Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
17917/22.4T8LSB-A.L1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: CATARINA SERRA
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
AVALISTA
RENÚNCIA
GERENTE
SÓCIO
RESPONSABILIDADE
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Data do Acordão: 09/19/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
Admitindo-se a desvinculação do avalista de livranças em branco subscritas, no quadro de contrato de abertura de crédito em conta corrente, pela sociedade da qual deixou de ser gerente, da responsabilidade deste só ficam excluídas as obrigações correspondentes ao crédito concedido depois da data em que aquela desvinculação se tornou eficaz.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


I. RELATÓRIO

Recorrente: AA

Recorrida: Caixa Económica Montepio Geral

1. Nos presentes autos foi proferido um despacho saneador-sentença com o seguinte teor:

Pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedente a presente oposição mediante embargos de executado e, consequentemente:

a) Declara-se extinta a execução, quanto ao ora Embargante, no que respeita ao montante de capital de €5.325,50 (cinco mil trezentos e vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos), compreendido no pedido exequendo respeitante à livrança n.º ................94;

b) Determina-se o prosseguimento da execução quanto ao mais.

Fixa-se o valor da causa em €77.603,20 (setenta e sete mil seiscentos e três euros e vinte cêntimos).

Custas pelo Embargante e pela Embargada, na proporção do respetivo decaimento”.

2. Desta decisão, na parte em que determinou “o prosseguimento da execução quanto ao mais”, veio o embargante interpor recurso, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, em 22.02.2024, proferido Acórdão com o seguinte dispositivo:

Por todo o exposto, acordam os Juízes desta 8.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar parcialmente procedente o recurso interposto, decidindo:

- Não aplicar ao caso o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2013, de 11.12.2012;

- Julgar válida a desvinculação do aval efectuada pelo recorrente, entendida como resolução unilateral do acordo de preenchimento que subscreveu como avalista, operando esta resolução “ex nunc”, - apenas vale para as dívidas ulteriores à respetiva desvinculação- continuando o recorrente responsável pelas dívidas existentes até à comunicação ao credor dessa desvinculação- 11 de outubro de 2021.

- Manter, no mais, a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente e pela recorrida, na proporção do decaimento”.

3. Inconformado também com esta decisão, veio o embargante AA, “ao abrigo do disposto nos artigos 671.º n.º1 1.ªparte e 677.º, ambos do Código de Processo Civil(CPC), dele interpor RECURSO para o Supremo Tribunal de Justiça”.

Termina as suas alegações enunciando as seguintes conclusões:

1. Mencionando o acórdão recorrido que o ora recorrente permaneceria responsável pelas dívidas existentes até à comunicação da desvinculação do aval ao exequente, em 11 de outubro de 2021, forçoso seria que essa decisão fixasse, em concreto, qual o valor da divida exequenda que permaneceria válida para cobrança coerciva.

2. Não o tendo feito, deixou a instância recorrida de se pronunciar sobre uma questão essencial sobre a qual recaia a obrigação de se pronunciar, o que consubstancia, salvo melhor opinião em contrário, a nulidade do acórdão recorrido, nessa parte, por omissão de pronuncia, nos termos e para os efeitos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.

3. Por outro lado, a liquidação da presente divida exequenda não depende de simples cálculo aritmético, pois que, não só não decorre da segurança do título executivo qual o valor concreto em divida em 11/10/2021, como também tal não decorre da integralidade da matéria de facto provada.

4. Motivo, pelo qual, impõe-se que o acórdão recorrido seja substituído por uma outra decisão que impunha a fixação da quantia exequenda pela qual os presentes autos deveriam prosseguir, sendo que, não sendo possível apurar esse quantum, deverão os presentes autos serem extintos dada a obrigação exequenda não ser líquida.

5. Acresce que, discorda o recorrente dos efeitos jurídicos retirados pelo acórdão recorrido, no que à desvinculação do aval diz respeito.

6. Com efeito, entendendo o acórdão recorrido que deveriam os presentes autos prosseguir quanto aos valores em divida existentes à data de 11/10/2021, esquece que nessa data ainda não existia qualquer divida constituída na esfera jurídica do recorrente.

7. De facto, no momento em que a exequente resolveu o contrato de abertura de crédito em conta corrente, preencheu as livranças, se venceu a divida, já há muito o ora recorrente tinha procedido à desvinculação do aval que havia prestado.

8. Nesse sentido, a desvinculação do aval não deverá ser entendida como apenas sendo válido “para as dívidas ulteriores à respectiva desvinculação”, mas sim que essa desvinculação apenas abrange as obrigações assumidas, mas ainda não vencidas,

9. sob pena de não se respeitar o princípio segundo o qual o acordo pelo qual o gerente de uma sociedade aceita a subscrição como avalista de uma livrança, que será preenchida pelo credor no momento do incumprimento, tem como pressuposto único aquela sua qualidade.

10. Por tal motivo, tendo o acórdão recorrido fixado que o executado responde pelas dívidas existentes até 11/10/2021, ao invés de fixar que o executado apenas responderia pelas obrigações vencidas até esse momento temporal, entende-se que interpretou de forma incorrecta a aplicação do n.º 1 do artigo 224.º do CC, no que aos seus efeitos diz respeito”.

4. No Tribunal da Relação de Lisboa foi proferido, em 27.05.2024, um despacho que admitiu o recurso e, em 6.06.2024, um Acórdão de Conferência que se pronunciou sobre a arguição de nulidade do Acórdão de 22.02.2024, rejeitando-a.


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Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC), as questões a decidir, in casu, são as de saber se:

1.ª) se o Acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia; e

2.ª) se a desvinculação do embargante / ora recorrente abrange as obrigações constituídas mas ainda não vencidas antes de 11 de Outubro de 2021.


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II. FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

São os seguintes os factos que vêm provados no Acórdão recorrido:

Para o conhecimento da excepção de ineptidão do requerimento executivo

1. Mediante requerimento executivo apresentado em 06-07-2022, a ora Embargada, Caixa Económica Montepio Geral, instaurou contra O..., Lda, BB e AA a ação executiva para pagamento de quantia certa, sob a forma ordinária, de que estes autos constituem apenso, pedindo o pagamento da quantia de €77.603,20 [cf. requerimento executivo apresentado nos autos principais]

2. No requerimento executivo indicou como título executivo “Livrança” e alegou os seguintes factos [cf. requerimento executivo apresentado nos autos principais]:

«1.º A ora Exequente é dona e legítima portadora de duas livranças, identificáveis pelos n.ºs ................94 e ................40, subscritas pela sociedade executada O..., Lda e avalizadas pessoalmente por BB e AA, nos precisos termos que dela extraem e conforme livrança que se junta como Documentos n.ºs 1 e 2.

2.º Os ora executados foram interpelados para o devido pagamento por parte da Exequente, no dia 18/11/2021, para proceder à regularização dos valores em dívida, conforme carta que ora se juntam como Documento n.º 3.

