Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3322/21.3T8VCT.G1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: CATARINA SERRA
Descritores: PENSÃO POR INCAPACIDADE
INCAPACIDADE PERMANENTE PARCIAL
INDEMNIZAÇAO DE CLIENTELA
ACIDENTE DE VIAÇÃO
ACIDENTE DE TRABALHO
CUMULAÇÃO DE INDEMNIZAÇÕES
RELEVÂNCIA JURÍDICA
SEGURADORA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DUPLA CONFORME
FUNDAMENTAÇÃO ESSENCIALMENTE DIFERENTE
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
EXCESSO DE PRONÚNCIA
Data do Acordão: 10/31/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. Visando a indemnização na forma de pensão anual e vitalícia arbitrada no processo laboral ressarcir o dano da perda / redução da capacidade para o trabalho, o seu objecto não coincide com o da indemnização, a arbitrar em processo cível, dirigida a ressarcir a incapacidade permanente parcial, traduzida tanto na redução da capacidade de ganho como em todas as limitações funcionais com que o lesado é susceptível de se deparar na sua vida activa.

II. Sendo os danos distintos, não há duplicação de indemnizações, nada impedindo o seu cúmulo.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


I. RELATÓRIO

Recorrente: Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A.

Recorrida: AA

1. AA instaurou a presente acção, com processo comum, contra Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A., pedindo que se condene a ré a pagar-lhe a indemnização global líquida de € 499.082,89, acrescida de juros de mora vincendos, contados à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação até efectivo pagamento, bem como a indemnização ilíquida que, por força dos factos alegados nos artigos 313.º a 338.º da petição inicial, vier a ser fixada em decisão ulterior (artigo 564.º n.º 2, do CC) ou vier a ser liquidada em execução de sentença (artigos 358.º n.ºs 1 e 2, e 609.º n.º 2 e s. do CPC).

2. Neste processo foi proferida a seguinte sentença com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, decide-se:

▪ Julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido formulado na presente ação pelo A. AA contra a R. Allianz, condenando esta no pagamento àquele da quantia de 210.298,95 € (duzentos e dez mil, duzentos e noventa e oito euros e noventa e cinco cêntimos), sendo:

- 80.000,00 € (oitenta mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, contados desde a prolação da presente decisão e até efetivo e integral pagamento;

- 130.000,00 € (cento e trinta mil euros) a título de défice funcional permanente da integridade física e psíquica, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação até efetivo e integral pagamento;

- 298,95 € (duzentos e noventa e oito euros e noventa e cinco cêntimos) a título de danos patrimoniais (diferenças salariais), acrescidos de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação até efetivo e integral pagamento”.

3. Inconformadas, vieram ambas as partes apresentar recurso, tendo o Tribunal da Relação de Guimarães proferido Acórdão em cujo dispositivo pode ler-se:

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar:

a) improcedente a apelação apresentada pela ré, apesar da parcial procedência da sua impugnação sobre a matéria de facto;

b) parcialmente procedente a apelação apresentada pelo autor, incluindo a impugnação sobre a matéria de facto e, em conformidade:

1 – revogam a decisão proferida na parte em que condena a ré no pagamento de 298,95 euros a título de perdas salarias;

2 - condenam a ré a pagar ao autor, a título de perdas salarias, a quantia de 1.688,77 euros;

3 – revogam a decisão proferida na parte em que absolveu a ré do pedido relativo a danos no vestuário e capacete que o autor trazia consigo no momento do acidente;

4 – condenam a ré a pagar ao autor a quantia que se vier a liquidar em incidente ulterior relativa aos seguintes bens danificados com o acidente:

- blusão, até ao limite de 300,00 euros;

- camisa, até ao limite de 50,00 euros;

- t’shirt até ao limite de 30,00 euros;

- calças, até ao limite de 100,00 euros;

- capacete, até ao limite de 500,00 euros.

5 – mantêm, quanto ao mais, a decisão proferida.

Nos termos do art. 527.º do C. P. Civil:

- as custas da ação são devidas por ambas as partes na proporção do seu decaimento resultante desta decisão, sendo, quanto aos valores referidos em 4, tal decaimento na proporção de ½ para o autor e ½ para a ré.

- as custas do recurso interposto pela ré são da sua responsabilidade,

- as custas do recurso interposto pelo autor são suportadas por autor e ré, na proporção de 4/5 para o autor e 1/5 para a ré.

Nos termos referidos, dispensa-se as partes do pagamento da taxa de justiça remanescente”.

4. Ainda inconformada, a ré Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A., vem agora interpor recurso de revista “nos termos do previsto no artigo 671.º e seguintes do Código do Processo Civil”.

Conclui as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. O Tribunal a quo ao ter decidido pela possibilidade de cumulação da pensão na vertente de acidente de trabalho com a indemnização fixada a título de dano biológico na sua vertente patrimonial, violou o princípio de reformatio in pejus o que equivale a dizer que tomou conhecimento de questão que não podia conhecer, o que é motivo gerador da sua nulidade nos termos previstos no art. 615º, nº 1, al, d), 2ª parte do CPC, o que se invoca para todos os efeitos legais.

2. Considerando que a Recorrente tem a qualidade simultânea de seguradora de acidentes de trabalho e de responsabilidade civil, sempre se dirá que deverá ser realizada a dedução dos montantes pagos a título de acidente de trabalho correspondentes a indemnizações não cumuláveis.

3. A pensão fixada a título de acidente de trabalho pela perda de capacidade laboral e a indemnização fixada a título de dano biológico na vertente de dano patrimonial, visam indemnizar o mesmo dano: o dano patrimonial na esfera económica do lesado, causado pela influência de uma sequela permanente na sua remuneração e/ou carreira retributiva.

4. Atento o exposto, sempre se dirá que não devem as indemnizações serem consideradas como cumuláveis, uma vez que sempre levariam à duplicação da indemnização quanto a um mesmo dano.

5. Consequentemente, considerando os montantes já recebidos e a receber pelo Recorrido, é manifesto que o mesmo será integralmente ressarcido pela sua perda de capacidade de ganho através da pensão referida no ponto 178 da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo, pensão fixada de forma prévia à decisão proferida pelo Tribunal a quo, razão pela qual deve a indemnização fixada pelo Tribunal Civil ser compensada pela mesma e reduzida a zero.

6. Caso assim não se entenda, e se considere, como considerou o Tribunal a quo, que podem “ser pedidas as duas indemnizações (ao Tribunal do Trabalho uma, outra ao Tribunal comum), para depois ser feita a opção pela mais conveniente.”, é necessário assim impor essa escolha ao Recorrido antes de ser efetuado qualquer pagamento subsequente pela Recorrente, de modo a que o mesmo não receba em duplicado qualquer indemnização.

7. Assim, ao decidir como decidiu o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 562.º do Código Civil, o que se invoca nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 674.º, n.º 1, al. a) do Código de Processo Civil”.

5. Respondeu o autor, concluindo:

1. Analisadas as decisões de 1.ª e 2.ª Instância, não se vislumbra que a fundamentação de ambas seja essencialmente distinta, o que torna o presente recurso inadmissível, à luz do disposto no art. 671.º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil, pelo que o recurso não deverá ser admitido.

2. Face ao objecto do recurso definido pela Ré nas conclusões da sua douta apelação – em particular, as conclusões 6, 7, 8 e 10 daquele recurso -, o Tribunal recorrido não poderia deixar de abordar a temática da possibilidade de cumulação de indemnizações fixadas em sede cível e laboral, tomando posição quanto à mesma, bem como quanto ao suposto enriquecimento sem causa decorrente dessa possível cumulação, sob pena de nulidade por omissão de pronúncia.

3. A indemnização pelo dano corporal contempla as vertens de indemnização pela perda de capacidade de ganho, indemnização pelo dano biológico e indemnização por danos não patrimoniais.

4. A indemnização pela perda de capacidade de ganho é calculada com base em fórmulas recorrentemente seguidas pela jurisprudência, que têm como base de cálculo a idade do lesado, o grau de défice funcional permanente de que ficou a padecer e, por fim, o salário auferido à data do sinistro, pelo que é diferenciada conforme a idade e o rendimento do lesado, traduzindo-se em indemnizações superiores quanto menor a idade e maior o rendimento.

5. A indemnização pelo dano biológico, por sua vez, por corresponder a uma perda de disponibilidade do corpo para responder a tarefas do dia-a-dia, que não as tarefas laborais, é independente do salário auferido pelo sinistrado e, em idênticas circunstâncias, é igual para sinistrados com a mesma incapacidade, independentemente dos seus rendimentos, sendo fixada por recurso à equidade e tendo fundamento no art. 562.º do Cód. Civil.

6. A indemnização por danos não patrimoniais, variando de acordo com o grau de sofrimento do sinistrado, é fixada também por recurso à equidade, sem que existam referenciais objectivos que permitam auxiliar essa tarefa do Julgador, com excepção dos valores comummente seguidos pela jurisprudência.

