Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:8298/14.0BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:03/11/2021
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:IRC,
PROVISÕES
Sumário:O art. 37.º do CIRC, na redação vigente no exercício de 1995, admitia como custos ou perdas do exercício os créditos que, para além do mais, resultassem incobráveis face a processo especial de recuperação de empresa e proteção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência, não se exigindo o trânsito em julgado da respetiva sentença.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

A impugnante P... PORTUGUESA, SA e a Fazenda Pública, com os demais sinais nos autos, vêm recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial apresentada, da liquidação adicional de IRC do ano de 1995.

A Recorrente, P... PORTUGUESA, SA, apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:
«CONCLUSÕES:
1) Como decorre dos autos, o Tribunal a quo foi chamado, no âmbito da presente ação de impugnação judicial, a pronunciar-se sobre a ilegalidade: (i) da correção ao apuramento do lucro tributável do Grupo relativa a provisões para créditos em contencioso, no montante de Esc. 28.956.243$00 (€ 144.433,13); (ii) da correção ao apuramento do lucro tributável do Grupo relativa ao acréscimo de 20% das despesas de representação, no montante de Esc. 2.647.127$00 (€ 13.203,81), (iii) da correção ao apuramento do lucro tributável do Grupo relativa a despesas contabilizadas na conta 62 - "Deslocações e Estadas”, no montante de Esc. 2.352.127$00 (€ 11.732,36); (iv) da correção referente à dedução de prejuízos fiscais reportados de exercícios anteriores, no montante de Esc. 296.151.017$00 (€ 1.477.195,04); (vii) da desconsideração das correções efetuadas pela Administração tributária ao lucro tributável do Grupo referentes aos exercícios de 1993 e de 1994; e, (viii) da correção referente ao crédito fiscal para o investimento.

2) Na sequência, o Tribunal a quo julgou, através da sentença recorrida, a presente ação de impugnação parcialmente procedente, tendo decidido anular o ato de liquidação adicional de IRC sub judice apenas na parte em que reflete as correções relativas à provisão sobre A... e

as correções identificadas nas alíneas (vii) e (viii) do ponto anterior.

3) Porém, como resulta da leitura da decisão recorrida, o Tribunal a quo não se pronunciou, como se lhe impunha, sobre as correções ao apuramento do lucro tributável consolidado referentes à redução de provisões sobre devedores, no montante de Esc. 6.599.407$00 (€ 32.917,70) e à dedução de prejuízos fiscais reportados de exercícios anteriores, no montante de Esc. 296.151 017$00 (€ 1.477.195,04).


4) Significa isto, pois, que a decisão recorrida é nula por omissão de pronúncia, impondo-se, em consequência a prolação de uma nova sentença que – apreciando a ilegalidade das referidas correções – sane o invocado vício (cf. artigos 608.º, n.º 2, 1.ª parte, do Código de Processo Civil e artigo 125.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário).


5) Sem prejuízo da invocada nulidade, sempre se afirma que a decisão recorrida não deverá subsistir, devendo, em qualquer caso, ser substituída por outra que julgue a presente ação de impugnação procedente e que, nessa medida, determine a anulação do ato de liquidação adicional de IRC, nos termos que se seguem.

6) Como decorre dos autos, a Administração tributária corrigiu o valor das provisões constituídas pela Recorrente para créditos em contencioso, tendo, em consequência, acrescido ao lucro tributável consolidado do Grupo o valor de Esc. 28.956.243$00 (€ 144.433,13).

7) Porém, contrariamente ao entendimento da Administração tributária - e do Tribunal a quo - os créditos respeitantes à T..., Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada, foram efetivamente reclamados judicialmente no ano de 1995: em concreto a Recorrente apresentou, tendo em vista a restituição dos referidos créditos, uma denúncia contra o gerente da T..., Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada, por emissão de cheque sem cobertura, no valor de Esc. 102.470$00 (€ 511,12).

8) Significa isto, por conseguinte, que a correcção do valor da provisão referente ao crédito sobre a T..., Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada é ilegal (cf. artigos 33.º, n.º 1, alínea a) e 34.º, n.º 1, alínea b) do Código do IRC e, bem assim, artigos 7.º e 71.º do Código de Processo Penal).
9) No que respeita à correção relativa ao acréscimo de 20% das despesas de representação, importa fazer notar que a P... Iluminação, Lda., acresceu, na linha 21 do quadro 17 da sua declaração anual, o montante de Esc. 1.063.342$00 (€ 5.303,93), correspondente a 20% do valor de Esc. 5.136.708$00 (€ 25.621,79), rectius, correspondente a 20% do montante global efetivamente suportado com despesas de representação.

10) Sucede que, por mero lapso, a P... Iluminação, Lda., inscreveu no quadro 37 da declaração individual relativa ao exercício de 1995 – campo onde devia estar inscrito o valor global suportado com despesas de representação - o valor total das despesas provisoriamente inscritas nas contas de despesas de representação e não o valor efetivamente incorrido com tais despesas.

11) Por esta razão, a Administração tributária acresceu, em sede de inspeção, ao lucro tributável consolidado o montante de Esc. 2.647.127$00 (€ 13.203,81).

12) Neste contexto, considerando que a correcção em causa vem exclusivamente fundamentada no facto de a P... Iluminação, Lda., ter registado, erroneamente, no quadro 37 da sua declaração individual o valor de Esc. 3.710.469$00 (€ 92.538,71) e não o montante efetivamente suportado - 5.136.708$00 (€ 25.621,79) - com despesas de representação, sempre se terá de concluir que a mesma representa um acréscimo ilegal do lucro consolidado do Grupo.


13) A P... Sistemas de Telecomunicações, Lda., registou na "conta 62227 - deslocações e estadas" o montante de Esc. 2.352.127,00 (€ 11.732,36).

14) A Administração tributária anulou a dedução do valor registado, e fiscalmente considerado, pela P... Sistemas de Telecomunicações, Lda. na "conta 62227 - deslocações e estadas" (Esc. 2.352.127,00, correspondente a € 11.732,36), por ter entendido que aquela "sociedade não tinha qualquer funcionário nos seus quadros nem ao seu serviço".

15) Sucede, no entanto, que ao longo do exercício de 1995, a P... Sistemas de Telecomunicações, Lda., teve, efetivamente, ao seu serviço vários trabalhadores com vínculo laboral à Recorrente, ao abrigo de uma prática contratual reiterada de cedência de trabalhadores entre as empresas do Grupo.

16) Assim, uma vez que as despesas em causa foram efetivamente suportadas pela P... Sistemas de Telecomunicações, Lda., e constituem obrigações assumidas por esta entidade para a realização da sua atividade económica, elas têm de ser relevadas contabilística e fiscalmente na sua esfera.

17) Sem prejuízo, caso se considere que as despesas de deslocação e alojamento em causa eram da responsabilidade direta da Recorrente, então aquelas despesas teriam de ser suportadas e consideradas custos dedutíveis na esfera desta sociedade, cabendo à Administração tributária o dever de efetuar a correção correlativa e, assim, eliminar o resultado no seio do Grupo.

18) A Administração tributária efetuou, igualmente, uma correção ao lucro tributável do Grupo, no valor de Esc. 38.453.927$00 (€ 191.807,38), relativa a créditos que a sociedade C... - C..., Lda., tratou como incobráveis.