3.º Atendendo ao facto de que os Executados não procederam à regularização dos montantes em dívida, a Exequente notificou os executados por carta datada no dia 18/05/2022 da resolução do contrato e procedeu ao preenchimento da livrança, conforme missiva que se junta como Documento n.º 4.

4.º A Livrança n.º ................94 foi preenchida no valor de €61.060 (sessenta e um mil e sessenta euros), não tendo sido paga aquando do seu vencimento, nomeadamente no dia 2022/06/17.

5.º A Livrança n.º ................40 foi preenchida no valor de €16.331,51 (dezasseis mil trezentos e trinta e um mil euros e cinquenta e um cêntimos), não tendo sido paga aquando do seu vencimento, nomeadamente no dia 2022/06/17.

6.º De tal modo que, na presenta data, são os Executados devedores da importância global de 77.603,2 (setenta e sete mil seiscentos e três euros e vinte cêntimos), discriminados da seguinte forma:

a) Livrança n.º ................94:

Capital em Dívida: 61.060,00

Juros de 2022-06-17 a 2022-07-11 à taxa de 4,0000000%: 160,60

Imposto de Selo: 6,42

TOTAL: 61.227,02

b) Livrança n.º ................40:

Capital em Dívida: 16.331,51

Juros de 2022-06-17 a 2022-07-11 à taxa de 4,0000000%: 42,95

Imposto de Selo: 1,72

TOTAL: 16.376,18

7.º Até ao efetivo e integral pagamento serão devidos juros vincendos e demais encargos às taxas suprarreferidas.

8.º Mostram-se reunidos todos os pressupostos de que depende o prosseguimento da presente ação executiva requerida, sendo a obrigação certa, líquida e exigível, de tal modo lhe devendo suceder os seus ulteriores trâmites processuais.».

3. A Exequente juntou com o requerimento executivo cópia das seguintes livranças [cf. documentos juntos com o requerimento executivo apresentado nos autos principais]:

- Livrança com o n.º ................94, impresso no canto superior esquerdo, da qual consta ainda o n.º .............-5, manuscrito, em que figura como subscritora O..., Lda, e na qual se encontra aposta, como data de emissão, o dia 16-11-2018, como data do vencimento, o dia 17-06-2022, e como importância, o valor de €61.060,00;

- Livrança com o n.º ................40, impresso no canto superior esquerdo, da qual consta ainda o n.º ...........-5, manuscrito, em que figura como subscritora O..., Lda, e na qual se encontra aposta, como data de emissão, o dia 27-02-2019, como data do vencimento, o dia 17-06-2022, e como importância, o valor de €16.331,51.

4. Nas livranças referidas em 3., encontra-se aposta, no respetivo verso, a assinatura do ora Embargante AA, antecedida da expressão “Bom por aval ao subscritor”.

Para o conhecimento do mérito da causa

1. Entre Caixa Económica Montepio Geral (designada como “CEMG”) e O..., Lda (designada como “Parte Devedora”), representada por BB, CC e AA (designados como “Segundos Contraentes”), que intervieram «por si e na qualidade de gerentes da referida Sociedade», foi celebrado, no dia 24 de outubro de 2011, o acordo escrito denominado “Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente Montepio Gestão Activa”, cuja cópia se mostra junta aos presentes autos com o requerimento de 21-06-2023, do qual consta, além do mais, o seguinte [cf. documento n.º 1, junto a estes autos com o requerimento de 21-06-2023, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]:

«CLÁUSULA 1.ª

(Abertura de crédito em conta corrente)

1. A PARTE DEVEDORA acorda em constituir, na CEMG, uma conta MONTEPIO GESTÃO ACTIVA, que consiste numa conta de depósito à ordem (DO), sem remuneração, que, de uma forma automática, transfere saldos para uma conta de aplicação financeira ou desta para a conta DO, bem como, de uma forma igualmente automática, efetua transferências da conta DO para a presente conta corrente e desta para a conta DO. Todos os movimentos automáticos aqui descritos serão efetuados diariamente.

2. No âmbito da conta MONTEPIO GESTÃO ACTIVA, a CEMG abre um crédito em conta corrente à PARTE DEVEDORA até limite máximo contratado de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros) que se destina, exclusivamente, a ser utilizado nesse âmbito. […]

CLÁUSULA 2.ª

(Prazo)

O presente contrato é celebrado pelo prazo de 6 (seis) meses, com início em 24/10/2011 e termo em 24/04/2012, renovando-se automática e sucessivamente por iguais períodos, nas condições estipuladas contratualmente, salvo denúncia por qualquer das partes, efetuada por escrito, com a antecedência mínima de 30 (trinta) dias do termo do prazo em curso ou eventuais renovações. […]

CLÁUSULA 9.ª

(Titulação)

1. Para titulação e garantia de todas as responsabilidades emergentes do presente contrato é, nesta data, entregue pela PARTE DEVEDORA à CEMG, uma livrança em branco, subscrita pela PARTE DEVEDORA e avalizada pessoalmente pelo(s) SEGUNDOS CONTRAENTE(S).

2. Em caso de incumprimento do contrato, a CEMG e a PARTE DEVEDORA acordam expressamente que a CEMG poderá substituir as obrigações da PARTE DEVEDORA mediante novação, por uma obrigação cambiária constante da referida livrança.

3. A livrança será oportunamente preenchida quando a CEMG o entender, com indicação do montante que será de valor igual ao do saldo devedor na conta corrente, composto por capital, juros e demais encargos, apurados na data de encerramento da conta, que coincidirá, em caso de não prorrogação, com a data do termo do período contratual, acrescido de todos e quaisquer encargos de natureza fiscal.

4. A livrança é domiciliada em Lisboa e é pagável no 30.º (trigésimo) dia contado da data de encerramento da conta.

5. A CEMG poderá acrescentar ao valor da livrança o montante dos juros contados à taxa nominal anual, desde a data do vencimento do contrato até ao vencimento da livrança, e esta vencerá juros à taxa legal.

6. O(s) SEGUNDOS CONTRAENTE(S) declara(m) expressamente acordar na prestação de aval na referida livrança nas condições e para os efeitos previstos no presente contrato, dando o seu consentimento ao preenchimento da mesma nos termos da presente cláusula, durante todo o período da vigência do contrato, bem como nas eventuais renovações do mesmo. […]

CLÁUSULA 14.ª

(Direito de Resolução)

1. Sem prejuízo de quaisquer outros direitos que lhe sejam conferidos por lei ou pelo presente contrato, constituem causa bastante e fundamentada de resolução do presente contrato, as que, designadamente, se indicam:

a) Incumprimento, ainda que parcial, de qualquer das obrigações assumidas ao abrigo do presente contrato e/ou de quaisquer outras obrigações assumidas pela PARTE DEVEDORA em quaisquer outras operações de crédito celebradas ou a celebrar com a CEMG ou com quaisquer outras instituições de crédito ou financeiras, nacionais ou internacionais; […]

2. Vale como interpelação para efeitos de determinação do vencimento da dívida, a simples citação nos termos legais para a acção executiva ou outra a que a CEMG recorra para manter, garantir ou haver o seu crédito.