7. As Instâncias definiram vertente indemnizatória de 130 000,00 € como indemnização por dano biológico, e não como dano pela perda de capacidade de ganho, sendo que esse segmento das decisões das instâncias não constitui objecto deste recurso e, nessa medida, transitou em julgado, o que equivale a dizer que a parcela indemnizatória de 130 000,00 € arbitrada ao Autor foi-o a título de dano biológico.

8. Estando em causa uma vertente indemnizatória que não visa compensar a perda de capacidade de ganho, mas o dano biológico, a mesma complementa a indemnização fixada em sede de processo de AT, o que equivale a dizer que as mesmas são cumuláveis – na senda de vasta jurisprudência dos tribunais superiores, já mencionada no Douto Acórdão recorrido, para a qual se remete.

9. O que não seria cumulável seria a indemnização destinada a compensar a perda de capacidade para o trabalho, sendo que, aí sim, sem prejuízo da necessidade de fixar as indemnizações em ambas as instâncias, o Autor teria de optar por uma delas (naturalmente, a que lhe fosse mais favorável).

10. Não sendo esse o caso dos autos, atenta a configuração da parcela indemnizatória de 130 000,00 € como dano biológico, por decisão transitada, o Douto Acórdão recorrido não poderá merecer censura e deverá ser confirmado”.

6. Proferiu-se despacho no Tribunal de Relação de Guimarães com o seguinte teor:

Admissão do recurso:

No Acórdão proferido julgou-se parcialmente procedente o recurso apresentado pelo autor (no que se reporta a perdas salariais e danos em vestuário e capacete) e improcedente o recurso apresentado pela ré.

A ré vem apresentar recurso de revista da decisão, apenas na parte em que julgou improcedente a sua apelação, no que diz respeito à questão da possibilidade de cumulação das indemnizações fixadas nestes autos e aquela que é devida pela circunstância de estar também em causa um acidente de trabalho.

Cumpre apreciar a admissibilidade do recurso, pois que este Tribunal julgou improcedente o recurso apresentado, confirmando, nesta parte, a decisão de 1.ª Instância.

Alega a ré que o recurso não é admissível, pois que a decisão deste Tribunal confirma, nesta parte, a decisão de 1.ª Instância.

Sobre a matéria da cumulação das indemnizações, referiu o Tribunal de 1.ª Instância: “O A. está a receber uma pensão na vertente de acidente de trabalho. Ora, as indemnizações consequentes ao acidente de viação e ao sinistro laboral – assentes em critérios distintos e cada uma delas com a sua funcionalidade própria – não são cumuláveis, mas antes complementares até ao ressarcimento total do prejuízo causado, assumindo a responsabilidade laboral carácter subsidiário. Apesar de não ser permitida a cumulação de indemnizações, quando deva haver lugar à fixação de indemnizações na dupla vertente do acidente, cada um dos tribunais – o cível e o laboral – fixará as indemnizações segundo os critérios legais aplicáveis, mas com inteira independência do que tenha decidido ou venha a decidir o outro tribunal, podendo, pois, ser pedidas as duas indemnizações (ao Tribunal do Trabalho uma, outra ao Tribunal comum), para depois ser feita a opção pela mais conveniente”.

No Acórdão proferido, sobre esta matéria, escreveu-se que: “quando exista duplicação de indemnizações, e não podendo estas ser cumuladas, não havendo nota que foi proposta qualquer ação pela companhia de seguros do acidente de trabalho contra a ré, nem tendo aquela tido qualquer intervenção nos autos, pagando o responsável civil a indemnização ao autor, cabe àquele responsável laboral apenas direito de ação precisamente contra o lesado (e não já contra o responsável civil), razão pela qual não existe a situação indicada de se ver o responsável civil colocado na posição de indemnizar duas vezes o mesmo dano.

Não cremos, porém, que, nestes autos, a quantia aqui fixada a título de dano biológico – de 130.000,00 euros, mas cujo valor está ainda em discussão, considerando os recursos apresentados por ambas as partes – assuma a mesma natureza que a quantia paga a título de pensão anual e vitalícia no âmbito do processo de acidente de trabalho.

Veja-se, neste sentido, com vasta indicação de jurisprudência, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29/03/2022, da Juiz Conselheira Maria João Vaz Tomé, proc. 119/19.4T8STR-E1.S1, in www.dgsi.pt, referindo-se ao dano biológico considerado em sede civil “verifica-se a existência de danos distintos, cujo ressarcimento se impõe, sem que haja lugar a qualquer dedução do montante indemnizatório atribuído no foro laboral na indemnização conferida na presente ação.

É que não se pode falar de cumulação de indemnizações de carácter idêntico, pelo mesmo dano. Não pode, por conseguinte, falar-se de violação do princípio da integralidade do ressarcimento, segundo o qual o lesado não pode vir a encontrar-se numa posição patrimonial mais favorável do que aquela em que estaria se a lesão não houvesse ocorrido.

O acidente não é fonte de lucro ou de enriquecimento para o lesado, não existindo uma dupla indemnização pelo mesmo dano.

O montante obtido pelo lesado no foro laboral não repara o mesmo prejuízo que é pressuposto e medida da indemnização por si pretendida nesta ação.

O ressarcimento concedido com base na incapacidade parcial permanente não obsta à indemnização do dano biológico: o lesado não peticiona, nesta ação, a indemnização do dano da incapacidade profissional”.

Concordando-se com este entendimento que, como se disse, é abundantemente defendido na jurisprudência dos Tribunais Superiores, torna-se claro que não existe fundamento para considerar na fixação da indemnização pelo dano biológico as quantias que foram pagas no âmbito do processo de acidente de trabalho (veja-se, para além da jurisprudência citada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça já referido, o Acórdão deste Tribunal da Relação de Guimarães de 14/03/2019, proc. 2110/15.0T8VCT.G1, da Juiz Desembargadora Ana Cristina Duarte, e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14/05/2020, proc. 2171/17.8T8PRD.P1, do Juiz Desembargador Joaquim Correia Gomes, ambos in www.dgsi.pt.

Improcede assim a argumentação da ré recorrente tendo em vista a dedução ou a consideração dos valores pagos ou a pagar ao autor, a título de pensão anual e vitalícia, no âmbito do processo de acidente de trabalho”.

Resulta do exposto que a razão pela qual se entendeu que não haveria que fazer qualquer dedução à indemnização fixada de 130.000,00 euros, considerando que o acidente dos autos era também acidente de trabalho, não é a mesma em ambas as decisões, com resultados práticos também diferentes.

Dispõe o art.º 671.º, n.º 3, do C. P. Civil que apenas não é admitido recurso de revista de Acórdão do Tribunal da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão de 1.ª Instância.

Assim, considerando a diferença de fundamentação para rejeitar a requerida dedução de indemnizações ou a imposição de uma escolha, salvo melhor entendimento do Tribunal Superior, esta é suficiente para que, apesar de se ter mantido o montante indemnizatório fixado pelo Tribunal de 1.ª Instância – 130.000,00 euros – para reparação deste dano, se entenda que o recurso de revista apresentado é admissível (e não exista, assim, “dupla conforme”).

II - Pelo exposto, admite-se o recurso de revista (normal), com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, para o Supremo Tribunal de Justiça (arts.º 671º, n.º 1, 674.º, 675.º, n.º 1, 676.º, n.º 1, por interpretação “a contrario”, todos do C. P. Civil).

Aguardem os autos a próxima sessão para apreciação da arguição da nulidade”.

7. De seguida proferiu-se Acórdão em que se decidiu, na parte relevante:

A recorrente expressa o entendimento de que estaria vedado a este Tribunal de recurso afirmar que as pensões arbitradas – em sede laboral e em sede civil – seriam cumuláveis, pois que o Tribunal de 1.ª Instância havia decidido que o não eram e, nessa parte, a decisão seria definitiva, já que não havia colocado em causa esse entendimento.

Está em causa o art.º 615.º, n.º1, alínea d), do C. P. Civil, que estabelece que é nula a sentença que conhece de questões de que não podia tomar conhecimento.

O objeto do recurso era, nesta parte, saber se, estando em causa acidente de viação que era também de trabalho, deveria ou não fazer-se qualquer dedução na indemnização de 130.000,00 euros que foi fixada ou se o autor teria de escolher entre esta indemnização e aquela que estava já fixada em sede laboral (como alegava a recorrente).

Sendo esta a questão a decidir, não estava o Tribunal adstrito aos fundamentos jurídicos apresentados pelo Tribunal de 1.ª Instância quer para não efetuar tal dedução, quer para não concluir pela pretendida escolha (que era requerida pela recorrente nas suas alegações de recurso).

Aliás, é esta fundamentação diferente que torna admissível o recurso interposto, pois que, de outra forma, como vimos e decorre do despacho de admissão, estes não seria admissível.

O Tribunal não decidiu assim questão que estava já decidida.

