Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1296/10.5BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:07/11/2019
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:FACTURAS FALSAS
Sumário:1. Quando a Administração Tributária desconsidera facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção.
2. No que concerne à prova que compete à Administração, o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientes indiciadores a que o Tribunal possa concluir, “em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência”, pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”.
3. Nesta tarefa, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado.
4. No caso, concluindo-se que a AT não demonstrou os pressupostos legitimadores da sua actuação correctiva, cumprindo o ónus da prova que lhe competia na demonstração de indicadores seguros, credíveis e consistentes de que as facturas contabilizadas pela impugnante não reflectem reais e efectivas operações económicas, é inútil averiguar sobre a prova da veracidade das transacções.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


1 – RELATÓRIO


O Exmo. Representante da Fazenda Pública recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria que julgou procedente a impugnação judicial apresentada, na sequência de indeferimento de recurso hierárquico, por “G............, Lda.”, contra a liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 2006, no valor de 118.545,30 Euros.
Nas alegações de recurso, o Recorrente formulou as seguintes conclusões:
A. Da análise às facturas recolhidas ressalta desde logo que as “máscaras” das facturas nada têm a ver umas com as outras.
B. O facto de existirem eventuais prestações de serviços, não retira às facturas em causa o carácter de “falsas”, pois não respeitam, às transacções reais.
C. Em sede de IRC, a infracção aos artigos 17º, nº 3, e 23º nº 1 do CIRC, e ainda nº 1 do artigo 39º da LGT, pela contabilização de facturas relativamente às quais se verificam fortes indícios de as operações por elas tributadas respeitam a operações simuladas.
D. Dos fornecedores referenciados no relatório de inspecção tributária, e em consequência da análise à base de dados da AT, verificou-se que ambos os fornecedores revelavam situações fiscais bastante irregulares, nomeadamente encontravam-se em situação de incumprimento declarativo, quer em sede de IVA quer em sede de IRC.
E. Assim, tudo se conjuga para a conclusão de que não existe, nem provavelmente existiu, uma estrutura produtiva associada que produzisse os trabalhos descritos nas facturas ou que os mesmos tivessem sido efectivamente realizados, pelo que se conclui existirem indícios fundados de que a facturação emitida é falsa.
F. Os custos titulados por facturas falsas relativamente às quais há fortes indícios, objectivos e credíveis, de que as operações nelas descritas são simuladas, não poderão concorrer para a determinação do lucro tributável, porquanto não está comprovada a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora nos termos do disposto pelo artigo 23º, nº 1 do CIRC.
G. Além disso, o nº 1 do artigo 39º da LGT dispõe que “Em caso de simulação de negócio jurídico, a tributação recai sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado”, a que será de acrescer o imperativo constitucional de que a tributação das empresas incidirá sobre o lucro real e não sobre o lucro fictício.
H. Numa definição paradigmática relativa à repartição do ónus da prova, “II – À Administração cumpre apenas o ónus da prova da verificação dos respectivos indícios ou pressupostos da tributação, ou seja, dos pressupostos legais da sua actuação e ao contribuinte cabe provar a existência dos factos tributários que alega como fundamento do seu direito” - (Acórdão do STA, processo nº 0338, de 31-10-2007).
I. Assim, perante os indícios recolhidos no RIT passou a caber ao Sujeito Passivo o ónus da prova de que as operações em causa são reais e foram efectivamente realizadas, o que não aconteceu.
J. Obedecendo aos comandos legais e no regular exercício da função inspectiva que lhe está cometida, tendo sido detectadas na contabilidade do impugnante facturas emitidas por fornecedores sem estrutura empresarial para a actividade comercial nelas evidenciada, e utilizadas para suportar os custos do exercício, não poderia a Administração Tributária deixar de adoptar o comportamento correctivo que adoptou.
K. Tudo razões que se reputam determinantes para a prolação dum juízo que determine a revogação da decisão aqui recorrida e, do mesmo passo, venha confirmar a valia dos actos tributários impugnados, desacertadamente anulados pelo Tribunal a quo.
Nestes termos e nos demais de Direito que o Insigne Tribunal entender por bem suprir,propugna a Representação da Fazenda Pública que seja dado provimento ao presente recurso jurisdicional, determinando-se a revogação da sentença do Tribunal a quo e, desse modo, considerar improcedente a impugnação judicial interposta pelo ora recorrido, com o que se fará a almejada Justiça!
*
Não houve contra-alegações.
*
A Exma. Magistrada do Ministério Público emitiu parecer concluindo no sentido da improcedência do recurso.
*
Colhidos os vistos legais, e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cfr. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), a questão central que importa resolver reconduz-se a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir que a factualidade relatada não suporta o juízo da AT quanto à falsidade das operações tituladas pelas facturas contabilizadas do emitente “A............Unipessoal, Lda.”, que estão na base dos custos não aceites, no exercício de 2006.

