Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
687/20.8T8CTB.C1.S1
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: AMÉLIA ALVES RIBEIRO
Descritores: SEGURO DE INCÊNDIO
LIMITE DA RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA
INDEMNIZAÇÃO DE PERDAS E DANOS
OMISSÃO
DOLO
ÓNUS DA PROVA
RETIFICAÇÃO DE ACÓRDÃO
NULIDADE DA DECISÃO
EXCESSO DE PRONÚNCIA
OPOSIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO
MATÉRIA DE DIREITO
Data do Acordão: 10/01/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: REVISTA PROCEDENTE
Sumário :
I - Para determinação da responsabilidade da seguradora, a definição de incêndio como combustão acidental não pode deixar de ser articulada com as exclusões da garantia do seguro relativamente a atos ou omissões dolosas do tomador do seguro, do segurado ou de pessoas por quem estes sejam civilmente responsáveis, pressupondo a demonstração de um comportamento doloso para o afastamento da responsabilidade da seguradora.

II - Atendendo às regras de repartição do ónus da prova, cabe ao lesado alegar e provar a ocorrência do incêndio e os danos dele derivados, enquanto factos constitutivos do direito (art. 342.º, n.º 1, de CC) e sobre a seguradora recai a prova de que o incêndio não teria tido causa acidental, enquanto matéria impeditiva do direito (art. 342.º, n.º 2, do mesmo código).

III - Assim, não se apurando a causa de um incêndio, torna-se a seguradora responsável pelos danos verificados.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

Processo 687/20.8T8CTB.C1

6ª secção

A./apelante: AA

R./apelada: Crédito Agrícola Seguros – Companhia de Seguros de Ramos Reais, S.A.

I. relatório

Pedido: condenação da R. a: (i) pagar à A. a quantia de, pelo menos, € 200.000, o valor atual de mercado do imóvel de sua A., acrescida da quantia que se vier a apurar como sendo os danos patrimoniais por si sofridos em virtude do incêndio ocorrido no prédio segurado e a (ii) pagar-lhe a quantia de € 10.000,00, a título de danos não patrimoniais, e (iii) todos os valores acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal em vigor.

Alegou, em síntese, que é dona e legítima possuidora do prédio sito em Quinta de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial da ... sob o n.º ...09, melhor referido no artigo 1.º da petição inicial, que se encontra desocupado há mais de 10 anos, cujo valor estima ser de € 230.000,00. No dia 31-10-2017, pelas 22h50, deflagrou um incêndio no referido imóvel, que teve a sua origem de ignição por intervenção humana, consumindo por inteiro o prédio em causa, sem dele resultarem feridos, e provocando combustão dos materiais e objetos que se encontravam no interior do imóvel, que ficaram inutilizados, bem como a habitação, carecida de reconstrução; no dia 31.03.2011, celebrou, mediante escritura pública, um contrato de compra e venda, associando ao mesmo um contrato de mútuo com hipoteca e fiança (empréstimo bancário), tendo ela declarado obrigar-se a contratar e manter válido um contrato de Seguro Multirrisco, o qual inclua o risco de incêndio, estando o infortúnio dos autos assegurado pelo contrato de seguro multirriscos celebrado com a aqui R., para a qual havia transferido a responsabilidade civil emergente de danos sofridos na sua habitação, mediante a apólice de seguro, em vigor à data dos factos, com o número...03. Em consequência da recusa da R. em liquidar o valor devido pelo contrato de seguro, sente-se nervosa, ansiosa, angustiada, defraudada, abatida e entristecida.

A R. contestou, sustentando que até fevereiro de 2020, o local do risco foi a Rua ..., tendo a R. aceitado as condições particulares e gerais da apólice, não tendo alegado qualquer desconformidade entre o acordado e o conteúdo da apólice nos 30 dias após a data da entrega da apólice. Apenas em 2020 a R.(?) solicitou a alteração do local de risco para Quinta ..., e só a partir de 23.02.2020, a R. passou a assumir os riscos decorrentes dessa alteração. A apólice em apreço apenas cobre a combustão acidental. O incêndio em apreço apenas danificou o hall de entrada e as divisões adjacentes e parede exterior danificadas por ação do fumo proveniente do foco de incêndio. A apólice não contempla danos não patrimoniais.

Terminou, pugnando pela improcedência da ação.

Foi proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento.

A sentença decidiu:

1) julgar improcedente a presente acção e, em consequência, absolver a Ré CRÉDITO AGRÍCOLA SEGUROS – COMPANHIA DE SEGUROS DE RAMOS REAIS, S.A. dos pedidos formulados pela Autora AA;

2) Condenar a Autora AA nas custas do processo, sem prejuízo do apoio judiciário concedido (artigos 527.º, n.º 1 e 2, e 607.º, n.º 6, do Código de Processo Civil).»”.

A autora apelou e o Tribunal da Relação decidiu: “negar provimento ao recurso e, consequentemente, posto que com fundamentos parcialmente diversos, confirmar a sentença”, não tendo o acórdão em conferência trazido novidade.

É contra esta decisão que se insurge a recorrente, formulando, na revista, as seguintes conclusões:

I. Sem prejuízo do desenvolvimento constante das presentes alegações, o presente recurso de Revista vem interposto do douto Acórdão proferido nos autos à margem referenciados o qual, confirmou, ainda que por razões diversas a Sentença de 1.ª instância.

II. A decisão recorrida constitui um gravíssimo atropelo da Justiça e das regras processuais adjetivas e substantivas com a qual a Recorrente não se pode conformar, e não se conforma.

III. A questão central que leva à estupefação e ao inconformismo da Recorrida e que constitui objeto do presente recurso prende-se com o facto do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra sofrer de nulidade por excesso de pronúncia baseada no artigo 615.º n.º 1 d) do Código de Processo Civil, já que o mesmo pronuncia-se quanto a questões de que não podia tomar conhecimento.

IV. Tal nulidade, ocorre quando o Tribunal decide questões que não foram suscitadas pelas partes, nem são de conhecimento oficioso.

V. Essas ditas questões não se confundem com os argumentos trazidos à lide pelas partes, tratam-se, isso sim, de situações que integram matéria decisória.

A nulidade por excesso de pronúncia resulta da não observância dos princípios estabelecidos no Código de Processo Civil, que determinam que o Juiz só deve tratar das questões apresentadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou exigir o conhecimento de outras questões.

VII. Pelo que quando o Tribunal decide questões que não foram apresentadas pelas partes e que não são de conhecimento oficioso, incorre em nulidade por excesso de pronúncia.

VIII. Apesar de ser uma distinção complexa, é notório que o Tribunal da Relação de Coimbra, no seu Acórdão, pronuncia-se e decide, com base em questões não suscitadas pelas partes, designadamente a origem do incêndio para concluir que o risco contratado não cobriria tal sinistro.

IX. Isto é, o Tribunal de 2.ª instância, conhece e pronuncia-se quanto a questões contratuais que nunca foram abordadas nem contestadas pelas partes, acabando, com base nessas questões por improceder o Recurso apresentado pela Recorrente.

X. Além do mais, também não resulta dos autos nem da prova produzida qualquer tipo de indício relativamente à questão através da qual o Tribunal ad quem se pronunciou.

XI. O Tribunal da Relação de Coimbra, mediante o seu Acórdão decide referindo que existe uma desconformidade entre o risco segurado e o risco efetivamente provado,

XII. Porém, como já foi aqui afirmado, tal questão nunca foi suscitada pelas partes, estando por isso, vedado ao Tribunal ad quem pronunciar-se sobre a mesma.

XIII. Nem essa questão foi sequer enunciada pelo Tribunal de 1.ª instância, pois o que este Tribunal refere é que o Seguro celebrado entre as partes não cobre o sinistro em causa, uma vez que o local de risco era distinto do local do sinistro.

XIV. O Tribunal ad quem devia, tão só e apenas incidir sobre as questões submetidas em sede de recurso. Assim, ao conhecer de questões diversas nunca antes suscitadas, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, padece de nulidade – Excesso de Pronúncia – uma vez que não se limitou a decidir tendo por base meros raciocínios jurídicos.

XVI. Decidiu isso sim, sobre matéria relacionada com cláusulas contratuais que nunca foram colocadas em causa pelas partes, maxime pela Ré/Recorrida.

XVII. Pelo que, ao decidir como decidiu, a sentença recorrida afeta gravemente a posição da Recorrente,

XVIII. Estando, por isso, tal Acórdão ferido da nulidade, nomeadamente da prevista na segunda parte, da já referida alínea d) do nº 1 do art. 615º do CPC.

XIX. Devendo, nessa conformidade, Colendos Conselheiros dar-se sem efeito a decisão proferida sobre a matéria indevidamente apreciada.

XX. No entanto mais se diz,

XXI. Conforme supra se demonstrou, o Tribunal da Relação de Coimbra, atento o manifesto excesso de pronúncia, conclui que a responsabilidade da Ré/Recorrida deve ser afastada.

XXII. Colocando a Recorrente numa situação manifestamente prejudicial, olvidando a realização da Justiça no caso concreto.

XXIII. Ora, a Justiça no caso concreto aqui trazida à colação, prende-se com o facto de resultar de forma clara e evidente que toda a celebração do contrato de seguro multirriscos teve como base um erro no momento do preenchimento do contrato, um erro cometido pelos serviços da Ré/Recorrida.

XXIV. Erro esse que não pode ser aproveitado pela Ré/Recorrente para se eximir da sua responsabilidade enquanto seguradora em relação ao sinistro ocorrido.

XXV. Pois, uma vez demonstrada a existência de erro na celebração do contrato de seguro Multirriscos, nada garante que esse mesmo erro, não se estenda às demais ramificações do contrato.

XXVI. E isto porque, é notório que o conteúdo original do contrato de seguro nunca refletiu a vontade real das partes, principalmente da aqui Recorrente.

XXVII. Já que a Recorrente sempre pretendeu um contrato de seguro que abrangesse o imóvel sito na Quinta de ... e que garantisse o risco de incêndio independentemente da sua origem.

XXVIII. Nunca por nunca a Recorrente pretendeu um contrato de seguro limitador no que respeita à assunção do risco quanto a incêndios.

XXIX. Logo, como não fazia sentido o local do risco ser distinto do local onde se encontra o imóvel hipotecado, também não faria sentido celebrar um contrato de seguro que não garantisse na integralidade o risco de incêndio.