Limitou-se a apreciar, com fundamentos diferentes, a questão que foi apreciada pelo Tribunal de 1.ª Instância, no limite das conclusões formuladas pela recorrente.

Entendemos assim que não se verifica qualquer nulidade, tendo este Tribunal da Relação apreciado apenas as questões objeto de recurso, embora com fundamentação diversa daquela que consta da decisão de 1.ª Instância.

Não existe, pois, a arguida nulidade do Acórdão.

Notifique e, observando as demais formalidades legais, remeta os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, para apreciação do recurso interposto e já admitido”.

*

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC), as questões a decidir, in casu, são as de saber se:

1.ª) o Acórdão recorrido é nulo por excesso de pronúncia; e

2.ª) o Tribunal a quo decidiu bem ao determinar a admissibilidade do cúmulo de indemnizações.

*

II. FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

São os seguintes os factos que vêm provados no Acórdão recorrido:

“1. O Autor – AA – era, à data de 25 de Maio de 2019, dono e legítimo proprietário do motociclo de matrícula ..-HD-...

2. No dia 25 de Maio de 2019, pelas 14h00m, ocorreu um acidente de trânsito, na Estrada Combatentes ..., junto à casa de habitação com o número de polícia “426”, ali existente, na margem direita da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

3. Nesse acidente, foram intervenientes os seguintes veículos:

– o motociclo de matrícula ..-HD-..;

– o motociclo de matrícula ..-CZ-...

4. O motociclo de matrícula ..-HD-.. era, na altura da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente ação, conduzido pelo A.

5. A Estrada Combatentes ..., no local da deflagração do sinistro, configura um traçado retilíneo.

6. Com um comprimento superior a trezentos metros.

7. Esse troço de reta é delimitado pelo lado Nascente – ou seja, pelo lado de C.......... – por uma curva que a Estrada Combatentes ... ali configura.

8. Descrita para o lado direito.

9. Tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...- C...........

10. Situada a uma distância superior a cem metros do preciso local onde eclodiu o acidente de trânsito.

11. A faixa de rodagem da Estrada Combatentes ... tem uma largura de 5,70 metros.

12. O seu piso era pavimentado a asfalto.

13. O tempo estava bom e seco.

14. E o pavimento asfáltico da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ... encontra-se limpo, seco e em bom estado de conservação.

15. Pelas suas duas margens, a faixa de rodagem da Estrada Combatentes ... apresentava bermas.

16. Pavimentadas a terra batida, sobre as quais cresciam ervas.

17. Com uma largura de:

a) de 2,00 metros, a situada na margem direita da referida via, tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C..........;

b) 1,50 metros, a situada na margem esquerda da referida via, tendo em conta o mesmo indicado sentido de marcha: Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

18. O plano configurado pelo pavimento térreo dessas duas referidas bermas encontra-se situado sensivelmente ao mesmo nível do plano configurado pelo pavimento asfáltico da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ....

19. Pelo lado exterior da berma térrea situada na margem direita da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C.........., existiam, de forma contínua, muros de vedação de logradouros de casas de habitação.

20. Ali existentes na margem direita da referida via – Estrada Combatentes ... -, tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

21. Nomeadamente, das casas de habitação com os números de polícia “420” e “426”.

22. Esses muros de vedação dos logradouros das supra-referidas casas de habitação têm uma altura de 1,50 metros.

23. Pelo lado exterior da berma térrea situada na margem esquerda da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, existiam terrenos de cultivo marginais, em relação à referida via.

24. A visibilidade no local do sinistro era muito boa.

25. O local da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente ação configura-se como uma localidade.

26. O local onde eclodiu o acidente de trânsito que está na génese da presente ação situa-se numa zona da Estrada Combatentes ..., que se situa entre as placas, fixas em suporte vertical, que avisam e assinalam a existência e a presença do núcleo urbano, comercial, habitacional, freguesia e localidade de ..., concelho de ...: SINAL N1a.

27. Para quem circula pela Estrada Combatentes ..., no sentido Nascente-Poente, ou seja, C..........-Estrada Nacional nº. ..., antes de chegar ao preciso local da deflagração do acidente de trânsito, deparava com um sinal, fixo em suporte vertical, de forma circular, com a sua orla pintada a cor vermelha, com o seu fundo branco, sobre o qual se encontrava, pintada a cor preta, a inscrição “50”: PROIBIÇÃO DE EXCEDER A VELOCIDADE MÁXIMA DE CINQUENTA (50,00) QUILÓMETROS POR HORA – SINAL C13.

28. A Estrada Combatentes ... encontrava-se, à data do sinistro, aberta aos dois sentidos de trânsito.

29. A faixa de rodagem da Estrada Combatentes ... apresentava-se subdividida em duas hemi-faixas de rodagem distintas.

30. Com uma largura de 2,85 metros, cada uma.

31. A hemi-faixa de rodagem, resultante da supra-referida subdivisão, situada do lado Norte, destina-se ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido Nascente-Poente, ou seja, C..........-Estrada Nacional nº ....

32. A hemi-faixa de rodagem, resultante da supra-referida subdivisão, situada do lado Sul, destina-se ao trânsito automóvel que desenvolve a sua marcha no sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

33. A uma distância de cinquenta metros a Nascente do local onde deflagrou o acidente de trânsito que deu origem à presente ação – do lado de C.......... -, a Estrada Combatentes ... configura um entroncamento.

34. No topo da Rua do ..., para quem circula no sentido convergente em relação à faixa de rodagem da Estrada Combatentes ... – lugar de A....../R......-Estrada Combatentes ... - existia um sinal de forma octogonal, com a orla branca e com o fundo de cor vermelha, sobre o qual se encontrava pintada a cor branca, a inscrição “STOP”: Sinal B2 - Paragem Obrigatória na Intersecção.

35. No dia 25 de Maio de 2019, pelas 14h00m, o Autor conduzia o seu referido motociclo de matrícula ..-HD-.., pela Estrada Combatentes ....

36. O motociclo de matrícula ..-HD-.. desenvolvia a sua marcha, no sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

37. O motociclo de matrícula ..-HD-.. – propriedade do Autor - circulava rigorosamente pela metade direita da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o seu indicado sentido de marcha.

38. Com os seus rodados a uma distância não superior a 0,20 metros do limite do lado direito da hemi-faixa de rodagem do lado direito da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente.

39. O A. não conduzia a mais de 40 kms/h.

40. Quando rodava nas circunstâncias atrás referidas e quando se encontrava a circular no sector de reta que a Estrada Combatentes ... configura no preciso local da deflagração do acidente de trânsito, o Autor apercebeu-se de que, nesse preciso momento, surgiu um outro motociclo, a circular pela Rua do ....

41. Esse motociclo circulava no sentido Norte-Sul, ou seja, lugar de A....../R......-Estrada Combatentes ....

42. Esse motociclo circulava a uma velocidade superior a oitenta quilómetros por hora.

43. Esse motociclo, de matrícula ..-CZ-.., era conduzido pelo seu proprietário BB.

44. Ao chegar ao topo da Rua do ..., o condutor do motociclo de matrícula ..-CZ-.. – BB – não reduziu a velocidade que imprimia ao referido motociclo.

45. BB, ao chegar ao topo da Rua do ..., no preciso local da sua confluência com a Estrada Combatentes ..., não imobilizou a sua marcha.

46. Nem parou o motociclo que tripulava em obediência do Sinal “STOP” – Sinal B2 -, ali existente, fixo em suporte vertical.

47. BB penetrou com o motociclo na faixa de rodagem da Estrada Combatentes ....

48. E levou, de imediato, a efeito a manobra de mudança de direção à sua direita.

49. BB passou, de imediato, a circular com o motociclo pela Estrada Combatentes ..., no sentido Nascente-Poente, ou seja, C..........-Estrada Nacional nº ..., sempre animado de uma velocidade superior a oitenta quilómetros por hora.

50. BB não prestava qualquer atenção à atividade – condução – que executava.

51. Nem aos restantes motociclos que, na altura, transitavam pela Estrada Combatentes ....

52. BB vinha a olhar para o seu lado esquerdo, em direção aos terrenos situados na margem esquerda da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Nascente-Poente, ou seja, C..........-Estrada Nacional nº ....

53. Logo que penetrou na Estrada Combatentes ..., BB transpôs, com o motociclo de matrícula ..-CZ-.., a linha correspondente ao eixo divisório da referida via: Estrada Combatentes ....

54. BB passou de imediato a circular, com o motociclo de matrícula ..-CZ-.., totalmente sobre a metade esquerda da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Nascente-Poente, ou seja, C..........-Estrada Nacional nº ....

55. Totalmente sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C.........., que estava reservada à circulação do motociclo de matrícula ..-HD-.., conduzido pelo Autor.

