Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
445/23.8PBBJA.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: MARIA DO CARMO SILVA DIAS
Descritores: RECURSO PER SALTUM
HOMICÍDIO TENTADO QUALIFICADO
QUALIFICAÇÃO JURÍDICA
MEDIDA DA PENA
REGIME ESPECIAL PARA JOVENS
Data do Acordão: 10/02/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário :
I. A factualidade dada como provada, única que pode ser atendida, para efetuar a qualificação jurídico-penal no acórdão, não permite considerar o crime de homicídio qualificado cometido pelo arguido como desqualificado ou simples tentado (como pretendido o Sr. PGA junto deste STJ). De facto, a atuação do arguido (dando pelo menos uma facada/golpe daquela forma em zona vital, abandonando o local, só não lhe tendo causado a morte por a vítima ter sido prontamente socorrida e submetida a intervenção cirúrgica de urgência, perante todo o circunstancialismo dado como provado) foi perfeitamente gratuita, de surpresa, sem dar qualquer hipótese de reação ao ofendido, não havendo qualquer motivo para essa atitude, mostrando bem a sua baixeza de caráter, sendo a sua atuação pesadamente repugnante, completamente desproporcionada, sem sentido, inexplicável, incompreensível, perante o senso comum e à luz do modo de agir do cidadão médio, não tendo qualquer justificação plausível, denunciando bem o elevado desprezo pelo valor da vida humana.

II. Considerando a imagem global dos factos dados como provados e a personalidade do arguido (à data com 20 anos de idade), não se pode deduzir que a prática do crime em questão traduza um desvio transitório e ocasional (próprio do período de latência social propiciador da delinquência juvenil), o que mostra ser inviável formular um juízo de prognose favorável à atenuação especial prevista no art. 4.º do DL n.º 401/82, de 23.09, não se podendo desprezar a própria necessidade de defesa do ordenamento jurídico, concluindo-se pela não verificação dos pressupostos que justifiquem a aplicação do regime penal especial para jovens.

III. Todas as circunstâncias apuradas, inclusive as que eram favoráveis ao arguido, foram devidamente ponderadas pela 1ª instância, tendo em atenção o conjunto dos factos dados como provados e a sua personalidade, sendo-lhes atribuído o valor adequado e ajustado, não merecendo censura a avaliação que delas foi feita na decisão sob recurso. O facto de o tribunal não dar a mesma relevância que o arguido/recorrente pretendia às circunstâncias que se apuraram, não significa que tivesse feito uma avaliação errada ou incorreta, antes revela que aquele (arguido/recorrente) parte de pressupostos errados, sobrevalorizando circunstâncias a seu favor indevidamente e de forma subjetiva, portanto, sem razão.

Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça


I. Relatório

1. No processo comum (tribunal coletivo) n.º 445/23.8PBBJA do Juízo Central Cível e Criminal de ..., ... 2, comarca de Beja, por acórdão em 13.05.2024, decidiu-se além do mais:

- quanto à ação penal, condenar o arguido AA pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio qualificado na forma tentada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 131.º, n.º1, 132.º n.ºs 1 e 2 al. e) e art. 22.º nº. 2 a) e b) e 23.º do Código Penal, na pena de oito anos de prisão;

- quanto à parte cível:

- foi julgado totalmente procedente o pedido deduzido pela ULSBA e, em consequência, foi condenado o arguido/demandado a pagar-lhe a quantia de nove mil, cento e doze euros e trinta e cinco cêntimos, a que acrescem juros de mora à taxa legal, contados desde a notificação do demandado para contestar até integral pagamento;

- foi Julgado totalmente procedente o pedido deduzido por BB e, consequentemente, foi condenado o arguido a pagar-lhe a quantia de cento e cinquenta euros a título de indemnização por danos patrimoniais e a quantia de cinco mil euros a título de danos não patrimoniais, a que acrescem juros de mora à taxa legal contados desde a presente data até integral pagamento.

2. Não se conformando com o decidido, recorreu o mesmo arguido para o STJ apresentando as seguintes conclusões1:

1.º O Recorrente, vem acusado pela prática, em autoria material e sob a forma tentada de um crime de homicídio qualificado, p e p pelos artigos 131.º, 132.º, n.ºs 1 e 2, al. e), 22.º, n.º 1, 14.º, n.º 1 e 26.º, n.º 1, primeira parte, todos do Código Penal,

2.º Tendo igualmente, contra si, sido deduzidos Pedidos de Indemnização Civil, pelos Demandantes Unidade Local de Saúde de Beja e Ofendido, BB.

3.º Pelo que o Recorrente viu-se condenado na pena de prisão efectiva de 8 anos e ao pagamento da totalidade dos PICs deduzidos.

4.º Entende o recorrente que a pena de prisão determinada é excessiva e desproporcional, porquanto violadora do plasmado nos artigos 40.º, n.º 2 e 71.º do Código Penal, devendo a mesma ser reduzida e suspensa na sua execução, ao abrigo do disposto nos artigos 50.º e 53.º do mesmo normativo.

