Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:114/13.7BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:07/13/2023
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRS.
DUPLA TRIBUTAÇÃO INTERNACIONAL
Sumário:A demonstração da efectividade do imposto pago no estrangeiro, por meio de prova idóneo, associada às cláusulas da Convenção sobre Dupla Tributação vigente, deve ser atendida pela Administração Fiscal
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO
I- Relatório
A Fazenda Pública interpõe o presente recurso jurisdicional contra a sentença proferida a fls. 746 e ss, (numeração no processo em formato digital-sitaf), datada de 15 de Fevereiro de 2017, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por W ……………… e D …………………………. contra o acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa das liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e respectivos juros compensatórios do ano de 2007, com o nº ………………225, e do ano de 2008, com o nº …………..960, no valor total de valor total de €131.734,48.
Nas alegações de recurso de fls. de fls. 773 e ss. (numeração do processo em formato digital - sitaf), a recorrente formula as conclusões seguintes:
1. A douta sentença recorrida decidiu pela procedência do pedido fundamentando que a eliminação da dupla tributação prevista nas convenções efectua-se através da isenção ou da dedução dos impostos dos contribuintes pagos no país da fonte.
2. Com o sempre devido respeito, não pode a FP concordar com a decisão.
3. Na alínea B) do probatório, dá-se como provado que o impugnante declarou no Anexo J da declaração de IRS rendimentos auferidos e imposto pago no estrangeiro sem ter entregue os documentos emitidos pela autoridade fiscal do Estado da fonte dos rendimentos, in casu, os EUA.
4. Nas alíneas G) e H) da referida componente da sentença ora sob recurso, considera provada a emissão das declarações individuais de rendimentos dos EUA para 2007 e 2008, em nome dos impugnantes, das quais constam dividendos provenientes de parceria S. C……………….
5. Finalmente, na alínea L) do probatório considerou-se provado que o impugnante é accionista de uma empresa estabelecida nos EUA, tratada para efeitos fiscais como uma sociedade transparente.
6. A douta decisão ancora-se na aplicação dos art.º 7º e 10º da Convenção para evitar a dupla tributação celebrada entre Portugal e os EUA.
7. Concluiu a Mmª Juiz a quo que os dividendos foram declarados nos EUA pelo que o método a utilizar é o da dedução dos dividendos.
8. A FP entende que as declarações correspondentes aos formulários 1040 nos EUA não correspondem a uma liquidação de imposto, pois embora tenham sido declarados, não foi provada a tributação dos dividendos por não existir documento emitido pela autoridade fiscal americana.
9. A sociedade americana não é sujeito passivo, mas sim o sócio. Nesta conformidade, deve o mesmo englobar a totalidade dos seus rendimentos no território nacional.
10. Não tendo sido demonstrada, em nossa opinião, a tributação no estado da fonte.
11. Assim, a inclusão de tais rendimentos na liquidação de IRS não constitui qualquer erro ou injustiça grave ou notória justificativa da anulação das impugnadas.
12. Tendo decidido no sentido da procedência do pedido, incorreu o julgador da 1ª instância em erro de julgamento e violou as disposições aplicáveis da Convenção e o art.º 78º da LGT.
Pede a revogação da sentença e a sua substituição por decisão que julgue improcedente a impugnação.
X
A fls. 780 e ss. (numeração do processo em formato digital - sitaf), os recorridos alegam e formulam as seguintes conclusões: «
a) Os impugnantes, aqui recorridos, W ……………… e mulher D …………………, vieram impugnar as liquidações de IRS nº ………………225 referente ao ano de 2007 e …………………960 relativa ao ano de 2008 e respetivos juros compensatórios, no valor total de €131.734,48, no seguimento de indeferimento tácito de pedido de revisão da matéria tributável.
b) Invocaram o erro sobre a qualificação e quantificação dos rendimentos do Impugnante W…………….. e o vício de violação da lei por falta de decisão no prazo do art. 57º nº1 da LGT e vício de falta de fundamentação.