56. O Autor travou, de imediato, o motociclo que tripulava.

57. Infletiu o motociclo que tripulava ainda mais para o seu lado direito.

58. Encostou os rodados do motociclo ao limite do lado direito da metade direita da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

59. Acionou, de forma insistente, o sinal acústico – “apito” – do motociclo de matrícula ..-HD-...

60. E imobilizou, completamente, o motociclo de matrícula ..-HD-...

61. Quando se encontrava assim, completamente parado e imobilizado, com os seus rodados totalmente encostados ao limite do lado direito da metade direita da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

62. O motociclo conduzido pelo Autor foi violentamente embatido pelo motociclo de matrícula ..-CZ-.., conduzido pelo BB.

63. BB prosseguiu totalmente sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

64. Que estava reservada à circulação do motociclo de matrícula ..-HD-.., propriedade do Autor AA e, na altura, por ele próprio conduzido, ao longo de uma distância de cinquenta metros.

65. Até que, sem sequer travar e sem reduzir a velocidade de que seguia animado – superior a oitenta quilómetros hora, BB embateu com o motociclo de matrícula ..-CZ-.. – por si tripulado, contra o motociclo de matrícula ..-HD-.., conduzido pelo A.

66. O embate ocorreu totalmente sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

67. Essa colisão verificou-se entre a parte frontal – roda da frente – do motociclo de matrícula ..-HD-.. – propriedade do Autor - e a parte frontal – roda da frente - do motociclo de matrícula ..-CZ-.., conduzido pelo BB.

68. E essa colisão ocorreu numa altura em que o motociclo de matrícula ..-HD-.., propriedade do Autor, estava já totalmente parado e imobilizado, totalmente sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C...........

69. Com os seus rodados totalmente encostados ao limite do lado direito da metade direita da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente.

70. Após a referida colisão, o motociclo de matrícula ..-HD-.., propriedade do Autor, foi projetado para o seu lado direito.

71. Até que ficou imobilizado totalmente sobre a berma térrea situada na margem direita da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente.

72. Totalmente encostado ao muro de vedação do logradouro da casa de habitação, com o número de polícia “426”, propriedade de CC, ali existente, sita na margem direita da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente.

73. Com a sua parte frontal apontada no sentido Poente, em direção à Estrada Nacional nº ....

74. E com a sua parte traseira apontada no sentido Nascente, em direção a C...........

75. O Autor ficou deitado no solo, também totalmente sobre a berma térrea situada na margem direita da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente.

76. Totalmente encostado ao muro de vedação do logradouro da casa de habitação, com o número de polícia “426”.

77. Após a supra-referida colisão, o motociclo de matrícula ..-CZ-.., tripulado pelo BB, ficou imobilizado sobre a metade esquerda da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Nascente-Poente; sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Combatentes ..., tendo em conta o sentido Poente-Nascente, ou seja, Estrada Nacional nº ...-C.........., que estava reservada à circulação do motociclo de matrícula ..-HD-.. conduzido pelo A.

78. Com a sua parte frontal apontada no sentido Poente, em direção à Estrada Nacional nº....

79. E com a sua parte traseira apontada no sentido Nascente, em direção a C...........

80. Logo após a deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente ação, a Ré Companhia de Seguros “ALLIANZ PORTUGAL, S.A.”, através dos seus serviços técnicos, levou a efeito as pertinentes averiguações tendentes ao apuramento das causas que estão na génese do acidente do sinistro dos presentes autos.

81. Concluiu que a culpa na produção do acidente de trânsito que deu origem à presente ação é, única e exclusivamente, imputável ao condutor do motociclo de matrícula ..-CZ-.. – BB.

82. Assumiu a responsabilidade pelas consequências danosas do acidente de trânsito que está na origem da presente ação.

83. E pagou já, ao Autor – AA – a quantia de 7.423,00 €, correspondente ao valor do motociclo de matrícula ..-HD-...

84. Como consequência direta e necessária do acidente, resultaram, para o Autor traumatismo crânio-encefálico – da queda no solo -, traumatismo abalamento do embate - da coluna lombar, dorsal e cervical, traumatismo do ombro esquerdo, traumatismo do membro superior esquerdo, traumatismo da mão esquerda, feridas nos nódulos dos dedos – indicador e máximo – da mão esquerda, escoriações na mão esquerda, rotura/esmagamento do plexo braquial esquerdo, axonotmesis grave (total?) do tronco primário superior do plexo braquial esquerdo, escoriações e hematomas espalhados pelo corpo.

85. Logo após a deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente ação, o Autor ficou prostrado no solo cerca de quarenta e cinco minutos a aguardar a chegada do I.N.E.M.

86. O Autor foi transportado na ambulância do I.N.E.M., para o Hospital de ..., de ..., em maca.

87. O Autor foi recebido no Hospital da ..., de ....

88. Onde lhe foram prestados os primeiros socorros, no respetivo Serviço de Urgência.

89. Foram-lhe, aí, efetuados exames radiológicos – R.X. – à coluna cervical, ao ombro esquerdo e ao membro superior esquerdo.

90. Foram-lhe, aí, efetuadas Tomografias Computorizadas – TACs, à coluna cervical, ao ombro esquerdo e ao membro superior esquerdo.

91. Foram-lhe, aí, efetuadas Ecografias ao ombro esquerdo e ao membro superior esquerdo.

92. Foi-lhe, aí, efetuada desinfeção às feridas sofridas, nos nódulos dos dedos da mão esquerdo – dedo indicador e dedo máximo.

93. Foi-lhe, aí, efetuada sutura das referidas feridas sofridas.

94. O Autor manteve-se, no Serviço de Urgência, do Hospital de ..., de ..., até às 02h00m da madrugada do dia 26 de Maio de 2019.

95. O Autor apresentava parestesias (paralisia) do membro superior esquerdo.

96. O Autor foi internado, no Serviço de Ortopedia – Piso 4 -, do Hospital de ..., de ....

97. Onde se manteve, ao longo de um período de tempo de seis dias, até dia 30 de Maio de 2019.

98. Durante esse período de tempo de internamento, no Hospital de ..., de ..., o Autor manteve-se retido no leito.

99. O Autor apenas se ausentou do Hospital de ..., de ..., no dia 29 de Maio de 2019.

100. Para se deslocar ao Hospital de ....

101. Para ser submetido a uma consulta da Especialidade de Cirurgia Plástica.

102. O Autor passou a frequentar a Consulta da Especialidade de Cirurgia Plástica, do Hospital de ....

103. No dia 30 de Maio de 2019, o Autor obteve alta hospitalar do Hospital de ..., de ...

104. E regressou à sua casa de habitação, sita no Caminho ..., freguesia de ..., concelho de ...

105. Onde se manteve, doente, combalido e retido no leito.

106. Ao longo de um período de tempo de três meses.

107. Sempre dependente da presença, da ajuda e do auxílio da sua esposa.

108. A qual fez a companhia de que o Autor carecia.

109. Administrava-lhe os medicamentos para debelar as dores de que o Autor era acometido.

110. Preparava-lhe e servia-lhe as refeições.

111. Fazia-lhe a higiene pessoal.

112. Vestia-o, sempre que necessário.

113. Despia-o.

114. E auxiliava-o a fazer as suas necessidades.

115. A “ALLIANZ PORTUGAL COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.” pagou à esposa do A. os salários respetivos, ao abrigo do contrato de seguro de acidentes de trabalho.

116. No mês de Setembro de 2019, o Autor passou a frequentar os Serviços Clínicos da Companhia de Seguros “ALLIANZ PORTUGAL, S.A.”, ao abrigo do contrato de seguro de acidentes de trabalho.

117. No Hospital de ..., da cidade ..., nas Especialidades de:

a) Ortopedia - Dr. DD;

b) Cirurgia Plástica – Dr. EE.

118. Aonde o Autor se dirigiu por trinta e cinco vezes.

119. O Autor manteve-se a frequentar os Serviços Clínicos da Companhia de Seguros “ALLIANZ PORTUGAL, S.A.” – acidentes de trabalho, no Hospital de ..., da cidade ... mensalmente e, às vezes, duas vezes, por mês.

120. Desde o mês de Setembro de 2019, até ao dia 25 de Maio de 2021.

121. Para consultas médicas.

122. E para a realização de Exames de Diagnóstico – Ressonâncias Magnéticas e Eletromiografias.

123. No dia 11 de Novembro de 2019, o Autor foi internado no Hospital de ..., da cidade ....

124. Onde se manteve – internado, ao longo de um período de tempo de cinco dias – entre o dia 11 de Novembro de 2019 e o dia 15 de Novembro de 2019.

125. O Autor fez análises clínicas.

126. Fez um eletromiograma.

127. Foi-lhe administrada uma anestesia geral.

128. E foi submetido a uma intervenção cirúrgica.

129. À região do ombro esquerdo – Plexo Braquial Esquerdo.

130. Consubstanciada na “união” das extremidades do Plexo Braquial Esquerdo, na zona da rotura/esmagamento.

131. Após o que foram aplicados cerca de quarenta pontos de sutura, na incisão cirúrgica.

132. Após o que o Autor continuou a frequentar a consulta das Especialidades de Ortopedia e de Cirurgia Plástica, no Hospital de ..., da cidade ....