Desde logo,

5.º O Recorrente, que não tinha ainda 21 anos à data dos factos, viu ser-lhe afastado o regime especial destinado a jovens delinquentes, previsto pelo Decreto-Lei 401/82, de 23 de Setembro.

6.º Porquanto o ter o tribunal entendido que: i.Ter já sofrido uma condenação pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, situação demonstrativa de se estar perante o seguimento de um percurso criminoso; ii. Os factos são reveladores duma personalidade violenta (…) que não se compadece com os pressupostos a uma atenuação especial da pena.

7.º O Recorrente entende incompreensível tal justificação, mesmo que não podendo negar a condenação tida, a verdade é que reporta a um crime de tráfico de menor gravidade (p e p pelo art.º 25.º do DL 15/93), tendo sido condenado, precisamente pelo mesmo tribunal a quo, no processo 509/21.2..., numa pena de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução e cujo perdão de pena, ex vi Lei 38-A/2023, de 2 de Agosto, foi requerido em 17 de Maio, último.

8.º Quanto à alegada personalidade violenta do arguido, mais indecifrável é indecifrável a forma como o tribunal a quo estriba tal entendimento, na medida em que dos autos sindicados, mormente do relatório social produzido, ou até das declarações do Inspector da PJ, CC, que procedeu à sua detenção daquele, reduzida ou nenhuma relevância foi atribuída pelo tribunal de condenação.

9.º O Acórdão em sindicância pretende enquadrar o Recorrente, como alguém particularmente violento mas não logra determinar como atingiu tal conclusão, acabando até por minimizar o facto do acto tido ter sido praticado em situação de confronto entre dois grupos de contendores, sendo a faixa etária do que recorrente se inseria, inferior ao do da vítima.

10,º O Recorrente é um jovem social e familiarmente inserido, reside desde os 5 anos, em ..., com a sua tia materna e o filho desta, a qual é ... no hospital dessa urbe e assume, como sempre assumiu, uma postura de acompanhamento permanente do seu sobrinho, mantendo firme propósito e disponibilidade para o tornar a acolher.

11.º O Recorrente, que se encontra sujeito a prisão preventiva, desde ... de 2023, no EP de ..., tem mantido uma conduta conducente com as normas da instituição onde se insere, encontrando-se a frequentar o sistema de ensino. Por outro lado,

12.º O Recorrente, que prestou declarações em audiência de julgamento, teve oportunidade de apresentar a sua versão, ainda que desculpabilizante dos factos, viu tal situação não merecer qualquer valoração pelo tribunal a quo;

13.º O qual optou também por, igualmente, não querer reconhecer o arrependimento e contrição demonstrados:

14.º Deste modo, foi notória, a falta de capacidade daquele tribunal e até alheamento ao menor grau de maturidade, face à reduzida idade, do Recorrente, no sentido de percepcionar a real situação de quem julgava.

15.º Não obstante, tem o Recorrente consciência da gravidade e necessidade de punição dos factos sub iudice, entendo, porém que uma pena de 8 anos de encarceramento é manifestamente excessiva face ao circunstancialismo havido.

16.º Considerando que, a sua condenação numa pena de 5 anos, suspensa na sua execução e sujeita a regime de prova (ex vi art 50.º e 53.º CP) como a mais adequada ao caso em apreço.

17.º Contrariamente, o Tribunal a quo, ao aplicar uma pena de prisão efectiva, na moldura penal de 8 anos violou o disposto nos artigos 40.º., 50.º, 53.º, 54.º,70.º, 71.º, todos do Código Penal , bem como o artigo 410.º, n.º2, al. a), do Código de Processo Penal.

Termina pedindo o provimento do recurso e, consequentemente, que seja revogado e substituído o acórdão sob recurso.

3. Na resposta ao recurso o Ministério Público apresentou as seguintes conclusões:

1 - O arguido ora recorrente foi condenado, pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio qualificado na forma tentada, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 131º/1, 132º/1 e 2 al. e) e artigos 22º/2 al. a) e b) e 23º do Código Penal, na pena de oito anos de prisão, tendo sido ainda julgados totalmente procedentes o pedido deduzido pela ULSBA e, em consequência, condenar o arguido/demandado a pagar-lhe a quantia de nove mil, cento e doze euros e trinta e cinco cêntimos, a que acrescem juros de mora à taxa legal, contados desde a notificação do demandado para contestar até integral pagamento e o pedido deduzido por BB e, consequentemente, condenar o arguido a pagar-lhe a quantia de cento e cinquenta euros a título de indemnização por danos patrimoniais e a quantia de cinco mil euros a título de danos não patrimoniais, a que acrescem juros de mora à taxa legal contados desde a presente data até integral pagamento.

2 – Inconformado com a decisão final, o recorrente dela recorre, entende que a pena de prisão determinada é excessiva e desproporcional, violando os artigos 40º/2 e 71º do Código Penal, pugnando assim pela aplicação de uma pena reduzida e suspensa na sua execução, ao abrigo do disposto nos artigos 50º e 53º do Código Penal.

Mais discorda do facto de não ter beneficiado do Regime Especial destinado a jovens delinquentes, estatuído pelo Decreto-Lei 401/82 de 23 de setembro.