19) A este propósito faz-se notar que em resultado da substituição da declaração modelo 22 de IRC da sociedade C... - C..., Lda., (i) o montante total de provisões fiscalmente relevantes para créditos de cobrança duvidosa sofreu uma redução - por utilização - de Esc. 35.136.953,00 (€ 175.262,38), passando de Esc. 161.355.974,00 (€ 804.840,10) para Esc. 126.219.021,00 (€ 629.577,82); (ii) as provisões fiscalmente não relevantes para créditos de cobrança duvidosa sofreram: uma redução de Esc. 4.989.934$00 (€ 24.889,19), por utilização; uma redução de Esc. 1.622.860$00 (€ 8.094,79) por reposição; e um acréscimo de Esc. 1.908.000$00 (€ 9.517,06); (iii) as provisões fiscalmente não relevantes para depreciação de existências sofreram uma redução (por reposição) de Esc. 60.000$00 (€ 299,28).

20) As reduções referentes às provisões fiscalmente relevantes foram efetuadas em função da inexistência de pagamento por parte dos devedores no âmbito dos processos judiciais contra eles instaurados pela C... - C..., Lda.

21) Diferentemente, as reduções relativas às provisões fiscalmente não relevantes foram sujeitas a um processo de write-off (eliminação) sem que a C... - C..., Lda., estivesse na posse de qualquer certidão judicial.

22) Assim, considerando que a mencionada utilização não corresponde a uma eliminação de provisões previstas no artigo 33.º, n.º 1, alínea a), do Código de IRC, não pode a mesma ser considerada proveito do exercício, nos termos do disposto no n.º 2 do mesmo artigo 33.º do Código do IRC.

23) Em face do exposto, impõe-se, pois, concluir, singelamente, pela ilegalidade da correção em apreço por violação ao disposto nos artigos 23.º, 33.º e 37.º do Código do IRC, devendo o ato de liquidação sub judice ser, também nesta parte, anulado.

24) Administração tributária também corrigiu o lucro tributável do Grupo no montante de Esc. 6.599.407$00 (€ 32.917,70) por entender que a Recorrente "considerou para o apuramento do seu lucro tributável a dedução excessiva efetuada no quadro 17 da sociedade dominante no valor de € 6.599.407$00, montante relativo à redução de provisões tributadas, resultante das seguintes situações:•2.001.000$00, relativo a um erro de cálculo na determinação do montante deduzido no quadro 17 (...);• 4.598.407$00, referente ao valor de parte da reposição de provisões tributadas que não foi considerada em proveitos extraordinários".

25) Sucede que, em 1995, a Recorrente adotou um procedimento segundo o qual a conta resultados extraordinários era normalmente movimentada pela redução de provisões consideradas desnecessárias/ excessivas, e não pelo seu efetivo consumo, que terá como contrapartida a própria provisão (conta balanço/classe 2, em contrapartida com a conta cliente).

26) Analisados os valores inscritos naquela conta conclui-se que o valor registado na conta de resultados extraordinários inclui o total das reduções de provisões para depreciação de existências e garantias a clientes, ascendendo a Esc. 129.893.563$00 (€ 647.906,36) em vez de Esc. 125.458.111$00 (€ 625.782,42) constantes da declaração “modelo 30 de IRC" submetida pela Recorrente.

27) Daqui infere-se que (i) o valor total a justificar ascende a Esc. 9.033.859$00 (€ 45.060,70); e que (ii) aquele valor respeita exclusivamente a reduções de provisões para créditos de cobrança duvidosa).

28) Ora, considerando que as provisões para créditos de cobrança duvidosas sofreram, ao longo do exercício de 1995, reduções no montante total de Esc. 155.611.401,00 (€ 776.186,40) e que o valor contabilizado foi de Esc. 154.150.845$00 (€ 768.901,17), apenas Esc. 1.460.556$00 (€ 7.285,22) poderiam estar omitidos nas contas de resultados. Porém, deste montante, parte - Esc. 1.173.183$00 (€ 5.851,81) - diz respeito a reparações incobráveis a equipamentos, que não são qualificáveis como proveitos.

29) Nestes termos, a correção em apreço e os atos de liquidação que a traduzem são ilegais por violação do disposto nos artigos 23.º e 33.º do Código do IRC, devendo, portanto, ser anulados.

30) Por último, a Administração tributária acresceu, ainda, ao lucro tributável consolidado do ano de 1995 o valor de Esc. 296.151.017$00 (€ 1.477.195,04), correspondente à diferença entre o valor deduzido [Esc. 464.972.386$00 (€ 2.319.272,48)] e "o saldo de prejuízos fiscais (...) a que o grupo teria direito a utilizar no exercício em análise'' [Esc. 168.821.369$00 (€ 842.077,44)].

31) Sucede, no entanto, que o saldo de prejuízos fiscais indicado - rectius, considerado - pela Administração tributária está errado, pois que encontra-se influenciado pela totalidade das correções feitas pela Administração tributária aos exercícios de 1992 e de 1993, quando é certo que a Recorrente já havia feito refletir, em parte, essas correções nas declarações de IRC - melhor dito, nos resultados do Grupo - dos exercícios posteriores àqueles.

32) Noutros termos, o saldo de prejuízos fiscais do exercício de 1995, tal como indicado pela Administração tributária no relatório de inspeção, não reflete as retificações entretanto realizadas pela Recorrente.

33) Em face do exposto, as correções efetuadas pela Administração tributária e os atos tributários que a traduzem são ilegais, por assentarem em erro sobre os respetivos pressupostos de facto e de direito, devendo, por conseguinte, ser correspondentemente anulados.

TERMOS EM QUE DEVE SER DADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELA RECORRENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, SER DECLARADA NULA A DECISÃO PROFERIDA PELO TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DE LISBOA. CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, DEVE A DECISÃO RECORRIDA SER REVOGADA, DETERMINANDO-SE, EM CONSEQUÊNCIA, A SUA SUBSTITUIÇÃO POR OUTRA QUE COMPORTE AS SOLUÇÕES JURÍDICAS ACIMA EXPOSTAS.»
A Recorrente, Fazenda Pública, apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES:

I. A liquidação adicional, já devidamente identificada nos autos, tem como fundamento correcções técnicas ao lucro tributável, correcções às deduções efectuadas ao lucro tributável consolidado e correcções do cálculo do imposto consolidado do grupo, cfr. relatório de inspecção efectuado pelos serviços da Administração Fiscal, que aqui se dá por plenamente reproduzido para todos os efeitos legais.

II. As provisões são uma consequência do princípio da especialização dos exercícios conjugado com o princípio da prudência fiscal, sendo a sua constituição obrigatória para efeitos fiscais, face à definição de critérios objectivos de constituição constantes do artigo 34.º do CIRC e à periodização do lucro tributável, cfr. artigo 18.º CIRC.

III. A função das provisões resume-se na inclusão num dado exercício de determinados custos que, de outro modo, nele não figurariam, dado a não existência de contrapartida para a movimentação, lacuna essa que a provisão procura suprir.

IV. O n.º 1 do artigo 34.º do CIRC (na redacção vigente à data dos factos) define as provisões para créditos de cobrança duvidosa fiscalmente dedutíveis, como aquelas em que o risco de incobrabilidade se considere devidamente justificado, estabelecendo a alínea b) do n.º 1 do artigo 34.º do mesmo diploma legal que o risco de incobrabilidade encontra-se verificado quando os créditos tenham sido reclamados judicialmente.

