Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1043/08.1BELRS |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 07/11/2019 |
Relator: | MÁRIO REBELO |
Descritores: | CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO. TRIBUTAÇÃO DAS SOCIEDADES IRREGULARES. |
Sumário: | 1. Nos termos art. 46º/1 LGT, na redação aplicável, o prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo do seu início, caso a duração da inspeção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação. 2. A referência à duração da inspeção externa significa que o procedimento de inspeção só se considera finalizado com a notificação do relatório final de inspeção, como resulta do art.º 62º/1 do RCPIT (na redação aplicável). 3. A conclusão dos actos de inspeção tributária não se confunde com conclusão do procedimento de inspeção externa, terminando aqueles na data da notificação da nota de diligência emitida pelo funcionário incumbido do procedimento, e esta com a notificação do relatório como deixámos referido. 4. A nota distintiva entre o regime da compropriedade e a sociedade irregular é que nesta perspetiva-se uma atividade comum exercida pelos sócios, visando a criação de uma utilidade nova, orientada para a obtenção de lucro, contrariamente ao que ocorre na compropriedade em que os consortes se limitam a usufruir dos simples frutos propiciados pelo património comum, com o mesmo espírito em que se move o proprietário singular. 5. As “sociedades irregulares” — comerciais quanto ao objecto, ainda que sem forma legal, e portanto destituídas de personalidade jurídica em face ao direito comum, mas com personalidade e capacidade tributárias (artigos 15.° e 16.°, n.° 3 da Lei Geral Tributária e 3.° n.° 1 e 2 do CPPT) —, não se confundem com as sociedades civis não constituídas sob forma comercial, estando sujeitas ao regime geral de IRC pelo lucro obtido com a actividade comercial exercida (artigos 2.°, n.º 1, alínea b) e n.° 2 e 3.°, n.° 1, alínea a) e n.° 4 do código do IRC) e não ao regime da transparência fiscal |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: RECORRENTES: E…., A…. e A…... RECORRIDA: Fazenda Pública. OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pela MMº juiz do TT de Lisboa que decidiu julgar improcedente a impugnação judicial deduzida por H….. e A…. (na qualidade de herdeira de J…..), contra o indeferimento da reclamação graciosa que apresentaram com vista à anulação dos actos tributários de liquidação adicional de IRS e juros compensatórios do exercício de 2001, CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES DE E……: «A - A douta sentença ora em crise sufraga a violação de lei formal e substancial cometida pela Administração Tributária: B - Violou-se o instituto da caducidade ao não se considerar o prazo contado a partir do fim da visita de inspeção. C - Violou-se a lei material ao considerar como ativa uma sociedade irregular que tinha a atividade cessada. D - Violou-se a lei material ao se fazer a aplicação dos métodos indiretos em sede de IRC e não de IRS. E - Violou-se a lei comunitária ao desconsiderar sem norma habilitante a declaração de cessação da sociedade irregular pelas partes porque se obrigou os contribuintes a exercer a atividade em sociedade contra sua vontade. F - Agravou-se a tributação do contribuinte ao não fazer a tributação em sede de IRC (Taxa proporcional) mas sim em sede de IRS (Taxa progressiva). Termos em que a douta sentença deverá ser substituída por outra que, analise estes aspectos e declare a anulabilidade das liquidações efectuadas». CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES DE A……: «A) A sociedade irregular enquanto sujeito passivo de IRC é a parte principal do processo de fixação de lucro tributável por métodos indiretos pelo que tinha de ter sido notificada da decisão do processo de revisão instaurado nos temos do artº9l da LGT; B) Os sócios enquanto responsáveis principais ou subsidiários pelo pagamento do imposto liquidado também deveriam ter sido notificados da decisão proferida pela administração tributária no âmbito do processo de revisão solicitado pela sociedade J…. e H…..; C) A falta de notificação à sociedade e aos sócios da decisão proferida pela administração tributária no âmbito do pedido de revisão nos termos do artº9l - e seguintes da LGT constitui uma nulidade processual que afeta todo o processado posterior, nomeadamente as liquidações efetuadas em nome dos sócios e em particular a liquidação de IRS do exercício de 2001 a H….; d) A falta de notificação da decisão do processo de revisão aberto nos termos do artº9l - e seguintes da LGT à sociedade e aos sócios implica a ineficácia desse ato porque nos termos do artº36º, nº l conjugado com os artigos 60° e 61° do CIRC os atos que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados; e) A ineficácia do ato impõe a ineficácia da fixação do lucro tributável e a consequente impossibilidade de liquidar o referido imposto aos impugnantes; F) A falta de notificação da decisão do processo de revisão é geradora de nulidade das liquidações efetuadas aos impugnantes, termos em que devem ser anuladas as liquidações de IRS com os números 2006/77…, 2006/ 1…., 2006/7…. e 2006/13….; g) A nulidade da liquidação é de conhecimento oficioso, pelo que o Tribunal deve decretá-la independentemente de arguição pela ora impugnante; h) A ação inspetiva ao exercício de 2001, em sede de IRS, externa e de caráter parcial, visando H.....é nula por fraude à lei, porquanto não foram realizados atos de inspeção externa e a mesma foi solicitada para evitar o decurso do prazo de caducidade de liquidação do imposto aos sócios da sociedade irregular J..... e H....... i) A fraude à lei determina a nulidade da ação inspetiva instaurada contra H…… através da Ordem de Serviços nº OI2005…… ; j) A nulidade da ação inspetiva instaurada a H….. determina a nulidade de todos os atos subsequentes, nomeadamente das liquidações de IRS com os números 2006/77…., 2006/13…., 2006/7…. e 2006…... k) A nulidade das liquidações é de conhecimento oficioso pelo que deverão ser anuladas as liquidações de IRS referentes ao ano de 2001. 1) Caso assim não se entenda, porque não foram realizados atos de inspeção externa e porque a ação inspetiva baseia as suas conclusões no relatório da ação inspetiva efetuada à sociedade, deverá a mesma ser desqualificada como inspeção externa e qualificada como inspeção interna; m) Qualificando-se ação inspetiva ao exercício de 2001, em sede de IRS, como interna, esta não tem efeito suspensivo nos termos do artº46- da LGT, o que determina a caducidade do direito de liquidar o imposto a 31/12/2005, ou seja, quando H.....foi notificado da liquidação do imposto o direito de liquidação tinha caducado; n) As sociedades irregulares não estão sujeitas ao regime da transparência fiscal constante do artº6 nº l alínea b) do CIRC; o) A interpretação efetuada pelo Tribunal a quo é uma interpretação analógica do arts 6º n.