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

“Compulsados os autos e analisada a prova documental apresentada e não impugnada, encontra-se assente por provada a seguinte factualidade:

1. A Impugnante, G............, Lda., com o NIPC 505......, com sede estabelecida no Largo .........., nº ..., 1º esq., Almeirim, foi constituída em 14.09.2000 como sociedade por quotas, tendo como sócios M...........e G..........., e como objeto social a cedência temporária de trabalhadores para utilização de terceiros utilizadores. (cfr. Relatório de Inspeção Tributária (RIT); fls. 24 do procedimento de reclamação graciosa (RG))
2. Em 19.11.2007, os sócios da Impugnante deliberaram a dissolução da sociedade, tendo apresentado em 21.11.2007 no Serviço de Finanças de Almeirim, a declaração de cessação da atividade. (cfr. RIT; fls. 24 da RG)

3. Através das Ordens de Serviço nºs OI 20070…, OI 20070...., OI 20070..... e OI2008…, datadas de 2007.10.26, 2007.12.03, 2007.12.03 e 2008.04.08, respetivamente, foi ordenada a inspeção tributária à Impugnante, a incidir sobre os anos de 2003, 2004, 2005 e 2006. (cfr. RIT; fls. 23 da RG)

4. No âmbito das Ordens de Serviço referidas no ponto anterior, a Direção de Finanças de Santarém remeteu à Impugnante o oficio nº 109..., datado de 29.10.2007, referente à carta aviso, dando conta de que iria proceder a uma ação inspetiva de âmbito geral, a muito curto prazo, ao exercício de 2003. (cfr. facto 1 e 2 da petição inicial, não impugnado; RIT; fls. 26 da RG)

5. Em 15.11.2007, a Direção de Finanças de Santarém remeteu à Impugnante o ofício nº 115..., notificando-a na pessoa do sócio gerente, para apresentar em 26.11.2007 todos os elementos e documentação a que está obrigada a possuir por imposição legal, com vista à análise da situação tributária relativa ao ano de 2003. (cfr. facto 3 da petição inicial, não impugnado; RIT; fls. 27 da RG)

6. Em resposta ao ofício referido no ponto anterior, a Impugnante remeteu aos serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Santarém, uma missiva, que foi rececionada em 25.11.2007, a informar que a gerência não se encontrava no país e a requerer o agendamento de nova data. (cfr. facto 4 da petição inicial; RIT, fls. 28 da RG)

7. Em 23.11.2007, a Inspeção Tributária, através do ofício nº 118..., solicitou via fax a presença do Técnico Oficial de Contas (TOC) da Impugnante, na sede da empresa no dia 26.11.2007, a fim de prestar declarações e disponibilizar os documentos de escrita e o processo de documentação fiscal. (cfr. RIT; fls. 29 da RG)

8. Na data referida no ponto anterior, o TOC não compareceu na sede da Impugnante tendo remetido nessa mesma data uma carta, rececionada pela Direção de Finanças de Santarém em 27.11.2007, informando a Inspeção Tributária que se encontrava num estado de saúde bastante fragilizado e que todos os elementos que lhe tinham sido solicitados e ainda os registos informáticos, se encontravam na posse do cliente, a Impugnante. (cfr. RIT; fls. 30 da RG)

9. Em 04.12.2007, através do ofício nº 122..., foi novamente solicitada a presença no TOC na Direção de Finanças de Santarém, no dia 04.01.2008. (cfr. RIT; fls. 29 da RG)

10. Em 04.01.2008, foi rececionada na Direção de Finanças de Santarém carta remetida pelo TOC, a reiterar os motivos de saúde que o impediam de comparecer como solicitado, informando novamente que os elementos de escrita se encontravam na posse da Impugnante. (cfr. RIT; fls. 31 da RG)

11. Em 28.11.2007, o Inspetor Tributário deslocou-se ao domicílio fiscal dos sócios, E.......... e G..........., afim de proceder à notificação pessoal da ordem de serviço nº OI20070... de 26.10.2007, relativa ao exercício fiscal de 2003. (cfr. RIT; fls. 32 da RG)

12. Na deslocação referida no ponto anterior, o Inspetor Tributário deixou nota de diligência de notificação com hora certa, dando conta do agendamento para o dia 30.11.2007, pelas 14h para proceder à referida notificação. (cfr. facto 5 da petição inicial, não impugnado; RIT, fls. 32 e 33 da RG)

13. Em 30.11.2007, o Inspetor Tributário procedeu à notificação com hora certa dos sócios E.......... e G..........., por afixação da Ordem de Serviço nº OI 20070..., de 26.10.2007, que determinou a realização do procedimento de inspeção externo, de âmbito geral, relativo ao exercício de 2003. (cfr. RIT; fls. 34, 35 e 36 da RG)

14. A notificação referida no ponto anterior, foi assinada por duas testemunhas, e constava que:
“A presente notificação determina para todos os efeitos legais o início do procedimento externo de inspeção à sociedade notificada, em conformidade com o disposto no nº 2 do art. 51º do RCPIT.” (cfr. RIT; fls. 35 da RG)

15. Em 08.04.2008, foi emitida a Ordem de Serviço nº OI 20080...., pelo Inspetor Tributário Assessor Principal, A.........., por delegação de competência, para realização de ação inspetiva interna, ao exercício fiscal de 2006, para verificação da situação tributária em sede de IRC e IVA. (cfr. fls. 116 da RG)

