Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
12465/20.0T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: AFONSO HENRIQUE
Descritores: INDEMNIZAÇÃO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
MANDATO
REVOGAÇÃO
TREINADOR
ÓNUS DA PROVA
REPARAÇÃO DO DANO
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DUPLA CONFORME
Data do Acordão: 09/19/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. A e R celebraram um contrato de prestação de serviços a que se aplica o regime do mandato.

II. O R revogou antecipadamente o contrato, ficando obrigado a indemnizar o A, atento à sua natureza onerosa, ser por tempo determinado e inexistir de justa causa.

III. Segundo as regras de ónus da prova competia ao A provar os lucros cessantes decorrentes da referida quebra contratual, por traduzirem elemento constitutivo do direito de indemnização do mesmo A, e ao R fazer prova de eventuais encargos que deixou de ter, por modificativos ou extintivos do aludido direito do A.

IV. Provados os lucros cessantes e o montante que o A passou a usufruir nas funções de treinador de outra equipa, só esse valor pode ser subtraído aos comprovados lucros cessantes para efeitos da indemnização devida ao A.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (2ª SECÇÃO)

I - AA, intentou a presente acção de condenação, em processo declarativo comum, contra o Sporting Clube de Portugal, pedindo a condenação do R. a pagar-lhe os créditos a que este tem direito, no valor vencido e não pago, de €38.000,00, que compreende a indemnização em valor correspondente às prestações periódicas em dívida durante a vigência do contrato; acrescido de juros moratórios legais, a contar da data da citação, acrescida de sobretaxa de 5%, a título de sanção pecuniária compulsória, a partir do trânsito em julgado de sentença, em ambos os casos até integral cumprimento; a pagar a quantia de €8.740,00 relativa ao IVA e que o R. se obrigou a liquidar.

Para tanto, alegou, em síntese, que:

Celebrou com o R. um contrato de prestação de serviços, para exercer funções como treinador da equipa de ... do Sporting, para vigorar entre 01/09/2016 e 30/06/2018, tendo o R. resolvido esse contrato, unilateralmente e sem causa justificativa, com efeitos a partir de 30/06/2017, impedindo o A. de continuar a prestar serviços e deixando de pagar as quantias referentes a setembro de 2017 a junho de 2018.

Citado, o R. contestou, impugnando a acção e alegando a livre revogação do contrato celebrado, bem como a existência de fundamento para a revogação.

Findos os articulados, realizou-se audiência prévia, tendo sido proferido despacho a identificar o objecto do litígio e a selecionar os temas da prova.

Realizada a Audiência de Discussão e Julgamento foi proferida sentença julgando a acção parcialmente procedente e condenando o R. a pagar ao A., a título de indemnização, a quantia de €12.000,00 acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, devidos desde o trânsito em julgado da presente decisão.

II - Dessa sentença vieram o A. e o R. recorrer – apelações - tendo a Relação proferido o seguinte acórdão – parte decisória:

“-…-

Pelo exposto, acorda-se em julgar as apelações apresentadas nos seguintes termos:

a) Julgamos procedente, por provada, a apelação apresentada pelo A. e, em consequência, alteramos a sentença recorrida, na sua parte dispositiva, que é substituída pela decisão de condenar o R., Sporting Clube de Portugal, a pagar ao A. a quantia de €31.000,00, a título de indemnização pela revogação unilateral e sem justa causa do contrato de prestação de serviços dos autos; acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% (cfr. n.º 1 do Art. 559.º do C.C. e Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril), a contar da citação do R. e até integral pagamento; e ainda de juros compulsórios à taxa de 5%, contados do trânsito em julgado da decisão condenatória (cfr. Art. 829.º-A n.º 4 do C.C.).

b) Julgamos improcedente, por não provada, a apelação apresentada pelo R., sem prejuízo da alteração produzida na matéria de facto provada decidida no ponto 1.1 e 1.6 do presente acórdão.

- As custas da ação são por A. e R. na proporção do respetivo decaimento (cfr. Art. 527.º n.º 1 do C.P.C.), o qual é fixado em €15.740,00 do valor da ação, a cargo do A., e €31.000,00 do valor da ação, a cargo do R..

- As custas de ambos os recursos de apelação são a cargo do, simultaneamente, Recorrente, Recorrido e R., Sporting Clube de Portugal (cfr. Art. 527.º n.º 1 e n.º 2 do C.P.C.).

-…-”

III - Desse acórdão veio o R., SPORTING CLUBE DE PORTUGAL, recorrer/revista para este STJ, formulando as seguintes conclusões:

1 – Entende o R. que o Tribunal violou o disposto no art. 342º, nº 1 CC, ao entender que o ónus da prova cabia aoR., no sentido de demonstrar uma efectiva redução do prejuízo do A., ao ter recebido uma quantia superior ao admitido, como treinador. Na verdade, o Tribunal subverteu as regras sobre o ónus da prova e fez impender sobre o R. uma prova que não lhe cabia, quando era o A. que deveria ter alegado e provado, quer todos os rendimentos que auferiu durante o período contratual, em causa, quer todas as despesas que deixou de suportar, ao invés de peticionar tão só o pagamento das prestações acordadas para a época desportiva em causa.

