Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 5.ª SECÇÃO | ||
Relator: | VASQUES OSÓRIO | ||
Descritores: | RECURSO PER SALTUM OMISSÃO DE PRONÚNCIA MEDIDA CONCRETA DA PENA PREVENÇÃO GERAL PREVENÇÃO ESPECIAL SUBSTITUIÇÃO DA PENA DE PRISÃO PERDA DE INSTRUMENTOS PRODUTOS E VANTAGENS | ||
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Data do Acordão: | 05/23/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PROVIDO EM PARTE | ||
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Sumário : | I - O critério legal de determinação da medida da pena, previsto no art. 71.º do CP, estabelece como factores a considerar na respectiva operação, dentro da moldura penal abstracta aplicável ao caso, as exigências de prevenção e a culpa do agente, devendo ser atendidas todas as circunstâncias que, não sendo típicas, militem contra e a favor deste. II - Tendo a pena por finalidade a protecção dos bens jurídicos e, na medida do possível, a ressocialização do agente, e não podendo ela, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa, o seu quantum resultará da medida da necessidade de tutela do bem jurídico (prevenção geral), com o limite da medida da culpa, intervindo a prevenção especial de socialização entre o ponto mais elevado da necessidade de tutela do bem e o ponto mais baixo onde ainda é comunitariamente suportável esta tutela. III - Tendo o arguido exercido a actividade de tráfico durante quase quatro anos, envolvendo, além do mais, cocaína e canábis, com aquisições de cerca de 50 gramas e 1,5 quilogramas, respectivamente, de três em três semanas, pelo preço global de € 3750, destinados à venda a número considerável de consumidores, quase todos eles com repetidas compras ao longo do tempo, e sendo muito elevadas as exigências de prevenção geral, não obstante a confissão parcial, a inexistência de antecedentes criminais, o problemático estado de saúde e a inserção social e familiar, a pena de 6 anos de prisão fixada pela 1.ª instância mostra-se necessária, adequada, proporcional e plenamente suportada pela medida da sua culpa, pelo que deve ser mantida. | ||
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Decisão Texto Integral: | RECURSO Nº 503/21.3PATVD.L1.S1 Recorrente: AA. Recorrido: Ministério Público. * Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte – Juízo Central Criminal de ... – Juiz ..., o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, do arguido AA, com os demais sinais nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de tráfico e outras actividades ilícitas agravado, p. e p. pelos arts. 21º, nº 1 e 24º, c) do Dec. Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às Tabelas I-B e I-C anexas. Por acórdão de 21 de Dezembro de 2023, foi indeferida a arguida nulidade da acusação por omissão de perícia essencial à descoberta da verdade e foi o arguido condenado, pela prática de um crime de tráfico e outras actividades ilícitas, p. e p. pelo art. 21º, nº 1 do Dec. Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às Tabelas I-B e I-C anexas, na pena de seis anos de prisão, bem como foram declaradas perdidas a favor do Estado, além do mais, as quantias monetárias apreendidas nos autos de € 255, € 1000 e € 7950, e os veículos automóveis com as matrículas ..-..-VD e ..-IS-.., por terem sido considerados vantagem ilícita proveniente da actividade criminosa. * Inconformado com a decisão, recorre o arguido para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando no termo da motivação, as seguintes conclusões: 1- o arguido AA nasceu a ...-...-1961, completa hoje 62 ANOS de vida; foi preso numa cela fria e húmida de 7m2 com outro recluso; a cela era nauseabunda, não existia privacidade, a sanita era junto às duas camas, sem ventilação, sem higiene e a alimentação era péssima; estava encerrado 22 Horas diárias na cela o que viola ostensivamente o artº 3º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Portugal foi condenado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos no caso “PETRESCU” contra Portugal pela sobrelotação prisional e condições indignas da cela; 2- o arguido estava condenado a não ser tratado nem visto por Médicos, quiçá a morrer por ausência de tratamento médico: padece de cardiopatia isquémica, tem 2 “stents”, é portador de “pacemaker”, sofre de diabetes, tem apenas um rim e emagreceu drasticamente nos últimos meses sendo observado e tratado nos Hospital 1, Hospital 2, Hospital 3, Hospital 4 e na Associação ... conforme documentos juntos aos autos. 3- no EP... e mesmo no Hospital 5 por não EXISTIREM CONDIÇÕES DE TRATAMENTO FOI ORDENADO QUE AGUARDASSE SOB VIGILÂNCIA ELETRÓNICA OS ULTERIORES TRAMITES. 4- a pena de seis (6) anos traduz a MORTE do arguido na cela !!! confessou a maioria dos factos na Instrução e Julgamento !!!! mostrou-se arrependido! consta do Acórdão: 1.94 O arguido confessou grande parte dos factos, mormente no que se refere aos compradores de cujo nome se recordava. 1.95 Verbalizou arrependimento. 5- uma pena de 4 anos e suspensa na sua execução propicia a REINSERÇÂO SOCIAL. A confissão foi espontânea mas não foi valorada pelo Tribunal a quo !!! a inversão da conduta do recorrente, entre a data da prática dos factos e o momento atual, tem de ser fortemente valorizada, em sede de fixação da execução da pena. A pena de 6 anos traduz o fim e morte do arguido na prisão nauseabunda e sem dignita. 6- tendo em conta toda a factualidade e circunstâncias provadas e porque se evidencia a possibilidade séria de fazer um juízo de prognose favorável relativamente à inserção do recorrente na Sociedade, sem que volte a cometer ilícitos criminais, é de reduzir a pena a 4 anos de prisão e suspensa na sua execução: art.º 50.º, do CP. 7- a sujeição a pena privativa da liberdade terá como consequência, um enorme prejuízo para a sua situação familiar, para a Reinserção Social, prolongamento do sofrimento numa cela fria e húmida, MORTE e afigura-se contrária às finalidades da punição que visam, precisamente, o oposto; o Tribunal a quo violou, por erro de interpretação, o art.º 50.º, do CP. pois o artº 21 do Dec. Lei 15/93 pugna por pena de prisão de 4 a 12 anos; sendo o limite mínimo de QUATRO (4) ANOS porque razão não será o arguido condenada a este quantum e ver a pena suspensa na sua execução? 8- sob o art.º 379.º, n.º 1, al. c), do CPP é nula a sentença e o artº 40° do Cód. Penal visa a reintegração social, não pode a pena ultrapassar a medida da culpa situando-se entre um limite mínimo… intervindo os outros fins das penas – prevenção geral e especial..(cf. Claus Roxin, in Culpabilidad Y Prevencion en Derecho Penal, pags. 4 a 113) ..” «reacção contra as penas institucionalizadas ou detentivas, por própria natureza lesivas do sentido ressocializador que deve presidir à execução das reacções penais» . “O pressuposto material da suspensão da execução da pena é o da adequação da mera censura do facto e da ameaça da prisão às necessidades preventivas do caso,..”- Paulo Pinto de Albuquerque in “Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, Univ. Católica Editora, fls. 195 9- a pena de prisão efetiva não cura antes revolta e causa sofrimento à Família e, após 2 anos e 7 meses é inútil: “qual o propósito de manter as pessoas enlatadas, armazenadas, sem actividade, sem objectivos, com o tempo a passar por elas?..sensação de sufoco…” in PRISÕES, pag. 86, ed. Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2020; CESARE BECCARIA: “crueldade das penas....vigilância dos Magistrados virtude útil..legislação branda...” Dei delitti e delle pene, Ed Harlem, Livorno - 1766, Ed. da Fundação Gulbenkian pag 115... .( sublinhado da defesa ) 10- uma JUSTIÇA VIGILANTE, que conceda a redução da pena para os 4 anos de prisão suspensa equivalerá ao ius est ars boni et aequi (= o direito é uma técnica do bom e do equitativo). 11- a única pena adequada, proporcionada e justa é a de 4 anos de prisão e suspensa na execução; assim foi decidido no processo 308/10.7... do Juiz Central Criminal ...- Juiz ...; o aí arguido BB foi condenado por trafico de 1732 Kg de cocaína em 4 anos e 2 meses de prisão com pena suspensa confirmada pelo Tribunal da Relação de ... e conforme documento 1 que se junta; 12- urge concluir sob o artº 379º- 1, c) do CPP que o acórdão é nulo por ausência de referencia e ponderação sobre a pena suspensa face à confissão e ao artº 50º do Código Penal; o Tribunal a quo violou o artº 21º do Dec lei 15/93 ao aplicar 6 anos de prisão, pena que deve ser reduzida a 4 anos e suspensa na sua execução. 13- os veículos devem ser restituídos ao arguido; o perdimento automático de um veículos ou mesmo de um barco, que transportam droga já foi declarado INCONSTITUCIONAL nos processos 327/99, 176/00 e 202/00 proferidos em 99.05.26, 00.03.22 e 00.04.04 pelo Tribunal Constitucional. 14- este Alto Tribunal tem assumido uma interpretação do nº 1 do artº 35º do Dec.Lei 15/93 apelando à CAUSALIDADE e de NECESSIDADE, de acordo coma qual a perda de objetos do crime só é admissível quando entre a utilização do objeto e a prática do crime existe uma relação de causalidade adequada, de forma a que, sem essa utilização, a infração em concreto não teria sido praticada ou dificilmente o teria sido na forma em que foi cometido, ou seja, para a declaração de perdimento é necessário que o crime não tivesse sido praticado (ou tivesse sido praticado de uma forma diferente, sendo essa diferença penalmente relevante) sem o objecto em causa (instrumento essencial) - conforme Acórdãos de 99.06.02, 01.02.21, 04.05.19 e 12.02.09 proferidos nos processos 281/99, 2814/00, 1118/04 e 999/10.TALRS.S1. 15- no Acórdão nº 202/00 de 4-4-2004 do Tribunal Constitucional decidiu-se que “Esta exigência de proporcionalidade resulta, aliás, logo do facto de (independentemente da mais próxima qualificação do direito de propriedade constitucionalmente protegido) se reconhecer, como se tem feito na jurisprudência deste Tribunal, que a garantia de cada um de não ser privado da propriedade (salvo por razões de utilidade pública, e ainda assim só mediante pagamento de justa indemnização), resultante do artigo 62º (designadamente, n.º 2) da Lei Fundamental, tem "natureza análoga" aos direitos, liberdades e garantias (v., recentemente, os Acórdãos n.ºs 329/99 e 517/99, tirados em plenário e publicados no Diário da República, II série, respetivamente de 20 de Julho e de 11-11-1999). À limitação a tal garantia resultante do facto de os bens serem utilizados como instrumento de um crime deve estar sujeita a uma regra de proporcionalidade. Ora, uma norma que prevê que os instrumentos da infracção devem em qualquer caso ser declarados perdidos a favor do Estado, independentemente da consideração em concreto, quer da gravidade do ilícito e da culpa do agente, quer da perigosidade e do risco dos instrumentos para futuros crimes, quer mesmo da própria natureza (e valor) do objecto em questão, não pode certamente, na indeterminação abstracta da reacção ablatória do direito de propriedade que impõe, ser considerada respeitadora das exigências constitucionais de proporcionalidade. Com estes fundamentos, o Tribunal Constitucional decide: julgar inconstitucional, por ofensa ao princípio constitucional da proporcionalidade, conjugado com o artigo 62º, n.º 2 da Constituição da República, a norma do artigo 31º, n.º 10, do mesmo diploma legal, na parte em que prevê, como efeito necessário da prática do crime ali tipificado, e independentemente da ponderação das circunstâncias do caso, a perda dos instrumentos da infracção; 16- no Acordão nº 327/99 no processo n.