3 - Cremos, salvo o devido respeito, que não assiste razão ao recorrente, não merecendo censura o Douto Acórdão e, consequentemente, o recurso está condenado à improcedência.

4 - Pretende o recorrente uma pena inferior, invocando que mal, foi afastado o regime especial para jovens.

5 - Só em caso de desproporcionalidade na sua fixação ou necessidade de correção dos critérios de determinação da pena concreta, atentos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso, deverá intervir o Tribunal de 2ª Instância alterando o quantum da pena concreta. Caso contrário, isto é, mostrando-se respeitados todos os princípios e normas legais aplicáveis e respeitado o limite da culpa, não deverá o Tribunal de 2ª Instância intervir corrigindo/alterando o que não padece de qualquer vício.

6 - De tal resulta que, se a pena fixada na decisão recorrida, em todas as suas componentes, ainda se revelar proporcionada e se mostrar determinada no quadro dos princípios e normas legais e constitucionais aplicáveis, não deverá ser objeto de qualquer correção por parte do Tribunal de Recurso.

7 - Há que ponderar, num primeiro momento, que determinantes nesta operação de escolha da pena são as finalidades da punição, ou seja, a prevenção geral positiva ou de reintegração e a prevenção especial em conformidade com o disposto no artigo 40º/1 do Código Penal.

8 - Na determinação concreta da pena, as finalidades de aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e na possível reinserção do agente na comunidade.

9 - Do exposto, a medida da pena há-de resultar da medida da necessidade comunitária de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto – a prevenção geral positiva – e pelas necessidades de ressocialização do agente, tudo isto sem nunca perder de vista a culpa do agente.

10 -Estabelecida a forma como se relacionam a culpa e a prevenção, quer geral quer especial, no processo de determinação concreta da pena impõe-se a valoração dos concretos fatores de determinação de medida da pena previstos no artigo 71º/2 do Código Penal.

11 - Fatores esses que o Tribunal a quo fundamentou proficientemente no processo de determinação da medida concreta da pena aplicada, especificando-os e valorando-os corretamente.

12 - O Tribunal a quo apreciou a culpa do recorrente para a determinação da pena, tendo afastado a aplicação do Regime Especial para Jovens Delinquentes.

13 - O regime de atenuação especial da pena para jovens delinquentes não constitui um “efeito automático” resultante da juventude do arguido, mas uma consequência, a ponderar caso a caso, em função dos crimes cometidos, do modo e tempo como foram cometidos, do comportamento do arguido anterior e posterior ao crime, e de todos os elementos que possam ser colhidos do caso concreto e que permitam concluir que a reinserção social do delinquente será facilitada se for condenado numa pena menor.

14 -Atendendo ao comportamento anterior e posterior à prática do crime em apreço, não se apresentaram evidências seguras que permitissem que o Tribunal a quo pudesse fazer um prognóstico favorável ao recorrente quanto a uma maior facilidade de ressocialização se lhe fosse aplicado o regime especial referido.

15 - Assim, para além do antecedente criminal pela prática do crime de tráfico de menor gravidade, o Tribunal a quo constatou a completa falta de arrependimento por parte do recorrente – tendo aliás, o Tribunal a quo referenciado o comportamento do recorrente, em julgamento, em sede de acórdão.

16 - O Tribunal aquilatou por outro lado, das exigências de prevenção geral que qualificou como fortíssimas, tendo em conta o bem afetado pela atuação do recorrente, a vida, que é o bem mais valioso que existe; o grau de ilicitude que é muito elevado considerando a natureza das lesões, o perigo para a vida – BB só não faleceu porque recebeu assistência médica rápida e prontamente, e a forma de atuação do recorrente – vontade em “acabar aquilo”, o uso da faca, dissimuladamente, não para afastar mas sim para espetar; o dolo direto, ausência de arrependimento – aliás, em sede de julgamento, o recorrente procurou atribuir responsabilidades à vitima, os antecedentes criminais.

17 - Assim, o Tribunal a quo decidiu fixar a pena de 08 anos de prisão, tendo em conta a moldura abstrata.

18 -As considerações tecidas na decisão recorrida não revelam qualquer incoerência ou desproporcionalidade na fixação da medida concreta da pena, não suscitando a necessidade de correção da decisão, visto que nela se observaram os critérios de determinação da pena concreta, foram adequadamente atendidos os parâmetros da culpa e as circunstâncias do caso.

19 - e, conforme supra se referiu, entende-se que deverá improceder o recurso do recorrente quanto às pretensões de redução da medida concreta da pena, e, constatando-se que o recorrente foi condenado em pena de prisão superior a cinco anos, não se apreciará o aludido pedido de suspensão da pena de prisão cominada.

20 - Por todas as razões ora aduzidas entende-se que o Acórdão proferido pelo Tribunal a quo não deverá merecer qualquer censura, pelo que, deve ser negado provimento ao recurso interposto e mantida aquela decisão, nos seus precisos termos.

Termina pedindo que seja negado provimento ao recurso e confirmada a decisão recorrida.