133. Pelo menos, uma vez por mês.

134. Até ao dia 25 de Maio de 2021.

135. Durante o referido período de tempo de internamento de cinco dias, no Hospital de ..., da cidade ..., o Autor manteve-se permanentemente retido no leito.

136. Com o membro superior esquerdo imobilizado, com um artefacto ortopédico e pendurado ao peito.

137. No mês de Junho de 2019, o Autor passou a frequentar Tratamento de Medicina Física e Reabilitação (MFR) – Fisioterapia.

138. Por conta e a expensas da Companhia de Seguros “ALLIANZ PORTUGAL COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.” - acidente de trabalho.

139. Até ao mês de Março de 2021.

140. Em sessões diárias, de segunda-feira a sexta-feira, desde o dia 31 de Maio de 2019, até ao dia 9 de Março de 2021.

141. Num total de (276,00 + 20,00) duzentas e noventa e seis (296,00) sessões.

142. Na “H..........”, com sede em ....

143. Consubstanciadas em:

a) massagens;

b) choques elétricos;

c) movimentação do membro superior esquerdo;

d) movimentos do cotovelo esquerdo;

e) ginásio – máquinas;

f) movimento da mão esquerda – abrir e fechar a mão.

144. O médico da seguradora não prescreveu a fisioterapia.

145. O A. toma antidepressivos.

146. No Hospital de ..., da cidade do ...– Serviços Clínicos da Companhia de Seguros “ALLIANZ PORTUGAL, S.A.”, ao abrigo do contrato de seguro de acidentes de trabalho, o Autor frequentou a consulta da Especialidade de Psiquiatria, da Dra. FF.

147. O A. sofreu um enorme susto.

148. O A. sofreu a privação da sua liberdade pessoal, inerente aos períodos de acamamento, na sua casa de habitação e aos períodos de acamamento, nos hospitais – Hospital de ..., de ... – Hospital de ..., da cidade ..., neste caso, aquando da intervenção cirúrgica a que foi submetido.

149. Como queixas, o A. apresenta:

A nível funcional:

- Manipulação e Preensão: impossibilidade de manusear e posicionar MSE;

- Outras queixas a nível funcional: acentuada limitação funcional do membro superior esquerdo;

- refere perda de sensibilidade na face externa de todo o membro superior esquerdo;

A nível situacional:

- Atos da vida diária:

Refere dificuldade para vestir algumas peças de vestuário e tomar banho.

Refere que apenas consegue conduzir carro automático em trajetos curtos mas evita.

Medicado com cymbalta (após o acidente); Pantoc, broncodilatador e cpap, desde antes do acidente. Nega toma de analgésicos.

- Vida afetiva, social e familiar: Não pratica qualquer desporto por falta de iniciativa.

- Vida profissional ou de formação: não consegue pegar em pesos e elevá-los com a mão esquerda, tendo dificuldades na atividade de ....

150. Como sequelas das lesões sofridas, o A. apresenta:

- Membro superior esquerdo: presença de cicatriz em forma de V de 9x9 cm na região supraclavicular esquerda e compatível com os antecedentes cirúrgicos. Atrofia muscular deltoide e músculos da região proximal do braço e cintura escapular.

Ausência de mobilidade ativa do ombro, abdução e supinação do braço e flexão do cotovelo.

Extensão do cotovelo e força da mão, dedos e punho preservadas.

Portanto, sequelas de lesão do plexo branquial.

Calosidades presentes na palma da mão simétricas com o lado contralateral.

151. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 25/05/2021.

152. O período de repercussão temporária na atividade profissional parcial é fixável em 659 dias e o período de défice funcional temporário total é fixável em 9 dias.

153. O quantum doloris é fixável no grau 5/7.

154. O défice funcional permanente da integridade físico-psíquica do A. é de 25 pontos.

155. As sequelas descritas são, em termos de repercussão permanente na atividade profissional, compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares.

156. Dada a profissão do A., sócio gerente/..., é de admitir que consiga desempenhar as suas funções de sócio gerente com esforços suplementares na medida do défice atribuído mas, se formos a considerar unicamente a profissão de ..., admite-se a IPATH.

157. O dano estético permanente do A. é fixável no grau 3/7.

158. O A., à data do acidente de viação, tinha quarenta e dois anos.

159. As sequelas decorrentes do acidente de viação causam ao A. um profundo desgosto.

160. O Autor era, à data da deflagração do acidente de trânsito que deu origem à presente ação, como é, na presente data, sócio-gerente da sociedade comercial “G..., Lda”, com sede no lugar de ..., ..., ....

161. Cujo objeto social é a extração, fabrico, comércio, importação e exportação de artigos de granito, designadamente soleiras e pavimentos.

162. Além das funções de sócio-gerente da referida sociedade comercial, o Autor desempenhava, na prática, a profissão de ... manual.

163. Por conta da referida sociedade comercial “G..., Lda

164. À data do acidente, o autor auferia um vencimento ilíquido de 1.200,00 euros, que corresponde ao valor líquido de 926,00 euros, auferindo ainda subsídio de alimentação por dia útil no valor unitário de 4,71 euros1.

165. Durante o período em que esteve incapacitado para o trabalho, a sua entidade patronal nada lhe pagou.

166. Mas, durante o referido período de tempo, o Autor recebeu da Companhia de Seguros “ALLIANZ PORTUGAL COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.”, através de acidente de trabalho, a quantia de 24.671,23 €.

167. Sofreu, assim, o Autor, a título de incapacidade temporária um prejuízo de (29.635, 12 € - 24.671,23 €) 4.963,89 €.

168. Antes do acidente em discussão, o A. era forte, ágil, dinâmico e robusto e desempenhava facilmente todas as tarefas inerentes à profissão de ... manual, por conta da “G..., Lda.”, com sede no lugar de ..., freguesia de ..., concelho de ....

169. Sopesava, manuseava, transportava e carregava todas as ferramentas indispensáveis ao exercício daquela sua profissão de ..., tais como:

a) picos para trabalhar a pedra;

b) rebarbadeiras elétricas;

c) jatos de areia;

d) bujardas – máquinas de picar a pedra;

e) ferramentas ligeiras, com 5 a 8 quilogramas cada uma.

170. Conduzia e manobrava Empilhadores/Monta Cargas, Retroescavadoras, Tratores e pás carregadoras.

171. Antes do acidente, o A. adubava e tratava do jardim e da relva, num espaço à volta da sua casa de habitação.

172. Desde que sofreu o acidente, o A. já não consegue cortar a relva.

173. O A. já não consegue manusear as máquinas e ferramentas que manuseava antes do acidente necessárias ao trabalho de pedreiro.

174. Os Serviços Clínicos da Companhia de Seguros “ALLIANZ PORTUGAL, S.A.”, no âmbito de acidentes de trabalho, em 26 de Maio de 2021, deram alta, ao Autor, com Incapacidade para a Profissão Habitual – IPH.

175. Para propor a presente ação, o Autor efetuou as seguintes despesas:

. obtenção do Relatório junto aos autos 610,00 €;

. deslocações diversas de táxi 1.225,00 €;

. 2 certidões da Conservatória do Registo Automóvel 34,00 €;

. 1 certidão de nascimento/Conservatória do Registo Civil 20,00 €.

176. Antes do acidente de viação em causa nos autos, o A. já conduzia um veículo automático.

177. Estava transferida para a Ré, Companhia de Seguros “ALLIANZ PORTUGAL, S.A.”, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo motociclo de matrícula ..-CZ-.., através de contrato de seguro, válido e eficaz, titulado pela apólice nº .......33, em vigor à data da ocorrência dos factos que estão na origem da presente ação.

178. No âmbito do processo de acidente de trabalho, o autor está a receber uma pensão anual e vitalícia de 10.409,00 euros, tendo já recebido, a esse título, com referência a 22/05/2023, a quantia de 20.894,01 euros, e recebeu da ré, a título de subsídio devido pela lei de acidentes de trabalho, a quantia de 4.664,94 euros2.

179 – A partir do mês de agosto de 2019 o autor sentiu crises de ansiedade recorrentes e um estado depressivo, na sequência das lesões e sequelas resultantes do acidente em causa nos autos3.

180 – Por isso, consultou a médica psiquiatra Drª GG, tendo com esta e com a médica psiquiatra indicada pela companhia de seguros no âmbito do seguro de acidentes de trabalho, mantido pelo menos três consultas4.

181 – Como consequência do acidente, ficaram danificados e inutilizados:

- o capacete de proteção que o autor trazia, de valor não apurado;

- a roupa que o autor vestia e que incluía calças, t´shirt, camisa e blusão, de valor não apurado5.