2 – À cautela e sem conceder ao exposto, verificou-se ainda que o Tribunal violou o disposto no art. 566º, nº2 CC, ao não ter considerado devidamente a teoria da diferença como baliza para o cômputo daindemnização,entrandoemsuposiçõeseconsiderações sobre os rendimentos do A. e as suas prováveis despesas, como se de um contrato de trabalho se tratasse, relevando somente os proveitos e algumas das despesas relacionadas directamente com a actividade de treinador.

3 – Na verdade, e caso o A. tivesse cumprido com o seu ónus, os rendimentos a deduzir deveriamtersidoosfiscalmente comprovados(enãosó a quantia paga pelo ...), bem como todas as despesas em que deixou de incorrer. Caberia depois ao Tribunal atender também à comunicação feita ao A. com uma antecedência de 6 meses face ao início da nova época desportiva, em Setembro de 2017, num contrato com a duração de 10 meses e em que o A. cumpriu tão só cerca de 6 meses, tornando desproporcional e desajustado o pagamento de qualquer indemnização ao A., considerando ainda os 4 meses de honorários pagos ao A. com a cessação do contrato.

4 – Em suma, entende o R. não se verificar a obrigação de indemnizar o A., atendendo à total ausência de alegação e prova da ocorrência de danos e do seu nexo causal, ónus que impendia sobre o A., e que, ao invés, se limitou a peticionar o valor acordado, no contrato, para a última época desportiva, quando lhe era exigível que demonstrasse todos os valores auferidos durante o período contratual em falta, bem como todas as despesas que deixou de suportar.

Nestes termos e nos demais de direito deverá proceder o recurso interposto pelo R.

Contra-alegou o recorrido AA, formulando as seguintes conclusões:

1 - O Recorrente interpôs o presente recurso de revista do Acórdão da Relação de Lisboa que concedeu provimento à Apelação do ora Recorrido e negou provimento à Apelação do ora recorrente.

2 - O Recorrente interpõe recurso “tão só com a obrigação de pagamento de uma indemnização a que o R foi condenado...”.

3 - O Recorrente alega que interpõe o Recurso de Revista, mas nem sequer invoca o artigo 671.º do Código de Processo Civil, ou seja, o artigo que prevê as decisões que comportam o recurso de revista;

4 - O artigo 671, n.º 3 do Código de Processo Civil diz: “Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª Instância”;

5 - No caso em apreço estamos perante um caso de dupla conforme, ou seja, na questão essencial do objecto da acção, o Venerando Tribunal da Relação confirmou a douta decisão do Tribunal da 1ª Instância;

6 – Com efeito, o douto Tribunal de 1.ª Instância decidiu que o ora Recorrente/Sporting revogou o contrato de prestação de serviços sem justa causa, decisão que foi confirmada pelo douto Acórdão objecto do presente recurso;

7 - Na verdade, o douto Tribunal de 1.ª Instância e o Venerando Tribunal da Relação decidiram que o contrato de prestação de serviços foi revogado pelo Recorrente sem justa causa por inexistir justa causa;

8 - A revogação do contrato de prestação de serviços sem justa causa é a questão essencial do processo e, nesta parte, não houve fundamentação essencialmente diferente;

9 - O douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa apenas entendeu decidir alterar o valor de indemnização que condenou o ora recorrente, ou seja, constitui uma decisão secundária porque a questão essencial, repete-se, é a revogação do contrato de serviço sem justa causa e, nessa parte, foi unânime a decisão dos dois Tribunais;

10 - O Recorrente no recurso que interpôs da douta sentença do Tribunal de 1.ª Instância, já o fez com fundamentos na violação do disposto no artigo 342.º, n.º 1 e 566.º, n.º 2 e 3 do Código Civil;

11 - Sobre a violação destas disposições legais já o douto Tribunal da 1.ª Instância e da Relação de Lisboa decidiram no mesmo sentido, entendendo que não há violação do disposto no artigo 342.º, n.º 1 e 566.º, n.º 2 do Código Civil;

12 - Parece óbvio que, nesta parte, já existia dupla conforme, ou seja, já foi decidido no mesmo sentido pelo douto Tribunal de 1ª Instância e pelo Venerando Tribunal da Relação;

13 - O Recorrente, no presente recurso, não colocou em causa, ou seja, não contrariou com um mínimo de rigor, a fundamentação do douto Acórdão da Relação;

14 - O Recorrente limitou-se a alegar umas frases soltas, a invocar Acórdãos até sem nexo de causalidade com o douto Acórdão Recorrido, visando essencialmente protelar o trânsito em julgado da decisão;

15 - O douto Tribunal de 1ª Instância e o Venerando Tribunal da Relação decidiram que o Recorrente revogou o contrato de prestação de serviços sem justa causa, ficando obrigado a indemnizar o Recorrido;

16 - O valor de indemnizar fixado pelos dois Tribunais foi diferente, mas a questão essencial, repete-se, foi decidida por ambos os Tribunais, pelo que, salvo melhor opinião, repete-se, não pode ser apreciado o recurso do Recorrente;

17 - O Recorrente não veio recorrer da questão essencial, mas do valor da indemnização, visando alterar uma decisão, o que lhe está vedado;

18 - O douto Acordão recorrido é claro, objectivo, está excelentemente fundamentado, evidenciando uma notável decisão jurídica, pelo que é inatacável e não merece qualquer reparo;

Assim, o presente recurso não tem suporte legal pelo que deve ser negado provimento.