4. Subiram os autos a este STJ e, o Sr. PGA emitiu parecer sustentando que o recurso deve improceder na parte em que o recorrente invoca violação do disposto no art. 410.º, n.º 2, al. a), do CPP, mas quanto à qualificação jurídico-penal dos factos dados como provados entende que o arguido não atuou animado de motivo fútil, pelo que a sua conduta integra apenas a autoria de um crime de homicídio simples tentado p. e p. nos arts. 22.º, n.º 2, 23.º, n.º 2, 73.º, n.º 1, al. a) e al. b) e 131.º do CP e, embora não seja caso de aplicar a o regime especial dos jovens delinquentes, por predominaram circunstâncias de conteúdo desabonatório, de onde resulta que a atenuação especial da pena nem traria vantagens para a sua reinserção social, não sendo compatível com as fortes exigências de prevenção geral que se fazem sentir, de todo o modo, quanto à medida da pena, caso seja desqualificado o crime de homicídio como promove, atenta a menor moldura abstrata (de 1 ano 7 meses e 6 dias de prisão a 10 anos e 8 meses de prisão) propõe que lhe seja aplicada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão.

5. Não houve resposta ao Parecer do Sr. PGA.

6. No exame preliminar a Relatora ordenou que fossem colhidos os vistos legais, tendo-se realizado depois a conferência e, dos respetivos trabalhos, resultou o presente acórdão.

II. Fundamentação

7. Factos

Consta da decisão sobre a matéria de facto do acórdão da 1ª instância o seguinte:

Estão provados os seguintes factos:

Da Acusação

1. Na noite de ... de ... de 2023, pelas 00h50m, o arguido AA, de alcunha AA, encontrava-se na Rua de ..., em ..., mais concretamente nas traseiras do ... de ..., acompanhado de um grupo composto por vários jovens, dentre os quais, DD.

2. A dado momento, surgiu a caminhar pelo local o ofendido BB que entabulou conversa com eles e questionou-os se haviam visto os seus amigos a passar por ali.

3. Por pensar que poderia tratar-se de um polícia, DD exaltou-se e aproximou-se do ofendido, tendo-lhe derrubado a cerveja que transportava na mão e arremessou-lhe um copo de whiskey, atingindo o ofendido na face e corpo com aquele líquido, molhando-o.

4. O ofendido encaminhou-se para junto do seu grupo de amigos, que se encontravam a alguns metros dali, e contou-lhes o sucedido.

5. Após saberem o que se havia passado, o ofendido e os seus amigos decidiram pedir explicações pelo ocorrido, tendo-se dirigido junto do referido grupo de jovens onde se encontrava o arguido.

6. Após alguma troca de palavras, o arguido disse ao ofendido “Agora estás aqui com os teus amigos, estás de costas quentes” e, em acto contínuo, desferiu-lhe uma bofetada na face.

7. Nessa sequência, os vários elementos de ambos os grupos envolveram-se em confrontos físicos mútuos, sendo que a determinada altura o arguido afastou-se do local a correr.

8. Alguns instantes depois, o arguido regressou e correu na direcção do ofendido, dizendo “Querem ver como é que isto acaba!”

9. Acto contínuo, com recurso a uma faca, cujas exactas características não se logrou apurar, o arguido desferiu, pelo menos, um golpe no ofendido, atingindo-o no abdómen, causando-lhe traumatismo abdominal com ferida incisa de 3-4 cm a nível da face anterior – transição toraco-abdominal direita - com hemorragia e choque hemorrágico, incisão mediana supra-umbilical, laceração hepática superficial do lobo esquerdo do fígado, punctiforme ao nível do diafragma central e comunicação com pleura esquerda, pequeno hemoperitoneu dos quadrantes superiores do abdómen e marcado hematoma de área de gordura pré-peritoneal.

10. Após, o arguido abandonou o local.

11. Os ferimentos que o arguido causou ao ofendido obrigaram a que o mesmo fosse sujeito a intervenção cirúrgica de urgência no Hospital ..., em ....

12. Não fosse a intervenção médico-cirúrgica atempada, as lesões infligidas pelo arguido teriam causado a morte ao ofendido.

13. Da descrita conduta do arguido, resultaram para o ofendido lesões que lhe determinaram 24 (vinte e quatro) dias para a consolidação médico-legal, com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional por idêntico período, com criação, em concreto, de perigo para a sua vida e desfiguração permanente através de extensa cicatriz da parede abdominal.

14. O arguido actuou com o propósito de tirar a vida a BB, atacando-o de surpresa com uma faca, desferindo-lhe um golpe na zona do abdómen, sabendo que se trata de zona onde estão alojados órgãos vitais e, por isso, ciente de que ao agir do modo descrito, lhe provocaria a morte, resultado que só não alcançou por motivos alheios à sua vontade, concretamente por o ofendido ter sido prontamente socorrido e submetido a intervenção médico-cirúrgica urgente.

15. Agiu ainda movido por motivos fúteis, insignificantes e de forma frívola, apenas pelo prazer de causar sofrimento, demonstrando desprezo pelo valor jurídico da mais elevada dignidade que é a vida.

16. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

Do pedido cível

17. A assistência médica e medicamentosa prestada pela demandante ULSBA a BB em consequência da conduta do arguido gerou uma despesa que ascende a 9.112,35€ (nove mil, cento e doze euros e trinta e cinco cêntimos), a qual se encontra por liquidar.

18. Em consequência da conduta do arguido, a roupa e o calçado utilizados por BB, ficaram inutilizados, o que lhe causou um prejuízo não inferior a 150,00€,

19. BB sofreu dores, mal-estar físico, medo e humilhação como consequência da conduta do arguido.

Mais se provou que:

20. O arguido não revelou arrependimento.

21. Antes de preso preventivamente, AA vivia no agregado familiar da avó EE, constituído por esta e pelo filho desta, de 10 anos de idade. O arguido integrou este agregado quando tinha 12 anos de idade. A decisão de viver com a avó deveu-se ao facto de manter algumas dificuldades de entendimento com a mãe e também porque a mesma apresentava algumas dificuldades económicas. Mantêm uma relação de cumplicidade e afecto, que o arguido justifica por ter sido sempre esta que o apoiou e ajudou. Os pais do arguido estão separados. O pai do arguido mantem-se a residir na ... e a mãe vive em .... AA é um cidadão ..., que está em Portugal desde os 5 anos de idade de idade. Veio para Portugal, na companhia da mãe e do irmão FF e fixaram residência em ... onde viviam com outros familiares, numa casa que é propriedade de EE. Com 12 anos de idade, integrou o agregado da avó, que vive em .... Quando o arguido tinha 15 anos de idade, a mãe emigrou para ... onde ainda se encontra e o irmão FF foi para a ... com o intuito de superar os problemas de saúde mental de que padece. O arguido manteve uma conduta assertiva e consentânea com as normas familiares e sociais. Contudo, passou a ausentar-se de casa sem o conhecimento da avó e mantinha convívio com grupo de pares associados a comportamentos rebeldes, que esta desconhecia. EE é ... no Hospital de ..., trabalha por turnos, sendo-lhe difícil fazer um controlo em relação às rotinas do arguido e ter uma supervisão mais consentânea. Antes de preso preventivamente, AA vivia no agregado da avó numa casa arrendada, de tipologia 2. Após a prisão do arguido, a avó comprou uma casa e mudou residência para zona pacata da cidade de .... A nível escolar, AA manteve um percurso escolar instável, com várias reprovações e mudanças de escola. Completou o 9º ano de escolaridade, tendo estudado no Agrupamento de Escolas nº1 de ..., na escola de ... até ao ano de 2021. Posteriormente integrou o 10º ano na Escola Secundária ..., num curso profissional de desporto, no entanto, anulou a matrícula no final do primeiro período, por ter atingido a maioridade e não retomou até à data o seu percurso escolar. Efectuou matrícula na Escola Profissional de ..., mas nunca frequentou a mesma. Mantinha algum absentismo e nem sempre estava motivado para ir às aulas. Desde que se encontra em prisão preventiva no Estabelecimento Prisional de ..., AA frequenta a escola e está no Projeto .... A nível de comportamento, o mesmo mantém um comportamento adequado às normas do estabelecimento prisional. Enquanto permaneceu a viver no agregado da avó, vivia na dependência económica desta, cuja situação financeira é satisfatória. A avó trabalha como ... no Hospital Distrital de ..., aufere um salário que médio de 4000€/mensais, sendo a única responsável pela organização financeira do agregado. Em termos de rotinas e ocupação de tempos livres não mantinha qualquer actividade estruturada, ocupando o tempo no convívio com os amigos. Apresentava sentimentos de pertença a grupo de pares, alguns deles co-arguidos em outro processo. É consumidor de estupefacientes, nomeadamente haxixe, desde os 15 anos de idade. Em meio prisional, mantém-se abstinente e desvaloriza a necessidade de qualquer tipo de tratamento/acompanhamento para esta problemática. No meio comunitário, não se perspectivam reacções negativas/ de rejeição à presença do arguido, até porque o agregado familiar reside no presente bairro apenas desde Julho do ano transacto. A actual situação jurídico-penal é vivida pelo arguido com ansiedade e receio do desfecho que poderá ter o presente processo. Ainda assim, tende a adoptar atitudes de minimização e desvalorização perante práticas similares às que lhe são imputadas. O presente processo judicial não lhe trouxe alterações significativas ao nível pessoal, assim como no seu enquadramento sociofamiliar. A avó continua a mostra-se disponível para o receber e apoiar e visita-o no Estabelecimento Prisional sempre que lhe é possível.

22. Por acórdão transitado em julgado em 18.12.2023, proferido no âmbito do proc. n.º 509/21.2..., foi o arguido condenado pela prática em 10.11.2022, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, numa pena de dezoito meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo e sujeita a regime de prova.


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Não deixaram de se provar quaisquer factos com interesse para a decisão da causa2.