16. Por ofícios nºs 31... e 31..., a Inspeção Tributária, remeteu à Impugnante na pessoa dos sócios, notificação do Projeto de Relatório de Inspeção Tributária e para, querendo no prazo de 15 dias, exercer o direito de audição prévia. (cfr. fls. 65 a 66 da RG)

17. Em 13.05.2008, foi elaborado o Relatório final de Inspeção Tributária, com o teor que em parte se transcreve:
“(…)
II – Objetivos, âmbito e incidência temporal
II – 1. Credencial
A presente ação inspetiva tem origem nas OI20070...., OI 20070...., OI20070.... e OI20080.... datadas de 2007/10/26, 2007/12/03, 2007/12/03 e 2008/04/08 respetivamente.
II – 2. Motivo, âmbito e incidência temporal
O procedimento inspetivo foi efetuado na sequência da Nota de Entrega nº 2.3.., de 2007 do Serviço de Apoio à Inspeção Tributária.
O âmbito das ações é polivalente para o exercício de 2003 e parcial com incidência em IRC e IVA para os exercícios de 2004, 2005 e 2006.
II. 3 – Outras Situações
II.3.1 – Caraterização da empresa
II.3.1.1 – Constituição da Sociedade, Capital Social e Objeto
(…)
II.3.1.4 – Enquadramento fiscal
Ao nível fiscal, a empresa enquadra-se: em sede de IVA no regime normal de periodicidade trimestral nos exercícios de 2003, 2004 e 2006 e no regime normal de periodicidade mensal no exercício de 2005 e em sede de IRC no regime geral de tributação.
II.3.1.5 – Colaboração nos termos do artigo 52º do RCPIT
Não existiu qualquer colaboração por parte do sujeito passivo embora tenham sido realizadas diversas diligências nesse sentido.
O Técnico Oficial de Contas responsável pela escrita é o senhor L.........., com o NIF 115.........., (responsável pelo gabinete de contabilidade L............, Lda. com sede em Lisboa) que recusou sempre prestar esclarecimentos pessoalmente.
III – Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável
III. 1 – Carta Aviso – Procedimento Inspetivo Externo – Exercício de 2003
A 29 de Outubro de 2007 foi expedido desta Direção de Finanças o Ofício 10.927 referente à Carta Aviso nos termos da alínea l) do nº 3 do artigo 59º da Lei Geral Tributária e do artigo 49º do Regime Complementar do Procedimento da Inspeção Tributária.
Em resposta à notificação foi rececionado nesta Direção de Finanças a seguinte Carta.
(…)
Podemos realçar que o sócio gerente não estabeleceu quaisquer contactos (pessoais ou postais) com estes serviços na tentativa de encontrar um dia e local para se encontrar com a Administração Fiscal.
Todas as tentativas e diligências pela inspeção tributária para agendar novo encontro tiveram resposta negativa por parte da funcionária, P.........., NIF 229......., presente na sede da sociedade, argumentando falta de contacto com o sócio gerente.
III-3. – Princípio de Colaboração – Art.º 54º e 55º do ETOC – Toc Sr. L........., NIF: 115.......
No dia 23/11/2007, pelo oficio 118.. desta Direção de Finanças foi solicitada via Fax a presença do TOC na sede da empresa no dia 26/11/2007 pelas 10h (Data para a qual estava notificado o sócio gerente), a fim de prestar declarações e apresentar todos os documentos de escrita e o Processo de Documentação Fiscal.
No dia e hora agendados o Toc não esteve presente na sede da empresa.
O Toc veio a responder a estes serviços, via correio, tendo a carta dado entrada a 27/11/2007.
Na resposta enviada pretende justificar a sua falta pelo desconhecimento do Fax que lhe foi enviado, argumentando ter tido conhecimento do mesmo duas horas após a hora para a qual foi notificado e problemas de saúde.
Fomos igualmente informados que todos os elementos de escrita, inclusive registos informáticos foram entregues ao cliente pelo que não os poderia disponibilizar.
No dia 04/12/2007, pelo ofício 122.. desta Direção de Finanças foi novamente solicitada a presença do TOC nesta Direção de Finanças no dia 04/01/2008 pelas 10 horas, a fim de prestar declarações e apresentar todos os documentos de escrita e o Processo de Documentação Fiscal.
Mais uma vez, o TOC faltou á notificação invocando os já mencionados problemas de saúde.
(…)
III.4. – Inicio do Procedimento de Inspeção Externo
Nos contactos estabelecidos para a sede da empresa, com a funcionária do sujeito passivo Sra. P..........., NIF 229....... e com o TO, foram efetuadas várias tentativas de assina a Ordem de Serviço OI20070.... de 26-10-2007, que determina a realização de procedimento de inspeção externo à sociedade G..........., Lda.
