Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 2259/09.9BELSB |
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Secção: | CA |
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Data do Acordão: | 06/18/2020 |
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Relator: | ANA CELESTE CARVALHO |
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Descritores: | COMISSÃO DE SERVIÇO, TRANSIÇÃO PARA O REGIME DE CONTRATO DE TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS. |
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Sumário: | I. A comissão de serviço implica o exercício temporário de funções diversas da categoria do trabalhador, com o regresso às funções anteriormente desempenhadas logo que finda a comissão.
II. Cessada a comissão de serviço cessa igualmente o direito ao estatuto que correspondia à função desempenhada, nomeadamente remuneratório, retornando o trabalhador à categoria base e ao correspondente estatuto, podendo tal implicar descida na valorização relativa das funções e no montante da retribuição. III. A diferença de valor de remuneração que veio a ocorrer teve como parâmetro inicial um direito precário, transitório ou temporário por natureza, que não convoca o princípio da irredutibilidade da remuneração, nem por aí é suscetível de serem afetados os direitos à carreira, à remuneração e à previdência. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
I – RELATÓRIO
O Sindicato dos Trabalhadores da Função Pública do Sul e Açores, devidamente identificado nos autos, em representação da sua associada, M....................., veio interpor recurso jurisdicional do acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datado de 15/05/2017, que no âmbito da ação administrativa instaurada contra o IEFP – Instituto de Emprego e Formação Profissional, julgou a ação improcedente e absolveu a Entidade Demandada do pedido, de anulação da deliberação do Conselho Diretivo do IEFP, de 07/07/2009 e dos subsequentes atos determinativos dos descontos nos vencimentos de Agosto em diante, de reconhecimento do direito da associada do Autor a transitar a 01/01/2009 para o regime de contrato em funções públicas com o vencimento e demais direitos adquiridos na situação antecedente, designadamente, de subscritora da Caixa Geral de Aposentações e ainda, de condenação a manter o vencimento auferido a 31/12/2008 e respeito das subsequentes atualizações, a pagar as diferenças de vencimento devidas desde 01/01/2009 até à execução da sentença e juros de mora, à taxa legal. * Formula o aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões, depois de sintetizadas, que infra e na íntegra se reproduzem: “A) A decisão recorrida padece de erro de julgamento ao não reconhecer a manifesta ilegalidade dos atos impugnados, invocados pelo Recorrente. Senão vejamos: B) O Recorrente peticionou a declaração de nulidade ou a anulação dos atos administrativos, consubstanciados na Deliberação do Conselho Diretivo do IEFP, I.P., de 14/07/2009, exarada na Informação n.º 683/0E-PE/2009, de 7/7, por via da qual foi unilateralmente feita cessar, a partir da notificação emitida com data de 11/08/2009, mas com efeitos retroativos a 31/12/2008, a situação de comissão de serviço por tempo indeterminado em CIT da associada do Recorrente; reduzindo o seu vencimento mensal de €2631,33 para €2265,65, ou seja, em €365,68, também como efeitos retroativos a 31/12/2008 e alterada a sua categoria profissional de ''Técnico Superior Consultor- RCC" para "Técnica Superior", também com efeitos para o passado; C) Simultaneamente o Recorrente impugnou os subsequentes atos determinativos dos descontos nos seus vencimentos e, em consequência, o reconhecimento do direito de a associada do Recorrente transitar, a partir de 01/01/2009, para o regime do CTFP, com vencimento e demais direitos adquiridos na situação antecedente, designadamente à manutenção da qualidade de subscritora da Caixa Geral de Aposentações, condenando-se a entidade demandada a manter o vencimento que a associada do Recorrente auferia a 31.12.2008 e a pagar as diferenças de vencimento devidas desde 01.01.2009 até à data de execução da sentença; D) Razão pela qual não é verdade que o Recorrente não tenha impugnado a cessação da comissão de serviço, uma vez que o ato que se impugna é a Deliberação exarada na informação supra referida que determina justamente a cessação da mesma; E) Consequentemente, impugnada a cessação de comissão de serviço a mesma não se convalidou na ordem jurídica pelo decurso do prazo para a respetiva impugnação judicial; F) Os atos impugnados padecem do vício de violação de lei, por referência do disposto nos arts. 88º, 90º, 104º e 109º da Lei nº 12-A/2008, de 27/02 e art. 17º da parte preambular da Lei nº 59/2008, de 11/09, concluindo que, tais atos, ao impor a alteração da situação jurídico-laboral da associada do Recorrente e a proceder à diminuição da sua retribuição, contendem diretamente com os direitos fundamentais consagrados na Constituição, a saber: o direito à carreira (corolário do direito de acesso à função pública - art. 47.º, nº 2), à retribuição (cfr. art. 59º, nº 1, al. a) e à segurança social (cfr. art. 63.º), o que gera a nulidade dos atos impugnados; G) Isto porque a disciplina jurídica do instituto da "comissão de serviço" foi desenvolvida no Direito Administrativo como forma exclusiva de nomeação para determinados cargos (pessoal dirigente) e, ainda, como uma forma de um funcionário público, com nomeação definitiva, prestar temporariamente funções de carreira distinta da sua; H) A figura da "comissão de serviço" assenta no seu caráter transitório e, por isso, na duração limitada do exercício de determinadas funções que, em tese, não coincidem (ou não devem pelo menos coincidir) com as funções que o trabalhador exercia na carreira de origem; I) Razão pela qual as funções exercidas no âmbito de uma "pura" comissão de serviço são, de facto, reversíveis; J) Tanto assim é que cessada a comissão de serviço, cessa igualmente o estatuto que correspondia à função desempenhada, nomeadamente remuneratório, retornando o trabalhador à