º 144/99 de 26-5-1999 o Tribunal Constitucional decidiu que “o artigo 30º, n.º 4, da Constituição dispõe que "nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos".Esta norma não proíbe que as penas possam traduzir-se, elas próprias, na perda de direitos civis, profissionais ou políticos (por exemplo, na interdição do exercício de uma profissão por determinado período de tempo ou na demissão da função pública). Questão é que tal pena seja aplicada pelo juiz de acordo com as regras competentes (princípio da culpa, regra da tipificação, adequação da pena à gravidade da infracção, etc.). A norma em causa proíbe, isso sim, que essa perda de direitos se siga, automaticamente (ou seja: por mero efeito da lei e independentemente de decisão judicial), à condenação em certas penas ou pela prática de certos crimes. É que, se tal fosse permitido, estar-se-ia a acrescentar à pena do crime uma outra pena, que redundaria na "morte civil, profissional ou política" do cidadão. E a fazê-lo, de maneira mecânica - ou seja: sem respeito pelas exigências dos princípios da culpa, da necessidade das penas e da jurisdicionalidade. E, com isso, ao mal da pena aplicada, que é inevitável, ia ainda juntar-se, de forma automática, um efeito estigmatizante ou infamante que serviria para dificultar a ressocialização do delinquente [ cf., sobre esta matéria, entre outros, os acórdãos nºs 16/84, 91/84, 310/85, 75/86, 94/86, 249/92, 209/93,442/93 e 748/93(publicados no Diário da República, II série, de 12 de Maio de 1984, I série, de 6 de Outubro de 1984, II série, de 11 de Abril de 1986, de 12 de Junho de 1986, de 18 de Junho de 1986, de 27 de Outubro de 1992, de 1 de Junho de 1993, de 19 de Janeiro de 1994 e I-A série, de 23 de Dezembro de 1993, respetivamente)] . Relator MESSIAS BENTO 17- no mesmo sentido o Acórdão do TRL no procº 756/16.9TELSB-C.L1-3: Relator: CRISTINA DE ALMEIDA E SOUSA Data do Acordão: 03-02-2021 Sumário: De acordo com o princípio geral que emerge da concatenação entre o art. 178º nº1 do CPP e o art. 109º nº 1 do CP….. para que possa ser considerado instrumento do crime e, consequentemente, declarado perdido a favor do Estado, é preciso que resulte demonstrado e ele se tornou ou ia ser necessário para a execução do crime, que a sua utilização influenciou a modalidade concreta de execução do facto, a tal ponto que sem o veículo a respetiva consumação resultaria impossível ou que, naquelas circunstâncias do facto, se tornaria de muito mais difícil a consumação, ou pelo menos, os resultado antijurídico teria sido produzido de forma substancialmente diferente. Deve a pena de 6 anos ser reduzida a 4 anos de prisão, suspensa na sua execução e revogado o perdimento dos veículos ordenando-se a sua restituição ao arguido pois só assim se fará a Lídima Justiça!!!! O acórdão fez errada interpretação dos artigos 21-1 do DL 15/93, 50º, 71º do Código Penal, 379-1-C) do CPP, 13º, 18º-2 da Lei Fundamental e 35º do DL 15/93. A pena aplicada viola os arts. 50º, 70º e 71º do Codigo Penal O artº 35º do DL 15/93 qua tale foi interpretado pelo Tribunal a quo traduz inconstitucionalidade por violação do artº. 18-2 da CRP. Concedendo provimento ao recurso, revogando a aplicação da pena de prisão de 6 anos, substituindo-a por uma pena de 4 anos de prisão e suspensa na sua execução, revogando o perdimentos dos veículos e a sua restituição ao arguido, Vossas Excelências farão a mais Lídima Justiça! * O recurso foi admitido por despacho de 19 de Janeiro de 2024. * Respondeu ao recurso a Digna Magistrada do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: 1. A pena aplicada ao arguido, face aos factos provados, mostra-se proporcional e plenamente adequada, tendo o tribunal a quo, na fixação da medida da pena, em consideração a sua confissão (ainda que parcial), o arrependimento verbalizado (ainda que incipiente) e o seu estado de saúde, motivo pelo qual foi condenado numa pena de seis anos de prisão – ¼ da moldura penal abstractamente aplicável. 2. O tribunal a quo não pôde deixar de atender ao elevado grau de ilicitude dos factos e à culpa do arguido, a diferente natureza dos estupefacientes, a facilidade com que o arguido os obtinha, deslocando-se a ..., amiúde, regressando posteriormente a ... transportando uma quantidade considerável de estupefaciente bem como à ligeireza com que procedia à sua venda a quem se mostrasse interessado, de dia ou à noite em locais públicos, frequentados por pessoas das mais variadas faixas etárias e condições. 3. Acresce que, não se olvida que para o verbalizado arrependimento terá pesado a abundante prova carreada para os autos, a evidência de uma decisão condenatória e o seu estado de saúde. E, pese embora a confissão, não se olvida o esforço do arguido em pretender circunscrever a sua conduta a um período temporal mais reduzido e de admitir apenas as vendas de canábis resina. 4. É verdade que o arguido padece de diversos problemas de saúde. Porém, tal condição, que já existia à data da prática dos factos, não o impediu de durante, pelo menos, três anos praticar o crime pelo qual foi condenado, demonstrando absoluta disponibilidade da sua parte, como também não obstou que, amiúde, conduzisse cerca de 120 km para se abastecer de estupefaciente, como igualmente não o inibiu de, diariamente, consumir produtos estupefacientes – canábis e cocaína. 5. As viaturas da marca Citroen, modelo Berlingo, matrícula ..-..-VD e da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-IS-.. foram adquiridas pelo arguido no período em que se dedicou ao tráfico de estupefacientes e com o produto desta actividade. 6. As aludidas viaturas foram utilizadas pelo arguido para o cabal desenvolvimento da actividade de tráfico de estupefacientes – facilitando as deslocações (quer para a venda quer para a aquisição dos produtos pelo arguido) e potenciando o incremento do negócio. Termos em que deve ser negado provimento ao recurso interposto, mantendo-se dessa forma a decisão recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA! * Por despacho de 31 de Janeiro de 2024 foi ordenada a subida dos autos para o Tribunal da Relação de Lisboa. * * Por despacho do Sr. Juiz Desembargador relator da Relação de Lisboa de 15 de Fevereiro de 2024, foi ordenado, nos termos do disposto no art. 432º, nº 1, c) do C. Processo Penal, o envio dos autos para o Supremo Tribunal de Justiça. * * Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal emitiu parecer, no termo do qual concluiu: Em síntese: Cremos, com natural respeito devido a opinião diversa, que o Tribunal “a quo”, ao aplicar a pena, apreendeu e valorou devidamente a natureza e gravidade do facto-crime e a personalidade do arguido, na sua relação dialéctica e expressão ético-social, aplicando uma pena bem perto do seu limite mínimo abstracto; São de declarar perdidos para o Estado, como vantagens e instrumentos, dois veículos pertença do agente do crime de “tráfico de estupefacientes”, que os adquiriu com os seus proveitos e que diariamente, durante cerca de 07 meses dos 03 anos em que desenvolveu tal actividade, os utilizou indistintamente para adquirir, transportar ou vender as drogas a consumidores. IV Em conclusão: Motivo por que o Ministério Público dá Parecer que: Deverá o presente recurso ser julgado não provido e improcedente, sendo de manter os termos da decisão recorrida. * Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal. O recorrente respondeu ao parecer, reafirmando, nos seus exactos termos, o recurso e respectivas conclusões. * * Colhidos os vistos, foram os autos presentes à conferência. Cumpre decidir. * * * * II. FUNDAMENTAÇÃO A) Factos provados A matéria de facto provada que provém da 1ª instância é a seguinte: “(…). 1. Com interesse para a boa decisão da causa, resultou provado que: 1.1 O arguido AA, conhecido pelas alcunhas de “CC”, “DD” e “EE”, pelo menos desde Fevereiro de 2019 que se vem dedicando com carácter de regularidade, de forma reiterada e persistente à compra de estupefaciente, designadamente cocaína e canábis, nos seus mais variados estados de apresentação, para posterior revenda no concelho de ... e localidades limítrofes, maioritariamente a consumidores a troco de quantias pecuniárias fazendo desta sua actividade o seu meio de subsistência. 1.2 Actividade que desenvolvia utilizando os números de telefone .......55 e .......94, este registado em nome da sua esposa FF, numa fase inicial a partir da sua residência, sita na Rua ..., deslocando-se os seus “clientes” ao parque de terra batida junto da mesma após contacto telefónico para adquirir o estupefaciente. 1.3 Sensivelmente a partir de 17 de Fevereiro de 2022, data em que GG foi fiscalizado após a aquisição de estupefaciente ao arguido AA, este passou a fazer menos transacções junto da sua habitação e intensificou a distribuição directa aos consumidores com recurso às viaturas da marca Citroen, modelo Berlingo branca, matrícula ..-..-VD, da marca VW, modelo Polo azul, matrícula ..-IS-.. e, por uma vez, deslocou-se na viatura da marca Citroen, modelo Xsara azul, matrícula ..-..-NZ, todas de sua propriedade. 1.4 Para o efeito, o arguido AA comprava o estupefaciente maioritariamente a um indivíduo de nome HH, residente entre a Estação e a praia de ..., onde se deslocava habitualmente de três em três semanas comprando-lhe 50 gramas de cocaína pelo valor de € 2.000,00, um quilo de canábis resina pelo preço de € 2.500,00, conhecido na gíria como “sabonete” e meio quilo de pedaços de canábis resina, vulgarmente conhecidos como “bolotas”, pela quantia de € 1.250,00. 1.5 Cocaína essa a que o arguido AA, por indicação daquele, acrescentava pelo menos 25 gramas de um medicamento cujo nome, substância e marca não se apurou, num processo comumente conhecido como de “corte” e após vendia a € 50,00 o grama, obtendo um lucro de pelo menos € 1.750,00 por cada 50,00 gramas comprados. 1.6 A canábis resina o arguido AA vendia entre os € 6,00 a € 8,00 o grama, obtendo um lucro mínimo de € 9.000,00 entre o “sabonete” e as “bolotas”. 1.7 Desde Fevereiro de 2019 e até 14 de Dezembro de 2022, data em que foi detido, o arguido AA foi contactado frequentemente por diversos consumidores para lhes vender produto estupefaciente. 1.8 II, consumidora de canábis resina, entre meados de Abril e Dezembro de 2021, adquiriu ao arguido AA, o qual contactava previamente por telefone, duas a três vezes por semana entre € 20,00 a € 40,00 de haxixe, deslocando-se ao parque de estacionamento de terra batida junto da residência daquele na viatura da marca Iveco, modelo Daly, matrícula ..-AZ-.., propriedade de JJ, que ali a levava a seu pedido. 1.9 KK é “cliente” do arguido AA desde Junho de 2020, comprando-lhe € 50,00 do dito produto pelo menos uma vez por mês, contactando-o previamente pelo Messenger ou para o n.º .......55. 1.10 Assim, no dia 21 de Setembro de 2021, cerca das 17h55, o arguido AA, após prévio contacto via Messenger de KK, deslocou-se ao parque de estacionamento da E.......... ...... ......, na viatura da marca Citroen, modelo Berlingo, matrícula ..-..-VD, estacionando nas traseiras do estabelecimento denominado “V.......”. 1.11 Cerca das 18h05, ali compareceu a pé LL e KK, tendo o primeiro entrado na mencionada viatura para o lugar do pendura e o segundo encetado contacto com o arguido AA pelo vidro do condutor. 1.12 Nesse instante o arguido AA entregou a KK um saco de plástico contendo 4,60 gramas de canábis folha (Liamba) entregando este em troca ao arguido uma nota de € 20,00 e três de € 10,00, totalizando € 50,00. 