Todas as tentativas não obtiveram resposta afirmativa, adiando todos os visados a sua presença na sede do Sujeito Passivo inspecionado.
Assim optamos pela notificação pessoal da sociedade na pessoa dos seus sócios, Sr. G..........., (…), e E.........., (…) nos termos previstos nos artigos 38º e 51º nº 1 e 2 do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributário (RCIPT) e do nº 1 do artigo 41º do Código do Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
A sócia E.......... recebeu a notificação, optando por não assinar a Ordem de Serviço sem falar com o seu filho e sócio da empresa Sr. G..........., tendo ficado agendado o dia 30/11/2007 pelas 14 horas para efetuar a Notificação com Hora Certa (artigo 240º nº 1 de Processo Civil, aplicável por força do nº 6 do artigo 38º do Código Procedimento e de Processo Tributário).
No dia 30 de Novembro de 2007, os sócios não compareceram novamente, tendo sido notificado por afixação da Ordem de Serviço OI20070.... do início do Procedimento Externo de Inspeção.
(…)
Pelos ofícios 12.2.. e 12.2.. desta Direção de Finanças foi comunicada aos sócios por via postal a Advertência de Notificação Pessoal com Hora certa por Afixação do Inicio do Procedimento Inspetivo a 30/11/2007.
(…)
A presente Ordem de Serviço foi encerrada em 14/04/2008 nos termos do artigo 61º do RCPIT, com o envio pela via postal da nota de diligências relativa Ordem de Serviço identificada com o número OI 20070.... para o domicilio fiscal dos dois sócios (…)
III.5. – Elementos constantes do Anexo J – Rendimentos Pagos – da Declaração Anual de Informação Contabilística (Artigo 119º do Código do IRS)
O Sujeito Passivo declarou os seguintes valores na Declaração Anual referente aos rendimentos pagos ou colocados à disposição de outros sujeitos passivos nos exercícios de 2003, 2004, 2005 e 2006.
a) Trabalho Dependente – Rendimentos Categoria A
b) Trabalho Independente – Rendimentos Categoria B
(…)
Estes elementos evidenciam a existência de quadro de pessoal que permitissem a execução das obras que foram adjudicadas pela sociedade.
III.6. – Elementos constantes do Anexo P da Declaração Anual de Informação Contabilística
Do sistema informático da DGCI retiramos a informação constante dos Prints que apresentamos seguidamente:
Por cada um dos exercícios objeto de análise foi retirado o Print da Declaração Anual de Informação Contabilística enviada eletronicamente pelo sujeito passivo G.........., Lda. e a informação resultante do cruzamento de dados entre ao valores declarados pelo sujeito passivo no Anexo P – Mapa recapitulativo de Fornecedores e os valores declarados por terceiros com os quais este se relacionou. Este cruzamento de dados é apresentado de forma agrupada e detalhada para cada um dos exercícios.
(…)
III.7. – Principais Fornecedores
Como se pode verificar pela análise dos n.ºs de identificação fiscal declarados pelo sujeito passivo nas declarações anuais entregues e descritas no ponto anterior os principais fornecedores da G..........., Lda. são:
 A............Unipessoal, Lda. – (…), nos exercícios 2003, 2004, 2005 e 2006, e
 U............. Unipessoal, Lda. – (…), apenas no exercício de 2003.
Dos fornecedores anteriormente referenciados, e em consequência da análise à base de dados da DGCI, verificou-se que ambos revelavam situações fiscais bastante irregulares, nomeadamente encontravam-se em situação de incumprimento declarativo, quer em sede de IVA quer em sede de IRC.
Perante os relatórios de inspeção enviados a estes serviços pela Direção de Finanças de Lisboa, referentes aos fornecedores colhemos a informação sobre a efetiva realização das operações que constam das faturas emitidas por estes supostos fornecedores:
III.7.1. – A............ Unipessoal, Lda., NIPC: 505.......
III.7.1.1. – Faturas detetadas
No que respeita ao suposto fornecedor A.......... Unipessoal, Lda (…) foram detetadas na ação de fiscalização efetuada pela DF de Lisboa a esse sujeito passivo, as seguintes faturas emitidas à sociedade G............, Lda. nos exercícios de 2003 a 2006:
(…)
III.7.1.2. – Informação prestada pelos Serv. Inspeção da DF de Lisboa