IV - DA ADMISSÃO DO RECURSO/REVISTA

O R/recorrente suscitou a questão prévia da inadmissibilidade do recurso/revista, por existir dupla conforme, nos termos do artº 671º nº 3 do CPC.

Para tanto alega que “a questão essencial, repete-se, é a revogação do contrato de serviço sem justa causa e, nessa parte, foi unânime a decisão dos dois Tribunais; o recorrente no recurso que interpôs da douta sentença do Tribunal de 1.ª Instância, já o fez com fundamentos na violação do disposto no artigo 342.º, n.º 1 e 566.º, n.º 2 e 3 do Código Civil; sobre a violação destas disposições legais já o douto Tribunal da 1.ª Instância e da Relação de Lisboa decidiram no mesmo sentido, entendendo que não há violação do disposto no artigo 342.º, n.º 1 e 566.º, n.º 2 do Código Civil”.

Como a doutrina e a jurisprudência vem lembrando para esse efeito - dupla conforme – deve-se desconsiderar “discrepâncias marginais, secundárias, periféricas, que não representam efectivamente um percurso jurídico diverso” - António Abrantes Geraldes, in, “Recursos em Processo Civil”, 7ª edição actualizada, em particular, pags. 424 e 427, onde também se faz referência a jurisprudência sobre a mesma matéria.

Atendendo às conclusões do recurso/revista, independentemente da maior ou menor relevância da modificação da matéria de facto, resulta evidente divergência substancial quanto às regras de ónus da prova, a qual determinou alteração significativa pela Relação da indemnização fixada em sede de 1ª Instância.

Pelo que fica dito, confirma-se o despacho de admissão do recurso exarado pela Relação.

APRECIANDO E DECIDINDO

Thema decidendum

Em função das conclusões da revista, temos que: “entende o R. (recorrente) não se verificar a obrigação de indemnizar o A., atendendo à total ausência de alegação e prova da ocorrência de danos e do seu nexo causal, ónus que impendia sobre o A., e que, ao invés, se limitou a peticionar o valor acordado, no contrato, para a última época desportiva, quando lhe era exigível que demonstrasse todos os valores auferidos durante o período contratual em falta, bem como todas as despesas que deixou de suportar.”

A) - DOS FACTOS

PROVADOS

1- Em 08.01.2016 o A. e o R. celebraram um contrato com o seguinte teor:

«PRIMEIRA

«Objeto

«1. O SCP contrata o Prestador de Serviços para prestar os serviços próprios da atividade de Treinador de ... de SCP, comprometendo-se a não prestar Iguais serviços a nenhuma outra entidade, designadamente clube, sociedade anónima desportiva ou Federação/seleção nacional, durante a vigência do presente contrato de prestação de serviços …

«2. Ao Prestador de Serviços caberá, designadamente, definir e preparar o plano de treinos, comparecer aos treinos, estágios, e jogos da equipa de ..., executar e orientar o plano de treinos da equipa, preparar, dirigir e orientar a equipa nos jogos, sempre com respeito pelas normas legais, regulamentares e pelos bons usos da profissão de treinador …

«3. O Prestador de Serviços, na qualidade de Treinador da equipa de ... do SCP participará em todas as competições nacionais ou internacionais em que a equipa esteja presente, sempre com o objetivo principal da obtenção das melhores classificações possíveis.

«4. O Prestador de Serviços deverá apoiar a coordenação técnica da formação e realizar a Integração entre a equipa de sub20 e a equipa sénior …

«5. O Prestador de Serviços deverá ainda, dentro e fora das instalações desportivas, observar uma conduta social e desportiva exemplar, em defesa do bom-nome, imagem e interesses do SCP …

«SEGUNDA

«Duração

«1. A presente prestação de serviços é válida para as épocas desportivas de 2016/2017 e 2017/2018, tendo inico a 1 de Setembro de 2016 e termo a 30 de Junho de 2018 …

«2. É conferido ao SCP o direito de opção de prorrogar o presente contrato para a época desportiva de 2018/2019, devendo para o efeito o SCP comunicar ao Prestador de Serviços a sua Intenção até 31 de Março de 2018 …