3. Findo ou resolvido este contrato, não abrangendo a resolução as prestações já efectuadas pela PARTE DEVEDORA, ou vencido o crédito, a conta corrente será para todos os efeitos havida por encerrada, obrigando-se desde já a PARTE DEVEDORA ao pagamento do respectivo saldo.

[…]».

2. Entre Caixa Económica Montepio Geral (designada como “CEMG”) e O..., Lda (designada como “Parte Devedora”), representada por BB, CC e AA (designados como “Segundos Contraentes”), que intervieram «por si e na qualidade de gerentes da referida Sociedade», foi celebrado, no dia 4 de junho de 2014, o acordo escrito denominado “Adicional a Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente Montepio Gestão Activa n.º 004-37.000033-5”, cuja cópia se mostra junta aos presentes autos com a contestação e do qual consta, além do mais, o seguinte [cf. documento n.º 4, junto com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]:

«CONSIDERANDO QUE:

I - Entre os contraentes, nas respetivas qualidades, foi celebrado em 24 de Outubro de 2011 um contrato de abertura de crédito em conta corrente, Montepio Gestão Ativa, até ao montante de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), pelo prazo de 6 (seis) meses, automática e sucessivamente renovável por sucessivos e iguais períodos nas condições estipuladas contratualmente;

II - O dito contrato vence atualmente juros à taxa de 8,93%; III - O contrato inicial se encontra titulado por documento particular ao qual se encontra anexa uma livrança subscrita pela PARTE DEVEDORA e pessoalmente avalizada pelos SEGUNDOS CONTRAENTES, o que se mantém;

[…]

VI - O capital efetivamente utilizado pela PARTE DEVEDORA ao abrigo do limite máximo contratado, é, na presente data, de €0,00 (zero euros);

VII - Os contraentes acordam agora num aumento no montante do capital disponibilizado ao abrigo do identificado contrato em mais €25.000,00 (vinte e cinco mil euros).

Entre os contraentes e nas qualidades em que intervêm, é celebrado o presente Acordo por adicional ao supra identificado contrato de abertura de crédito em conta corrente, que se rege pelas cláusulas seguintes:

CLÁUSULA PRIMEIRA

(Elevação do montante de crédito)

1. A CEMG eleva em €25.000,00 (vinte e cinco mil euros) o crédito aberto em conta corrente e concedido à PARTE DEVEDORA, perfazendo um limite máximo global de € 50.000,00 (cinquenta mil euros).

2. A utilização do montante ora acordado será feita nos termos e condições previamente estipulados. […]

CLÁUSULA QUINTA

(Livrança)

1. A PARTE DEVEDORA declara expressamente aceitar o estipulado na Cláusula 9.ª do identificado contrato, autorizando a CEMG, em caso de incumprimento, a preencher a referida livrança, reportada ao novo limite de crédito, nas condições estipuladas na mesma cláusula.

2. OS SEGUNDOS CONTRAENTES declaram expressamente manter a prestação de aval na referida livrança nas condições e para os efeitos previstos no identificado contrato e no presente adicional, dando o seu consentimento ao preenchimento da mesma como referido no número anterior, durante todo o período da vigência do contrato, bem como nas eventuais renovações do mesmo.

CLÁUSULA SEXTA

(Disposições finais)

O presente adicional produz efeitos a partir de 04/06/2014 e até termo do prazo contratual ou suas renovações, mantendo-se, em tudo o que não é aqui alterado, o então convencionado. […]».

3. Entre Caixa Económica Montepio Geral e O..., Lda, representada por BB e AA, que intervieram «por si e na qualidade de gerentes da referida Sociedade», foi celebrado, no dia 16 de novembro de 2018, o acordo escrito denominado “Adicional a Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente Montepio Gestão Activa n.º .............-5”, cuja cópia se mostra junta aos presentes autos com petição de embargos de executado e do qual consta, além do mais, o seguinte [cf. documento n.º 2, junto com a petição de embargos de executado, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]:

«CLÁUSULA 1.ª

(Capital utilizado)

O capital utilizado ao abrigo da supra identificada conta corrente é, na presente data, € 24.000,00 (vinte e quatro mil euros).

[…] CLÁUSULA 3.ª

(Prazo) O contrato é celebrado pelo prazo de 6 (seis) meses, eventualmente renovável por sucessivos e iguais períodos, nas condições estipuladas contratualmente, salvo denúncia por qualquer das partes, efetuada por escrito, com a antecedência mínima de 30 (trinta) dias do termo do prazo em curso ou eventuais renovações, ou, em alternativa, com a antecedência mínima de 30 (trinta) dias sobre a data em que se pretenda que a denúncia produza os seus efeitos.

CLÁUSULA 4.ª

(Juros/ Alteração Spread)

1. A partir de 2018.11.07, a CEMG e a PARTE DEVEDORA acordam que o capital efetivamente utilizado vencerá juros semestralmente, à taxa que corresponder à maior das seguintes: a) Taxa Indexada à Euribor a 6 (seis) meses, acrescida de um spread de 8,50 (oito virgula cinquenta) pontos percentuais; b) Taxa de juro fixa anual de 8,50% (oito virgula cinquenta).

2. Em 2018.11.07, e durante o próximo semestre, a taxa aplicável ao contrato é a estipulada na alínea b), do número anterior, por corresponder à maior das duas ali indicadas, a qual será revista semestralmente.

2.1. Com referência à taxa aplicável na data referida no número anterior, a taxa fixa anual nominal (TAN) é de 8,50 (oito virgula cinquenta pontos percentuais), sendo que a taxa anual nominal base definida para operações do mesmo tipo e prazo é fixada, na presente data, em 12,00% (doze pontos percentuais).

2.2. Para os efeitos do disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei número 220/94, de 23 de agosto, a taxa anual efetiva (TAE), nesta data e com referência à taxa declarada no número 2.1. é de 10,334% (dez virgula trezentos e trinta e quatro pontos percentuais), conforme cálculo efetuado nos termos do mesmo diploma.

3. Se nas revisões semestrais do contrato, a maior das taxas indicadas no número 1 supra vier a ser a da alínea a), a mesma será a que resultar da média aritmética simples das cotações diárias da taxa Euribor a 6 (seis) meses do mês anterior ao mês da data do contrato ou das suas revisões semestrais, numa base atual de trezentos e sessenta dias, a qual será arredondada para a milésima percentual, sendo que, quando a quarta casa decimal for igual ou superior a cinco, o arredondamento será efetuado por excesso e, quando inferior, o arredondamento será efetuado por defeito, acrescida do spread contratado na alínea a) do número 1, sendo que o spread base definido para operações do mesmo tipo e prazo é fixado, na presente data, em 12,00 pontos percentuais.