1.13 Por sua vez, o arguido AA entregou a LL, a troco de € 20,00, um saco de plástico contendo 4,948 gramas de canábis resina com um grau de pureza de THC de 26,3%, suficiente para 26 doses diárias individuais (perícia de fls. 35). 1.14 Após, aqueles entraram para a viatura da marca Renault, modelo Scenic, matrícula ..-..-XN e iniciaram a marcha para abandonar o local, contudo pelas 18h20 foram objecto de uma fiscalização realizada pelos Agentes da PSP MM e NN que vieram a encontrar na sua posse o estupefaciente referido. 1.15 OO, consumidor de canábis resina e folhas desde os 20 anos de idade, conheceu o arguido AA como vendedor de estupefaciente em Outubro de 2020, tendo registado no seu telefone o n.º .......55 com o nome “PP” e o n.º .......94 com o nome de “PP1”. 1.16 Desde a data referida, pelo menos uma vez por mês, passou a comprar ao arguido AA cerca de € 160,00 de canábis pagando posteriormente por MBWAY para o número indicado 1.17 No dia 10 de Dezembro de 2021, pelas 22h40, OO, na viatura da marca BMW, matrícula ..-JE-.., dirigiu-se ao parque de estacionamento junto da residência do arguido AA que saiu de casa, deslocou-se até junto do veículo daquele e entregou-lhe dois sacos de plástico, um contendo 22,540 gramas canábis resina e outro 9,442 gramas de canábis folha. 1.18 A canábis resina, tinha um grau de pureza de THC de 15,5%, sendo suficiente para 69 doses individuais e a canábis folha para 7 doses individuais atento o grau de pureza de THC de 7%. 1.19 Pela canábis resina OO pagou € 160,00 e pela canábis folha € 50,00 por MBW, como habitualmente fazia. 1.20 Após sair do local foi objecto de uma fiscalização realizada pelos Agentes da PSP QQ, MM e NN, na Rua ..., vindo a ser encontrado no compartimento de arrumação da porta do condutor um saco de plástico contendo o estupefaciente acima mencionado. 1.21 RR, consumidor desde 2012 de cocaína, entre os anos de 2018 e 2022, conheceu o arguido AA com a alcunha de “CC” por intermédio de SS, a quem comprava cocaína pelo valor de € 45,00. 1.22 Desde a data referida e até 14 de Dezembro de 2022 passou a comprar ao arguido AA, ocasionalmente uma tira de haxixe pelo preço de € 25,00 e diariamente um grama de cocaína em pó ou pedra (crack) pelo valor de € 50,00, contactando-o previamente para os números .......55 e .......94 fazendo as transações, habitualmente junto da casa daquele, ou em outros locais que cominavam, em ... (mas também junto das lojas do G......., do A..., do L..., da A....... ou do M...., em .... 1.23 SS é consumidor de canábis nos seus vários estados (haxixe/folha) e de cocaína tendo conhecido o arguido AA no início de 2020, a quem na altura adquiriu um grama de cocaína pelo preço de € 50,00. 1.24 A partir da data referida e até 14 de Dezembro de 2022, SS passou a comprar um grama de cocaína ao arguido AA pelo preço de € 50,00 quase todos os fins-de-semana, contactando-o previamente para o número .......55 fazendo as transações, habitualmente junto da casa daquele, mas também no posto de combustível da BP de ... e num terreno sito na .... 1.25 No dia 30 de Dezembro de 2021, cerca das 21h20, o arguido AA deslocou-se na viatura da marca Citroen, modelo Berlingo, matrícula ..-..-VD, à zona industrial do Bairro ..., onde se encontravam RR e SS na viatura da marca VW, modelo UP, matrícula AH-..-VC, tendo entregue a RR duas pedras de cocaína recebendo em troca € 100,00. 1.26 SS, solicitou ao arguido AA que lhe vendesse mais um grama de cocaína por € 50,00, mas como este ainda lhe devia € 20,00 o arguido AA recusou vender-lhe o estupefaciente. 1.27 TT, consumidor diário de canábis e cocaína, conheceu o arguido AA em Dezembro de 2020 por intermédio de UU, tendo-lhe adquirido pela primeira vez dois a três gramas de haxixe em Janeiro de 2021, tendo pago € 20,00. 1.28 Desde essa data e até 14 de Dezembro de 2022 comprou ao arguido AA, pelo menos uma a duas vezes por semana € 20,00 de haxixe e um grama de cocaína pelo preço de €50,00, contactando-o previamente para o número .......55 fazendo as transacções, habitualmente junto da casa daquele, mas também no estacionamento da A... em .... 1.29 Assim, no mencionado dia 30, TT, na viatura da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-FO-.., deslocou-se ao parque de estacionamento da loja G......., sita no Bairro ..., onde posteriormente compareceu o arguido AA que lhe entregou 2,5 gramas de haxixe pelo preço de € 20,00. 1.30 No dia 2 de Janeiro de 2022, cerca das 22h30, TT, na viatura referida, deslocou-se ao parque de estacionamento de terra batida junto da casa do arguido AA e comprou-lhe mais € 20,00 de haxixe. 1.31 Por sua vez, no dia 3 de Janeiro de 2022, pelas 17h25, TT, mais uma vez na viatura referida, deslocou-se novamente ao parque de estacionamento junto da casa do arguido AA que, decorridos alguns minutos, saiu de casa e entregou-lhe mais 2,5 gramas de haxixe recebendo em troca € 20,00. 1.32 VV, consumidor de haxixe duas a três vezes por semana, conheceu o arguido AA, pessoa que conhecia pela alcunha de “CC”, em Julho de 2020 começando a comprar-lhe haxixe em Julho de 2020. 1.33 Desde a mencionada data e até início de Janeiro de 2022, passou a comprar € 20,00 de haxixe ao arguido AA, pelo menos duas a três vezes por mês, deslocando-se para o efeito junto da sua residência onde era feita a transação após prévio contacto telefónico, sendo o pagamento feito por MBW ou em numerário. 1.34 No dia 4 de Janeiro de 2022, cerca das 21h20, o arguido AA deslocou-se ao posto de combustível da BP, sito na Avenida ..., na viatura da marca Citroen, modelo Berlingo, matrícula ..-..-VD, estacionando atrás da viatura da marca Citroen, modelo C3, matrícula ..-LJ-.., utilizada por VV. 1.35 Este saiu da viatura e dirigiu-se ao veículo do arguido AA tendo-lhe adquirido € 40,00 de haxixe. 1.36 Acto seguido, o arguido AA saiu da viatura, retirou um pedaço de haxixe, cujo peso não se apurou, do bolso direito do casaco e entregou-o a WW que foi ao seu encontro, tendo este entregue à troca quantia compreendida entre os € 10,00 e os € 20,00. 1.37 No dia 5 de Janeiro de 2022, pelas 21h47, TT, mais uma vez na viatura da marca VW, matrícula ..-FO-.., deslocou-se ao parque de estacionamento junto da casa do arguido AA, onde este compareceu decorridos alguns minutos vendendo-lhe mais um pedaço de haxixe pelo preço de € 20,00. (relatório de vigilância de fls. 92). 1.38 No dia 6 de Janeiro de 2022, cerca das 14h00, XX, após contactar telefonicamente com o arguido AA, pessoa que conheceu em Dezembro de 2021, por indicação desde deslocou-se ao posto de combustível da BP de ..., na viatura da marca Opel, modelo Movano, matrícula ..-AJ-.. a fim de lhe adquirir estupefaciente. 1.39 O arguido AA deslocou-se ao posto na viatura da marca Citroen, matrícula ..-..-VD, entregando a XX um grama de cocaína a troco de € 40,00. 1.40 Decorridos cerca de três meses desde a data referida, em data não apurada, XX adquiriu mais um grama de cocaína ao arguido pagando € 40,00. 1.41 YY, consumidor de canábis nos seus vários estados desde os 16 anos de idade, veio a ter conhecimento de que o arguido AA vendia estupefaciente em Janeiro de 2021 através dos seus amigos ZZ, WW. 1.42 A partir dessa data, por intermédio daqueles, passou a comprar ao arguido AA, pelo menos uma vez por semana, entre quatro a cinco gramas de canábis folha pelo preço de € 15,00 e um pedaço de haxixe em média com 5 gramas pelo valor de € 20,00, sendo as transações feitas nos C...., no posto de combustível da BP de ... ou junto à casa daquele. 1.43 No dia 7 de Janeiro de 2022, cerca das 22h00, o arguido AA, na viatura da marca Citroen, matrícula ..-..-VD, deslocou-se novamente ao posto de combustível referido, onde se encontrava WW que lhe comprou um pedaço de haxixe, cujo peso não se apurou a troco de quantia compreendida entre os € 10,00 e os € 20,00, tendo depois oferecido parte desse produto a YY. 1.44 No dia 10 de Janeiro de 2022, pelas 15h40, TT, na viatura da marca Fiat, modelo Doblo, matrícula AE-..-DB, deslocou-se à residência do arguido AA, onde após ter entrado, este lhe vendeu 2,5 gramas de haxixe pelo qual pagou € 20,00 e um grama de cocaína pela qual pagou € 50,00. 1.45 No dia 26 de Janeiro de 2022, pelas 13h20, TT, no veículo da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-FO-.., deslocou-se ao parque de estacionamento junto da casa do arguido AA onde este lhe entregou 2,5 gramas de haxixe a troco de € 20,00. 1.46 No dia 7 de Fevereiro de 2022, pelas 14h30, TT, na viatura da marca Fiat, modelo Doblo, matrícula AE-..-DB, deslocou-se novamente à residência do arguido AA, onde após ter entrado, este lhe vendeu 2,5 gramas de haxixe pelo qual pagou € 20,00 e um grama de cocaína a troco de € 50,00. 1.47 No dia 8 de Fevereiro de 2022, pelas 12h45, TT, na viatura acabada de mencionar, deslocou-se ao parque de estacionamento junto à residência do arguido AA, onde este lhe vendeu um grama de cocaína pela qual pagou € 50,00. 1.48 Nesse mesmo dia, pelas 21h30, TT, no veículo da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-FO-.., deslocou-se novamente ao mencionado parque ali comparecendo o arguido que lhe vendeu 2,5 gramas de haxixe pelo preço de € 20,00. 1.49 No dia 9 de Fevereiro de 2022, pelas 13h05, TT, na viatura da marca Fiat, modelo Doblo, matrícula AE-..-DB, deslocou-se ao parque de estacionamento junto à residência do arguido AA, onde este lhe vendeu um grama de cocaína pela qual pagou € 50,00. 1.50 No referido dia, pelas 22h20, AAA e WW, na viatura da marca Mercedes, modelo 190, matrícula ..., deslocaram-se ao posto de combustível da BP de ..., local onde pelas 22h25 chegou o arguido AA na viatura da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-IS-... 1.51 Acto seguido, WW dirigiu-se à viatura daquele e comprou-lhe haxixe em quantidade que não se apurou pagando entre € 10,00 a € 20,00. 1.52 No dia 10 de Fevereiro de 2022, pelas 14h20, TT, na viatura da marca Fiat, modelo Doblo, matrícula AE-..-DB, deslocou-se novamente ao parque de estacionamento junta à residência do arguido AA, onde este lhe entregou um grama de cocaína a troco de € 50,00, a qual o mesmo veio a consumir no posto de combustível da BP de ... cerca das 19h45. 1.53 No dia 11 de Fevereiro de 2022, cerca das 13h40, TT, na viatura mencionada, deslocou-se outra vez ao parque de estacionamento junto da habitação do arguido AA, após o que se dirigiu à porta do prédio onde este lhe entregou um grama de cocaína pelo preço de € 50,00. 1.54 No referido dia, pelas 19h30, BBB, na viatura da marca Fiat, modelo Doblo, matrícula ..-AC-.., acompanhado de WW deslocaram-se ao posto de combustível da BP de ..., local onde veio a surgir o arguido AA, na viatura da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-IS-.., parando ao lado da loja de conveniência, momento em que WW se lhe dirigiu e lhe comprou um pedaço de haxixe de peso não apurado por quantia compreendida entre os € 10,00 e € 20,00. 1.55 Ainda nesse dia, pelas 22h20, TT dirigiu-se a pé à porta do prédio da residência do arguido AA onde este lhe entregou 2,5 gramas de haxixe pelo valor de € 20,00. 1.56 No dia 12 de Fevereiro de 2022, pelas 18h40, o arguido AA na viatura da marca VW, matrícula ..-IS-.., deslocou-se ao posto de combustível da BP de ... tendo WW lhe comprado mais um pedaço de haxixe, cujo peso não se apurou, pagando entre € 10,00 a € 20,00. 