Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1163/08.2BESNT |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 11/28/2019 |
Relator: | JORGE CORTÊS |
Descritores: | IRC. PRESSUPOSTO PROCESSUAL DO PEDIDO PRÉVIO DE REVISÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL FIXADA POR MÉTODOS INDIRECTOS |
Sumário: | 1. A impugnação judicial incidente sobre os pressupostos justificativos e sobre a quantificação da matéria colectável através de métodos indirectos pressupõe o pedido prévio de reclamação junto da comissão de revisão da matéria colectável.
2. Na falta de preenchimento de tal pressuposto fica precludida a apreciação judicial da matéria em exame. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acórdão I- RelatórioO..... – O..... e P....., S.A., veio deduzir impugnação, pedindo a anulação da liquidação adicional de IRC n.º 2008 0……., relativa ao exercício de 2003, bem como da correspondente liquidação de juros indemnizatórios n.º 2008 0……, no valor global de € 474.503,88. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por sentença proferida a fls. 999 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), datada de 23 de Fevereiro de 2018, julgou improcedente a impugnação. A recorrente O..... – O..... e P....., S.A, depois de convidada a apresentar novas conclusões do recurso, juntou a fls. 1119 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), as mesmas, tendo formulado as conclusões seguintes: «A. As presentes alegações de recurso interpostas pela aqui recorrente dizem respeito à sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra. B. Não pode a aqui recorrente conformar-se com tal decisão em face da manifesta falta de razão que lhe subjaz. Do ónus da prova C. A recorrente sempre se pautou pelo cumprimento das suas obrigações fiscais, tendo agido de boa-fé e cooperado com os serviços de Inspeção tributária em tudo o que esteve ao seu alcance. D. A recorrente é uma sociedade comercial que se dedica à atividade imobiliária tendo sido objeto de um procedimento de inspeção externa sobre o seu exercício de 2003. E. Em sede de procedimento de inspeção, 3 dos 36 proprietários declaram que o preço real foi superior ao preço escriturado, tendo os outros 33 declarado que o preço real correspondeu ao preço escriturado. F. A administração tributária considerou que em todas as situações houve uma venda das frações por um valor superior ao constante das escrituras, tendo sido desenvolvida uma tese de simulação relativa sem no entanto apresentarem prova verossímil. G. Refira-se em primeiro lugar, que não foi respeitada a regra geral do ónus da prova, sobejamente referida pela recorrente. Não foi provado que a venda de 3 imóveis foi efetivamente realizada por um preço superior ao das escrituras. H. Veja-se a remissão hermenêutica do artigo 11.º, n.º 2, da LGT, que determina que muitos dos conceitos a que o direito fiscal recorre só podem ser determinados apurando a disciplina do ramo de direito no qual se inserem. I. No âmbito do direito civil, há todo um espectro de considerações sobre a prova necessária para comprovar essa pretensa simulação, as quais não foram consideradas pelo douto tribunal. J. Nos termos do artigo 372.º, n.º 1, do Código Civil, a força probatória dos documentos autênticos só poder ser ilidida com base na respectiva falsidade. K. Ou melhor, esta só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objeto. L. Refira-se igualmente que é pacífico o entendimento jurisprudencial que dita a proibição de prova testemunhal quando a simulação é invocada pelos próprios simuladores. M. O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01.06.2017, complementa ao interpretar o artigo 394.º do Código Civil, no sentido de considerar inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objecto quaisquer convenções contrária ou adicionais ao conteúdo do documento autêntico. N. Ora a produção de prova nos casos de pretensa simulação é bastante exigente, dado que terá de ser suficiente para desacreditar a escritura pública celebrada entre as partes. O. Assim, deveria o tribunal a quo apreciar e decidir com base nas restrições relativas à produção de prova, não sendo admissível exigir-se à ora recorrente que faça prova de que não recebeu qualquer valor adicional, não só por impossibilidade de o fazer, como também pelo facto de o ónus da prova recair sobre a administração tributária. P. Tudo isto resultou numa situação em que a administração tributária valorou meros indícios que eram favoráveis, em expressa contradição de outros (contra-indícios) que lhe eram desfavoráveis, abstendo-se por sua vez, o tribunal a quo de apreciar tal situação, a qual se afiguraria essencial à decisão final da causa. Q. Com efeito, atendendo às normas invocadas, tivesse concluído o tribunal a quo pela verificação de vícios na valoração da prova e, consequentemente, caindo por terra a tese da simulação ficaria inquinado ab initio o ato de liquidação adicional resultante do visado procedimento de Inspeção tributário. DO INCUMPRIMENTO DO PRAZO R. No âmbito da Inspeção tributária, o RCPITA consigna diversos prazos cuja violação pode ou não inquinar todo o processo. S. Se de facto, por vontade da recorrente, esta optou por não exercer o direito de audição prévia, faculdade que em nada determina a validade do procedimento de inspeção, tal não se confunde com outros desrespeitos dos prazos. T. O Tribunal a quo refere que a ultrapassagem do prazo de 10 dias previsto no n.