c) Alegaram, em síntese, que são residentes em Portugal e aqui entregaram as suas declarações de rendimentos obtidos quer em território nacional, quer no estrangeiro, no caso do Impugnante, e que os dividendos recebidos de sociedades situadas nos EUA não podem ser integrados nos rendimentos daquele, pois falta um dos requisitos que o art. 6º do CIRC e art.20º nº 2 do CIRS estipulam, ou seja, a existência de sede ou direção efetiva da sociedade em território português, pois aquelas sociedades têm a sua sede nos EUA e aí pagam os seus impostos.
d) Terminaram pedindo a procedência da impugnação e a anulação das liquidações de IRS.
e) Decidiu a Meritíssima Juiz a quo, e bem, no entender dos recorridos, pela procedência da Impugnação, e pela anulação, em consequência, as referidas liquidações, considerando, no essencial que, tendo o Impugnante declarado os rendimentos (dividendos da sociedade S. C……………..) auferidos nos EUA e os Impugnantes pagaram os devidos impostos nos EUA, devem os mesmos ser tidos em conta no cálculo da matéria tributável devendo ser aplicado ao caso concreto o n.º 2 do art.º10º da referida Convenção.
f) Inconformada com a decisão, veio a Fazenda Pública recorrer, alegando em síntese que incorreu o julgador da 1ª instância em erro de julgamento e violou as disposições aplicáveis da Convenção e o art.º 78º da LGT.
g) Contudo, não lhe assiste razão, porquanto a eliminação da dupla tributação através das convenções existentes para o efeito, é feita no país da residência, através da isenção, neste país, dos rendimentos que o outro país tenha direito de tributar, ou através de dedução, na tributação sobre o rendimento global, dos impostos pagos pelo contribuinte no país da fonte dos rendimentos a cuja tributação tenha direito.
h) Resulta da documentação junta aos autos e aceite pela Administração fiscal, que o Impugnante recebeu dividendos da sociedade S. C……………… com sede nos EUA, como sócio da mesma, durante os anos de 2007 e 2008.
i) Mais resulta que tais dividendos foram declarados fiscalmente nos EUA.
j) Portanto, no caso temos uma situação de tributação em que Portugal é o país de residência do titular do direito aos dividendos.
k) Segundo a convenção celebrada em causa, o método adoptado para efeitos de eliminar a dupla tributação é o da dedução dos dividendos distribuídos por sociedades participadas, ou seja, Portugal deduz uma percentagem dos dividendos incluídos na base tributável da entidade que os recebe.
l) Tendo ficado provado que o impugnante declarou tais rendimentos nos EUA, estando englobados nos seus rendimentos de 2007 e 2008 – Formulário 1040 e Tabela E - confrontando com os documentos de fls. 49 a 54 e 262 dos autos – e os Impugnantes pagaram os devidos impostos nos EUA (cfr. a alínea M) dos factos provados e a tabela constante do ofício referido na alínea J constante do p.a.), devem os mesmos ser tidos em conta, no cálculo da matéria tributável, devendo ser aplicada à situação dos autos o art. 10º, nº 2 da Convenção referida.
m) O regime da transparência fiscal prevista no artigo 20.º CIRS, o qual faz remissão para o artigo 6.º CIRC, ambos à data dos factos, apenas é aplicável a sociedades com sede ou direção efetiva em território português, o que não sucede no caso em concreto.
n) Pelo que os rendimentos não deverão ser considerados.
o) Não sendo possível a imputação nos termos dos artigos alegados pela FP, deverão ser desconsiderados os rendimentos gerados nos EUA pelas S-C………………..
p) Do exposto resulta evidente a procedência do alegado pelos impugnantes, pelo que, andou bem a douta sentença recorrida ao decidir pela anulação das liquidações postas em causa.
q) Donde resulta igualmente que, em contrário do alegado pela recorrente, não foi violada qualquer disposição legal.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal notificado para o efeito, emitiu parecer no sentido da concessão de provimento ao recurso.