4. Nas revisões semestrais do contrato, e se sobrevier uma alteração à taxa de juro que estiver em vigor, em cada momento, segundo o critério estipulado no número 1 (um) da presente cláusula, essa alteração será objeto de comunicação nos termos seguintes:

a) A taxa de juro alterada nos termos do número anterior, que vigorará para o novo período semestral subsequente será comunicada pela CEMG à PARTE DEVEDORA com uma antecedência mínima de 15 (quinze) dias em relação à data do débito efetivo dos juros relativos ao novo período semestral subsequente;

b) Se nada disser até à data do débito dos juros relativos ao período semestral de contagem de juros, considera-se que a PARTE DEVEDORA aceitou a taxa proposta, sem prejuízo da faculdade de amortização antecipada e total do presente contrato;

c) A nova taxa produzirá efeitos a partir do início do semestre contratual subsequente, sem prejuízo da referida comunicação feita pela CEMG à PARTE DEVEDORA.

5. O incumprimento de qualquer das obrigações assumidas no presente contrato determina para a PARTE DEVEDORA a perda automática do spread ora contratado ou da taxa fixa anual contratada, passando a aplicar-se o spread base ou a taxa fixa anual base supra mencionadas.

6. Se se verificar agravamento do risco de crédito da PARTE DEVEDORA ou perda ou diminuição das garantias prestadas, e sem prejuízo do disposto no número um da cláusula relativa à resolução do presente contrato, poderá a CEMG, unilateralmente, substituir o spread ora contratado para o dito spread base ou a taxa fixa anual contratada para a taxa fixa anual base.

7. Relativamente à taxa indicada no número 1. alínea a), se a Euribor deixar de ser publicada, ou se, por qualquer motivo, deixar de existir ou de ser divulgada, a CEMG reserva-se o direito de, unilateralmente, escolher outro indexante disponível no mercado, que, no seu entender, tenha uma representatividade o mais aproximada possível à atual representatividade da Euribor, ou, em caso de inexistência ou inadequação deste, a aplicar, em alternativa, a taxa resultante da média das taxas oferecidas no mercado Euro, para o mesmo prazo, por 4 (quatro) instituições de crédito escolhidas pela CEMG de entre o painel de instituições contribuidoras da Euribor.

8. Os juros são calculados numa base de trezentos e sessenta dias, e em função dos montantes de utilização efectiva de fundos pela PARTE DEVEDORA.

9. Os juros são pagos mensal e postecipadamente e nos termos do n.º 5 da Cláusula 1.ª.

CLÁUSULA 5.ª

(Livrança)

Na presente data e por exoneração do aval prestado pela Exma. Senhora CC é entre a CEMG e a PARTE DEVEDORA acordado substituir a anterior livrança por uma nova livrança, a qual, em branco, é neste ato entregue à CEMG subscrita pela PARTE DEVEDORA e avalizada pessoalmente pelos SEGUNDOS CONTRAENTES.

CLÁUSULA 6.ª

(Titulação)

1. Para titulação e garantia de todas as responsabilidades emergentes do presente contrato é, nesta data, entregue pela PARTE DEVEDORA à CEMG, uma livrança em branco, subscrita pela PARTE DEVEDORA e avalizada pelos SEGUNDOS CONTRAENTES.

2. Em caso de incumprimento do contrato, a CEMG e a PARTE DEVEDORA acordam expressamente que a CEMG poderá substituir as obrigações da PARTE DEVEDORA mediante novação, por uma obrigação cambiária constante da referida livrança.

3. A livrança será oportunamente preenchida quando a CEMG o entender, com indicação do montante que será de valor igual ao do saldo devedor do presente contrato, composto por capital, despesas, juros e demais encargos, apurados na data do vencimento do contrato, acrescido de todos e quaisquer encargos de natureza fiscal.

4. A livrança é domiciliada em Lisboa e é pagável no 30.º (trigésimo) dia contado da data de encerramento da conta.

5. A CEMG poderá acrescentar ao valor da livrança o montante dos juros contados à taxa nominal anual, desde a data do vencimento do contrato até ao vencimento da livrança, e esta vencerá juros à taxa legal.

6. Os SEGUNDOS CONTRAENTES. declaram expressamente ter prestado aval na referida livrança nas condições e para os efeitos previstos no presente contrato, dando o seu consentimento ao preenchimento da mesma nos termos da presente cláusula, durante todo o período da vigência do contrato. […]

CLÁUSULA 11.ª

(Disposições Finais)

O presente adicional reporta-se exclusivamente ao supracitado contrato de abertura de crédito em conta corrente, celebrado entre a CEMG e a PARTE DEVEDORA em 2011.11.07, mantendo-se em tudo o mais então convencionado, nomeadamente no que se refere ao aval prestado pelos SEGUNDOS CONTRAENTES na livrança anexa ao identificado contrato.

[…]»

4. A Exequente remeteu à Executada, por via postal registada, com aviso de receção, uma comunicação escrita, com data de 18 de novembro de 2021, que foi entregue, e da qual consta o seguinte [cf. documento n.º 1, junto com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]:

«Assunto: Carta de Interpelação

Contrato n.º .............-5 Crédito à Tesouraria Gestão Ativa

PREC ....51

Exmo.(a). Senhor(a),

Tendo como referência o contrato/financiamento em epígrafe, celebrado com V. Exas., na qualidade de principal Devedor(a), verificando-se que o mesmo se encontra em situação de mora, desde 30/09/2021, vimos interpelá-los para que, no prazo máximo de 10 (dez) dias, proceda ao pagamento do montante vencido de € 56.752,34 (cinquenta e seis mil setecentos e cinquenta euros e trinta e quatro cêntimos) referente a capital €55.325,50, a que acrescem juros remuneratórios, comissões e despesas, juros moratórias e imposto de selo, respetivamente, €796,84, €72,92 e €265,68. €201,09 e €90,31.

Caso as referidas quantias não sejam liquidadas no supra indicado prazo, consideraremos imediatamente vencidas todas as obrigações emergentes do financiamento em referência, e daremos de imediato entrada da competente ação judicial contra todos os devedores, com vista à cobrança integral do crédito, com todas as consequências legais e patrimoniais daí emergentes, sem mais qualquer aviso.

[…]».

5. Ainda com data de 18 de novembro de 2021, a Exequente remeteu ao ora Embargante, por via postal registada, com aviso de receção, uma comunicação escrita, de teor semelhante, que foi entregue, e da qual consta o seguinte [cf. documento n.º 1, junto com a contestação, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]:

«Assunto: Carta de Interpelação

Contrato nº: .............-5 Crédito à Tesouraria Gestão Ativa

PREC ....51

Exmo.(a). Senhor(a),

Tendo como referência o contrato/financiamento em epígrafe, celebrado com O..., Lda, em que V. Exa. intervém na qualidade de Avalista/Fiador(a), verificando-se que o mesmo se encontra em situação de mora, desde 30/09/2021, vimos interpelá-los para que, no prazo máximo de 10 (dez) dias, proceda ao pagamento do montante vencido de €56.752,34 (cinquenta e seis mil setecentos e cinquenta euros e trinta e quatro cêntimos) referente a capital €55.325,50, a que acrescem juros remuneratórios, comissões e despesas, juros moratórias e imposto de selo, respetivamente, €796,84, €72,92 e €265,68, €201,09 e €90,31.