º l alínea a) do CIRC que viola o nº4 do artº l1º da LGT; p) A interpretação efetuada pelo Tribunal a quo, sendo uma interpretação analógica do artº6º nº l alínea a) do CIRC, é inconstitucional por violação da reserva de lei da Assembleia da República consagrado no artº l03°, nº 2 da CRP; q) Uma interpretação correta do preceituado nos artigos 2º nº l , alínea b) e 2 e artº6º nº 1, alínea a) determinavam a inaplicabilidade do regime de transparência fiscal e a anulação das liquidações de IRS relativas ao exercício de 2001 com os números 2006/77…., 2006….. , 2006/7….. e 2006/13….. r) Existiu erro no apuramento do lucro tributável da sociedade irregular J…. e H….. porque foi mal calculado o custo de construção do prédio e da área de construção do mesmo, com relevância no apuramento do lucro tributável; s) A sociedade irregular foi tributada no regime geral, quando por efeito 46°-A, nº l do CIRC, na redação que lhe foi dada pela Lei n.s 30-G/2000 de 29/12, a sociedade estava no regime de tributação simplificado; t) O correto enquadramento da sociedade determinava que esta fosse enquadrada no regime simplificado de tributação e que os seus rendimentos fossem tributados à taxa de 20% reduzindo o lucro tributável para os € 918.785,80; u) Deve ser aditada a matéria dada como provada uma alínea V. com o seguinte teor: Na ação inspetiva realizada ao exercício de 2001 nos termos da alínea L. não foram praticados atos de inspeção externa. v) Deve ser aditada a matéria dada como provada uma alínea X. com o seguinte teor: O relatório e as conclusões constantes da alínea O., resultantes da ação inspetiva realizada nos termos da alínea L., tiveram por base o relatório e as conclusões da ação inspetiva à sociedade constituída por J…. e H…. constante da alínea B. dos factos dados como provados. x) Nestes termos e nos demais de direito deverá ser anulada a decisão recorrida e substituída por outra que declare procedente a impugnação apresentada pela Recorrente. Nestes termos e nos demais de direito requer-se a Vossas Excelências que admita m, por provado, o presente recurso e anulem a decisão recorrida e a substituam por outra que declare procedente a impugnação e anule a liquidações efetuadas pela administração tributária, ao exercício de 2001, em sede de IRS». CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES DE A…..: «A) A sociedade irregular enquanto sujeito passivo de IRC é a parte principal do processo de fixação de lucro tributável por métodos indirectos pelo que tinha de ter sido notificada da decisão do processo de revisão instaurado nos termos do artº9lº da LGT; B) Os sócios enquanto responsáveis principais ou subsidiários pelo pagamento do imposto liquidado também deveriam ter sido notificados da decisão proferida pela administração tributária no âmbito do processo de revisão solicitado pela sociedade J…. e H….; C) A falta de notificação à sociedade e aos sócios da decisão proferida pela administração tributária no âmbito do pedido de revisão nos termos do artº91º e seguintes da LGT constitui uma nulidade processual que afecta todo o processado posterior, nomeadamente as liquidações efectuadas em nome dos sócios e em particular a liquidação de IRS do exercício de 2001 a H....... D) A falta de notificação da decisão do processo de revisão aberto nos termos do artº91º e seguintes da LGT à sociedade e aos sócios implica a ineficácia desse acto porque nos termos do art.º36° nº l conjugado com os artigos 60° e 61° do CIRC os actos que afectem os direito e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados; E) A ineficácia do acto impõe a ineficácia da fixação do lucro tributável e a consequente impossibilidade de liquidar o referido imposto aos impugnantes; F) A falta de notificação da decisão do processo de revisão é geradora de nulidade das liquidações efectuadas aos impugnantes, termos em que devem ser anuladas as liquidações de IRS com os números 2006/7….., 2006/1….., 2006/7… e 2006/1….; G) A nulidade da liquidação é do conhecimento oficioso, pelo que o Tribunal deve decretá-la independentemente de arguição pela ora impugnante; H) A acção inspectiva ao exercício de 2001, em sede de IRS, externa e de carácter parcial, visando H….. é nula por fraude à lei, porquanto não foram realizados actos de inspecção externa e a mesma foi solicitada para evitar o decurso do prazo de caducidade de liquidação do imposto aos sócios da sociedade irregular J….. e H....... I) A fraude à lei determina a nulidade da acção inspectiva instaurada contra H…. através da Ordem de Serviço nºOI20……; J) A nulidade da acção inspectiva instaurada a H…. determina a nulidade de todos os actos subsequentes, nomeadamente das liquidações de IRS com os números 2006/7…., 20061….. 2006/7…. e 2006/1…. ; K) A nulidade das liquidações é do conhecimento oficioso pelo que deverão ser anuladas as liquidações de IRS referentes ao ano de 2001. L) As ordens de serviço n°9…., 95…. e 9…., para os exercícios respectivamente de 2000, 2001 e 2002, todas datadas de 27/09/2004, foram emitidas para a sociedade irregular J….. e H…. com o NIPC 901 …..e não para qualquer outra sociedade irregular. M) Resultando evidente da documentação abundante junta aos autos que a sociedade com o NIPC 901 ….não é parte interveniente no processo de aquisição, construção e comercialização do imóvel em causa, fácil é de concluir que o procedimento de aplicação de métodos indirectos tem na sua base um erro insanável sobre os pressupostos; N) Erro esse que gera a nulidade de todo o procedimento por ofensa aos mais elementares princípios do nosso ordenamento jurídico. O) Igualmente se comprova que o procedimento inspectivo ocorreu sem suporte de ordem de serviços e em desrespeito, por excesso, dos limites fixados nas ordens de serviço n.º 95…., 95…. e 95….. P) Caso assim não se entenda, porque não foram realizados actos de inspecção externa e porque a acção inspectiva baseia as suas conclusões no relatório da acção inspectiva efectuada à sociedade, deverá a mesma ser desqualificada como inspecção externa e qualificada como inspecção interna; Q) Qualificando-se acção inspectiva ao exercício de 2001, em sede de IRS, como interna, esta não tem efeito suspensivo nos termos do art.º46º da LGT, o que determina a caducidade do direito de liquidar o imposto a 31/12/2005, ou seja, quando H.....foi notificado da liquidação do imposto o direito de liquidação tinha caducado; R) As sociedades irregulares não estão sujeitas ao regime da transparência fiscal constante do artº6º nº l alínea b) do CIRC; S) A interpretação efectuada pelo Tribunal a quo é uma interpretação analógica do artº 6º nºl alínea a) do CIRC que viola o n°4 do artº llº da LGT; T) A interpretação efectuada pelo Tribunal a quo, sendo uma interpretação analógica do artº 6° nº l alínea a) do IRC, é inconstitucional por violação da reserva de lei da Assembleia da República consagrado no art.º 103º nº2 da CRP; U) Uma interpretação correcta do preceituado nos artigos 2º nº l. Alínea b) e 2 e artº6º nº l, alínea a) determinavam a inaplicabilidade do regime de transparência fiscal e a anulação das liquidações de IRS relativas ao exercício de 2001 com os números 2006/77…., 20061…, 2006/7…. e 2006/13…..; V) Existiu um erro no apuramento do lucro tributável da sociedade irregular J….e H…. porque foi mal calculado o custo de construção do prédio e da área de construção do mesmo, com relevância no apuramento do lucro tributável; W) A sociedade irregular foi tributada no regime geral, quando por efeito 46º-A, nº l do CIRC, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº30-G/2000 de 29112, a sociedade estava no regime de tributação simplificado; X) O correcto enquadramento da sociedade determinava que esta fosse enquadrada no regime simplificado de tributação e que os seus rendimentos fossem tributados à taxa de 20% reduzindo o lucro tributável para os € 918.785,80; Y) Deve ser aditada a matéria dada como provada uma alínea V, com o seguinte teor: Na acção inspectiva realizada ao exercício de 2001 nos termos da alínea L. não foram praticados actos de inspecção externa. Z) Deve ser aditada a matéria dada como provada uma alínea X. com o seguinte teor: O relatório e as conclusões constantes da alínea O., resultantes da acção inspectiva realizada nos termos da alínea L., tiveram por base o relatório e as conclusões da acção inspectiva à sociedade constituída por J…. e H…… constante da alínea B. dos factos dados como provados. AA) Nestes termos e nos demais de direito deverá ser anulada a decisão recorrida e substituída por outra que declare procedente a impugnação apresentada pela Recorrente. Nestes termos e nos demais de direito requer-se a Vossas Excelências que admitam, por provado, o presente recurso e anulem a decisão recorrida e a substituam por outra que declare procedente a impugnação e anule as liquidações efectuadas pela administração tributária, ao exercício de 2001, em sede de IRS». CONTRA ALEGAÇÕES. A Fazenda Pública não apresentou contra alegações. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso. II QUESTÕES A APRECIAR. O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou, de facto e de direito, ao julgar improcedente a impugnação deduzida contra as liquidações de IRS imputadas aos Impugnantes, por via da aplicação do regime da transparência fiscal. III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO. A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação: A. Com base na Ordem de Serviço n.º 9…, de 27/09/2004, foi realizada ação inspetiva ao exercício de 2001, em sede de IRC, externa e de caráter geral, visando a sociedade constituída por J…. e H….. (fls. 325/454 do processo administrativo tributário apenso). B. Do respetivo relatório, elaborado em 12/10/2005 e com despacho concordante do Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa de 20/10/2005, consta o seguinte: “Em 14 de dezembro de 1993, por escritura pública de compra e venda, J…. e H…. adquirem em partes iguais uma moradia sita na Av.ª A….., ……em Lisboa - Anexo 13; • Ainda em 1993 foi demolida a moradia adquirida em compropriedade e iniciada a construção de um prédio composto por 45 frações, o qual viria a ser inscrito na matriz predial urbana em 2001, ano em que iniciam a sua comercialização. Na ação desenvolvida pelos Srs. J….. e H…. (Compra da moradia e posterior demolição, construção de novo prédio e sua comercialização) está bem patente o objetivo de obtenção de lucro bem como a existência de um contrato de sociedade (art°980° do Código Civil); • Em 2001 foi apresentada no Serviço de Finanças de Lisboa 10 uma declaração de início de atividade da sociedade irregular ‘J…. e H…. com o NIPC 901….., para o exercício da atividade de Construção de Edifícios - CAE 4….., com sede na Av A…..-ALoja em Lisboa, tendo sido declarada como data de início de atividade a de 01/10/1993; • Em 2002 foi entregue, no mesmo Serviço de Finanças, a declaração de cessação de atividade com efeitos a 01/10/1993; • A sociedade não apresentou qualquer declaração de rendimentos ou declaração anual desde o início da sua atividade, conforme obriga o disposto no art° 109° e nos termos do art°112° e 113°, todos do CIRC. • Na comercialização das fracções do citado prédio, iniciada em 2001, intervêm como vendedores os dois membros da sociedade – J….. (NIF 129…..) e H…. (NIF 126…..); • Os valores de venda das fracções declarados nas escrituras públicas de venda realizadas em 2001, são em muito inferiores aos valores reais das transações, facto este comprovado através de regularizações efetuadas no decurso do ano de 2005 pelos compradores de 7 das 21 frações vendidas em 2001 e que resultaram em liquidações adicionais de SISA para os mesmos (ver ponto V do presente relatório). Dos factos atrás expostos constata-se que: a) Não foi possível aceder à contabilidade da sociedade J…. e H…. (NIPC 901….), por incumprimento da notificação para exibição da mesma, o que se traduziu na recusa de exibição de escrita. b) A sociedade reportou a cessação de atividade à data de início da mesma, pretendendo fazer crer que a sociedade não teria desenvolvido qualquer atividade. c) A venda de 21 frações referentes ao prédio sito na Av.ª A….. n°…. em Lisboa no exercício de 2001, onde atuaram como vendedores os dois membros da sociedade J…… (NIF 129….) e H….. (NIF 126…..), pelas razões de facto e de direito já expostas, devem ser imputadas para efeitos de tributação em sede de Impostos sobre o Rendimento (IR) à sociedade. Desta forma, e dada a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria coletável pelos factos apontados anteriormente, no que respeita ao exercício de 2001, o apuramento da mesma será efetuado com recurso à aplicação de métodos indiretos de acordo com o art°52° do CIRC e alínea b) dos art°87° e art°88°, ambos da LGT. (…) [V]erifica-se que os valores declarados como sendo os de Venda/Compra nas escrituras públicas, é em muito inferior ao valor real das transações efetuadas. Determinação dos Preços de Venda Analisados os preços de venda reais, auto denunciados por 7 dos 21 compradores de frações durante o exercício de 2001 - Quadro 3, é possível determinar o preço de venda das restantes 14 frações, já que é possível verificar que para frações iguais (Esquerdos, direitos ou frentes ), o valor de venda é sempre acrescido de 500 000$00,ou seja, 2 493,99€ (…) Desta forma, encontram-se determinados os valores de venda das frações alienadas em 2001 - Quadro 4
Determinação dos preços de Custo (…) Presume-se que os custos financeiros suportados pela sociedade ‘J….. H….. representam cerca de 15% do valor de venda das frações. (…) Para o exercício de 2001, considerar-se-á que os custos financeiros ascenderam a 689 089,35€ (4 593 929,03€ * 15%). (…) A matéria coletável apurada no montante de 2 277 515,30€ será imputada aos sócios, em partes iguais, de acordo com o art°5° n° 1 a) e n°3 do CIRC, uma vez que estamos perante uma sociedade civil não constituída sob a forma comercial, vulgarmente designada para efeitos fiscais como sociedade irregular” (fls. 325/454 do PAT anexo). C. No dia 28/11/2005, J…. e H….. requereram a revisão da matéria tributável, por referência ao relatório indicado no ponto B (fls. 98/116 do PAT apenso). D. O debate entre os três peritos ocorreu no dia 22/12/2005, sem unanimidade, concordando o perito independente e o da Fazenda Pública com a fixação do lucro tributável decorrente da ação inspetiva (fls. 98/116 do PAT apenso). E. Por decisão do Diretor de Finanças da Direção de Finanças de Lisboa, datada de 23/12/2005, foram mantidos os valores fixados pelos serviços de inspeção tributária (fls. 98/116 do PAT apenso). F. No dia 16/11/2005, o Diretor Geral dos Impostos autorizou a realização de novo procedimento de inspeção externo a J….. (fls. 79/84 do PAT apenso). G. Com base na Ordem de Serviço n.º OI20…., de 23/11/2005, foi realizada ação inspetiva ao exercício de 2001, em sede de IRS, externa e de caráter parcial, visando o agregado familiar constituído por J…. e A…… (fls. 251/265 do PAT apenso). H. No dia 28/11/2005, A…. recebeu a carta aviso relativa a esta ação inspetiva (fls. 250 do PAT apenso). I. No dia 06/12/2005, A….. recebeu cópia da Ordem de Serviço n.