Carreira/categoria base, de origem; K) Todavia, não foi isso que aconteceu no caso da associada da Recorrente, não se podendo apontar à dita "comissão de serviço", ao abrigo da qual a associada do Recorrente exerceu as suas funções, as características que lhe são próprias; L) Em primeiro lugar porque com o exercício do direito de opção pelo tipo de vínculo jurídico-funcional a associada do Recorrente passou a integrar a carreira de Técnico Superior Consultor - RCC do contrato individual de trabalho e a exercer no Recorrido as mesmíssimas funções que exercia, enquanto funcionária pública em sentido estrito; M) Em segundo porque a comissão de serviço foi estabelecida por tempo indeterminado, não tendo sido definido um prazo, uma duração limitada que implicasse o seu regresso à categoria de origem; N) Daí que se tratasse de uma comissão de serviço "sui generis" atípica, que por assentar numa relação laboral estabelecida "por tempo indeterminado" - que tinha como fonte normativa a disciplina Jurídica aplicável ao contrato individual de trabalho - assumia caráter permanente; O) Acresce que, todo o processo de transição de carreiras/categorias desenvolvido pelo IEFP em 2009, mesmo com a entrada em vigor do DL nº 213/2007 até à data da transição - 31/12/2008, o vínculo jurídico laboral estabelecido com a associada do Recorrente com o IEFP subsistia nos mesmos moldes em que foi estabelecido na referida Portaria, designadamente no que respeita à situação remuneratória, evidenciando, pois, o caráter permanente dessa relação laboral; P) Por força da conversão legal operada pelos arts. 88º e ss. e 109º da LVCR, com a entrada em vigor dessa Lei, as relações jurídicas de trabalho subordinado previamente estabelecidas com caráter permanente - incluindo, naturalmente, as relações jurídico-laborais constituídas sob as vestes de um contrato individual de trabalho, ainda que tendo por referência a comissão de serviço "atípica" - convolaram-se em contrato de trabalho em funções públicas (cfr. arts. 2º, 3º, 9º e 97º da citada lei); Q) O problema situa-se ao nível do seu reposicionamento remuneratório, pois que o Recorrido determinou que finda a comissão de serviço, a associada do Recorrente passaria a auferir a remuneração base mensal correspondente à carreira/categoria de origem (que teria na função pública) a partir de 01/01/2009; R) A diminuição do vencimento operada ofende o direito fundamental à retribuição bem como o princípio da igualdade retributiva, plasmado no art. 59º, nº 1 al. a) da CRP, pelo que é absolutamente inválido, nos termos do art. 133º, nº 2, al. d) do CPA; S) Viola ainda o art. 89º, al. d) do RCTFP e 104º da LVCR e contraria o princípio geral da irredutibilidade salarial; T) Perante o quadro legal acima exposto, outra conclusão não se poderá retirar senão a de que o operar da transição do vínculo detido pela associada do Recorrente não importou, nem poderá importar, uma modificação da respetiva situação remuneratória e muito menos ficar tal direito refém das regras definidas para o regime de proteção social a adotar (cfr. art. 114º da LVCR); U) Pois que, pese embora esta transição, por força das citadas normas, consagrou-se a regra de que na passagem de contrato individual de trabalho para o contrato de trabalho em funções públicas, o trabalhador goza da garantia de não ver diminuída a sua remuneração (sendo certo que o facto de tal contrato individual de trabalho ser exercido em regime de comissão de serviço em nada afeta esta conclusão, atenta a sua real natureza - permanente e não transitória); V) Essa é a bitola - a da irredutibilidade da retribuição - que norteia o regime de transição operado pela LVCR, complementado pelo RCTFP; W) Não existindo no caso concreto qualquer ressalva na lei, quanto a este princípio; X) Assim, o vício de violação de lei invocado pelo Recorrente terá de preceder; Y) Devendo, em consequência, a associada do Recorrente ter o direito de transitar para o sistema de carreiras/categorias previsto na LVCR com a garantia de não ver diminuída a remuneração que auferia anteriormente, por imperativo de dependência lógica em relação à decisão anulável; Z) E ser a decisão recorrida ser substituída por outra que condene o Recorrido a colocar a associada do Recorrente na posição remuneratória que, nos termos do disposto no art. 104º da LVCR garanta a remuneração base mensal a que a mesma auferia em 31/12/2008 e demais direitos adquiridos na situação antecedente, designadamente à manutenção da qualidade de subscritora da Caixa Geral de Aposentações; AA) Razões pelas quais entende o Recorrente que na douta sentença a quo foi feita errónea interpretação e aplicação do Direito ao caso submetido à apreciação e decisão do Tribunal, pelo que nela se incorre em erro de julgamento ao não reconhecer a manifesta ilegalidade dos atos impugnados, invocados pelo Recorrente.”. Pede que seja concedido provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida. * Notificado o Recorrido, o mesmo contra-alegou o recurso, formulando as seguintes conclusões, que ora se reproduzem, na íntegra: “A) A decisão recorrida não padece de erro de julgamento, e fez boa interpretação e aplicação a lei; B) O Recorrente impugnou a deliberação que determinou a transição da sua representada para o regime do contrato de trabalho em funções públicas e não a deliberação que determinou a cessação da comissão de serviço da sua representada; C) Não tendo o Recorrente impugnado a deliberação que determinou a cessação da comissão de serviço dentro do prazo para o efeito, a decisão convalidou-se na ordem jurídica; D) A disciplina jurídica do instituto da «comissão de serviço» foi desenvolvida no Direito Administrativo, como forma exclusiva de nomeação para determinados cargos (pessoal dirigente), e, ainda, como uma forma de um funcionário público, com nomeação definitiva, prestar temporariamente funções de carreira distinta da sua. A figura da «comissão de serviço» assenta, assim, no carácter transitório e, por isso, na duração limitada do exercício de determinadas funções, que, em tese, não coincidem (ou não devem pelo menos coincidir) com as funções que o trabalhador exercia na carreira de origem. E por essa razão é que as funções exercidas no âmbito de uma (“pura”) comissão de serviço são, de facto, reversíveis. Tanto assim é que cessada a comissão de serviço, cessa igualmente o estatuto que correspondia à função desempenhada, nomeadamente remuneratório, retornando o trabalhador à carreira/categoria base, de origem”; E) No que concerne especificamente à Comissão de Serviço por tempo indeterminado, no seguimento de evolução legislativa, veio-se a verificar que a comissão de serviço atípica criada ao abrigo da Portaria n.