Sobre este suposto fornecedor apuraram os Serviços de Inspeção no Relatório Final de Inspeção Tributária efetuado após ação inspetiva ao exercício de 2003, que:
“…
Da análise à contabilidade do sujeito passivo ressalta desde logo o seguinte:
a) Os proveitos … têm como suporte faturas de duas gráficas – V........ e G........, onde a sequência numérica nas faturas emitidas pelo sujeito passivo não existe, a fatura 239 é datada de Janeiro e a 321 é datada de Janeiro, a 283 é datada de Setembro e a 200 é datada de Março;
b) …Existem faturas seguidas para o mesmo cliente embora emitidas em meses e anos diferentes.
c) Dos custos – 96% são suportados por subcontratos do s. passivo NIPC 505....... … e por despesas com pessoal no valor de 10.412,25€, não possuindo o mesmo qualquer imobilizado.
d) Efetuada a análise às faturas dos subcontratos antes referidos, constata-se que todas elas têm o mesmo problema – faturam só mão de obra – oficias, serventes, carpinteiros, marteleiros, etc e não respeitam os requisitos previstos na alínea b) do n.º 5 do artigo 35º do CIVA – falta de indicação das horas/trabalhador o valor unitário das horas, bem como os locais onde os serviços foram prestados.
e) Comparando as faturas emitidas pelo s. passivo aos “seus clientes” com as do seu sub empreiteiro constata-se que muitas delas referem cofragens, rebocos, assentamento de blocos, tubagem, etc
(…)”
No relatório foi também apurado que:
“…
a) O sujeito passivo não tem estrutura empresarial para efetuar os serviços declarados como proveitos até porque os mesmos são suportados por sub contratos de outros sujeitos passivos sem qualquer estrutura em que um desses declarou que vendeu as faturas a uma percentagem de 4%, pelo que em relação a todas as faturas emitidas existe fortes indícios de corresponderem a negócios jurídicos simulados;