XXX. Não se trata assim de uma situação em que a segurada (Recorrente), não tinha conhecimento das cláusulas devido à falta de comunicação ou informação por parte da Ré/Recorrida, mas sim de um erro no preenchimento do contrato de seguro.

XXXI. E isto porque a Ré/Recorrida emitiu um contrato de seguro que não correspondia à real intenção da Recorrente.

XXXII. O que se traduz num erro evidente no preenchimento do contrato, que a Ré/Recorrida deve corrigir com base no artigo 249º do Código Civil.

XXXIII. Já que a Recorrente sempre pretendeu um contrato de seguro multirriscos que garantisse o risco de incêndio na sua globalidade, isto é, incêndios por combustão acidental, bem como, incêndios por combustão mediante intervenção humana.

XXXIV. Tudo isto a significar que a Ré/Recorrida emitiu uma declaração (contrato de seguro) com informações totalmente distintas das exigidas pela própria, nas quais a Recorrente não podia, como não pode ter qualquer interferência, muito menos culpa.

XXXV. Assim, cumpre retificar também aqui este manifesto erro de escrita com base no disposto no artigo 249º do Código Civil e deste modo, realizar a Justiça atento o Caso Concreto.

XXXVI. Sendo o Acórdão da Relação de Coimbra revogado por Acórdão a proferir pelo Supremo Tribunal de Justiça, e no qual se declare procedente o presente Recurso de Revista e assim, condenando-se a Ré/Recorrida, na assunção dos danos provocados pelo Incêndio ocorrido no prédio segurado, nomeadamente o prédio urbano sito na Quinta de ....

Termos em que, e nos demais de Direito que os Venerandos Juízes Conselheiros doutamente suprirão, se requer seja admitido o presente recurso e recebidas as respetivas alegações e, considerada a matéria constante das mesmas seja o presente Recurso de Revista julgado procedente por provado, revogando-se o Acórdão Recorrido proferido pelo Tribunal da Relação do Coimbra, nos termos peticionados.

Houve contra-alegações, tendo a R. pugnado pela improcedência do recurso.

I.2. Atendendo ao estabelecido nos artigos 635º nº4 e 639º do CPC e face ao anteriormente deliberado e ao posicionamento da A., a questão que cumpre resolver situa-se no contexto da invocada responsabilidade da R. e circunscreve-se aos danos patrimoniais, ficando, pois, excluídos os danos não patrimoniais inicialmente componentes da causa de pedir.

Neste âmbito e concretizando, a questão nuclear suscitada pela A. e claramente refletida no pedido de procedência da revista, centra-se em saber se o risco contratado cobria o incêndio a que os autos se referem, por forma, naturalmente a fundar o pedido de indemnização por danos patrimoniais, com os decorrentes efeitos, naturalmente, no caso de acolhimento da tese da A..

Neste âmbito, ao contradizer a orientação das instâncias, nas conclusões da revista, a A. suscita duas sub questões, a saber:

- foi cometida nulidade por excesso de pronúncia (artigo 615/1/d) CPC);

- se há erro imputável aos serviços da R., que deve ser retificado, porquanto, aquando da celebração, no contrato de seguro (por referência à interpretação da recorrida) não foi refletida a vontade real das partes: tendo a recorrente sempre pretendido um contrato de seguro que abrangesse o imóvel sito na Quinta de ... e que garantisse o risco de incêndio independentemente da sua origem.

II. Fundamentação

II.1. As instâncias consideraram provados os seguintes factos:

1) Por acordo escrito denominado «Título de Compra e Venda, Mútuo com Hipoteca e Fiança», outorgado em 31-03-2011, na Conservatória do Registo Predial do ..., perante a Conservadora Sr.ª Dr.ª BB, por I..., Lda., designada de primeira outorgante/parte vendedora, representada no acto por CC, a Autora AA, designada de segunda outorgante / parte compradora e mutuária, Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da Região do ... e ... CRL, designada como terceira outorgante e parte credora, e representada no acto por DD, e CC e mulher EE, designados como quartos outorgantes e parte fiadora, a primeira outorgante declarou vender à segunda, e a segunda outorgante declarou comprar à primeira, o prédio urbano composto por edifício de cave, rés-do-chão, primeiro andar, sótão e logradouro, sito em Quinta de ..., descrito sob o n.º 18 da freguesia de ..., na Conservatória do Registo Predial da ..., e inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o n.º ...44, pelo preço de € 140.000,00.

2) Ficou a constar do acordo descrito em 1) o seguinte: «F. MÚTUO COM HIPOTECA

F.1. A CAIXA AGRÍCOLA, representada da Terceira, concede à SEGUNDA, um empréstimo no montante de CENTO E QUARENTA MIL EUROS, de que esta se confessa devedora, destinado à aquisição da propriedade do imóvel acima identificado, pelo prazo de 30 anos, a contar da presente data, que a SEGUNDA OUTORGANTE declara ter recebido nesta data, e rege-se ainda pelas cláusulas e condições constantes do ANEXO I, que faz parte integrante do presente título, cujo conteúdo é do perfeito conhecimento das partes.

A MUTUÁRIA, constitui a favor da CAIXA AGRICOLA, hipoteca sobre o imóvel atrás identificado, para garantia do bom e integral pagamento de:

a) Capital mutuado no montante de 140.000,00 I

b) Respectivos juros remuneratórios à taxa contratada, que para efeitos de registo de hipoteca se fixa em oito virgula oito pontos percentuais, acrescida, em caso de mora, a esse título e de cláusula penal, da sobretaxa de quatro pontos percentuais, capitalizáveis,

c) Despesas que a CAIXA AGRICOLA faça, incluindo honorários de Advogados e outros mandatários, que para efeitos de registo se computam em 7000,00 sete mil euros), Montante máximo assegurado, 200.760,00 (duzentos mil setecentos e sessenta euros).

Que constitui a favor da CAIXA AGRÍCOLA, hipoteca, com a máxima amplitude legal, abrangendo beneficiações e as renovações, prorrogações de prazos e outras alterações do empréstimo, sobre o prédio atrás identificado, adquirido neste acto e a que atribuem o valor de cento e quarenta mil euros.

F.2. As partes declaram aceitar o negócio, nos termos exarados. G. FIANÇA.

G.1. Os QUARTOS declararam que prestam fiança a favor da CAIXA AGRÍCOLA, pelo que solidariamente assumem e garantem o bom e integral cumprimento de todas as obrigações da MUTUÁRIA, previstas ou decorrentes deste empréstimo e nas condições constantes do documento complementar anexo, de cujos termos têm cabal conhecimento, vinculando-se na qualidade de fiadores e principais pagadores, pelo respectivo pagamento, por qualquer prazo, prorrogação ou renovação, renunciando à excussão prévia e dando o seu acordo a quaisquer modificações das condições, incluindo da taxa de juro e de prazos, ou outras alterações, subsistindo a fiança até completa extinção das obrigações garantidas.

A TERCEIRA OUTORGANTE declarou ainda que para a sua representada CAIXA AGRÍCOLA aceita a confissão de dívida, a hipoteca e a fiança, nos termos exarados.

Que igualmente renúncia a hipoteca registada sob Ap.6 de 18/06/2001. POR TODOS OS OUTORGANTES FOI AINDA DITO:

Que o empréstimo e as garantias que asseguram o seu cumprimento se regem pelas cláusulas e condições constantes deste documento e do ANEXO I, que fica anexo e do qual os outorgantes declaram ter perfeito conhecimento, pelo que é dispensada a sua leitura.»

3) Consta do documento referido em 2) que o seu conteúdo foi explicado aos intervenientes, tendo sido assinado pelos outorgantes bem como pela Sr.ª Conservadora.

4) Do Anexo I a que se refere no facto 2), junto como documento n.º 4 com a petição inicial, consta o seguinte:

«Além das cláusulas constantes do titulo de que este documento é parte integrante, são também aplicáveis as seguintes cláusulas:

CLÁUSULA PRIMEIRA - Montante, finalidade e confissão de dívida

1. A CCAM REGIÃO DO ... E ... C.R.L. (doravante e abreviadamente designada por Caixa Agrícola) concede ao(à/s) MUTUÁRIO(A/S), AA, um empréstimo no montante de 140.000,00 (cento e quarenta mil euros), ao abrigo do Regime Geral do Crédito à Habitação, regulado pelo Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de Novembro (republicado pelo Decreto-Lei n.º 320/2000, de 15.12), suas alterações e demais disposições legais complementares aplicáveis a esse regime de crédito, o qual se destina a financiar a aquisição do imóvel identificado no título de que este instrumento é anexo, e que se destina a habitação própria permanente.

2. O prazo do empréstimo é de 360 (trezentos e sessenta) meses, a contar da presente data.

3. A quantia mutuada é nesta data entregue ao(à/s) MUTUÁRIO(A/S) e por este(a/s) recebida, por crédito na conta de depósito à ordem com o NIB ...32 (…), designada por Conta DO, titulada em nome dele(a/s), na Caixa Agrícola, em ... / CCAM REGIÃO DO ... E ... C.R.L.

4. O empréstimo é concedido pressupondo serem verdadeiras e correctas as informações e declarações do(a/s) MUTUÁRIO(A/S), inclusive dos elementos constantes da Proposta ...35/ 1 (…).

5. O (A/S) MUTUÁRIO(A/S) confessa(m)-se devedor(a/es/as) da quantia mutuada, que se obriga(m) a pagar à Caixa Agrícola com os respectivos juros, comissões e despesas, nos termos e condições constantes deste documento e do título de que é parte integrante.

CLÁUSULA SEGUNDA - Juros

1. O capital mutuado e em dívida vence juros postecipados, contados dia a dia e pagos em períodos mensais, a contar da presente data, com base na convenção 30/360, à taxa de juro anual nominal que resultar da média aritmética simples das cotações diárias da taxa EURIBOR a 6 (seis) mês(es), durante o mês de calendário anterior a cada período semestral de contagem e arredondada à milésima de ponto percentual, por excesso se a quarta casa decimal for igual ou superior a 5 (cinco), ou por defeito se for inferior, e depois acrescida do 'spread' de +3,000 (três vírgula zero) ponto(s) percentual(is), o que se traduz na taxa de juro nominal actual de 4,352% (quatro vírgula trezentos e cinquenta e dois por cento).