º 2 do artigo 62.º “não é de molde a inquinar o processo”. U. Salvo melhor opinião, a técnica legislativa "deve ser", único argumento apresentado na sentença não é suficiente para concluir que o prazo não tem natureza peremptória. V. A interpretação desta norma deve ser adequada à organização sistemática daquele diploma, em consonância com os princípios orientadores do procedimento das inspeções bem como, do procedimento tributário se daí advieram naturais consequências. W. Se atentarmos ao disposto, findo o prazo para o exercício do direito de audição prévia, começa contar novo prazo para a elaboração das conclusões e do relatório final de todo o procedimento de inspeção. X. Ora, se das conclusões da atividade inspetiva se concluir pelo acréscimo da matéria tributável, não haverá qualquer discricionariedade na emissão de uma liquidação por parte da autoridade tributária competente. Y. Trata-se do início do procedimento tributário, onde os efeitos do seu não cumprimento devem ser analisados à luz das regras do procedimento tributário e não, propriamente, de uma atividade acessória da liquidação que sobrevier. DO MEIO PROCESSUAL UTILIZADO Z. Nos casos em que a matéria tributável tenha sido determinada com base na avaliação indireta, pode ser invocada qualquer ilegalidade na impugnação do ato tributário da liquidação (ARTIGO 86.º Nº4 DA LGT). AA. Não se discute o recurso aos métodos indiretos, mas a violação das imposições legais em matéria probatória (DESIGNADAMENTE, DOS ARTIGOS 351º, 371º, 372º, 394º,405º DO CÓDIGO CIVIL) e consequentemente a ilegalidade patente do procedimento de inspeção e a licitude da própria liquidação adicional de imposto, que o tribunal a quo não aprecia e sobre os quais não decide. BB. Procedimento de inspeção esse que viola grosseiramente a lei e os princípios enformadores da inspeção tributária, designadamente o princípio da legalidade, da descoberta da verdade material, da proporcionalidade e da boa-fé. CC. Assim, no entendimento da recorrente deveria o tribunal a quo ter decido pela invalidade da liquidação adicional de imposto, resultante de tal procedimento de inspeção. dd. Por último, é sempre mister relembrar que o critério de determinação da matéria coletável com recurso a métodos indiretos, usado pela administração tributária, é no presente caso completamente injusto e abusivo, ainda que não seja aqui objeto de discussão. Nestes termos, e nos demais de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, requer-se a Vossas Excelências que se dignem a anular a decisão ora recorrida e, quanto ao mais, seja a mesma substituída por outra que julgue procedente o pedido formulado pela ora Recorrente, com todas as legais consequências.» * A recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.»X O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, ofereceu aos autos o seu douto parecer no sentido da improcedência do recurso. X Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta. X 2.1.De Facto. A sentença recorrida considerou provados os factos seguintes: «A. A Impugnante encontra-se inscrita pela actividade de “Compra e venda de bens imobiliários”, à qual corresponde o CAE 68100, desde 15 de Setembro de 1999, tendo por objecto a “Promoção imobiliária de empreendimentos e edifícios, bem como a sua administração, podendo acessoriamente proceder à compra, venda, compra para revenda e revenda de imóveis adquiridos para esse fim” (cf. doc. 2, junto com a p. i. a fls. 66 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido e fls. 687 e 1210 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; B. A Impugnante é tributada no exercício de 2003 pelo Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades, estatuído nos artigos 63.º e 64.º do CIRC, com a sociedade O…. – O…., e C…., S. A., com o NIPC 5….., sendo a Impugnante a sociedade dominante (cf. fl. 687 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); C. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI200707760, com despacho de 17 de Outubro de 2007, foi determinada uma acção de inspecção externa para verificação do IRC e do IVA, relativamente ao exercício de 2003, a qual teve início em 30 de Outubro de 2007, com a assinatura da referida Ordem de Serviço (cf. doc. 5, junto com a p. i. a fl. 81, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e fl. 686 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); D. Em 10 de Março de 2008, a Impugnante foi notificada da diligência que encerra os actos de inspecção tributária, com a assinatura da respectiva Nota de Diligência (cf. doc. 11, junto com a p. i. a fl. 405, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e fl. 686 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); E. Em 26 de Março de 2008, a Impugnante foi notificada para o exercício do direito de audição (cf. doc. 12, junto com a p. i. a fls. 407 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido); F. Em 10 de Abril de 2008, foi elaborado o Relatório de inspecção, em que se fez constar, entre o mais, o seguinte (cf. fls. 688 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido): “(texto integral no original, imagem)”
G. Dá-se por integralmente reproduzido o teor dos Anexos 1 a 9 ao Relatório de inspecção constantes de fls. 696 e segs. do PAT apenso; H. Em 17 de Abril de 2008, foi emitido parecer pelo Chefe de Equipa com o seguinte teor:
I. Na mesma data, foi proferido despacho pelo Director de Finanças Adjunto, com o seguinte teor: J. Em 21 de Abril de 2008, a Impugnante foi notificada das Conclusões finais do procedimento de inspecção (cf. docs. 13 e 14, junto com a p. i. a fls. 413 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido e fls. 1164 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); K. Por Ofício n.º 031386 de 21 de Abril de 2008, a Impugnante foi notificada do Relatório de inspecção e do despacho que sobre ele recaiu (cf. doc. 15, junto com a p. i. a fls. 419 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido e fls. 1168 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); L. Em 16 de Junho de 2008, a Impugnante foi notificada da liquidação adicional de IRC n.º 2008 0…., relativa ao exercício de 2003, bem como da correspondente liquidação de juros indemnizatórios n.º 2008 0….., no valor global de € 474.503,88 (cf. artigo 1.º da p. i. e doc. 1, junto com a p. i. a fl. 64, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); M. Em 19 de Junho de 2008, a Impugnante foi notificada nos termos do n.º 5 do artigo 239.º do CPC, apesar de a mesma “se ter recusado a assinar a notificação conforme cópia da certidão de notificação que se anexa” (cf. doc. 16, junto com a p. i. a fls. 671 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido); N. Em 29 de Outubro de 2008, a Impugnante a apresentou a p. i. da presente impugnação no Serviço de Finanças de Oeiras 3 (cf. carimbo aposto na p. i. a fl. 4, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); O. Dá-se por integralmente reproduzido o teor das Cartas enviadas pela Impugnante, com a referência em assunto “Pedido de emissão de 2.ª via de facturas”, juntas como doc. 7 a fls. 87 e segs.; P. Dá-se por integralmente reproduzido o teor das Escrituras públicas de compra e venda e respectivos anexos juntas como doc. 9 a fls. 121 e segs.; Q. Dá-se por integralmente reproduzido o teor dos Termos de declarações e respectivos anexos juntos como doc. 10 a fls. 355 e segs.; R. Dá-se por integralmente reproduzido o teor das Notificações das 2.ªs avaliações, relativas a 3 fracções adquiridas, juntas como doc. 17 a fls. 679 e segs.; S. Segundo declarações das testemunhas inquiridas J……., P…., M….., G….., A…… e R……, o valor escriturado corresponde ao valor real/preço praticado no negócio jurídico efectuado (cf. depoimentos das referidas testemunhas); T. Nas chuvas que caíram em 2006, houve uma inundação num dos contentores dos estaleiros da obra, que eram usados como escritórios, como é habitual na actividade desenvolvida pela Impugnante, danificando alguns documentos que estavam aí guardados em pastas (cf. depoimentos das testemunhas inquiridas J….. e R…….e S……).» X 2.2. De Direito 2.2.1. Nos presentes autos, é sindicada a sentença proferida a fls. 999 e ss., datada de 23 de Fevereiro de 2018, que julgou improcedente a impugnação, deduzida por “O..... – O..... e P....., S.A.”, com vista à anulação da liquidação adicional de IRC n.º 2008 0……, relativa ao exercício de 2003, bem como da correspondente liquidação de juros indemnizatórios n.º 2008 0……, no valor global de € 474.503,88. 