V. Não se podem dar como provados os requisitos impostos pelo artigo 37.º do CIRC, como o fez a douta sentença, ora recorrida, para serem aceites fiscalmente como custos do exercício, as provisões para os créditos incobráveis acima assinaladas.

VI. A Impugnante não provou nem documentou que intentou qualquer acção judicial com vista a reclamar os seus créditos, relativamente ao ano de 1995, tão pouco revelou qualquer acção ou esforço no sentido de reclamar os mesmos.

VII. Em nenhum momento, nestes autos, foi, pela impugnante, aduzido qualquer meio de prova destinado a suportar o seu registo contabilístico provisional, pois que das certidões apresentadas pela impugnante não resulta absolutamente provada a incobrabilidade das dívidas, nos termos acima referidos, muito menos que a impugnante tenha desenvolvido qualquer esforço no sentido de reclamar os seus créditos junto daquele processo de insolvência.

VIII. No que respeita aos custos das provisões a acrescer à determinação do lucro tributável, entendemos, salvo o devido respeito, que o acórdão na qual a douta sentença alicerçou a sua fundamentação - acórdão do STA de 25-06-2008, rec.n.º 0291/08 – não é susceptível de aplicação in casu.

IX. No exercício de 1993 a impugnante constituiu provisões excessivas do ponto de vista fiscal, o que acarretou que as importâncias registadas na contabilidade a título de custos, fossem, em parte, sujeitas a correcção fiscal, pelo que a impugnante excedeu o princípio da prudência fiscal patente no artigo 34.º do CIRC, designadamente ao efectuar a constituição excessiva de provisões.
X. Mas acontece que as importâncias não aceites como custo no ano de 1993, não estão incluídas na formação do lucro tributável dos exercícios de 1994 e 1995, pois que não foram consideradas para efeitos fiscais aquando da sua constituição, em 1993, ficando, assim, afastadas, do processo de determinação do lucro tributável no momento da sua utilização/reposição.
XI. Porquanto tal situação se reveste da maior relevância para a discussão desta matéria, a qual, com a devida vénia, não foi devidamente valorada pela douta sentença ora recorrida.
XII. Como muito bem nota a informação prestada ao abrigo do artigo 111.º do CPPT, pelos Serviços da Administração fiscal, § 64.º "Assim a eventual dedução do montante de 10.064.014$00 ao lucro tributável de 1995, só poderia ser objecto de apreciação se a impugnante tivesse utilizado noutro processo, os meios de contestação legalmente consagrados (cf. Reclamação de autoliquidação do exercício de 1993 – artigo 151.º do CPT) cujo prazo, no entanto, se encontrava já esgotada à data já esgotada à data da apresentação da presente impugnação”.
XIII. Em consequência, o crédito fiscal por investimento, o qual corresponde a 15% da colecta individual da sociedade dominante, deve manter-se, in totum, na ordem jurídica, tal como estipulado no relatório de inspeção, que aqui se dá por plenamente reproduzido para os devidos efeitos legais, em consequência das correções efectuadas ao lucro tributável consolidado constantes dos presentes autos, as quais, contrariamente ao afirmado na douta sentença, ora recorrida, se devem reputar de conformes à lei e, por isso, mantidas na ordem jurídica.
XIV. Pelo que, à Fazenda Pública, não se conformando com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, não resta senão concluir, salvo o devido respeito, que a douta sentença violou o disposto nos artigos 18.º, 34.º e 37.º, todos do CIRC.
TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DEVE A DOUTA SENTENÇA, ORA RECORRIDA, SER REVOGADA, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!»

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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido de da improcedência dos recursos.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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As questões invocadas pelas Recorrentes nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir são as seguintes:

Recorrente Impugnante:
_nulidade da sentença por omissão de pronúncia por não conhecimento dos vícios imputados às correções referentes à redução de provisões sobre devedores, e à dedução de prejuízos reportados de exercícios anteriores (conclusões 1 a 4);
_ erro de julgamento de facto e de direito relativamente às correções em que foi julgada improcedente a impugnação (conclusões 5 a 33);

Recorrente Fazenda Pública:

_ erro de julgamento de facto e de direito relativamente às correções relativas a provisões sobre créditos considerados incobráveis, custos relativos a provisões a acrescer à determinação do lucro tributável e crédito fiscal por investimento.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«III. SEGMENTO FACTICO

Com interesse para a decisão da causa resulta assente a factualidade que se passa a subordinar por alíneas:
A) A Impugnante tem por objecto social a exploração directa ou indirecta de todo e qualquer ramo de comércio ou indústria e, em especial, o comércio e fabrico de produtos e material eléctrico.
B) No exercício de 1995, a Impugnante encontrava-se sujeita ao regime de tributação do lucro consolidado (RTLC), previsto no artigo 59º do CIRC, sendo a sociedade dominante do Grupo constituída pelas seguintes sociedades: «C...- C..., Lda», «P... Iluminação, Lda» e «P... Sistemas Médicos, Lda».
C) Em Setembro de 1999, a Impugnante foi notificada do Relatório de Inspecção Tributária, emitido na sequência da acção de inspecção externa de âmbito geral referente ao exercício de 1995, levada a efeito pela Administração Tributária e Aduaneira em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 0082/99, do Senhor Director de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária. (Doc.n.º2 da p.i.)
D) Em Fevereiro de 1997, por escritura pública procedeu-se à fusão na Impugnante, por incorporação das sociedades, até então dominadas por esta. (Cfr. artigo 3º da P.I. e aceite pela Fazenda Pública)
E) Neste documento, a Administração tributária acresceu à matéria tributável do Grupo P... o total de € 2.072.635,11 (Esc. 415.526.032,00), correspondente à soma de € 595.440,06 (Esc. 119.375.015,00), referentes a correcções "ao nível do apuramento do lucro tributável consolidado" com € 1.477.195,04 (Esc. 296.151.017,00), relativos a correcções às "deduções ao lucro tributável consolidado". (Doc.n.º 2 da p.i.)
F) Adicionalmente, a Administração Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção ao imposto favorável à Impugnante, mediante a qual acresceu o valor de € 70.365,75 (Esc.14.107.066,00) ao montante deduzido por referência ao chamado crédito fiscal para o investimento (cujo limite máximo era proporcional à colecta). (Doc. n.º2 junto à p.i.)
G) O Serviço de Fiscalização Tributária elaborou o Mapa de Apuramento – Mod. DC -22, de cujo teor se destaca:
«ANEXO AO DC22/1° APº-EXº 1995 DO GRUPO "P... PORTUGUESA, SA»
LINHA 7 DO QUADRO 20: 28.956.243$00, relativo a provisões além dos limites legais.
O grupo considerou para o apuramento do resultado tributável consolidado, provisões constituídas pela sociedade dominante para créditos em contencioso cuja reclamação judicial, não deu entrada em tribunal no exercício de 1995 e portanto não é enquadrável nos termos da alínea b) do n° 1 do art.º 34° do CIRC. No entanto, os créditos mencionados encontravam-se em mora no exercício em análise, pelo que só deveriam ter sido provisionados nas percentagens estipuladas no nº 2 do art. 34° do mesmo código conforme anexo 2, fls 2.
(…)
LINHA 21 DO QUADRO 20: 2.647.127$00, relativo ao acréscimo de 20% das despesas de representação.
O grupo considerou para o apuramento do seu lucro tributável, o montante de 1.063.342$00 acrescido pela sociedade P... Iluminação, Lda, relativo a despesas de representação de acordo com o disposto na alínea g) do n° 1 do art. ° 41 ° do CIRC. No entanto o valor que deveria constar na linha 21 do quadro 17 da declaração desta sociedade seria de 3.710.469$00, correspondente a 20% do valor de despesas de representação de 18.552.346100 considerando no quadro 37. Assim, acresceu-se ao lucro tributável consolidado a diferença no montante de 2.647.127$00.
LINHA 22 DO QUADRO 20: 41.526.054$00, relativo a:

2.352.127$00, relativo a deslocações e estadas.

