Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | NUNO PINTO OLIVEIRA | ||
Descritores: | ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA REQUISITOS VALORES MOBILIÁRIOS COMPRA E VENDA INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA CULPA DO LESADO AÇÃO CAUSAL DEVER DE INFORMAÇÃO DIREITO À INDEMNIZAÇÃO PRINCÍPIO DA JUSTIÇA | ||
Data do Acordão: | 12/12/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
Sumário : | I — O artigo 476.º do Código Civil poderá aplicar-se, directa ou indirectamente (por analogia), a transmissões de valor, ainda que a forma da transmissão de valor não seja a realização de uma prestação. II — O requisito da imediação ou da unidade do procedimento de enriquecimento significa que, entre empobrecimento e enriquecimento, não deve encontrar-se um facto intermédio ou, em todo o caso, não deve encontrar-se um património intermédio, de terceiro. III — Estando em causa a aplicação do requisito da imediação ou da unidade do procedimento de enriquecimento, os critérios mais simples, de aplicação automática ou quase-automática, devem abandonar-se em favor de critérios mais complexos, por que se exige uma ponderação global ou uma valoração global, orientada, p. ex., pelo comum sentimento de justiça. | ||
Decisão Texto Integral: | I. — RELATÓRIO 1. Caixa Geral de Depósitos S.A. propôs a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra AA, pedindo que o Réu seja condenado a restituir à Autora a quantia de 105.684,05 euros, acrescida de juros moratórios à taxa anual legal supletiva dos juros civis, desde 15 de Janeiro de 2021, e até efectivo pagamento. 2. O Réu AA contestou, defendendo-se por impugnação e por excepção. 3. Invocou, inter alia, o abuso do direito da Autora Caixa Geral de Depósitos S.A., em consequência da cativação de saldo bancário de 81.836,57 euros. 4. Em 7 de Fevereiro de 2023, o Tribunal de 1.ª instância proferiu sentença em que julgou totalmente improcedente a acção. 5. O dispositivo da sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância é do seguinte teor: 1. Pelo exposto, o Tribunal decide julgar improcedente por não provada a presente acção e, em consequência decide absolver o Réu do pedido. 2. Custas a cargo da A. 6. Inconformada, a Autora Caixa Geral de Depósitos S.A. interpôs recurso de apelação. 7. O Réu AA contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso. 8. Em 29 de Junho de 2023, o Tribunal da Relação de Guimarães julgou parcialmente procedente o recurso. 9. O dispositivo do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães é do seguinte teor: Nestes termos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente o presente recurso, revogando a sentença recorrida e, em sua substituição, julgam a acção parcialmente procedente, condenando o Réu a restituir à autora a quantia de €104.553,13 (cento e quatro mil, quinhentos e cinquenta e três euros e treze cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal para as obrigações civis, contados da citação, sobre o montante de €22.716,56 (vinte e dois mil, setecentos e dezasseis euros e cinquenta e seis cêntimos), até efectiva e integral restituição. Custas, em ambas as instâncias, pelas partes, na proporção da sucumbência. 10. Inconformado, o Réu AA interpôs recurso de revista. 11. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: A) O Tribunal de primeira Instância - Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo – Juízo Central Cível de ... – Juiz 1 - absolveu o R., aqui Recorrente da acção intentada pela A., aqui Recorrida, de enriquecimento sem causa. B) Enquanto que o Tribunal da Relação de Guimarães entendeu o oposto e condenou o aqui Recorrente em acção de enriquecimento sem causa, julgando-a parcialmente procedente, condenando o Réu a restituir à Autora a quantia de €104.553,13, acrescida de juros de mora à taxa legal para as obrigações civis, contados da citação, sobre o montante de €22.716,56, até efectiva e integral restituição. C) Nos termos do artigo 674.º n.º 1 alinea a) do CPC, vimos apresentar os fundamentos para o Recurso de Revista, e entendemos estar perante tanto num erro de interpretação dos factos provados no caso concreto e num erro de aplicação do artigo 374.º do CC, pois deveria o Tribunal de Relação de Guimarães ter decidido não se aplicar o instituto do enriquecimento sem causa ao caso em concreto ao não o fazer interpretou mal a prova produzida e aplicou o direito de forma errada, D) pois, sem alterar factos, e aplicando somente o direito consegue fazer uma subversão da leitura dos factos para aplicar e reconhece estarmos perante um enriquecimento sem causa, vejamos, E) A sentença proferida nos presente autos pelo JUIZO CENTRAL CÍVEL DE ... – JUIZ 1, não merecia qualquer repreensão ou censura, pelo que a mesma logrou a aplicação efectiva do direito na submissão aos factos. F) A mesma reconhece não haver qualquer enriquecimento sem causa e justifica da seguinte forma: “No caso vertente, entende-se não existir um enriquecimento sem causa por parte do Réu, e que sobretudo que esse enriquecimento tivesse sido obtido à custa empobrecimento da A. Na verdade, e quanto a este aspecto, o que a A. qualifica de seu empobrecimento mais não é do que uma consequência nefasta de um erro imputável aos seus próprios serviços como de resto assumiu desde logo na p.i. A ter havido enriquecimento do R., o mesmo não advém causalmente do empobrecimento do património da A.. A A. é que para reparar um erro dos seus serviços teve de suportar um prejuízo, o que não se pode confundir com um empobrecimento com base no qual se deu o enriquecimento do Réu. De resto quanto ao alegado enriquecimento do Réu, este, desconhecendo o evento de reverse stock split, e no convencimento legítimo de ser titular e ter em carteira 25.000 acções (já que por lapso da Autora não foi actualizada a carteira do Réu por efeito daquele evento), vendo o Réu que no mercado as mesmas estavam a valorizar passou a vendê-las através de várias ordens de venda, que a própria A. cumpriu! E dessa venda retirou o respectivo lucro / mais valias. Durante o período em causa, ou seja, durante 29 dias, o R. procedeu à venda de 20.000 das 25.000 acções que tinha adquirido e constavam da sua carteira, mediante as expectativas que a cotação das mesmas tinha subido sobremaneira, e vendeu-as pois constavam disponíveis na sua carteira. Ou seja, o enriquecimento do R. está fundado, por um lado, na titularidade de determinado número de acções, que para si constavam formalmente da sua carteira, carteira essa que não tinha sido actualizada pelos serviços da A., e por outro em ordens de venda dessas mesmas acções dadas pelo Réu, quando viu a sua valorização no mercado bolsista, que a própria A. cumpriu. Perante isto, entende-se que não se está propriamente em face de um enriquecimento sem causa justificativa. Por outro lado, também não se pode olvidar que o Réu, em virtude da venda das acções em causa, e para abater eventuais mais valias efectuou também a venda de acções que tinha em carteira em desvalorização, venda que não faria se não ocorresse a vendas das primeiras. Por último, não se pode olvidar que entre A. e R. estabeleceu-se um contrato de intermediação financeira, que a A. cumpriu ou executou em erro a si própria imputável, pelo que será ou seria no âmbito das regras que regem tal contrato que as vicissitudes verificadas entre A. e R. deverão ou deveriam ser objecto de tratamento, pelo que lançar mão do instituto do enriquecimento sem causa não seria o único meio de a A. obter eventual indemnização ou restituição.” G) Em virtude desta sentença a ali A. recorreu para o Tribunal da Relação de Guimarães apresentando alegações que não correspondem à realidade, então: H) A Autora no seu recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães formula conclusões no ponto 5) e no ponto 7) que são absolutamente falsas, a saber: “5) Ou seja, o enriquecimento do apelado só se tornou possível porque a apelante teve de adquirir o diferencial das ações em falta, sem o que a venda das mesmas e o correspetivo encaixe/enriquecimento daquele no valor de €105.684,00 não teria existido, verificando-se assim uma ligação funcional imediata entre o lapso da A. na atualização do número de ações, as ordens de venda dadas pelo apelado, e a aquisição do diferencial das ações pela apelante que originou o enriquecimento daquele e o empobrecimento desta;” “7) Certo é que sem a aquisição destas ações pela apelante o apelado não teria visto o seu património enriquecido e, não fora essa aquisição, não teria a apelante visto empobrecer o seu património;” I) O Réu obteve o encaixe financeiro logo com a venda das acções que constavam na sua carteira entre o dia 20-12-2020 até dia 15-01-2021, o R. foi vendendo as suas acções, o montante das vendas efectivas foram logo cumpridas e efectuado o pagamento devido, J) O R. não teve de aguardar que a A. adquirisse o diferencial das acções em falta, para o R. ter o retorno ou encaixe financeiro das acções vendidas– o que é absolutamente falso, - quando a A. se apercebe do seu erro grosseiro a 15-01-2021 e o Réu já tinha embolsado na sua conta bancária o valor das acções efectivamente vendidas!!! K) A A. falta à verdade, o Réu foi vendo o seu património enriquecido à medida que ia vendendo as acções, as ordens eram cumpridas e o valor das mesmas era pago ao Réu, logo em 15-01-2021 o R. já tinha o valor todo disponível na sua conta bancária das vendas que tinha efectuado! L) Assim não entenderam os Exmos. Srs. Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Guimarães, o qual proferiram Acórdão com fundamentação totalmente oposta ao Tribunal de primeira instância e com a qual discordamos na integra, vejamos: M) O Tribunal da Relação de Guimarães entendeu que: “Efectivamente, no caso em apreço provou-se que ocorreu uma deslocação do património da Autora para o património do Réu, correspondente ao valor de 19.800 acções de que o mesmo não era titular e, por isso, de que não podia dispor, nem fazer seu o produto da respectiva venda. Essa deslocação patrimonial, na parte em que excede o valor correspondente às 200 acções, fundada num mero lapso dos serviços da Autora, carece de justificação legal ou negocial e enriqueceu nessa exacta medida o património Réu. Por força dessa deslocação patrimonial a favor do Réu, a Autora (CGD) viu o seu activo diminuído ou o seu passivo aumentado, nessa exacta medida. Inexiste qualquer relação obrigacional, negocial ou legal que justifique tal deslocação patrimonial, e aquela prestação (montante transferido pela Autora para a conta do Réu pela venda de 19.800 acções que este não detinha), ou seja, a deslocação patrimonial, não tinha qualquer finalidade típica juridicamente tutelada. Existe a necessária correlação entre o enriquecimento (recebimento indevido) e o empobrecimento da Autora (transferência ou depósito efectuado com base em erro dos serviços – facto provado sob o nº16). Embora na sentença recorrida se refira que não seria a este meio (restituição com base no enriquecimento sem causa) que a autora deveria ter recorrido, antes a questão deveria ter sido dirimida no âmbito das regras que regem o contrato de intermediação financeira, certo é que também refere que a Autora “cumpriu ou executou em erro a si própria imputável!”, pelo que não vislumbramos nem é adiantado na sentença de que modo, através das citadas regras contratuais, quando a falta, que leva ao enriquecimento do Réu, é imputável à Autora, poderia esta reaver o que para ele transferiu ou depositou indevidamente, sem ser através do recurso a este instituto do enriquecimento sem causa. Pelo anteriormente exposto entendemos que se mostram preenchidos os pressupostos da obrigação de restituir com fundamento em enriquecimento sem causa, competindo ao Réu restituir à Autora a quantia com que injustificadamente se enriqueceu, correspondente a €104.553,13 (€105.684,05 - €1.130,92) – factos provados sob os nºs 24, 25 e 26.” N) Na parte da fundamentação do Acordão os Srs. Juízes Desembargadores entenderam existir “… (montante transferido pela Autora para a conta do Réu pela venda de 19.800 acções que este não detinha)…” O) A A. não transferiu nenhum valor para a conta do Réu, o valor existente na sua conta bancária foi o produto da venda das acções existentes na sua carteira!!!!! P) Mais justificam os Srs. Juízes desembargadores que : “…Existe a necessária correlação entre o enriquecimento (recebimento indevido) e o empobrecimento da Autora (transferência ou depósito efectuado com base em erro dos serviços – facto provado sob o nº16).” Q) Tal justificação não pode colher, não estamos perante nenhum depósito ou transferência de valores da A. para o R., alias o facto provado sob n.