E são seguintes os factos considerados não provados no Acórdão recorrido:

I. O Autor viu-se na necessidade de recorrer à presença, ajuda e auxílio de uma terceira pessoa – sua esposa -, ao longo de um período de um ano, desde o dia 26 de Maio de 2019, até ao dia 25 de Maio de 2020.

II. O Autor andou com o membro superior esquerdo, imobilizado e pendurado ao peito, ao longo de um período de tempo de um mês.

III. Regressado à sua casa de habitação, o Autor permaneceu retido no leito ao longo de um período de tempo de um mês.

IV. Apenas retirava o artefacto ortopédico para tomar banho.

V. O Autor viu-se na necessidade de suportar esse artefacto ortopédico, desde o mês de Novembro de 2019 até ao mês de Maio de 2020.

VI. Após o mês de Maio de 2020, o Autor passou a ter necessidade de apoiar a mão esquerda no bolso das calças.

VII. Até ao mês de Setembro de 2020.

VIII. Ao mesmo tempo que frequentava a “H..........”, em ..., o Autor repetia os exercícios de movimentação do membro superior esquerdo e os movimentos de abertura e fecho da mão esquerda, com bola, na sua casa de habitação, com o auxílio da sua esposa e da sua filha.

IX. 6

X. 7

XI. O A. receou pela própria vida.

XII. O Autor ficou a carecer de dependências (despesas) futuras, ao longo de toda a sua vida, nomeadamente:

a) necessidade de ingestão e toma de medicamentos analgésicos, anti-inflamatórios, ansiolíticos e antidepressivos;

b) necessidade de Tratamentos de Medicina Física e Reabilitação (MFR) – Fisioterapia, nas regiões do membro superior esquerdo e do ombro esquerdo, além de outras, que, no futuro, vão passar a ser afetadas pela insuficiência do ombro e membro superior esquerdo;

c) necessidade de veículo automóvel com caixa de velocidades automática e comandos manuais adaptados à sua insuficiência funcional do membro superior esquerdo;

d) necessidade da presença, da ajuda e do auxílio de terceira pessoa – ajuda humana, para a ajuda e execução de determinadas tarefas do seu dia-a-dia, tais como, vestir-se, despir-se, preparar e tomar os alimentos/levar os alimentos à boca – carne, peixe, legumes, além de outros, no mínimo, ao longo de uma hora por dia.

XIII. O A. ficou absoluta, total e irreversivelmente incapaz para o exercício de qualquer profissão.

XIV. O Autor viu danificadas e inutilizadas as seguintes peças de vestuário e calçado, que trajava na altura da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente ação:

. 1 par de botas de 150,00 €8.

XV. E viu, ainda, danificados e inutilizados os seguintes objetos de uso pessoal, que usava, na altura do acidente:

. 1 relógio de pulso de 250,00 €;

. 1 Telemóvel de 600,00 €9.

XVI. O Autor não se encontra, ainda, completamente curado, nem clinicamente estabilizado.

XVII. No futuro, em consequência do acidente de trânsito que deu origem aos presentes autos, das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes, o Autor vai necessitar de obter consultas médicas da Especialidade de Medicina, Ortopedia, Fisiatria, Psiquiatria e de Cirurgia, além de outras, ao longo de toda a sua vida.

XVIII. Vai ter necessidade de obter análises clínicas, de efetuar exames radiológicos, TACs, ECOS, RMNs, EMGs e outros exames complementares e meios de diagnóstico, ao longo de toda a sua vida.

XIX. Vai necessitar de se submeter a uma ou mais intervenções cirúrgicas, ao Plexo Braquial Esquerdo, ao longo de toda a sua vida.

XX. Vai necessitar de se sujeitar a um ou mais períodos de internamento hospitalar.

XXI. Vai necessitar de tomar medicamentos vários.

XXII. Vai sofrer os períodos de internamento hospitalar, inerentes a essas intervenções cirúrgicas.

XXIII. Vai sofrer os riscos e os perigos, que sempre acompanham essas operações.

XXIV. Vai sofrer os incómodos e a privação da sua liberdade pessoal, correspondentes aos períodos de internamento hospitalar.

XXV. Vai sofrer um ou mais períodos de doença, com Incapacidade Temporária Absoluta, para o trabalho – Períodos de Repercussão da Atividade Profissional Total.

XXVI. E, a final, vai ver a Incapacidade Parcial Permanente para o trabalho – Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica - de que se encontra afetado, ainda mais agravada.

XXVII. O A. necessita já e vai continuar a necessitar da presença, da ajuda e do auxílio de uma terceira pessoa, durante uma hora por dia, ao longo de toda a sua vida.

XXVIII. Para o vestir, despir, fazer a higiene pessoal e auxiliar na preparação e toma dos alimentos.

XXIX. O Autor, também, em consequência do acidente de trânsito que deu origem à presente ação, das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes, deixou de poder conduzir um veículo automóvel de comandos manuais convencionais.

XXX. Necessita, assim, de um veículo automóvel equipado com caixa de velocidades automática.

XXXI. O Autor vai ter necessidade de adquirir, por compra, um veículo automóvel ligeiro de passageiros equipado com caixa de velocidades automática e com os comandos manuais, nomeadamente à sua esquerda adaptados à sua condição de deficiente físico e motor.

XXXII. E vai ter necessidade de substituir, por compra, esse veículo automóvel, de cinco em cinco anos, periodicamente, até ao fim da sua vida.

XXXIII. O A. apresenta um défice funcional permanente da integridade físico psíquica de 45 pontos.

O DIREITO

Breve nota sobre a admissibilidade do recurso

Verifica-se que a questão central que é suscitada no presente recurso (a admissibilidade do cúmulo da indemnização arbitrada neste processo com a indemnização laboral) obteve resposta convergente em ambas as instâncias (afirmativa).

Dispõe-se no artigo 671.º, n.º 3, do CPC:

Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte”.

Sucede que não é possível dizer que o Acórdão recorrido tenha confirmado a sentença sem fundamentação essencialmente diferente desta.

De facto, no Acórdão recorrido, a decisão alicerçou-se, fundamentalmente, na recusa de que “a quantia aqui fixada a título de dano biológico – de 130.000,00 euros, mas cujo valor está ainda em discussão, considerando os recursos apresentados por ambas as partes – assuma a mesma natureza que a quantia paga a título de pensão anual e vitalícia no âmbito do processo de acidente de trabalho” e não, como na sentença, em que “cada um dos tribunais – o cível e o laboral – fixará as indemnizações segundo os critérios legais aplicáveis, mas com inteira independência do que tenha decidido ou venha a decidir o outro tribunal, podendo, pois, ser pedidas as duas indemnizações (ao Tribunal do Trabalho uma, outra ao Tribunal comum), para depois ser feita a opção pela mais conveniente”.

Assim, sem necessidade de averiguar outros factos relevantes para afastar a dupla conforme (designadamente a alteração da decisão sobre a matéria de facto), o recurso de revista normal é admitido.

Da alegada nulidade do Acórdão recorrido

Alega a ré / ora recorrente que “[o] Tribunal a quo ao ter decidido pela possibilidade de cumulação da pensão na vertente de acidente de trabalho com a indemnização fixada a título de dano biológico na sua vertente patrimonial, violou o princípio de reformatio in pejus o que equivale a dizer que tomou conhecimento de questão que não podia conhecer, o que é motivo gerador da sua nulidade nos termos previstos no art. 615º, nº 1, al, d), 2ª parte do CPC, o que se invoca para todos os efeitos legais” (cfr. conclusão 1).

O Tribunal apreciou a questão referida sob a seguinte formulação:

saber se (…) - o facto de o acidente os autos ser também acidente de trabalho tem relevância para o montante indemnizatório a fixar nos presentes autos” ou, como resulta adiante do Acórdão, “saber se tem ou não relevância para estes autos o facto de este acidente ter sido também um acidente de trabalho no âmbito do qual o autor está a receber uma pensão anual e vitalícia”.

A nulidade invocada tem como causa o vício commumente conhecido como “excesso de pronúncia”, que consiste em o Tribunal apreciar questões de que não pode tomar conhecimento, porque não são suscitadas pelas partes nem de conhecimento oficioso.

Ora, olhando para os recursos de apelação, verifica-se que uma das questões suscitadas – aliás, a questão central (de direito) suscitada no recurso de apelação da ré / recorrente – era a de saber se, ao fixar-se, nestes autos, a indemnização, não devia proceder-se à dedução dos montantes que o autor estava a receber a título de indemnização laboral ou, pelo menos, não devia ser este interpelado para esclarecer que indemnização pretendia receber (cfr., em especial, conclusões 6 a 18 das alegações de apelação).

Face a isto, manifesto é que não há nulidade por excesso de pronúncia. Perante esta alegação da ré / então apelante, a apreciação da questão da admissibilidade do cúmulo das indemnizações ou, como a enunciou o Tribunal recorrido, a questão de “saber se (…) - o facto de o acidente os autos ser também acidente de trabalho tem relevância para o montante indemnizatório a fixar nos presentes autos” ou de “saber se tem ou não relevância para estes autos o facto de este acidente ter sido também um acidente de trabalho no âmbito do qual o autor está a receber uma pensão anual e vitalícia” é a uma questão que ele não só tinha o poder como tinha o dever de apreciar.