º 66/90, de 27 de janeiro, veio a ser revogada com a entrada em vigor da Lei Orgânica do IEFP, I. P., aprovada pelo Decreto-Lei n.º 213/2007, de 29 de maio, que revogou expressamente o Decreto-Lei n.º 247/85, de 12 de julho, não tendo conferido quaisquer direitos adquiridos a quem dela foi destinatário, mormente quem não tenha exercido, em tempo, o direito de opção definitiva pelo contrato individual de trabalho. Após a entrada em vigor deste Decreto-Lei, entendeu o Recorrente, sem que tal possa ser entendido como censurável, que apenas se mostraria possível assegurar uma de duas opções: a) Ou a remuneração que vinham auferindo nas carreiras dos Contrato individual de trabalho, implicando a exoneração da função pública e a anulação da inscrição na Caixa Geral de Aposentações; b) Ou a manutenção da inscrição na Caixa Geral de Aposentações, mas tendo em conta a remuneração que corresponde à carreira/categoria do lugar de origem; F) Em qualquer caso, o Recorrido deu ainda a oportunidade a todos aqueles que se encontravam nestas condições, de poderem optar até 31 de Dezembro de 2008. O Recorrido, através dos seus órgãos competentes, decorrido o prazo concedido para o direito de opção, pôs termo à comissão de serviço daqueles que nada disseram, tendo em conta o direito dos trabalhadores ao seu lugar de origem; G) O Recorrido limitou-se a confirmar aquilo que foi imposto a todos aqueles que exerciam funções públicas ao deliberar respeitar o regime de que a representada do Recorrente era detentora na função pública; H) Pelo que a representada do Recorrido, finda a comissão de serviço por tempo indeterminado, em 31 de dezembro de 2008, não só transitou para as novas carreiras como foi reposicionada a nível remuneratório, nos termos dos artigos 95.º e 104.º, ambos da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro. I) Finda a comissão de serviço por tempo indeterminado passou naturalmente a auferir a remuneração base mensal correspondente à carreira/categoria de origem, a partir de 1 de janeiro de 2009; J) A representada do Recorrente não poderia manter a remuneração que auferia enquanto sujeita ao regime de contrato individual de trabalho (em comissão de serviço), visto se encontrar a exercer funções em comissão de serviço por tempo indeterminado, em regime de contrato de trabalho, e o novo regime regulador de formas de emprego público não permitir a figura da comissão de serviço; K) Contrariamente ao que refere o Recorrente, a sua associada não tem direito a que a transição para o RCTFP se considere legalmente processada ou operada por força da lei, sem perda de qualquer direitos existentes a 31/12/2008; L) O Recorrido não estabeleceu tratamento diferente para a associada do Recorrente, visto que esta conservou o regime previdencial da CGS; M) As funções exercidas em comissão de serviço são reversíveis, e cessada a comissão de serviço cessa igualmente o direito ao estatuto que correspondia à função desempenhada, designadamente remuneratório, retornando o trabalhador à categoria base e ao correspondente estatuto, podendo tal implicar descida na valorização relativa das funções e no montante da retribuição, sem que tal situação constitua a violação do principio da irredutibilidade da remuneração.”. Pede que a sentença recorrida seja mantida na íntegra. * Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não foi emitido parecer. * O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.
II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso. Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento de direito, por violação dos artigos 88.º, 90.º, 104.º e 109.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02 e artigo 17.º da parte preambular da Lei n.º 59/2008, de 11/09, decorrente da cessação unilateral da comissão de serviço por tempo indeterminado da associada do Autor, com implicação da remuneração auferida, em violação dos artigos 47.º, n.º 2, 59.º, n.º 1, a) e 63.º, da CRP, quanto ao direito à carreira, à retribuição e à segurança social.
III. FUNDAMENTOS
DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “1– Mediante deliberação tomada em 14.07.2009, pelo Conselho Directivo do R., exarada na informação nº. 683/OE-PE/2009, de 07.07.2009, foram cessadas as comissões de serviço, entre as quais a da representada do A., M....................., deliberação cujo teor aqui se dá por reproduzido, e do qual extrai - se que a comissão de serviço da representada do A. foi cessada (cfr. docº. , junto com a p.i., de fls. 92 e 93 dos autos, e admissão por acordo). 2 – A A. foi notificada da cessação da comissão de serviço, nos termos do ofício datado de 06.08.2009, junto com a p.i., cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. de fls. 99 dos autos, e procº. instrutor). 3 – O percurso da representada do A. mostra-se patenteado na declaração emitida pelo R., junta com a p.i., cujo teor abaixo reproduz-se (cfr. docº. de fls. 47 a 49 dos autos, e admissão por acordo):” «imagens no original» 4 – A representada do A., M....................., manifestou a vontade de transitar para o contrato individual de trabalho, mas mantendo a CGA e ADSE (cfr. docº. junto com a p.i., de fls. 100 a 107 dos autos, constando aquela manifestação a fls. 105 dos autos, integrada no quadro alínea c), da informação identificada no facto provado, supra, sob o nº.1 (cfr. docº. de fls. 100 a 107 dos autos, e procº. instrutor).
A convicção do Tribunal fundou-se na prova documental supra referenciada, bem como na admissão por acordo das partes.