º 16 diz o seguinte: “Com as vendas / alienação realizadas das 20.000 acções resultou um crédito na conta do R. no montante de €105.684,05, conforme doc. 5 e 5-A, fls. 16 a 20 vº.” R) mais uma vez andou mal o Acordão do Tribunal da Relação de Guimarães, mas a justificação persiste: “…que leva ao enriquecimento do Réu, é imputável à Autora, poderia esta reaver o que para ele transferiu ou depositou indevidamente, sem ser através do recurso a este instituto do enriquecimento sem causa….“ S) Insistimos que não houve nenhuma transferência ou depósito por parte da Autora para a conta do Réu, o que existiu foi que a Autora incumpriu gravemente o seu dever de informação e de actualizar as plataformas que dispõe aos seus clientes para compra e venda de acções, e o Réu somente vendeu aquilo que detinha, os valores que o Réu recebeu foram os valores das vendas das acções e esses valores foram pagos por quem as adquiriu e não pela Autora!!!! T) Parece-nos estar claro que o Tribunal da Relação de Guimarães efectivamente não compreendeu a questão em discussão nos autos e por esse motivo as justificações apresentadas não se coadunam com a realidade dos factos. U) Mais, se assim fosse estariam a abrir uma porta para que o lesante pudesse ser premiado pelo seu erro, e ao que entendemos saber no ordenamento Português não há tutelas para empobrecimentos com causa (própria), que é o que a Autora sempre pretendeu com esta acção. V) Fundamentação esta do Tribunal da Relação de Guimarães que discordamos na integra e acresce que a mesma está em discordância com acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no Processo: 20210/20.3T8LSB.L1-7 já transitado em julgado. W) A fundamentação do Acordão da Relação de Guimarães não se encontra em consonância com a realidade efectiva, pois vejamos quando na sua fundamentação os Srs. Juízes Desembargadores assumem que “Inexiste qualquer relação obrigacional, negocial ou legal que justifique tal deslocação patrimonial, e aquela prestação (montante transferido pela Autora para a conta do Réu pela venda de 19.800 acções que este não detinha), ou seja, a deslocação patrimonial, não tinha qualquer finalidade típica juridicamente tutelada.” X) Discordamos, pois o aqui Réu detinha efectivamente as acções 25.000 por isso as conseguiu vender 20.000,00, caso não as detivesse o sistema não permitia que as mesmas fossem vendidas!!! Y) Existiu aqui uma incorrecta interpretação do caso concreto e uma incorrecta aplicação do direito aos factos provados, acórdão proferido que ora se recorre ao decidir como decidiu fez uma subversão dos factos ao direito. DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA: Z) Então, para que possa ser aferido se existiu ou não um enriquecimento à custa de outrem, que possa subsumir no artigo 473º n.º 1 do Código Civil a Recorrente teria de ter preenchido cumulativamente todos os quatro requisitos legais, a saber: a. a existência de um enriquecimento; b. a obtenção deste à custa de outrem; c. a falta de causa justificativa dessa valorização patrimonial; d. que a lei não faculte ao empobrecido outro meio de ser restituído/indemnizado. AA) Na acção que correu termos e da mesma resultou a douta sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo – Juízo CentralCível de ... – Juiz 1 fez prova do não preenchimento dos requisitos supra elencados, cabendo a absolvição do Réu. BB) Não existiu um “enriquecimento” que foi obtido à custa de outrem, CC) A existência do “enriquecimento” do Réu encontra-se fundado na titularidade do número de acções que efectivamente detinha na sua carteira de acções nas datas em que procedeu à sua venda, caso as acções não tivessem disponíveis na sua carteira o Réu não as poderia ter vendido. DD) Alerta-se para o facto do Réu ter dado várias ordens de venda de acções ao longo de 29 dias, que foram cumpridas e os valores das vendas recebidos na sua conta bancária. EE) Pois, a Autora admitiu que os seus funcionários cometeram um erro, mas esse erro não pode prejudicar o Réu, os erros devem ser suportados por quem os pratica, e não vir a A. 29 dias depois tentar responsabilizar o R. pelo erro de terceiros, pretendendo a A. ficar sem qualquer prejuízo dos erros por si cometidos e imputando os prejuízos ao R. que nenhum comportamento activo teve na prossecução desse erro. FF) O Réu deu as várias ordens de venda das acções por 29 dias, elas sempre foram cumpridas, e automaticamente com as vendas o valor foi encaixado na conta do Réu, logo o alegado enriquecimento do Réu foi justificado pela venda das acções que este possuía, bem como é justificado pelo mercado financeiro. GG) Assim houve a existência de um negócio ou facto que legitimou este enriquecimento – a venda de acções que efectivamente possuía -, o qual se encontra justificado. HH) Logo o “enriquecimento” está justificado numa relação ou facto que de acordo com os princípios do sistema jurídico, justifique a deslocação patrimonial, que concretamente foi a venda de acções existentes na sua carteira. II) Acresce que, a venda das acções de que o Réu era titular ocorreu entre 20/12/2020 até ao dia 15/01/2021, e com a alteração de ano de ano 2020 para ano 2021, o Réu iria ter várias mais valias correspondentes às vendas efectuadas ainda em 2020, então para esbater as mesmas teve de vender acções que tinha e que se encontravam a desvalorizar, conforme vem facto provado na douta sentença. JJ) Acresce que a Autora nunca contestou ou impugnou o negócio jurídico da venda propriamente dita efectuada na plataforma disponibilizada pela Autora, pelo que aceitou o negócio!!! KK) Mais, durante esses 29 dias o Réu vendeu acções e os valores da venda foram logo depositados na sua conta, não teve este que aguardar que a Autora alegadamente comprasse acções para que os valores fossem disponibilizados. LL) Assim conforme justificação na douta sentença o enriquecimento não advém casualmente do empobrecimento do património da Autora!!! MM) O que acontece é que a Autora teve de suportar um prejuízo em consequência de um erro seu, o que não é confundível com o empobrecimento com base no qual se deu o enriquecimento do Réu. NN) Como vem justificado na douta sentença, não é possível à Autora pedir a restituição de um valor que não se perdeu. OO) Quanto ao requisito de a falta de causa justificativa dessa valorização patrimonial – o enriquecimento do Réu está justificado na titularidade de um número de acções que constavam na sua carteira, carteira essa gerida pela plataforma da Autora, e pelas várias ordens de venda emitidas pelo Réu que foram cumpridas pela Autora, PP) Assim o “enriquecimento” está plenamente justificado, existia um contrato de intermediação financeira, no qual estavam abrangidas as acções em discussão nos autos, as mesmas valorizaram e o Réu emitiu ordens de venda que foram cumpridas pela A. e os valores foram depositados na sua conta bancária. QQ) Se tais ordens foram cumpridas ou executadas em erro, esse erro só poderá ser imputável à própria Autora e não ao Réu. RR) Pelo que não aceita o Réu que esteja em face de um enriquecimento sem causa, pelos argumentos trazidos e pelos factos dados como provados o seu enriquecimento está mais que justificado. SS) A conduta da Autora à luz do Código de Valores Mobiliários, então: O art. 304º, nº5 do Cod. Val. Mob. é claro quanto à distinção entre princípios e deveres no quadro do exercício de intermediação financeira, destacando cinco princípios que se impõem ao intermediário financeiro, à Autora: Principio da protecção dos legítimos interesses dos clientes; o principio da eficiência do mercado; o principio da observância dos ditames da boa fé (de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência); o principio da recolha de informação sobre a situação financeira, experiência e objectivos dos clientes; e o principio do segredo profissional. TT) Logo aqui parece evidente que a Autora com a sua conduta violou os 4 princípios elencados, somente não tendo violado o princípio do segredo profissional. UU) No âmbito do contrato de intermediação financeira, a contribuição culposa do cliente apenas está prevista em condições muito exigentes, face ao dever do intermediário financeiro de manter uma conduta não apenas diligente, mas diligentíssima, relativamente ao agravamentodos danos pelos quais o intermediário financeiro é responsável perante o cliente. VV) Pelo que a Autora bem sabendo que não iria lograr obter a sua pretensão através das normas do código de valores mobiliários, tentou a sua sorte no instituto do enriquecimento sem causa, apesar do Réu não ter tido nenhuma intervenção no erro da Autora. WW) Mas mais, caso a Autora fossem pela interpretação e integração das leis do código de valores mobiliários, poderia ainda ser severamente condenada pela sua conduta, pois é que, XX) Quando a Autora se apercebe do seu erro grosseiro o Réu vai consultar a sua conta bancária e verifica que se encontram cativados €81.836,57 (oitenta e um mil oitocentos e trinta e seis euros e cinquenta e sete cêntimos) da sua conta à ordem, sem ter sido informado e sem ter dado o seu consentimento!!! - Conforme provado nos autos! YY) Assim a Autora, agiu a seu bel prazer e como se fosse detentora daquela quantia e cativou-a sem mais, sem qualquer ordem judicial para o efeito. ZZ) Não faz qualquer sentido a pretensão da Autora, esta comete erros grosseiros e pretende que seja o Réu a sofrer as consequências e a reparar esses mesmos erros. AAA) Assim não poderá ser considerado um enriquecimento ilícito do Réu pois este não locupletou nenhum valor, somente deu ordem de venda de acções que existiam na sua carteira e disponível para venda, ao invés da Autora que efectivamente locupletou-se já desde 15/01/2021 da quantia de €81.836,57 depositada à ordem do Réu. BBB) Efectivamente a Autora não logrou provar 3 dos requisitos necessários ao preenchimento do instituto do enriquecimento sem causa, pelo que a sua pretensão não poderá ter provimento. CCC) Ainda o Acordão do Tribunal da Relação de Guimarães proferido nos presentes autos encontra-se em contradição com outro - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Processo: 20210/20.3T8LSB.L1-7, - já transitado em julgado, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, nomeadamente o preenchimento dos requisitos do enriquecimento sem causa. DDD) Vejamos o, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Processo: 20210/20.3T8LSB.L1-7, EEE) A fundamentação aqui utilizada na parte em que decidem a não aplicação do enriquecimento sem causa, e onde justificam o porque do não preenchimento dos requisitos é semelhante ao caso em concreto que trazemos para analise no presente recurso, a saber: FFF) Numa conduta semelhante à da Autora incorreu o banco BPI na acção descrita supra, e da qual podemos retirar várias semelhanças com a situação de facto existentes nos autos de que se recorre, e justificar a inexistência de um enriquecimento sem causa por parte da Autora, a saber: GGG) Não se vislumbra que o enriquecimento do Réu careça da causa justificativa, significando apenas o funcionamento do mercado de capitais. HHH) O empobrecimento que o Banco - Autora sofreu, apenas emergiu da sua obrigação legal de efetuar tais recompras, consequência dos seus erros operacionais e da violação dos seus deveres de informação enquanto intermediário financeiro. III) A justificação que foi proferida neste Acordão da Relação de Lisboa que explica o entendimento de não haver um enriquecimento sem causa, tem absoluto paralelo com os presentes autos, vejamos: JJJ) Importa, por isso, realçar que a questão central que se coloca nestes autos – e que o Banco quer, a todo o custo, fazer desaparecer – é a flagrante e gravosa violação, enquanto intermediário financeiro, do seu dever de prestar uma informação completa, verdadeira, atual. KKK) A razão pela qual as vendas (das acções do Réu) foram realizadas foram diversos erros operacionais, todos imputáveis ao Banco, a que acresce a violação do dever de informação a que o mesmo estava obrigado. LLL) Os erros operacionais cometidos pela Autora apenas possibilitaram a ida ao mercado de capitais, o incremento no activo patrimonial que se verificou é, simplesmente, o resultado do funcionamento desse mercado de capitais, que tanto permite situações de avultados e inesperados enriquecimentos, e quanto situações de graves e irrecuperáveis prejuízos. MMM) não há uma relação directa entre a violação do dever de informação doBanco e os erros operacionais que praticou, e o enriquecimento do réu. NNN) A Autora efectuou as recompras de acções porque era sua obrigação legal fazê-lo, e fê-lo em consequência dos seus erros (muito graves) operacionais, e da violação (muito grave) do seu dever de informação, enquanto intermediário financeiro. OOO) O réu recebeu o valor devido pelas acções que vendeu, de acordo com as regras do mercado de capitais. PPP) Perante isto, nunca faria sentido o R. ser condenado a restituir o que quer que fosse ao Banco, uma vez que era o Banco, o responsável por os indemnizar por todos os danos que lhes fossem causados, pois que uma qualquer devolução seria, no mínimo, de uma flagrante e gravosa injustiça , pois que se tratar-se-ia de beneficiar o infractor, o lesante. QQQ) Na verdade, existe claramente uma causa que justifica toda a vantagem obtida: é o simples funcionamento dos mercados. RRR) E se há regras quanto àquilo que se pode transacionar – claro – como o Banco sabe perfeitamente mas teima em querer fazer esquecer, também existem regras quanto à responsabilidade dos intermediários financeiros pela falta de informação, pela tutela da confiança dos investidores e quanto à protecção de terceiros de boa-fé. SSS) À luz do erro cometido e sobejamente demonstrado nos presentes autos, o que o Banco -Autora pretende é, em vez de assumir as suas responsabilidades, imputar os prejuízos que os lesantes, ele próprio, alegadamente sofreu, para a esfera do Réu lesado, chegando ao ponto de desconsiderar completamente o próprio mecanismo de buy in, leia-se de “compra forçada” – que é, já em si, um mecanismo de responsabilização da entidade que coloca os valores mobiliários no mercado, de modo a garantir que exista a liquidação dos mesmos. TTT) Pelo exposto entendemos que é cristalino que deve ser confirmada e mantida na íntegra a Decisão proferida pelo Tribunal de Primeira instância proferida em 7 de Fevereiro de 2023 a propósito da inaplicabilidade do instituto do enriquecimento sem causa ao caso concreto, que interpretou e aplicou corretamente o Direito aos factos que foram carreados para os autos e deverá ser anulado o Acordão do Tribunal da Relação de Guimarães. UUU) Finalmente, VVV) Apreciando os factos, resulta evidente que o réu obteve com a venda das mencionadas acções um aumento do seu activo patrimonial, mas a questão que se coloca é a de saber se esse aumento de activo patrimonial se traduz num enriquecimento injustificado, ou sem fundamento jurídico, porque indevidamente recebido, ou em razão de um efeito que deixou de existir, ou de um efeito que se previa mas que não se veio a verificar. WWW) O requisito negativo da ausência de causa jurídica não se esgota nos exemplos que constam do artigo 473.º, n.º 2, do Código Civil (como refere LUÍS MANUEL TELES MENEZES LEITÃO, «a ausência de causa justificativa é seguramente o conceito mais indeterminado no âmbito do enriquecimento sem causa»). XXX) No caso dos autos, a Autora não tratou de actualizar a carteira de acções do Réu após o evento corporativo do qual não prestou qualquer informação ao Réu, só tendo sido informado o Réu da existência de um evento corporativo 29 dias depois dele ter acontecido e quando este já tinha vendido 20.000,00 acções que constavam na sua carteira, YYY) Ficou demonstrado também que, antes deste evento corporativo, a Autora não prestou qualquer informação que lhe era exigível nos termos do disposto no artigo 7.º do Código dos Valores Mobiliários. ZZZ) Assim o incremento do património activo do réu, com estas vendas é, apenas, o resultado do funcionamento das leis do mercado de capitais, pois poderiam não ter conseguido obter qualquer lucro com tais vendas. AAAA) O réu, recebeu o valor devido pelas acções que vendeu, de acordo com as regras do mercado de capitais. BBBB) O Réu actuou no exercício dos seus direitos e poderes, não tendo tido conhecimento de qualquer evento corporativo, provando-se, ao invés, o erro operacional e a falta do dever de informação por parte do Banco, aqui Autora. CCCC) A Sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, mostra-se – como se vê – particularmente bem estruturada, sistematizada e fundamentada, demonstrando um raciocínio lógico, escorreito e preocupado em ser claro. DDDD) A Autora faz por não querer perceber e desviar as atenções do essencial: foi a sua conduta, foram os erros por si cometidos, foi a falta de informação por si prestada, foi a normal disponibilização do sistema ao Réu para prosseguir a sua actividade bolsista, que permitiu que este vendesse acções que constavam na sua carteira de acções. EEEE) A Autora age, actua e recorre como se tivesse sido o Réu a agir mal, quando este apenas actuou com a normalidade de um detentor de acções em Bolsa (vendendo-as por estarem valorizadas), quando foi a Autora a única a agir de uma forma desastrada, sem reconhecer as consequências dos seus erros e procurando, além do mais, castigá-los – basicamente – por existirem enquanto tal. FFFF) Não havia nada que apontasse para que o Réu pudesse entender que não podia vender as suas acções, ou que as não pudessem vender, ou que soubesse do erro que a Autora tinha cometido. GGGG) Por outro e mesmo que assim não fosse, porque aquilo a que chama de enriquecimento sem causa do Réu não pode ser considerado um enriquecimento, mas simplesmente o normal funcionamento das regras do mercado bolsista, em que um investidor vende as acções que tem disponíveis, de forma a com isso lucrar: as acções, aumentaram o seu valor (e podiam perfeitamente ter descido) e a decisão natural foi de venda. HHHH) O Réu não teve um qualquer enriquecimento à custa da Autora, mas à conta das acções que detinha, nos termos em que as detinha, e com base na falta de informação que a Autora não prestou, (ou seja, nada à conta da Autora e muito menos sem causa justificativa). IIII) Assim, o que podemos dizer sobre este “enriquecimento” é que não corresponde a uma deslocação patrimonial da Autora para o Réu, e que tem uma causa: as regras do mercado bolsista e o facto de as acções serem suas (pois nada lhes tinha sido indicado em sentido contrário). JJJJ) Por fim, e quanto ao “empobrecimento” da Autora, o mínimo que se pode dizeré que tem causa e ela não é a venda das acções pelo Réu mas o “lapso operacional” por si cometido que induziu este em erro e levou a que por força das regras internacionais a que está vinculado, tivesse que proceder à recompra das acções. Para reparar o seu erro. KKKK) Teve custos? Evidentemente que sim, mas são custos derivados do seu erro e não custos por qualquer conduta menos própria do Réu, ou por qualquer aproveitamento anómalo da sua parte. LLLL) E não há tutelas para empobrecimentos com causa (própria). MMMM) Na prática, a Autora queria que fosse o Réu a pagar pelos seus próprios erros. NNNN) Por tudo o alegado e pelos factos provados deve ser proferido Acordão que decida que o caso concreto não preenche os requisitos do instituto do enriquecimento sem causa nos termos do artigo 374.º do CC., devendo assim ser revogada a decisão do Tribunal da Relação de Guimarães e mantida a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância do Juízo Central de .... NESTES TERMOS E NOS MAIS E MELHORES DE DIREITO, QUE V. EXAS. MUITO DOUTAMENTE SUPRIRÃO: A) Requer-se a V. Exas. a admissão da presente Revista por preenchidos e verificados todos os seus requisitos e pressupostos; B) Seja revogado o Acordão recorrido e substituído por outro, julgando o Recurso totalmente procedente, ASSIM SE FAZENDO INTEIRA, SÃ E COSTUMADA, JUSTIÇA! 12. A Autora Caixa Geral de Depósitos S.A. contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso. 13. Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões. 1) O recorrente fundamenta boa parte deste seu recurso num douto Ac. do TRL, processo: 20210/20.3T8LSB.L1-7, que alegadamente “julgou situação semelhante”, situação esta que, todavia, não é como alega atendendo a que esse aresto não aborda situação semelhante ao caso sub judice, apresentando apenas alguns traços fácticos comuns, sendo que tratando-se de situações não análogas não se podem extrair de tal douto aresto do TRL as conclusões que o recorrente pretende ver aplicadas a este processo; 2) Com efeito, na análise da fundamentação de facto e de direito desse citado aresto conclui-se que a instituição de crédito aí em questão intentou ação com fundamento em responsabilidade contratual, como pedido principal, e com base no enriquecimento sem causa, como pedido subsidiário, situação que não se verifica no caso aqui em análise atendendo a que a CGD não invocou nesta sua ação como causa de pedir a título principal a violação de um contrato, mas apenas e tão-somente as regras do enriquecimento sem causa; 3) Ainda, no caso aqui em análise o incremento patrimonial verificado no património do recorrente nada teve que ver com o que o douto aresto do TRL apelidou de “funcionamento do mercado de capitais”, desde logo porque de acordo com tal funcionamento o recorrente teria direito a receber no máximo 1.130,92 € (cfr. nº 30 dos factos provados), e não os 105.684,05 € (cfr. nº 25 dos factos provados) que efetivamente auferiu; 4) Nem tão pouco se verificou a hipótese tratada nesse aresto segundo a qual caso o réu “não tivesse vendido as ações como vendeu, teriam até valorizado mais o seu património” atendendo a que no caso sub judice não foi alegada nem demonstrada tal matéria; 5) Por último, na presente ação nunca esteve em discussão se se verificou ou não violação do dever de informação por parte do banco relativamente ao seu cliente, realidade esta que está subjacente ao juízo de direito formulado pelo citado acórdão do TRL; 6) O TRG apreciou e ponderou todas questões versadas nas alegações recursórias apresentadas pela aí apelante CGD, nomeadamente as conclusões 5ª e 7ª, que aliás enumerou e concretizou no seu douto acórdão, sendo certo que o aqui recorrente nunca invocou em sede de contra alegações nesse mesmo Tribunal que a CGD “faltou à verdade” nessas conclusões (5ª e 7ª) da sua, então, apelação sendo pprtanto intempestivo fazê-lo agora; 7) O que se passou – e que consta provado na douta fundamentação de facto já definitivamente fixada nas instâncias – foi factualmente que por força do evento societário de Reagrupamento de Ações (Reverse Stock Split) da empresa em causa, a partir de 18.12.2020 por cada lote de 100 (cem) ações os acionistas (como o aqui recorrente), passavam a deter apenas 1 (uma) ação (cfr. factos provados nºs 4 a 6 e 9), pelo que, por força desse evento as 25.000 ações de que era portador o recorrente passaram efetivamente e