1.57 CCC, consumidor de cocaína, comprou pela primeira vez um grama de cocaína ao arguido AA em meados de Janeiro de 2021 pelo valor de € 50,00, pessoa que contactava previamente para o numero .......55 que tinha gravado na sua lista telefónica como “DDD”. 1.58 A partir da data referida passou a comprar um grama de cocaína ao arguido AA pelo valor de € 50,00 pelo menos uma vez por mês fazendo as transacções junto ao C..... ......, na D........, no posto de combustível da BP de ... e no I.......... .. ...... ...... e, pelo menos duas vezes, no terreno utilizado por aquele na .... 1.59 No dia 15 de Fevereiro de 2022, pelas 21h20, o arguido AA na viatura da marca VW, matrícula ..-IS-.., deslocou-se ao referido posto de combustível, onde parou vindo a parar junto de si a viatura da marca Opel, modelo Zafira, matrícula ..-DC-.., tendo CCC se dirigido àquele comprando-lhe um grama de cocaína pelo preço de € 50,00. 1.60 No dia 16 de Fevereiro de 2022, pelas 18h50, o arguido AA, na viatura da marca VW, matrícula ..-IS-.., deslocou-se novamente ao posto de combustível da BP. de ..., parando ao lado da viatura da marca Fiat, matricula ..-AC-.., utilizada por BBB, momento em que WW se lhe dirigiu comprando-lhe um pedaço de haxixe cujo peso não se apurou pagando entre € 10,00 a € 20,00. 1.61 No dia 17 de Fevereiro de 2022, pelas 19h00 foi combinando um encontro na Av ..., ..., onde o arguido AA se deslocou na viatura da marca VW, matrícula ..-IS-.., entregando a GG 2,206 gramas de haxixe, com um grau de pureza de THC de 41,6%, suficiente para 18 doses diárias individuais, a troco de € 25,00. 1.62 No dia 21 de Março de 2022, pelas 20h45, o arguido AA na sua viatura da marca Citroen, modelo Xsara, matrícula ..-..-NZ, dirigiu-se ao parque de estacionamento da A....... onde parou, momento em que surge TT no veículo da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-FO-.., tendo o arguido feito sinais de luzes após o que abandonaram o parque. 1.63 Pelas 21h00 TT imobiliza a sua viatura na Av ... e TT na Av. ..., após dirigiu-se ao multibanco do Banco Santander onde levantou dinheiro dirigindo-se de seguida ao arguido AA que lhe entregou 2,5 gramas de haxixe a troco de duas notas de € 10,00. 1.64 EEE, consumidor diário de haxixe e de cocaína, conheceu o arguido AA há cerca de 2 anos tendo-lhe adquirido pela primeira quatro gramas de canábis resina pela altura do Carnaval de 2019, tendo pago € 20,00. 1.65 A partir dessa data e até 14 de Dezembro de 2022, passou a comprar ao arguido AA, pelo menos uma vez por mês, entre cinco a dez gramas de haxixe pagando entre € 60,00 a € 70,00 por compra, contactando-o previamente para os números .......55 e .......94 fazendo a maioria das transacções na rotunda da ... e junto da residência daquele. 1.66 No dia 4 de Maio de 2022, pelas 11h20, EEE, na viatura da marca Honda, modelo Civic, matrícula ..-..-XL, deslocou-se ao parque de estacionamento junto da casa do arguido AA, onde este compareceu passados uns minutos e lhe vendeu dez gramas de haxixe pelo preço de € 60,00. 1.67 No dia 10 de Maio de 2022, pelas 21h10, TT, no veículo da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-FO-.., deslocou-se novamente ao parque de estacionamento junto da casa do arguido AA, tendo este saído de casa, se dirigido à viatura daquele e lhe entregou 0,149 gramas de Canábis resina e 0,918 gramas de cocaína, pelo qual pagou € 10,00 e € 50,00 respectivamente. 1.68 No entanto, na Rua ..., TT foi fiscalizado pela Agente da PSP QQ vindo a ser encontrado numa bolsa o haxixe e, na zona genital, dois sacos de plástico contendo a cocaína. 1.69 Por sua vez, no dia 16 de Maio de 2022, pelas 15h15, TT, no veículo da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-FO-.., deslocou-se novamente ao parque de estacionamento junto da casa do arguido AA tendo-lhe adquirido 2,5 gramas de haxixe pelo preço de € 20,00. 1.70 No dia 18 de Maio de 2022, pelas 12h10, EEE, na viatura da marca Honda, modelo Civic, matrícula ..-..-XL, deslocou-se novamente ao parque de estacionamento junto da casa do arguido AA, o qual saiu de casa, dirigiu-se à viatura daquele e lhe entregou 10,104 gramas de canábis resina, com um grau de pureza de THC de 30,8%, suficiente para 62 doses diárias individuais, pelo qual pagou € 60,00. 1.71 No entanto, na Rua ..., EEE foi fiscalizado pelos Agentes da PSP QQ e MM vindo a ser encontrado no compartimento da consola central da viatura o haxixe referido. 1.72 FFF, consumidor diário de canábis resina conheceu o arguido AA como vendedor de estupefaciente por indicação de um amigo em data não apurada do Verão de 2020, dia em que lhe comprou, junto à Escola de ..., um pedaço de haxixe com peso não apurado pelo preço de € 10,00. 1.73 Desde essa data e até 14 de Dezembro de 2022, passou a comprar ao arguido AA, pelo menos uma vez por mês, um pedaço de haxixe pelo valor de € 25,00, contactando-o para o número .......55 fazendo depois a transação junto do A..., da residência daquele, no terreno na ... e no posto de combustível da BP em .... 1.74 Assim, no dia 25 de Maio de 2022, pelas 17h40, o arguido AA na viatura da marca VW, matrícula ..-IS-.., deslocou-se ao posto de combustível da BP, sito na Estrada ..., onde parou atrás da viatura com a matrícula ..-XV-.. onde se encontrava FFF. 1.75 De imediato este dirigiu-se à viatura do arguido e lhe comprou 9,433 gramas de canábis resina, com um grau de pureza de THC de 27,7% suficiente para 52 doses diárias individuais, pelo preço de € 75,00 que ocultou debaixo do tapete da mala junto à roda suplente. 1.76 No dia 4 de Julho de 2022, pelas 16h35, TT, na viatura da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-FO-.., deslocou-se à casa do arguido AA, onde entrou por breves minutos e lhe comprou 1,540 gramas canábis resina, com um grau de pureza de THC de 2,5% e 0,474 gramas de cocaína com um grau de pureza de 44,7%, suficiente para um dose diária individual, tendo pago € 10,00 e € 50,00 respectivamente. 1.77 No entanto, na Rua ..., TT foi fiscalizado pelos Agentes da PSP QQ e MM vindo a ser encontrado numa bolsa o haxixe e na zona dos pés atrás do banco do pendura a cocaína. 1.78 GGG, consumidor de cocaína desde os seus 42 anos de idade, soube que o arguido AA, a quem tratava por “DD”, vendia estupefaciente através de um seu conhecido que lhe forneceu os números daquele. 1.79 Por sua vez, no dia 12 de Agosto de 2022, cerca das 21h45, TT, na viatura supra mencionada, deslocou-se à casa do arguido AA, onde estrou e lhe comprou 2,5 gramas de haxixe pelo valor de € 20,00. 1.80 HHH, consumidor de canábis resina e folhas, veio a tomar conhecimento de que o arguido AA vendia estupefaciente através de um seu amigo e passou a adquirir-lhe produto estupefaciente. 1.81 Assim, no Verão de 2022 comprou pela primeira vez ao arguido AA 2 gramas de haxixe pelo preço de € 10,00, passando desde aí a comprar-lhe através dos amigos, pelo menos uma vez por semana, € 10,00 de haxixe. 1.83 No dia 16 de Agosto de 2022, pelas 19h15, o arguido AA na viatura da marca VW, matrícula ..-IS-.., deslocou-se novamente ao posto de combustível da BP de ..., parando no parque de clientes, após o que foi abordado por HHH, passageiro da viatura da marca Opel, modelo Corsa, matrícula ..-HN-.. conduzida por III, tendo entregue ao arguido AA € 100,00 para pagamento de estupefaciente a pedido deste. 1.84 No dia 24 de Agosto de 2022, pelas 15h45, TT, no veículo da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-FO-.., deslocou-se novamente ao parque de estacionamento junto da casa do arguido AA tendo-lhe adquirido 2,5 gramas de haxixe pelo preço de € 20,00. 1.85 No dia 14 de Outubro de 2022, pelas 22h00, o arguido AA na viatura da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-IS-.., deslocou-se novamente ao posto de combustível da BP de ..., parando no parque de clientes, após o que foi abordado por JJJ, passageiro na viatura da marca Seat, modelo Ibiza, matrícula ..-..-VM, utilizada por KKK, a quem havia pedido para ali o levar, que lhe comprou um grama de cocaína pelo preço de € 50,00. 1.86 No dia 14 de Dezembro de 2022, pelas 9h30, o arguido detinha na sua habitação, sita na Rua ... o seguinte: 1.86.1 €10.995,00 (dez mil, novecentos e noventa e cinco euros); 1.86.2 Trezentos e quarenta dirahms; 1.86.3 88,283 gramas de canábis resina com um grau de pureza de THC de 28,2%, suficiente para 497 doses diárias individuais; 1.86.4 40,161 gramas de canábis resina com um grau de pureza de THC de 27,7%, suficiente para 222 doses diárias individuais; 1.86.5 8,930 gramas de canábis resina (bolotas) com um grau de pureza de THC de 32,7%, suficiente para 58 doses diárias individuais; 1.86.6 47,365 gramas de canábis resina (bolotas) com um grau de pureza de THC de 34,0%, suficiente para 322 doses diárias individuais; 1.86.7 9,007 gramas de canábis resina (bolotas) com um grau de pureza de THC de 29,1%, suficiente para 52 doses diárias individuais; 1.86.8 70,762 gramas de canábis resina com um grau de pureza de THC de 31,7%, suficiente para 448 doses diárias individuais; 1.86.9 49,337 gramas de cocaína com um grau de pureza de 49,9%, suficiente para 123 doses diárias individuais; 1.86.10 17,308 gramas de cocaína com um grau de pureza de 77,2%, suficiente para 66 doses diárias individuais; 1.86.11 27,241 gramas de cocaína com um grau de pureza de 62,4%, suficiente para 84 doses diárias individuais; 1.86.12 4,785 gramas de MDMA com um grau de pureza de 79,2%, suficiente para 37 doses diárias individuais; 1.86.13 0,485 gramas de MDMA com um grau de pureza de 76,1%, suficiente para 3 doses diárias individuais (perícia de fls. 1287); 1.86.14 1 telemóvel da marca Redmi; 1.86.15 1 telemóvel da marca Samsung; 1.86.16 2 telemóveis da marca Alcatel; 1.86.18 4 canivetes; 1.86.19 2 passaportes n.º J710071 e CC635579; 1.86.20 Uma balança de precisão da marca Tanita; 1.86.21 26 bolsas herméticas; 1.86.22 Um computador HP e um Acer; 1.86.23 Uma PEN Sacandisk. 1.87 Por sua vez, num anexo a um terreno por si cultivado, sito na Rua da ... detinha: 1.87.1 760,000 gramas de canábis resina com um grau de pureza de THC de 29,9%, suficiente para 4544 doses diárias individuais; 1.87.2 243,443 gramas de canábis resina (bolotas) com um grau de pureza de THC de 29,8% suficiente para 1450 doses diárias individuais; 1.87.3 94,332 gramas de canábis resina com um grau de pureza de THC de 27,3%, suficiente para 515 doses diárias individuais; 1.87.4 27,394 gramas de canábis resina (bolotas) com um grau de pureza de THC de 28,1%, suficiente para 153 doses diárias individuais (perícia de fls. 1287). 1.88 O arguido AA desde de Fevereiro de 2019 até ser detido comprou ao individuo referido no art.º 5º, de três em três semanas, 50 gramas de cocaína pelo valor de € 2.000,00, que “cortava” em 25% vendendo o grama a € 50,00. 1.89 O arguido AA comprou ao dito indivíduo, de dois em dois meses, um quilo de canábis resina por € 2.500,00 e 500 gramas de “bolotas” pelo valor de € 1.250,00 vendendo o grama a pelo menos € 4,00. 1.90 Em todas as ocasiões supracitadas o arguido entregou o produto estupefaciente aos vários consumidores que o contactaram e recebeu o respectivo preço em numerário. 1.91 O arguido agiu com o propósito conseguido, de comprar, ceder, transportar, deter e vender estupefaciente para com isso obter uma compensação pecuniária, tendo perfeito conhecimento da natureza e características do produto que detinha, bem sabendo que não estava autorizado para o efeito e que dadas as suas características o não podia comprar, transportar, deter, ceder e vender. 