O grupo considerou para o apuramento do seu lucro tributável, várias despesas contabilizadas na conta 62- "Deslocações e Estadas" da sociedade P... Sistemas de Telecomunicações. Não se considerou que essas despesas fossem comprovadamente indispensáveis para a formação dos proveitos, conforme obriga o art.º 23° do CIRC, visto que esta sociedade não tinha qualquer funcionário nos seus quadros nem ao seu serviço.
• 38.453.927$00, montante relativo à utilização de provisões sobre devedores.

O grupo considerou para o apuramento do resultado fiscal consolidado, a utilização de provisões de créditos considerados incobráveis pela sociedade C... - C..., Lda, no montante total de 38.453.927$00 (valor total utilizado ou reposto - valor contabilizado em proveitos extraordinários). No entanto, para que os créditos possam ser considerados incobráveis é necessário que tenha sido proferida decisão judicial transitada em julgado, considerando que o devedor não possuía bens para solver a dívida em execução, ou que na sequência de processo de falência ou insolvência não foi também possível liquidar a mesma dívida. Das certidões apresentadas pelo contribuinte a incobrabilidade das dívidas não se encontra comprovada nos termos acima referidos, pelo que a "utilização" das respectivas provisões deverá ser considerada como proveito do exercício nos termos do nº 2 do art.º 33° do CIRC.
LINHA 1 DO QUADRO 12: 296.151. 017$00, referente à dedução de prejuízos fiscais consolidados.
O grupo procedeu na sua declaração de rendimentos à dedução de prejuízos no montante global de 464.972.386$00, montante este relativo a prejuízos do exercício de 1993 e 1995. No entanto, foi verificado o saldo de prejuízos fiscais (à data de 31/12/94) a que o grupo teria direito a utilizar no exercício em análise que ascendem apenas a 168.821.369$00 e correspondem a prejuízos não objecto de compensação em exercícios anteriores nos termos do art.º 59-A do CIRC, os quais correspondem a prejuízos do exercício de 1993 que não foram integrados na base tributável consolidada dos exercícios de 1993 e de 1994 das sociedades P... Portuguesa (82.092.537$00), da C... (23.527.152$00) e da sociedade P... Sistemas Médicos (63.201.680$00) (anexo 6, fls 6 a 8).» ( Doc. junto ao PAT não paginado)
H) Em Setembro de 1999, a Impugnante foi notificada do acto de liquidação adicional de IRC n.º 831 0..., praticado em consequência das mencionadas correcções efectuadas em sede de Inspecção. (Doc. n.º 1 da p.i.)
I) Nos termos da liquidação adicional a que alude a al.H) do probatório, a Administração Tributária e Aduaneira:
*aumentou a matéria colectável do Grupo, de € 1.640.258,33 (Esc. 328.842.270,00) para € 3.411.385,87 (Esc. 744.368.302,00);
*Efectuou a correspondente correcção da colecta, de € 2.945,37 (Esc. 590.492,99) para e 1.336.641,64 (Esc. 267.972.589,00);
*Liquidou juros compensatórios, no montante de € 325.251,17 (Esc. 65.207.005,00); e

*Corrigiu o valor a pagar para € 1.075.648,93 (Esc. 215.648.248,00).

J) Em 3.11.1999, a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação de IRC a que alude a al.H) do probatório.
1) Em 21.06.2001, a Impugnante foi notificada na liquidação de IRC n.º 833 0..., praticado com referência ao mesmo exercício de 1995, nos termos do qual a Administração Tributária e Aduaneira:
*reduziu a matéria colectável, apurada no anterior acto de liquidação adicional de IRC n.º 831 0..., de€ 3.712.8933,44 (Esc. 744.368.302$00) para € 3.411.385,87 (Esc. 683.921.462$00);
*efectuou a correspondente redução da colecta, de € 1.336.641,64 (267.972.589$00) para € 1.228.098,91 (Esc.246.211.726,00)
*reduziu os juros compensatórios liquidados de€ 325.251,17 (Esc. 65.207.005) para € 273.498,43 (Esc. 54.831.513);
*corrigiu o montante de IRC a pagar para € 904.500,69 (Esc. 181.336.107) (Doc. fls. 97 dos autos)

L) Na sequência do pedido de emissão de certidão contendo a fundamentação da liquidação adicional de IRC a que alude a al.I) do probatório a Impugnante foi notificada Outubro de 2001, nos termos seguintes termos:

a) Na sequência das correcções efectuadas, relativamente ao exercício de 1994, foram passíveis de dedução ao lucro tributável consolidado no exercício de 1995 e `recalculados´ os prejuízos integrados nesse exercício e consequentemente os seguintes. Assim, corrige-se a favor do grupo o montante de 60.446.840$00 relativo a prejuízos passíveis de dedução de acordo com a alínea b) do art.º 60.º do CIRC, os quais não foram integrados por força das correcções efectuadas em 1994 ";

b) Efectua-se a correcção de juros compensatórios a favor do contribuinte no montante de 10.375.192$00, correspondente à diferença entre os juros compensatórios liquidados no primeiro documento de correcção e os que deveriam ter sido calculados com base na nova colecta do exercício de 1995, de acordo com o disposto no n.º 2 do art.º 80.º do CIRC". ( Doc. fls. 93 dos autos)
M) Por despacho de 13.05.2002, do Director de Finanças de Lisboa, notificado à Impugnante através do oficio n.º 19892, de 15.05.2002, o acto de liquidação adicional de IRC n.º 831 …, foi objecto de revogação parcial, no sentido de considerar como credito como crédito de imposto de IRC, incidente sobre rendimentos sobre capitais, o montante de € 441.50 (88.512$00) e, no que diz respeito à utilização de provisões sobre devedores, no montante de € 1.172,87 (235.140$00).

N) Em 14 de Outubro de 1993, a Impugnante deu entrada junto do Dr. Delegado do Exmo. Procurador da Republica no Tribunal da Comarca de Setúbal uma queixa crime contra o Sr. J..., na qualidade de administrador da ''J... & Filhos", por prática de crime de abuso de confiança. (Doc.n.º3 junto á p.i).

O) O valor da queixa crime apresentada, ascendia ao montante de Esc. 90.668.528. (Doc.n.º3 junto á p.i).

P) Em 17 de Novembro de 1993, foi apresentado novo requerimento, no qual se acrescentava à queixa crime no valor de Esc. 90.668.528, o montante de Esc. 49.399.272. (Doc.n.º4 junto á p.i).

Q) O valor total da dívida do cliente "J... & Filhos", reclamada judicialmente no ano de 1993, na pessoa do seu administrador, ascende, assim, a Esc. 140.067.800. (Doc.n.º5 junto á p.i.)

R) Em 1995, a Impugnante apresentou denúncia crime, contra J..., titular do " T..." Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada, por emissão de cheque sem cobertura, a que corresponde o Proc. n.º 271/95 junto do Departamento de Investigação e Acção Penal. ( Doc.n.º 6 junto á p.i.)