«TERCEIRA

«Preço e condições de pagamento

«1. Para a época desportiva de 2016/2017, o SCP pagará ao Prestador de Serviços a quantia anual ilíquida de €38.000,00 euros (trinta e oito mil euros), a qual será paga em 10 prestações ilíquidas, mensais, iguais e sucessivas, no valor de €3,800,00 euros, cada, a pagar nos meses de Setembro a Junho de respetiva época desportiva, acrescida de IVA à taxa legal quando houver lugar à sua liquidação nos termos da legislação em vigor …

«2. Para a época desportiva de 2017/2018, o SCP pagará ao Prestador de Serviços a quantia anual ilíquida de €38.000,00 euros (trinta e oito mil euros) a qual será paga em 10 prestações ilíquidas, mensais, iguais e sucessivas, no valor de €3.800,00 euros, cada, a pagar nos meses de Setembro a Junho da respetiva época desportiva, acrescida de IVA à taxa legal quando houver lugar à sua liquidação nos termos da legislação em vigor …

«3. Todos os valores ao abrigo do presente contrato estão sujeitos aos respetivos descontos legais e só serão pagos mediante a entrega do respetivo recibo de modelo oficial, devidamente preenchido e assinado pelo Prestador de Serviços …

«4. Os rendimentos auferidos pelo Prestador de Serviços ao abrigo do presente contrato serão tributados em IRS por aplicação da taxa prevista nos termos de Código do IRS, mediante retenção na fonte quando a ela houver lugar nos termos da Lei, sem prejuízo do apuramento anual de rendimentos do Prestador de serviços e consequentemente do imposto final a pagar ou receber por este …

«5. Ambos os outorgantes ficam obrigados a cumprir todas as obrigações que resultem da legislação fiscal e da segurança social aplicáveis a cada um deles emergentes deste contrato de prestação de serviços …

«QUARTA

«Autonomia

«1. A prestação devida pelo Prestador de Serviços será, dentro dos parâmetros definidos neste contrato, por ele organizada com inteira autonomia técnica e Jurídica, com vista à satisfação das necessidades do SCP no que respeita aos fins pressupostos na cláusula primeira e dentro dos condicionalismos locais e temporais do seu funcionamento …

«QUINTA

«Vínculo

«1. Os outorgantes consideram-se vinculados apenas pelo regime do presente contrato de prestação de serviços. Fica, designadamente, expresso que:

«a) O Prestador de Serviços não fica obrigado ao cumprimento de qualquer modalidade de duração e organização de horário de trabalho, nem a comparecer ou permanecer nas instalações do SCP, com exceção da estrita medida do necessário ao adequado e normal cumprimento do plano de treinos, dos jogos, e dos estágios; nessa medida, o Prestador de Serviços não será incluído em qualquer mapa de horário de trabalho ou escala de serviço, nem em outros suportes documentais, mecanográficos ou computadorizados que, de acordo com a lei ou os usos, sejam próprios do cumprimento de formalidades relativas ao trabalho subordinado, tais como mapas de férias, mapas de quadro de pessoal, registos de controlo de tempos de trabalho, ficando naturalmente salvaguardada a sua submissão, como quaisquer utilizadores das instalações, ao registo de entradas e saídas para fins de segurança de pessoas e bens;--------------

«b) O Prestador de Serviços deverá fazer prova perante o SCP, quando este a entenda solicitar, da declaração à Administração Fiscal de início, alterações ou cessação de atividade …

«c) O SCP não ficará obrigada ao pagamento de contribuições para qualquer regime de proteção social relativamente ao Prestador de Serviços, nem a contratar para este qualquer seguro de acidentes de trabalho, devendo o Colaborador fazer prova perante o SCP, quando esta a entenda solicitar, da sua inscrição no regime de segurança social dos trabalhadores independentes …

«d) O SCP poderá resolver imediatamente o presente contrato de prestação de serviços se o Prestador de Serviços incumprir as suas obrigações, nomeadamente, se o Prestador de Serviços prestar as atividades constantes da cláusula 1° a qualquer outra entidade, bem como se se comprometer a prestá-las, verbalmente ou por escrito, ou ainda se iniciar negociações tendentes a essa finalidade, durante a vigência da presente prestação de serviços …

«e) Sendo o contrato resolvido com fundamento na alínea anterior da presente cláusula, o Prestador de Serviços ficará obrigado e indemnizar o SCP, a título de cláusula penal, o valor de 50.000€ (cinquenta mil euros) …

«f) Sem prejuízo da alínea anterior, as partes acordam na duração do presente contrato e têm essa expectativa jurídica legítima, pelo que se o Colaborador revogar o contrato antes do termo acordado, ou resolver o mesmo sem fundamento que justifique, fica obrigado a indemnizar a outra parte, pelo valor de 50.000,00€ (cinquenta mil euros) …

2. A equipa sénior de... do R. iniciou a época 2016/2017 a vencer a ... (competição europeia), disputada, entre 16 e 18 de setembro de 2016 (artigo 6.º da contestação).

3. O campeonato nacional teve início em 01.10.2016, com uma vitória da equipa do R. frente à equipa do ..., por 12-2 (artigo 7.º da contestação).