1.92 O arguido agiu com o propósito de obter uma elevada compensação monetária o que conseguiu. 1.93 O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta é proibida e punida por lei. [Mais se provou que:] 1.94 O arguido confessou grande parte dos factos, mormente no que se refere aos compradores de cujo nome se recordava. 1.95 Verbalizou arrependimento. 1.96 Utilizou igualmente para o exercício da sua actividade de tráfico de estupefacientes os telefones, canivetes, balança de precisão e bolsas herméticas apreendidos. 1.97 A viatura da marca Citroen, modelo Xsara azul, matrícula ..-..-NZ, pese embora registada no nome do arguido, é pertença da sua mulher FF. [Da contestação do arguido provou-se que:] 1.98 O arguido era, à data dos factos, consumidor haxixe, desde os seus 26 anos. 1.99 Iniciou o consumo de cocaína em 2020, na altura da Pandemia. 2. Do relatório social do arguido AA, além do mais, consta que: “À data dos factos, tal como na atualidade, AA, 61 anos, integrava o seu agregado familiar constituído apenas pelo cônjuge, FF, com quem está casado há 22 anos. Do matrimónio não existe descendência. Ainda que a constância do matrimonio fosse caracterizada de forma positiva e cooperante, no presente FF verbaliza descontentamento com o envolvimento do cônjuge nos factos, com custos na relação conjugal. A família reside há 10 anos, num apartamento arrendado de Tipologia 2, com boas condições de habitabilidade e conforto, em zona suburbana, num bairro com baixa densidade populacional e sem problemáticas sociais de relevo. Trabalhador por conta própria, AA encontrava-se à data dos factos, a desenvolver a sua actividade profissional, no âmbito da empresa criada por si e pelo cônjuge, a T..........., dedicada à comercialização de taças e trofeus. Atualmente, mantém atividade, mas segundo disse, com um reduzido número de vendas, porquanto se trata de uma atividade muito dependente do contacto direto com os clientes. A sustentabilidade do agregado é assegurada essencialmente pela remuneração de FF na ordem dos € 490 como funcionária de limpeza a tempo parcial no M.... ......... .. ...... ......, que complementa com outros trabalhos de limpeza cujo rendimento não quantificou. Apresentam como principal despesa a quantia de € 300 referente ao pagamento da renda da casa, pelo que, o orçamento disponível obriga a uma gestão criteriosa do mesmo. O processo de socialização de AA decorreu no seio do agregado familiar de origem, composto pelos progenitores e os 3 filhos do casal, numa dinâmica relacional isenta de conflitos. Contudo, o arguido e o irmão mais velho, desde cedo, se iniciaram no consumo de substâncias estupefacientes, sem que os progenitores se apercebem-se desta problemática que se veio a refletir no negócio de família. Comerciantes no ramo da ourivesaria e com uma pequena fábrica de troféus e taças, vivenciaram do ponto de vista económico uma vida estável, no entanto, os furtos de ouro perpetrados pelo irmão e pelo arguido levaram ao encerramento da ourivesaria da família. Iniciou o percurso escolar em idade normal, registando duas retenções que motivaram o seu encaminhamento para um externato de ...”, para colmatar o atraso verificado. Está habilitado com o 11º ano de escolaridade, tendo abandonado a escolaridade durante a frequência do 12º ano por desmotivação, optando por se iniciar laboralmente. Em termos laborais, referiu experiências em diversas áreas em atividades sazonais até que se iniciou no negócio da família nomeadamente, na gestão da empresa de fabricação e comercialização de taças e trofeus, atividade a que deu continuidade em sociedade com o cônjuge. Experienciou, ainda, um período de 3 anos de trabalho na ..., onde desenvolveu diversas atividades. AA apresenta vários problemas de saúde que o obrigam a acompanhamento em diversas unidades de saúde e em outras tantas especialidades médicas (diabetes, oftalmologia, urologia, nefrologia e cardiologia), com medicação regular. Apresenta também um percurso de toxicodependência iniciado há vários anos, quase exclusivamente com o consumo diário de canabinóides. No período de confinamento motivado pela pandemia da COVID19, iniciou o consumo diário de cocaína, facto com impacto negativa na sua situação económica. Nunca se submeteu a acompanhamento terapêutico no âmbito dos hábitos aditivos. Sem atividades de tempo livre estruturadas, AA referiu no passado ter praticado basquetebol como atleta federado e mais recentemente hidroginástica essencialmente para fins terapêuticos. Sem antecedentes criminais, na sequência da eclosão do presente processo, o arguido foi detido preventivamente em 15dez2022, medida de coação desgravada em 03jul2023 para obrigação de permanência na habitação fiscalizada por vigilância eletrónica, vindo, desde então, a manter um comportamento consentâneo com as normas a que está sujeito e de colaboração com estes serviços. Em abstrato e face à acusação proferida, o arguido reconhece a ilicitude e censurabilidade dos factos, conseguindo atribuir a existência de vítima e danos, contudo, tende a legitimar a sua conduta com as dificuldades económicas que vivenciava fruto da espiral de consumos.” 3. Dos antecedentes criminais do arguido: Nada consta. (…)”. B) Factos não provados A matéria de facto não provada que provém da 1ª instância é a seguinte: “ (…). Com interesse para a decisão da causa, não se provou que: 4.1 Nos contactos telefónicos eram utilizadas expressões para significar a intenção de comprar estupefaciente, quantidades e tipo de produto tais como “vamos beber café”, “bebemos café na BP”, “é um saco de alfaces”, “caixa de 10” entre outras. 4.2 Em data não concretamente apurada de Setembro de 2021, o arguido AA propôs a ZZ que o mesmo efectuasse trabalhos para a sua empresa “T...........” a troco de estupefaciente, oferecendo-lhe duas gramas de canábis folha como forma de pagamento do serviço que tinha realizado, produto que aquele recusou por ter mau aspecto. 4.3 BBB, consumidor de canábis nos seus vários estados desde os 14 anos de idade duas a três vezes por semana, a partir do início de 2020 começou a comprar ao arguido AA, por intermédio do seu amigo de infância WW, dois gramas de haxixe pelo valor de € 10,00 pelo menos uma vez por semana chegando a levá-lo várias vezes ao parque de terra batida junto da casa do arguido AA para fazer a transacção. 4.4 GG, consumidor de canábis nos seus vários estados de apresentação desde há 10 anos, começou a comprar estupefaciente ao arguido AA a partir de Abril de 2021, o qual contactava através do número .......55, adquirindo-lhe normalmente € 25,00 de haxixe pelo menos uma vez de dez em dez dias. 4.5 JJJ, consumidor de estupefaciente desde 2019, adquiriu ao arguido AA, em datas não apuradas, pelo menos por duas vezes cerca de 5 gramas de haxixe pagando de cada uma das vezes entre € 25,00 a € 30,00. 4.6 Com a conduta ali descrita o arguido AA locupletou-se com o valor monetário de pelo menos € 82.000,00, produto da venda entre Fevereiro de 2019 e 14 de Dezembro de 2022 de cocaína ao preço de € 50,00 o grama (50gr.+25%=75gr.x75=3750-2000=1750x12x3,9). 4.7 O arguido AA locupletou-se ainda no período referido com o valor de € 280.000,00 produto da venda de canábis a pelo menos € 4,00 o grama (1500gr.x4x12x3,9). (…)”. C) Fundamentação da medida concreta da pena “(…). 2. Da determinação concreta da Medida da Pena: Demonstrado que está que o arguido AA cometeu, em autoria material, um crime de crime de tráfico de estupefacientes, acima escalpelizado, importa pois, neste momento graduar dentro da moldura abstracta da pena aplicável a medida das sanções a aplicar. Ao crime de tráfico de estupefacientes cabe apenas pena de prisão, cujos limites mínimo e máximo são, respectivamente, 4 (quatro) e 12 (doze) anos (cfr. art.º 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01. Para haver responsabilização jurídico-penal do arguido não basta a mera realização por este de um tipo-de-ilícito (facto humano anti-jurídico e correspondente ao tipo legal), torna-se necessário que aquela realização lhe possa ser censurada como culpa, o mesmo é dizer, que aquele comportamento preencha também um tipo-de-culpa (como se referem Leal-Henriques e Simas Santos, in Código Penal Anotado, vol. I, 2002, p. 205). Nos termos do disposto no art.º 40.º, do Código Penal, a aplicação de uma pena visa a protecção de bens jurídicos, entendida como tutela da crença e confiança da comunidade na sua ordem jurídico-penal e a reintegração social do agente, não podendo a pena ultrapassar a medida da culpa, a qual é, concomitantemente, limite e fundamento da pena. Na verdade, a determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, visando sempre evitar a prática pelo agente de futuros crimes e a sua ressocialização no tecido ético-jurídico no qual o arguido se insere. A determinação da medida concreta da pena será efectuada segundo os critérios consignados no art.º 71.º, do Código Penal, onde se explicita que a medida da pena se determina em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo-se, no caso concreto, a todas as circunstâncias, que não fazendo parte do tipo de crime, depuserem contra o agente e a favor dele. Há que considerar no caso concreto, relativamente ao arguido AA, quanto às primeiras: - o grau de ilicitude dos factos que se considera elevado, dadas as circunstâncias em que os mesmos ocorreram, aproveitando o período de Pandemia para fazer negócio, sem grande organização, mas alguma preparação, na medida em que se deslocava a ... para comprar o produto estupefaciente, de diferente natureza Haxixe (sabonete, placa, bolota) e cocaína, cortava-o com 25 % de outro produto para obter lucro com a posterior revenda aos consumidores, o que denota algum investimento e energia criminosa, sendo certo que, da prova produzida nos autos, os consumidores que procuraram o arguido não são os comuns e normais “drogados” que nada mais fazem na vida a não ser consumir, constatando-se que, na esmagadora maioria dos casos, são pessoas inseridas profissional, social e familiarmente que recorriam ao arguido, pelo “passa palavra” para se fornecerem em determinados momentos. A todos, o arguido vendia pequenas quantidades para os respectivos consumos, sem sofisticação e sempre com o mesmo modus operandi que consistia num telefonema a perguntar “onde estás?” e a resposta dada seria o local do encontro para a transacção. Não se apurou que proventos efectivos conseguia o arguido com esta actividade para além de se saber que, de facto, os conseguia, que até lhe permitiram fazer férias em ..., pelo menos uma vez, mas tais proveitos não lhe permitiam alcançar uma maior escala, à semelhança dos demais traficantes que operam nos mesmos moldes, atenta a utilização de algum do produto por banda do arguido o que, todavia, não permite considerá-lo como traficante-consumidor, uma vez que a finalidade exclusiva do arguido não era o uso pessoal, nem as quantidades que lhe foram apreendidas permitem concluir nesse sentido; - a intensidade do dolo que se revela elevada, uma vez que o arguido actuou sempre com dolo directo, juntando o útil ao agradável e aproveitando-se do conhecimento que tinha do mercado e das dificuldades, na altura da Pandemia. em conseguir produto estupefaciente, pensar fazer do tráfico um negócio, em todos os aspectos e sempre para benefício próprio; - a frequência, na actualidade, com que nos deparamos com a prática deste tipo de crimes, cada vez mais, sendo Portugal um país privilegiado, por