S) Em 27.11.2000, foi emitida certidão pela 12ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, certificando que nos autos de acção Ordinária n.º 221/94, instaurados por «C...­ C..., Lda», contra «F... & Filha, Lda» por sentença de 29.11.1994, a qual foi notificada e transitou em julgado em 12.01.1995, foi aquela condenada a pagar a quantia de 13.979.014$00 objecto do pedido, mais se certificou « (...) nos presentes autos não consta que a autora tenha logrado receber, parcial ou parcialmente, a quantia objecto do pedido e respectivos acréscimos.» (Doc. fls. 71 dos autos)

T) Em 23.07.1999, foi emitida certidão pela Secretaria Geral Comum dos Tribunais Judiciais de Lisboa, certificando que nos autos de acção ordinária em que foi autora «C...- C..., Lda», e réu I... e mulher M..., que correram seus tramites pela 3º secção do 2° juízo cível, daquela Comarca sob o nº 3474, do ano de 1993, foram os mesmos à conta em 21.09.93, não constando que tenha recebido qualquer importância por conta do sue crédito.( Doc. fls. 72 dos autos) .

U) Em 24.03.2000, foi emitida certidão pela 12ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, certificando que nos autos de acção Ordinária n.º 6.687/93, instaurados por «C...­ C..., Lda», contra «A..., Lda» foi esta condenada a pagar a quantia da quantia exequenda no montante de 2.773.601$00, mais se certificou « (...) nos presentes autos não consta que a exequente a tenha logrado receber, parcial ou parcialmente, a quantia exequenda.» (Doc. fls. 73 dos autos)

V) Em 22.07.1999, foi emitida certidão pela 12ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, certificando que os autos de acção Ordinária n.º 11.189/94 instaurados por «C...­ C..., Lda» contra «S... - Electrónica, de Consumo, Lda» foram remetidos à conta em 23.09.1999, em virtude da exequente não lhe ter dado andamento, mais se certificou « (...) não constando dos autos que tenha recebido qualquer importância por conta do seu crédito.» (Doc. fls. 74 dos autos)

X) Em 03.10.1997, foi emitida certidão pela Secretaria Geral Comum dos Tribunais Judiciais de Lisboa, certificando que os autos de acção Ordinária n.º 13.384/97 instaurados por «C...­ C..., Lda», contra «B...» foram remetidos à conta em 28.01.1994, em virtude da exequente não lhe ter dado andamento. (Doc. fls. 75 dos autos)

Z) Em 22.03.1996, a secretaria do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, emitiu certidão, certificando que nos autos de acção Sumária n.º 2855/95, que correram termos no 3° Juízo, 2ª Secção instaurados por «C...­ C..., Lda», contra «M... - Comercio de Electrodomésticos, Lda» encontram-se em visto de correição deste 27.10.1005. (Doc. fls. 76 dos autos)

AA) Em 14.10.1997, a secretaria do 7º Juízo Cível da Comarca do Porto, emitiu certidão certificando que nos autos de Execução Ordinária n.º 634/90, em que é Exequente «C...­ C..., Lda», e Executado A..., que até aquela data não consta dos autos que a Exequente tenha recebido a quantia de 7.291.983$00. (Doc. fls. 78 dos autos)

AB) Em 15.03.1996, a secretaria do 1° juízo Cível da Comarca de Lisboa, emitiu certidão, certificando que se encontram pendentes os autos de acção Ordinária n.º 8.734/93, instaurados por «C...­ C..., Lda» contra «L...» com o valor de 16.919.330$00, encontrando-se os mesmos a aguardar impulso processual. (Doc. fls. 79 dos autos)

AC) Em 12.03.1996, a secretaria do 13º juízo Cível da Comarca de Lisboa, emitiu certidão, certificando que correm termos sob o n.º 6831/A/94, os autos de Execução de Sentença para pagamento de quantia de 962.257$00 em que é Exequente «C...­ C..., Lda», e executado A..., mais certificando que «não consta dos presentes autos que a exequente tivesse recebido a quantia exequenda nem que fossem conhecidos bens pertencentes á executada, encontrando-se as custas pagas». (Doc. fls. 80 dos autos)


FACTO NÃO PROVADOS

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito.


MOTIVAÇÃO DE FACTO

A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou do exame dos documentos, não impugnados, das informações oficiais constantes dos autos, conforme referido no probatório.»


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Conforme resulta dos autos, e com na matéria de facto supra, a Meritíssima Juíza do TAF de Sintra julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida da liquidação de IRC de 1995, que se fundamenta em várias correções técnicas ao lucro tributável consolidado da Impugnante efetuadas no âmbito de uma ação de inspeção.

Ambas as partes recorrem da sentença, na respetiva parte em que a decisão lhes é desfavorável.

Vejamos, então.

Começando com o recurso da Impugnante importa conhecer da omissão de pronúncia por não conhecimento dos vícios imputados às correções referentes à redução de provisões sobre devedores, e à dedução de prejuízos reportados de exercícios anteriores (conclusões 1 a 4).

Conforme resulta dos autos, a presente impugnação judicial foi intentada da liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 1995, tendo sido sindicadas as seguintes correções à matéria coletável:

_ correção no montante de 28.956.243$00 relativa a créditos em contencioso (provisão relativa ao cliente “J... & Filhos”, provisão relativa ao cliente “T...”, e custos relativos a provisões a acrescer à determinação do lucro tributável não considerados pela AT);
_ correção no montante de Esc. 88.512 relativa a IRC e a Contribuição Autárquica;
_ correção no montante de Esc. 2.647.127 relativa ao acréscimo de 20% das despesas de representação;
_ correção no montante de Esc. 2.352.127, relativa a despesas contabilizadas na conta 62 – “Deslocações e Estadas”;
_ correção no montante de Esc. 38.453.927 relativa a utilização de provisões sobre devedores;
_ correção no montante de Esc. 6.599,497, relativa a redução de provisões tributadas;
_ correção no montante de Esc. 296.151.017 relativa a dedução de prejuízos fiscais reportados a períodos anteriores;
_ correção no montante de Esc. 14.151.017 relativa ao crédito fiscal por investimento.

Na pendência da ação, foi revogada a correção ao lucro tributável relativa à retenção na fonte de IRC efetuada a uma entidade terceira (correção de Esc. 88.512$00), e revogou parcialmente a correção ao lucro tributável decorrente da utilização de provisões sobre devedores (correção de Esc. 235.140$00).

Portanto, analisada a sentença recorrida, constata-se que efetivamente não foi emitida pronúncia sobre correções referentes à redução de provisões sobre devedores, e correção relativa à dedução de prejuízos reportados de exercícios anteriores, questões suscitadas na p.i., e que não foram revogadas pela AT.

Pelo exposto, a sentença é nula por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no n.º 1, do art. 125.º do CPPT.

Passa-se de imediato ao conhecimento dessas questões não conhecidas na sentença recorrida, nos termos do disposto no art. 665.º do CPC, e posteriormente das demais questões invocadas nos recursos.

Relativamente à redução de provisões sobre devedores no montante de Esc. 6.599,497, a correção na parte impugnada diz respeito ao valor de parte da reposição de provisões tributadas que a AT entendeu que não foi considerada em proveitos extraordinários.