2. A taxa anual efectiva (TAE) do empréstimo, calculada nos termos do Decreto-Lei n.º 220/94, de 23.08, é de 5,015% (cinco vírgula zero quinze por cento).

3. A taxa de juro nominal e o 'spread' que a integra foram fixados tomando em consideração a relação do(a/s) MUTUÁRIO(A/S) com a Caixa Agrícola, sendo a taxa de juro nominal revista no início de cada período de contagem, em função das variações e da periodicidade do indexante EURIBOR, revisões essas que serão comunicadas ao(à/s) MUTUÁRIO(A/S), por escrito, nomeadamente através do extracto de conta DO, com uma antecedência mínima de 15 (quinze) dias relativamente à data de vencimento da prestação subsequente a essa alteração.-

4. Se o indexante EURIBOR for substituído ou deixar de ser usado, a Caixa Agrícola poderá aplicar outro, em consonância com as práticas do sector bancário, e após a sua comunicação ao(à/s) MUTUARIO(A/S), nos termos do número anterior.

5. A Caixa Agrícola pode capitalizar juros remuneratórios correspondentes a períodos não inferiores a 3 (três) meses e juros moratórios de período igual ou não inferior a 1 (um) ano, adicionando tais quantias de juros ao capital em divida, para seguirem o regime deste.

6. Em caso de mora no pagamento de qualquer prestação ou obrigação e enquanto ela durar serão devidos juros moratórios, à taxa nominal aplicável acrescida de 4 (quatro) pontos percentuais, a título de cláusula penal, que se vencem e são exigíveis diariamente e sem dependência de Interpelação.

CLÁUSULA TERCEIRA - Processamento-

1. O empréstimo é processado numa conta interna constituída para o efeito, pela Caixa Agrícola, com a numeração que o seu sistema automático the atribuir e que poderá ser alterada, que funcionará por contrapartida da Conta DO acima mencionada, na qual serão feitos os débitos e pagamentos das quantias devidas pelo(a/s) MUTUÁRIO(A/S), quer das prestações, incluindo juros, quer das comissões, despesas e impostos, e que para o efeito se obriga(m) a ter suficientemente provisionada, nas datas de vencimento das obrigações, ficando a Caixa Agrícola autorizada(s) a movimentá-la, a crédito e a débito, para efectivar esses pagamentos.

2. O(A/S) MUTUÁRIO(A/S) pode(m) indicar outra conta de depósitos à ordem que esteja na sua titularidade e domiciliada na Caixa Agrícola para, através dela, serem feitos os débitos de todas as prestações de natureza pecuniária decorrentes do presente contrato, substituindo a conta DO anteriormente indicada e aplicando-se-lhe, para tanto, o disposto no número anterior.

3. Os extractos das referidas contas processados pela Caixa Agrícola, constituem documentos bastantes para prova da sua movimentação e da dívida.

CLÁUSULA QUARTA - Pagamento do empréstimo: Prestações constantes -

1. O empréstimo será reembolsado em 360 (trezentos e sessenta) prestações mensais e sucessivas, constantes de capital e juros, vencendo-se a primeira no dia 30 de Abril de 2011 e as restantes no correspondente dia de cada mês subsequente.

2. Até ao momento da primeira revisão da taxa de juro o montante de cada prestação de capital e juros devida pelo(a/s) MUTUÁRIO(A/S) e a que se refere o número anterior será de 697,10 (seiscentos e noventa e sete euros e dez cêntimos).

CLÁUSULA QUINTA - Reembolsos antecipados-

1. O(A/S) MUTUÁRIO(A/S) poderá(ão) fazer reembolsos antecipados do empréstimo, parciais ou total, inclusive com vista à transferência do crédito para outra instituição, mediante pedido escrito entregue à Caixa Agrícola e nos termos a seguir previstos.

2. Os reembolsos podem ser feitos em qualquer momento e por qualquer montante, desde que observando o seguinte:

a) Os parciais em data coincidente com as dos vencimentos das prestações e com pré-aviso de 7 (sete) dias úteis;

b) O total, em qualquer momento mediante pré-aviso de 10 (dez) dias úteis.

3. No caso de reembolso antecipado será devida uma comissão até ao máximo de cinco décimas de ponto percentual sobre o capital reembolsado, salvo nos casos expressamente excepcionados por lei, que o(a/s) MUTUÁRIO(A/S) se obriga(m) a pagar à Caixa Agrícola impreterivelmente até à data do reembolso.

4. Optando o(a/s) MUTUÁRIO(A/S) pela antecipação do reembolso do empréstimo não haverá lugar a qualquer restituição de juros cobrados, e fica(m) obrigado(a/s) a pagar à Caixa Agrícola todas as quantias que estejam vencidas, além das comissões acima previstas, acrescidas do respectivo imposto de selo.

(…) (…)

CLÁUSULA OITAVA- Hipoteca

1. Para garantia do cumprimento das obrigações decorrentes do empréstimo, o(a/s) MUTUARIO(A/S) constitui(em) hipoteca sobre o(s) imóvel(els) identificado(s) no título de que este instrumento é anexo, nos termos nela e aqui previstos.

2. A hipoteca é constituída com a máxima amplitude legal, sobre o(s) aludido(s) imóvel(is) livre(s) de quaisquer outros ónus, encargos ou limitações, com todas as respectivas partes componentes, construções, beneficiações e acessões, presentes e futuras, bem como as Indemnizações devidas por sinistro, expropriação e quaisquer outras ou por qualquer razão, que a Caixa Agrícola poderá reclamar e receber como e de quem entender, e permanecerá até integral cumprimento ou extinção de todas e cada uma das obrigações ou responsabilidades do(a/s) MUTUÁRIO(A/S), abrangendo prorrogações de prazos, moratórias, renovações e reformulações do empréstimo, que forem ajustadas, sempre sem necessidade de qualquer outra formalidade para além do consentimento expresso da Cabra Agrícola.--

3. A Caixa Agrícola poderá inspeccionar e avaliar o(s) bem(ns) hipotecado(s), como e quando entender adequado, correndo os respectivos encargos por conta do(a/s) MUTUÁRIO(A/S); e se aquele(s) se tornar(em) insuficiente(s) para a segurança dos créditos, poderá exigir o reforço das garantias, nos termos e valor que indicar

4. A Caixa Agrícola fica autorizada a requerer qualquer inscrição, registo, alteração, rectificação, averbamento ou actualização relativa ao(s) imóvel(is), quer na matriz quer no registo predial, perante Conservatórias, Serviços de Finanças, Câmaras Municipais, ou outras entidades, bem como pode debitar os inerentes encargos ao(/s) MUTUARIO(A/S).

CLÁUSULA NONA - Seguros

1. O(A/S) MUTUÁRIO(A/S) obriga(m)-se a contratar e a manter apólice(s) de Seguro Multiriscos, incluindo o risco de incêndio, e de Seguro de Vida, eficazes e aprovadas pela Caixa Agrícola, incluindo cláusulas a indicar a Caixa Agrícola como única beneficiária, e como se indica nas alíneas seguintes:

a) Seguro Multiriscos, incluindo o risco de incêndio, que compreenda a cobertura do valor do(s) imóvel(is) hipotecado(s), por montantes a ele(s) adequados e actualizados, e de conter a menção da existência da hipoteca de que a Caixa Agrícola é beneficiária, com a expressa e irrevogável autorização para esta poder reclamar e receber quaisquer indemnizações e quantias, como entender e com preferência em relação a Terceiros, podendo substituir-se ao(s) seu(s) titular(es) no exercício de qualquer direito e acção.

b) Seguro de Vida, de que a Caixa Agrícola seja única beneficiária, para em caso de morte ou invalidez permanente lhe assegurar o pagamento de todas as quantias decorrentes do empréstimo que forem devidas na data do evento.

2. O(A/S) MUTUÁRIO(A/S) obriga(m)-se a pagar atempadamente os prémios de seguro; podendo a Caixa Agrícola alterar os seguros, pagar por conta dele(a/s) os respectivos encargos e fazer os inerentes débitos.

3. As apólices de seguro são entregues à Caixa Agrícola, endossadas a seu benefício, como credora hipotecária, assim como o serão as eventuais actas adicionais, sem o acordo escrito da qual e enquanto subsistir qualquer responsabilidade decorrente do empréstimo, não poderão ser canceladas nem alteradas.

(…)

CLÁUSULA DÉCIMA PRIMEIRA - Conexão de documentos -

Os documentos, sejam de que natureza forem, em que o(a/s) MUTUÁRIO(A/S) figure(m) como responsável(eis) ou que titulem qualquer obrigação dele(s) perante a Caixa Agrícola, designadamente: os relativos ao pagamento de prémios de seguros e de impostos, relacionados com o empréstimo ou com o imóvel hipotecado, e os extractos de conta e os documentos de débito emitidos pela Caixa Agrícola, consideram-se em conexão com este documento e com o título a que é anexo, de que farão parte integrante, para efeitos de execução, nos termos do artigo cinquenta do Código de Processo Civil.

CLÁUSULA DÉCIMA SEGUNDA Comunicações -

1. Sem prejuízo do que em contrário resulte deste contrato e/ou da lei, as comunicações escritas entre as partes deverão ser feitas por carta ou por telecópia, para os respectivos endereços, mencionados no título, que se consideram também como seus domicílios para efeitos de citação e notificação judicial, e cujas alterações o(a/s) MUTUÁRIO(A/S) se obriga(m) a comunicar nos trinta dias posteriores à sua ocorrência.

2. As comunicações expedidas pela Caixa Agrícola sob registo consideram-se devidamente feitas e recebidas no terceiro dia posterior ao do registo au no primeiro dia útil seguinte, se aquele o não for, salvo se a efectiva recepção não tiver ocorrido por facto a que o destinatário seja alheio.

CLÁUSULA DÉCIMA TERCEIRA - Tramitação de Dados -

1. Os dados pessoais constantes do presente contrato e os relacionados com o empréstimo serão processados informaticamente e destinam-se a ser usados pela Caixa Agrícola, nomeadamente, para administração, fiscalização e execução da operação de crédito, das garantias, dos seguros e dos produtos e serviços associados.

2. Os titulares dos dados autorizam a Caixa Agrícola a usá-los e processá-los, bem como a recolher informação adicional e a facultar esses elementos a outra entidade à qual seja cedido ou transferido o crédito, com salvaguarda da confidência legal.