materialmente a ser apenas 250; 8) Todavia, atendendo a que a CGD não atualizou atempadamente o seu sistema por forma a refletir na carteira deste seu cliente este evento societário o aqui recorrente continuou a deter formalmente na sua carteira 25.000 “ações”, embora nas datas em que realizou as vendas de 20.000 “ações”, já fosse só materialmente proprietário de apenas 250 ações (cfr. factos provados nºs 10 a13), atendendo a que as restantes tinham deixado de existir; 9) Significa isto que o aqui recorrente efetivou ordens de venda de 20.000 “ações” quando na verdade já não detinha de jure 20.000 títulos, mas apenas 200, tendo portanto vendido títulos que materialmente já não existiam, vendas estas de que auferiu o montante de €105.684,05 (nº 16 dos factos provados); 10) Como o número daquelas ações que a CGD possuía custodiadas na respetiva Central Depositária de títulos via City Bank havia já sido convertido por esta mesma Central para as referidas 250 ações, tal originou uma divergência entre os títulos depositados na sua conta de Ativos Financeiros e os títulos constantes na dita Central Depositária que a CGD teve de colmatar – atendendo a que as ordens de venda não podiam deixar de ser cumpridas (nº 13 dos factos provados) - mediante a aquisição de 19.800 ações, pelo que, atenta esta divergência, a CGD despendeu na aquisição que se viu forçada a realizar a quantia de 125.000,00 € (cfr. nºs 27 e 28 dos factos provados); 11) Ora, caso o aqui recorrente tivesse vendido as 200 ações de que era efetivamente titular (e não as 20.000, que materialmente, de jure, já não detinha) teria auferido, à melhor cotação o montante de apenas 1.130,92 € (cfr. nºs 29 e 30 dos factos provados), e não os €105.684,05 que auferiu; 12) O efeito direto e imediato do evento denominado Reverse Stock Split (RSS) é a valorização das ações que compõem o capital social da empresa, efeito esse que advém apenas e exclusivamente da redução do seu número, e não de qualquer valorização resultante do mercado bolsista, como sucederia, por exemplo, se a empresa tivesse conseguido uma valorização decorrente da entrada de novos clientes; 13) Atendendo a que o recorrente vendeu ações que já não existiam a CGD teve de as adquirir para poder honrar, na sua qualidade de intermediária financeira, as ordens de compra dadas pelo aqui recorrente atenta a respetiva irreversibilidade das ordens de compra; 14) Com efeito, sem a aquisição dessas ações pela CGD o aqui recorrente não tinha 19.800 ações para entregar a quem as adquiriu, atendendo a que as mesmas já não existiam, pelo que sem tal aquisição pela CGD os créditos que foram sendo efetivados na sua conta bancária à medida que ia vendendo as “ações” não tinham razão qualquer razão substantiva de ser nem qualquer correspondência com a realidade e teriam de ser devolvidos pelo recorrente; 15) Tais créditos só puderam assim ser mantidos na conta do aqui recorrente precisamente porque a CGD teve de honrar as ordens de compra e adquirir as ações que o seu cliente já materialmente não detinha, o que possibilitou a entrega de tais ações aos respetivos adquirentes, ações estas que, todavia, a CGD teve de adquirir ao preço após o evento RSS; 16) Pelo que, o enriquecimento do R. não está legitimado face às regras e princípios do nosso Ordenamento Jurídico e apenas estaria legitimado se as ações existissem de jure no património do R. aqui recorrente, o que não sucedia, como ficou provado; 17) Ao contrário do que invoca o recorrente, este não está a ser “responsabilizado por um erro grosseiro por parte dos funcionários da Autora”, desde logo porquanto ao recorrente a CGD apenas pediu a devolução do montante que teve de despender e que equivale àquele com que o recorrente viu o seu património injustificadamente enriquecido; 18) O que o recorrente pretende é recolher de tal erro proveitos ilegítimos, situação esta que não é admissível face ao Direito e às mais elementares regras da boa fé, agindo como se de tal erro pudesse extrair-se justificação de jure para o seu ganho; 19) A lógica do recorrente é a seguinte: a CGD cometeu um erro, pelo que, existindo esse erro, que não é imputável ao recorrente, tem este direito a beneficiar de tal erro; 20) De acordo com tal arrevesada “lógica” caso alguém transfira por lapso dinheiro para a conta bancária do recorrente (por engano na indicação do IBAN, por exemplo) este tem direito a ficar com ele porque “não pode ser responsabilizado pelos erros dos outros”; 21) O enriquecimento do recorrente verificou-se porque este vendeu ações que materialmente já não detinha, ações estas que já não existiam e que, consequentemente, já não deveriam constar sequer da sua carteira de títulos, e, por outro lado, sem a aquisição das 19.800 ações pela CGD o aqui recorrente não poderia entregá-las a quem as adquiriu, porque materialmente não as detinha, pelo que sem tal aquisição os créditos que lhe foram sendo efetivados na conta bancária à medida que ia vendendo as “ações” não tinham qualquer razão substantiva subjacente nem qualquer correspondência com a realidade, tendo de ser devolvidos/estornados à respetiva procedência; 22) O enriquecimento do recorrente não se encontra “fundado na titularidade do número de ações que efetivamente detinha na sua carteira” (cfr. nº 43 das alegações do recorrente), e que “caso não detivesse as ações o sistema não permitia que as mesmas fossem vendidas” porquanto está provado que tais ações não existiam (cfr. nº 11 dos factos provados); 23) O recorrente pretende inculcar que o seu enriquecimento afinal resultou do livre jogo das “regras de mercado”, o que até contradiz a sua arrevesada lógica, que é a de que houve um erro do banco, erro este pelo qual refere não poder ser responsabilizado, alicerçando todavia a sua pretensão nesse erro, mas esquecendo que tal erro obviamente nada teve que ver com as “regras do mercado”; 24) Ao contrário do que afirma o recorrente o que se verificou – ganho/enriquecimento de €105.684,05 - nada teve que ver com o funcionamento das “regras de mercado”, mas antes com a verificação de um erro administrativo/informático do qual o recorrente pretende agora ilegitimamente beneficiar; 25) Com efeito, o valor que o recorrente deveria efetivamente ter auferido decorrente daquilo a que apelida de “regras de mercado” era apenas 1.130,92 € (cfr. nºs 29 e 30 dos factos provados), porquanto era esse o valor de mercado das ações de que era real e materialmente titular, e isto caso as tivesse vendido à mais alta cotação de mercado que se verificou no intervalo de tempo em que procedeu à venda das “ações”; 26) Não foi portanto o “mercado financeiro” que lhe permitiu receber €105.684,05, mas sim o erro verificado na sua carteira de ações quanto a este título em concreto, e do qual o recorrente se pretende aproveitar; 27) Vem também o recorrente invocar a alegada violação de deveres constantes do Código de Valores Mobiliários e do Regime Geral das Instituições de Crédito; Todavia, não obstante o R. aqui recorrente ter invocado tais alegadas violações em sede de contestação as mesmas só seriam relevantes para o mérito desta ação caso o R. tivesse deduzido pedido reconvencional, o que não fez, ou caso tivesse invocado tais alegadas violações como exceções atinentes à não verificação (factos impeditivos, modificativos ou extintivos) do direito que foi invocado pela A., o que também não sucedeu; 28) O R. limitou-se a enumerar deveres dos intermediários financeiros constantes do Código de Valores Mobiliários, mas sem deduzir pedido reconvencional e, por outro lado, sem explicar ou indicar em que concreta medida é que tal alegada violação desses deveres pela A. serviu de facto impeditivo, modificativo ou extintivo do invocado direito da A., não tendo tão pouco demonstrado a ocorrência de quaisquer danos na sua esfera jurídico-patrimonial resultantes de qualquer facto ilícito praticado pela A.; 29) Dessa irrelevância para o mérito da causa resultou porventura o facto/consequência de as instâncias não terem sequer aludido a esta temática, seja na sentença de primeira instância seja no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, irrelevância esta que aliás é secundada na prática pelo próprio recorrente, que nunca invocou ou arguiu qualquer nulidade por omissão de pronúncia no que a esta temática concerne, atitude que aliás manteve nas presentes alegações recursórias; 30) Pelo que, sempre com o devido respeito, toda esta panóplia argumentativa corresponde na prática a questões novas, na medida em que não foram previamente apreciadas pelas instâncias, estando assim subtraídas ao douto conhecimento do STJ, que apenas sindica decisões enquanto Tribunal de Revista de questões que tenham sido previamente apreciadas e decididas pelas instâncias que o precederam no respetivo grau hierárquico; 31) Verificam-se in casu os requisitos do enriquecimento sem causa no caso; assim, 32) Verificou-se enriquecimento do recorrente na medida em que este viu o seu património acrescido por força da venda de “ações” que já não existiam materialmente, não tinham existência de jure, e que só por causa de um erro de atualização da CGD na carteira de ativos financeiros do R. se mantinham artificialmente na sua carteira de títulos; 33) O património do recorrente deveria apenas ser acrescido do valor das ações reduzidas a 200, mas, por força do lapso da A., beneficiou de um incremento patrimonial correspondente ao preço da venda das restantes, ou seja, de 19.800 ações que de jure não detinha, e, por isso, de que não podia dispor, não podendo fazer seu o produto da respetiva venda; 34) Caso o aqui recorrente tivesse vendido as 200 ações de que era efetiva e materialmente titular (e não as 19.800, que materialmente, de jure, já não detinha) teria auferido, à melhor cotação, o montante de apenas 1.130,92 € (cfr. nºs 29 e 30 dos factos provados), e não os €105.684,05 que auferiu; 35) O enriquecimento do aqui recorrente reflete a diferença, para mais, produzida na sua esfera económica, e que resulta da comparação entre a sua situação efetiva (real) e aquela em que se encontraria se a deslocação patrimonial se não houvesse verificado (situação hipotética); 36) E, o enriquecimento injustificado do recorrente foi ainda obtido às custas da CGD atendendo a que o número daquelas ações (N...ASA) que a CGD possuía custodiadas na respetiva Central Depositária de títulos via City Bank havia já sido convertido por esta mesma Central para 250 ações, o que originou uma divergência entre os títulos depositados na sua conta de Ativos Financeiros e os títulos constantes na dita Central Depositária que a CGD teve de colmatar – atendendo a que as ordens de venda não podiam deixar de ser cumpridas (nº 13 dos factos provados) -mediante a aquisição de 19.800 ações, pelo que, atenta esta divergência, a CGD despendeu na aquisição que se viu forçada a realizar a quantia de 125.000,00 € (cfr. nºs 27 e 28 dos factos provados); 37) E, sem esta aquisição das 19.800 ações pela CGD o aqui recorrente não poderia entregá-las a quem as adquiriu (porque materialmente as não detinha), pelo que sem tal aquisição os créditos que lhe foram sendo efetivados na conta bancária à medida que ia “vendendo” as “ações” não tinham qualquer razão substantiva subjacente nem qualquer correspondência com a realidade, tendo consequentemente de ser devolvidos/estornados à procedência; 38) Ou seja, foi precisamente a aquisição destas 19.800 ações pela CGD que permitiu que o recorrente pudesse manter o dinheiro na sua conta; 39) Todavia, tal aquisição das 19.800 ações pela CGD implicaram a realização duma despesa, a qual se traduziu no empobrecimento correspetivo da CGD.; 40) O enriquecimento do recorrente residiu, assim, na diferença entre o montante que efetivamente auferiria caso tivesse vendido, ao melhor preço de cotação em bolsa (que é o que vem indicado no doc. 8 junto com a p.i.), as 200 ações de que era efetivamente