…”
Pelo ofício 006... de 23-01-2008 da Direção de Finanças de Lisboa fomos informados que relativamente ao sujeito passivo A............Unipessoal, Lda., existe o processo de inquérito N.º 428/07.8IDLSB.
Em face do exposto conclui-se:
 pela existência de fortes indícios, objetivos e credíveis que as prestações de serviços indicadas nas faturas emitidas por A........... Unipessoal, Lda. não consubstanciam operações reais, o que indicia que se está na presença da designada prática de utilização de faturas “falsas”.
 o facto de existirem eventuais prestações de serviços, não retira às faturas em causa o caráter de “falsas”, pois, não respeitam, conforme as declarações supra transcritas, às transações reais.
Em sede de IRC, a infração aos artigos 17º nº 3 alínea a) e 23º nº 1 ambos do Código de IRC e nº 1 do art.º 39º da Lei Geral Tributária, pela contabilização de custos consubstanciados em faturas relativamente às quais se verificam fortes indícios de as operações por elas tituladas respeitam a operações simuladas, é punia pelo n.º 2 do art.º 104º do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT).
(…)
III.8. – Correções Propostas
III.8.1. – Em sede de IRC – Exercícios de 2003, 2004, 2005 e 2006
Em face do exposto nos pontos III.2. a III.7. o valor dos subcontratos, que consubstanciam custos dos respetivos exercícios económicos/fiscais, contabilizados com base nas faturas emitidas pelos supostos subempreiteiros da G............., Lda. anteriormente discriminadas, não podem ser aceites fiscalmente, nos termos do artigo 23º do Código do IRC, o qual dispõe no seu n.º 1 (…)

Pois, os custos titulados por faturas relativamente à quais há forte indícios, objetivos e credíveis, de que as operações nelas descritas são simuladas, não poderão concorrer para a determinação do lucro tributável, porquanto não está comprovada a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora nos termos do disposto pelo artigo 23º n.º 1 do Código do IRC.
Para além disso, o n.º 1 do artigo 39º da Lei Geral Tributária dispõe que “Em caso de simulação de negócio jurídico, a tributação recai sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado”, a que será se acrescer o imperativo constitucional de que a tributação das empresas incidirá sobre o lucro real e não sobre o lucro fictício.
Sendo assim, será de acrescer ao lucro tributável as seguintes correções:
(…)
 2006, o montante de € 380.291,45
(…)
VIII – Outros Elementos Relevantes
A sociedade G.........., Lda., (…), encontra-se dissolvida e liquidada desde 21-11-2007 conforme consta do averbamento (…).
(…)
IX – Direito de audição – Fundamentação
Em 22/04/2008, foi notificado sujeito passivo para exercer no prazo de 15 dias, o direito de audição previsto nos artigos 60º da Lei Geral Tributária e 60º do Regime Complementar de Procedimentos da Inspeção Tributária, sem que o tenha efetuado pelo que se propõem as correções atrás descritas. (…)”
(cfr. RIT, fls. 20 a 64 da RG, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos)
18. Os sócios da Impugnante foram notificados do Relatório de Inspeção Tributária, pelos ofícios nºs 36.. e 36.., datados de 15.05.2008. (cfr. fls. 18 e 19 da RG)
19. Em 18.06.2008, foi emitida a liquidação de IRC e juros compensatórios nº 2008 8......, relativa ao ano de 2006, no valor de € 118.545,30. (cfr. fls. 13 e 14 da RG)
20. Em 25.11.2008, a Impugnante apresentou junto da Repartição de Finanças de Almeirim, Reclamação Graciosa da liquidação de IRC relativa ao ano de 2006. (cfr. fls. 2 a 11 da RG)
21. Por ofício nº 35.., datado de 21.07.2009, foi a Impugnante notificada do indeferimento da reclamação graciosa. (cfr. fls. 144 da RG)
22. Em 28.08.2009, a Impugnante apresentou junto do Serviço de Finanças de Almeirim, Recurso Hierárquico, do indeferimento da reclamação graciosa referida no ponto anterior. (cfr. fls. 2 a 9 do Processo de Recurso Hierárquico - RH)
23. Em 03.05.2010, a Sra. Diretora de Serviços M..........., por subdelegação de competência, exarou despacho de indeferimento do recurso hierárquico. (cfr. fls. 25 do RH)
24. Em 18.05.2010, pelo ofício nº 10.., a Impugnante foi notificada do indeferimento do Recurso Hierárquico apresentado. (cfr. fls. 37 e 38 do RH)
25. Por Despacho 21 de junho de 2010, cujos efeitos se reportam a 1 de março de 2010, publicado pelo Aviso nº 13261/2010, no Diário da Republica nº 127, 2ª série, de 2010.07.02, a Subdiretora-Geral, T..........., subdelegou na Diretora de Serviços do IRC, M.........., a competência para, entre o mais, “apreciar e decidir os recursos hierárquicos previstos nos artigos 66.º e 76.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (…)”. (cfr. Diário da República, 2ª série, nº 127, de 2010.07.02, disponível em https://dre.pt/web/guest/pesquisa-avancada/-/asearch/1918077/details/maximized?serie=II&numeroDRE=127&search=Pesquisar&ano=2010&types=DR&dreId=701089)
26. A presente Impugnação deu entrada neste Tribunal Administrativo e Fiscal em 18.08.2010. (cfr. fls. 1 do suporte físico)
*
Factos Não Provados
Não resultam provados quaisquer outros factos, com relevância para a decisão da causa, tendo em conta as várias soluções de direito plausíveis.
Motivação da decisão de facto
A decisão da matéria de facto resultou da análise dos documentos e informações oficiais, não impugnados, juntos aos autos pelas partes e constantes do processo administrativo apenso (procedimento de reclamação graciosa e recurso hierárquico), bem como nas posições assumidas nos articulados, tudo conforme foi referido em cada ponto dos factos assentes”.
*