3. Os interessados poderão aceder às informações pessoais que directamente lhes digam respeito e que constem da base de dados da Caixa Agrícola, bem como solicitar a sua correcção ou actualização (…)»

5) O prédio urbano situado em Quinta ..., composto de edifício de cave, rés-do-chão, primeiro andar e sótão, com a área total de 1170 m2, inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o n.º ...99, com o valor patrimonial de € 227.180,00, determinado no ano de 2015, e descrito actualmente na Conservatória do Registo Predial de ..., freguesia da ..., sob a descrição ...09, encontrando-se registado a favor da Autora pela AP. ...30 de 2011/03/31.

6) Em data não concretamente apurada, mas anterior a 23-02-2011, mediante contrato de seguro de habitação celebrado entre a Autora e a Ré, titulado pela apólice n.º ...03, a Ré, enquanto seguradora, e a Autora, enquanto tomadora, declararam acordar que a primeira assumiria o risco da ocorrência de danos sofridos (inclusive incêndio) no prédio urbano sito na quinta de ..., descrito sob o nº18 da Freguesia de..., na Conservatória do Registo Predial da ..., e inscrito na matriz Predial Urbana sob o artº ...44 (tendo, por lapso material, sido indicado o edifício sito na Rua ...) , com as coberturas e limites de capital constantes da Apólice de seguro n.º ...03 e dos documentos intitulados Condições Particulares e Especiais dessa Apólice e Condições Gerais e Especiais, com início em 23-02-2011 e duração de um ano, renovável por iguais períodos se não fosse denunciado com 30 dias de antecedência mínima em relação à data da prorrogação, ou se o tomador não procedesse ao pagamento do prémio, juntos aos autos como documentos n.ºs 3 e 4 da contestação, e que aqui se dão por transcritos, suportando os danos causados no edifício acima identificado1.

7) A referida apólice titula um contrato de seguro «Multirriscos» e tinha no dia 31-10-2017 como objecto seguro o edifício e os conteúdos do local de risco o referido no ponto anterior (tendo, por lapso material, sido indicado o sito na Rua ...)2.

8) A caracterização do risco, coberturas, capitais seguros e franquias encontram-se descritos nas condições particulares, inscritas no documento n.º 3 junto com a contestação, com o seguinte teor:

«CARACTERIZAÇÃO DO RISCO:

Prédio urbano sito na Quinta de ..., descrito sob o nº18 da Freguesia de ..., na Conservatória do Registo Predial da ..., e inscrito na matriz Predial Urbana sob o artº ...443.

COBERTURA E CAPITAIS SEGUROS CAPITAL SEGURO

EDIFÍCIO

MULTIRRISCOS – COBERTURA BASE 335 000.00 EUR

CONTEÚDOS

MULTIRRISCOS – COBERTURA BASE 15 000.00 EUR

CONDIÇÃO ESPECIAL

ASSISTÊNCIA AO LAR INCLUÍDA

PROTECÇÃO JURÍDICA INCLUÍDA

(…)

FRANQUIAS

CONFORME MENCIONADAS NAS CONDIÇÕES GERAIS E ESPECIAIS DA APÓLICE (...)

BENEFICIÁRIOS: HERDEIROS LEGAIS

ENTIDADE CREDORA – O EDIFÍCIO OU FRACÇÃO SEGURA POR ESTA APÓLICE ENCONTRA-SE EM REGIME DE GARANTIA REAL A FAVOR DA ENTIDADE MENCIONADA, NA QUALIDADE DE CREDORA PRIVILEGIADA, NÃO DEVENDO POR ISSO, PROCEDER-SE A QUALQUER ALTERAÇÃO OU À ANULAÇÃO DESTE CONTRATO, SEM O SEU PRÉVIO CONHECIMENTO, NEM PAGAR-SE NENHUMA INDEMNIZAÇÃO POR SINISTRO, SEM O SEU CONSENTIMENTO

ENTIDADE CREDORA

NOME: CCAM REGIÃO DO ... E ... MORADA: RUA ... LOCALIDADE: ... CÓD.POSTAL: ...».

9) Das condições gerais do contrato referido em 6) consta:

«CLÁUSULA 1.ª - DEFINIÇÕES

Para efeitos do presente contrato entende-se por: (…)

f) Incêndio, a combustão acidental, com desenvolvimento de chamas, estranha a uma fonte normal de fogo, ainda que nesta possa ter origem, e que se pode propagar pelos seus próprios meios;

(…)

i) Sinistro, a verificação, total ou parcial, do evento que desencadeia o accionamento da cobertura do risco prevista no contrato;

(…)

CLÁUSULA 2.ª - OBJECTO E GARANTIAS DO CONTRATO

1 - O presente contrato destina-se a cumprir a obrigação de segurar os edifícios constituídos em regime de propriedade horizontal, quer quanto às fracções autónomas, quer relativamente às partes comuns, que se encontrem identificados na Apólice, contra o risco de incêndio, ainda que tenha havido negligência do Segurado ou de pessoa por quem este seja responsável.

2 - Para além da cobertura dos danos previstos no número anterior, o presente contrato garante igualmente os danos causados no bem seguro em consequência dos meios empregados para combater o incêndio, assim como os danos derivados de calor, fumo, vapor ou explosão em consequência do incêndio e ainda remoções ou destruições executadas por ordem da autoridade competente ou praticadas com o fim de salvamento, se o forem em razão do incêndio ou de qualquer dos factos anteriormente previstos.

3 - Salvo convenção em contrário, o presente contrato garante ainda os danos causados por acção mecânica de queda de raio, explosão ou outro acidente semelhante, mesmo que não acompanhado de incêndio.

CLÁUSULA 3.ª - EXCLUSÕES DA GARANTIA OBRIGATÓRIA

Excluem-se da garantia obrigatória do seguro os danos que derivem, directa ou indirectamente, de:

a) Guerra, declarada ou não, invasão, acto de inimigo estrangeiro, hostilidades ou operações bélicas, guerra civil, insurreição, rebelião ou revolução;

b) Levantamento militar ou acto do poder militar legítimo ou usurpado;

c) Confiscação, requisição, destruição ou danos produzidos nos Bens Seguros, por ordem do governo, de direito ou de facto, ou de qualquer autoridade instituída, salvo no caso de remoções ou destruições previstas no n.º 2 da cláusula 2.ª;

d) Greves, tumultos e alterações da ordem pública, actos de terrorismo, vandalismo, maliciosos ou de sabotagem;

e) Explosão, libertação do calor e irradiações provenientes de cisão de átomos ou radioactivas e ainda os decorrentes de radiações provocadas pela aceleração artificial de partículas;

f) Incêndio decorrente de fenómenos sísmicos, tremores de terra, terramotos e erupções vulcânicas, maremotos ou fogo subterrâneo;

g) Efeitos directos de corrente eléctrica em aparelhos, instalações eléctricas e seus acessórios, nomeadamente sobretensão e sobreintensidade, incluindo os produzidos pela electricidade atmosférica, tal como a resultante de raio, e curto-circuito, ainda que nos mesmos se produza incêndio;

h) Actos ou omissões dolosas do Tomador do Seguro, do Segurado ou de pessoas por quem estes sejam civilmente responsáveis;

i) Lucros cessantes ou perda semelhante;

j) Extravio, furto ou roubo dos Bens Seguros, quando praticados durante ou na sequência de qualquer sinistro coberto.

(…)

CAPÍTULO III - PAGAMENTO E ALTERAÇÃO DOS PRÉMIOS CLÁUSULA 9.ª - VENCIMENTO DOS PRÉMIOS

1 - Salvo convenção em contrário, o prémio inicial, ou a primeira fracção deste, é devido na data da celebração do contrato.

2 - As fracções seguintes do prémio inicial, o prémio de anuidades subsequentes e as sucessivas fracções deste são devidos nas datas estabelecidas no contrato.

3 - A parte do prémio de montante variável relativa a acerto do valor e, quando seja o caso, a parte do prémio correspondente a

alterações ao contrato são devidas nas datas indicadas nos respectivos avisos. CLÁUSULA 10.ª - COBERTURA

A cobertura dos riscos depende do prévio pagamento do prémio. (…)

CAPÍTULO IV - INÍCIO DE EFEITOS, DURAÇÃO E VICISSITUDES DO CONTRATO

CLÁUSULA 14.ª - INÍCIO DA COBERTURA E DE EFEITOS

1 - O dia e hora do início da cobertura dos riscos são indicados no contrato, atendendo ao previsto na cláusula 10.ª.

2 - O fixado no número anterior é igualmente aplicável ao início de efeitos do contrato, caso distinto do início da cobertura dos riscos.

CLÁUSULA 15.ª - DURAÇÃO

1 - O contrato indica a sua duração, podendo ser por um período certo e determinado (seguro temporário) ou por um ano prorrogável por novos períodos de um ano.

2 - Os efeitos do contrato cessam às 24 horas do último dia do seu prazo.

3 - A prorrogação prevista no n.º 1 não se efectua se qualquer das partes denunciar o contrato com 30 dias de antecedência mínima em relação à data da prorrogação, ou se o Tomador do Seguro não proceder ao pagamento do prémio. (…)

CLÁUSULA 18.ª - CAPITAL SEGURO

1 - A determinação do capital seguro, no início e na vigência do contrato, é sempre da responsabilidade do Tomador do Seguro, devendo atender, na parte relativa ao Bem Seguro, ao disposto nos números seguintes.

2 - O valor do capital seguro para edifícios deve corresponder, ao custo de mercado da respectiva reconstrução, tendo em conta o tipo de construção ou outros factores que possam influenciar esse custo, ou ao valor matricial no caso de edifícios para expropriação ou demolição.

3 - À excepção do valor dos terrenos, todos os elementos constituintes ou incorporados pelo proprietário ou pelo titular do interesse seguro, incluindo o valor proporcional das partes comuns, devem ser tomados em consideração para a determinação do capital seguro referido no número anterior.

(…)

PARTE II - DO SEGURO FACULTATIVO CLÁUSULA 32.ª - DISPOSIÇÕES APLICÁVEIS

O Seguro Facultativo corresponde ao conjunto de outras garantias e / ou coberturas que o Tomador do Seguro pode contratar, regendo-se pelo disposto nas cláusulas seguintes e, em tudo o que aí não se encontre previsto, pelas disposições da Parte I das presentes Condições Gerais.