titular, e que lhe renderiam nessa operação o montante de 1.130,92 €, e o montante que efetivamente embolsou por força da venda de “ações” que já não existiam, ou seja o valor de 105.684,05 €, sendo este o montante do empobrecimento da recorrida; 41) Os 125.000,00 € que a CGD despendeu constituem o preço total que o banco teve de suportar para adquirir as 19.800 ações em causa, muito embora apenas se reclame nesta ação a diferença entre o valor recebido pelo recorrente decorrente da venda das 20.000 ações (que materialmente não tinha) e o que efetivamente deveria ter auferido pela venda das 200 (que materialmente tinha), por ser essa a medida do enriquecimento/empobrecimento; 42) Acresce que a ocorrida deslocação patrimonial em benefício do recorrente, na parte em que excede o valor correspondente às 200 ações, fundou-se num mero lapso dos serviços da aqui recorrida carecendo de justificação legal ou negocial, e enriqueceu nessa exata medida o património do R. aqui recorrente inexistindo qualquer relação obrigacional, negocial ou legal que justifique tal deslocação patrimonial; 43) Ao contrário do que pretende o recorrente o seu benefício patrimonial não resultou das “regras do mercado bolsista”, mas sim de um erro da CGD na atualização da carteira de títulos deste, erro este do qual agora pretende injustificadamente beneficiar; 44) Para que tivessem sido as regras do mercado bolsista a funcionar teria de se ter verificado uma valorização das ações da N...ASA de que o recorrente era efetivo titular em quase 100%, facto esse que pura e simplesmente não ocorreu (aliás, nem sequer foi alegado pelo recorrente); 45) A aqui recorrida fundamentou a presente ação exclusivamente no instituto jurídico do enriquecimento sem causa, não tendo invocado a existência de qualquer contrato que tivesse sido violado nem tão pouco alegou qualquer facto suscetível de integrar o instituto jurídico da responsabilidade aquiliana do R. pelo que nada foi alegado e nada ficou provado a este respeito; 46) Por outro lado o facto de o recorrente ser cliente do banco, e nessa qualidade lá manter a sua conta de ativos financeiros tal não significa que o problema poderia ser resolvido no âmbito das regras do contrato de depósito atendendo a que o banco não pode retirar dinheiro da conta titulada pelo seu cliente por sua única e exclusiva vontade e decisão, só o podendo fazer com o acordo do cliente ou com sentença judicial que a tal habilite; 47) Por outro lado, o apelado não praticou nenhum facto ilícito, pelo que convocar seja a responsabilidade contratual seja a aquiliana como meios alternativos de resolução deste litígio esbarra desde logo e à cabeça nesta inultrapassável aporia; 48) Com efeito, não se tratando de hipótese subsumível à chamada responsabilidade pelo risco, para convocar a aplicabilidade do instituto jurídico da responsabilidade civil sempre teria que se verificar a existência de culpa por parte do apelado, requisito sem o qual não há responsabilidade; 49) Ora, tal culpa não existe in casu, pelo que não se aplicam ao caso as regras da responsabilidade civil; 50) Com efeito, não foi por culpa do apelado a omissão de atualização da sua carteira de títulos, nem foi por culpa dele que o quantum monetário resultante de tal venda entrou na sua conta bancária, pelo que ao banco outra alternativa não restava senão a de recorrer ao enriquecimento sem causa. Termos em que deverá ser mantido na íntegra o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães. Assim se fará Justiça ! 14. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. artigo 608.º, n.º 2, por remissão do artigo 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), a questão a decidir, in casu, é tão-só a seguinte: — se estão preenchidos os requisitos da obrigação de restituição por enriquecimento sem causa. II. — FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS 15. O acórdão recorrido deu como provados os factos seguintes. 1. O cliente n.º 43640852 - AA, cliente da A. da agência de ..., e aqui R. é titular da conta de activos financeiros com o n.º .... ...... ... ..01, conforme doc. 1 de fls. 10 e vº. 2. Em 17/12/2020 detinha a carteira de títulos que abaixo se discrimina, com uma valorização de 11.101,65 €, conforme doc. 2-A e 2-B de fls. 11 a 14: Código ISIN — Espécie — Quantidade — Cotação — Moeda — Valorização PTBRI0AM0000 — B.... — 800 — 0,01000 — EUR — 8,00 PTCFN0AE0003 — C..... — 1.500 — 0,25300 — EUR — 379,50 PTGMC0AM0003 — G... — 600 — 2,00000 — EUR — 1.200,0 PTIPR0AM0000 — I...SGPS — 2.000 — 0,15700 — EUR 314,00 PTMEN0AE0005 — M...SGPS — 5.000 — 1,40600 — EUR 7.030,00 PA1436583006 — C...C... — 100 — 21,63000 — USD — 2.163,00 PTTD10AM0000 — T..., S.A. — 700 — 0,09800 — EUR — 68,60 PTBCP0AM0015 — BCP — 2.557 — 0,12640 — EUR — 323,20 PTS3P0AM0025 — So...SGPS — 12 — 1,00500 — EUR — 12,06 NO0010196140 — N...ASA — 25.000 — 0,63520 — NOK — 15.880,00 3. O aqui R. efectua operações em bolsa quer em mercado nacional quer internacional. 4. Sucedendo que a empresa N...ASA de que o R. era acionista, anunciou ao mercado, em 17.12.2020, com efeito a partir de 18.12.2020, um evento corporativo de Reverse Stock Split (Reagrupamento de Ações), no âmbito do a proporção de conversão foi de, por cada lote de 100 (cem) acções passariam os acionistas a deter 1 (uma) acção, com o mesmo código ISIN, por redução das posições em carteira para negociação – cf. doc. 3 de fls. 37 / 63 vº, tradução a fls. 64. 5. O evento societário denominado Reverse Stock Split 1 tem por desiderato permitir à sociedade emitente aumentar o valor de mercado das suas acções através da redução do número de ações existente. 6. A data de produção de efeitos do evento em causa era o dia 18 de Dezembro de 2020, pelo que nesta data as acções deveriam ter sido reagrupadas na carteira de títulos do R. de acordo com o coeficiente de 100 (cem) acções para 1 (uma) acção, ou seja por cada cem acções anteriormente detidas os accionistas desta empresa passariam a deter apenas uma. 7. Todavia, a CGD, por lapso dos seus serviços, não procedeu de imediato a esta actualização do número de acções na carteira de Activos Financeiros do R. derivada deste evento de Reverse Stock Split. 8. Ou seja, atendendo a que a CGD não processou em devido tempo este evento societário (Reverse Stock Split) o seu Sistema Informático de Gestão de Activos Financeiros não continha desde o início do evento as posições deste título devidamente actualizadas, ou seja contando já com a redução do número de acções resultante do evento Reverse Stock Split. 9. Como consequência deste evento as 25.000 (vinte e cinco mil) acções que constavam na conta de Ativos Financeiros do ora R. respeitantes à N...ASA deveriam de imediato ter sido reduzidas pela CGD para apenas 250 (duzentas e cinquenta) ações. 10. Após a publicitação deste evento de Reverse Stock Split o cliente e aqui R. AA instruiu e ordenou a venda de 20.000 ações da N...ASA, mediante várias ordens de venda. 11. Acções estas que só por falta de actualização do sistema informático da CGD, como supra descrito, o A. ainda detinha, embora já só formalmente, na sua carteira. 12. Na verdade, nas datas em que realizou estas vendas, apenas já detinha 250 ações da empresa em causa, por força do ocorrido evento de Reverse Stock Split. 13. Estas ordens de venda respeitantes a 20.000 ações foram instruídas pelo aqui R., via Caixa Direta on line, a partir das 20:35 horas do dia 20.12.2020, e foram enviadas, no dia útil seguinte de cada uma delas, ao Mercado, consumando-se a irreversibilidade das operações em bolsa nesse mesmo dia, e, dois dias depois após cada ordem de venda, a respectiva liquidação financeira dessas ordens. E já não materialmente, ou substantivamente, atendendo a que o R. já só tinha 250 acções. 14. As vendas realizadas pelo R. foram efetivadas nas datas, quantidades, preços e câmbios (de coroa norueguesa para euros) conforme doc. 4 de fls. 15 e vº. 15. Só em 15.01.2021 foi detectado o lapso tendo então sido convertidas pela CGD as 5.000 ações que ainda não tinham sido vendidas pelo R. para a respectiva quantidade correcta, ou seja para 50 acções. 16. Com as vendas / alienação realizadas das 20.000 acções resultou um crédito na conta do R. no montante de €105.684,05, conforme doc. 5 e 5-A, fls. 16 a 20 vº. 17. O que só foi possível porque tais “acções” continuavam activas na sua conta de activos financeiros, por lapso da A.. 18. Por outro lado, o número daquelas ações que a CGD possuía custodiadas na respetiva Central Depositária de títulos via City Bank havia já sido convertido por esta Central para as referidas 250 ações, originando, desta forma, uma divergência entre os títulos depositados na sua conta de Activos Financeiros e os títulos constantes na Central Depositária. 19. Pelo que a CGD, para reparar o seu lapso, teve de proceder à aquisição das acções em falta (19.800) para poder fazer face ao saldo negativo deste cliente aqui R. (e da CGD no Mercado) pelo valor aproximado de € 125.000,00; 20. Detectada a situação, em 15.01.2021 a CGD procedeu não só à referida aquisição no Mercado Bolsista das acções em falta, ou seja 19.800 ações, mas também ao imediato contacto telefónico com o aqui R. dando-lhe nota de que a quantidade de ações que efectivamente detinha em conta, a partir do dia 18.12.2020, não estava correcta – detinha apenas 250 e não 25.000 - e que, por lapso da A., a quantidade detida e por ele vendida não correspondia à quantidade correcta e de que era efetivamente titular, pelo que era urgente a reposição da situação real devendo o R. reembolsar à CGD a quantia que resultava da diferença entre o número de acções que vendeu e aquelas de que efectivamente era titular/proprietário. 21. Na sequência do contacto telefónico, o R. solicitou que lhe fosse exposto, por escrito, a situação ocorrida, o que a CGD efectivou mediante o envio de e.mail – doc. 6 de fls. 21 e vº. 22. O Réu respondeu nos termos do email que constitui o doc. 7 de fls. 22 a 24, recusando proceder ao reembolso à aqui A. da quantia por esta reclamada. 23. O quadro junto sob doc. 8 de fls. 26 e ss enuncia e descreve: a) As datas das ordens de venda dadas pelo R.; b) A quantidade de ações transacionadas pelo R. em cada data (20.000 no total); c) A quantidade efetivamente pertencente ao R. em função do Reverse Stock Split; d) O melhor preço destas ações às datas em que as vendas ocorreram, em NOK3; e) O montante financeiro em NOK que o R. deveria ter encaixado pela venda; f) O montante financeiro em euros que o R. deveria ter encaixado pela venda; 24. De que resulta que o A. deveria ter auferido, nas datas em que procedeu às transacções, pela venda das 200 ações de que efetivamente era titular apenas o montante de 1.130,92 €. 25. Todavia, por força da venda de um número de ações que já não existiam o R. auferiu na realidade a quantia de 105.684,05 €. 26. Essa diferença ascende assim a 104.553,13 €, 27. Em consequência da venda das acções, a A. teve de adquirir no Mercado Bolsista 19.800 ações da N...ASA para poder honrar, na sua qualidade de intermediária financeira, as ordens de compra dadas pelo R., ao preço das acções após o Reverse Stock Split, uma vez que desde 18.12.2020 a entidade custodiante (City Bank) destas ações havia já convertido estes títulos para 250 ações, por força do Reverse Stock Split, originando, desta forma, uma divergência entre os títulos “depositados” na sua conta de Ativos Financeiros e os títulos constantes na Central Depositária (entidade custodiante). 28. Atenta esta divergência a CGD despendeu nesta aquisição que se viu forçada a realizar a quantia de 125.000,00 €, conforme doc. 9 de fls. 28. 29. A cotação destes títulos na Bolsa nas datas em que o R. procedeu à sua venda, ou seja entre 23.12.2020 e 18.01.2021 é a constante do doc. 10 de fls. 29, por onde se constata que as melhores cotações deste título nesse período são as que vêm indicadas em 1.23. e 1.24. supra. 