força da sua localização geográfica, de acesso dos produtos estupefacientes, sobretudo cocaína, provenientes do continente sul-americano, ao mercado europeu, aliado à facilidade de entrada, dificuldade de controlo e a cada vez maior sofisticação dos meios utilizados (instrumentais e tecnológicos inclusive); - o potencial de disseminação e a facilidade com que o arguido vendia a quem quer que o interpelasse e lhe pagasse, sem se preocupar com as eventuais consequências dos seus actos, não se importando em transaccionar de noite ou de dia e em locais públicos, frequentados por pessoas de mais variadas faixas etárias e condições, como por exemplo as Bombas da BP; - as diferentes naturezas do produto estupefaciente traficadas pelo arguido (cocaína, MDMA e haxixe), demonstrando o intuito lucrativo, já que o arguido não consome MDMA, ganância e total desrespeito pela saúde e integridade das pessoas que consomem o produto estupefaciente, para já não se falar no flagelo que é a disseminação da droga pela população, gerando e fomentando o vício de substâncias ilegais, caras e que desgraçam os próprios consumidores e todos aqueles que lhes são próximos; - o recurso regular ao fornecedor de ... para adquirir o produto e a energia criminosa para o “cortar” com 25% de outro produto e assim ganhar mais dinheiro, servindo um grupo de clientes numeroso e de forma consistente; - Os razoáveis proventos que tal actividade trazia, na medida em que o arguido, não tinha trabalho fixo, nem lhe são conhecidos trabalhos ocasionais, mas tinha uma vida fácil e sem grandes preocupações, tinha assegurado o seu próprio vício e um negócio de tráfico lucrativo, motivo pelo qual não tinha justificação lícita para o montante de € 7.950,00, encontrados na gaveta do móvel aparador, sito no corredor da sua casa, bem como para a quantia de € 255,00 encontrados num bolsa como vário produto estupefaciente em cima do tampo de uma mesma de centro de sala e mais € 1.000,00, encontrado num compartimento oculto de uma mesma redonda da sala. Quanto às segundas: - o facto do arguido denotar estruturação e apoio familiar, integração social e a sua condição humilde; - o facto de nada constar do certificado de registo criminal do arguido AA (presentemente nada consta); - a colaboração do arguido para a descoberta da verdade com uma confissão parcial, mas sem reservas relativamente aos factos/consumidores de que se lembrava, a postura e verbalização de arrependimento, que denotam autocensura, juízo crítico e interiorização do desvalor da conduta, sem olvidar, no entanto que muito desta postura se deve ao contexto em que o arguido agora se encontra, em OPHVE e problemas de saúde; No que diz respeito às necessidades de prevenção geral, consideram-se as mesmas extremamente elevadas, atendendo à forte danosidade social que a violação dos bens jurídicos – saúde pública – protegidos por este tipo de crime acarreta, acrescidas perante este tipo de delitos e os seus efeitos “colaterais” (familiares, sociais e patrimoniais). Não sendo despicienda a motivação mercantilista subjacente à resolução criminosa do arguido AA, imbuída da perspectiva de obtenção de proventos rápidos e fáceis. No respeitante à culpa do arguido, deve atender-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, sob pena de haver uma dupla valoração da culpa, depuserem a favor ou contra o arguido, considerando, nomeadamente, o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste, a intensidade do dolo, os fins ou motivos que os determinaram e as suas condições pessoais. Têm de ser ponderadas, de forma equilibrada, todas as circunstâncias para a individualização da pena aplicada ao arguido. Assim, conclui-se serem, diminutas as necessidades de prevenção especial atento o seu débil estado de saúde. Em face das circunstâncias acima expostas, sopesando as circunstâncias acima elencadas que depõem a favor e contra o arguido, atendendo aos limites mínimos e máximo aplicáveis, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos, entende-se ser adequado, justo e consentâneo quer com as finalidades ínsitas à punição, quer com a medida da culpa e da consciência da ilicitude, aplicar: - ao arguido AA uma pena de 6 (seis) anos de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, em autoria material e na forma consumada. (…)”. D) Fundamentação quanto ao perdimento de quantias monetárias e veículos automóveis “(…). 6. Do pedido de declaração de perda das vantagens: A consagração da perda de instrumentos, produtos e vantagens do crime foi tendo associada finalidades diferentes, de retribuição e prevenção, quer geral, quer especial. Actualmente estão subjacentes razões de ordem exclusivamente preventiva, distinguindo-se dois regimes com base no perigo para a segurança das pessoas. Por um lado, há o regime da perda dos produtos e instrumentos do crime consagrados no art.º 109.º, do Código Penal, onde se verifica a tal perigosidade seja para a moral, ordem pública ou surgimento de novos crimes. Por outro, a perda das vantagens provenientes do crime, consagrada no art.º 110.º, do mesmo diploma legal, que está isenta de qualquer ideia de perigosidade, no sentido de que não atentam contra a moral ou ordem pública, sendo o único perigo aqui presente o risco das vantagens serem reinvestidas no cometimento de novos ilícitos criminais. Este mecanismo de perda de benefícios resultantes de um crime exige que se prove a efectiva ligação entre os benefícios obtidos e o crime. O que categoricamente se provou quanto às viaturas da marca Citroen, modelo Berlingo branca, matrícula ..-..-VD e da marca VW, modelo Polo azul, matrícula ..-IS-.. e quanto às quantias pecuniárias de € 255,00 (duzentos e cinquenta e cinco euros), € 1000,00 (mil euros) e € 7.950,00 (sete mil, novecentos e cinquenta euros). O mesmo já não sucede quanto às quantias pecuniárias de 1.790.0,00 (mil, setecentos e noventa euros), de € 340 (trezentos e quarenta euros) dirahms (moeda marroquina), um computador HP e um computador Acer e uma PEN Scandisk ou quanto à viatura da marca Citroen, modelo Xsara azul, matrícula ..-..-NZ apreendidas ao arguido AA (cfr. fls. 587), pois a verdade é que não se provou a sua proveniência ilícita, atendendo à actividade comercial desenvolvida pelo arguido AA. Em face dos factos provados, considera-se como vantagem ilícita proveniente da actividade criminosa, acima dada como provada, declarando-se perdidos a favor do Estado (cfr. art.º 110.º, do Código Penal), os veículos automóveis da marca Citroen, modelo Berlingo branca, matrícula ..-..-VD e da marca VW, modelo Polo azul, matrícula ..-IS-.. e as quantias de € 7.950,00 (sete mil, novecentos e cinquenta euros), € 255,00 (duzentos e cinquenta e cinco euros) e € 1000,00 (mil euros), devendo ser-lhe dado o legal destino, cfr. arts.º 35.º, 36.º, 39.º e 62.º, todos do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01 e julgando-se improcedente o demais requerido quanto às demais quantias, objectos e veículo, acima referidos, apreendidos ao arguido AA, determinando-se, após trânsito em julgado, o levantamento da apreensão e a sua restituição ao arguido. (…)”. * * * Âmbito do recurso Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem, pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso. Consistindo as conclusões num resumo do pedido, portanto, numa síntese dos fundamentos do recurso levados ao corpo da motivação, entre aquelas [conclusões] e estes [fundamentos] deve existir congruência. Deste modo, as questões que integram o corpo da motivação só podem ser conhecidas pelo tribunal ad quem se também se encontrarem sumariadas nas respectivas conclusões. Quando tal não acontece deve entender-se que o recorrente restringiu tacitamente o objecto do recurso. Por outro lado, também não deve ser conhecida questão referida nas conclusões, que não tenha sido tratada no corpo da motivação (Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, Vol. 3, 2020, Universidade Católica Editora, pág. 335 e seguintes). Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir no recurso, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, por ordem de precedência lógica, são: - A de saber se o acórdão enferma de nulidade por omissão de pronúncia; - A de saber se foi incorrectamente determinada a medida concreta da pena de prisão; - A de saber se deve ser substituída a pena de prisão; - A de saber se deve ou não haver lugar ao perdimento dos veículos automóveis. * * Da nulidade do acórdão por omissão de pronúncia 1. Alega o arguido – conclusão 12 – que o acórdão recorrido é nulo, nos termos do disposto na alínea c) do nº 1 do art. 379º do C. Processo Penal, por não ter referido nem ponderado sobre a aplicação da suspensão da execução da pena de prisão, face à confissão e ao disposto no art. 50º do C. Penal. No corpo da motivação o recorrente densificou a alegação, introduzindo como factores não ponderados, relevantes para a existência da nulidade, a sua idade e a sua grave situação clínica. Vejamos. Da sucinta argumentação do recorrente resulta a imputação ao acórdão recorrido da nulidade de omissão de pronúncia, prevista no art. 379º, nº 1, c) do C. Processo Penal. Nos termos do disposto na citada disposição legal, ocorre a nulidade em causa quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, nelas se integrando, quer as questões de conhecimento oficioso, quer as questões que foram submetidas à apreciação do tribunal pelos sujeitos processuais, desde que sobre elas não esteja legalmente impedido de se pronunciar. É entendimento pacífico que por questão se deve considerar o problema concreto, de facto ou de direito, a decidir, e não também, os motivos, os argumentos, as doutrinas e os pontos de vista invocados pelos sujeitos processuais, em abono das respectivas pretensões, o que vale dizer que, quanto a estes, não se coloca a possibilidade de o tribunal omitir pronúncia (Oliveira Mendes, Código de Processo Penal Comentado, obra colectiva, 2014, Almedina, pág. 1182, Mouraz Lopes, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, obra colectiva, Tomo IV, 2022, Almedina, pág. 801 e acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Setembro de 2023, processo nº 257/13.7TCLSB.L1.S1, de 17 de Maio de 2023, processo nº 140/06.2JFLSB.L1.S1 e de 24 de Outubro de 2012, processo nº 2965/06.0TBLLF.E1, todos in www.dgsi.pt). Dito isto. O arguido afirma a presença da nulidade no acórdão recorrido, conforme já dito, porque o tribunal a quo não ponderou a possibilidade de suspender a execução da pena de prisão, não obstante a sua idade, confissão e situação de saúde. Porque a aplicação da pena de substituição de suspensão da execução da pena de prisão depende, além do mais, de não ser aplicada pena de prisão em medida superior a cinco anos (art. 50º, nº 1 do C. Penal), uma vez que a 1ª instância decretou ao recorrente a pena de seis anos de prisão, é evidente que não poderia aplicar a referida pena de substituição, o que significa que, in casu, tal aplicação não era uma questão sobre a qual devesse o tribunal emitir pronúncia. Na verdade, o que o recorrente pretende, segundo cremos, ao invocar a confissão, a sua idade e o seu estado de saúde, é justificar uma outra valoração atenuativa destas circunstâncias, de modo a obter uma redução da pena de prisão aplicada, a um quantum compatível com a aplicação daquela pena de substituição. E tanto assim, que parte considerável das conclusões formuladas pelo recorrente se prende com a incorrecta, em seu entender, determinação da medida concreta da pena, peticionando, quanto a esta questão, a aplicação de uma pena de quatro anos [vd., conclusões 5, 7, 11 e 12], suspensa na respectiva execução. Em conclusão, e sem necessidade de maiores considerações, não enferma o acórdão recorrido da omissão de pronúncia que lhe assaca o arguido. * Da incorrecta determinação da medida concreta da pena de prisão 2. O recorrente não questiona a qualificação jurídica feita da sua apurada conduta, no acórdão recorrido, sendo certo que com ela havemos de concordar, uma vez que a mesma [conduta] preenche o tipo, objectivo e subjectivo, do crime de tráfico e outras actividades ilícitas, p. e p. pelo art. 21º, nº 1 do Dec. Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às Tabelas I-B e I-C anexas, crime a que corresponde a moldura penal de quatro a doze anos de prisão. Com efeito, restringiu o objecto do recurso, na parte em que agora releva, à medida concreta da pena, considerando excessiva a fixada no acórdão recorrido, e pugnando pelo seu sancionamento com a pena de quatro anos de prisão. Assim, alega o arguido – conclusões 1 a 5, 7, 11 e 12 – que nasceu a ... de ... de 1961, padece de cardiopatia isquémica, tendo dois stents e pacemaker, sofre de diabetes e tem apenas um rim, sendo seguido em vários estabelecimentos hospitalares da capital, que os Estabelecimento Prisional ... e o Hospital 5 não têm condições para assegurarem o seu tratamento, que confessou os factos e se mostrou arrependido, razões pelas quais, considerando a inversão da sua conduta, ocorrida entre a data da prática dos factos e o momento actual, que deve ser fortemente valorizada, a pena de quatro anos de prisão é adequada, proporcionada e justa, como decidiu o Tribunal da Relação de ... no processo nº 308/10.7... Vejamos. a. Estabelece o art. 40º, nº 1 do C. Penal que, a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, e dispondo o seu nº 2 que, em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa. Assim, prevenção – geral e especial – e culpa são os factores a relevar na determinação da medida concreta da pena. A prevenção reflecte a necessidade comunitária da punição do caso concreto, enquanto a culpa, dirigida ao agente do crime, constitui o limite inultrapassável da pena (Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas, Editorial Notícias, pág. 214 e ss.). O critério legal de determinação da medida da pena está previsto no art. 71º do C. Penal. Nos termos do disposto no seu nº 1, a determinação da medida da pena é feita, dentro da moldura penal abstracta aplicável, em função das exigências de prevenção e da culpa do agente, estabelecendo o seu nº 2, que, para tal efeito, devem ser atendidas todas as circunstâncias que, não sendo típicas, militem contra e a seu favor, designadamente, as enunciadas nas diversas alíneas deste mesmo número. Podemos, pois, dizer, com Figueiredo Dias, que toda a pena que responda adequadamente às exigências preventivas e não exceda a medida da culpa é uma pena justa (Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª Edição, 2ª Reimpressão, 2012, Coimbra Editora, pág. 84). b. Tendo presente que a pena tem por finalidade a protecção dos bens jurídicos e, na medida do possível, a ressocialização do agente, e que não pode, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa, a sua medida concreta resultará da medida da necessidade de tutela do bem jurídico (prevenção geral), sem ultrapassar a medida da culpa, intervindo a prevenção especial de socialização entre o ponto mais elevado da necessidade de tutela do bem e o ponto mais baixo, onde ainda é comunitariamente suportável essa tutela (Maria João Antunes, Consequências Jurídicas do Crime, 1ª Edição, 2013, Coimbra Editora, pág. 43 e seguintes) ou, como, de forma modelar, se escreveu no acórdão deste Supremo Tribunal de 3 de Julho de 2014, proferido no processo nº 1081/11.7PAMGR.C1.S1 (in www.dgsi.pt), a defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração), é a finalidade primeira, que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada, e o máximo, que a culpa do agente consente; entre estes limites, satisfazem-se quando possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização. Como se percebe, a determinação da medida da pena não resulta, pois, de um poder discricionário do juiz e da sua arte de julgar, mas da aplicação de um critério legal ao caso concreto, sendo, assim, o resultado de um procedimento juridicamente vinculado. Contudo, precisamente porque estamos perante a aplicação de um critério legal que comporta diversos parâmetros, o resultado final, o quantum da pena, não é alcançável com precisão matemática, razão pela qual, a intervenção do tribunal de recurso só deve tornar-se efectiva quando seja evidente a violação de tal critério – por falta de razoabilidade ou violação das regras da experiência comum – na configuração das operações necessárias à determinação da pena. 3. Retomando o caso concreto, verificamos que a 1ª instância, no acórdão recorrido, ponderou, como circunstâncias agravantes: - O elevado grau de ilicitude do facto, fundamentado na diversidade de estupefacientes traficados – haxixe, MDMA e cocaína – e o seu modo de execução, fundamentado no aproveitamento do período de pandemia, na organização sem sofisticação, no número e tipo de clientes – pessoas, em regra, inseridas em termos familiares, profissionais e sociais – e nos proventos obtidos, não quantificados, mas de alguma forma evidenciados pelas quantias apreendidas, totalizando mais de € 8000, e que que permitiram, uma vez, fazer férias em ...; - A elevada intensidade do dolo, pois que foi directo; E ponderou, como circunstâncias atenuantes: - A inserção social e familiar do arguido bem como a sua origem humilde; - A inexistência de antecedentes criminais; - A confissão parcial, com relevo para a descoberta da verdade e a verbalização de arrependimento, reveladoras de autocensura e interiorização do desvalor da conduta, mas às quais não é alheia o regime coactivo a que se encontra sujeito – obrigação de permanência na habitação – e o seu estado de saúde. Por fim, considerou ainda a 1ª instância, serem extremamente elevadas as exigências de prevenção geral, quer pela crescente frequência com que este crime vem sendo praticado, quer pela danosidade social que a sua prática acarreta, quer directamente, atentando contra o bem saúde pública, quer indirectamente, pelos seus efeitos colaterais, e serem diminutas as exigências de prevenção especial, face ao débil estado de saúde do arguido. Concordamos, na generalidade, com as considerações feitas pela 1ª instância, relativamente às circunstâncias ponderadas e às exigências de prevenção geral, sem prejuízo do que seguidamente diremos. É efectivamente elevado o grau de ilicitude do facto, quer pela diversidade dos estupefacientes traficados, entre eles se incluindo a cocaína, substância com poderoso efeito aditivo e graves consequências na saúde dos consumidores, por isso comummente qualificada como droga dura, quer pela duração da actividade criminosa, que perdurou por quase quatro anos, envolvendo um número significativo de transacções, estando identificados dezoito consumidores, quase todos eles com aquisições frequentes durante períodos variáveis, alguns de consideráveis extensão, não se percebendo, no entanto, a referência às respectivas condições familiares, profissionais e sociais, uma vez que nenhuma menção lhes é feita nos factos provados. Por outro lado, apesar de não quantificados, os rendimentos obtidos pelo arguido com a actividade de tráfico foram importantes, como resulta, quer dos já mencionados período de actividade e número de consumidores, quer dos montantes apreendidos com proveniência no tráfico, quer ainda, da frequência com que o arguido se abastecia de estupefacientes para vender [estabelecida no ponto 1.4 dos factos provados e que, por alto, nos conduz, em cerca de quatro anos, a perto de 2,3 kg de cocaína e perto de 59 kg de canábis de resina em sabonetes e bolotas], quer das quantidades de estupefaciente apreendidas, com destaque para os 1434 g de canábis e para os 49 g de cocaína. Já a referência a férias suportadas por rendimentos da actividade ilícita não tem suporte na factualidade provada. Finalmente, consideramos algo excessiva a consideração de serem diminutas as exigências de prevenção especial, fundada no, afirmado, débil estado de saúde do recorrente, quando este estado, pelas sua características, não pode ser recente e, naturalmente, não impediu a actividade que desenvolveu até Dezembro de 2022. Em sentido contrário, invoca o recorrente a sua idade, a sua difícil condição de saúde, a incapacidade de o sistema prisional o assistir na doença, se recluído, a confissão, o arrependimento e a inversão da sua conduta, desde a data da prática dos factos até hoje. Vejamos. A idade do recorrente, enquanto circunstância não ponderada ou insuficientemente ponderada pelo tribunal a quo, não consta dos factos provados do acórdão em crise pois que, numa opção que, com ressalva do respeito devido, consideramos tecnicamente incorrecta, o que foi considerado provado é que consta do relatório social do arguido ou seja, «À data dos factos, tal como na atualidade, AA, 61 anos, integrava (…)». Ainda que o recurso verse exclusivamente o reexame da matéria de direito (art. 432º, nº 1, c) do C. Processo Penal), e se tenha por definitivamente fixada a matéria de facto, nos exactos termos em que o foi pela 1ª instância, certo é que no Relatório do acórdão recorrido, na identificação do arguido, um dos elementos referidos é que o mesmo nasceu a ... de ... de 1961, tendo, portanto, 62 anos de idade. Em todo o caso, não só o recorrente não explica as razões pelas quais a sua idade tem aptidão para atenuar a sua responsabilidade penal, como também não as conseguimos lobrigar, sendo certo que ela, idade, não pode ser qualificada como provecta. Invoca o recorrente a sua situação clínica – diabetes, cardiopatia isquémica, tendo dois stents e pacemaker, e falta de um rim –, que o obriga a ser seguido em vários hospitais da zona de ..., e não permite o seu tratamento nos estabelecimentos prisionais, incluindo o Hospital 5. Também aqui se considerou provado o que consta do relatório social do arguido, isto é, que «(…) apresenta vários problemas de saúde que o obrigam a acompanhamento em diversas unidades de saúde e em outras tantas especialidades médicas (diabetes, oftalmologia, urologia, nefrologia e cardiologia), com medicação regular.». Não está, pois, provada, a incapacidade do sistema prisional em assegurar o seu tratamento em reclusão, o que, de todo o modo, seria questão a relevar em sede de modificação da execução da pena de prisão (arts. 118º e seguintes do C. da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade). De qualquer forma, a 1ª instância incluiu nas circunstâncias atenuantes o débil estado de saúde do arguido, o que significa que o ponderou. Invoca o recorrente a confissão e o arrependimento, demonstrativos da inversão da sua conduta, e por isso, merecedores de forte valorização atenuativa. A 1ª instância incluiu nas circunstâncias atenuantes, a confissão parcial (ponto 94 dos factos provados), tida por relevante para a descoberta da verdade, e a verbalização de arrependimento (ponto 95 dos factos provados), e considerou que ambas são reveladoras de interiorização do desvalor da conduta e autocensura, mas a elas, não serão alheios o regime coactivo e o estado de saúde. Sendo