X
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
X
II- Fundamentação
1.De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: «
A) Os Impugnantes residem em Portugal (por acordo);
B) O Impugnante declarou no Anexo J das declarações Mod. 2 de IRS relativas aos anos de 2007 e 2008, rendimentos auferidos e imposto pago no estrangeiro sem ter entregue os documentos emitidos pela autoridade fiscal do Estado fonte dos rendimentos (cfr. p.a.);
C) Através das Ordens de Serviço nº OI201101717/8/9, emitidas em 31/10/2011 foi determinada ação de inspeção de âmbito parcial aos exercícios de 2007, 2008 e 2009, tendo sido iniciada em 02/11/2011 e concluída em 08/11/2011 (cfr. fls. 154 do p.a.);
D) Em 07/12/2011 foi feito relatório de inspeção tributária que aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 180 a 197 dos autos);
E) Em 12/12/2011, foi aposto, sobre o relatório de inspeção tributária, o despacho emitido pelo Diretor de Finanças de Faro nos seguintes termos: “Concordo. Proceda-se como se propõe.” (cfr. fls. 55 a 57 dos autos);
F) Em 19/12/2011, foram os Impugnantes notificados do relatório referido na alínea anterior, na pessoa do seu representante fiscal – D …………….. - através do ofício nº 11774 de 15/12/2011 (cfr. fls. 179 dos autos);
G) Foi emitida “Declaração Individual de Rendimentos dos EUA de 2007” – “Formulário 1040” onde consta, nomeadamente, como “rendimento bruto: USD:1.053,161, sendo que USD:428,092 são provenientes de dividendos e USD:439,378 são provenientes de parceria S C ………….. (cfr. fls. 268);
H) Foi emitida “Declaração Individual de Rendimentos dos EUA de 2008” – “Formulário 1040” onde consta, nomeadamente, como “rendimento bruto: USD:818,889 sendo que USD:307,464 são provenientes de dividendos e USD:290,001 são provenientes de parceria S C………………….. (cfr. fls. 266 e 271);
I) Em 16/07/2012, os Impugnantes apresentaram pedido de revisão da matéria tributável que foi objeto de despacho de indeferimento, em 08/03/2013, tendo, os Impugnantes, sido notificados dessa decisão na pessoa do seu Ilustre Mandatário através dos ofícios nº4896 e 4899 de 21/03/2013 (cfr. p.a.);
J) Foram emitidas liquidações de IRS referentes aos anos de 2007 e 2008 no valor total de €131.734,48 (cfr. fls. 22 a 32 do p.a.);
K) Em 28/01/2013 foi enviado pela Embaixada dos Estados Unidos da América ofício a responder às questões colocadas pela Administração fiscal portuguesa (cfr. p.a.);
L) O Impugnante é acionista de uma empresa estabelecida nos EUA – a S. C…………….e é tratada, para efeitos fiscais como entidade transparente (cfr. p.a.);
M) Os Impugnantes pagaram os impostos devidos nos EUA referentes a 2007 e 2008 – cfr. tabela constante do ofício referido na alínea J constante do p.a.».
X
«III-2. Factualidade não provada// Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afetar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.»
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«Fundamentação do julgamento// Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na documentação junta com os articulados, no processo administrativo cuja genuinidade não foi posta em causa.»
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Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
N) Do ofício referido na alínea K), consta, designadamente, o seguinte:
6. W……………………….. é ou foi um sócio de uma empresa estabelecida sob a jurisdição legal dos Estados Unidos?
Resposta: O Sr. L………………é um accionista de uma S C…………………..(em termos da legislação em vigor nos Internal Revenue Services- é uma empresa com estrutura especial de negócios; consegue evitar a dupla tributação e não se encontra sujeita a tributação sobre os lucros da empresa em sede de IRC. Todos os prejuízos /lucros são directamente imputados aos seus accionistas/sócios. Estes entregam as suas declarações de rendimentos em sede de IRS em seu próprio nome e pagam imposto sobre o rendimento na parte dos lucros da empresa que lhes é imputado pela quota que lhes é atribuída pela empresa. - Embora sejam tributados sobre todos os lucros obtidos durante o ano quer tenham sido ou não distribuídos.