4. À 5.ª jornada a equipa do R. foi penalizada pelo Conselho de Disciplina da Federação de ..., devido a falta de comparência no jogo contra a equipa de ..., por utilização indevida do seu guarda-redes que havia jogado pela equipa B, sem que tivesse decorrido o descanso regulamentar obrigatório e que permitiria ao atleta ser convocado para a equipa sénior (artigo 8.º da contestação).

5. À 6.ª jornada, a equipa do R. deslocou-se a B....... e perdeu contra a equipa do O... ........ por 7-3 (artigo 10.º da contestação).

6. À 13.ª jornada a equipa do R. deslocou-se ao ... e perdeu contra a equipa do S.... ...... . ....... por 5-4 (artigo 11.º da contestação).

7. No mencionado jogo contra o S.... ...... . ......., o A. e o capitão de equipa foram expulsos da partida (artigo 11.º da contestação).

8. Na 14.ª jornada, a 25.02.2017, a equipa do R. desloca-se a ... – então último classificado do campeonato nacional - e empata 2-2 (artigo 13.º da contestação).

9. A 09.03.2017, após o treino da equipa do R., ao final do dia, o A. ausentou-se de avião para ..., tendo aí permanecido até 14.03.2017 (artigo 14.º da contestação).

10. Em 14.03.2017, o A. reuniu-se com os membros do R. BB (vice-presidente do R. para as Modalidades) e CC, que o informaram ser entendimento do R. não haver condições para continuar a desempenhar a sua atividade de treinador da equipa de... (artigo 18.º da contestação).

11. Nessa mencionada reunião, o R. comunicou ao A. que, desde aquela data (14.03.2017) o A. estava dispensado de prestar serviços no R. (artigo 5.º da petição inicial, artigo 19.º da contestação).

12. Nessa mencionada reunião, o R. informou o autor que lhe iria pagar o valor correspondente aos honorários remanescentes até ao final da época 2016/17 (março, abril, maio e junho), num total de € 15 200,00 (artigo 20.º da contestação).

13. Nessa mencionada reunião, o R. informou o A. que iria formalizar a revogação da prestação de serviços (artigo 21.º da contestação).

14. Em data posterior à mencionada reunião, o R. pagou ao A. o montante de €15.200,00, correspondente às prestações de março, abril, maio e junho de 2017 (artigo 5.º da petição inicial e artigo 20.º da contestação).

15. O R. não pagou ao A. quaisquer quantias relativas a setembro de 2017 a junho de 2018 (artigo 7.º da petição inicial).

16. O A. assumiu, na época 2017/2018, com início em setembro de 2017 o cargo de treinador da equipa sub-13 (formação) de ... do ... (artigo 24.º da contestação).

17. Pelas funções de treinador da equipa sub-13 (formação) de ... do ... na época 2017/218 o A. recebeu, pelo menos, a quantia de €7.000,00 (artigo 24.º da contestação) – provado em sede de 1ª instância com a seguinte alteração parcial pela Relação: «17. Pelas funções de treinador da equipa sub-13 (formação) de ... do F. .. ......... na época 2017/218 o A. recebeu, pelo menos, a quantia de €7.000,00, sendo que, no ano fiscal de 2018, o A. declarou perante as autoridades fiscais espanholas rendimentos do trabalho que ascenderam a um total de €18.002,34».

18. Na época 2017/18 a equipa do R. foi liderada pelo treinador DD, tendo sido campeã nacional e apurada para a Final 4 da Liga Europeia (artigo 23.º da contestação).”

NÃO PROVADOS

- Como consequência do empate mencionado acima em 8., a equipa do R. tenha terminado a 14.ª jornada no 5.º lugar da classificação (artigo 13.º da contestação).

- O A. não tenha dado informação a nenhum membro do R. sobre a sua ausência para ... entre 09.03.2017 e 14.03.2017 (artigo 14.º da contestação).

- A 10.03.2017, o R. tenha tido necessidade de arranjar um substituto de improviso do A., sob pena dos jogadores ficarem sem treino, nem orientação técnica (artigo 15.º da contestação).

- A 10.03.2017, o A. tenha sido contactado telefonicamente para uma reunião com a direção do R. (artigo 17.º da contestação).

- Na reunião de 14.03.2017 (acima referida em 10.) BB tenha informado o A. que o R. não pretendia mais os serviços do A. pelas seguintes razões: i) ausência para ... num período menos bom da equipa; ii) incompetência na gestão do grupo de trabalho, com reflexo nos resultados averbados até então; iii) erros de gestão do plantel com consequências na falta de comparência, no jogo contra a equipa de ...; iv) falta de conhecimento e coordenação no jogo ante a equipa do ..., no ...; v) sugestão de contratação de um atleta, à data com 19 anos, que passou a ser o 2.º jogador mais caro do R. e que, até à saída do A., apenas tinha tido uma média de 7 minutos de utilização; vi) eliminação da equipa na fase de grupos da Liga Europeia; vii) classificação da equipa, à data, em 5.º lugar no campeonato nacional (artigo 19.º da contestação).