2.2.2. A presente intenção recursória centra-se sobre os alegados erros de julgamento seguintes: a) Incidente sobre a aplicação do ónus da prova: a AT não aplicou correctamente os ónus da prova, dado que, em sede procedimento de inspecção, 3 dos 36 proprietários declararam que o preço real foi superior ao preço declarado, tendo 33 declarado que o preço real correspondeu ao preço escriturado e AT considerou que em todas as situações houve uma venda das fracções por um valor superior ao constante das escrituras sem no entanto apresentar prova verosímil. b) Incidente sobre o incumprimento do prazo para proceder à notificação do projecto de relatório de inspecção e do relatório de inspecção, dado que terá sido incumprido o prazo referido. c) Incidente sobre a violação dos princípios enformadores da inspecção tributária, designadamente, o princípio da legalidade, da verdade material, da proporcionalidade e da boa fé. 2.2.3. No que respeita ao alegado erro de julgamento referido em a), supra, a recorrente censura o veredicto da instância, o qual confirmou o juízo subjacente ao acto tributário em apreço, a liquidação adicional de IRC de 2003. Este último assenta em correcções assentes em métodos indirectos, com base em omissões de proveitos, dado que houve simulação de preço (com redução do mesmo), na venda de fracções, com a inerente redução da matéria colectável (alínea F) do probatório). Através do presente esteio de recurso, a recorrente questiona a correcção relativa à aplicação dos métodos indirectos na fixação da matéria colectável, subjacente à liquidação em apreço. A fls. 792/793, o tribunal recorrido proferiu despacho seguinte: «Foi suscitada pela Fazenda Pública, na sua contestação (fls.693, que assumiu como contestação a informação de fls. 1225 a 1273 do processo administrativo), a questão prévia da preterição de apresentação prévia do pedido de revisão da matéria colectável (art. 86º, nº 5 e 91º e segs. da LGT e art. 117º, nº 1 do CPPT) por parte da impugnante “O…. – O….., e P…., S.A.”, identificada a fls. 4, contra as liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios referentes ao exercício de 2003, a qual, em caso de procedência obsta ao conhecimento do mérito da impugnação. A impugnante pronunciou-se nos termos constantes de fls. 756 a 764, no sentido da improcedência da questão suscitada. O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu parecer com o seguinte teor (cfr. fls. 770): // “Na presente acção, e de momento, importará decidir da questão prévia suscitada na contestação apresentado pelo Exmo. Representante da Fazenda Pública, e que contende com a falta de prévia apresentação pela Impugnante de pedido de revisão da matéria colectável nos termos do disposto no art. 91º, e seguintes, da LGT, meio que é obrigatório para a posterior abertura da via contenciosa de acordo com o disposto no art. 117º, nº1, do CPPT. A nosso ver na petição da impugnação vem elencada matéria que impunha que a Impugnante lançasse mão do pedido de revisão da matéria colectável, isto quando fundamenta a mesma com questões atinentes à determinação da matéria colectável com recurso a métodos indirectos, e ainda com questões atinentes à sua quantificação. Porém, sucede que para além disso, aquela também fundamenta a sua pretensão processual com questões relativas à legalidade do procedimento inspectivo e à legalidade da liquidação, as quais não cabem na previsão da norma do art. 117º, nº 1, do CPPT. Assim, somos de parecer que será de improceder parcialmente a questão prévia invocada pelo Exmo. Representante da Fazenda Pública, e, em consequência, a impugnação deverá prosseguir mas apenas para apreciação da parte que não impunha o prévio pedido de revisão da matéria colectável.” Analisado o teor da petição inicial, e acolhendo a posição expressa no douto parecer do DMMP, o Tribunal julga improcedente a questão prévia suscitada devendo os autos prosseguir os seus trâmites. // Notifique». A este propósito constitui jurisprudência firme a seguinte: i) «Nos termos do artigo 117º, nº 1 do CPPT e do artigo 86º, nº 5 da Lei Geral Tributária a reclamação do ato de fixação da matéria tributável por métodos indiretos, com fundamento em erro nessa fixação ou nos pressupostos da utilização destes métodos, constitui pressuposto ou condição de procedibilidade da impugnação judicial com esses fundamentos»(1). ii) «A liquidação subsequente à avaliação da matéria tributável por métodos indirectos só é impugnável após o procedimento de revisão previsto nos artºs.91 e seguintes da L.G.T., caso o fundamento de tal impugnação se reconduza ao erro nos pressupostos da utilização da avaliação indirecta ou ao erro na sua quantificação, situação que se deve visualizar como um pressuposto processual/condição de procedibilidade, atento o disposto nos artºs.86, nº.5, da L.G.T., e 117, nº.1, do C.P.P.T., tal implicando o não conhecimento do mérito da causa e devendo levar à absolvição da instância (que não à absolvição do pedido, como decidiu o Tribunal “a quo”), consequência processual adequada para a procedência de obstáculos ao conhecimento do mérito, conforme estatuem os artºs.278, nº.1, al.e), e 576, nº.2, ambos do C.P.Civil, aplicáveis “ex vi” do artº.2, al.e), do C.P.P.T»(2). Compulsadas as alegações de recurso em referência, verifica-se que a recorrente pretende reverter o decidido na instância com base em alegado erro nos pressupostos de facto em que terá incorrido o acto tributário, no que se reporta ao método concreto de apuramento da matéria colectável, o que não lhe é permitido, dado que não interpôs o correspondente pedido de revisão da matéria colectável, nos termos do disposto no artigo 86.