7. Durante os anos de 2007 e 2008 o contribuinte recebeu rendimentos desta S C………….?
Resposta: Uma vez que esta S C…………….. é tratada como uma entidade transparente ou entidade flow-through o contribuinte reporta a sua quota de rendimentos à S C………………, (nota de tradução: uma organização que distribui regularmente uma parte do seu rendimento aos seus investidores. Este método utilizado geralmente, só os investidores são tributados sobre este rendimento, não a entidade. Uma S C……………….. e uma sociedade anónima são ambas exemplos de uma entidade flow-through),
8. Em caso afirmativo, quais os montantes e quem lhe pagou?
Resposta: Ver resposta à questão 7 e ver a tabela inclusa no final desta resposta
9. Pagou alguns impostos sobre este rendimento?
Resposta: Isto estava incluído na sua sujeição global a imposto e os impostos foram pagos sobre a totalidade. Estes diversos montantes do indivíduo são impostos baseados nas taxas de imposto interno dos Estados Unidos. Este indivíduo tem direito a um crédito fiscal estrangeiro para todos os impostos pagos sobre rendimentos de fonte americana nos termos do artigo 25 do tratado fiscal entre Portugal e os Estados Unidos.
10. Em caso afirmativo, quanto?
Resposta: ver resposta à questão 9
11. Como se classifica este rendimento nos Estados Unidos?

Resposta: receitas extraordinárias
12. Qual é a natureza legal da empresa S?
Resposta: Por favor veja: http://www.irs.qov/Business/Small-Business-&-Self- Emploved/S-Corporations
13. É idêntica a uma empresa comercial?
Resposta: ver respostas às questões 7 e 12
14. Está sujeita a transparência fiscal, com os seus lucros /perdas imputados aos seus sócios e tributados como seu rendimento?
Resposta: ver respostas às questões 7 e 12
15. Se existir outras informações relevantes para clarificar o estatuto fiscal destes contribuintes e a função de empresas S, gostaríamos de receber também informação sobre este assunto.
Resposta: Não.
A nossa base de dados mostra-nos os rendimentos que se seguem e os impostos para os anos de 2007 e 2008 (todos os valores são em dólares):

    Rendimento
    2008
    2007
    Receita extraordinária (K-1) de S- Corp.
    290,001
    190,596
    salários
    175,612
    81,019
    Juros pagos/tributados
    47,292
    38,781
    Dividendos ordinários
    307,484
    38,781
    Dividendos habilitados
    102,885
    Dividendos
    389,305
    Acções e obrigações
    307,686
    imposto pago
    183,035
    224,109

O) Do relatório inspectivo consta o seguinte:

- DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
1. O sujeito passivo W……………………, NIF ……………………….., declarou no Anexo J das declarações modelo 3 de IRS, relativas aos anos de 2007 e 2008, rendimentos auferidos e imposto pago no estrangeiro, tendo beneficiado de um crédito de imposto por dupla tributação internacional. Conforme instruções de preenchimento deste Anexo, estava obrigado à entrega dos documentos emitidos pela autoridade fiscal do Estado da fonte dos rendimentos, o que não se verificou. // Foi então notificado para apresentar os comprovativos em falta, bem como para informar sobre os motivos da não entrega da declaração de rendimentos em Portugal, para o ano de 2009 (Anexo 1 - Ofício nº 15700 de 11.08.2011). // Em 2010.08.16, deu entrada nos serviços, ofício do sujeito passivo, a informar que já solicitou os elementos aos seus contabilistas, bem como a prorrogação do prazo para a sua entrega (Anexo 2). // Em 2010.09.28, o sujeito passivo procedeu à entrega dos elementos solicitados e enviou, ainda, a declaração de rendimentos final dos Estados Unidos da América, para o ano de 2009 (Anexo 3 - ofício do sujeito passivo). // Reunidos os elementos do sujeito passivo, procedeu a Direcção de Serviços das Relações Internacionais à sua análise, dando origem ao ofício nº 15600 de 2011.08.05 (Anexo 4), com o propósito de notificar o sujeito passivo (nº1 do artigo 128º do C.I.R.S. e nº4 do artigo 59º da Lei Geral Tributária - L.G.T.) para, no prazo de 15 dias, apresentar declarações de rendimentos de substituição, em Portugal, que contemplassem a totalidade dos rendimentos obtidos a título universal, para os anos de 2007, 2008 e 2009. E ainda: para apresentar