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8. Direito

8.1. Como sabido, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação que apresentou (art. 412.º, n.º 1, do CPP).

Os poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça restringem-se exclusivamente ao reexame da matéria de direito (art. 434.º do CPP), sem prejuízo do disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do art. 432.º

Analisadas as conclusões do recurso apresentado pelo arguido para o STJ, verifica-se que considera excessiva e desproporcional a pena de 8 anos de prisão que lhe foi imposta, discordando da argumentação da decisão recorrida, pois, na sua perspetiva, devia ter beneficiado do regime especial destinado a jovens delinquentes previsto no DL 401/82, defendendo que lhe devia ser aplicada uma pena de 5 anos de prisão suspensa na sua execução sujeita a regime de prova, sustentando que ao não ter assim decidido o tribunal recorrido violou o disposto nos arts. 40.º, 50.º, 53.º, 54.º, 70.º, 71.º do CPP, bem como o disposto no art. 410.º, n.º 2, al. a), do mesmo código.

Vejamos então.

8.2. Comecemos por referir que, apesar de estarmos perante um recurso per saltum, não se percebe a razão pela qual o recorrente invoca a violação do disposto no art. 410.º, n.º 2, al. a), do CPP, quando na verdade nem sequer recorreu da decisão sobre a matéria de facto constante do acórdão sob recurso, ainda que discorde da argumentação apresentada para afastar a aplicação do regime dos jovens previsto no DL 401/82.

O facto de também o recorrente fazer uma avaliação das provas (designadamente das suas próprias declarações prestadas em audiência, do depoimento que teria sido prestado pela testemunha CC e mesmo apelando ao relatório social) de forma distinta do tribunal da 1ª instância não se impõe ao tribunal, nem significa que haja qualquer erro de apreciação das provas.

De resto, nem o recorrente impugnou amplamente a matéria de facto, caso em que o conhecimento do recurso sempre seria da competência da Relação.

De esclarecer que, os vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, do CPP, têm de resultar do texto da decisão recorrida na sua globalidade, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.

A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (artigo 410º, nº 2, al. a), do CPP) “supõe que os factos provados não constituem suporte bastante para a decisão que foi tomada, quer porque não permite integrar todos os elementos materiais de um tipo de crime, quer porque deixem espaços não preenchidos relativamente a elementos essenciais à determinação da ilicitude, da culpa ou outros necessários para a fixação da medida da pena. A insuficiência significa, por outro lado, que não seja também possível uma decisão diversa da que foi tomada; se não for o caso, os factos podem não ser bastantes para constituir a base da decisão que foi tomada, mas permitir suficientemente uma decisão alternativa, mesmo de non liquet em matéria de facto. Por fim, a insuficiência da matéria de facto tem de ser objectivamente avaliada perante as várias soluções possíveis e plausíveis dentro do objecto do processo, e não na perspectiva subjectiva decorrente da interpretação pessoal do interessado perante os factos provados e as provas produzidas que permitiram a decisão sobre a matéria de facto.”3

A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão (art. 410º, nº 2, al. b), do CPP) “é somente aquela que é intrínseca ao próprio teor da sentença, “considerada como peça autónoma e não também as contradições eventualmente existentes entre a decisão e o que consta do processo, no inquérito ou na instrução”.

O erro notório na apreciação da prova (art. 410º, nº 2, al. c), do CPP) “constitui uma insuficiência que só pode ser verificada no texto e no contexto da decisão recorrida, quando existam e se revelem distorções de ordem lógica entre os factos provados e não provados, ou que traduza uma apreciação manifestamente ilógica, arbitrária, de todo insustentável, e por isso incorrecta, e que, em si mesma, não passe despercebida imediatamente à observação e verificação comum do homem médio. A incongruência há-de resultar de uma descoordenação factual patente que a decisão imediatamente revele, por incompatibilidade no espaço, de tempo ou de circunstâncias entre os factos, seja natural e no domínio das correlações imediatamente físicas, ou verificável no plano da realidade das coisas, apreciada não por simples projecções de probabilidade, mas segundo as regras da "experiência comum". Na dimensão valorativa das "regras da experiência comum" situam-se, por seu lado, as descontinuidades imediatamente apreensíveis nas correlações internas entre factos, que se manifestem no plano da lógica, ou da directa e patente insustentabilidade ou arbitrariedade; descontinuidades ou incongruências ostensivas ou evidentes que um homem médio, com a sua experiência da vida e das coisas, facilmente apreenderia e delas se daria conta.”4

Ora, lendo o texto da decisão sob recurso, para além dos factos apurados permitirem proferir uma decisão (o que mostra a sua suficiência), não se deteta qualquer contradição entre a fundamentação e a decisão (nem sequer foi exposto qualquer raciocínio ilógico ou contraditório na fundamentação que apontasse para decisão contrária à da condenação do arguido/recorrente), sendo certo que a apreciação feita pelo Tribunal da 1ª instância não contraria as regras da experiência comum e tão pouco evidencia qualquer erro relevante de que o homem médio facilmente se desse conta.

Assim, não ocorrendo qualquer dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, do CPP, nem qualquer nulidade de conhecimento oficioso, podemos concluir que está definitivamente fixada a decisão sobre a matéria de facto constante da decisão sob recurso.