4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Por sentença proferida pelo TAF Leiria foi julgada procedente a impugnação judicial deduzida pela Impugnante, G.........., Lda, contra a liquidação adicional de IRC, respeitante ao exercício de 2006, no montante de € 118.545,30 Euros.
Tendo em consideração a questão versada nas conclusões formuladas, vejamos a discordância da Recorrente, Fazenda Pública, com o decidido.
Na análise que se segue, iremos recuperar, transcrevendo, o teor do acórdão proferido neste TCA, no passado dia 25/06/19, no processo nº 1295/10.7BELRA.
Trata-se de recurso jurisdicional em tudo idêntico ao que aqui nos ocupa, tendo por base a impugnação judicial deduzida pela ora Recorrida relativamente a uma liquidação de IRC do exercício de 2005 (aqui, 2006). Note-se que ambas as liquidações adicionais contestadas são resultantes do mesmo RIT, estando em causa (em qualquer dos casos) custos não aceites e titulados por facturas emitidas pelo mesmo fornecedor, A.............. Unipessoal, Lda.
Estando nós, no essencial, de acordo com o decido no referido aresto e inexistindo, aqui, novos argumentos cuja consideração se imponha, justifica-se o apelo ao teor do referido acórdão de 25/06/19.
Assim, e como ficou dito no aresto identificado:
“(…)
Mostram os autos e o probatório que a impugnante foi sujeita a uma acção inspectiva de que resultaram, entre outras, correcções à matéria tributável do IRC referenciado ao exercício de 2005, pela desconsideração dos custos contabilizados com base em facturas emitidas pelo sujeito passivo “A............Unipessoal, Lda.”.
A ver da Administração tributária, a factualidade apurada e relatada suporta o juízo extraído de que as facturas daquele emitente não representam reais e efectivas operações económicas.
A sentença, todavia, não validou o juízo fáctico formulado pela AT, com o que se não conforma o Recorrente. Vejamos.
Como tem sido realçado, reiterada e uniformemente, pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, nomeadamente por este Tribunal Central Administrativo Sul (vd. Ac. de 07/06/2018, tirado no proc.º813/11.8 BELRA (09855/16)) quando a Administração tributária desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do art.º74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que as operações constantes das facturas não correspondem à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção – vd., entre muitos outros, os acórdãos do STA, de 20/11/2002, proc.º01483/02 e do TCA Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF.
Assim sendo, importa analisar se a Administração tributária fez a prova que lhe competia na recolha de factos que permitam concluir que às facturas contabilizadas pela Impugnante, ora Recorrida, não subjazem as operações que, alegadamente, teriam implicado a respectiva emissão.
Tenha-se em conta, como também é pacífico na jurisprudência, que não é imperioso que a Administração efectue uma prova directa da simulação. Como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cf. Alberto Xavier, “Conceito e Natureza do Acto Tributário”, pág. 154; também neste sentido, entre outros, o acórdão do TCAN, de 26/04/12, proc.º 00964/06.0 BEPRT.
Ou seja, a Administração Tributária não tem que demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo (Acórdão do STA de 27/10/04, Proc.º810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – art.º75º da LGT.
Os indícios são definidos por João de Castro Mendes como aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” – cit. por Saldanha Sanches, “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 2ª edição, pág. 311.
Nesta tarefa e como é salientado no citado Acórdão deste TCA Sul de 07/06/2018, tirado no proc.º 813/11.8 BELRA (09855/16) e do TCAN, de 28/02/2013, proferido no proc.º00383/08.4BEBRG, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm, necessariamente, que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado, revelando-se até a fiscalização cruzada um procedimento crucial no combate à fraude e evasão fiscais.
Salienta-se, ainda, quanto à questão do ónus da prova e do seu cumprimento pela AT quando esteja em causa a não-aceitação, como custo fiscal do exercício, do valor reflectido em facturas contabilizadas e reputadas falsas, o Acórdão do Pleno da Secção do CT do STA, de 17/02/2016, tirado no proc.º0591/15 – embora aí estivesse concretamente em causa a dedutibilidade do IVA, mas cujas considerações são transponíveis para estes autos – em que se deixou consignado o seguinte: «Para que a AT, ao abrigo do disposto no nº 3 do art. 19º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240º do C. Civil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende»; «Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução de imposto, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito à dedução do IVA) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução».
Regressando aos autos, vejamos que indicadores da falsidade das facturas a Administração tributária recolheu e aportou ao procedimento e aos autos e se tais indicadores se apresentam seguros, credíveis, consistentes e bastantes para suportar o juízo formulado pela AT.
Recorda-se que não foi impugnada a decisão de facto, pelo que não se impõe a este tribunal considerar eventuais fontes probatórias que a sentença não relevou ou de que não extraiu factualidade que interessaria à Recorrente ver contemplada no probatório
De banda do emitente, “A............Unipessoal, Lda.”, é referido que se trata de um sujeito passivo incumpridor das obrigações fiscais e já referenciado como falso emitente em processo de Inquérito; as facturas que emite não apresentam numeração sequencial; não dispõe de estrutura empresarial para os serviços facturados; não possui imobilizado; 96% dos seus custos referem-se a subcontratos envolvendo um outro sujeito passivo, sendo que as facturas dos subcontratos referem apenas mão-de-obra (oficiais, serventes, carpinteiros, marteleiros…), ao passo que as facturas emitidas aos seus “clientes” referem “cofragem, rebocos, assentamento de blocos, tubagem…”; um subcontratado deste sujeito passivo declarou ter-lhe vendido facturas a uma percentagem de 4% (cf. ponto 3. da matéria assente); já indícios de irregularidades e/ou anomalias reportados ao sujeito passivo utilizador (impugnante e Recorrido nos autos) ou à sua actividade, concretamente a estabelecida com o emitente, não são referidos nenhuns.
Não repugna aceitar que os indícios recolhidos pela AT com relação à pessoa do emitente e respectiva actividade apontam prima facie para a falta de credibilidade do mesmo como real e efectivo fornecedor/ prestador dos serviços facturados, pois e, em suma, não apresenta estrutura empresarial para os trabalhos facturados; não emite facturas com numeração sequencial; apresenta situação fiscal irregular; e até há informação de que terá recorrido na sua actividade à utilização de facturação falsa.
Todavia e como já se tem salientado em anteriores arestos, nomeadamente no Acórdão do TCAN, de 21/12/2016, tirado no proc.º00477/09.9BEPNF, em que o relator é o mesmo deste, «da circunstância de um sujeito passivo se dedicar à emissão de facturas falsas, não pode concluir-se, sem mais, que não exerça simultaneamente a actividade para que está colectado (no caso do emitente, a de construção civil). Daí a necessidade, também, da recolha de indícios, seguros e credíveis, centrados na relação concreta por ele estabelecida com o utilizador, de modo a poder estabelecer-se algum nexo entre a actividade ilícita do emitente e as operações facturadas ao utilizador. Porque, o que verdadeiramente importa apurar é se os serviços facturados foram efectivamente prestados pelo emitente, independentemente do incumprimento generalizado das obrigações legais e fiscais (art.º31.º, n.ºs 1 e 2 da LGT) a que ele está vinculado no exercício da actividade prestadora.