documentos de prova, passados ou autenticados pelas autoridades do Canadá e do Reino-Unido, ou outras, que façam prova inequívoca dos rendimentos auferidos e imposto suportado naqueles Estados; justificar o motivo de entrega de uma declaração de substituição em 2011.01.13 para o ano de 2009; remeter esclarecimentos/documentos que conduzam ao correcto apuramento da sua situação fiscal. // Alertou-se, também, que o “não cumprimento desta notificação ou o seu cumprimento incompleto ou extemporâneo, terá como consequência uma proposta de correcções às suas liquidações de imposto dos anos fiscais de 2007 a 2009, sendo-lhe considerada a totalidade do rendimento auferido no estrangeiro e sendo-lhe retirado o crédito de imposto de que tenha beneficiado, relativamente aos Estados de que não foi apresentada qualquer prova documental válida (Canadá, Reino Unido, outros)". // A esta notificação, a empresa E………………., S.A., representante do sujeito passivo (sem envio de prova/ mandato para o efeito), enviou fax em 2011.08.18, a solicitar a prorrogação do prazo para o envio da documentação (Anexo 5). // Foi-lhe concedido prorrogação do prazo por 30 dias para cumprimento da notificação (Anexo 6). // Via e-mail, em 2011.09.19, a empresa E………………, S.A. veio informar que iria fazer seguir por correio documentação de suporte às declarações de IRS de 2007 e 2009 (Anexo 7) e em relação a 2008 aguardava resposta. Segundo a Direcção de Serviços das Relações Internacionais, não foi recebido por correio qualquer documentação. // Em 2011.09.20 (via e-mail), o representante do sujeito passivo veio apresentar explicação (na língua inglesa) para a substituição da declaração de IRS/2009, que se consubstancia num documento assinado por contabilista dos EUA, que refere (apenas) que o montante de 225.526 USD pago pela empresa W ………………………..E………….. não deveria ser incluído em Portugal, uma vez que de acordo com a legislação interna dos EUA não deve ser sujeito. Somos de parecer que sendo o sujeito passivo residente em Portugal, devem ser declarados em Portugal os rendimentos auferidos a título universal. // Assim, concluiu a Direcção de Serviços das Relações Internacionais que não foi dada resposta cabal à notificação efectuada em 2011.08.05, nem enviado qualquer novo documento válido emitido por autoridade fiscal comprovativo dos rendimentos auferidos e impostos suportados, a título final e total, nos Estados da fonte dos rendimentos, apenas se podendo analisar os que já constavam do processo como válidos.
11- Conclui-se, então, que iremos proceder à alteração das declarações de rendimentos do sujeito passivo, para os anos de 2007, 2008 e 2009, tendo em conta os seguintes aspectos: // - As liquidações finais válidas dos EUA; // As explicações que possam ser consideradas pertinentes; // Os elementos que já constavam das declarações de rendimentos entregues em Portugal pelo sujeito passivo; // A residência do sujeito passivo: consta como residente em Portugal, no cadastro da DGCI, e tal foi inclusivamente declarado pelo próprio à Administração Fiscal dos EUA (Anexo 8 - Form 1040 e Form 1116); // A dedução do montante de crédito de imposto por dupla tributação internacional que os EUA já concederam, uma vez que não pode haver duplo benefício de crédito de imposto por dupla tributação internacional (Anexo 9 - Form 1040, linhas 54, 55 ou 56); // A conversão dos valores constantes das declarações de rendimentos e liquidações finais dos EUA, tendo em conta os valores de referência da taxa de câmbio, de fim de período, publicada pelo Banco de Portugal, para os anos de 2007, 2008 e 2009, respectivamente de 1.4721, 1.3917 e 1.4406. // Alerta-se, ainda, para a seguinte situação; os sujeitos passivos procederam à entrega de declarações de substituição, Mod. 3 - IRS, para os exercícios de 2008 e 2009. Face aos valores declarados, as referidas declarações encontram-se no nosso sistema informático no estado ‘declaração não liquidável', pelo que as correcções agora propostas têm por base as declarações já entregues e que se encontram liquidadas. // Seguem-se as correcções a cada um dos exercícios».

X
2.2. De Direito.
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa.