8.3. Posto isto e, antes de passarmos à questão da medida da pena colocada pelo recorrente, importa verificar o enquadramento jurídico-penal dos factos dados como provados.

Coloca-se esta questão uma vez que o Sr. PGA, junto deste STJ, sustenta que os factos devem ser reconduzidos ao tipo de homicídio simples na forma tentada p. e p. nos arts. 22.º, n.º 2, 23.º, n.º 2, 73.º, n.º 1, al. a) e b) e 131.º, todos do CP, por no caso concreto não crer que o arguido tivesse sido animado por motivo fútil.

Sobre essa matéria consta da decisão sob recurso o seguinte:

De acordo com o disposto no art. 131º do C. Penal “Quem matar outra pessoa é punido com pena de prisão de oito a dezasseis anos.”

O crime de homicídio previsto no supra citado preceito legal tem como escopo a protecção da vida humana.

Trata-se de um crime material ou de resultado que se consuma quando o agente, com a sua conduta, causa a morte a outrem, ou seja, quando a conduta daquele agente é causa adequada e directa da morte ocorrida, sendo que o art. 10º do C. Penal consagra a teoria da causalidade adequada com vista à imputação objectiva do resultado ao agente.

É assim necessário que a acção seja, em abstracto, idónea a produzir o resultado típico e que tal resultado seja uma consequência normal de tal actuação. E para aferir da existência de tal nexo de adequação, como refere o Prof. Figueiredo Dias (Direito Processual Penal, 1º Vol., pag. 328 e seguintes) “o juiz se deve deslocar mentalmente para o passado, para o momento em que foi praticada a conduta e ponderar, …, se, dadas as regras da experiência e o normal acontecer dos factos (…), a acção praticada teria como consequência a produção do resultado», de tal modo que, “se entender que a produção do resultado era previsível ou que, sendo previsível, era improvável ou de verificação rara, a imputação não deverá ter lugar” tendo em consideração as regras da experiência comum e os especiais conhecimentos do agente.

A nível subjectivo trata-se de um crime doloso, que pode assumir qualquer das suas modalidades – directo, necessário ou eventual – cfr. art. 14º do C. Penal.

No caso concreto, dúvidas inexistem quanto ao preenchimento do tipo objectivo (com excepção do resultado morte) e subjectivo do crime em análise, porquanto está demonstrado que o Arguido, munido de uma faca de características não concretamente apuradas, desferiu pelo menos um golpe no ofendido, atingindo-o no abdómen, causando-lhe traumatismo abdominal com ferida incisa de 3-4 cm a nível da face anterior – transição toraco-abdominal direita - com hemorragia e choque hemorrágico, incisão mediana supra-umbilical, laceração hepática superficial do lobo esquerdo do fígado, punctiforme ao nível do diafragma central e comunicação com pleura esquerda, pequeno hemoperitoneu dos quadrantes superiores do abdómen e marcado hematoma de área de gordura pré-peritoneal, procurando desta forma tirar-lhe a vida, resultado esse que só não se verificou devido à pronta assistência médica prestada à vítima, ou seja, por motivos alheios à sua vontade (art. 22º nºs. 1 e 2 a) e b) do Cód. Penal).

Agiu com dolo directo – 14º nº.1 do Cód.Penal.

Importa agora aferir da possibilidade de integração da conduta do Arguido no art. 132º do Código Penal.

Como resulta desse normativo legal, são susceptíveis de revelar especial censurabilidade ou perversidade, entre outras, as circunstâncias ali previstas que prevêem exemplos-padrão de qualificação do crime de homicídio

A técnica dos exemplos-padrão de qualificação do crime de homicídio consiste na previsão de uma cláusula geral de agravação – “especial censurabilidade ou perversidade do agente” – conjuntamente com um elenco de exemplos-padrão, exemplos-regra ou exemplos típicos.

A qualificação do crime resulta de uma conexão entre ambos, isto é, os exemplos explicitam o sentido da cláusula geral, sendo certo que a verificação de um exemplo-padrão não implica, nem importa a asserção automática quanto à verificação dessa especial censurabilidade ou perversidade.

Ao invés, os exemplos apenas indiciam a verificação da cláusula geral, pelo que a especial censurabilidade e perversidade deverá sempre ser comprovada, através de uma ponderação global das circunstâncias de facto e da atitude do agente nelas expressa.

Há unanimidade na doutrina e jurisprudência, em torno da ideia de que a qualificação consagrada no artigo 132.º, do Código Penal, assenta num especial tipo de culpa do agente, na medida em que terá que passar pela comprovação da especial censurabilidade ou perversidade do agente e isso exige uma ponderação final da atitude deste, comprovada na sua conduta.

A alínea e) do n.º 2 do artigo 132.º, do Código Penal, refere-se à actuação do agente determinado por avidez, pelo prazer de matar ou de causar sofrimento, para excitação ou para satisfação do instituto sexual ou por motivo torpe ou fútil.

O motivo torpe ou fútil é aquele que se afigura incompreensível ou inexplicável, à luz do modo de agir do homem médio ou mesmo revelador de um baixo carácter.