Nada mais logrou-se provar com relevância para a decisão do mérito da presente acção.”. * Nos termos do disposto no artigo 662.º, n.º 1 do CPC, procede este Tribunal ad quem, à correção do julgamento da matéria de facto fixado no acórdão recorrido, por manifesta incorreção no respeitante ao exato teor do ato impugnado, assim como à sua respetiva fundamentação no meio documental: 1 – Mediante deliberação tomada em 14.07.2009, pelo Conselho Diretivo da Entidade Demandada, de concordância com o despacho exarado pelo Vogal do Conselho Diretivo, J..................... e os demais pareceres e informações exarados na Informação n.º 683/OE-PE/2009, de 07.07.2009, foram cessadas as comissões de serviço dos funcionários públicos do quadro de pessoal do IEFP a exercerem funções em regime de comissão de serviço no CIT, entre as quais a da representada do A., M....................., nos termos da alínea c) da referida Informação, correspondente aos trabalhadores que “não manifestaram a sua intenção de forma clara e inequívoca ou fizeram-nos com algumas condições, tais como, transitar para o regime do contrato individual de trabalho, mas mantendo a CGA e a ADSE”, deliberação cujo teor aqui se dá por reproduzido, e do qual se extrai que a comissão de serviço da representada do Autor foi cessada (cfr. doc. junto a fls. 100 a 107 do processo físico, para que se remete e se considera integralmente reproduzido). DE DIREITO Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.
Erro de julgamento de direito, por violação dos artigos 88.º, 90.º, 104.º e 109.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02 e artigo 17.º da parte preambular da Lei n.º 59/2008, de 11/09, decorrente da cessação unilateral da comissão de serviço por tempo indeterminado da associada do Autor, com implicação da remuneração auferida, em violação dos artigos 47.º, n.º 2, 59.º, n.º 1, a) e 63.º, da CRP, quanto ao direito à carreira, à retribuição e à segurança social Vem o Recorrente a juízo, em representação da sua associada recorrer da decisão recorrida, que julgou a ação improcedente, absolvendo a Entidade Demandada de tudo quanto fora peticionado. O presente litígio respeita a saber os termos em que deve ser feita a transição da situação dos funcionários públicos para o regime do contrato de trabalho em funções públicas, quer quanto à transição para o lugar da carreira, quer quanto aos efeitos retributivos. O presente litígio tem por objeto a deliberação tomada pelo Recorrido em 14/07/2009, ora assente no ponto 1 do julgamento da matéria de facto, nos termos ora corrigidos, de cessação da comissão de serviço da associada do Autor, nos termos da Informação n.º 683/OE-PE/2009, de 07/07/2009, com reflexos na sua categoria profissional e vencimento mensal. Trata-se da impugnação da deliberação do Conselho Directivo do IEFP, IP., datada de 14/07/2009, exarada na Informação n.º 683/0E-PE/2009, de 07/07, nos termos da qual a Entidade Demandada procedeu à cessação da comissão de serviço nas carreiras/categorias do contrato individual de trabalho, com efeitos a 31/12/2008 e à respetiva integração na carreira/categoria de que o trabalhador era detentor na função pública, com efeitos a 01/01/2009. Sustenta o Recorrente que incorre a sentença recorrida em erro de julgamento ao invocar que o Autor não veio impugnar a cessação da comissão de serviço e que, por isso, a mesma se consolidou na ordem jurídica, mais alegando a contradição em que incorre na sua fundamentação. Invoca que tanto impugnou o ato impugnado, que determina a cessação da comissão de serviço, como impugnou os consequentes atos de processamento de vencimentos. Além de dirigir contra a sentença recorrida e, consequentemente, o ato impugnado, a violação de direitos adquiridos ao abrigo da relação jurídica de comissão de serviço, constituída ao abrigo da Portaria n.º 66/90, de 27/01, nomeadamente de ingressar em regime de contrato de trabalho em funções públicas, ao abrigo do artigo 95.º e seguintes da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02, tendo por pressuposto a sua carreira/categoria do contrato individual de trabalho, em detrimento do vínculo de origem. Assim, sustenta o Recorrente que a sua associada estava integrada na carreira/categoria de Técnica Superior Consultor – RCC, auferindo o valor mensal de € 2.631,33, mas em consequência da cessação da comissão de serviço e respetiva transição para o regime da função pública, nos termos da Lei n.º 12-A/2008, de 17/02, viu o seu vencimento ser reduzido para € 2.265,65. Entende o Recorrente que a transição para o regime do contrato de trabalho em funções públicas a partir de 01/01/2009, deve ser operada sem perda de quaisquer direitos existentes em 31/12/2008, sejam remuneratórios, sejam referentes à inscrição e desconto para a CGA. Vejamos. Afim de apreciar e decidir a questão de direito que vem colocada, importa antes de mais atender à situação individual e concreta em que se encontra a associada do Autor, para, depois, com base nos factos apurados se proceder à respetiva subsunção do direito aplicável. Conforme o que resulta dos factos apurados na sentença recorrida, apresenta-se incontrovertido que a associada do Autor é trabalhadora do quadro de pessoal do IEFP, ora Recorrido, aí tendo iniciado funções em 28/09/1984, tendo sido nomeada definitivamente na categoria de Técnico Superior de 2.ª classe, em 29/04/1989, ao abrigo do D.L. n.º 193/82, de 20/05. Quando se encontrava provida na categoria de Técnica Superior Principal, no regime geral da função pública, em 14/02/1995, a associada do Autor requereu, ao abrigo do disposto no artigo 2.º da Portaria n.º 66/90, de 27/02, que aprova, em anexo, o Estatuto do Pessoal do Instituto do Emprego e Formação Profissional, a sua integração na categoria profissional da carreira definida para o contrato individual de trabalho, em regime de comissão de serviço por tempo indeterminado, com base no artigo 31.º do Estatuto do Instituto do Emprego e Formação Profissional, anexo ao D.L. n.º 247/85, de 12/07. Estipulava-se ainda no artigo 3.