A sentença julgou procedente a impugnação, determinando a anulação da liquidação de IRS de 2007. Para assim proceder, ponderou, em síntese, «que o Impugnante recebeu dividendos da sociedade S C…………………. com sede nos EUA, como sócio da mesma, durante os anos de 2007 e 2008. Mais resulta que tais dividendos foram declarados fiscalmente nos EUA. // Portanto, no caso temos uma situação de tributação em que Portugal é o país de residência do titular do direito aos dividendos. // Segundo a Convenção celebrada em causa, o método adotado para efeitos de eliminar a dupla tributação é o da dedução dos dividendos distribuídos por sociedades participadas, ou seja, Portugal deduz uma percentagem dos dividendos incluídos na base tributável da entidade que os recebe. // Tendo ficado provado que o Impugnante, declarou tais rendimentos nos EUA, estando englobados nos seus rendimentos de 2007 e 2008 - formulário 1040 e Tabela E – confrontando com os documentos de fls. 49 a 54 e 262 dos autos – e os Impugnantes pagaram os devidos impostos nos EUA, devem os mesmos ser tidos em conta, no cálculo da matéria tributável, pelo que procede o alegado pelos Impugnantes, devendo ser aplicada à situação dos autos, o art. 10º nº 2 da Convenção referida».
2.2.2. A recorrente censura o veredicto que fez vencimento na instância, assacando-lhe erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa.
Apreciação. O cerne do dissídio reside em saber se assiste ao recorrido o crédito por dupla tributação invocado, nas suas declarações de rendimentos dos exercícios de 2007 e 2008. Está em causa a aplicação da norma do disposto no artigo 10.º/2, da Convenção celebrada entre Portugal e os Estados Unidos da América, com vista a evitar a dupla tributação [CDT](1). A norma citada estabelece que «[o]s dividendos pagos por uma sociedade residente de um Estado Contratante a um residente do outro Estado podem ser tributados nesse outro Estado» (1). «Esses dividendos podem, no entanto, ser igualmente tributados no Estado Contratante de que é residente a sociedade que paga os dividendos e de acordo com a legislação desse Estado, mas, se o beneficiário efectivo dos dividendos for residente do outro Estado Contratante, o imposto assim estabelecido não exceder 15% do montante bruto dos dividendos» (2).
Determina o artigo 15.º/1, do CIRS, «[s]endo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território». Nos termos do artigo 81.º/1(2), do CIRS, «[o]s titulares de rendimentos das diferentes categorias obtidos no estrangeiro têm direito a um crédito de imposto por dupla tributação internacional, dedutível até à concorrência da parte da colecta proporcional a esses rendimentos líquidos, considerados nos termos da alínea b) do n.º 6 do artigo 22.º, que corresponderá à menor das seguintes importâncias: // a) Imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro; // b) Fracção da colecta do IRS, calculada antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados». A eliminação da dupla tributação jurídica internacional faz-se segundo «o método da imputação normal, que opera mediante a concessão, aos titulares de rendimentos das diferentes categorias obtidos fora do território português (…), de um crédito relativo ao imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro por tais rendimentos» (3). Estes devem ser «considerados pelas respectivas importâncias ilíquidas dos impostos sobre o rendimento pagos no estrangeiro» (artigo 22.º/6, CIRS). «À colecta apurada é deduzido o crédito de imposto por dupla tributação jurídica internacional, correspondente ao imposto pago no estrangeiro em relação aos rendimentos aí obtidos, mas sujeito a um limite máximo» (4).
A este propósito, constitui jurisprudência assente a de que sendo o ónus da prova dos factos constitutivos do direito sobre quem o invoque (artigo 74º da LGT e 342º do C.C), é sobre o contribuinte que recai «a obrigação de demonstrar o direito a deduzir à colecta o montante relativo à dupla tributação internacional, ou seja, o imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro (artigo 81º do CIRS)»; e que se não existir «qualquer prova que ateste o pagamento do imposto, não pode a Administração Tributária substituir-se ao contribuinte, diligenciando pela obtenção ab initio de prova que lhe competia a ele trazer para a declaração de rendimentos». (5)
Mais se refere que a prova dos factos alegados pelo contribuinte está sujeita aos princípios da atipicidade dos meios de prova e da livre apreciação da prova (artigos 87.º/1 do CPA, antigo, e 410.º e 411.º do CPC). De harmonia com tais princípios, na falta de prescrição legal em sentido contrário, a prova dos factos alegados realiza-se através da valoração dos meios de prova disponíveis no processo, realizada através do cotejo livre e fundamentado dos mesmos.