evidente que a 1ª instância valorou ambas as questionadas circunstâncias, a confissão parcial foi-o em mais elevado grau, precisamente porque foi relevante para a descoberta da verdade. O arrependimento, porque não passou da mera verbalização, acompanhou aquela no juízo feito quanto à interiorização da culpa, ainda assim, não deixou a 1ª instância de lhes colocar as limitações assinaladas, isto é, o regime coactivo e o estado de saúde. Ora, estas limitações, como nos parece claro, assinalam uma diminuição do seu valor atenuativo. Deste modo, sendo elevado o grau de ilicitude do facto praticado – considerando o tempo de duração da conduta, ao número de consumidores e de transacções envolvidos, as quantidades globais de estupefacientes traficados, a elevada qualidade aditiva da cocaína, não obstante a reduzida sofisticação de meios empregues – e sendo elevada a intensidade do dolo, reveladora de persistente energia criminosa, por um lado, tendo o arguido confessado parcialmente a prática dos factos, com relevo para a descoberta da verdade e verbalizado arrependimento – daqui resultando, com algumas reservas, a assunção da culpa –, estar social e familiarmente inserido, ser de humilde condição, não ter antecedentes criminais e, de algum modo, o seu estado de saúde, por outro lado, de tudo isto aqui resultando a sobreposição das circunstâncias agravantes às circunstâncias atenuantes, e sendo, por fim, muito elevadas as exigências de prevenção geral e pouco relevantes as de prevenção especial, não encontramos razões justificativas para efectuar um juízo de discordância quanto à pena fixada pela 1ª instância. Mostra-se, pois, com ressalva do respeito devido, carecida de fundamento, face ao critério legal de determinação da medida concreta da pena, a pretensão do recorrente em vir a ser sancionado com uma pena correspondente ao limite mínimo da moldura abstracta aplicável. Com efeito, a pena de seis anos de prisão – num arco punitivo que vai de quatro anos a doze anos de prisão – porque situada no primeiro quarto da moldura abstracta aplicável, é necessária, adequada, proporcional e mostra-se plenamente suportada pela culpa do arguido, estando, aliás, em linha com o referente deste Supremo Tribunal (acórdãos de 21 de Fevereiro de 2024, processo nº 211/18.2PALGS.E1.S1, de 15 de Fevereiro de 2024, processo nº 2020/22.5PAALM.S1 e de 24 de Setembro de 2020, processo nº 109/17.1GCMBR.S1, todos in www.dgsi.pt). Em suma, sendo necessária, adequada e proporcional, deve manter-se a pena de seis anos de prisão, fixada no acórdão recorrido. * Da substituição da pena de prisão 4. Pretende o recorrente, no pressuposto de que, pela via do presente recurso, a pena de 6 anos de prisão imposta pela 1ª instância seja reduzida para 4 anos de prisão, que esta seja suspensa na respectiva execução, por ser a decisão equitativa – conclusões 7 e 10 a 12 –, sem que no corpo da motivação tenha, quanto à pretendida pena de substituição, acrescentado maior argumentação. Vejamos, então. A pretensão do recorrente parte de um pressuposto não verificado, o que a torna inviável. Com efeito, a aplicação da pena de substituição de suspensão da execução da pena de prisão depende, desde logo, como seu pressuposto formal, que a pena de prisão aplicada e a substituir não seja superior a cinco anos de prisão (art. 50º, nº 1 do C. Penal. Assim, porque, no caso, não se verifica este pressuposto, não pode proceder a pretensão do recorrente de ver substituída a pena de prisão imposta. * Do perdimento dos veículos automóveis 5. Alega o recorrente – conclusões 13 a 17 – que os veículos automóveis declarados perdidos não o deveriam ter sido, quer porque o perdimento só é admissível quando exista uma relação de causalidade adequada entre a sua utilização e a prática do crime, de modo que, sem essa utilização, o crime não teria sido praticado ou dificilmente o teria sido na forma em que foi praticado, quer porque o perdimento automático de veículos foi já declarado inconstitucional. No corpo da motivação, o arguido densifica a argumentação, dizendo que os veículos em causa nunca transportaram estupefacientes, sendo apenas meios de locomoção por si usados, como o poderiam ter sido quaisquer outros. Vejamos. No despacho acusatório, no segmento intitulado Da Perda de Objectos, Direitos e Vantagens, o Ministério Público escreveu: “(…). 1º Dão-se por integralmente reproduzidos os factos descritos na acusação. (…). 6º Em todas as circunstâncias supra descritas o arguido AA utilizou as viaturas de sua propriedade da marca VW, modelo Polo, matrícula ..-IS-.. e da marca Citroen, modelo Xsara, matrícula ..-..-NZ para fazer entregas de estupefaciente aos seus clientes. 7º Sem as ditas viaturas, o arguido AA não teria meio de concretizar o ilícito sem chamar atenção para a sua actividade, qual estaria limitada ao parque junto da sua residência. (…). 12º A viatura com a matrícula ..-..-NZ foi adquirida pelo arguido a 15-12-2021, a com a matrícula ..-IS-.. a 25-01-2022 e a com a matrícula ..-..-TJ a 01-06-2021, sendo não só as duas primeiras utilizadas na venda de estupefaciente, como todas elas adquiridas no decurso do período em que o arguido se dedicou a esta actividade com produto desta. (…)”. E, invocando as disposições dos arts. 35º, nºs 1 e 2, 36º, nºs 2, 3 e 5 e 37º do Dec. Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, promoveu que, a final, fossem declaradas perdidas a favor do Estado as viaturas NZ, IS e TJ. O Dispositivo do acórdão recorrido tem, quanto ao perdimento de veículos, a seguinte redacção: “(…). 1.8 Considerar como vantagem ilícita proveniente da actividade criminosa, acima dada como provada e declarar perdidos a favor do Estado (cfr. art.º 110.º, do Código Penal), os veículos automóveis da marca Citroen, modelo Berlingo branca, matrícula ..-..-VD e da marca VW, modelo Polo azul, matrícula ..-IS-.., devendo ser-lhe dado o legal destino, cfr. arts.º 35.º, 36.º, 39.º e 62.º, todos do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01. (…). 2. Após trânsito: (…). 2.5 Dê-se o legal destino às quantias pecuniárias e aos dois veículos apreendidos nos autos e declarados perdidas a favor do Estado, nos termos do 39.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01 (cfr. fls. 587); 2.6 Notifique-se o arguido ou a pessoa a quem o mesmo indicar para proceder ao levantamento do veículo da marca Citroen, modelo Xsara azul, matrícula ..-..-NZ (…). (…)”. A fundamentação de direito determinante do perdimento dos veículos ..-..-VD e ..-IS-.. e da notificação do arguido para levantamento do veículo ..-..-NZ [supra, integralmente transcrita], assentou no seguinte argumentário, «Por um lado, há o regime da perda dos produtos e instrumentos do crime consagrados no art.º 109.º, do Código Penal, onde se verifica a tal perigosidade seja para a moral, ordem pública ou surgimento de novos crimes. Por outro, a perda das vantagens provenientes do crime, consagrada no art.º 110.º, do mesmo diploma legal, que está isenta de qualquer ideia de perigosidade, no sentido de que não atentam contra a moral ou ordem pública, sendo o único perigo aqui presente o risco das vantagens serem reinvestidas no cometimento de novos ilícitos criminais. Este mecanismo de perda de benefícios resultantes de um crime exige que se prove a efectiva ligação entre os benefícios obtidos e o crime. O que categoricamente se provou quanto às viaturas da marca Citroen, modelo Berlingo branca, matrícula ..-..-VD e da marca VW, modelo Polo azul, matrícula ..-IS-.. (…). O mesmo já não sucede (…) quanto à viatura da marca Citroen, modelo Xsara azul, matrícula ..-..-NZ (…), pois a verdade é que não se provou a sua proveniência ilícita, atendendo à actividade comercial desenvolvida pelo arguido AA.». Como se vê, em primeiro lugar, não é feita qualquer menção ao veículo ..-..-TJ, cujo perdimento havia sido promovido pelo Ministério Público. Depois, e em segundo lugar, como decorre da fundamentação apresentada, o perdimento dos veículos VD e IS teve por fundamento legal, não a sua consideração como instrumentos do crime, mas a sua qualificação como vantagens provenientes do crime, e consequente sujeição ao regime estabelecido no art. 110º do C. Penal. Da mesma forma que a determinação da entrega ao arguido do veículo NZ teve por fundamento a sua não proveniência ilícita e, portanto, a sua não consideração como vantagem proveniente do crime. Em todo o caso, ocorre que no Dispositivo do acórdão recorrido, no que ao perdimento de veículos respeita, foram convocadas, para além do art. 110º do C. Penal, as normas dos arts. 35º e 36º do Dec. Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro. No que à perda de vantagens respeita, existe um regime legal geral, previsto no C. Penal e um regime legal especial, previsto no Dec. Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, mas no que especificamente concerne à perda de vantagens, nada de muito relevante os distingue, como se constatará da leitura da alínea b) do nº 1 do art. 110º do referido código e do nº 2 do art. 36º do mencionado decreto-lei. Estando provado que o arguido é titular do direito de propriedade relativo aos veículos automóveis marca Citroen, modelo Berlingo, matrícula ..-..-VD, marca VW, modelo Polo, matrícula ..-IS-.., e marca Citroen, modelo Xsara, matrícula ..-..-NZ, que usou na venda de estupefacientes a consumidores [ponto 1.3 dos factos provados], não consta, nem dos factos provados, nem dos factos não provados, que tais veículos tenham entrado no seu património pela via da actividade de tráfico. Ocorre que o Ministério Público alegou no artigo 12º do segmento do despacho acusatório intitulado Da Perda de Objectos, Direitos e Vantagens, que os veículos ..-IS-.., ..-..-NZ e ..-..-TJ haviam sido adquiridas pelo arguido no período em que se dedicou à actividade de tráfico de estupefacientes, com o produto desta. Descartando a questão relativamente ao veículo ..-..-NZ, uma vez que foi ordenada a sua restituição, é evidente que o tribunal a quo não conheceu da questão de facto que foi submetida à sua apreciação relativamente aos demais veículos, na vertente de terem estes sido adquiridos com os proventos obtidos com a actividade de tráfico de estupefacientes, conforme narrado no mencionado artigo 12º. Deste modo, incorreu a 1ª instância em omissão de pronúncia. Em suma, pelas sobreditas razões, enferma o acórdão recorrido da nulidade prevista na alínea c) do nº 1 do art. 379º do C. Processo Penal. * * * * III. DECISÃO Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que constituem este coletivo da 5.ª Secção Criminal, se bem que por distintas razões, em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, decidem: A) Declarar a nulidade parcial do acórdão recorrido, por omissão de pronúncia, relativamente à questão da declaração de perdimento a favor do Estado dos veículos automóveis com as matrículas ..-..-VD e ..-IS-.., determinando a prolação de novo acórdão, pelo mesmo tribunal colectivo, nele devendo ser tomada posição quanto à identificada questão de facto omitida. B) Confirmar, quanto ao mais, o acórdão recorrido. * C) Recurso sem custas, atenta a parcial procedência (art. 513º, nº 1 do C. Processo Penal, a contrario). * * (O acórdão foi processado em computador pelo relator e integralmente revisto e assinado pelos signatários, nos termos do art. 94º, nº 2 do C. Processo Penal). * * Lisboa, de 23 de Maio de 2024 Vasques Osório (Relator) Leonor Furtado (1ª Adjunta) Albertina Pereira (2ª Adjunta) |