A Impugnante na p.i. vem invocar, em síntese, que na sua contabilidade uma redução de provisão não significa uma contrapartida em resultados extraordinários, porque adotam um procedimento que não implica a movimentação dessa conta pelo efetivo consumo de provisões, e assim sendo, o valor a justificar deve-se exclusivamente a redução de provisões de créditos de cobrança duvidosa, cujo método de cálculo é global, não se distinguindo as provisões tributadas das não tributadas.

Contudo, a recorrente limita-se a alegar procedimentos contabilísticos próprios sem sustentar na lei a sua atuação, e sem demonstrar a sua efetiva existência, bem como o concreto impacto na correção efetuada, limitando-se a alegar na p.i. que o procedimento adotado conduz a que uma redução de provisão não significa uma contrapartida em resultados extraordinários.

Ora, ao invés, a AT efetuou a correção de forma fundamentada demonstrando os pressupostos das sua atuação (n.º 1, do art. 74.º da LGT), nomeadamente, entendeu que numa parte existia um erro de cálculo na determinação do montante deduzido no quadro 17, o que resulta demonstrado no anexo 4 ao relatório de inspeção, e por outro lado, na outra parte entendeu que parte da reposição de provisões tributadas não foram consideradas em proveitos extraordinários, porém foram deduzidas do quadro 17, tal como se demonstrou no anexo 4 ao relatório de inspeção.

Ademais, tais alegações contabilísticas da Impugnante, ainda que não provadas, foram minuciosamente analisadas pela informação oficial da AT constante do processo administrativo, na qual é demonstrado que tais alegações não afastam a correção que foi efetuada pela AT. Ou seja, apesar das alegações da Impugnante, esta não logrou demonstrar inequivocamente que o procedimento contabilístico que adotou tem respaldo na lei, aliás, nada diz a respeito da regularidade desse procedimento contabilístico divergente.

Pelo exposto, nesta parte, a correção não enferma de vício de violação de lei, improcedendo, as conclusões 24 a 29 das conclusões de recurso.

Quando à correção relativa à dedução de prejuízos reportados de exercícios anteriores invoca a Impugnante na p.i. que se verifica erro sobre pressupostos de facto na medida em que a correção não teve em conta que parte dos valores corrigidos no âmbito das ações de inspeção aos exercícios de 1992 e de 1993 já haviam sido refletidos nos resultados declarados. Nas conclusões 30 a 33 das alegações de recurso a Impugnante vem reiterar o invocado.

Contudo, por um lado, dos documentos juntos pela Impugnante aos autos, aliás, apenas com as alegações do art. 120.º do CPPT, não resulta demonstrado o alegado pela Impugnante, conforme se impunha face às regras do ónus da prova (n.º 1, do art. 74.º da LGT), e por outro lado, esta questão foi analisada na informação oficial junta ao processo administrativo, tendo sido analisados os argumentos da Impugnante que não importam a ilegalidade das correções.

Efetivamente, a AT demonstrou minuciosamente os seus cálculos através de um quadro analítico, no qual constam os movimentos de prejuízos constantes de declarações individuais com os respetivos saldos de anos anteriores, prejuízos do exercício, prejuízos deduzidos no exercício, e saldo do ano seguinte bem como os movimentos de prejuízos considerados na declaração de consolidação, o que contraria o alegado pela Impugnante. Ora, não tendo a Impugnante trazido aos autos elementos que infirmem a correção impugnada, terá de improceder o invocado.

Pelo exposto, importa concluir, também nesta parte, que não assiste razão à Impugnante.

Prosseguindo no conhecimento dos fundamentos do recurso da recorrente Impugnante.

Invoca a recorrente, relativamente a provisões constituídas para créditos em contencioso relativamente à “T...” foram efetivamente reclamados em 1995, através da denúncia contra o gerente daquela sociedade por emissão de cheque sem cobertura (conclusões 5 a 8).

Contudo, apenas resulta assente que a Impugnante apresentou uma denúncia no âmbito de um processo crime por cheque sem cobertura (alínea R) dos factos provados), o que de per se, não integra a “reclamação judicial” prevista no art. 34.º, n.º 1, alínea b) do CIRC para a constituição de provisão para créditos de cobrança duvidosa.

Na verdade, não resulta provado que tenha sido apresentado pedido de indemnização civil no âmbito do processo crime para ressarcimento do montante do crédito, o que tanto basta para ser manifesto que não existe prova da reclamação judicial dos créditos em questão.

Por outras palavras, apenas resulta provado a apresentação de uma denúncia crime, mas não a tentativa de recuperação do crédito referido, o que se evidenciaria através do pedido de indemnização civil, e assim sendo, improcede o recurso nesta parte.

Relativamente à correção relativa ao acréscimo de 20% das despesas de representação invoca a recorrente Impugnante que a correção é ilegal porque a correção apenas vem fundamentada no facto da Impugnante ter registado erroneamente no quadro 37 da declaração individual o valor em questão, e não o montante efetivamente suportado (conclusão 9 a 12).

Resulta da fundamentação da correção ora em causa que o valor que deveria constar na linha 21 do quadro 17 da declaração modelo 22 não correspondia aos 20% do valor das despesas de representação declaradas no quadro 37 (18.552.346$00). Sublinhe-se que a Impugnante não contesta estes factos, apenas alega que houve um lapso na inscrição do valor do quadro 37. Ora, considerando que tal valor se encontra efetivamente inscrito no quadro 37, encontra-se legitimada a atuação do AT, nos termos do n.º 1 do art. 74.º da LGT.

Não obstante, a Impugnante vem alegar que existiu um lapso na inscrição dos valores no quadro 37, alegado diversos factos na p.i. acerca da forma como relevava na contabilidade as despesas de representação e as deslocações e acerca de normas internas da Impugnante e que estarão na origem do alegado lapso.

Contudo, não demonstra o alegado, conforme se impunha face às regras do ónus da prova (n.º 1, do art. 74.º da LGT), sendo certo que ao contrário do que entende o erro não se encontra corrigido na linha 21 do quadro 17 da declaração, porque o que importava é demonstrar que o valor constante da sua contabilidade, apurado pela AT, e que se encontra inscrito no quadro 37 não corresponde efetivamente a despesas de representação, o que não logrou fazer.

Pelo exposto, e nesta parte, improcede os fundamentos do recurso.

No que diz respeito à correção relativa à conta “62227 – deslocações e estadas”, no montante de 2.352.127$00, entende a recorrente Impugnante que tais despesas dizem respeito a cedência de trabalhadores entre empresas do grupo, efetivamente suportadas, e de todo o modo, ainda que se entendesse que eram diretamente da responsabilidade da Impugnante, então, devia a AT ter efetuado a correção correlativa, eliminando o resultado no seio do grupo (conclusão 13 a 17).

Resulta do relatório de inspeção que a correção se fundamenta no entendimento da AT de que tais despesas não são comprovadamente indispensáveis para a formação dos proveitos, nos termos do art. 23.º do CIRC, considerando que a empresa não tinha qualquer funcionário nos seus quadros, nem ao seu serviço.

A Impugnante confirma que no exercício em causa não tinha trabalhadores ao seu serviço (cf. art. 59.º da p.i.), contudo, entende que tais despesas devem ser aceites como custo porque havia uma “prática contratual reiterada de cedência de trabalhadores” entre as empresas do grupo.

Ora, a questão é que os custos em causa não eram faturados às empresas do grupo como a própria Impugnante admite (cf. art. 61.º da p.i.), e nessa medida, a despesa não se encontra comprovada, nos termos do art. 23.º do CIRC.