No caso em exame, do probatório resulta o seguinte:
i) Os Impugnantes residem em Portugal (alínea A).
ii) O Impugnante declarou no Anexo J das declarações Mod. 2 de IRS relativas aos anos de 2007 e 2008, rendimentos auferidos e imposto pago no estrangeiro sem ter entregue os documentos emitidos pela autoridade fiscal do Estado fonte dos rendimentos (alínea B).
iii) Foi emitida “Declaração Individual de Rendimentos dos EUA de 2007” – “Formulário 1040” onde consta, nomeadamente, como “rendimento bruto: USD:1.053,161, sendo que USD:428,092 são provenientes de dividendos e USD:439,378 são provenientes de parceria S C……………. (alínea G).
iv) Foi emitida “Declaração Individual de Rendimentos dos EUA de 2008” – “Formulário 1040” onde consta, nomeadamente, como “rendimento bruto: USD:818,889 sendo que USD:307,464 são provenientes de dividendos e USD:290,001 são provenientes de parceria S C……………….(alínea H).
v) Em 16/07/2012, os Impugnantes apresentaram pedido de revisão da matéria tributável que foi objeto de despacho de indeferimento, em 08/03/2013, tendo, os Impugnantes, sido notificados dessa decisão na pessoa do seu Ilustre Mandatário através dos ofícios nº4896 e 4899 de 21/03/2013 (alínea I).
vi) Em 28/01/2013 foi enviado pela Embaixada dos Estados Unidos da América ofício a responder às questões colocadas pela Administração fiscal portuguesa (alínea K).
vii) O Impugnante é acionista de uma empresa estabelecida nos EUA – a S. C………… e é tratada, para efeitos fiscais como entidade transparente (alínea L).
viii) Os Impugnantes pagaram os impostos devidos nos EUA referentes a 2007 e 2008 (alínea M).
Em face dos elementos coligidos no probatório, é de concluir que o recorrido demonstrou o rendimento percebido, bem como os montantes do imposto retido e pago no Estado da fonte do rendimento. Elementos cuja veracidade não é posta em causa pela recorrente, pelo que outra solução não existe que não seja aplicar os normativos da Convenção sobre dupla tributação (artigo 10.º/2, da CDT), reconhecendo e dispensando de tributação o rendimento declarado no Estado da fonte. Recorde-se que, nos termos do artigo 10.º/2, da CDT, «[e]sses dividendos podem, no entanto, ser igualmente tributados no Estado Contratante de que é residente a sociedade que paga os dividendos e de acordo com a legislação desse Estado, mas, se o beneficiário efectivo dos dividendos for residente do outro Estado Contratante, o imposto assim estabelecido não exceder 15% do montante bruto dos dividendos»; nos termos do artigo 25.º/3/a), da CDT, «[n]o caso de Portugal: // Quando um residente de Portugal obtiver rendimentos que, de acordo com o disposto nesta Convenção, possam se tributados nos Estados Unidos (com base noutro critério que não seja o da cidadania), Portugal permitirá a dedução do imposto sobre o rendimento desse residente de uma importância igual ao imposto de rendimento pago no Estados Unidos. A importância deduzida não poderá, contudo, exceder a fracção do imposto sobre o rendimento calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que podem ser tributados nos Estados Unidos». A correcção em exame afronta directamente os normativos referidos.
Ao julgar no sentido referido, a sentença sob recurso não merece censura, devendo ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
X
Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)

(1.ª Adjunta – Lurdes Toscano)

(2.º Adjunto – Vital Lopes)
(1) Aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 39/95; ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 73/95.Publocada no Diário da República I-A, n.º 236, de 12/10/1995.
(2) “Crédito de imposto por dupla tributação internacional”.
(3) Paula Rosado Pereira, Manual de IRS, Almedina, 2019, p. 305.
(4) Paula Rosado Pereira, op. e loc. citados.
(5) Acórdão do TCAN, de 22-02-2012, P. 00434/09.5BEMDL.