 22 em 15/12/2010, uma vez que essa é a interpretação que deve ser dada à contagem do prazo considerando a notificação remetida (conclusões 6.ª a 10.ª). Ou seja, a tese da Recorrente é a de que considerando a interpretação que faz da notificação para a apresentação da Declaração Modelo 22, no prazo de 15 dias, esse prazo conta-se a partir da data do conhecimento da liquidação oficiosa, sendo certo que a sentença não invoca qualquer disposição legal para afirmar que tal prazo se conta da data da notificação para a apresentação da Declaração Modelo 22. Contudo, não lhe assiste razão. Conforme resulta da fundamentação do aviso n.º 001467425 a Administração Tributária (AT) concedeu à Impugnante o prazo de 15 dias para a apresentação da declaração de IRC do exercício de 2009. Este prazo é concedido no contexto em que a AT constatou que tal declaração de rendimentos não foi entregue até 31/05/2010, e que tal omissão, para além de consubstanciar contraordenação, “implica a emissão de uma liquidação oficiosa, nos termos da alínea b), do n.º 1 do art. 83.º do Código do IRC (CIRC), a qual terá por base o montante mínimo previsto no n.º 4, do art. 53.º do CIRC (…)”. Ora, a verdade é que resulta da alínea b), do n.º 1 do art. 83.º do Código do IRC (CIRC), que a falta de entrega da declaração de IRC dentro do prazo estipulado no art. 112.º do CIRC, conduz a uma liquidação oficiosa. Portanto, não se encontrando controvertido nos autos a falta de entrega da declaração ora em causa dentro do prazo previsto no art. 112.º, do CIRC, então, a liquidação oficiosa foi emitida de acordo com a lei, não enfermando de qualquer vício. A questão que se coloca a respeito do prazo de 15 dias poderá relevar para efeitos de aferirmos se a AT violou o dever de boa-fé, face ao princípio da colaboração previsto no art. 59.º da LGT que vincula, quer o contribuinte, quer a AT. Neste contexto, a indicação de um prazo de 15 dias pela AT para a entrega da declaração modelo 22 do exercício de 2009 que não foi entregue dentro dos prazos legais, não é mais do que uma manifestação desse princípio da colaboração a que a AT está, também, vinculada, ou seja, é um prazo suplementar que é dado ao contribuinte para o cumprimento de uma obrigação declarativa que não foi cumprida dentro dos prazos estabelecidos na lei. Assim sendo, é manifesto que o dies a quo desse prazo que a AT concede ao contribuinte não poderá ser interpretado noutro sentido senão aquele que resulta de todo este contexto legal, o que significa que não faz qualquer sentido que o início desse prazo excecionalmente concedido se faça após a emissão da declaração oficiosa como entende a Recorrente. Na verdade, é manifesto que o que a AT pretende é evitar é a emissão de uma liquidação oficiosa, e por isso, notifica o contribuinte não só do facto de a declaração de IRC do exercício de 2009 não ter sido entregue dentro do prazo, mas também das consequências jurídicas dessa falta declarativa, e é nesse contexto que lhe concede um prazo para declarar os rendimentos, exatamente para evitar a emissão da liquidação oficiosa. É esse o sentido normal que se poderá deduzir do comportamento declarativo da AT quando refere que “Esta liquidação oficiosa (que terá de ser emitida na falta de uma declaração efetivamente entregue pelo contribuinte) fica, no entanto, prejudicada (ou seja, não será emitida) se, no prazo de 15 dias, vier a ser apresentada a declaração em falta (…)”. Não faz qualquer sentido a interpretação da Recorrente em que primeiro a AT emite a liquidação oficiosa, e só depois começa a correr o prazo para que o contribuinte venha a suprir a sua omissão declarativa. Portanto, nesta parte, improcede o fundamento do recurso. Mais entende a Recorrente que é inconstitucional o entendimento adotado na sentença, por ofensa ao disposto no art. 104.º, n.º 2, da CRP, porque a tributação das empresas se deve fazer pelo rendimento real, violando-se ainda as legítimas expectativas da Impugnante (conclusões 22.ª a 25.ª). Contudo, não nos parece que assim seja. Muito pelo contrário, honrando o princípio constitucional da tributação pelo lucro real a AT, antes da aplicação do normativo em questão, levou ao conhecimento do contribuinte da sua omissão declarativa, e deu-lhe a oportunidade de apresentar uma declaração de rendimento que suprisse tal falta, concedendo-lhe um prazo, sendo que tal declaração não foi apresentada desse prazo. Não nos parece razoável entender que em nome do princípio da tributação real se possa retirar a legitimidade da AT em se substituir ao contribuinte faltoso e emitir uma liquidação oficiosa, nos termos do disposto na alínea b), do n.º 1, do art. 83.º do CIRC. Tal normativo não viola o princípio constitucional da tributação do lucro real. Ademais, no caso dos autos, a Impugnante nada invocou nem junto da AT, nem mesmo na sua p.i. de impugnação judicial, qualquer excesso na quantificação, ou outros vícios de violação de lei que enfermasse a quantificação do imposto, nem invocou quais as razões para discordar do apuramento do imposto concretamente apurado nos termos legalmente previstos (art. 53.º, n.º 4, do CIRC), para que pudéssemos entender que existia um dever da AT de rever a declaração oficiosa emitida nos termos da lei, pelo que também por esta razão, não se verifica qualquer violação nem da lei, nem da Constituição e dos seus princípios. Pelo exposto, improcedem todos os fundamentos do recurso, e assim sendo, será de negar provimento ao recurso. Nos termos do artigo 527.º do CPC aplicável ex vi do artigo 2.º alínea e) do CPPT a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte a que elas houver dado causa (n.º 1), entendendo-se que dá causa às custas do processo a parte vencida na proporção em que o for (n.º 2), e, portanto, vencida no recurso a Recorrente, esta é responsável pelas custas. Sumário (art. 663.º, n.º 7 do CPC) I. Nos termos da alínea b), do n.º 1 do art. 83.º do Código do IRC (CIRC), a falta de entrega da declaração de IRC dentro do prazo estipulado no art. 112.º do CIRC, conduz à emissão de uma liquidação oficiosa; II. Nesse contexto, caso a AT conceda um prazo suplementar ao contribuinte para apresentar a declaração de IRC em falta, fazendo jus ao princípio da colaboração previsto no art. 59.º da LGT, esse prazo conta-se por referência à respetiva notificação, e não a partir da data da emissão da liquidação oficiosa. DECISÃO Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção, da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida. **** Custas pela Recorrente. D.n. Lisboa, 28 de abril de 2022. Cristina Flora (Relatora) Patrícia Manuel Pires (1.ª adjunta) Vital Lopes (2.º adjunto) |