º OI200…. (fls. 249 do PAT apenso). J. Do respetivo relatório, elaborado em 19/04/2006 e com despacho concordante do Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa de 03/05/2006, consta o seguinte: “O sujeito passivo procedeu ao apuramento/tributação em sede de IRS (Categoria B - Anexo C ), dos rendimentos obtidos na sequência da construção/venda de um prédio sito na Av. A…, nº…. em Lisboa, tendo obtido um resultado liquido de 255.678,47€ em 2001 e de 21.478,18€ em 2002. Estes rendimentos obtidos em conjunto por si e pelo seu sócio H….., com o qual constituiu a sociedade irregular ‘J…. e H…. encontram -se sujeitos a IRC, nos termos do artº2° nº2 do CIRC, devendo a matéria coletável da sociedade ser imputada a cada um dos sócios, em partes iguais, nos termos do artº6° nº1 a) e nº3 do CIRC. A matéria coletável imputada a J….. ascende em 2001 a 1.138.757,65€ e em 2002 a 279.083,00€, e constitui rendimento líquido da Categoria B, nos termos do artº2ºnº 1 e 2 do CIRS. Assim, propõe-se a alteração do resultado líquido da Categoria B do ano de 2001 de 255.678,47€ para 1.138.757,65€ e do ano de 2002 de 21.478,18€ para 279.083,00€, nos termos do artº65° nº4 do CIRS” (fls. 251/265 do PAT apenso). K. No dia 12/05/2006, A….. recebeu cópia do relatório da ação inspetiva (fls. 317 do PAT apenso). L. Com base na Ordem de Serviço n.º OI200…., de 23/11/2005, foi realizada ação inspetiva ao exercício de 2001, em sede de IRS, externa e de caráter parcial, visando H…. (fls. 120/135 do PAT apenso). M. No dia 29/11/2005,H....... recebeu a carta aviso relativa a esta ação inspetiva (fls. 68 do PAT apenso). N. No dia 06/12/2005,H....... recebeu cópia da Ordem de Serviço n.º OI2005…. (fls. 69 do PAT apenso). O. Do respetivo relatório, elaborado em 19/04/2006 e com despacho concordante do Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa de 03/05/2006, consta o seguinte: “O sujeito passivo procedeu ao apuramento/tributação em sede de IRS ( Categoria B - Anexo C ), dos rendimentos obtidos na sequência da construção/venda de um prédio sito na Av. A….., em Lisboa, tendo obtido um resultado liquido de 283 137,21€ em 2001 e de 269 309,82€ em 2002. Estes rendimentos obtidos em conjunto por si e pelo seu sócio J…., com o qual constituiu a sociedade irregular ‘J…. e H.......’ encontram -se sujeitos a IRC, nos termos do artº 2° nº2 do CIRC, devendo a matéria coletável da sociedade ser imputada a cada um dos sócios, em partes iguais, nos termos do artº6° nº1 a) e nº3 do CIRC. A matéria coletável imputada a H....... ascende em 2001 a 1.138.757,65€ e em 2002 a 279.083,00€, e constitui rendimento líquido da Categoria B, nos termos do artº20ºn° 1 e 2 do CIRS. Assim, propõe-se a alteração do resultado líquido da Categoria Bdo ano de 2001 de 283.137,21€ para 1.138.757,65€ e do ano de 2002 de 269.309,82€ para 279.083,00€, nos termos do artº65° nº4 do CIRS” (fls. 120/135 do PAT apenso). P. No dia 12/05/2006,H....... recebeu cópia do relatório da ação inspetiva (fls. 180 do PAT apenso). Q. Na sequência da ação inspetiva indicada no ponto G, foi emitido o ato de liquidação de IRS do exercício de 2001 e respetivos juros compensatórios com o n.º 2006…., e a compensação n.º 200…., que deram lugar à demonstração de acerto de contas n.º 2006…., e dos quais resultou o valor a pagar por J…. e A…. de € 529.339,61 (quinhentos e vinte e nove mil, trezentos e trinta e nove euros e sessenta e um cêntimos), com data limite de pagamento no dia 28/06/2006 (fls. 322/324 do PAT apenso). R. No dia 25/05/2006, A…. recebeu cópia dos atos referidos no ponto antecedente (fls. 321 do PAT apenso). S. Na sequência da ação inspetiva indicada no ponto L, foi emitido o ato de liquidação de IRS do exercício de 2001 e respetivos juros compensatórios com o n.º 2006…, e a compensação n.º 2006…., que deram lugar à demonstração de acerto de contas n.º 20060…., e dos quais resultou o valor a pagar por H....... de € 406.965,88 (quatrocentos e seis mil, novecentos e sessenta e cinco euros e oitenta e oito cêntimos), com data limite de pagamento no dia 28/06/2006 (fls. 186/188 do PAT apenso). T. No dia 26/05/2006,H....... recebeu cópia dos atos referidos no ponto antecedente (fls. 185 do PAT apenso). U. H....... e A…. apresentaram reclamação graciosa dos atos de liquidação supra identificados, a qual foi indeferida por decisão do Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa, datada de 26/05/2008 (Doc. 1 da petição inicial). Factos Não Provados Não se provaram quaisquer outros factos, com relevância para a decisão da causa. Motivação da decisão de facto A decisão da matéria de facto efetuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório. IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO. Sintetizando as conclusões das alegações dos três recorrentes, enunciamos o conjunto das questões que nos são submetidas neste recurso e que, a nosso ver, são as seguintes: 1- Falta de notificação da decisão proferida no procedimento de revisão, à sociedade e aos sócios o que gera ineficácia desse acto e constitui fundamento de nulidade das liquidações de IRS, nulidade que é do conhecimento oficioso (Conclusões a) a g) das alegações de A…. e A….). 2- A ação de inspeção ao exercício de 2001, em sede de IRS, externa e de caráter parcial visando H.....é nula por fraude à lei porquanto não foram realizados atos de inspeção externa, assim arrastando a nulidade das liquidações de IRS, o que também do conhecimento oficioso (Conclusões h) a k das alegações de A….e A…..). 3- As ordens de serviço n.ºs 95…., e 95…. foram emitidas para a sociedade irregular J…. e H…. e não qualquer outra. Mas esta sociedade não é interveniente no processo de aquisição construção e comercialização do imóvel em causa, pelo que o procedimento de aplicação de métodos indiretos tem na sua base um erro insanável sobre os pressupostos, gerador de nulidade de todo o procedimento (Conclusões L a N das alegações de A…). 4- Caso assim se não entenda, porque a ação inspetiva se baseia no relatório da ação inspetiva à sociedade, deverá a mesma ser qualificada como inspeção interna, a qual não tem qualquer efeito suspensivo, o que determina a caducidade do direito de liquidar o imposto a 31/12/2005 (Conclusão m) das alegações de A…. P) e Q) A…..). 5- Violou-se o instituto da caducidade ao não se considerar o prazo contado a partir do fim da visita da inspeção (Conclusão B) das alegações de E…..), 6- Violou-se a lei material ao considerar-se como activa uma sociedade irregular que tinha a atividade cessada (Conclusão C) das alegações de E…..); 7- Violou-se a lei material ao aplicar métodos indiretos em sede de IRC e não de IRS (Conclusão D) das alegações de E…..); 8- Violou-se a lei comunitária ao desconsiderar sem norma habilitante a declaração de cessação da sociedade irregular pelas partes porque se obrigou os contribuintes a exercer atividade em sociedade contra sua vontade (Conclusão E) das alegações de E…..); 9- É inconstitucional a interpretação analógica do art. 6º/1ª) do CIRC, sendo inaplicável o regime de transparência fiscal (Conclusões n) a q) das alegações de A…. e R) a U) das alegações de A….. e F) das alegações de E….); 10- Existiu erro no apuramento do lucro tributável porque foi mal calculado o custo de construção e a área de construção do mesmo (Conclusões r das alegações de A….. e V) das alegações de A); 11- A sociedade irregular foi tributada pelo regime geral quando deveria ter sido tributada pelo regime simplificado (Conclusões s) a t) das alegações de A....... e W) e X) das alegações de A.......) 12- Devem ser aditados factos à matéria provada (Conclusões s) a t) das alegações de A....... e Y) a Z) das alegações de A.......): Na ação inspetiva realizada ao exercício de 2001 nos termos da alínea L. não foram praticados actos de inspeção externa; O relatório e as conclusões constantes da alínea O., resultantes da ação inspetiva realizada nos termos da alínea L., tiveram por base o relatório e as conclusões da ação inspetiva à sociedade constituída por J.......e H....... constante da alínea B. dos factos dados como provados. Do conjunto dos factos supra referidos, os relativos aos n.