º da citada Portaria n.º 66/90, de 27/02 que “A comissão de serviço a que se refere o número anterior apenas cessará por vontade do interessado.”. Em 1999 a associada do Autor foi promovida a Técnica Superior Assessor e em 2002, após concurso, à categoria de Técnico Superior Consultor. Em 07/03/2005, na sequência de concurso, foi nomeada definitivamente na categoria de Assessora do quadro de pessoal do IEFP. Em 31/12/2008, a associada do Autor auferia € 2.542,88, sobre os quais recaiam descontos para a Caixa Geral de Aposentações. Perante a citada situação de facto, detendo a associada do Autora a categoria de Assessora, da carreira de Técnica Superior do contrato individual de trabalho do IEFP, nos termos do Regulamento de Carreiras do IEFP, em comissão de serviço por tempo indeterminado, importa agora atender à interpretação e aplicação dos respetivos normativos de direito. A transição operada pela Lei n.º 12-A/2008, de 27/02 (cfr. artigo 95.º e seguintes da referida lei) levou a que os trabalhadores nomeados definitivamente que exercem funções em condições diferentes das referidas no artigo 10.º, transitassem para a modalidade de contrato por tempo indeterminado. Ao invés, os trabalhadores nomeados definitivamente que exercem funções integrados em carreiras, nas condições referidas no artigo 10.º mantêm a nomeação definitiva. Considerando a carreira e respetiva categoria detidas pela Autora, assim como as funções exercidas, próprias da carreira geral de Técnico Superior, com nomeação definitiva, à data do exercício de funções em regime de comissão de serviço, é manifesto que se enquadra no âmbito dos trabalhadores que exercem funções fora do âmbito das atribuições, competências e atividades previstas no artigo 10.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02, pelo que a transição entre modalidades de relação jurídica de emprego público em casos como ao da associada do Autora deu-se para a modalidade de contrato por tempo indeterminado. O cerne do presente litígio prende-se com o Autor pretender que a transição da sua associada opere com base na situação jurídica que a mesma detinha em virtude de exercer as suas funções em regime de comissão de serviço, com os respetivos direitos inerentes. Mas sem razão, não servindo o instituto da comissão de serviço a tempo indeterminado em que se encontrava a sua associada antes de ocorrer a transição, dar guarida à sua pretensão. A disciplina jurídica da comissão de serviço foi iniciada e desenvolvida no direito administrativo, no âmbito do qual constitui a forma exclusiva de nomeação para determinados cargos (o pessoal dirigente e equiparado, nos termos do artigo 7.º , n.º 1, do D.L. n.º 427/89, de 07/12 e artigo 18.º da Lei 49/99, de 22/06), constituindo um modo de um funcionário com nomeação definitiva prestar temporariamente funções em carreira distinta da sua (artigos 7.º , n.º 1 e 24.º, do D.L. n.º 427/89, de 07/12). A comissão de serviço implica o exercício temporário de funções diversas das da categoria do trabalhador, com regresso às funções anteriores quando termine. Finda a comissão de serviço o trabalhador deixa o cargo de direção ou de chefia que desempenhava, regressando ao lugar de origem, vide António Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, Almedina, 1991, pág. 674. Neste sentido, o exercício de funções em comissão de serviço aparece como um instrumento de flexibilização das relações laborais, no que respeita ao exercício de funções de chefia ou em categoria/carreira diversa da do lugar de origem, com uma natureza intrinsecamente transitória. Esta natureza provisória ou transitória da comissão de serviço, não é posta em causa, nem se contrapõe o regime constante da Portaria n.º 66/90 de 27/01, que esteve na base da comissão de serviço da associada do Autor. É que o regime da Portaria n.º 66/90 de 27/01, quando refere no seu artigo 3.º que “A comissão de serviço a que se refere o número anterior apenas cessará por vontade do interessado”, apenas visa limitar as situações em que a entidade empregadora lhe pode pôr termo, sem impedir a sua respetiva cessação, quer pelo trabalhador, quer ope legis ou por força da lei. Tanto mais que, como referido, a natureza intrínseca da comissão de serviço relaciona-se com o exercício transitório de determinadas funções. É neste sentido que a figura foi prevista e regulada no D.L n.º 427/89 de 07/12, ao estabelecer o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública, em que, manifestamente, o exercício de funções em comissão de serviço nunca se configura como tendo potencialmente um carácter definitivo. No que se refere à situação jurídica da associada do Autor e aos direitos reclamados em função da comissão de serviço, o artigo 31.º do Estatuto do Instituto do Emprego e Formação Profissional, aprovado pelo D.L. n.º 247/85, de 12/07, referia expressamente os direitos dos trabalhadores do IEFP que fossem chamados a desempenhar funções em institutos públicos, os quais consistiam na garantia do lugar de origem e dos direitos nele adquiridos, sendo considerado esse período como tempo de serviço prestado no IEFP, devendo também entender-se ser aplicável, por identidade de razão, aos trabalhadores do IEFP que fossem chamados a desempenhar funções em comissão de serviço no próprio IEFP. O que acarreta que a associada do Autor detém, à data da transição imposta pela Lei n.º 12-A/2008, de 27/02 e, por isso, ope legis, os direitos inerentes ao seu lugar de origem e não outros que, porventura, lhe adviessem do exercício de funções em comissão de serviço. A deliberação do IEFP, ora impugnada, tomada em 14/07/2009, faz retroagir os seus efeitos à data de 31/12/2008 quanto à cessação da comissão de serviço e a 01/01/2009 quanto à transição para a carreira geral e respetivo posicionamento remuneratório, nos termos do artigo 98.º e seguintes da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02 e segundo o D.L. n.º 121/2008, de 11/07, com efeitos na regularização do vencimento. Tendo a Entidade Demandada, ora Recorrida, reportado o posicionamento da associada do Autor a 01/01/2009, há lugar à reposição das importâncias indevidamente recebidas após essa data, nos termos dos artigos 36.