CAPÍTULO I - DEFINIÇÕES E OBJECTO CLÁUSULA 33.ª - DEFINIÇÕES

Para efeitos do Seguro Facultativo entende-se por: (…)

b) Edifício, o conjunto de todos os bens imóveis que integram o imóvel ou fracção seguros, incluindo as instalações gerais de água, electricidade, gás, comunicações, aquecimento e semelhantes, garagens, anexos, muros, portões, vedações, caminhos, benfeitorias incorporadas pelo proprietário do edifício com carácter permanente. Quando se trate de seguro de propriedade horizontal, as partes comuns do edifício onde se encontra a Habitação Segura;

c) Recheio, o conjunto de bens móveis existentes na habitação segura, pertença do Segurado, seu agregado familiar ou seus empregados domésticos, bem como as benfeitorias incorporadas na mesma, feitas a expensas do inquilino ou ocupante; (…)

CLÁUSULA 34.ª – OBJECTO

O Seguro Facultativo garante, nos termos estabelecidos nas respectivas coberturas contratadas, as indemnizações devidas por:

a) Danos directamente causados a edifício que não se encontre sujeito à obrigação de segurar prevista na cláusula 2.ª das presentes Condições Gerais, desde que devidamente identificado nas Condições Particulares;

b) Danos directamente causados aos Bens Seguros, identificados nas Condições Particulares, propriedade do Segurado e destinados exclusivamente à Habitação Segura;

c) Responsabilidade Civil Extracontratual do Segurado e pessoas do seu agregado familiar.

CAPÍTULO II - ÂMBITO DAS GARANTIAS

CLÁUSULA 35.ª - COBERTURA FACULTATIVA DE INCÊNDIO

Garante a cobertura de Incêndio, Acção Mecânica de Queda de Raio e Explosão, prevista para o Seguro Obrigatório constante da Parte I das presentes Condições Gerais, a edifícios ou fracções identificados nas Condições Particulares, que não estejam constituídos em propriedade horizontal.

CLÁUSULA 36.ª - COBERTURA BASE

1 - Designa-se por Cobertura Base do Seguro Facultativo a garantia do ressarcimento, nos termos previstos na Secção seguinte, dos prejuízos em consequência directa de:

a) Incêndio, Acção Mecânica de Queda de Raio e Explosão (Cl. 39.ª); b) Acção de Ventos (Cl. 40.ª);

c) Inundações (Cl. 41.ª);

d) Acidentes Geológicos (Cl. 42.ª);

e) Danos por Água (Cl. 43.ª);

f) Danos em Canalizações e Instalações Subterrâneas (Cl. 44.ª);

g) Furto ou Roubo (Cl. 45.ª);

h) Responsabilidade Civil Proprietário (Cl. 46.ª);

i) Responsabilidade Civil do Inquilino ou Ocupante (Cl. 47.ª);

j) Queda de Aeronaves (Cl. 48.ª);

k) Choque ou Impacto de Veículos Terrestres ou Animais (Cl. 49.ª);

l) Derrame Acidental de Óleo (Cl. 50.ª);

m) Demolição e Remoção de Escombros (Cl. 51.ª);

n) Quebra ou Queda de Antenas Exteriores (Cl. 52.ª);

o) Quebra ou Queda de Painéis Solares (Cl. 53.ª);

p) Quebra de Vidros, Espelhos, Mármores e Louças Sanitárias (Cl. 54.ª);

q) Queda Acidental de Móveis Fixos (CL. 55.ª);

r) Danos em Bens do Senhorio (Cl. 56.ª);

s) Mudança Temporária (Cl. 57.ª);

t) Privação Temporária do Uso da Habitação (Cl. 58.ª);

u) Perda de Rendas (Cl. 59.ª);

v) Despesas de Documentação (Cl. 60.ª);

w) Honorários Técnicos (Cl. 61.ª);

x) Danos Estéticos (Cl. 62.ª);

y) Deterioração de Bens Refrigerados (CL. 63.ª);

z) Reconstituição de Documentos (CL. 64.ª);

aa) Danos em Bens de Empregados (CL. 65.ª);

bb) Danos Eléctricos Cl. 66.ª);

cc) Acidentes Pessoais na Residência Segura (Cl. 67.ª);

dd) Roubo Praticado sobre a Pessoa (Cl. 68.ª);

ee) Danos por Fumo (Cl. 69.ª).

2 - À excepção das previstas nas alíneas cc) e dd), as coberturas acima indicadas, aplicar-se-ão a Edifícios e / ou a Conteúdos / Recheio, conforme o objecto das mesmas.

(…)

SECÇÃO ÚNICA - ÂMBITO DA COBERTURA BASE

CLÁUSULA 39.ª - INCÊNDIO, ACÇÃO MECÂNICA DE QUEDA DE RAIO E EXPLOSÃO Garante a cobertura de Incêndio, Acção Mecânica de Queda de Raio e Explosão, prevista para o Seguro Obrigatório constante da Parte I das presentes Condições Gerais, nos precisos e exactos termos aí previstos, aos Bens Seguros identificados nas Condições Particulares, aplicando-se o disposto na Parte I e, subsidiariamente, em tudo o que não o contrarie, o disposto nesta Parte II.

(…)

CLÁUSULA 46.ª - RESPONSABILIDADE CIVIL PROPRIETÁRIO

1 - Garante a satisfação das indemnizações legalmente exigíveis ao Segurado na sua qualidade de proprietário do Edifício ou Fracção Segura, com fundamento em Responsabilidade Civil Extracontratual, por danos patrimoniais e / ou não patrimoniais decorrentes de lesões corporais e / ou materiais causadas a Terceiros.

2 - Para além das exclusões mencionadas nas cláusulas 3.ª e 38.ª das presentes Condições Gerais ficam ainda excluídos desta cobertura:

(…)

c) A responsabilidade civil emergente da propriedade de imóveis ou outras instalações não seguras por esta Apólice;

(…)

CAPÍTULO III - OUTRAS DISPOSIÇÕES DO SEGURO FACULTATIVO CLÁUSULA 70.ª - CAPITAL SEGURO

1 - A determinação do capital seguro, no início e na vigência do contrato, é sempre da responsabilidade do Tomador do Seguro, devendo atender, na parte relativa ao Bem Seguro, ao seguinte:

a) Imóveis: O capital seguro para edifícios deve corresponder, ao custo de mercado da respectiva reconstrução, tendo em conta o tipo de construção ou outros factores que possam influenciar esse custo, ou ao valor matricial no caso de edifícios para expropriação ou demolição;

b) Mobiliário e Equipamentos - O capital seguro deverá corresponder ao custo de substituição dos bens, objecto do contrato, pelo seu valor em novo, com excepção

dos bens obsoletos ou fora de uso, cuja indemnização terá por base os respectivos valores venais;

c) Objectos de Arte, Antiguidades ou Objectos de Valor Histórico - O capital seguro deverá corresponder ao valor corrente no mercado da especialidade;

(…)

2 - À excepção do valor dos terrenos, todos os elementos constituintes ou incorporados pelo proprietário ou pelo titular do interesse seguro, incluindo o valor proporcional das partes comuns, devem ser tomados em consideração para a determinação do capital seguro referido na alínea a) do número anterior.

(…)

4 - Nos seguros de conteúdos em que o Segurado não tenha efectuado a discriminação e valorização dos Bens Seguros, considera-se que os Objectos Especiais ficam limitados, em caso de sinistro, a 30 % do valor seguro para o total dos conteúdos no seu conjunto e por objecto ou colecção, a 1.500 €.

(…)

5 - Para efeitos deste contrato, consideram-se objectos especiais os seguintes:

a) Aparelhos e respectivos acessórios de som e / ou imagem, fotografia e filmagem, bem como discos e cassetes;

b) Jóias, objectos de ouro, prata ou outros metais preciosos; c) Quadros e outros objectos de arte;

d) Antiguidades;

e) Colecções de qualquer espécie;

f) Objectos de valor histórico;

g) Peles; h) Armas;

i) Outros objectos análogos aos acima referidos.»

10)No dia 31 de Outubro de 2017, pelas 22h30, deflagrou um incêndio entre a sala e hall da entrada principal, no piso térreo, do prédio referido em 5), com origem de ignição mediante intervenção humana, com recurso a chama directa ou material incandescente.

11) O prédio referido em 5) encontra-se desocupado há mais de 10 anos e à data do incêndio referido em 10), estavam em curso obras de remodelação, e as janelas e porta principal encontravam-se sempre entreabertas.

12)Consta do Auto de Notícia de Crime – Relatório Inicial de Diligências, elaborado pela Polícia Judiciária na sequência do incêndio descrito em 10), o seguinte:

«Pelo circunstancialismo verificado e ora descrito (moradia abandonada, sem qualquer presença de elemento, tal como electricidade, que pudesse atuar como fonte de ignição junto do material combustível presente na habitação), salvo melhor opinião, a investigação concluiu que o foco de incêndio em apreço tenha tido origem humana, dolosa ou acidental».

13)Como consequência directa e necessária da intervenção humana referida em 10), e do incêndio deflagrado:

- Na sala com lareira, a porta da sala, as caixilharias de madeira das janelas, a lareira, o recobrimento das paredes ficaram destruídos e os tectos degradados;

- No hall de entrada, a porta principal, o gradeamento trabalhado em ferro, e recobrimentos do tecto e paredes ficaram chamuscados;

- o recobrimento da laje do tecto do corredor e acesso ao vão de escadas ficou chamuscado.

- os degraus de madeira da escadaria, assim como o corrimão em ferro e madeira, ficaram carbonizados;

- os vitrais da escadaria apresentam vidros partidos e a caixilharia ficou e o recobrimento de paredes e tecto ficaram chamuscados.

- as tubagens das redes técnicas de eletricidade, distribuição de águas e drenagem de águas residuais, alojadas nos roços abertos, no corredor, casa de banho e divisões diretamente localizados por cima da sala e hall de entrada, ficaram danificadas pelo calor.

- o corrimão do corredor em ferro e madeira ficou danificado pelo calor e fumo.

- Na divisão situada por cima do hall de entrada principal, as chamas passaram pelos buracos abertos para a instalação das redes de águas da de esgotos, afectando o reboco das paredes, tecto e caixilharia de madeira da janela.