Caso as referidas quantias não sejam liquidadas no supra indicado prazo, consideraremos imediatamente vencidas todas as obrigações emergentes do financiamento em referência, e daremos de imediato entrada da competente ação judicial contra todos os devedores, com vista à cobrança integral do crédito, com todas as consequências legais e patrimoniais daí emergentes, sem mais qualquer aviso.

[…]».

6. A Exequente remeteu a cada um dos Executados uma comunicação escrita, com data de 28 de dezembro de 2021, da qual fez constar o seguinte [cf. documento n.º 3, junto com o requerimento executivo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]:

«Refª.: Procº nº .............-6

Cont° nº .............-5

Exmo(a). Senhor(a),

A Caixa Económica Montepio Geral vem, pela presente, por motivo de incumprimento de V.Exa., falta de pagamento da(s) prestação(ões) entretanto vencida(s), resolver o contrato identificado em assunto, tendo procedido ao apuramento da respetiva dívida em atraso que, nesta data, é de € 42.806,89 (Quarenta e dois mil, oitocentos e seis euros e oitenta e nove cêntimos), nos termos seguintes:

• Capital - € 42.096,02

• Juros - (2021/09/27) a (2021/12/28) - € 347,48

• Cláusula Penal de 3% desde 2021/10/27 - € 217,50 • Mutuários conta despesa - € 118,55

• Imposto sobre despesas - € 4,74

• Encargos (imposto de selo) - € 22,60

Nestes termos, solicitamos a V. Exa. que procedam à regularização da referida dívida, no prazo máximo de 10 dias, sob pena de procedimento judicial.

[…]».

7. A Exequente remeteu a cada um dos Executados, por via postal registada, uma comunicação escrita, com data de 18 de maio de 2022, da qual fez constar o seguinte [cf. documento n.º 4, junto com o requerimento executivo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]:

«Assunto: Resolução de contrato e Preenchimento Livrança

Contrato n.º: .............-5

Exmo/a. Senhor/a,

Vimos por este meio informar V. Exa. que, em face do incumprimento das obrigações emergentes do contrato em referência, procedemos nesta data à resolução do mesmo.

Deste modo, e de acordo com o que está contratualmente estabelecido, procedemos hoje ao consequente preenchimento da livrança, pelo montante global em dívida de 16.331,51 €, cujo vencimento ocorrerá em 17-06-2022, devendo V. Exa. proceder ao seu pagamento até ao respetivo vencimento.

O pagamento poderá ser efetuado utilizando a opção Pagamento de Serviços abaixo indicada, ou junto de um dos balcões da Caixa Económica Montepio Geral.

Após a data de vencimento da livrança sem que seja efetuado o seu pagamento, será de imediato instaurada a competente ação judicial.

[…]».

8. Com a mesma data de 18 de maio de 2022, a Exequente remeteu a cada um dos Executados, por via postal registada, uma outra comunicação escrita, da qual fez constar o seguinte [cf. documento n.º 4, junto com o requerimento executivo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]:

«Assunto: Resolução de contrato e Preenchimento Livrança

Contrato n.º: .............-5

Exmo/a. Senhor/a.

Vimos por este meio informar V. Exa. que, em face do incumprimento das obrigações emergentes do contrato em referência, procedemos nesta data à resolução do mesmo.

Deste modo, e de acordo com o que está contratualmente estabelecido, procedemos hoje ao consequente preenchimento da livrança, pelo montante global em dívida de 61.060,00€, cujo vencimento ocorrerá em 17-06-2022, devendo V. Exa. proceder ao seu pagamento até ao respetivo vencimento.

O pagamento poderá ser efetuado utilizando a opção Pagamento de Serviços abaixo indicada, ou junto de um dos balcões da Caixa Económica Montepio Geral Após a data de vencimento da livrança sem que seja efetuado o seu pagamento, será de imediato instaurada a competente ação judicial.

[…] ».

9. O executado AA foi designado gerente da sociedade executada em 22-01-2010, designação essa que foi inscrita pela Ap. .05/......27 [cf. doc. n.º 1, junto com a petição de embargos de executado]

10. Tendo sido nessa qualidade que, em 16 de novembro de 2018, subscreveu o acordo escrito referido no ponto 3., supra.

11. Foi acordado entre a Exequente/Embargada e a sociedade Executada a substituição da livrança anteriormente prestada no âmbito do acordo escrito referido no ponto 1., supra.

12. A referida substituição foi efetuada devido à exoneração, como avalista de CC, nos termos das cláusulas 5.ª e 6.ª do acordo escrito referido no ponto 3., supra.

13. Em 15-09-2021, o Executado/Embargante renunciou às funções de gerente da sociedade executada, facto que se encontra inscrito pela AP. .15/......16 [cf. documentos n.ºs 3 e 4, juntos com a petição de embargos de executado]

14. O Executado/Embargante, entregou nos serviços da Exequente/Embargada, em 11-10-2021, uma comunicação escrita, da qual fez constar, além do mais, o seguinte [cf. documento n.º 5, junto com a petição de embargos de executado, cujo teor se dá por integralmente reproduzido]:

«Assunto: Avales sobre a empresa O..., Lda

Exmos Srs.,

Como é do conhecimento de vossas excelências a empresa vossa cliente O..., Lda, com sede na Av. ... – ... ..., está a atravessar um período único de grande dificuldade motivado pela pandemia Covid 19, cujo impacto foi desastroso na atividade turística em Portugal no último ano e meio, não havendo ainda uma clara retoma que possa assegurar o início da sua normalidade.

Como também é do vosso conhecimento ao longo dos últimos anos tenho sido o interlocutor da empresa na qualidade de gerente junto de Vª Exas, não sendo, como também oficialmente sabeis, sócio desta empresa. Tenho sido portanto sempre funcionário da O..., Lda com a função de gerente.

[…]

Nesta fase difícil da empresa gostaria de vos informar que não tenho qualquer vencimento há vários meses, mais especificamente desde novembro de 2020, e decorrente desta situação vi-me forçado como facilmente compreendereis, a renunciará minha função de gerente. Estou assim neste momento desvinculado da empresa exatamente porque não recebo qualquer salário nem tive oportunidade de ser informado de quando os meus salários em atraso seriam liquidados.