Serve isto para dizer que um sujeito passivo pode não ter assalariados inscritos na segurança social, não reter e/ ou não entregar ao Estado o imposto sobre remunerações pagas, nem declarar à AT operações com terceiros fornecedores de bens e serviços (…), sem que isso represente per si um indício forte da irrealidade das operações facturadas, sendo certo que a capacidade empresarial do emitente nem sempre poderá ser apreendida e medida a partir da sua estrutura de custos declarada (com assalariados e operações com terceiros), bastando pensar, no sector da construção civil, na recorrente situação de alocação de trabalho indiferenciado com recurso a mão-de-obra clandestina» (fim de citação).
Por isso mesmo, sempre temos entendido como temerária e de elevado risco anulatório a actuação da AT que conclua pela falsidade das facturas só porque emitidas por sujeito passivo sem adequada estrutura de custos declarada para a realização dos serviços facturados, e/ou por se tratar de sujeito passivo que não cumpre as obrigações fiscais a que está vinculado e/ou já se encontre referenciado em processo de Inquérito como falso emitente e nisso esgote a AT sua actividade investigatória, sem avançar com a recolha de indícios reportados à pessoa e actividade do utilizador (impugnante/Recorrida), em particular na sua relação com o emitente, analisando nomeadamente o rastro do dinheiro (como, com que meios e por que modo foram feitos os pagamentos facturados), sabendo-se ser este um dos indicadores mais seguros da falsidade das operações facturadas. E neste âmbito, a AT nada apurou, ou pelo menos, relatou.
“Ex abundanti” sempre se dirá que as próprias situações irregulares/ anomalias relatadas com relação à pessoa e actividade do emitente, apresentam-se frágeis do ponto de vista da sua consistência para afastar a existência (também) de operações reais na actividade do emitente: primeiro, porque se refere que 96% dos custos facturados pelo sujeito passivo emitente “A............Unipessoal, Lda.” depende de um único subempreiteiro, o que enfraquece, como elemento indiciador de falsidade, a declaração de um dos seus subempreiteiros de que lhe vendeu facturas a troco de 4% do seu valor; depois, porque a referência à inexistência de imobilizado e de falta de estrutura empresarial, à falta de melhor concretização, não se revela decisivo como indicador de falsidade na actividade alocadora de mão-de-obra, resultando, por outro lado, manifestamente insubstanciada a relatada afirmação de que a impugnante/Recorrida dispunha de recursos no seu quadro de pessoal para acorrer às obras que lhe foram adjudicadas, sem concretizar minimamente de que obras se trataram e como concluiu a AT pela suficiência dos recursos próprios da impugnante para as executar e concluir.
Ou seja, os indicadores recolhidos pela AT não são suficientes para este tribunal concluir que a actividade do emitente “A..........” se centrava unicamente na emissão de facturação falsa, não tendo estabelecido com clientes seus reais e efectivas operações económicas e, em particular com a impugnante, as operações reflectidas nas facturas desconsideradas pela AT para efeitos de custos do exercício de 2005.
Nesta linha de entendimento, há que concluir que a AT não demonstrou os pressupostos legitimadores da sua actuação correctiva, cumprindo, nos termos já expostos, o ónus da prova que lhe competia (cf. artigo 74º da LGT) na demonstração de indicadores seguros, credíveis e consistentes de que as facturas contabilizadas pela impugnante e não aceites como custos fiscais não reflectem reais e efectivas operações económicas.
A sentença recorrida, ao não validar o juízo conclusivo da AT quanto à falsidade das operações representadas pelas facturas do emitente “A............Unipessoal, Lda.”, contabilizadas pela impugnante decidiu bem e não merece censura, sendo inteiramente de confirmar.
O recurso não merece provimento” (fim de citação).
Deve acrescentar-se que, se bem lermos o RIT, na parte em que o mesmo recupera o relatório inspectivo relativo ao fornecedor em causa, A........., o que se constata é que o mesmo respeita a uma análise efectuada ao exercício de 2003, sendo certo que, no presente caso, daquilo que tratamos é do exercício de 2006. Com efeito, lê-se no ponto III.7.1.2 do relatório transcrito no probatório que “Sobre este suposto fornecedor (leia-se, A.........) apuraram os Serviços de Inspecção no Relatório Final de Inspecção Tributária efectuado após acção inspectiva ao exercício de 2003, que: …”.
Ora, da leitura do relatório relativo à G....., aqui Recorrida, não resulta cabalmente esclarecido se o alegado circunstancialismo indiciador do incumprimento e da não realização dos serviços facturados por A........ à G....... se manteve inalterado, entre os exercícios de 2003 e 2006. Admite-se, na economia do RIT, que a AT assim o entendeu; porém, tal consideração está longe de se mostrar evidente e esclarecida.
Para mais, deve salientar-se que o RIT, na parte em que se apoia na inspecção feita relativamente ao contribuinte A........., mostra-se ancorado em juízos conclusivos e afirmações imprecisas, que nos remetem para longe das exigências que, neste aspecto, recaem sobre a AT, ou seja, de trazer aos autos indícios sérios, seguros e credíveis que permitam concluir, com elevada probabilidade (ou até certeza), que o negócio declarado pelas partes não corresponde à realidade materializada nas facturas em causa.
Com efeito, assim é quando se afirma, sem base densificadora suficiente, que o “sujeito passivo não tem estrutura empresarial para efectuar os serviços que declara como proveitos” ou quando se constata uma total ausência de concretização temporal do circunstancialismo relatado. A título de exemplo, lido o relatório, pouco se sabe sobre as mencionadas facturas identificadas com os nºs 239, 321 e 283, em concreto, e como se impunha, a que período temporal respeitam. Outro exemplo se retira da afirmação correspondente a “estes elementos evidenciam a existência de um quadro de pessoal que permitissem a execução das obras que foram adjudicadas pela sociedade”, pois, ressalvado o facto de se indicar que, no ano de 2006, foram pagos rendimentos da Cat. A, no valor de € 263.046,74, nenhum outro elemento é avançado que permita estabelecer a mínima relação/comparação com as obras executadas, de modo a concluir pela afirmada suficiência do quadro de pessoal existente.
Nesta conformidade, conclui-se nos exactos termos em que se concluiu no acórdão deste TCA que citámos, no sentido de que a sentença recorrida, ao não validar o juízo conclusivo da AT quanto à falsidade das operações subjacentes às facturas emitidas por A........., e contabilizadas pela impugnante, decidiu bem e não merece censura, sendo inteiramente de confirmar.
Improcedem, assim, as conclusões do recurso, negando-se provimento ao mesmo.
5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Lisboa, 11 de Julho de 2019



_______________________________
Catarina Almeida e Sousa


________________________________
Hélia Gameiro


________________________________
Jorge Cortez