14)Não se registaram vítimas nem feridos em consequência do incêndio. (artigo 18.º a petição aperfeiçoada)

15)No local estiveram presentes 16 elementos dos bombeiros voluntários de ..., apoiados por 04 viaturas de combate às chamas, três das quais pesadas e uma ligeira. (artigo 17.º do aperfeiçoamento)

16)No momento do incêndio encontravam-se no interior do prédio os seguintes bens pertencentes à Autora:

i. cinco serviços de mesa (louças e talheres);

ii. Três conjuntos de copos de cristal, compostos por 12 exemplares cada um dos conjuntos;

iii. Seis camas de casal desmontadas; iv. Quatro armários desmontados;

v. Três obras de arte (pinturas); vi. Sete enciclopédias;

vii. um número indeterminado de louças de WC;

viii. um número não concretamente apurado de recordações de índole pessoal, a saber, fotografias, molduras, cartas, roupas;

ix. Material de construção - Taco (parcelas de madeira);

17)À data da ocorrência do sinistro, o imóvel, decorrente das obras de reabilitação inacabadas que, em tempo estiveram em curso, tinha grande parte das paredes e pavimentos com roços abertos para a instalação de redes técnicas de eletricidade, abastecimento de águas e drenagem de águas residuais domésticas.

18)À data da ocorrência do sinistro, todos os revestimentos das lajes do piso térreo e piso 1 já tinham sido arrancados para a realização dos roços e instalações das infraestruturas técnicas e parte da instalação das canalizações para a instalação eléctrica, abastecimento de águas e águas residuais domésticas já estava instalada nos roços e buracos por fechar.

19)À data da ocorrência do sinistro, a pintura das paredes e tectos, além de marcações com spray, da abertura de buracos e roços para a instalação das tubagens de especialidades, evidenciava falta de manutenção e pintura degradada causada pelo normal desgasto e/ou envelhecimento e as janelas e portas exteriores em madeira também evidenciavam falta de manutenção, vidros partidos e a madeira com revestimento degradado.

20)O valor de reparação dos danos descritos em 13), provocados pelo sinistro, compreende-se entre os € 32.000,00 e os € 46.200,00, após desconto do valor que sempre teria a Autora de desembolsar para reparação e remodelação dos mesmos à data da ocorrência do sinistro.

21)No dia 30-11-2017, a Autora participou o sinistro referido em 10) à Ré. 22)Recepcionada a participação, a Ré comunicou à Autora que o local onde ocorreu o

sinistro não correspondia ao local de risco constante da apólice.

23)Após solicitação da Autora, na anuidade de 2020, procedeu-se à alteração do local de risco, relativamente ao contrato de seguro referido em 6), passando-se a fixar o local de risco na Quinta..., o que ficou a constar das condições particulares da Apólice de Seguro n.º 01074703, com efeitos a partir de 23-02-2020.

24)Após realização de diligências de inquérito no âmbito do Processo n.º 271/17.3..., que correu termos na Procuradoria do Juízo Local Criminal de ... – ....ª Secção Inquéritos, atinente ao incêndio ocorrido no dia ... de Outubro de 2017, na Rua ..., na ..., foi proferido a 08-06-2018 despacho de arquivamento pelo Ministério Público com o seguinte teor: «determino o arquivamento dos autos, nos termos do artigo 277º, n.º 2 do Código de Processo Penal, por desconhecimento de quem foi o agente do crime, sem prejuízo da sua reabertura, nos termos 279º, n.º 1 do referido Diploma Legal, caso surjam novos elementos de prova, ressalvado o prazo de prescrição criminal».

B) FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provaram quaisquer outros factos com interesse para a decisão da causa, designadamente não se provou que:

a) O incêndio consumiu por inteiro o prédio em causa (artigo 6.º da p.i.)

b) O incêndio provocou combustão de todos os materiais e objetos que se encontravam no interior do prédio referido em 5) (artigo 8.º da p.i.)

c) Todos os bens referidos em 16) foram adquiridos pela Autora. (artigo 10.º da petição inicial)

d) Não conseguindo a Autora voltar a utilizar ou reparar qualquer tipo de objeto que fora consumido pelas chamas, nem a própria habitação. (artigos 11.º e 12.º da petição inicial)

e) Os cinco serviços de mesa (louças e talheres) tinham o valor de € 1.000,00.

f) Os três conjuntos de copos de cristal, compostos por 12 exemplares cada um dos conjuntos, tinham o valor de € 600,00.

g) As seis camas de casal desmontadas tinham o valor de € 3.000,00. h) Os quatro armários desmontados tinham o valor de € 2.000,00.

i) As Três obras de arte (pinturas) tinham o valor de € 6.000,00. j) As sete enciclopédias tinham o valor de € 700,00.

k) As louças de WC tinham o valor de € 2.000,00.

l) O Taco (parcelas de madeira) tinha o valor de € 10.000,00.

m) A Autora sente-se enganada pela Ré, por falta de colaboração desta, sendo constante o seu mal-estar, sentindo-se nervosa, ansiosa, angustiada, defraudada, abatida e entristecida.

II. Apreciando

Relembra-se que a questão que cumpre resolver situa-se no contexto da invocada responsabilidade da R. e circunscreve-se aos danos patrimoniais, centrando-se em saber se o risco contratado cobria o incêndio a que os autos se referem. Ficam, pois, excluídos os danos não patrimoniais inicialmente componentes da causa de pedir.

Neste âmbito, importa dilucidar previamente se no acórdão recorrido foi cometida nulidade por excesso de pronúncia (artigo 615/1/d) CPC) e se estamos em presença de erro imputável aos serviços da R., que deve ser retificado, porquanto, aquando da celebração, no contrato de seguro (por referência à interpretação da recorrida) não foi refletida a vontade real das partes: tendo a recorrente sempre pretendido um contrato de seguro que abrangesse o imóvel sito na Quinta de ... e que garantisse o risco de incêndio independentemente da sua origem.

Vejamos então.

II.1. Quanto à nulidade por excesso de pronúncia (artigo 615/1/d) CPC).

A recorrente argumenta, em síntese, que “é notório que o Tribunal da Relação de Coimbra, no seu Acórdão, pronuncia-se e decide, com base em questões não suscitadas pelas partes, designadamente a origem do incêndio para concluir que o risco contratado não cobriria tal sinistro”. Daí retira que, em virtude de tal questão nunca ter sido suscitada pelas partes, vedado estava ao Tribunal ad quem pronunciar-se sobre ela.

Por seu turno, o Tribunal da Relação, desatendeu a invocada nulidade.

Como se sabe, a nulidade por excesso de pronúncia ocorre quando o tribunal se pronuncia sobre questões de que não podia tomar conhecimento, por não terem sido suscitadas pelas partes nem serem do conhecimento oficioso.

Acontece que na revista, como, aliás, sucedera no recurso de apelação - como bem notou a Relação - a A. focou uma única questão essencial e que consiste em saber se: “lhe assiste jus a ser indemnizada, no âmbito do contrato de seguro firmado (…), pelos danos provocados pelo incêndio”.

E foi, na realidade, sobre esta questão que o tribunal a quo se pronunciou, problematizando e desenvolvendo argumentos orientados à decisão da questão submetida a juízo, na P.I..

Pode, pois afirmar-se, sem margem para dúvida razoável, que o que vem referenciado como questão não suscitada, constitui matéria que cabe perfeitamente dentro da discussão jurídica da causa.

Aliás, é a própria A. que afirma na P.I. (artigo 5º) que o incêndio teve a sua origem de ignição mediante intervenção humana, dolosa ou acidental (convocando o auto de notícia da P.J).

Portanto, o que sobressai não é saber se a origem tem a ver com a intervenção humana ou não. A questão traduz-se em saber se a A. tem direito à indemnização peticionada, cumprindo determinar se o contrato de seguro cobre o incêndio em questão.

Assim, por estarmos perante matéria expressamente suscitada e que, aliás, se traduz no núcleo da divergência desta ação, não pode deixar de improceder a invocada nulidade.

II.2. Quanto ao alegado erro cuja retificação vem pedida

A A. afirma que “o conteúdo original do contrato de seguro nunca refletiu a vontade real das partes, principalmente da aqui Recorrente, já que a Recorrente sempre pretendeu um contrato de seguro que abrangesse o imóvel sito na Quinta de ... e que garantisse o risco de incêndio independentemente da sua origem”.

Salvo o devido respeito haverá aqui algum equívoco no raciocínio da A., porquanto a retificação que verdadeiramente justifica a alegação de erro foi atendida pela Relação ao corrigir a identificação do imóvel objeto do contrato de seguro (pontos 6 e 8 dos factos).

Porém, ainda assim, a Relação entendeu que o risco contratado não cobria o incêndio em causa. Mas essa constitui matéria interpretativa e está no cerne da controvérsia deste caso, como acima se referiu.

Ou seja, não foi o alegado erro que motivou a decisão da Relação, não havendo, pois, qualquer razão que motive a pretendida retificação, ao abrigo do artigo 249º CC.

O que motivou a decisão da Relação foi a diferente interpretação do clausulado pelas partes, o que nada tem a ver com o alegado erro.

Improcede, pois, esta pretensão da A.

II.3. Quanto à questão de saber se o risco contratado cobre o incêndio dos autos.

A primeira instância respondeu negativamente a esta questão, razão pela qual considerou a ação improcedente.

A Relação, muito embora tenha corrigido a matéria de facto subjacente, no sentido de que o prédio em que o incêndio deflagrou era efetivamente o visado pelo contrato de seguro dos autos, absolveu, ainda assim, a R. com fundamento essencialmente em que o referenciado incêndio derivou de “intervenção humana”, o que, do ponto de vista da Relação, afastaria o caráter acidental do sinistro, colocando-o, assim, fora da cobertura do risco contratado.

Sucede que a tese da R., na contestação – onde, como é sabido toda a defesa deve ser esgrimida - e nas contra-alegações da apelação, jamais assume a tese da Relação. Na verdade, limita-se afirmar essencialmente que o risco contratado não abrange o incêndio dos autos em virtude de o prédio objeto do contrato do contrato de seguro não se identificar com o indicado pela A..

Acresce que nas contra-alegações no âmbito da presente revista a R. limita-se a parafrasear o acórdão, mas sem qualquer leitura própria.

Portanto, em bom rigor a R. nunca chega a corroborar, de forma expressa, a tese da Relação que, na verdade, e salvo o devido respeito se nos afigura desconforme ao clausulado pelas partes.