Contudo a minha desvinculação da empresa para ser completa passa também pela vossa colaboração! Isto é, quando foram efetuadas operações de crédito nomeadamente as operações N° ....33-5 e N°...12-5 (copias dos créditos em anexo) elas foram possíveis na altura com a minha intervenção como avalista ainda que não sendo sócio, mas apenas gerente, mas no contexto de então, não havia outra forma de o fazer por imperativos do banco na atribuição dos créditos, pelo que assente na minha dedicação à empresa assumi essa responsabilidade que a empresa sempre cumpriu.

Neste momento não faz sentido manter os avales estando afastado da empresa e não sendo sócio da mesma. Estou consciente de que a retirada do aval de uma operação de crédito carece de uma decisão de retirada de garantias, sei por isso que não é o desejável para o Banco, e compreendo obviamente o tema, mas apelo a que entendam que além de não estar mais na empresa infelizmente também estou numa situação delicada, tendo de recomeçar a minha vida, nomeadamente do ponto de vista profissional e muito mais financeiro.

Peço assim a vossa colaboração no sentido da retirada dos avales que tenho nas operações de crédito na empresa.

[…]».

15. A Exequente não deu qualquer resposta à solicitação do executado, constante da comunicação referida no ponto 14., supra, de ser retirado dos avales por si prestados.

16. Com referência ao contrato n.º ..........35 e ao montante inscrito na livrança n.º ................94, a Embargante emitiu, com data de 18-05- 2022, a nota de débito junta com a contestação como documento n.º 2, da qual consta o seguinte:

«Mutuário(s): AA O..., Lda BB

Capital em Dívida 55.325,50

Juros desde 2021/09/07 a 2022/06/17 - 3.696,82

Compreendendo:

- Juros de 2021-09-07 a 2021-10-06 à taxa de 8,5000000% 391,89

- Juros de 2021-10-07 a 2022-06-17 à taxa de 8,5000000% 3.304,93

Sobretaxa de Juros de Mora de 3.0000000% desde 2021/10/07 1.166,45

Mutuários Conta Despesas 265,68

Imposto sobre Despesas 10,63

Comissões Financeiras 221,18

Imposto de Selo 373,74

TOTAL 61.060,00

São: Sessenta e Um Mil, Sessenta Euros»

17. Com referência ao contrato n.º ..........25 e ao montante inscrito na livrança n.º ................40, a Embargante emitiu, com data de 18-05- 2022, a nota de débito junta com a contestação como documento n.º 3 com o seguinte teor:

«Mutuário(s): AA O..., Lda BB

Capital em Dívida 14.873,82

Juros desde 2021/09/07 a 2022/06/17 - 719,79

Compreendendo:

- Juros de 2021-09-27 a 2021-10-26 à taxa de 3,2300000% 113,31

- Juros de 2021-10-27 a 2022-02-24 à taxa de 3,2300000% 457,01

- Juros de 2022-02-25 a 2022-06-17 à taxa de 3,2300000% 149,47

Sobretaxa de Juros de Mora de 3.0000000% desde 2021/10/27 563,29

Mutuários Conta Despesas 118,55 I

Imposto sobre Despesas 4,74 Imposto de Selo 51,32

TOTAL 16.331,51»

O DIREITO

1) Da nulidade por omissão de pronúncia

Quanto a este ponto, o recorrente alega que:

1. Mencionando o acórdão recorrido que o ora recorrente permaneceria responsável pelas dívidas existentes até à comunicação da desvinculação do aval ao exequente, em 11 de outubro de 2021, forçoso seria que essa decisão fixasse, em concreto, qual o valor da divida exequenda que permaneceria válida para cobrança coerciva.

2. Não o tendo feito, deixou a instância recorrida de se pronunciar sobre uma questão essencial sobre a qual recaia a obrigação de se pronunciar, o que consubstancia, salvo melhor opinião em contrário, a nulidade do acórdão recorrido, nessa parte, por omissão de pronuncia, nos termos e para os efeitos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.

3. Por outro lado, a liquidação da presente divida exequenda não depende de simples cálculo aritmético, pois que, não só não decorre da segurança do título executivo qual o valor concreto em divida em 11/10/2021, como também tal não decorre da integralidade da matéria de facto provada.

4. Motivo, pelo qual, impõe-se que o acórdão recorrido seja substituído por uma outra decisão que impunha a fixação da quantia exequenda pela qual os presentes autos deveriam prosseguir, sendo que, não sendo possível apurar esse quantum, deverão os presentes autos serem extintos dada a obrigação exequenda não ser líquida”.

Apreciando em Conferência esta arguição, afirmou o Tribunal da Relação de Lisboa:

A al. d) do n.º 1 do artigo 615 do CPC, dispõe que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.

Esta nulidade está diretamente relacionada com o artigo 608/2 do CPC, segundo o qual: «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.»

Há aqui que distinguir entre “questões a apreciar” e “razões” ou “argumentos” aduzidos pelas partes.

Conforme já ensinava Alberto dos Reis (in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. V, pág. 143): «São, na verdade coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.» Ou seja, a omissão de pronúncia circunscreve-se às questões/pretensões formuladas de que o tribunal tenha o dever de conhecer para a decisão da causa e de que não haja conhecido, realidade distinta da invocação de um facto ou invocação de um argumento pela parte sobre os quais o tribunal não se tenha pronunciado (Cfr. Também os Acórdãos do STJ de 7/7/1994, Miranda Gusmão, BMJ n.º 439, pág. 526 e de 22/6/1999, Ferreira Ramos, C.J. 1999 – II, pág. 161; da Relação de Lisboa de 10/2/2004, Ana Grácio, C.J. 2004 – I, pág. 105, de 4/10/2007, Fernanda Isabel Pereira, e de 6/3/2012, Ana Resende, Proc. n.º 6509/05, acessíveis em www.dgsi.pt/jtrl.).

Conforme se escreveu, com inteiro acerto, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04-05-2022 (Pº 2774/16.8T8PRT.P2, rel. Pedro Damião e Cunha), “[s]egundo o disposto no art. 615º, nº 1, al. d) do CPC, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Neste âmbito, importa ter bem presente que as questões submetidas à apreciação do tribunal a que o legislador se refere se identificam com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as excepções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio. Nessa medida, embora a não apreciação de algum fundamento fáctico ou argumento jurídico, invocado pela parte, possa, eventualmente, prejudicar a boa decisão sobre o mérito das questões suscitadas, daí apenas pode decorrer um eventual erro de julgamento (“error in iudicando”), mas não já um vício (formal) de omissão de pronúncia. Ou seja, este tipo de omissão pode, eventualmente, conduzir a um erro de julgamento quanto à matéria de facto e/ou quanto às questões de direito esgrimidas nos autos e, portanto, logicamente, nessa medida, só em sede de impugnação da decisão de facto ou de dissídio jurídico perante a decisão, se pode/deve colocar a questão (…)”.