Assim sendo, importa concluir que a AT demonstrou os pressupostos da tributação, sendo certo que a Impugnante não logrou provar o alegado, de acordo com as regras da distribuição do ónus da prova (cf. art. 74.º, n.º 1 da LGT).

Na verdade, tais despesas não se encontravam evidenciadas na contabilidade da Impugnante, não havia faturação entre as sociedades do grupo, e, por conseguinte, cabia-lhe comprovar a existência efetiva desses custos, designadamente, cabia-lhe fazer prova do que no exercício de 1995 teve efetivamente ao seu serviço vários trabalhadores ao abrigo da prática contratual que alegou, o que não logrou fazer.

Efetivamente, ao contrário do que entende a recorrente, o regime da consolidação previsto no art. 59.º do CIRC não justifica de modo a algum a inexistência de documentos comprovativos da existência da despesa. Por outro lado, a inexistência da comprovação dos custos ora em causa legitima, de igual modo, a atuação da AT em não fazer a correção correlativa.

Pelo exposto, improcede, também nesta parte as conclusões de recurso.

Também não se conforma a recorrente Impugnante com a correção relativa a créditos que a sociedade “C...” tratou como incobráveis. Entende a recorrente que as reduções das provisões fiscalmente relevantes foram efetuadas em função da existência de pagamento por parte dos devedores no âmbito dos processo judiciais instaurados, diferentemente, as provisões fiscalmente não relevantes foram sujeitas a um processo de write-off (eliminação) sem que tivesse na posse de qualquer certidão judicial, pelo que a utilização não corresponde a uma eliminação de provisões prevista no art. 33.º, n.º 1, alínea a) do CIRC, não podendo ser considerada proveito do exercício nos termos do n.º 2 do art. 33.º do CIRC (conclusão 18 a 23).

Conforme resulta do relatório de inspeção a correção assentou no entendimento da AT de que das certidões apresentadas pela Impugnante não resulta comprovada a incobrabilidade das dívidas, e assim sendo, a “utilização” das provisões respetivas foi considerada proveito do exercício nos termos do n.º 2, do art. 33.º do CIRC.

Ora, tal como se entendeu na sentença recorrida, que analisou as certidões apresentadas pela Impugnante, das mesmas não constava o valor das dívidas, não se alcançando o valor dos respetivos créditos, sendo certo que noutros casos não foi apresentada certidão (apenas procedeu a impugnação quanto à certidão referente ao cliente A...).

Ou seja, a verdade é que para que a Impugnante não deu cumprimento ao disposto no art. 37.º do CIRC ao não ter comprovado a incobrabilidade das dívidas, que deve resultar “de processo especial de recuperação de empresa e proteção de credores ou de processos de execução, falência ou insolvência”.

Efetivamente no art. 37.º do CIRC existe “uma exigência específica de “existência de um processo judicial” condicionante da possibilidade de serem relevados na contabilidade da credora os créditos desta considerados incobráveis, que foi afirmada no preceito de forma inequívoca o que se compreende para evitar abusos ou arbítrio dos sujeitos passivos credores mas não se exige que para a sua consideração, os mesmos créditos tenham de ser declarados incobráveis por decisão judicial transitada em julgado.” – cf. nesse sentido acórdão do STA de 20/06/2018, proc. n.º 01532/14.

Deste modo, e independentemente das alegações da recorrente verifica-se legitimada a atuação da AT nos termos do n.º 1 do art. 74.º da LGT, aliás que são devidamente rebatidas contabilisticamente na informação oficial da AT constante do processo administrativo, demonstrando que tais alegações não têm a virtualidade de afastar a correção. Na verdade, a Impugnante não logrou demonstrar que o que vem alegar nas suas conclusões 18 a 23 das alegações de recurso, in casu, afasta os requisitos no art. 37.º do CIRC, pelo que improcedem aquelas conclusões, sendo de manter a sentença recorrida.

Em suma, e quanto aos erros de julgamento invocados, improcede in totum os fundamentos do recurso, sendo de manter a sentença recorrida nesta parte.

Relativamente ao recurso da Fazenda Pública, esta insurge-se contra a sentença recorrida na parte em que anulou a liquidação.

Relativamente à correção relativa a utilização de provisões sobre devedores a recorrente Fazenda Pública considera que aquela certidão não prova a incobrabilidade da dívida, não se verificando os requisitos do art. 37.º do CIRC. Entende que a Impugnante não documentou que intentou ação judicial com vista a reclamar os seus créditos de 1995, face ao princípio da especialização dos exercícios previsto no art. 18.º do CIRC, e ao disposto na alínea b), do n.º 1, do art. 34.º do CIRC, esses custos devem ser imputados ao exercício em que o risco de incobrabilidade se considera devidamente justificado. Por outro lado, para que os créditos sejam incobráveis, tem de ser proferida decisão transitada em julgado considerando que o devedor não tinha bens para solver a dívida em execução ou em processo de insolvência ou falência não tivesse sido possível liquidar a dívida (conclusões I) a VII).

Contudo não lhe assiste razão.

Antes de mais cumpre referir que a Fazenda Pública não pode nesta sede invocar outros fundamentos para além os que assentaram o ato tributário para defender a legalidade da correção, nomeadamente, não pode invocar a violação do princípio da especialização dos exercícios, como decorre das suas alegações 22.º e ss que complementam a conclusão II, porque não consubstancia a fundamentação da correção.

Portanto, a apreciação do erro de julgamento da sentença recorrida parte da fundamentação do ato tributário, que é contemporânea ao ato, não sendo admissível fundamentação a posteriori, ou seja, não pode a Fazenda Pública em sede do presente recurso invocar outras razões de facto e/ou de direito que não constem da fundamentação da correção subjacente à liquidação impugnada.

“I - No contencioso de mera legalidade, como é o caso do processo de impugnação judicial previsto no art. 99.º e segs. do CPPT, o tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do acto sindicado em face da fundamentação contextual integrante do próprio acto, estando impedido de valorar razões de facto e de direito que não constam dessa fundamentação, quer estas sejam por ele eleitas, quer sejam invocados a posteriori.
II - Assim, não pode a AT, em sede de recurso jurisdicional, pretender que se aprecie a legalidade da correcção que esteve na base da liquidação impugnada à luz de outros fundamentos senão aqueles que constam da declaração fundamentadora que oportunamente externou” – cf. acórdão do STA de 28/10/2020, proc. n.º 02887/13.8BEPRT.

A correção relativa a utilização de provisões sobre devedores assentou no entendimento da AT de que para que os créditos sejam consideráveis incobráveis é necessário a certidão de que tenha sido proferida decisão judicial transitada em julgado, considerando que o devedor não possuía bens para solver a dívida, ou que na sequência do processo de falência não foi possível liquidar a mesma. Das certidões apresentadas pelo contribuinte a incobrabilidade das dívidas não deverá considerada.

Portanto, importa aferir se a sentença recorrida erro quando considerou justificada a provisão com base na certidão emitida pelo 13.º juízo civil da Comarca de Lisboa que refere que não são conhecidos bens do executado, e, portanto, se mostra demonstrada a impossibilidade da Impugnante cobrar coercivamente o seu crédito (cf. Ponto 4 da sentença recorrida).