º e seguintes do D.L. n.º 155/92, de 28/07. Assim, em face ao teor do diploma, à data da transição imposta pela Lei nº 12-A/2008 de 27/02, a associada do Autor detinha os direitos inerentes ao seu lugar de origem, e não outros que lhe tivessem advindo do exercício de funções em comissão de serviço. Cessada a comissão de serviço, cessa igualmente o direito ao estatuto que correspondia à função desempenhada, nomeadamente remuneratório, retornando o trabalhador à categoria base e ao correspondente estatuto, podendo tal implicar descida na valorização relativa das funções e no montante da retribuição. Isto porque, a comissão de serviço caracteriza-se pela transitoriedade e pela “provisoriedade”, permitindo a ocupação temporária de determinados lugares e/ou funções que não podem ter natureza vitalícia, tal como sucede com os cargos dirigentes. Ao ser facultado à associada do Autor, ora Recorrente, a possibilidade de, finda a comissão de serviço, optar pelo contrato individual de trabalho ou pelo regime do contrato de trabalho em função pública, e não o tendo exercido, foi aquela integrada no ultimo regime, que corresponde ao lugar de origem. Pelo que, tendo a associada do Recorrente continuado a exercer as suas funções em comissão de serviço após a produção de efeitos da Lei n.º 12-A/2008 de 27/02, até à data da cessação da mesma pela deliberação de 14/07/2009, a Recorrida continuou a processar os vencimentos tendo por base a retribuição do exercício de funções em comissão de serviço. No entanto, como a referida deliberação faz retroagir os seus efeitos à data de 31/12/2008 no que se refere à cessação da comissão de serviço e a 01/01/2009 quanto à regularização do vencimento, importa proceder aos respetivos acertos remuneratórios, havendo direito à reposição das importâncias indevidamente recebidas, após aquela data, segundo o nível remuneratório resultante da integração a partir de 01/01/2009. Tal atuação não derroga os princípios e direitos constitucionais invocados pelo Recorrente, de direito à carreira e de acesso à função pública ou sequer, à retribuição e à segurança social, previstos nos artigos 47.º, n.º 2, 59.º, n.º 1, a) e 63.º, da CRP. Em consequência do ato impugnado, a associada do Autor não ficou privada da sua carreira na Administração Pública, segundo um vinculo definitivo e não precário ou transitório, do mesmo modo que não ficou privada do direito à remuneração, nem sequer do regime previdencial. Pelo que, é manifesto que não se verifica a ofensa do conteúdo essencial de tais direitos constitucionais, mantendo-se os direitos, quer à carreira, quer à remuneração, quer à previdência da associada do Autor. As alterações operadas pelo ato impugnado têm por fonte direta a lei, traduzindo-se na prática de um ato de conteúdo vinculado quanto aos seus pressupostos. A diferença salarial existente entre o que a associada do Autor vinha auferindo e o que passou a auferir constitui um efeito necessário da transição operada por efeito da Lei n.º 12-A/2008 e da circunstância de não ter manifestado a sua opção pela cessação do vinculo à função pública, motivo porque o silêncio foi interpretado como mantendo o regime de nomeação definitiva de origem, com efeitos a 31/12/2008, ficando integrada na carreira e categoria de que é detentora na função pública. Por isso, nos termos legalmente previstos, foi concedida a opção à associada do Autor de escolher entre transitar definitivamente para o regime do contrato individual de trabalho, cessando o seu vínculo à função pública, com efeitos a 31/12/2008 ou manter o vínculo à função pública, cessando a comissão de serviço na carreira e categoria do contrato individual de trabalho, com efeitos a 31/12/2008. A pretensão defendida pela associada do Autor, de pretender transitar para o regime do contrato individual de trabalho, mas mantendo a Caixa Geral de Aposentações e a ADSE, traduz-se numa confluência de regimes que não encontra acolhimento na lei. Do Acórdão n.º 154/2010 do Tribunal Constitucional, Proc. n.º 177/2009, tirado em sede de fiscalização abstrata sucessiva da constitucionalidade das normas constantes dos artigos 10.º, 20.º, 21.º, n.º 1, 88.º, n.º 4, e consequentemente, da norma do artigo 109.º, n.ºs 1, 2, 3 e 4, todos da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02, extrai-se o seguinte: “(…) 8.1. Em primeiro lugar, não pode dizer-se que a alteração do regime de nomeação (por acto de autoridade unilateral da Administração) para um regime contratual (por conjugação do interesse público que a Administração Pública serve com a autonomia privada do particular) ofenda, em si mesmo, a ideia de um estatuto específico da função pública. Na verdade, nenhuma das regras e princípios que vimos caracterizarem esse estatuto (sejam elas relativas a concurso no acesso e na carreira; direito de reclamação; garantias em processo disciplinar, responsabilidade por acções e omissões ou acumulações e incompatibilidades) é posta em causa pela mera alteração da modalidade de vínculo em causa e todas elas são compatíveis com um regime jurídico de matriz contratual. O estatuto específico da função pública existe constitucionalmente, mas não é atingido apenas pelo facto de haver formas contratuais de recrutamento de trabalhadores da Administração Pública. Como esclarecem Jorge Miranda e Ana Fernanda Neves (loc. cit., pág. 621): “Estes elementos irredutíveis [que compõem o estatuto da função pública e que acima se enumeraram] encontram-se tanto nas situações (mais correntes até hoje) de sujeição dos trabalhadores da Administração pública e demais funcionários e agentes a um regime estatutário como nas situações de contrato individual de trabalho”. 