Conclui-se – como se fez no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08-05-2019 (Processo 1211/09.9GACSC-A.L2-3, relatora Maria da Graça Santos Silva) - que: “A omissão de pronúncia é um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronuncia sobre essas questões com relevância para a decisão de mérito e não quanto a todo e qualquer argumento aduzido. O vocábulo legal -“questões”- não abrange todos os argumentos invocados pelas partes. Reporta-se apenas às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, às concretas controvérsias centrais a dirimir”.

Conforme se aponta no Ac. STJ de, 11.10.20221, no Proc. 602/15.0T8AGH.L1-A.S1, disponível in www.dgsi.pt: «I - As nulidades da sentença/acórdão, encontram-se taxativamente previstas no artº. 615º CPC e têm a ver com vícios estruturais ou intrínsecos da sentença/acórdão também conhecidos por erros de atividade ou de construção da própria sentença/acórdão, que não se confundem com eventual erro de julgamento de facto e/ou de direito.

II - A Nulidade de sentença/acórdão, por omissão de pronúncia, só ocorre quando o julgador deixe de resolver questões que tenham sido submetidas à sua apreciação pelas partes, a não ser que esse conhecimento fique prejudicado pela solução a outras questões antes apreciadas.

III - O conceito de “questão”, deve ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, dele sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes.»

Ora, tem sido entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência, que apenas as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o «thema decidendum», ou que dele se afastam, constituem verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa ou o dever de não conhecer, sob pena de incorrer na nulidade prevista nesse preceito legal.

Questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as excepções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio.

Coisa diferente são os argumentos, as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, que não constituem questões no sentido do artigo 615/1-d) do CPC.

Não constitui objeto do recurso interposto para esta Relação a fixação da quantia exequenda. Nem a mesma poderia ser feita pois inexiste qualquer facto provado que concretize o valor das dívidas existentes até 11 de outubro de 2021.

Com a decisão do recurso interposto, cabe ao tribunal de 1.ª instância fixar a quantia exequenda. Não foi cometida qualquer nulidade, porque sendo a quantia exequenda o resultado de um cálculo aritmético (entre o que foi pago e o que está em dívida) compete ao juiz de 1.ª instância diligenciar no sentido de apurar o efectivo valor exequendo. O crédito exequendo corresponderá ao somatório das quantias pagas até à data da desvinculação.

Ora se assim é, importa concluir que não foi cometido o aludido vício, designadamente na sua vertente da omissão. Todas as questões submetidas a decisão, foram decididas.

Decisão

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes que compõem esta 8ª secção em indeferir a arguição da nulidade do acórdão proferido a 22 de fevereiro de 2024”.

É de notar que este Acórdão foi tirado com um voto de vencido suportado na seguinte declaração de voto:

Do voto de vencido que elaborei no acórdão cuja nulidade foi arguida já consta que “não concordo com a parte dispositiva do acórdão em que fiquei vencida, …porque nada diz sobre qual o valor pelo qual deve prosseguir a execução quanto ao embargante”; e que “a liquidação desse valor não depende de simples cálculo aritmético, sendo certo que não resulta da matéria de facto provada o valor das dívidas existentes até 11 de outubro de 2021”.

Na fundamentação do acórdão que aprecia a arguição de nulidade, pode ler-se:

- “Não constitui objeto do recurso interposto para esta Relação a fixação da quantia exequenda.”

- “… sendo a quantia exequenda o resultado de um cálculo aritmético (entre o que foi pago e o que está em dívida) compete ao juiz de 1.ª instância diligenciar no sentido de apurar o efectivo valor exequendo”.

Discordo de tal fundamentação.

A decisão recorrida é um despacho saneador que decidiu a oposição à execução. Constitui objeto do recurso decidir se a execução deve ou não prosseguir quanto ao embargante. Decidindo a Relação que deve prosseguir, mas não nos exatos termos definidos pelo tribunal recorrido, então tinha de resultar do acórdão que julgou o objeto do recurso por quanto deve prosseguir.

Se é desconhecida uma das parcelas da operação matemática que, no entender da Relação, é preciso efetuar, então a liquidação do crédito exequendo não depende de simples cálculo aritmético.

Findando a oposição à execução na fase do saneamento, como pode o “juiz da 1.ª instância diligenciar no sentido de apurar o efectivo valor exequendo”?”.

Aprecie-se.

Como claramente se explicou no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que apreciou a arguição de nulidade, dispensando mais desenvolvimentos aqui, a omissão de pronúncia geradora do vício de nulidade previsto no artigo 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, do CPC só existe em relação a questões em sentido próprio.

Ora, compulsando as alegações de apelação, não se vislumbra que o apelante / ora também recorrente tenha suscitado qualquer questão relacionada com a quantificação da dívida. Esta não é, por outro lado, uma questão de conhecimento oficioso, que o Tribunal recorrido tivesse o dever de apreciar.

Aquilo que foi suscitado e que importava decidir nos presentes embargos era apenas se a oposição à execução devia ser julgada procedente e, em caso de resposta negativa, quais os termos em que a execução devia prosseguir.

Estava em causa, portanto, delimitar ou definir o alcance da responsabilidade do embargante / apelante, o que apenas obrigava à identificação do espectro de obrigações abrangidas pelo aval por ele dado.

Ora, este objectivo foi, manifestamente, cumprido pelo Tribunal a quo, não se verificando, por conseguinte, qualquer omissão de pronúncia.

2) Do alcance da desvinculação ou, pela positiva, das obrigações abrangidas pela responsabilidade do embargante / recorrente

A presente questão respeita aos efeitos da desvinculação1 ou, se se quiser, à delimitação da responsabilidade remanescente do avalista.

As alegações de revista relevantes para esta questão são as seguintes:

5. Acresce que, discorda o recorrente dos efeitos jurídicos retirados pelo acórdão recorrido, no que à desvinculação do aval diz respeito.

6. Com efeito, entendendo o acórdão recorrido que deveriam os presentes autos prosseguir quanto aos valores em divida existentes à data de 11/10/2021, esquece que nessa data ainda não existia qualquer divida constituída na esfera jurídica do recorrente.

7. De facto, no momento em que a exequente resolveu o contrato de abertura de crédito em conta corrente, preencheu as livranças, se venceu a divida, já há muito o ora recorrente tinha procedido à desvinculação do aval que havia prestado.

8. Nesse sentido, a desvinculação do aval não deverá ser entendida como apenas sendo válido “para as dívidas ulteriores à respectiva desvinculação”, mas sim que essa desvinculação apenas abrange as obrigações assumidas, mas ainda não vencidas,

9. sob pena de não se respeitar o princípio segundo o qual o acordo pelo qual o gerente de uma sociedade aceita a subscrição como avalista de uma livrança, que será preenchida pelo credor no momento do incumprimento, tem como pressuposto único aquela sua qualidade.