Relativamente à sugestão de que a resposta do Tribunal recorrido à questão consubstancia a violação da proibição reformatio in pejus, não relevando, em rigor, para a questão da nulidade, sempre se diga que tal violação não se verifica, porquanto não se chegou a “consolidar” na sentença uma genuína decisão sobre a dedução dos montantes – uma decisão que o Tribunal recorrido pudesse desrespeitar, ao decidir, por sua vez, que não havia lugar à dedução.

É verdade que o Tribunal de 1.ª instância discorreu, em geral, na sua fundamentação, sobre a impossibilidade de cúmulo de indemnizações sempre que estas coincidem na função de compensar o mesmo dano, mas tudo o que decidiu ou declarou com efeitos para o caso concreto foi somente que nada impedia que ambas as indemnizações fossem pedidas (ao Tribunal do Trabalho uma, outra ao Tribunal comum). Ou seja: enunciou, no fundo, o princípio geral que decorre da Lei n.º 98/2009, de 4.09, de que “[q]uando o acidente for causado por outro trabalhador ou por terceiro, o direito à reparação devida pelo empregador não prejudica o direito de acção contra aqueles, nos termos gerais”.

Da admissibilidade do cúmulo das indemnizações

Como resulta da exposição anterior, o caso dos autos reconduz-se à categoria de casos em que verifica simultaneamente um acidente de viação e um acidente de trabalho, tendo Tribunal de 1.ª instância esclarecido, sem dúvida, um ponto importante no que toca à coordenação da indemnização por acidente de viação com a indemnização por acidente laboral, ao dizer:

O A. está a receber uma pensão na vertente de acidente de trabalho. Ora, as indemnizações consequentes ao acidente de viação e ao sinistro laboral – assentes em critérios distintos e cada uma delas com a sua funcionalidade própria – não são cumuláveis, mas antes complementares até ao ressarcimento total do prejuízo causado, assumindo a responsabilidade laboral carácter subsidiário. Apesar de não ser permitida a cumulação de indemnizações, quando deva haver lugar à fixação de indemnizações na dupla vertente do acidente, cada um dos tribunais – o cível e o laboral – fixará as indemnizações segundo os critérios legais aplicáveis, mas com inteira independência do que tenha decidido ou venha a decidir o outro tribunal, podendo, pois, ser pedidas as duas indemnizações (ao Tribunal do Trabalho uma, outra ao Tribunal comum), para depois ser feita a opção pela mais conveniente”.

Esclareceu, assim, o Tribunal de 1.ª instância que os regimes da indemnização por acidente de viação, calculada nos termos gerais, e da indemnização por acidente de trabalho, calculada com base em regras específicas, são complementares entre si e preordenadas ao ressarcimento integral dos danos.

O mesmo se disse, por outras palavras, no sumário do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 2.03.2023 (Proc. 3621/19.4T8AVR.P1.S1):

Entre o regime de indemnização a título de acidente de viação e o regime de indemnização a título de acidente de trabalho existe uma relação de complementaridade, significando, pela negativa, que os dois regimes não devem cumular-se e, pela positiva, que os dois regimes devem completar-se, o que, mais uma vez, é coerente com o (e é mesmo instrumental ao) propósito do ressarcimento completo do lesado”.

Neste contexto, e como também explicou o Tribunal de 1.ª instância, o lesado tem a possibilidade de optar pela indemnização que lhe for mais favorável.

Mas, se o lesado tem a possibilidade de optar pela indemnização que lhe for mais favorável, a verdade é que não pode receber duas indemnizações pelo mesmo dano.

Ora, foi este o ponto (distinto) a que o Tribunal a quo deu relevância para decidir o caso, concluindo-se no Acórdão recorrido:

(…) quando exista duplicação de indemnizações, e não podendo estas ser cumuladas, não havendo nota que foi proposta qualquer ação pela companhia de seguros do acidente de trabalho contra a ré, nem tendo aquela tido qualquer intervenção nos autos, pagando o responsável civil a indemnização ao autor, cabe àquele responsável laboral apenas direito de ação precisamente contra o lesado (e não já contra o responsável civil), razão pela qual não existe a situação indicada de se ver o responsável civil colocado na posição de indemnizar duas vezes o mesmo dano.

Não cremos, porém, que, nestes autos, a quantia aqui fixada a título de dano biológico – de 130.000,00 euros, mas cujo valor está ainda em discussão, considerando os recursos apresentados por ambas as partes – assuma a mesma natureza que a quantia paga a título de pensão anual e vitalícia no âmbito do processo de acidente de trabalho.

(…) torna-se claro que não existe fundamento para considerar na fixação da indemnização pelo dano biológico as quantias que foram pagas no âmbito do processo de acidente de trabalho (…).

Improcede assim a argumentação da ré recorrente tendo em vista a dedução ou a consideração dos valores pagos ou a pagar ao autor, a título de pensão anual e vitalícia, no âmbito do processo de acidente de trabalho”.

Para verificar do acerto deste raciocínio é preciso saber quais são, em concreto, os danos visados em cada uma das indemnizações.

No que respeita à indemnização discutida nos presentes autos, retira-se do que afirma o Tribunal recorrido (na sequência, aliás, do Tribunal de 1.ª instância) que ela é dirigida a compensar o “dano biológico”. Mas o que é o dano biológico?

Retomando o que se disse, por exemplo, no Acórdão deste Supremo Tribunal de 14.03.2024 (Proc. 1008/19.8T8PTM.E1.S1), a categoria do “dano biológico” (também chamado “dano da saúde”10, “dano corporal”11) e a categoria, mais abrangente ainda, do “dano existencial”12 vêm sendo usadas tanto pela doutrina e como pela jurisprudência com a intenção de superar a dificuldade na identificação dos danos susceptíveis de resultar da ofensa de direitos de personalidade e na distinção entre os vários tipos. Tendo em conta a unidade da pessoa, importando, em qualquer caso, manifestar a percepção crescente dos “multifacetados níveis de protecção que a personalidade humana reclama13, trata-se de um conceito tentativamente englobalizador ou (re)unificador.

Segundo os adeptos destas categorias, pondo em causa a rigidez da distinção entre danos patrimoniais e não patrimoniais14, a categoria do “dano biológico” permitiria a ampliação do número e do tipo de consequências que o julgador deve ter em consideração no momento de calcular o montante da indemnização e propiciaria as condições para o cálculo de uma indemnização mais justa, uma vez que permitiria compreender que o facto lesivo origina um conjunto de consequências que não são absolutamente autónomas ou dissociáveis e em que se incluem as consequências conhecidas como de natureza não patrimonial bem como de natureza patrimonial futura, não se esgotando, contudo, nestas.

Embora tenha tido origem no Direito italiano15, esta nova orientação foi bem recebida em Portugal, sendo aplicada, em particular, quando estão em causa danos decorrentes de acidentes de viação. De acordo com a jurisprudência aderente, na avaliação destes danos, o julgador deve ponderar factores variados, quais sejam as restrições que o lesado tem de suportar na qualidade da sua vida em virtude das lesões biológicas, a criação ou indução de dependências que afectam o exercício da sua liberdade pessoal, os prejuízos nas suas aptidões familiares ou afectivas, as necessidades especiais dos lesados que sejam pessoas débeis, como os idosos ou as crianças, e quaisquer outros que possam assumir relevância consoante as circunstâncias do caso concreto.

Sucede que, não obstante as boas intenções dos adeptos da sua utilização, o termo “dano biológico” não é sempre uniformemente utilizado e / ou devidamente compreendido, podendo causar mal-entendidos. Sobretudo quando o termo é empregue em simultâneo com a (e não em alternativa à) terminologia clássica, assente na distinção entre “danos patrimoniais” e “danos não patrimoniais”, pode haver a impressão de que certos danos não foram contabilizados ou, ao invés, de que existiu uma dupla contabilização.

Feita este enquadramento, e voltando ao caso dos autos, veja-se, então, quais são os danos objecto de ressarcimento através de cada uma das indemnizações.

Segundo o Tribunal de 1.ª instância, que foi quem fixou, ab initio, o valor de €130.000 à indemnização, o dano traduzia-se “numa incapacidade funcional ou fisiológica de 25 pontos, a repercussão negativa centra-se na diminuição da condição física e numa penosidade, dispêndio e desgaste físico acrescido na execução de tarefas antes desempenhadas, sem o mesmo esforço, no seu dia-a-dia”, sendo que aquela indemnização se destinava “a compensar danos futuros deve[ndo] corresponder a um capital produtor de rendimentos que proporcione o que, teórica ou efetivamente, deixou de se auferir e se extinga no fim presumível da vida do lesado, determinado com base na esperança de vida.