8.2. Em segundo lugar, não parece pertinente, à luz da evolução constitucional portuguesa, a alegação (desenvolvida nos pontos 14 a 22 do requerimento) segundo a qual o modelo de Estado social que a Constituição consagra exigiria que se mantivesse o regime de nomeação definitiva e excluiria que a Administração Pública se regesse por critérios de contratualidade laboral. O requerente desenvolve a ideia de uma configuração do Estado, segundo as “tarefas” que deverá constitucionalmente cumprir, que parece poder caracterizar-se como de “Estado assistencial”. Contudo, se é verdade que a Constituição rejeita o modelo do “Estado mínimo” e impõe um modelo de “Estado social” (entendido no quadro da “sociedade livre justa e solidária” a que se refere logo no seu artigo 1.º e da democracia económica, social e cultural de que fala o artigo 2.º), não é menos certo que o modelo constitucional de Estado “não se compadece com o Estado assistencial”. É precisamente o que sintetiza Jorge Miranda (Manual de Direito Constitucional, Tomo IV, p. 445): “Se, obviamente, a Constituição rejeita o Estado mínimo (em face da soma de tarefas e incumbências que atribui às entidades públicas, à luz do desígnio de «uma sociedade mais solidária» do art. 1.º), tão pouco se compadece com o Estado assistencial. Não se conforma com este por causa de todo o relevo que confere à intervenção de grupos, associações e instituições existentes na sociedade civil na efectivação dos direitos sociais. Depois, por causa da garantia da propriedade e da iniciativa económica privada (reforçada em sucessivas revisões). Enfim, porque, expressamente, ao considerar o acesso à justiça alude à «insuficiência de meios económicos» (art. 20.°, n.° 1, atrás considerado) e declara o serviço nacional de saúde tendencialmente gratuito «tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos» (art. 64.°, n.° 2, alínea c), na versão de 1989)”. A questão não é, anote-se, político-ideológica, mas eminentemente jurídica e, mais especificamente, “jurídico-constitucional” (só assim se compreendendo, aliás, que o requerente insista tão veementemente nela, no âmbito de um processo jurisdicional de fiscalização da constitucionalidade). Na verdade, a “democracia económica, social e cultural”, que sustenta a ideia constitucional de Estado de direito democrático, não corresponde a um modelo ideológico predefinido de organização e actuação do Estado e da Administração Pública, mas a uma transcendental exigência de juridicidade constitucional, exigência esta que se compadece com modelos estruturalmente diversos de organização administrativa pública e com formas heterogéneas de realização do interesse público, que o Estado visa servir. Além disso, o Estado actuante e conformador da sociedade, que a Constituição prefigura nos seus artigos 2.º e 9.º, não se confunde com o Estado meramente executor de um programa que seja constitucionalmente fixado, de forma exauriente e fechada. Bem pelo contrário. Sendo a ideia de Estado social uma implicação do Estado de direito, e integrando este, nos termos do artigo 2.º, ainda os princípios da soberania popular e do pluralismo de expressão e de representação política democráticas, ao poder político legitimamente constituído em cada legislatura caberá, de acordo com os mandatos populares, decidir sobre o modo de concretização das normas da CRP que fixam as tarefas fundamentais do Estado. De nenhuma dessas normas se poderá depreender a vinculação do legislador ordinário a uma “visão” invariável do Estado – seja ela ou não a “visão mais abrangente do Estado-providência”, para citar as palavras do ponto 16 do requerimento –, ou a um programa tão detalhado da sua acção futura que obrigue à manutenção de um certo modelo de constituição da relação de emprego público. 8.3. Em terceiro lugar, a função pública não é um estatuto que obrigatoriamente seja marcado pela homogeneidade. Mesmo quem mais enfaticamente defende a existência de uma especificidade constitucional inerente ao regime da função pública, como sucede com Paulo Veiga e Moura (A Privatização da Função Pública, Coimbra 2004, p. 80 a 84 e 257 a 261), reconhece que há no interior da Administração Pública diferenciações a fazer e especificidades a ter em conta (ob. cit., pág. 85-94), fazendo inclusivamente, como corolário da posição diferenciadora, a referência àquilo que designa como “núcleo duro da Função Pública” (p. 94), do qual naturalmente − acrescente-se − não farão parte todos os trabalhadores da função pública. 8.4. Em quarto lugar, e infirmando aquilo que é o nó górdio de toda a construção argumentativa do requerente, não é de todo possível estabelecer um nexo de causalidade necessária entre a segurança da relação de emprego público (artigos 53.º e 58.º da Constituição) e o correcto exercício da actividade administrativa pública no quadro dos princípios constitucionais (artigo 266.º da Constituição). De facto, como se sabe, há diversas modalidades de constituição da relação de emprego público. Existem, para além dos trabalhadores nomeados a título definitivo e em regime de contrato administrativo de provimento, trabalhadores em regime de “contrato a termo” e em regime de “comissão de serviço”. Ora seria ilegítimo pensar que estes últimos teriam necessariamente menor empenho na realização do interesse público (que constitui a razão fundamental de ser e o “norte” da Administração Pública) e dos princípios jurídicos fundamentais (enquanto parâmetros normativos que balizam a prossecução de tal interesse público) do que os funcionários ou agentes com um vínculo menos precário e mais estável. É certo que a estabilidade promove o compromisso, mas não é legítimo presumir que os trabalhadores com contrato por tempo indeterminado terão menor empenhamento na prossecução do interesse público do que os trabalhadores definitivamente nomeados. Além disso, convém notar que qualquer uma das modalidades de constituição da relação jurídica de emprego público está, nos termos da lei, submetida às mesmas garantias de imparcialidade, quer se trate de nomeação (definitiva ou transitória) quer se trate de contrato (por tempo indeterminado ou a termo resolutivo, certo ou incerto). Tal significa que, pelo menos na perspectiva do legislador, inexiste uma correlação de causalidade necessária entre a modalidade de constituição da relação jurídica de emprego público e o grau de cometimento na prossecução do interesse público por parte do trabalhador. Com efeito, se assim não fosse, teria optado a lei por limitar o âmbito de aplicação das garantias de imparcialidade aos vínculos constituídos por contrato e não por nomeação definitiva, já que, quanto a estes últimos, se presumiria, pela própria natureza das coisas, um indiscutível comprometimento com o interesse público. Significa isto que a Administração Pública, desenvolvendo-se num quadro institucional democraticamente legitimado, detém uma estrutura tal que possibilita que quem age em nome dela o faça em nome do interesse público, independentemente do modo pelo qual – nomeação ou contrato – se constituiu o vínculo laboral. E a imposição constitucional é justamente essa: a vinculação exclusiva da administração ao interesse público (artigo 266.