Como se escreveu no acórdão do STA de 20/06/2018, proc. n.º 01532/14: I - Créditos incobráveis são aqueles que não podem ser recebidos pelo credor ou porque o devedor não queira pagar ou não tenha realmente com que pagar e relativamente aos quais se reconhece a perda, sem esperança de boa cobrança, designadamente por inexistência de bens penhoráveis evidenciada judicialmente (quanto a esta última asserção vide o referido Ac. deste STA de 10/10/2012 tirado no rec. 0782/12 disponível no site da DGSI).
II - O art. 37.º do CIRC, admitia como custos ou perdas do exercício os créditos que, para além do mais, resultassem incobráveis “na medida em que tal resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência”
III - Essa norma não exigia que tais créditos só pudessem ser contabilizados como créditos incobráveis mediante sentença com trânsito em julgado que declarasse a sua incobrabilidade.”

Ora, in casu, face ao facto dado como provado na alínea AC), a incobrabilidade do crédito em causa resulta de um processo de execução, que se encontra tipificado no art. 39.º do CIRC, e nessa medida, pode ser diretamente considerado como custo ou perda do exercício.

Ou seja, ao contrário do que entendeu a AT a certidão apresentada é suficiente para atestar a incobrabilidade da dívida, não sendo necessário que tenha sido proferida decisão judicial transitada em julgado, a atestar que o devedor não possuía bens para solver a dívida, ou que na sequência do processo de falência não foi possível liquidar a mesma.

Pelo exposto, e nesta parte, improcedem os fundamentos de recurso da Fazenda Pública.

Relativamente aos custos com provisões a acrescer à determinação do lucro tributável, a sentença recorrida entendeu que a AT estava obrigada, no apuramento do lucro tributável, a fazer uma correção correlativa, designadamente, considerar-se como custo do exercício de 1995, a parte excedente do custo não aceite em 1993, deduzido do montante já reclamado pela Impugnante relativamente a 1994.

A recorrente não concorda com o decidido, porque, por um lado, entende que a impugnante excedeu no exercício de 1993 o princípio da prudência do art. 34.º do CIRC, e por outro lado, as importâncias não aceites como custo no ano de 1993, não estão incluídas na formação do lucro tributável dos exercícios de 1994 e 1995, pois não foram consideradas para efeitos fiscais na data da sua constituição em 1993. Nessa medida, entende a recorrente que a pretensão da impugnante sempre estaria fora do âmbito destes autos que se reportam a 1995 (conclusões VIII a XII).

Vejamos.

A AT, por força do princípio da justiça tributária a AT está obrigada a fazer as correções correlativas que se imponham por força das correções efetuadas, ainda que a favor do contribuinte.

Na verdade, a tal não obsta o princípio da especialização dos exercícios, pois esse princípio “deve tendencialmente conformar-se e ser interpretado de acordo com o princípio da justiça, com conformação constitucional e legal (artigos 266.º, n.º 2 da CRP e 55.º da LGT), por forma a permitir a imputação a um exercício de custos referentes a exercícios anteriores, desde que não resulte de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios.” – cf. acórdão do STA de 14/03/2018, proc. n.º 0716/13.

In casu, as correções efetuadas assentaram no entendimento de que nesse exercício foram excedidos os montantes máximos estabelecidos no n.º 2 do art. 34.º do CIRC, e assim sendo, sem as correções correspetivas a Impugnante não poderá deduzir a totalidade da provisão que foi constituída em 1993. Apesar de a Impugnante em 1993 não ter respeitado as percentagens máximas previstas na lei para o montante anual acumulado de provisão, e por essa razão a correção nesse exercício tem respaldo na lei, a verdade é que, se a AT não fizer as correções correlativas que se impõem em 1995, exercício em que também vem a efetuar correções nas provisões (e por essa razão considera-se que esta questão ainda se encontra no âmbito da presente impugnação), a Impugnante não irá deduzir a totalidade da provisão que foi constituída em 1995, e nessa medida, o princípio da justiça impõe que tais provisões sejam consideradas posteriormente.

Pelo exposto, improcede, nesta parte, os fundamentos do recurso da Recorrente Fazenda Pública, e, por conseguinte, também improcedem as conclusões de recurso XII a XV, relativamente ao crédito fiscal ao investimento, na medida em que a sentença recorrida entendeu que face às ilegalidades apontadas, e consequentemente, tais correções não se poderiam manter, devendo ser correlativamente ajustadas, e, por conseguinte, mantendo-se a sentença recorrida, nessa medida, também se mantém a decisão nessa parte.

Em suma, improcedem todas as conclusões de recurso da Recorrente Fazenda Publica, pelo que será negado provimento ao seu recurso.

Em matéria de custas o artigo 527.º do CPC consagra o princípio da causalidade, de acordo com o qual paga custas a parte que lhes deu causa. Vencidas na presente causa ambas as recorrentes, importa concluir que estas deram causa às custas do presente processo em partes iguais, e, portanto, devem ser condenadas nas respetivas custas na proporção de 50% cada uma.


Contudo, o presente processo foi instaurado em data anterior a 01/01/2004, e portanto, a Recorrente Fazenda Pública está isenta de custas ao abrigo do art. 3.º, n.º 1, al. a), do Regulamento das Custas dos Processos Tributários, e art. 9.º, do DL n.º 29/98, de 11 de Fevereiro, que aprovou tal Regulamento.

Nos termos do n.º 7 do art. 6.º do RCP, «[n]as causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento».

Trata-se, pois, de uma dispensa excecional que depende de uma concreta e casuística avaliação pelo juiz e deve ter lugar aquando da fixação das custas ou, no caso de aí ter sido omitida, mediante requerimento de reforma da decisão — cf., neste sentido, o acórdão de 15/10/2014, do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, no proc. n.º 01435/12.

Ora, considerando que a complexidade das questões, a conduta processual das partes que foi a normal e adequada, bem como ponderado o montante da taxa de justiça que será devida com base no valor da presente causa, face ao concreto serviço prestado, revela-se adequado e necessário face ao princípio da proporcionalidade, dispensar o remanescente da taxa de justiça, nos termos do n.º 7 do art. 6.º do RCP – cf. Ac. do STA de 18/03/2015, proc. n.º 01160/13: “Justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do RCP, se o montante da taxa de justiça devida se afigura desproporcionado em face do concreto serviço prestado, tendo em conta, designadamente, que a questão sujeita a recurso já foi anteriormente objecto de diversas decisões deste Supremo Tribunal e que o acórdão, usando da faculdade concedida pelo n.º 5 do art. 663.º do CPC, remeteu para a fundamentação expendida por aresto anterior.” (sublinhado nosso).


Sumário (art. 663.º, n.º 7 do CPC)

O art. 37.º do CIRC, na redação vigente no exercício de 1995, admitia como custos ou perdas do exercício os créditos que, para além do mais, resultassem incobráveis face a processo especial de recuperação de empresa e proteção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência, não se exigindo o trânsito em julgado da respetiva sentença.



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II. DECISÃO


Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em declarar nula a sentença recorrida, e em substituição, nessa parte, julgar improcedente a Impugnação judicial, no demais negar provimento ao recurso da Impugnante, e negar provimento ao recurso da Fazenda Pública.


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Custas por ambas as partes, na proporção de 50% para cada uma, sem prejuízo da isenção de que beneficia a Fazenda Pública, dispensando-se as partes do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

D.n.

Lisboa, 11 de março de 2021.


A Juíza Desembargadora Relatora

Cristina Flora

A Juíza Desembargadora Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo art. 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Juízes Desembargadores Tânia Meireles da Cunha e Susana Barreto.