Vejamos.

A questão que agora se evidencia como nuclear tem sido objeto de tratamento expresso pela Doutrina e pela Jurisprudência, sobressaindo neste domínio, o AUJ n.º 9/2022, de 19 de Outubro de 2022, no qual se firmou a seguinte jurisprudência obrigatória: "A cláusula contratual geral inserta em contrato de seguro, mesmo facultativo, em que se define o sinistro "Incêndio" como "combustão acidental", não cobre, no seu âmbito e alcance, o incêndio causado dolosamente por terceiro, ainda que não seja identificado o seu autor"4.

A este propósito, os factos mostram que:

“Em data não concretamente apurada, mas anterior a 23-02-2011, mediante contrato de seguro de habitação celebrado entre a Autora e a Ré, titulado pela apólice n.º 01074703, a Ré, enquanto seguradora, e a Autora, enquanto tomadora, declararam acordar que a primeira assumiria o risco da ocorrência de danos sofridos (inclusive incêndio) no prédio urbano sito na quinta de ..., descrito sob o nº18 da Freguesia de ..., na Conservatória do Registo Predial da ..., e inscrito na matriz Predial Urbana sob o artº ...44 (tendo, por lapso material, sido indicado o edifício sito na Rua ...) , com as coberturas e limites de capital constantes da Apólice de seguro n.º ...03 e dos documentos intitulados Condições Particulares e Especiais dessa Apólice e Condições Gerais e Especiais, com início em 23-02-2011 e duração de um ano, renovável por iguais períodos se não fosse denunciado com 30 dias de antecedência mínima em relação à data da prorrogação, ou se o tomador não procedesse ao pagamento do prémio, juntos aos autos como documentos n.ºs 3 e 4 da contestação, e que aqui se dão por transcritos, suportando os danos causados no edifício acima identificado5.

7) A referida apólice titula um contrato de seguro «Multirriscos» e tinha no dia 31-10-2017 como objecto seguro o edifício e os conteúdos do local de risco o referido no ponto anterior (tendo, por lapso material, sido indicado o sito na Rua ...).

8) A caracterização do risco, coberturas, capitais seguros e franquias encontram-se descritos nas condições particulares, inscritas no documento n.º 3 junto com a contestação, com o seguinte teor:

«CARACTERIZAÇÃO DO RISCO:

Prédio urbano sito na Quinta de ..., descrito sob o nº18 da Freguesia de ..., na Conservatória do Registo Predial da ..., e inscrito na matriz Predial Urbana sob o artº ...44.

COBERTURA E CAPITAIS SEGUROS CAPITAL SEGURO

EDIFÍCIO

MULTIRRISCOS – COBERTURA BASE 335 000.00 EUR

CONTEÚDOS

MULTIRRISCOS – COBERTURA BASE 15 000.00 EUR

CONDIÇÃO ESPECIAL

ASSISTÊNCIA AO LAR INCLUÍDA

PROTECÇÃO JURÍDICA INCLUÍDA

(…)

FRANQUIAS

CONFORME MENCIONADAS NAS CONDIÇÕES GERAIS E ESPECIAIS DA APÓLICE (...)

BENEFICIÁRIOS: HERDEIROS LEGAIS

ENTIDADE CREDORA – O EDIFÍCIO OU FRACÇÃO SEGURA POR ESTA APÓLICE ENCONTRA-SE EM REGIME DE GARANTIA REAL A FAVOR DA ENTIDADE MENCIONADA, NA QUALIDADE DE CREDORA PRIVILEGIADA, NÃO DEVENDO POR ISSO, PROCEDER-SE A QUALQUER ALTERAÇÃO OU À ANULAÇÃO DESTE CONTRATO, SEM O SEU PRÉVIO CONHECIMENTO, NEM PAGAR-SE NENHUMA INDEMNIZAÇÃO POR SINISTRO, SEM O SEU CONSENTIMENTO

ENTIDADE CREDORA

NOME: CCAM REGIÃO DO ... E ... MORADA: RUA ... LOCALIDADE: ... CÓD.POSTAL: ...».

9) Das condições gerais do contrato referido em 6) consta:

«CLÁUSULA 1.ª - DEFINIÇÕES

Para efeitos do presente contrato entende-se por: (…)

f) Incêndio, a combustão acidental, com desenvolvimento de chamas, estranha a uma fonte normal de fogo, ainda que nesta possa ter origem, e que se pode propagar pelos seus próprios meios;

(…)

i) Sinistro, a verificação, total ou parcial, do evento que desencadeia o accionamento da cobertura do risco prevista no contrato;

(…)

(…)

10)No dia 31 de Outubro de 2017, pelas 22h30, deflagrou um incêndio entre a sala e hall da entrada principal, no piso térreo, do prédio referido em 5), com origem de ignição mediante intervenção humana, com recurso a chama directa ou material incandescente.

11) O prédio referido em 5) encontra-se desocupado há mais de 10 anos e à data do incêndio referido em 10), estavam em curso obras de remodelação, e as janelas e porta principal encontravam-se sempre entreabertas.

12)Consta do Auto de Notícia de Crime – Relatório Inicial de Diligências, elaborado pela Polícia Judiciária na sequência do incêndio descrito em 10), o seguinte:

«Pelo circunstancialismo verificado e ora descrito (moradia abandonada, sem qualquer presença de elemento, tal como electricidade, que pudesse atuar como fonte de ignição junto do material combustível presente na habitação), salvo melhor opinião, a investigação concluiu que o foco de incêndio em apreço tenha tido origem humana, dolosa ou acidental».

Daqui decorre que é verdade que o incêndio teve de facto origem humana. Porém, o contrato dos autos não afasta a cobertura nestes casos, porque ainda assim, não está afastada a ocorrência acidental (não dolosa). Por outras palavras, os incêndios com origem humana só podem ser afastados da cobertura se procederem de ato doloso e no contexto das demais circunstâncias descritas contratualmente.

E este entendimento conforma-se patentemente com o AUJ acima citado que, aliás, admite que estão cobertos todos os incêndios devidos a caso fortuito, todos os incêndios causados negligentemente e, inclusivamente, todos aqueles incêndios cuja causa não se logrou apurar.

De facto, a circunstância de se desconhecer se o ato humano que deu origem ao incêndio dos autos foi ou não intencional (doloso), não implica a exclusão da cobertura do risco. Não foi esse o alcance do clausulado pelas partes, como o revelam os factos provados.

Em reforço poder-se-á ainda referir que o caso em apreço colhe respaldo nas “exclusões da garantia” consagradas no contrato, onde se diz expressamente

CLÁUSULA 3.ª - EXCLUSÕES DA GARANTIA OBRIGATÓRIA

Excluem-se da garantia obrigatória do seguro os danos que derivem, directa ou indirectamente, de:

(…)

h) Actos ou omissões dolosas do Tomador do Seguro, do Segurado ou de pessoas por quem estes sejam civilmente responsáveis;

Ora, a este propósito tem sido referido que:

“V. A definição de incêndio como combustão acidental (entre o mais) não pode deixar de ser articulada com uma cláusula em que se prevê a exclusão da garantia do seguro relativamente a actos ou omissões dolosas do tomador do seguro, do segurado ou de pessoas por quem estes sejam civilmente responsáveis, pressupondo a demonstração de um comportamento doloso para o afastamento da responsabilidade da seguradora.

VI. Atendendo às regras de repartição do ónus da prova, cabe ao lesado alegar e provar a ocorrência do incêndio e os danos sofridos, como factos constitutivos do seu direito (art. 342.º, n.º 1, do C. Civil), recaindo sobre a seguradora a prova de que o incêndio não teria tido causa acidental, por se tratar se matéria impeditiva do direito invocado (art. 342.º, n.º 2, do mesmo Código).

VII. Assim, não se apurando a causa de um incêndio, deve a consequência da ausência de prova consistente funcionar contra quem tinha o ónus de demonstrar que o incêndio não foi acidental, ou seja, contra a seguradora6.

Daí que, estando-se perante matéria de exceção, é inequívoco que o ónus de prova de factos sobre a origem não acidental do incêndio cabia à seguradora (artigo 342º/2 CC). Não o tendo feito significa que a seguradora torna-se responsável pelo valor que a matéria de facto revela corresponder aos danos causados pelo incêndio.

II.2.3. Vejamos então os efeitos da cobertura no tocante ao valor da indemnização

A A., na apelação, reiterou o peticionado na P.I. (conclusão XL), mas na revista peticiona que a R. seja responsabilizada pelos danos provocados pelo incêndio.

Subsistem, como se disse, os danos patrimoniais que estão descritos no facto n.º 13.

Como consequência direta e necessária da intervenção humana referida em 10), e do incêndio deflagrado:

- Na sala com lareira, a porta da sala, as caixilharias de madeira das janelas, a lareira, o recobrimento das paredes ficaram destruídos e os tectos degradados;

- No hall de entrada, a porta principal, o gradeamento trabalhado em ferro, e recobrimentos do tecto e paredes ficaram chamuscados;

- o recobrimento da laje do tecto do corredor e acesso ao vão de escadas ficou chamuscado.

- os degraus de madeira da escadaria, assim como o corrimão em ferro e madeira, ficaram carbonizados;

- os vitrais da escadaria apresentam vidros partidos e a caixilharia ficou e o recobrimento de paredes e tecto ficaram chamuscados.

- as tubagens das redes técnicas de eletricidade, distribuição de águas e drenagem de águas residuais, alojadas nos roços abertos, no corredor, casa de banho e divisões diretamente localizados por cima da sala e hall de entrada, ficaram danificadas pelo calor.

- o corrimão do corredor em ferro e madeira ficou danificado pelo calor e fumo.

- Na divisão situada por cima do hall de entrada principal, as chamas passaram pelos buracos abertos para a instalação das redes de águas da de esgotos, afectando o reboco das paredes, tecto e caixilharia de madeira da janela.

E no ponto 20 dos factos assinala-se que o valor de reparação dos danos descritos em 13), provocados pelo sinistro, compreende-se entre os € 32.000,00 e os € 46.200,00, após desconto do valor que sempre teria a A. de desembolsar para reparação e remodelação dos mesmos à data da ocorrência do sinistro.

Atendendo às circunstâncias do caso e ao disposto no citado artigo 566/3 CC, como melhor se demonstrará, afigura-se adequado recorrer à equidade para determinar o valor dos danos neste caso.