B) DO DIREITO

Previamente, importa referir que já foi tomada posição no sentido da inexistência de dupla conformecfr. supra IV a propósito da admissão do recurso.

Começando pela caracterização do contrato firmado entre o autor/A e o Réu/R verificamos que o primeiro obrigou-se a treinar uma equipa de ... do segundo, mediante remuneração mensal e por tempo determinado.

Estamos, pois, na presença dum contrato de prestação de serviços previsto no artº 1154º do Código Civil/CC a que se aplica o regime do mandato - artº 1156º do CC.

O R antes do terminus acordado para o fim do contrato revogou unilateralmente o mesmo, o que lhe era permitido à nos termos do nº 1 do artº 1170º do CC: “o mandato é livremente revogável por qualquer das partes, não obstante convenção em contrário ou renúncia do direito ao direito de revogação”.

A natureza onerosa do contrato em análise afasta, desde logo, a excepção prevista para o caso “de o mandato ser conferido também no interesse do mandatário”, bem como não se provou a alegada justa causacfr. factos não provados e nº 2 do citado artº 1170º CC.

Quanto à impugnação da matéria de facto importa deixar consignado que da mesma apenas resultou a alteração do ponto 17, o qual passou a ter a seguinte redacção:

«17. Pelas funções de treinador da equipa sub-13 (formação) de ... do ... na época 2017/218 o A. recebeu, pelo menos, a quantia de €7.000,00, sendo que, no ano fiscal de 2018, o A. declarou perante as autoridades fiscais espanholas rendimentos do trabalho que ascenderam a um total de €18.002,34».

No que se reporta à obrigação de indemnizar estabelece o artº 1172º do CC:

“A parte que revogar o contrato deve indemnizar a outra do prejuízo que esta sofrer:

(…)

c) se a revogação proceder do mandante e versar sobre mandato oneroso, sempre que o mandato tenha sido conferido por certo tempo ou para determinado assunto ou que o mandante o revogue sem antecedência conveniente.

(…)”

Quanto à questão decidendi, entende o recorrente/R que competia ao recorrido/A provar os prejuízos sofridos e, não o tendo feito, não há lugar à arbitrada indemnização.

Sobre a ponto ainda controvertido e em discussão escreveu-se no acórdão recorrido:

“-…-

Assim, pode discutir-se essencialmente a questão dos prejuízos consequentes da revogação unilateral e sem justa causa.

No fundo é o carácter duradouro da relação contratual, baseada na confiança mútua das partes, que justifica essencialmente a obrigação de indemnização, conjugada com o carácter oneroso do negócio jurídico considerado.

(…)

Reportando-nos agora ao caso concreto, que se refere a um caso de contrato de prestação de serviços por tempo determinado que foi revogado unilateralmente, sem justa causa, com antecipação do termo do prazo estipulado, o que se verifica é que o A. se limitou a invocar o seu direito a indemnização fundado exclusivamente no direito às prestações mensais que se venceriam até ao termo do contrato e que não foram pagas.

A essa factualidade, que resulta provada, corresponde um dano, ou seja corresponde a um prejuízo decorrente da revogação unilateral do contrato por iniciativa do R..

Há assim um lucro cessante correspondente às remunerações que o A. tinha direito a receber se o contrato fosse executado até ao seu termo e que por força da revogação não lhe foram pagas.

Esse valor, que não foi pago, mesmo que possa não ser tido como critério definitivo para a fixação da indemnização, deve servir de referência para efeitos de cálculo dos prejuízos suscetíveis de reparação nos termos do Art. 1172º al. c) do C.C..

Em todo o caso, considerando o disposto no Art. 562º do C.C., importaria apurar não só as receitas que o lesado deixou de auferir por força da revogação do contrato, como ainda as despesas que com a execução do mesmo para si adviriam.

Sucede que, no caso, estamos perante uma prestação de serviços muito particular, relacionada com a atividade de treinador de ..., relativamente à qual não existem, normalmente, despesas relevantes, inerentes ao exercício desse cargo pelo A., nem a elas se reporta o contrato dos autos. Por isso, compreensivelmente, elas não foram alegadas.

Ainda assim, a sentença recorrida, entendeu fazer uma ponderação relativa a perdas efetivas de rendimento, recorrendo para o efeito à equidade.

Recorde-se, a propósito, o que aí é dito:

«O valor de partida é, então, de €38.000,00. Sabe-se nos autos que o autor auferiu, pelo menos, a quantia de €7.000,00 pela atividade desenvolvida como treinador ao serviço do ... na dita época 2017/18.