º, n.º 1, da CRP). 8.5. Em quinto lugar, nenhum dos acórdãos do Tribunal Constitucional invocados pelo requerente permite a inferência de que do estatuto da função pública decorreria a impossibilidade de estabelecer a regra da contratualização em matéria laboral. Adiante se fará referência aos acórdãos n.ºs 154/86 e 340/92. Por agora, limitamo-nos ao acórdão n.º 683/99. Aquilo que ficou decidido no Acórdão n.º 683/99, numa jurisprudência, aliás, posteriormente confirmada em inúmeros outros acórdãos (vejam-se, nomeadamente, os acórdãos n.ºs 85/00, 191/00, 368/00, 409/07, 248/08, 412/08 ou 483/08), foi a inconstitucionalidade da conversão automática de contratos a termo em contrato definitivo sem necessidade de procedimento de recrutamento e selecção de candidatos que assegure o respeito pelos princípios da liberdade e da igualdade no acesso à função pública. O acórdão não consagra, portanto, nenhum “direito à função pública”, como pretende o requerente, decidindo apenas no sentido da existência no âmbito desta de um direito de acesso à função pública, através de concurso, de que resultará a escolha dos mais aptos para o exercício das funções que especificamente estejam em causa. Em suma, o acórdão depõe no sentido da não definitividade dos vínculos pelo mero decurso do tempo, e não no sentido, que o requerente pretende, de um direito à função pública. 8.6. Em sexto lugar, é necessário ter em conta que a segurança no emprego (artigos 53.º e 58.º da Constituição) não é um direito absoluto, mas antes, à semelhança, aliás, de todos os outros direitos, um direito que admite limites e restrições à luz de outros direitos e valores constitucionalmente protegidos (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição). Ora no que especificamente respeita ao emprego público é necessário ponderar o objectivo constitucionalmente definidor da Administração Pública, ou seja, o “interesse público”, com o dever de boa administração que lhe é inerente. Deste modo, deve entender-se que o regime de vínculos, remunerações e carreiras da Administração Pública poderá restringir a segurança do emprego público em vista da qualidade da actividade administrativa pública. Se a segurança no emprego é um imperativo constitucional não o é menos o modelo da boa administração inerente à prossecução do “interesse público” (artigo 266.º, n.º 1, da Constituição), interesse este ao serviço do qual se encontram exclusivamente dedicados os trabalhadores da função pública (artigo 269.º, n.º 1, da Constituição). Era já isto, precisamente, o que se concluía no Acórdão n.º 233/97 (…)”. Tendo o Tribunal Constitucional assim decidido para os casos incluídos no regime de nomeação definitiva, por maioria de razão o será quando esteja em causa, como no presente caso, uma situação de comissão de serviço. Donde, a diferença de valor de remuneração que veio a ocorrer teve como parâmetro inicial um direito precário, transitório ou temporário por natureza, pelo que, como assinalado pelo Recorrido, o princípio da irredutibilidade da retribuição também não se coloca. Pelo que, não obstante com diferente fundamentação de facto e de direito, não incorre a sentença recorrida em erro de julgamento ao ter decidido julgar a ação improcedente e absolver a Entidade Demandada do pedido. A associada do ora Recorrente, em 31/12/2008, tem o direito à remuneração base correspondente à carreira e categoria de que era titular por nomeação definitiva e promoção, não qualquer outra. Como alegado pelo Recorrido, é sobre esse direito adquirido – o da sua nomeação definitiva na função pública – que assentam os pressupostos base para se operar, a 01/01/2009, a transição para a nova carreira, bem como o respetivo reposicionamento remuneratório, nos termos do disposto nos artigos 95.º e 104.º, ambos da Lei nº 12-A/2008, de 27/02. Termos, em face de todos o exposto, com base nas razões, será de negar provimento ao recurso e em confirmar, com diferente fundamentação de facto e de direito, a sentença recorrida. * Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma: I. A comissão de serviço implica o exercício temporário de funções diversas da categoria do trabalhador, com o regresso às funções anteriormente desempenhadas logo que finda a comissão. II. Cessada a comissão de serviço cessa igualmente o direito ao estatuto que correspondia à função desempenhada, nomeadamente remuneratório, retornando o trabalhador à categoria base e ao correspondente estatuto, podendo tal implicar descida na valorização relativa das funções e no montante da retribuição. III. A diferença de valor de remuneração que veio a ocorrer teve como parâmetro inicial um direito precário, transitório ou temporário por natureza, que não convoca o princípio da irredutibilidade da remuneração, nem por aí é suscetível de serem afetados os direitos à carreira, à remuneração e à previdência. * Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e, com diferente fundamentação de facto e de direito, confirmar a sentença recorrida. Custas pela associada do Autor. Registe e Notifique. (Ana Celeste Carvalho - Relatora) (Pedro Marchão Marques) (Alda Nunes)
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