30. O valor mais elevado destas acções no período em causa (entre 23.12.2020 e 18.01.2021) ascendeu a 1.130,92 € (cfr. doc. 8). 31. O R. adquiriu em 18/12/2020, 25.000,00 acções N...ASA, na plataforma gerida pela aqui A., via Caixa Directa online e conseguiu aceder à plataforma e dar ordem de venda, sem que tivesse surgido algum aviso, ou publicidade a informar a existência de um evento de “Reverse Stock Split”. 32. O R. deu ordens de venda da sua carteira de acções de N...ASA, desde de dia 20/12/2020 até ao dia 15/01/2021, sem que se tivesse tido conhecimento de qualquer evento que tenha acontecido ou que estivesse para acontecer, tendo durante esse período o aqui R. vendido as suas acções e criando expectativas que a cotação das mesmas tinha subido sobremaneira. 33. O R. não foi informado da existência do evento Reverse Stock Split, até à data de 15-01-2021, e somente vendeu as acções pois elas constavam da sua carteira, e estava convencido que as detinha. 34. Aliás, o R. em final de 2020 apercebe-se que das vendas das acções N...ASA, iriam gerar mais valias, então para deduzir estas mais valias decidiu vender as suas carteiras de acções que se encontravam a desvalorizar, nomeadamente, as carteiras: C..... (- 1981,30€), I...SGPS (-5918,80€), S... (- 19699,28€), T..., S.A. (-2634,26€), M...SGPS (-11792,76€), M........(-4565,97€), E PT (-3844,00€), conforme docs de fls. 47 vº a 50 vº. 35. Todas estas acções eram geridas pela plataforma caixa online à excepção das acções da PT, - cf. doc. 4 de fls. 51. 36. Então no dia 28 de Dezembro o R. analisa as vendas que tem vindo a fazer e constata que os valores recebidos com a venda das acções N...ASA irão gerar mais valias e para equilibrar decide vender as carteiras de acções que se encontravam a desvalorizar, para deduzir as menos valias às mais valias. 37. Após o final do ano de 2020 e início de 2021 o aqui R. continua a vender as acções que tem da N...ASA, pois a cotação das mesmas continuava a subir, o aqui R. dá ordens de venda e as mesmas são liquidadas nas datas de 7, 8, 14 e 18 de 2021. 38. Para surpresa do Réu, após o contacto telefónico e antes da recepção do email da A., consulta a sua conta bancária e verifica que se encontram cativados €81.836,57 (oitenta e um mil oitocentos e trinta e seis euros e cinquenta e sete cêntimos) da sua conta à ordem, sem ter sido informado e sem ter dado o seu consentimento – cf. doc. 1 de fls. 47. 39. O R. em virtude do encaixe financeiro com a venda das ditas acções até ao final do ano de 2020, viu-se na necessidade de vender acções das suas carteiras que se encontravam em desvalorização, para assim poder abater as menos valias resultantes de tais vendas às mais valias resultantes das vendas das acções N...ASA. 40. A opção de colocar à venda tais activos somente ocorreu pelo facto de que o R. iria ser tributado em mais valias e estas vendas só ocorreram na perspectiva de esbater as mais valias que iria ter a pagar, pois de outra forma não teria nenhum interesse em vender tais títulos até pelo facto de os vender a preço bastante inferior ao preço de aquisição. 16. Em contrapartida, o acórdão recorrido deu como não provados os factos seguintes: 1. O R acompanhava diariamente o mercado bolsista nacional e internacional bem como a evolução das posições da sua carteira de valores. 2. O R., após contacto telefónico da A., alegou então que compreendia a situação e que entendia que não era já detentor/proprietário das ações à data da sua venda, tendo inclusivamente perguntado se a CGD tinha seguro para este tipo de ocorrências. 3. Posteriormente, veio responder em sentido contrário ao que tinha assumido na chamada telefónica. 4. Da venda no mercado das acções referidas em 1.34. resultou para o aqui R. menos valias na quantia de €-50436,37. 5. O Réu terá que pagar impostos das mais valias pelas vendas efectuadas durante o mês de Janeiro de 2021. 6. Mais no ano de 2021 o aqui R. declarou as suas mais valias e menos valias a título de IRS, e sobre o qual foi taxado a Imposto das menos valias utilizadas computado a 28% perfaz a quantia de €-14122,18. O DIREITO 17. O n.º 1 do artigo 473.º do Código Civil consagra o princípio geral do enriquecimento sem causa: — “[a]quele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem, é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou” 1. 18. Os requisitos do enriquecimento sem causa enunciados no n.º 1 do artigo 473.º do Código Civil resumem-se a três — o primeiro consiste no enriquecimento; o segundo consiste em que o enriquecimento seja conseguido à custa de outrem; o terceiro, em que o enriquecimento seja conseguido à custa de outrem sem causa justificativa. 19. O n.º 2 do artigo 473.º do Código Civil descreve três casos em que o enriquecido tem a obrigação de restituir aquilo com que injustamente se locupletou — e, entre os três casos descritos no n.º 2 do artigo 473.º, está aquele em que o enriquecido recebeu aquilo que não devia ter recebido. “A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido […]”. 20. O conceito de enriquecimento relevante para efeitos de enriquecimento sem causa é, de acordo com a opinião dominante na doutrina 2 e na jurisprudência 3, o conceito de enriquecimento patrimonial, ou seja, “… [o] saldo ou [a] diferença para mais no património do enriquecido, que resulte da comparação entre a situação em que ele presentemente se encontra (situação real) e aquela em que se encontraria se não se tivesse verificado a deslocação patrimonial que funda a obrigação de restituição (situação hipotética)” 4. 21. Como se diz, p. ex., no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 2021 — processo n.º 4158/17.1T8CBR.C1.S1 —, 18. … [o] enriquecimento pode conceber-se de duas formas distintas, a que correspondem as noções real e patrimonial. O enriquecimento real é o valor objetivo do ganho obtido pelo [sujeito] beneficiado e o enriquecimento patrimonial é a diferença para mais no património desse [sujeito], a diferença entre a situação patrimonial actual e a situação patrimonial que teria se a Autora não houvesse realizado aquelas contribuições. Enquanto no enriquecimento real se faz uma avaliação abstracta e objectiva do ganho, no enriquecimento patrimonial procede-se a uma avaliação concreta, subjectiva e dinâmica do ganho. O montante da obrigação não pode nunca exceder aquela diferença. […] 20. Se a função desta obrigação restitutória consiste na remoção do ganho, compreende-se a adoção do conceito de enriquecimento patrimonial. Os princípios do enriquecimento sem causa não permitem ao [sujeito] prejudicado exigir a perda concretamente sofrida. 22. O Réu, agora Recorrente, admite que os factos dados como provados são suficientes para que se conclua que houve um enriquecimento: o Réu, agora Recorrente, tinha 250 acções da N...ASA 5 e, não obstante, vendeu 20000 6: caso tivesse vendido 200 das acções que tinha, teria recebido 1 130,92 euros 7; como vendeu 200 das acções que tinha e 19800 acções que não tinha, recebeu 105 684,05 euros 8. O resultado da comparação entre a situação em que ele presentemente se encontra (situação real) e aquela em que se encontraria se não se tivesse verificado a deslocação patrimonial que funda a obrigação de restituição (situação hipotética) é uma diferença, para mais, de 104.553,13 euros 9. 23. Embora admita que houve um enriquecimento, o Réu, agora Recorrente, alega duas coisas: I. — que o enriquecimento não foi conseguido à custa da Autora, agora Recorrida; II. — que, ainda que o enriquecimento tivesse sido conseguido à custa da Autora, agora Recorrida, nunca teria sido um enriquecimento injustificado. 24. O primeiro argumento deduzido pelo Réu, agora Recorrente, é o de que o enriquecimento só teria sido conseguido à custa da Autora, agora Recorrida, se houvesse uma relação entre o enriquecimento do Réu, agora Recorrente, e o empobrecimento da Autora, agora Recorrida — ora, em concreto, não haveria nenhuma relação entre o enriquecimento do Réu agora Recorrente, e o empobrecimento da Autora, agora Recorrida. O enriquecimento do Réu, agora Recorrente, resultou da venda das acções de que, de acordo com o sistema informático da Autora, agora Recorrida, era titular e o empobrecimento da Autora, agora Recorrida, resultou da compra das acções necessárias para cumprir as ordens de venda dada pelo Réu, agora Recorrente 10 Em consequência, a Autora, afora Recorrida, não teria feito nenhuma atribuição patrimonial ou, em todo o caso, não teria feito nenhuma atribuição patrimonial directa ao Réu, agora Recorrente — teria feito, tão-só, atribuições patrimoniais directas a terceiros, a quem comprou as acções no mercado bolsista. 25. O problema suscitado pelo Réu, agora Recorrente, relaciona-se com o requisito da imediação 11, ou da unidade do procedimento de enriquecimento 12. 26. Ora, o requisito da imediação ou da unidade do procedimento de enriquecimento significa que, entre empobrecimento e enriquecimento, não deve encontrar-se um facto intermédio 13 ou, em todo o caso, não deve encontrar-se um património intermédio, de terceiro 14. 27. Exigir-se que a atribuição patrimonial seja directa ou imediata, ou que o procedimento por que se concretiza a atribuição patrimonial seja um procedimento unitário — exigir-se que entre o empobrecimento e o enriquecimento não haja nenhum facto intermédio, ou que entre o património empobrecido e o património enriquecido não haja nenhum património intermédio. — é, em todo o caso, algo de controvertido 15. Em favor do requisito da imediação, pronunciaram-se, p. ex., Antunes Varela 16, Francisco Manuel Pereira Coelho 17, Jorge Ribeiro de Faria 18 e Diogo Leite de Campos 19. Em desfavor do requisito, pronunciou-se, p. ex., Luís Menezes Leitão 20. 28. Constatando a controvérsia, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Maio de 2006 — processo n.º 06A825 — diz expressamente que “[n]ão é possível inferir com segurança das normas que regulam o instituto do enriquecimento sem causa — artigos 473.º a 482.º do Código Civil — que a lei faça da imediação um requisito geral desta figura” 21. 29. Entre os dois pólos extremos, a doutrina e a jurisprudência portuguesas tendem a abandonar os critérios mais simples, de aplicação automática ou quase-automática, como sejam a regra da ausência de um facto intermédio ou a regra da ausência de um património intermédio, em favor de critérios mais complexos 22, por que se exige uma ponderação global 23 ou uma valoração global 24, orientada, p. ex., pelo comum sentimento de justiça 25. 30. O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Janeiro de 1998 — processo n.º 97A354 —enunciou os critérios, mais complexos, aplicáveis aos casos em que as atribuições patrimoniais sejam só indirectas ou mediatas em termos de uma regra e de uma excepção. Em primeiro lugar, enunciou a regra — de que o enriquecimento há-de ser directa ou imediatamente obtido à custa do empobrecido 26 — e, em segundo lugar, enuncia a excepção — exceptua-se os casos em que o requisito da imediação conflitue com o comum sentimento de justiça 27. 31. Os dois critérios foram aplicados, p. ex., pelos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Maio de 2006 — processo n.º 06A825 —, de 16 de Novembro de 2006 — processo n.º 06B3568 —, de 12 de Fevereiro de 2009 — processo n.º 08A3714 —, de 31 de Janeiro de 2019 — processo n.º 89/16.0T8VGS.P1.S2 —, de 6 de Junho de 2019 — processo n.º 593/14.5TBTNV.E2.S2 — e de 7 de Novembro de 2019 — processo n.º 354/14.1TBALM.L1.S2. 32. O acórdão de 16 de Novembro de 2006 afirma que, ainda que a regra seja a imediação, “sempre se deve admitir que uma atribuição patrimonial indirecta deve fundamentar a restituição do injustamente locupletado, sob pena [de a] exigência da deslocação patrimonial directa se mostrar excessiva, conduzindo a soluções que chocam o comum sentimento de justiça” e o acórdão de 6 de Junho de 2019 confirma, em termos em quase tudo semelhantes, que “a atribuição patrimonial indirecta pode justificar a aplicação do instituto do enriquecimento sem causa, de modo a evitar casos que, por falta da imediação, ficariam juridicamente desprotegidos e chocariam o ‘comum sentimento de justiça’” 28. 