«Ademais, resulta dos autos também que o autor declarou às autoridades fiscais catalãs o recebimento, no total dos anos 2017 e 2018, de € 25 000,64 (€6.998,30 relativos a 2017 e o remanescente, €18.002,34, a 2018). Ora, não tendo o autor demonstrado que estas quantias sempre teriam sido recebidas ainda que se mantivesse a prestar serviços ao réu, estes montantes terão que ser contabilizados para efeitos da indemnização a calcular. Ou seja, considerar-se-á que estes montantes apenas foram recebidos porque o autor já não prestava serviços ao réu. Assim, considerar-se-á a totalidade do valor referente a 2017 (€6.998,30) e €9.000,00 relativamente a 2018 (ou seja, metade do valor declarado em 2018, uma vez que a prestação de serviços em causa nos autos vigoraria apenas seis meses no ano de 2018).

«Afigura-se também adequado considerar que, com a cessação da prestação de serviços o autor deixou de estar deslocado – o autor, segundo indica na petição inicial, reside em ... – e, portanto, deixou de suportar os encargos inerentes à manutenção de uma vida organizada em Lisboa e em .... Então, considerar-se-á, como custo com a manutenção de residência temporária em Lisboa, o valor mensal de €900,00 (compreendendo despesas de casa, bem como de fornecimento de serviços como água, eletricidade, gás, internet). Pelas deslocações efetuadas à sua cidade, pode admitir-se que, entre setembro e junho, o autor iria a ..., pelo menos cinco vezes, e que cada deslocação não custaria menos de €200,00.

«Tendo presente todos estes elementos, afigura-se ajustado fixar em €12.000,00 (doze mil euros) o valor devido pelo réu ao autor a título de indemnização pela cessação antecipada do contrato de prestação de serviços celebrado».

Com o devido respeito, não existe fundamento algum para considerar este tipo de despesas, relacionadas com a circunstância de estar deslocalizado na prestação de serviços que realizava para o R., porque nada nos diz que o A. tivesse efetivamente despesas com alojamento em Lisboa, com as inerentes despesas domésticas.

Julgamos assim que a sentença recorrida percorreu um caminho que extravasou a realidade palpável dos factos. O A. poderia perfeitamente ter alojamento pago pelo R., ou viver em casa de pessoas amigas ou familiares, sem suportar qualquer encargo com isso. Nada sabemos a esse respeito. Por isso, seguir por esta via é entrarmos no domínio das suposições e não do exercício legítimo do poder jurisdicional, com recurso à equidade.

As despesas que poderiam ser consideradas seriam apenas as inerentes à própria prestação de serviços como treinador. Ora, o que nos diz a pouca experiência que temos sobre estas matérias, é que quase todas elas, se não todas, costumam ser suportadas pelo diretamente pelo Clube, ao proporcionar as condições para o prestador de serviços realizar o seu trabalho. Pensamos, por exemplo, nas deslocações ao estrangeiro com a equipa e as inerentes estadias e refeições. Pensamos igualmente nos fatos de treino, computadores ou outros equipamentos necessários à função, que normalmente são proporcionados pelo clube.

Dito isto, não conseguimos identificar despesas próprias da prestação de serviços como treinador que sejam inerentes a essa prestação e que se traduzam na consideração duma redução do “saldo”, correspondente à ponderação de encargos dedutíveis no rendimento mensal, ou anual, acordado entre o A. e o R..

Neste caso, não temos dúvidas nenhumas em considerar que a perda de rendimento corresponde apenas à diferença entre o valor da remuneração acordada para a época de 2017-2018 (€38.000,00) e o valor que o A. logrou auferir, como treinador do F... ......... (€7.000,00) para esse mesmo período.

Ainda assim, coloca-se a questão de o A. ter declarado rendimentos do trabalho, no ano de 2018, no valor total de €18.002,34, conforme provado no ponto 17 (com a redação nova dada no ponto 1.1. do presente acórdão).

A verdade é que se desconhece por completo qual a proveniência desses valores, sendo certo que se pode admitir que parte dele corresponderá à remuneração que o F... ......... reconhece que lhe pagou na temporada de 2017-2018 (cfr. doc.s juntos com os Requerimentos de 23/11/2021, 2/6/2022, 24/6/2022 e 29/12/2022). Ou seja, os €7.000,00 (cfr. factos provados 16 e 17 – este último com nova redação), que o A. veio posteriormente a reduzir ao seu pedido final.

Assim sendo, em face da falta de prova de que esses valores remanescentes – resultantes da diferença entre os mencionados €7.000,00 e os valores declarados para efeitos fiscais – estão efetivamente ligados a qualquer remuneração emergente do exercício da profissão de treinador, não existem razões para se concluir que daí resultou a demonstração duma redução efetiva do prejuízo emergente da cessação antecipada do contrato a que os presentes autos se reportam.

É que, é nosso entendimento, que qualquer facto de onde resultasse a demonstração duma efetiva redução do prejuízo, competia ao ónus de prova do lesante, por ser um facto modificativo ou extintivo do direito invocado pelo A. (cfr. Art. 342.º n.º 2 do C.C.). Pelo que, não tendo sido feita prova suficiente de que o prejuízo foi inferior, por força da circunstância do A. ter recebido vencimento, como treinador, de valor superior ao por este admitido, só nos resta concluir que o prejuízo do A. é igual a €31.000,00.