10. Por tal motivo, tendo o acórdão recorrido fixado que o executado responde pelas dívidas existentes até 11/10/2021, ao invés de fixar que o executado apenas responderia pelas obrigações vencidas até esse momento temporal, entende-se que interpretou de forma incorrecta a aplicação do n.º 1 do artigo 224.º do CC, no que aos seus efeitos diz respeito”.

A questão das obrigações que permanecem no âmbito da responsabilidade do embargante foi decidida, no Acórdão recorrido, na sequência da resposta à questão sobre a admissibilidade da desvinculação. E foi decidida no sentido de que, sendo a desvinculação admissível, ela só produzia efeitos ex nunc ou para o futuro, abrangendo, portanto, apenas as dívidas correspondentes ao crédito concedido a partir da data em que a desvinculação se tornou eficaz, o que, aplicando o disposto no artigo 224.º, n.º 1, do CC, se concluiu ter ocorrido em 11.10.2021.

As considerações mais relevantes para esta matéria contidas no Acórdão recorrido são, designadamente, as seguintes:

A partir do momento em que recebe a comunicação de desvinculação, o credor pode diligenciar por outras garantias do crédito, sabendo que se o conceder, já não responderá pelo mesmo o avalista que lhe comunicou a vontade de se desvincular.

No momento da prestação do aval nas livranças em branco subscritas pela sua sociedade, o recorrente era o gerente daquela, e é esta indissociável ligação entre a qualidade de gerente e a prestação da garantia que legitima a interrogação sobre o modo como a perda dessa qualidade poderá influenciar a (manutenção da) responsabilidade do garante. Nessa medida, é o facto de deixar de ser gerente que legitima a resolução (faculdade reconhecida ao avalista por integração do acordo de preenchimento segundo a vontade hipotética das partes e os ditames da boa fé impostos pelo art.º 239º do CC), uma vez que o avalista deixa de poder influenciar a gestão societária e consequentemente assegurar-se que a sociedade está a ser gerida de modo a honrar os compromissos financeiros assumidos.

Concluindo, o recorrente pode resolver unilateralmente o acordo de preenchimento que subscreveu como avalista, mas esta resolução opera “ex nunc”, o que significa que apenas vale para as dívidas ulteriores à respetiva desvinculação, continuando responsável pelas dívidas existentes até à comunicação ao credor dessa desvinculação- 11 de outubro de 2021”.

Partindo do princípio (que não é possível pôr em causa) de que a desvinculação é admissível no caso concreto, cumpre apenas determinar, como se disse, o momento a partir do qual ela produz os seus efeitos e daí retirar consequências para o alcance da responsabilidade do embargante.

Dispõe-se no artigo 224.º, n.º 1, do CC:

A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada”.

Conforme consta dos factos provados 13 e 14, o embargante / recorrente renunciou à gerência em 15.09.2021 e comunicou a sua intenção de se desvincular como avalista à embargada / recorrida em 11.10.2021, pelo que a sua declaração se torna eficaz nesta última data. Daqui decorre que o crédito concedido à sociedade posteriormente a esta data fica dentro do alcance da desvinculação mas não o concedido anteriormente.

Ao contrário do que alega o recorrente (cfr. conclusão 9 das alegações de revista), a solução sustentada no Acórdão recorrido (responsabilidade do recorrente pelas obrigações constituídas anteriormente à desvinculação) surge como uma consequência lógica da regra de indissociabilidade entre a razão de ser do aval dado por gerente de sociedade e a sua qualidade de gerente de sociedade (nas palavras do recorrente: “o princípio segundo o qual o acordo pelo qual o gerente de uma sociedade aceita a subscrição como avalista de uma livrança, que será preenchida pelo credor no momento do incumprimento, tem como pressuposto único aquela sua qualidade”) em que o Tribunal a quo fundou a admissibilidade da desvinculação.

Só para ilustrar, diga-se que esta ideia de indissociabilidade entre a qualidade de gerente (ou de sócio ou de sócio-gerente) e a assunção de garantia de dívida da sociedade é defendida por diversos autores, que daí retiram consequências para o efeito da desvinculação e do alcance da desvinculação.

Diz, por exemplo, Carolina Cunha:

(…) é esta indissociável ligação entre a qualidade de sócio e a pretensão da garantia que legitima a interrogação sobre o modo como a perda dessa qualidade poderá influenciar a (manutenção da) responsabilidade do garante”2.

Diz ainda Evaristo Mendes:

Vindo tal qualidade de sócio a faltar, a cobertura das responsabilidades constituídas, à data da comunicação da saída, em princípio, não se discute (…). Tratamento distinto merece, porém, a cobertura da relação de negócios que perdura entre a sociedade e a IC, com as inerentes responsabilidades futuras da sociedade já sem o sócio. Na verdade, quanto a esta, a perda da qualidade de sócio faz desaparecer, em princípio, a razão de ser da exigência da garantia (por parte dos financiadores) e da correspondente vinculação (por parte dos avalistas)3.

Como se antecipa nos excertos da doutrina acabados de reproduzir, é razoável entender que, tendo a desvinculação sido reconhecida, a responsabilidade do gerente como avalista não alcance as obrigações resultantes da concessão de crédito que ele, por ter deixado de ser gerente, já não tenha tido o poder de decidir, influenciar ou sequer conhecer, mas permaneça intocada relativamente às resultantes da concessão de crédito que, pelo contrário, ele teve o poder de conhecer, influenciar ou mesmo decidir.

Dito de outra forma: ao contrário do que pretende o recorrente, não pode a desvinculação estender-se às obrigações constituídas antes mas apenas vencidas depois da desvinculação. O momento determinante é – tem de ser – o da constituição das obrigações, porquanto é este o momento que o avalista, na sua posição de gerente, exerce os seus poderes de gestão, ponderando (ou devendo ponderar) a oportunidade e a razoabilidade da assunção da obrigação e avaliando (ou devendo avaliar) os riscos e as consequências de um eventual incumprimento.


*


III. DECISÃO

Pelo exposto, nega-se provimento à revista e confirma-se o Acórdão recorrido.


*


Custas pelo recorrente.

*


Lisboa, 19 de Setembro de 2024

Catarina Serra (relatora)

Fernando Baptista

Ana Paula Lobo

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1. Esclareça-se que a desvinculação de que aqui se fala configura, em rigor, uma denúncia. A denúncia tem o seu campo de aplicação privilegiado no âmbito dos contratos celebrados por tempo indeterminado mas pode aplicar-se também a contratos celebrados por tempo determinado com renovação automática (que, ipso facto, não têm um termo definido). Opera por declaração unilateral receptícia.

2. Carolina Cunha, “Cessão de quotas e aval: equívocos de uma uniformização de jurisprudência, Direito das Sociedades em Revista, 2013, volume 9, p. 105 (sublinhados da autora).

3. Evaristo Mendes, “Aval prestado por sócios de sociedades por quotas e anónimas e perda da qualidade de sócio: Apontamento, Revista de Direito das Sociedades, 2015, n.º 3-4, pp. 604-605 (sublinhados do autor).