33. O sistema esboçado corresponde no mínimo a uma recompreensão 29 e, no máximo, a uma superação do requisito de que o enriquecimento seja directo ou imediato 30. 34. Os factos dados como provados são suficientes para que se conclua que a aplicação do requisito da imediação ou da unidade do procedimento de enriquecimento conduziria a uma decisão insustentável do ponto de vista dos critérios de justiça admitidos e reconhecidos pela ordem jurídica: 34. A Autora, ainda que devesse atribuir ao Réu o valor de, tão-só, 200 acções, atribuiu-lhe o valor de 20 000; ainda que devesse atribuir-lhe pouco mais de 1000, atribuiu-lhe mais de 100000 euros; o Réu, ainda que devesse receber o valor de, tão-só, 200 acções, recebeu o valor de 20000; ainda que devesse receber pouco mais de 1000, recebeu mais de 100000 euros — ora, seria insustentável do ponto de vista do comum sentimento de justiça ou, em todo o caso, do ponto de vista de um recto sentimento de justiça que ficasse com um valor mais de 100 vezes superior ao valor com que deveria ter ficado. 35. O segundo argumento deduzido pelo Réu, agora Recorrente, é o de que o enriquecimento do Autor, agora Recorrente, só teria sido injustificado se não tivesse havido um erro da Autora, agora Recorrida, ou, em todo o caso, se o erro da Autora, agora Recorrida, tivesse sido um erro desculpável. 36. Ora, em concreto, houve um erro da Autora, agora Recorrida e um erro que o Réu, agora Recorrente, qualifica como indesculpável — como um erro grave ou muito grave. 37. Como tivesse havido um erro da Autora, agora Recorrida, o Réu, agora Recorrente, alega que oo enriquecimento e o empobrecimento tinham causa justificativa. O enriquecimento do Réu, agora Recorrente, teria como causa justificativa a alienação de 20000 acções de que, ainda que só formalmente, era titular e o empobrecimento da Autora, agora Recorrida, teria como causa justificativa a falta de actualização do sistema informático da Caixa Geral de Depósitos 31, de que decorria que o Réu, agora Recorrente, tivesse direito a 25000 acções e que a Autora, agora Recorrida, tivesse o dever de adquirir 25000 acções, em cumprimento do contrato de intermediação financeira. 38. O teor das conclusõe MM) a QQ) do recurso de revista é elucidativo: MM) O que acontece é que a Autora teve de suportar um prejuízo em consequência de um erro seu, o que não é confundível com o empobrecimento com base no qual se deu o enriquecimento do Réu. NN) Como vem justificado na douta sentença, não é possível à Autora pedir a restituição de um valor que não se perdeu. OO) Quanto ao requisito de a falta de causa justificativa dessa valorização patrimonial – o enriquecimento do Réu está justificado na titularidade de um número de acções que constavam na sua carteira, carteira essa gerida pela plataforma da Autora, e pelas várias ordens de venda emitidas pelo Réu que foram cumpridas pela Autora, PP) Assim o “enriquecimento” está plenamente justificado, existia um contrato de intermediação financeira, no qual estavam abrangidas as acções em discussão nos autos, as mesmas valorizaram e o Réu emitiu ordens de venda que foram cumpridas pela A. e os valores foram depositados na sua conta bancária. QQ) Se taisordens foram cumpridas ou executadas em erro, esse erro só poderá ser imputável à própria Autora e não ao Réu. 39. O requisito da ausência de causa justificativa, ou da falta de causa justificativa, remete-nos para o conceito de causa, ou de causa justificativa, e o conceito de causa justificativa é um conceito indeterminado 32 — remete-nos para os “critérios legais definidores de uma correcta ordem ou ordenação dos bens” 33. 40. Ora os critérios legais definidores de uma correcta ordem ou de uma correcta ordenação dos bens são todos os princípios e todas as regras do ordenamento ou do sistema jurídico — e, como os critérios legais definidores de uma correcta ordenação dos bens são todos os princípios e todas as regras do ordenamento ou do sistema jurídico, o requisito da falta de causa justificativa significa, em última análise, “uma remissão para o resto do ordenamento” 34. 41. O Supremo Tribunal de Justiça tem afirmado, constantemente, que “[a] noção de falta de causa do enriquecimento é… muito controvertida e difícil de definir, inexistindo uma fórmula unitária que sirva de critério para a determinação exaustiva das hipóteses em que o enriquecimento deve considerar-se privado de justa causa” 35. 42. Entre os pontos mais ou menos consensuais estão o de que a ausência de causa justificativa põe um problema de interpretação e de integração da lei 36 e o de que, através da interpretação e da integração da lei, há-de determinar-se, “em cada caso concreto, ‘se o ordenamento jurídico […] acha ou não legítimo que o beneficiado […] conserve [o enriquecimento]” 37. 43. Como se diz, p. ex., nos acórdãos de 28 de Junho de 2011 — processo n.º 3189/08.7TVLSB.L1.S1 —, de 29 de Abril de 2014 — processo n.º 246/12.9T2AND.C1.S1 — ou de 3 de Maio de 2018 — processo n.º 175/05.2TBALR.E1.S1 —, “[o] eixo directriz da definição da ausência de causa justificativa da deslocação patrimonial tem a ver com a correcta ordenação jurídica dos bens aceita pelo sistema jurídico, de modo que, de acordo com a mesma, se o enriquecimento deve pertencer a outra pessoa, carece de causa justificativa”. 44. Ora a correcta ordenação jurídica dos bens aceita pelo sistema jurídico determinaria que se consolidasse no património do Réu, agora Recorrente, o valor das acções de que era substancialmente titular — ou seja, que se consolidadasse no património do Réu o valor de 200 acções — e que não se consolidasse no património do Réu, o valor das acções de que era formalmente titular, ainda que o não fosse substancialmente — ou seja, que não se consolidasse no património do réu o valor das demais 19800 acções. 45. Como se diz no acórdão recorrido, “[i]nexiste qualquer relação obrigacional, negocial ou legal que justifique tal deslocação patrimonial, e aquela prestação (montante transferido pela Autora para a conta do Réu pela venda de 19.800 acções que este não detinha), ou seja, a deslocação patrimonial, não tinha qualquer finalidade típica juridicamente tutelada”. 46. O resultado só pode ser reforçado pelo regime do artigo 476.º do Código Civil, sobre a repetição do indevido: 1. — Sem prejuízo do disposto acerca das obrigações naturais, o que for prestado com a intenção de cumprir uma obrigação pode ser repetido, se esta não existia no momento da prestação. 2. — A prestação feita a terceiro pode ser repetida pelo devedor enquanto não se tornar liberatória nos termos do artigo 770.º 3. — A prestação feita por erro desculpável antes do vencimento da obrigação só dá lugar à repetição daquilo com que o credor se enriqueceu por efeito do cumprimento antecipado 38. 47. O artigo 476.º do Código Civil poderá aplicar-se, directa ou indirectamente (por analogia), a transmissões de valor, ainda que a forma da transmissão de valor não seja a realização de uma prestação 39, ainda que não se aplicasse, nem directa, nem indirectamente, a transmissões de valor semelhantes à do caso sub judice, sempre as decisões de valor subjacentes ao artigo 476.º deveriam inspirar a interpretação do artigo 473.º do Código Civil. 48. A aquisição pela Autora, agora Recorrida, das 19800 acções necessárias para cumprir a ordem de venda do Réu, agora Recorrente, dá lugar a uma transmissão de valor. 49. Ora, no artigo 476.º do Código Civil, “a repetição não fica dependente da existência de um erro desculpável do solvens” 40 — o erro desculpável não é condição necessária para que se constitua de uma obrigação de restituição do valor indevidamente transferido. 50. O facto de a Autora, agora Recorrida, ter cometido um erro não é condição suficiente para que o enriquecimento do Réu, agora Recorrente, tenha uma causa justificativa — logo, não significa que não estejam provados factos constitutivo ou que estejam provados factos impeditivos da obrigação de restituição do valor indevidamente transferido pea o seu património. 51. Em diferentes palavras, ainda que insistindo em igual pensamento — o erro da Autora, agora Recorrida, não faz com que o enriquecimento do Réu, agora Recorrente, fique de acordo com a correcta ordenação jurídica dos bens aceita pelo sistema jurídico. 52. Em complemento do argumento do erro o Réu, agora Recorrente, invoca a violação de deveres de esclarecimento ou de informação da Autora, agora Recorrida. 53. Ora, ainda que a questão da violação de deveres de esclarecimento ou de informação devesse ser conhecida, sempre se dirá que nunca faria com que o enriquecimento do Réu, agora Recorrente, tivesse uma causa justificativa ou com que a Autora, agora Recorrida, tivesse um meio alternativo de ser indemnizada ou restituída 41: 54. O facto constitutivo da obrigação de indemnização relevante para efeitos do artigo 562.º do Código Civil é a informação incorrecta ou inexacta — logo, a obrigação de indemnizar deve colocar o lesado na situação em que estaria se não lhe tivesse sido prestada uma informação incorrecta ou inexacta. 55. Em consequência, a alegação violação de deveres de esclarecimento ou de informação, através de informações incorrectas ou inexactas, daria ao Réu, agora Recorrente, o direito a uma indemnização pelo interesse negativo, e só pelo interesse negativo — daria ao Réu, agora Recorrente, o direito a uma indemnização destinada a colocá-lo na situação em que estaria se não lhe tivesse sido dada uma informação incorrecta ou inexacta. 56. Embora desse ao Réu, agora Recorrente, direito a uma indemnização pelo interesse negativo, não lhe daria, não lhe daria nunca, o direito a uma indemnização pelo interesse positivo — não lhe daria nunca o direito a uma indemnização destinada a colocá-lo na situação em que estaria se a informação incorrecta ou inexacta fosse correcta ou exacta (na situação em que estaria se a realidade fosse conforme à informação). 57. Ou seja — não daria nunca ao Réu, agora Recorrente, o direito a ser colocado na situação em que estaria se a informação incorrecta (de que tinha 25000 acções) fosse correcta; na situação em que estaria se o Réu, agora Recorrente, tivesse 25000 acções. 58. Em conclusão — a Autora, agora Recorrida, terá o direito à restituição do valor indevidamente transferido para o património do Réu, agora Recorrente, por ser o único meio que a lei lhe faculta para reconstituir a correcta ordenação jurídica dos bens aceita pelo sistema jurídico. III. — DECISÃO Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se o acórdão recorrido. Custas pelo Recorrente AA. Lisboa, 12 de Dezembro de 2023 Nuno Manuel Pinto Oliveira (relator) Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Maria de Fátima Gomes ______ 1. Sobre a interpretação do artigo 473.º do Código Civil, vide por todos Fernando Andrade Pires de Lima / João de Matos Antunes Varela (com a colaboração de Manuel Henrique Mesquita), anotação ao artigo 473.º, in: Código Civil anotado, vol. I — Artigos 1.º a 761.º, 4.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1987, págs. 454-458; Ana Prata, anotação ao artigo 473.º, in: Ana Prata (coord.), Código Civil anotado, vol. I — Artigos 1.º a 1250.º, Livraria Almedina, Coimbra, 2017, págs. 613-614, Júlio Gomes, anotação ao artigo 473.º, in: Luís Carvalho Fernandes / José Carlos Brandão Proença (coord.), Código Civil anotado, vol. II — Direito das obrigações. Das obrigações em geral, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2018, págs. 245-253, ou Diogo Costa Gonçalves, anotação ao artigo 473.º, in: António Menezes Cordeiro (coord.), Código Civil comentado, vol. iI — Das obrigações em geral, Livraria Almedina, Coimbra, 2021, págs. 389-392. 