º/5.º da LGT. A impugnação judicial incidente sobre os pressupostos e sobre a quantificação da matéria colectável através de métodos indirectos pressupõe o pedido prévio de reclamação junto da comissão de revisão da matéria colectável, nos termos dos artigos 91.º a 94.º da LGT. Na falta de preenchimento de tal pressuposto formou-se caso administrativo decidido, preclusivo da apreciação judicial da matéria em exame. De onde ocorre a impossibilidade do conhecimento judicial das questões em apreço, dado que incidem directamente sobre a quantificação da matéria colectável em apreço. Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu em erro, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica. Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente imputação. 2.2.3. No que respeita ao alegado erro reportado ao item referido em b), supra a recorrente invoca que terão sido incorrectamente aplicadas as normas sobre o prazo de notificação constantes do RCPIT. A este propósito, escreveu-se na sentença recorrida o seguinte. «VIII. Do desrespeito dos prazos para proceder à notificação do Projecto de relatório de inspecção e do Relatório de inspecção A este respeito, diga-se, tão-somente que, in casu, o direito de audição prévia não foi exercido pela Impugnante por opção sua (cf. atrigo 94.º da p. i.). Pelo que, falta-lhe, desde logo, o interesse em agir relativamente a uma eventual notificação não tempestiva para o exercício do direito de audição prévia. Há, ainda, que considerar que, in casu, não faltou o envio da notificação do Relatório de inspecção (cf. letra K do probatório). Pelo que, mesmo que tivesse ocorrido a ultrapassagem do prazo de 10 dias previsto no n.º 2 do artigo 62.º do RCPIT, que dispõe, note-se, que o relatório referido “deve ser notificado ao contribuinte por carta registada nos 10 dias posteriores ao termo do prazo referido no nº 4 do artigo 60º” [Sublinhado nosso], sempre o resultado do acto de liquidação seria o mesmo. Tudo o que não é de molde a inquinar o procedimento». O regime da prática dos actos do procedimento inspectivo decorre do disposto nos artigos 53.º a 63.º do RCPIT. A recorrente pretende reverter o veredicto que fez vencimento na instância alegando a inobservância do prazo de notificação do projecto de relatório final de inspecção, daqui procurando extrair conclusões quanto à subsistência do acto tributário. Sem razão, porém. Do probatório resulta que o direito de audição da contribuinte foi observado (alíneas e) e F). Os prazos previstos nos artigos 60.º/1 e 62.º/2, do RCPIT, na medida em que respeitam a actos do procedimento inspectivo que não incidem directamente sobre a esfera jurídica dos visados, são meramente ordenadores. A sua eventual preterição não assume efeito invalidante dos actos sobre escrutínio. Outro seria o resultado se se detectasse a violação ou a preterição do direito do contribuinte à participação na formação do relatório inspectivo, através do exercício do direito de audição prévia. O que no caso não se verifica. De onde se impõe julgar improcedente a presente alegação. Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não enferma de erro, pelo que deve ser confirmada na ordem jurídica. Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente imputação. 2.2.5. No que respeita ao alegado erro reportado ao item referido em c), supra a recorrente invoca a violação por parte do procedimento inspectivo dos princípios da legalidade, da verdade material, da proporcionalidade e da boa fé. Compulsadas as presentes alegações de recurso, impõe-se referir que as mesmas não logram corporizar alegados vícios do procedimento inspectivo autonomizáveis em relação à fixação da matéria colectável através do recurso aos métodos indirectos. Nesta medida, o conhecimento de tais alegados vícios mostra-se precludido pelo caso decidido administrativo, formado na sequência da falta de apresentação do pedido de revisão da matéria colectável, referido em 2.2.3. Pelo que dos mesmos se impõe não conhecer nesta sede. Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente imputação. DISPOSITIVO Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida. Custas pela recorrente. Registe. Notifique. (Jorge Cortês - Relator) (1º. Adjunto) (2º. Adjunto) ------------------------------------------------------------- (1).Acórdão do STA de 17.05.2017; P. 01662/15. (2).Acórdão do TCAS, de 05.07.2018; P. 422/14.0BEBJA. |