ºs 1, 2, 4, 11 e 12 são questões e factos novos que não foram alegados na petição inicial, nem por qualquer forma, abordados na sentença sob censura, que não contém, por isso mesmo qualquer pronúncia sobre eles. Vale isto por dizer que se está, assim, perante o que tecnicamente se designa por “questões novas”. Ora, como é jurisprudência uniforme, os recursos são específicos meios de impugnação de decisões judiciais, que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova (Cf. entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 27.06.2012, recurso 218/12, de 25.01.2012, recurso 12/12, de 23.02.2012, recurso 1153/11, de 11.05.2011, recurso 4/11, de 1.07.2009, recurso 590/09, 04.12.2008, rec. 840/08, de 30.10.08, rec.112/07, de 2.06.2004, recurso 47978 (Pleno), de 29.11.1995, recurso 19369 e do Supremo Tribunal de Justiça, recurso 259/06.0TBMAC.E1.S1, todos in www.dgsi.pt.). As questões suscitadas também não são do conhecimento oficioso. Os Recorrentes referem várias vezes a nulidade das liquidações em consequência da violação de preceitos legais, mas a verdade é que os vícios que atribuem ao acto de liquidação impugnado se reconduzem a vícios de violação de lei, gerador da respectiva anulabilidade, e não da sua nulidade, que constitui uma forma de invalidade excepcional (sendo a sanção regra da invalidade dos actos a sua anulabilidade – artigo 135º e 136º do CPA – atual art.º 163º). Não se vislumbra ofensa do conteúdo essencial de direitos fundamentais (artigo 133.º, n.º 2, alínea d) do CPA) ou qualquer outro motivo determinante de nulidade do acto de liquidação (artigo 133.º do CPA – atual art.º 161º). Como se consignou no Acórdão do STA de 28 de Novembro de 2012, rec. n.º 1038/12, citando JORGE LOPES DE SOUSA, (…) embora a liquidação ilegal de qualquer imposto acarrete uma ofensa do direito de propriedade, que é um dos direitos fundamentais, já que estes serão todos os englobados na Parte I da CRP, que tem a epígrafe «Direitos e deveres fundamentais», pelo que tal qualificação é de estender aos direitos e deveres económicos, sociais e culturais, incluídos no Título III dessa Parte I, em que se engloba o direito de propriedade privada (art. 62°), «nem todas as liquidações ilegais se podem considerar feridas de nulidade, já que a lei expressamente prevê para elas a sanção da anulabilidade, como se depreende do facto de prever um prazo para a sua impugnação (art. 102° deste Código). Não é qualquer ofensa de um direito fundamental que a alínea d) do nº 2 do art. 133° do Código do Procedimento Administrativo, mas apenas as ofensas do seu conteúdo essencial. Uma ofensa deste tipo só ocorrerá quando perante ela o direito fundamental afectado fique sem expressão prática apreciável, o que não é o caso de uma liquidação ilegal, que apenas atinge limitadamente o direito de propriedade dos seus destinatários. Por outro lado, entre as violações possíveis de direitos por normas tributárias, a sanção mais grave da nulidade, por razões de proporcionalidade, terá de ser reservada para os actos que representam mais graves violações dos direitos tributários.» Consequentemente não se toma conhecimento da matéria em apreço. Prosseguindo, vejamos agora a questão da caducidade do direito à liquidação supra enunciado na questão 5. Na douta petição inicial, os Impugnantes alegaram, entre o mais, caducidade do direito à liquidação, com fundamento em que sendo o imposto de 2001, e tendo-se suspendido o prazo de caducidade em relação ao Impugnante C…. (e habilitados) em 6/12/2005 e concluído em 24/2/2006, o prazo de caducidade cumpriu-se em 22/3/2003, pelo que a notificação da liquidação efetuada em 25/5/2006 ocorreu depois de expirado o direito de liquidar. E quanto à Impugnante B…., a suspensão iniciou-se em 6/12/2005, a inspeção terminou no dia 24/4/2006, o prazo de caducidade expirou em 20/5/2006, pelo que a notificação da liquidação em 26/5/2006 ocorreu depois de expirado o direito da AT à liquidação. A reflexão do MMº juiz sobre a matéria foi a seguinte: “A caducidade do direito à liquidação constitui um vício gerador de ilegalidade do ato, na medida em que consubstancia a prática de ato tributário ferido de vício de violação de lei, gerando esse vício mera anulabilidade do ato (cf. ac. do STA de 25/01/2012, proc. n.º 1018/11, disponível em http://www. dgsi.pt/jsta.nsf). Como tal, esta ilegalidade pode ser conhecida em sede de impugnação judicial, atendendo a que nos termos do artigo 99.º do CPPT constitui fundamento de impugnação “qualquer ilegalidade”. Como se assinala em aresto do TCAS de 27/09/2011 (proc. n.º 02970/09, disponível em http://www. dgsi.pt/tca.nsf), “pode definir-se a caducidade como o instituto através do qual os direitos que, por força da lei ou de convenção das partes, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo seu não exercício durante o mesmo prazo. O instituto da caducidade tem por fundamentos vetores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere. A necessária brevidade da relação jurídica que comporta um direito caducável determina que o não exercício do mesmo no prazo legal ou convencionalmente definido acarreta a sua competente extinção. Refira-se, ainda, que a caducidade, determinando a extinção do direito e da correspondente vinculação sem mais, não gera o consequente aparecimento de uma obrigação natural, contrariamente ao que acontece com o instituto da prescrição.” No caso em análise, estão em causa dois atos tributários distintos de liquidação adicional de IRS do exercício de 2001. Os quais foram notificados a A…. no dia 25/05/2006, e a H....... no dia 26/05/2006. O regime da caducidade do direito de liquidação aplicável é o previsto no artigo 45.º, n.º 1, da LGT, que prevê caducar o direito de liquidar os tributos se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro. Tratando-se de IRS, a Administração Tributária pode exercer o direito à liquidação no prazo de 4 anos contados a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, uma vez que estamos perante um imposto periódico, conforme resulta do n.º 4 do citado artigo 45.º da LGT. Assim, no caso vertente, a contagem do prazo de caducidade do direito à liquidação iniciou-se no dia 31/12/2001, e terminaria, em princípio, no dia 31/12/2005. Contudo, haverá que relevar os períodos de tempo em que decorreram as acções inspetivas, em face do disposto no artigo 46.º, n.º 1, da LGT, de acordo com o qual “[o] prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo desde o seu início, caso a duração da inspeção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação.” Assim, o prazo de caducidade suspendeu-se com a notificação aos contribuintes, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa. Conforme resulta do probatório, no dia 28/11/2005, relativamente a A......., e no dia 29/11/2005, relativamente a H......., os impugnantes receberam carta aviso dando conta da realização do procedimento de inspeção. Sendo que, no dia 06/12/2005, tanto A....... como H....... receberam cópias das Ordens de Serviço que determinaram a realização das sobreditas ações inspetivas. Aquelas primeiras notificações assentaram no disposto no artigo 49.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT), o qual, sob a epígrafe ‘notificação prévia para procedimento de inspeção’, prevê que “[o] procedimento externo de inspeção deve ser notificado ao sujeito passivo ou obrigado tributário com uma antecedência mínima de cinco dias relativamente ao seu início.” Ao passo que as segundas assentaram nos termos do artigo 51.