Para o cálculo desta indemnização, o Tribunal de 1.ª instância atendeu a vários factores, discriminados, fundamentalmente, assim:

“Estando em causa um dano biológico, traduzido numa incapacidade funcional ou fisiológica de 25 pontos, a repercussão negativa centra-se na diminuição da condição física e numa penosidade, dispêndio e desgaste físico acrescido na execução de tarefas antes desempenhadas, sem o mesmo esforço, no seu dia-a-dia. Ora, esta realidade incontornável deve ser vertida na determinação da indemnização a atribuir e deve sê-lo partindo dos cálculos objetiváveis a partir das usuais fórmulas e tabelas financeiras (…).

Em termos sintéticos, sendo abundante a jurisprudência concomitante, seguiremos o entendimento de que o “quantum” indemnizatório destinado a compensar danos futuros deve corresponder a um capital produtor de rendimentos que proporcione o que, teórica ou efetivamente, deixou de se auferir e se extinga no fim presumível da vida do lesado, determinado com base na esperança de vida – cfr., neste sentido, entre muitos outros, Ac. da RP, de 24 de janeiro de 2018, processo n.º 1173/14.0T2AVR.P1, disponível em dgsi.pt.

Temos, assim, como elementos a atender os seguintes:

A idade do Autor à data do sinistro - 42 anos; o tempo previsível de vida ativa que tem pela frente (desde aquela data) e a esperança média de vida para o sexo masculino (77 anos); rendimento mensal, no momento do acidente (auferia 1.200€ ilíquidos); o défice de que ficou afetado – 25 pontos; a inexistência de culpa, ainda que concorrencial, da sua parte na produção do acidente e o fator da tabela financeira adequado ao tempo de vida ativa do demandante”.

Por sua vez, para a indemnização laboral releva o facto provado 178, de acordo com o qual no âmbito do processo de acidente de trabalho, o autor está a receber uma pensão anual e vitalícia de 10.409,00 euros, tendo já recebido, a esse título, com referência a 22.05.2023, a quantia de 20.894,01 euros, e recebeu da ré, a título de subsídio devido pela lei de acidentes de trabalho, a quantia de 4.664,94 euros.

Isoladamente, isto não permite identificar o dano que é objecto da pensão anual e vitalícia arbitrada no processo laboral. Sabe-se, no entanto, que esta indemnização foi arbitrada com fundamento nas normas especiais do Direito do trabalho, designadamente as normas correspondentes às do artigo 23.º, al, b), e dos artigos 47.º e s, da Lei n.º 98/2009, de 4.09, que regulam o direito à reparação por prestações em dinheiro. Destaca-se, entre elas, a do artigo 48.º, n.º 2, onde se dispõe:

A indemnização em capital e a pensão por incapacidade permanente e o subsídio de elevada incapacidade permanente são prestações destinadas a compensar o sinistrado pela perda ou redução permanente da sua capacidade de trabalho ou de ganho resultante de acidente de trabalho”.

Resulta daqui que o dano que está na origem da indemnização laboral é necessariamente calculado com base no grau de perda / redução da capacidade do lesado para o trabalho e não tem em conta o dano pela incapacidade funcional permanente, com os contornos que estão em causa no presente processo.

Para explicar a distinta natureza destes danos, o Tribunal recorrido invocou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.03.2022 (Proc. 119/19.4T8STR.E1.S1). Neste processo estava em causa um pedido de indemnização por incapacidade permanente parcial e perda da capacidade de ganho e a ré seguradora sustentou também a possibilidade de serem deduzidos os montantes da pensão arbitrada no processo laboral. Decidiu-se que, visando esta última indemnizar o dano da desvalorização para o trabalho / incapacidade laboral sofrido pelo lesado e da consequente da perda de rendimentos salariais, o seu objecto não coincidia com o da indemnização discutida no processo cível e dirigida a ressarcir a incapacidade permanente parcial, que se traduzia tanto na redução da capacidade de ganho como em todas as limitações funcionais com que o lesado se poderia vir a deparar na sua vida activa, implicando esforço adicional ou acrescido no exercício de tarefas profissionais e pessoais ou de lazer.

Mas encontram-se na jurisprudência deste Supremo Tribunal muitos outros arestos em que se distingue de forma muito clara o dano indemnizável no processo laboral e o dano resultante da incapacidade funcional permanente, denominado “dano biológico”.

Diz-se, por exemplo, no Acórdão de 11.12.2012 (Proc. 40/08.1TBMMV.C1.S1):

São de considerar como danos diferentes o que decorre da perda de rendimentos salariais, associado ao grau de incapacidade laboral fixado no processo de acidente de trabalho e compensado pela atribuição de certo capital de remição, e o dano biológico decorrente das sequelas incapacitantes do lesado que – embora não determinem perda de rendimento laboral - envolvem restrições acentuadas à capacidade do sinistrado, implicando esforços acrescidos, quer para a realização das tarefas profissionais, quer para as actividades da vida pessoal e corrente”.

Diz-se ainda, mais recentemente, no Acórdão de 17.11.2021 (Proc. 3496/16.5T8FAR.E1.S1).

as duas indemnizações visam compensar danos distintos: a pensão vitalícia fixada no processo por acidente de trabalho corresponde á redução na capacidade de ganho do sinistrado, por incapacidade parcial permanente, como resulta do art. 10º, alínea b) da Lei nº 100/97 de 13.09, que aprovou o regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais; a indemnização pelo dano biológico visa ressarcir, além da redução da capacidade de ganho, ainda as limitações funcionais do lesado, um dano que vai para além do tempo de vida activa, e o esforço acrescido no exercício das actividades profissionais e pessoais”.

Tudo ponderado, não pode deixar de se dar razão ao Tribunal recorrido quando admitiu o cúmulo da indemnização pela incapacidade funcional permanente do lesado com a indemnização pela desvalorização da sua capacidade para o trabalho com a justificação de que isso não consubstanciava uma duplicação mas sim o ressarcimento de danos diferentes.


*


III. DECISÃO

Pelo exposto, nega-se provimento à revista e confirma-se o Acórdão recorrido.


*


Custas pela recorrente.

*


Lisboa, 31 de Outubro de 2024

Catarina Serra (relatora)

Orlando Nascimento

Fernando Baptista

______


1. Alterado pelo Tribunal da Relação.

2. Alterado pelo Tribunal da Relação.

3. Aditado pelo Tribunal da Relação.

4. Aditado pelo Tribunal da Relação.

5. Aditado pelo Tribunal da Relação.

6. Eliminado pelo Tribunal da Relação.

7. Eliminado pelo Tribunal da Relação.

8. Alterado pelo Tribunal da Relação.

9. Alterado pelo Tribunal da Relação.

10. Cfr. Maria da Graça Trigo, “Adopção do conceito de 'dano biológico' pelo Direito português”, in: Revista da Ordem dos Advogados, 2012, vol. I, pp. 147 e s. (disponível em https://portal.oa.pt/upl/%7B5b5e9c22-e6ac-4484-a018-4b6d10200921%7D.pdf), e Responsabilidade civil – Temas especiais, Lisboa, Universidade Católica Portuguesa Editora, 2015, pp. 69 e s.

11. Cfr. Maria Manuel Veloso, “Danos não patrimoniais”, in: Comemorações dos 35 anos do código civil e dos 25 anos da reforma de 1977, Volume III – Direito das Obrigações, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, pp. 512 e s.

12. Cfr. Manuel A. Carneiro da Frada, “Nos 40 anos do Código Civil Português – Tutela da Personalidade e Dano Existencial”, in: Forjar o Direito, Coimbra, Almedina, 2015, pp. 289 e s. Segundo o autor (p. 298), o conceito de “dano existencial” permite compreender “o impacto da lesão que a pessoa sofreu na sua integridade física na sua realidade mais global”, transcendendo-se, pois, o “nível meramente biológico, o nível daquilo que é passível de uma averiguação ou testificação médica, para nos situarmos no plano dinâmico da vida da pessoa e das suas condições concretas (atingida que foi por uma lesão da saúde)” (sublinhado do autor).

13. Cfr. Manuel A. Carneiro da Frada, “Nos 40 anos do Código Civil Português – Tutela da Personalidade e Dano Existencial”, cit., p. 292.

14. A distinção entre danos patrimoniais e danos não patrimoniais assenta na susceptibilidade da sua avaliação pecuniária. Os segundos são definidos pela negativa, podendo apenas ser objecto de compensação e não, como os primeiros, de uma indemnização por equivalente.

15. Cfr., entre outros, Maria da Graça Trigo, Responsabilidade civil – Temas especiais, cit., pp. 78 e s. Adverte a autora que a jurisprudência italiana retomou, no entanto, a partir de 2003, a dicotomia “dano patrimonial / dano não patrimonial”, entendendo que o primeiro era suficientemente amplo para compreender os danos não patrimoniais, como o dano biológico e o dano existencial.