2. Cf. designadamente João de Matos Antunes Varela, Das obrigações em geral, vol. I, 10.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2000, págs. 512-513; Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das obrigações, 10.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2006, pág. 512; ou Jorge Ribeiro de Faria, Direito das obrigações, vol. I, Livraria Almedina, Coimbra, 2001 (reimpressão), págs. 407-408. 3. Cf. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Janeiro de 1996 — processo n.º 087664 —, de 19 de Fevereiro de 1998 — processo n.º 96B980 —, de 26 de Abril de 2001 — processo n.º 01B528 —, de 16 de Janeiro de 2007 — processo n.º 06A4386 —, de 14 de Julho de 2009 — processo n.º 370/09.5YFLSB —, de 28 de Junho de 2011 — processo n.º 3189/08.7TVLSB.L1.S1 —, de 27 de Setembro de 2012 — processo n.º 1696/08.0TBFAR.E1.S2 —, de 29 de Abril de 2014 — processo n.º 246/12.9T2AND.C1.S1 —, de 8 de Julho de 2015 — processo n.º 81/12.2TBBRG.G1.S1 —, de 24 de Março de 2017 — processo n.º 1769/12.5TBCTX.E1.S1 —, de 4 de Julho de 2019 — processo n.º 2048/15.1T8STS.P1.S1 — e de de 22 de Junho de 2021 — processo n.º 4158/17.1T8CBR.C1.S1. 4. Francisco Manuel Pereira Coelho, O enriquecimento eo dano, Livraria Almedina, Coimbra, 1970, pág. 29. 5. Cf. facto dado como provado sob o n.º 12: “… nas datas em que realizou estas vendas, apenas já detinha 250 ações da empresa em causa, por força do ocorrido evento de Reverse Stock Split”. 6. Cf. factos dados como provados sob os n.ºs 9 a 11: 9. “[…] as 25.000 (vinte e cinco mil) acções que constavam na conta de Ativos Financeiros do ora R. respeitantes à N...ASA deveriam de imediato ter sido reduzidas pela CGD para apenas 250 (duzentas e cinquenta) ações. 10. Após a publicitação deste evento de Reverse Stock Split o cliente e aqui R. AA instruiu e ordenou a venda de 20.000 ações da N...ASA, mediante várias ordens de venda. 11. Acções estas que só por falta de actualização do sistema informático da CGD, como supra descrito, o A. ainda detinha, embora já só formalmente, na sua carteira”. 7. Cf. facto dado como provado sob o n.º 24: “[…] o A. deveria ter auferido, nas datas em que procedeu às transacções, pela venda das 200 ações de que efetivamente era titular apenas o montante de 1.130,92 €”. 8. Cf. facto dado como provado sob o n.º 25: “[…] por força da venda de um número de ações que já não existiam o R. auferiu na realidade a quantia de 105.684,05 €”.↩︎ 9. Cf. facto dado como provado sob o n.º 26. 10. Cf. factos dados como provados osb os n.ºs 27.e 28: “27. Em consequência da venda das acções, a A. teve de adquirir no Mercado Bolsista 19.800 ações da N...ASA, para poder honrar, na sua qualidade de intermediária financeira, as ordens de compra dadas pelo R., ao preço das acções após o Reverse Stock Split, uma vez que desde 18.12.2020 a entidade custodiante (City Bank) destas ações havia já convertido estes títulos para 250 ações, por força do Reverse Stock Split, originando, desta forma, uma divergência entre os títulos “depositados” na sua conta de Ativos Financeiros e os títulos constantes na Central Depositária (entidade custodiante). 28. Atenta esta divergência a CGD despendeu nesta aquisição que se viu forçada a realizar a quantia de 125.000,00 €, conforme doc. 9 de fls. 282. 11. Expressão preferida por Fernando Andrade Pires de Lima / João de Matos Antunes Varela (com a colaboração de Manuel Henrique Mesquita), anotação ao artigo 473.º, in: Código Civil anotado, vol. I — Artigos 1.º a 761.º, 4.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1987, págs. 454-458 (457); João de Matos Antunes Varela, Das obrigações em geral, vol. I, 10.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2000, págs. 493-496; Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das obrigações, 10.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2006, págs. 496-499; ou António Menezes Cordeiro, Tratado de direito civil, vol. VIII — Direito das obrigações. — Gestão de negócios. Enriquecimento sem causa. Responsabilidade civil, Livraria Almedina, Coimbra, 2017, págs. 232-235. 12. Expressão preferida por Jorge Ribeiro de Faria, Direito das obrigações, vol. I, Livraria Almedina, Coimbra, 2001 (reimpressão), págs. 381-385 — com algum eco em António Menezes Cordeiro, Tratado de direito civil, vol. VIII — Direito das obrigações. — Gestão de negócios. Enriquecimento sem causa,. Responsabilidade civil, cit., págs. 233-234 (nota n.º 836). 13. No sentido de que imediação é a ausência de um facto intermédio, vide p. ex. Fernando Andrade Pires de Lima / João de Matos Antunes Varela (com a colaboração de Manuel Henrique Mesquita), anotação ao artigo 473.º, in: Código Civil anotado, vol. I — Artigos 1.º a 761.º, cit., pág. 457; João de Matos Antunes Varela, Das obrigações em geral, vol. I, cit., págs. 493-496 14. No sentido de que a imediação é a ausência de um património intermédio, vide, p. ex., Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das obrigações, cit., pág. 497 — caracterizando o enriquecimento indirecto ou mediato como aquele em que “a deslocação [se faz] através de um património intermédio”, ou em que há “duas deslocações sucessivas” — e Luís Menezes Leitão, Direito das obrigações, vol. I — Introdução. Da constituição das obrigações, 13.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2017, págs. 425-426. 15. O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Maio de 2006 — processo n.º 06A825 — fala de um requisito, “no mínimo, discutível e polémico”. 16. Fernando Andrade Pires de Lima / João de Matos Antunes Varela (com a colaboração de Manuel Henrique Mesquita), anotação ao artigo 473.º, in: Código Civil anotado, vol. I — Artigos 1.º a 761.º, cit., pág. 457; João de Matos Antunes Varela, Das obrigações em geral, vol. I, cit., págs. 493-496. 17. Francisco Manuel Pereira Coelho "Um problema de enriquecimento sem causa", in: Revista de Direito e Estudos Sociais, ano 27.º (1970), págs. 351-356 (354-356). 18. Jorge Ribeiro de Faria, Direito das obrigações, vol. I, cit., págs. 381-385 19. Diogo Leite de Campos, A subsidiariedade da obrigação de restituir o enriquecimento, Livraria Almedina, Coimbra, 1974, pág. 327 (nota n.º 1). 20. Luís Menezes Leitão, O enriquecimento sem causa no direito civil. Estudo dogmático sobre a viabilidade da configuração unitária do instituto, face à contraposição entre as diferentes categorias de enriquecimento sem causa, Centro de Estudos Fiscais, Lisboa, 1996, págs. 627 ss.; e, em termos mais sintéticos, Direito das obrigações, vol. I — Introdução. Da constituição das obrigações, 13.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2017, págs. 425-426. 21. Considerando que a posição do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Maio de 2006 é a “posição correcta”, vide Júlio Gomes, anotação ao artigo 473.º, in: Luís Carvalho Fernandes / José Carlos Brandão Proença (coord.), Código Civil anotado, vol. II — Direito das obrigações. Das obrigações em geral, cit., pág. 251. 22. Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das obrigações, cit., págs. 498-499. 23. Cf. Luís Menezes Leitão, Direito das obrigações, vol. I — Introdução. Da constituição das obrigações, cit., págs. 425-426. 24. António Menezes Cordeiro, Tratado de direito civil, vol. VIII — Direito das obrigações. — Gestão de negócios. Enriquecimento sem causa. Responsabilidade civil, cit., pág. 234. 25. Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das obrigações, cit., págs. 498-499. 26. Cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Janeiro de 1998 — processo n.º 97A354 —, em cujo sumário se escreve: “I. — No enriquecimento sem causa, como fonte da obrigação de restituir, é necessário que o enriquecimento tenha sido obtido imediatamente à custa do empobrecido que se arroga o direito à restituição, ou seja, é preciso que a vantagem, por um lado, e a perda, por outro, tenham sido originados pelo mesmo facto ou circunstância”. 27. Cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Janeiro de 1998 — processo n.º 97A354 —, em cujo sumário se escreve: “II. — A adopção deste princípio é de excluir, devendo admitir-se uma atribuição patrimonial indirecta com a intervenção de um património intermédio, sempre que a exigência da deslocação patrimonial directa se mostre excessiva, susceptível de ferir a justiça material, o comum sentimento de justiça”. 28. Entre os elementos relevantes para averiguar se a atribução patrimonial indirecta choca, ou não, com o comum sentimento de justiça poderão estar, p. ex., regras relativas ao risco da prestação e do concurso de credores, através dos […] pontos de vista valorativos [da] manutenção das excepções […], [da] protecção contra as excepções de terceiro […] [e da] justa repartição do risco de insolvência” [cf. Luís Menezes Leitão, Direito das obrigações, vol. I — Introdução. Da constituição das obrigações, cit., págs. 425-426]. 29. Como parece pensar António Menezes Cordeiro, Tratado de direito civil, vol. VIII — Direito das obrigações. — Gestão de negócios. Enriquecimento sem causa. Responsabilidade civil, cit., pág. 234 — sustentando que deve, tão-só, substituir-se a imediação ou unidade do enriquecimento pela unidade da valoração. 30. Como parece pensar Júlio Gomes, O conceito de enriquecimento, o enriquecimento forçado e os vários paradigmas do enriquecimento sem causa, Universidade Católica, Porto, 1998, págs. 433 ss. e 675 ss.; e Júlio Gomes, anotação ao artigo 473.º, in: Luís Carvalho Fernandes / José Carlos Brandão Proença (coord.), Código Civil anotado, vol. II — Direito das obrigações. Das obrigações em geral, cit., pág. 251. 31. Cf. factos dados como provados sob os n.ºs 7-10 e sob o n.º 11. 32. Cf. Luís Menezes Leitão, Direito das obrigações, vol. I — Introdução. Da constituição das obrigações, cit., pág. 453: “seguramente o conceito mais indeterminado no âmbito do enriquecimento sem causa”. 33. Rui de Alarcão, Direito das obrigações (policopiado), Coimbra, 1983, pág. 190. 34. Júlio Gomes, anotação ao artigo 473.º, in: Luís Carvalho Fernandes / José Carlos Brandão Proença (coord.), Código Civil anotado, vol. II — Direito das obrigações. Das obrigações em geral, cit., pág. 251. 35. Cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Março de 2017 — processo n.º 1769/12.5TBCTX.E1.S1. 36. Cf. designadamente os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Setembro de 1999 — processo n.º 99B686 —, de 16 de Outubro de 2003 — processo n.º 03B2813 — e de 19 de Fevereiro de 2013 — processo n.º 2777/10.6TBPTM.E1.S1. 37. Cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Março de 2017 — processo n.º 1769/12.5TBCTX.E1.S1. 38. Sobre a interpretação do artigo 476.º do Código Civil, vide, por todos, Júlio Gomes, anotação ao artigo 476.º, in: Luís Carvalho Fernandes / José Carlos Brandão Proença (coord.), Código Civil anotado, vol. II — Direito das obrigações. Das obrigações em geral, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2018, págs. 259-262; ou Diogo Costa Gonçalves, anotação ao artigo 476.º, in: António Menezes Cordeiro (coord.), Código Civil comentado, vol. iI — Das obrigações em geral, Livraria Almedina, Coimbra, 2021, págs. 394-396. 39. Cf. Júlio Gomes, anotação ao artigo 476.º, in: Luís Carvalho Fernandes / José Carlos Brandão Proença (coord.), Código Civil anotado, vol. II — Direito das obrigações. Das obrigações em geral, cit., pág. 262 — dando como exemplo o de “alguém ao transferir dinheiro de uma conta bancária para outra de que é também titular acaba por erro ou por defeito técnico do sistema para transferir a importãncia para a conta de um terceiro”. 40. Júlio Gomes, anotação ao artigo 476.º, in: Luís Carvalho Fernandes / José Carlos Brandão Proença (coord.), Código Civil anotado, vol. II — Direito das obrigações. Das obrigações em geral, cit., pág. 261. 41. cf. artigo 474.º do Código Civil: “Não há lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos ao enriquecimento”. |