º do mesmo diploma legal, referente à data do início do procedimento de inspeção, segundo o qual “[d]a ordem de serviço ou do despacho que determinou o procedimento de inspeção será, no início deste, entregue uma cópia ao sujeito passivo ou obrigado tributário, exceto nas situações previstas no n.º 6 do artigo 46.º” (n.º 1), e “[o] sujeito passivo ou obrigado tributário ou o seu representante deve assinar a ordem de serviço indicando a data da notificação, a qual, para todos os efeitos, determina o início do procedimento externo de inspeção” (n.º 2). Donde se verifica ser inequívoco que o início da inspeção se reporta ao dia 06/12/2005, coincidindo com o início da suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação, faltando então 25 dias para este se completar. Já o termo da inspeção, e bem assim o termo da suspensão do prazo de caducidade, ocorre com a notificação ao contribuinte do teor do relatório de inspeção, em conformidade com o disposto no artigo 62.º do RCPIT, de acordo com o qual, “[p]ara conclusão do procedimento é elaborado um relatório final com vista à identificação e sistematização dos factos detetados e sua qualificação jurídico-tributária” (n.º 1), sendo que “[o] relatório referido no número anterior deve ser notificado ao contribuinte por carta registada nos 10 dias posteriores ao termo do prazo referido no n.º 4 do artigo 60.º, considerando-se concluído o procedimento na data da notificação.” Conforme decorre do probatório, as cópias dos relatórios das ações inspetivas foram recebidas pelos impugnantes no dia 12/05/2006, reiniciando-se em seguida a contagem dos prazos de caducidade, que, como já assinalado, estavam a 25 dias do seu termo. Também já aqui se assinalou que as notificações dos atos de liquidação de IRS ocorreram, quanto a A....... no dia 25/05/2006, e quanto a H....... no dia 26/05/2006. O que vale por dizer que, à data destas notificações, não se havia ainda completado o prazo de caducidade de quatro anos, quer quanto a A......., quer quanto a H........ Pelo que improcede o que nesta sede vem invocado pelos impugnantes.” Os Recorrentes discordam do decidido. Entendem que a caducidade se suspende com a notificação da ordem de serviço ou despacho que determina a inspeção e termina com a notificação da nota de diligência emitida pelos serviços de inspeção, e não com a notificação do relatório de inspeção como decidiu o MMº juiz. Sem razão, porém. Com efeito, nos termos do art. 46º/1 LGT, na redação vigente à data da inspeção, O prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo do seu início, caso a duração da inspeção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação (sublinhado nosso). Ora, a referência à duração da inspeção externa significa que o procedimento de inspeção só se considera finalizado com a notificação do relatório final de inspeção, como resulta do art.º 62º/1 do RCPIT (na redação aplicável). Sendo de notar que a conclusão dos actos de inspeção tributária não se confundem com conclusão do procedimento de inspeção externa, terminando aqueles na data da notificação da nota de diligência emitida pelo funcionário incumbido do procedimento, esta com a notificação do relatório como deixámos referido, carecendo que qualquer apoio legal a tese de que o prazo se conta “a partir do fim da visita da inspeção”. Por conseguinte, a reflexão do MMº juiz está certa improcedendo, nesta parte, as conclusões de recurso. Nas questões n.º 6 e 8 advoga-se que a sociedade irregular, designada por J.......e H......., foi constituída em 22/6/2001, mas desconsiderou-se que em 2002 foi declarada, também retroativamente a 1993, a cessação de actividade e que o contribuinte regularizou a situação tributária declarando o rendimento e coletando-se em IRS – rendimentos empresariais. Apesar destes factos, a AT considerou a sociedade irregular como estando em actividade e presumiu o rendimento da mesma. A sentença adota a posição da AT sem analisar se a sociedade irregular estava em actividade e quais as consequências da declaração de vontade que cessou a atividade em 1993. Ao não relevar a declaração das partes (cessação da actividade) a AT violou a lei que o obriga a aceitar como válidas as declarações das partes e obrigou-se os contribuintes a exercer atividade em sociedade contra a sua vontade. Sobre o assunto, o MMº juiz escreveu o seguinte: “No que respeita ao procedimento de aplicação de métodos indiretos, teria na sua base um erro sobre os pressupostos, a existência de uma alegada sociedade irregular, pois as atividades foram exercidas por J.......e H......., em regime de compropriedade, como empresários em nome individual, pelo que inexistindo tal sociedade irregular, não podia ser facultada a contabilidade ou as escrituras pedidas. Por outro lado, sustentam inexistir suporte legal para o recurso à transparência fiscal, pois a sociedade irregular não se enquadra no respetivo regime legal. Conforme consta da matéria de facto dada como assente, em sede de ação inspetiva foi possível apurar que no ano de 1993 J.......e H....... adquiriram em partes iguais uma moradia, que de seguida demoliram e iniciaram a construção de um prédio composto por 45 frações, o qual viria a ser inscrito na matriz predial urbana no ano 2001. Procederam então à respetiva comercialização, com o evidente objetivo de obtenção de lucro. Como se observa em acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24/09/2009 (proc. n.º 2825/08.0TJLSB.L1-2, disponível em http://www.dgsi.pt/jtca.nsf), “o atual Código das Sociedades Comerciais não nos dá um conceito de sociedade irregular, deixando à doutrina e à jurisprudência a tarefa de fixar os seus momentos essenciais e respetivos contornos. (…) Em termos gerais poderá entender-se, na esteira de Menezes Cordeiro, que com a locução sociedades irregulares se abrangem “as sociedades comerciais que, por falha ou incompleitude genética, não tenham personalidade coletiva”, caindo por isso na previsão dos art.ºs 36º ou 52º, do Código das Sociedades Comerciais. Contrariamente ao que sucedia no domínio pleno do Código Comercial, em que globalmente se consideravam não existentes as sociedades com um fim comercial que se não constituíssem nos termos e segundo os trâmites indicados naquele Diploma, ficando todos quantos nela contrataram obrigados pelos respetivos atos pessoal, ilimitada e solidariamente – artigo 107º - optou agora o novo Código das Sociedades Comerciais por considerar na pré-vida da sociedade comercial uma evolução faseada até à sua constituição plena, sendo certo que enquanto não for cumprido tal iter estaremos perante uma sociedade imperfeita, uma sociedade comercial de facto.” Outrossim, tal como se assinala em aresto do Supremo Tribunal Administrativo de 23/10/2002 (proc. n.