-…-”

Como se constata - e o acórdão recorrido foi criterioso na análise doutrinal e jurisprudencial - para efeitos de indemnização importa compatibilizar o acima citado artº 1172º c) do CC com o princípio geral consagrado no artº 562º do CC: “Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga a reparação”.

Como decorre do que foi dito inicialmente aquando da caracterização do contrato em crise, a responsabilidade do R tem na sua base um acto lícito (liberdade de pôr o fim ao contrato) que não o exime da obrigação de indemnizar o A.

À semelhança do direito societário em que o gerente pode ser destituído sem justos motivos – ad nutum –, sem prejuízo do direito do lesado ser indemnizado – vide, António Pereira de Almeida, Sociedades Comerciais, pags.267 e 268.

Nas palavras de Mota Pinto, “o nosso sistema jurídico admite, com carácter excepcional, alguns casos contados de responsabilidade por actos lícitos. Pretende-se em tais casos compensar o sacrifício de um interesse menos valorado na composição de um conflito teleológico, porque a prevalência absoluta e total do interesse oposto seria injusta” in, Teoria Geral do Direito Civil, 1976, pag.91.

A primeira fonte referencial da responsabilidade do mandante/R é o contrato que estabeleceu com o A, o qual permite, unicamente, quantificar os lucros cessantes, no valor de €38.000,00, respeitante aos rendimentos que seriam devidos ao A se o acordado fosse até ao seu termo (2ª época), sendo certo que relativamente à 1ª época o R pagou o remanescente em falta no montante de €15.2000,00 – cfr. factos provados.

Acompanhamos o que se escreveu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça/STJ, de 5-2-2015 – publicitado in www.dgsi.pt e respeitante ao mesmo tema/revogação antecipada dum contrato de prestação de serviço/mandato, ónus de prova, quantum indemnizatório:

“A atribuição de uma indemnização deve pautar-se pelo critério da diferença entre a situação existente e aquela que existiria se não houvesse responsabilidade civil. Nessa medida, em abstracto, não seria destituída de interesse a alegação e demonstração de que a antecipada revogação do contrato libertou a A. da realização de determinadas despesas cujo cômputo deveria ser correspondentemente deduzido. Porém, no caso concreto, nenhuma das partes alegou qualquer facto com relevo para a quantificação dessas eventuais despesas que apenas relevariam se e na medida em que estivessem causalmente ligadas à execução do contrato de que a R. intempestivamente se desvinculou. (…) relativamente aos lucros cessantes, a alegação e demonstração das receitas projectadas para o período contratual em falta traduz o elemento constitutivo do direito de indemnização da A., servindo a alegação e prova de eventuais despesas associadas a tais receitas de elemento modificativo, na medida em que, de acordo com o referido critério da diferença, pudessem determinar a redução do montante indemnizatório. (…) a absoluta ausência de discussão e de demonstração desses encargos não permite determinar, com o mínimo grau de segurança, que o facto de a R. ter cessado extemporaneamente o contrato determinou para a A. uma redução nos encargos inerentes à sua actividade, por forma a interferir no montante dos prejuízos patrimoniais efectivos.”

Nestes autos, quanto aos ganhos do A na sequência da revogação do contrato pela R apenas se apurou que, passando a exercer as funções de treinador da equipa sub-13 (formação) de ... do F. .. ......... na época 2017/218 o A. recebeu a quantia de €7.000,00.

Quanto ao non liquet em relação a quaisquer outros valores susceptíveis de diminuírem os prejuízos que sofreu por causa da antecipada revogação do contrato, competia a R fazer prova dos mesmos, por modificativos ou extintivos do comprovado direito do A a ser compensado no montante total das remunerações que receberia se o acordado contratualmente fosse cumprido na íntegra – artº 342º nº 2 CC e a nível doutrinal Vaz Serra, in “Provas - Direito probatório material” - publicado no BMJ 110, pags. 61/256, onde ensina, nomeadamente, que esse non liquet resolve-se contra quem impendia o ónus de prova.

Concluindo e sumariando:

1. A e R celebraram um contrato de prestação de serviços a que se aplica o regime do mandato.

2. O R revogou antecipadamente o contrato, ficando obrigado a indemnizar o A, atento à sua natureza onerosa, ser por tempo determinado e inexistir de justa causa.

3. Segundo as regras de ónus da prova competia ao A provar os lucros cessantes decorrentes da referida quebra contratual, por traduzirem elemento constitutivo do direito de indemnização do mesmo A, e ao R fazer prova de eventuais encargos que deixou de ter, por modificativos ou extintivos do aludido direito do A.

4. Provados os lucros cessantes e o montante que o A passou a usufruir nas funções de treinador de outra equipa, só esse valor pode ser subtraído aos comprovados lucros cessantes para efeitos da indemnização devida ao A.

DECISÃO

- Assim e pelos fundamentos expostos, julga-se improcedente a revista.

- Custas pelo recorrido/R.

Lisboa, 19-9-2024

Afonso Henrique (relator)

Isabel Salgado

Ana Paula Lobo