Dispõe-se naquele normativo: “Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.

Neste âmbito, como se escreveu no Ac. STJ de 07.07.2021: “Mostra-se pacífico o entendimento de que, uma vez assente a existência de um dano indemnizável (porque verificados todos os pressupostos da obrigação de indemnizar) sem que, porém, seja determinável o seu exacto montante, é possível optar-se por um dos mecanismos previstos na lei para superar a falta de determinação do referido valor: a liquidação posterior (artigo 609.º, n.º 2, do CPC) ou o julgamento de acordo com a equidade (artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil). A opção por um ou outro desses mecanismos dependerá do juízo que, em face das circunstâncias concretas, se possa formular sobre a maior ou menor probabilidade da futura determinação do montante em questão; assim, se for de concluir no sentido da improbabilidade de vir a ser feita prova do valor exacto do dano em sede de liquidação, deve prevalecer, desde logo, o recurso à equidade.7

E no contexto da densificação deste critério, contradistinguindo a determinação de danos pessoais e de danos patrimoniais, acrescenta-se ainda no mesmo aresto: “a aplicação do regime prescrito no nº3 do art 566º do CC em sede de puros e típicos danos patrimoniais envolve, desde logo, a questão de saber se a indefinição factual acerca do real valor do dano sofrido é susceptível de suprimento através de uma ponderação equitativa; é que, como atrás se referiu, o apelo à equidade é, neste caso, puramente complementar e acessório da aplicação da teoria da diferença, pressupondo que o «núcleo essencial» do dano está suficientemente concretizado e processualmente demonstrado e quantificado – não devendo o juízo equitativo representar um verdadeiro e arbitrário «salto no desconhecido», dado perante matéria factual de contornos manifestamente insuficientes e indeterminados”.

“A previsão contida no referido preceito legal supõe, na verdade, o preenchimento de duas condições ou requisitos: não estar determinado apenas o «valor exacto» do dano mas terem sido provados «limites», máximo e mínimo, para esse dano – que não podem considerar-se verificadas quando, no momento do julgamento, ocorre uma essencial indefinição acerca do valor real do dano material sofrido, pressupondo a formulação do juízo complementar de equidade uma base factual minimamente sólida e consistente sobre os valores indemnizatórios em causa (…)”.

“Este tribunal tem vindo a sublinhar que, não equivalendo a equidade a arbitrariedade, a fixação de indemnização com recurso a esse juízo não pode surgir como expressão de sensibilidades ou intuições meramente subjectivas do julgador, tendo antes de se alicerçar em factualidade donde se possa, com base em padrões sedimentados na experiência comum, chegar a um valor racional.

No presente caso, cumpre ter presentes os limites traçados pelo tribunal da primeira instância (e que não foram, aliás, postos em causa por qualquer das partes), situados entre €32.000 e €46.200.

A superação da dificuldade de determinação concreta do valor em dívida deve, face ao exposto, decorrer das circunstâncias do caso.

Neste domínio, valendo-nos da motivação de facto plasmada na sentença colhe-se nomeadamente que: “No que concerne aos factos 13), 17) a 20), o Tribunal assentou a convicção sobre a sua verificação no relatório pericial junto aos autos a 23-03-2023 (referência n.º ...73) e nos subsequentes esclarecimentos prestados a 24-06-2022 (referência n.º ...91). O juízo técnico e científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador, pelo que o julgador está, de certa forma, amarrado ao juízo pericial, apenas podendo dele divergir com uma fundamentação acrescida (e com argumentos de igual natureza), sem prejuízo também da valoração da perícia e das conclusões da mesma no contexto da demais prova produzida. Se quanto aos factos 13), 17), 18) e 19) houve um consenso entre a maioria dos peritos quanto à sua verificação, consenso no qual o Tribunal se baseou para dar como verificada tal factualidade, quanto ao facto 20), a convicção quanto a este facto deveu-se à explicitação do Perito do Tribunal (Engenheiro FF). Este Perito verteu no Relatório que para que se «considere que a autora não fique beneficiada com a ocorrência do sinistro, compreendido entre 32.000,00 € e 46.200,00 €, e por arredondamento do valor médio do intervalo onde se admite encontrar o valor do dano efetivo para a autora em consequência do sinistro, o signatário atribui o valor de 40.000,00 € (quarenta mil euros)», pelas razões expostas nas páginas 8 e 9 do Relatório, que são, quanto a nosso ver, plausíveis e bem fundamentadas, e apenas o Perito indicado pela Autora se afasta de forma exagerada dos valores indicados pelos outros dois Peritos (indicando que o valor de dano efectivo a considerar será de € 110.872,80, contra os valores indicados pelo Perito da Ré, € 40.000,00, e o do Perito do Tribunal, que fixa uma moldura de dano efectivo entre € 32.000,00 e € 46.200,00). Diga-se, precisamente, que face à maior proximidade entre os valores avançados pelos Peritos do Tribunal e da Ré, sem escamotear sempre que o Perito da Autora pode não apresentar a imparcialidade que o Perito do Tribunal apresenta, o Tribunal deu maior credibilidade às conclusões e respostas do Perito do Tribunal. Ademais, quanto às conclusões atinentes ao significado de dano efectivo sofrido pela Autora [isto é, a diferença entre os danos que o imóvel já apresentava antes do sinistro e os danos que apresentou após o sinistro], também se entendeu que as conclusões vertidas pelo Perito do Tribunal foram razoáveis e convincentes, atenta a forma clara com que foram expostas (sem escamotear igualmente a maior imparcialidade deste Perito)”.

Resulta, pois, que dois dos peritos (do tribunal e da R.) entendem que o valor mais ajustado será o de €40.000. Ora, não existindo qualquer motivo para alterar o veredito da primeira instância, também não se colhe qualquer razão para afastar o juízo formulado concretamente pelos dois senhores peritos, tanto mais que o tribunal, sem crítica expressa e concreta neste âmbito, expressamente aderiu às “razões expostas nas páginas 8 e 9 do Relatório, que são, quanto a nosso ver, plausíveis e bem fundamentadas”.

À luz do mesmo relatório, como resulta do facto 13, em causa estava “a sala e o hall [que] foram diretamente danificados” – numa área de cerca de 200 a 220 m2 - conforme fls. 8 relatório acolhido na motivação da sentença. Por isso, tudo aponta no sentido de que, dentro das balizas consideradas provadas (facto n.º 20), o valor de €40.000 apontado pelos dois peritos, além de contido nos limites provados, não se afasta do que é adequado, face aos critérios acima indicados.

Impõe-se, assim, concluir que, atendendo à realidade provada, é adequado fixar em €40.000 o valor dos danos patrimoniais sofridos.

A obrigação em causa vence juros nos termos peticionados, à taxa legal desde a citação (artigo 559º CC).

III. DECISÃO

Pelo exposto e decidindo, de harmonia com as disposições legais citadas, concedendo a revista, altera-se o acórdão recorrido, condenando a R. a pagar à A. a quantia de €40.000, acrescida de juros de mora, desde a citação à taxa legal.

Custas na proporção do decaimento.

___________________________________________________________


1. Na versão da sentença este facto que foi modificado pela Relação, tinha a seguinte redação: 6) Em data não concretamente apurada, mas anterior a 23-02-2011, mediante contrato de seguro de habitação celebrado entre a Autora e a Ré, titulado pela apólice n.º ...03, a Ré, enquanto seguradora, e a Autora, enquanto tomadora, declararam acordar que a primeira assumiria o risco da ocorrência de danos sofridos (inclusive incêndio) no edifício sito na Rua ..., com as coberturas e limites de capital constantes da Apólice de seguro n.º ...03 e dos documentos intitulados Condições Particulares e Especiais dessa Apólice e Condições Gerais e Especiais, com início em 23-02-2011 e duração de um ano, renovável por iguais períodos se não fosse denunciado com 30 dias de antecedência mínima em relação à data da prorrogação, ou se o tomador não procedesse ao pagamento do prémio, juntos aos autos como documentos n.ºs 3 e 4 da contestação, e que aqui se dão por transcritos, suportando os danos causados no edifício acima identificado.↩︎

2. Na versão original, constante da sentença, mas ulteriormente modificada pelo tribunal da Relação, a formulação era a seguinte: 7) A referida apólice titula um contrato de seguro «Multirriscos» e tinha no dia 31-10-2017 como objecto seguro o edifício e os conteúdos do local de risco sito na Rua ....↩︎

3. Na versão da sentença, antes, pois da modificação de facto por parte da Relação era a seguinte a formulação deste segmento do ponto 8) A caracterização do risco, coberturas, capitais seguros e franquias encontram-se descritos nas condições particulares, inscritas no documento n.º 3 junto com a contestação, com o seguinte teor:

COBERTURA E CAPITAIS SEGUROS

«CARACTERIZAÇÃO DO RISCO:

MORADA: R. ...

LOCALIDADE: ...

CÓD. POSTAL: ...↩︎

4. Relatado pelo Exmº Conselheiro Luís Espírito Santo.↩︎

5. Na versão da sentença este facto que foi modificado pela Relação, tinha a seguinte redação: 6) Em data não concretamente apurada, mas anterior a 23-02-2011, mediante contrato de seguro de habitação celebrado entre a Autora e a Ré, titulado pela apólice n.º ...03, a Ré, enquanto seguradora, e a Autora, enquanto tomadora, declararam acordar que a primeira assumiria o risco da ocorrência de danos sofridos (inclusive incêndio) no edifício sito na Rua ..., com as coberturas e limites de capital constantes da Apólice de seguro n.º...03 e dos documentos intitulados Condições Particulares e Especiais dessa Apólice e Condições Gerais e Especiais, com início em 23-02-2011 e duração de um ano, renovável por iguais períodos se não fosse denunciado com 30 dias de antecedência mínima em relação à data da prorrogação, ou se o tomador não procedesse ao pagamento do prémio, juntos aos autos como documentos n.ºs 3 e 4 da contestação, e que aqui se dão por transcritos, suportando os danos causados no edifício acima identificado.↩︎

6. Ac. STJ de 10-11-2022, no proc.º n.º 3311/16.0T8PDL.L2.S1, relatado pelo Exmº Conselheiro Tibério Nunes da Silva.↩︎

7. Ac. STJ de 7 de Julho de 2021, Exmª Conselheira Graça Amaral.↩︎