º 0676/02, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf), já trazido à colação pela Fazenda Pública e pelo Ministério Público, “os traços que distinguem as situações de compropriedade e de sociedade são os que vêm esta como algo de dinâmico, onde existe uma atividade comum exercida pelos sócios, visando a criação de uma utilidade nova, orientada para a obtenção de lucro, contrariamente ao que ocorre na compropriedade em que os consortes se limitam a usufruir dos simples frutos propiciados pelo património comum, com o mesmo espírito em que se move o proprietário singular.” Donde, em face da factualidade apurada em sede de ação inspetiva, não se vê como negar as apontadas características à situação em análise nos presentes autos. Como tal, estando caracterizada a atuação dos dois sujeitos como uma sociedade irregular, que se traduziu na venda de um prédio, sua demolição, construção e comercialização das frações, afigura-se de todo irrelevante que a respetiva inscrição no RNPC apenas se tenha concretizado no ano de 2002. Ou que os membros daquela sociedade tenham comunicado o início e a cessação da atividade da sociedade apenas por reporte ao ano de 1993”. Em face do que deixámos transcrito, e que sufragamos, parece claro que a RECORRENTE não tem razão. O MMº juiz analisou a questão de saber se a sociedade (irregular) estava ou não em actividade, não obstante ter sido declarada a sua cessação reportada à mesma data em que também foi iniciada, 1/10/1993. Esta sobreposição de datas de início e cessação visava demonstrar que a sociedade não desenvolveu qualquer actividade e que o produto da venda das frações deveria ser imputada aos dois membros da sociedade, aparentemente em regime de compropriedade. Mas como bem esclareceu o MMº juiz, a nota distintiva entre a compropriedade e a sociedade irregular é que nesta perspetiva-se “...uma atividade comum exercida pelos sócios, visando a criação de uma utilidade nova, orientada para a obtenção de lucro, contrariamente ao que ocorre na compropriedade em que os consortes se limitam a usufruir dos simples frutos propiciados pelo património comum, com o mesmo espírito em que se move o proprietário singular"(1). Assim, tendo em conta o objectivo assumido de criação de uma utilidade nova, orientada para a obtenção de lucro, está definida e caracterizada a atuação dos dois sujeitos como uma sociedade irregular, que se traduziu na venda de um prédio, sua demolição, construção e comercialização das frações, sendo de todo irrelevante que a respetiva inscrição no RNPC apenas se tenha concretizado no ano de 2002, ou que os membros daquela sociedade tenham comunicado o início e a cessação da atividade da sociedade apenas por reporte ao ano de 1993, como bem decidiu o MMº juiz. Por outro lado, debruçando-nos agora sobre a questão 7, estando em presença de uma actividade societária de natureza comercial, regida pelas normas de incidência do CIRC, resulta claro que a avaliação indireta e o cálculo da matéria tributável não poderia deixar de ser a respeitante a este imposto e não a relativa a IRS. E não é que a AT tenha “obrigado” (questão 8ª) os contribuintes a exercer atividade em sociedade contra a sua vontade. O que se passa é que os contribuintes unidos num objectivo comum de exercer uma actividade comercial visando o lucro, constituem, legalmente, uma sociedade irregular e não dois sujeitos operando em regime de compropriedade. Quanto ao erro no apuramento do lucro tributável, defendem que foi mal calculado o custo de construção e a área de construção do mesmo (questão 10ª). O MMº juiz apreciou assim a questão: “De facto, em sede de ação inspetiva foi apurado o lucro tributável da sociedade irregular e seguidamente foram presumidos os custos financeiros suportados pela sociedade ‘J.......e H.......’ em cerca de 15% do valor de venda das frações. Assim, considerou-se que os custos financeiros ascenderam a 689 089,35€ (4.593.929,03 x 15%), apurando-se a matéria coletável no montante de € 2.277.515,30.” Tendo em conta os valores apurados relativos aos custos, resulta claro que os RECORRENTES não têm razão quando alegam a existência de erro neste cálculo, tanto mais que, nos termos do art. 74º/3 da LGT, cabia-lhes a demonstração do excesso na quantificação, que não lograram provar. Caraterizada a actuação societária dos dois sujeitos como uma sociedade irregular, e definidas as restantes matérias relativas à caducidade, quantificação e validade do acto tributário, vejamos a caraterização da respetiva tributação, debruçando-nos agora sobre a questão 9ª. Os IMPUGNANTES alegaram que não poderia ser efetuada a tributação pelo regime da transparência fiscal, precisamente com base na letra do art.º 6º/a) CIRC. O MMº juiz decidiu a questão nos seguintes termos: “No que respeita à aplicação do regime da transparência fiscal, haverá que atentar no que previa à data dos factos o artigo 6.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC), na redação da Lei 30-G/2000, de 29 de dezembro: “1 - É imputada aos sócios, integrando-se, nos termos da legislação que for aplicável, no seu rendimento tributável para efeitos de IRS ou IRC, consoante o caso, a matéria coletável, determinada nos termos deste Código, das sociedades a seguir indicadas, com sede ou direção efetiva em território português, ainda que não tenha havido distribuição de lucros: a) Sociedades civis não constituídas sob forma comercial; b) Sociedades de profissionais; c) Sociedades de simples administração de bens, cuja maioria do capital social pertença, direta ou indiretamente, durante mais de 183 dias do exercício social, a um grupo familiar ou cujo capital social pertença, em qualquer dia do exercício social, a um número de sócios não superior a cinco e nenhum deles seja pessoa coletiva de direito público. 2 - Os lucros ou prejuízos do exercício, apurados nos termos deste Código, dos agrupamentos complementares de empresas e dos agrupamentos europeus de interesse económico, com sede ou direção efetiva em território português, que se constituam e funcionem nos termos legais são também imputáveis diretamente aos respetivos membros, integrando-se no seu rendimento tributável. 3 - A imputação a que se referem os números anteriores é feita aos sócios ou membros nos termos que resultarem do ato constitutivo das entidades aí mencionadas ou, na falta de elementos, em partes iguais. 4 - Para efeitos do disposto no nº 1, considera-se: a) Sociedade de profissionais a constituída para o exercício de uma atividade profissional constante da lista de atividades a que alude o artigo 141º do Código do IRS, em que todos os sócios sejam profissionais dessa atividade b) Sociedade de simples administração de bens a sociedade que limita a sua atividade à administração de bens ou valores mantidos como reserva ou para fruição ou à compra de prédios para habitação dos seus sócios, bem como aquela que conjuntamente exerça outras atividades e cujos proveitos relativos a esses bens, valores ou prédios atinjam, na média dos últimos três anos, mais de 50% da média, durante o mesmo período, da totalidade dos seus proveitos; c) Grupo familiar o constituído por pessoas unidas por vínculo conjugal ou de adoção e bem assim de parentesco ou afinidade na linha reta ou colateral até ao 4º grau, inclusive.” Como resulta do relatório da ação inspetiva, foi enquadrada a atuação da sociedade no âmbito do n.º 1, al. a), deste artigo. Ora, não obstante a sociedade irregular configurar uma sociedade comercial de facto, é indesmentível que a mesma não se encontra constituída nos termos e de acordo com os trâmites indicados na lei. Logo, tratando-se de uma sociedade que não se mostra constituída sob forma comercial, afigura-se correta a aplicação ao caso dos autos do regime da transparência fiscal, nos termos daquele artigo 6.º, n.º 1, al. a). Conclui-se, pois, pela improcedência dos argumentos avançados pelas impugnantes neste conspecto.” Nesta parte, não acompanhamos a decisão do MMº juiz. Está em causa saber se a sociedade irregular constituída pelos impugnantes deve ser tributada em IRC por sujeição ao regime geral de tributação, como pretendem os IMPUGNANTES, ou, ao invés, por sujeitação ao regime da transparência fiscal, como decidido na sentença e defendido pela Autoridade Tributária. O STA já se pronunciou sobre a questão em vários arestos, decidindo que a tributação da sociedade irregular com fim comercial está sujeita à tributação pelo regime geral de IRC pelo lucro obtido com a atividade comercial exercida.(2) Seguindo de perto o Ac. do STA n.º 0216/12, a resposta àquela questão não decorre do disposto no n.º 2 do artigo 36.º do Código das Sociedades Comerciais, que, sob a epígrafe “Relações anteriores à escritura pública” estabelece que: “Se for acordada a constituição de uma sociedade comercial, mas, antes da celebração da escritura pública, os sócios iniciarem a sua actividade, são aplicáveis às relações estabelecidas entre eles e com terceiros as disposições sobre sociedades civis”, porquanto esta norma não tem, nem podia ter sob pena de violação do princípio da legalidade tributária qualquer relevo fiscal (artigos 103.º/ 2 e 165.º/1-i) da CRP). É que a matéria da incidência, na qual se inclui o regime da transparência fiscal desde logo por determinação do legislador - cfr. o artigo 6.º do Código do IRC (“Transparência fiscal”), inserido no Capítulo I do respectivo Código, sob a epígrafe “Incidência” e o artigo 20.º do Código do IRS (“Imputação especial”), igualmente inserido no Capítulo I do respectivo Código, sob a epígrafe “Incidência” pessoal – Secção II) – é matéria sujeita ao princípio da reserva absoluta de lei formal, no sentido de que só pode ser estabelecida por Lei da Assembleia da República ou Decreto-lei emanado ao abrigo de autorização legislativa daquela, razão pela qual tendo o Código das Sociedades Comerciais (CSC) sido aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de Setembro ao abrigo da competência legislativa própria do Governo (cfr. a então alínea a) do n.º 1 do 201.º da Constituição, actual 198.º, n.º 1, alínea a) da CRP) não poderia legitimamente pretender ter também efeitos tributários, sob pena de inconstitucionalidade. Mesmo que assim não se entendesse, nem por isso se poderia concluir ser aplicável no caso dos autos, por remissão do n.º 2 do artigo 36.º do CSC, o regime da transparência fiscal, porquanto não há no Código do IRC um regime tributário uniforme das “sociedades civis”, já que apenas estão abrangidas na previsão da alínea a) do n.º 1 do artigo 6.º do Código do IRC (Transparência fiscal) as Sociedades civis não constituídas sob forma comercial, sendo as sociedades civis sob forma comercial plenamente equiparadas às sociedades comerciais para efeitos de incidência deste imposto (cfr. os artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 3.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRC). Ora, que não estamos perante uma sociedade civil simples parece evidente, porquanto a sociedade irregular constituída pelos impugnantes visou a prática (e praticou) actos de comércio, e, de acordo com a melhor doutrina, as sociedades civis contrapõem-se às comerciais, porquanto aquelas não visam a prática de tais actos. Nas palavras de JORGE MAGALHÃES CORREIRA (A Tributação dos Rendimentos das Sociedades Irregulares, Fisco, Ano 1, outubro de 1988, p. 22) as sociedades civis simples diferenciam-se das restantes não pela forma, mas pela ausência dela. E porque carecem da única forma que a lei permite adoptar – a forma comercial – há-de a sua identidade ser afirmada através do objecto, que obviamente se não confunde com o que é visado pelas sociedades irregulares. Também SOARES MARTÍNEZ distingue claramente a tributação das sociedades civis da tributação das sociedades irregulares (Manual de Direito Fiscal, 7.ª ed., Lisboa, 1993, pp. 240/242) entendendo que as primeiras, quando não constituídas sob forma comercial, estão excluídas do plano de incidência de IRC, sendo os respectivos rendimentos atribuídos aos respectivos sócios, enquanto as segundas estão sujeitas em termos gerais àquele imposto (alínea b) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 2.º do Código do IRC). Estamos, pois, não perante uma sociedade civil não constituída sob forma comercial (sujeita ao regime da transparência fiscal nos termos do artigo 6.º n.º 1 alínea a) do Código do IRC), mas perante uma sociedade comercial irregular. Comercial quanto ao objecto, ainda que sem forma legal, e portanto destituída de personalidade jurídica em face ao direito comum, mas com personalidade e capacidade tributárias (artigos 15.º e 16.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária e 3.º n.º 1 e 2 do CPPT), sujeita ao regime geral de IRC pelo lucro obtido com a actividade de natureza industrial e comercial exercida (artigos 2.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 e 3.º, n.º 1, alínea a) e n.º 4 do código do IRC) e não ao regime da transparência fiscal. Nestes termos, por tudo o que deixámos exposto, concluímos ser ilegal a tributação dos rendimentos em sede de IRC com aplicação do regime da transparência fiscal, pelo que a liquidação impugnada enferma de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, determinantes da sua anulação. V DECISÃO. Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCA em revogar a sentença recorrida, e julgar procedente a impugnação anulando-se as liquidações impugnadas Custas pela AT. Lisboa, 11 de julho de 2019. (Mário Rebelo) (Patrícia Manuel Pires) (Cristina Flora) ____________________________________________ (1) Cfr. além do acórdão do STA referido peplo MMº juiz "a quo" cfr. o ac. da RP n.º 842/10.9TBPNF.P2 de 14-09-2015 Relator: CARLOS QUERIDO Sumário: I - A jurisprudência e a doutrina estabelecem como requisito essencial para a existência da sociedade irregular (ou sociedade imperfeita, de acordo com alguma doutrina), para além do vício formal da sua constituição, a affectio societatis: intenção de cada um dos contraentes de se associar com os restantes, pondo em comum (afectando) bens, valores e trabalho, com o objectivo de partilhar os lucros resultantes dessa atividade. III - Deve ser qualificado como contrato de sociedade irregular (e não como associação em participação), o contrato verbal pelo qual o autor e o réu assumiram um projeto que consistia na realização de investimentos futuros em imóveis, passando ambos a concorrer com os capitais necessários e na medida das disponibilidades de cada um, sendo suportados por ambos as despesas e investimentos realizados, distribuindo entre eles os lucros que viessem a ser realizadas, também na proporção dos respectivos investimentos, criando uma conta corrente de despesas e receitas, onde passaram a ser registados os investimentos realizados e todas as operações financeiras relacionadas com o projeto de investimento. (2) Referimo-nos aos os Acs. do STA n.º 0733/14 de 15-04-2015 Relator: FONSECA CARVALHO e n.º 0216/12 de 05-02-2014 Relator: ISABEL MARQUES DA SILVA Ambos com o seguinte Sumário: As “sociedades irregulares” — comerciais quanto ao objecto, ainda que sem forma legal, e portanto destituídas de personalidade jurídica em face ao direito comum, mas com personalidade e capacidade tributárias (artigos 15.° e 16.°, n.° 3 da Lei Geral Tributária e 3.° n.° 1 e 2 do CPPT) —, não se confundem com as sociedades civis não constituídas sob forma comercial, estando sujeitas ao regime geral de IRC pelo lucro obtido com a actividade comercial exercida (artigos 2.°, n.º 1, alínea b) e n.° 2 e 3.°, n.° 1, alínea a) e n.° 4 do código do IRC) e não ao regime da transparência fiscal. |