Como assinala Paulo Pinto de Albuquerque, para aferir dessa baixeza de espírito e de carácter deve ter-se em conta a desproporção entre a conduta da vítima e a reacção do agente, a responsabilidade do agente pela situação criada e as características pessoais do agente, mencionando uma conjunto de casos jurisprudenciais que se inserem nesse conceito de motivo fútil5.

Atentos os factos provados, entendemos que a conduta do arguido vista na sua globalidade não pode deixar de ser considerada como reveladora de uma especial censurabilidade e perversidade. Com efeito, está demonstrado que a vítima BB se aproximou inicialmente do grupo onde se encontrava o arguido e questionou-os se haviam visto os seus amigos a passar por ali, sendo que por pensar que poderia tratar-se de um polícia, DD (que fazia parte do grupo do arguido) exaltou-se e aproximou-se dele, tendo derrubado a cerveja que transportava na mão e arremessou-lhe um copo de whiskey, atingindo-o na face e corpo com aquele líquido, molhando-o. O ofendido encaminhou-se para junto do seu grupo de amigos, que se encontravam a alguns metros dali, e contou-lhes o sucedido, sendo que decidiram pedir explicações pelo ocorrido, tendo-se dirigido junto do referido grupo de jovens. Após alguma troca de palavras, o arguido disse ao ofendido “Agora estás aqui com os teus amigos, estás de costas quentes” e, em acto contínuo, desferiu-lhe uma bofetada na face. Nessa sequência, os vários elementos de ambos os grupos envolveram-se em confrontos físicos mútuos, tendo-se o arguido afastado do local a correr. Alguns instantes depois, o arguido inverteu o seu sentido de marcha e correu na direcção do ofendido, dizendo “Querem ver como é que isto acaba!” Acto contínuo, com recurso a uma faca, o arguido desferiu, pelo menos, um golpe no ofendido, atingindo-o no abdómen, sendo que não lhe causou a morte por ter sido prontamente socorrido e submetido a intervenção médico-cirúrgica urgente. As circunstâncias supra referidas mostram-nos que este se determinou a matar a vítima por motivo fútil, baixo e gratuito, correndo na sua direcção sem lhe dar qualquer possibilidade de defesa, anunciando que iria terminar a contenda que tinha sido ele próprio a iniciar, revelando pois um profundo desprezo pelo valor da vida humana, e tendo o arguido, ao actuar como actuou, revelado um especial grau de culpa (uma “especial censurabilidade”).

Em suma, e inexistindo causas de exclusão da ilicitude ou da culpa, temos de concluir ter o arguido cometido, em autoria material, na forma tentada, um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.s 131º 132º, n.º 1 e n.º 2, alínea e) e 22º nºs 1 e 2 al. a) e b) do Cód.Penal.

Pois bem.

Quanto a esta circunstância qualificativa dispõe o Artigo 132.º (homicídio qualificado)

1 - Se a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, o agente é punido com pena de prisão de doze a vinte e cinco anos.

2 - É suscetível de revelar a especial censurabilidade ou perversidade a que se refere o número anterior, entre outras, a circunstância de o agente:

e) Ser determinado por avidez, pelo prazer de matar ou de causar sofrimento, para excitação ou para satisfação do instinto sexual ou por qualquer motivo torpe ou fútil;

Para além do que já foi dito sobre esta circunstância qualificativa no acórdão impugnado, acrescenta-se apenas, em breve síntese, citando Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayette6 que, “O motivo torpe ou fútil como gerador duma certa actuação, deve sempre considerar-se pesadamente repugnante, baixo e gratuito.”

E, como assinala Paulo Pinto de Albuquerque7, «O motivo torpe ou fútil (…) é o motivo incompreensível ou mesmo revelador de um baixo carácter (…). Para aferir da baixeza de carácter e da futilidade do motivo devem ter-se em conta, por um lado a desproporção entre a conduta da vítima e a reacção do agente e a responsabilidade do agente pela situação criada e, por outro lado, as características pessoais do agente, como, por exemplo, as representações culturais do seu país de origem quando se trate de estrangeiro ou a sua história pessoal como vítima de maus-tratos”.

Ora, como resulta dos factos provados e decorre da análise de direito feita no acórdão sob recurso, o arguido agiu nas circunstâncias supra referidas (começando até por agredir gratuitamente o ofendido com uma bofetada e despoletando que, nessa sequência, elementos dos grupos opostos se envolvessem em confrontos físicos mútuos, tendo o arguido se afastado do local a correr, mas alguns instantes depois, invertendo o seu sentido de marcha e correndo em direção ao ofendido que nada lhe tinha feito), que nos mostram «que estava determinado a matar a vítima, por motivo fútil, baixo e gratuito, correndo na sua direcção sem lhe dar qualquer possibilidade de defesa, anunciando que iria terminar a contenda que tinha sido ele próprio a iniciar, revelando um profundo desprezo pelo valor da vida humana, e tendo o arguido, ao actuar como actuou, revelado um especial grau de culpa (uma “especial censurabilidade”)

De facto, essa atuação (dando pelo menos uma facada/golpe daquela forma em zona vital, abandonando o local, só não lhe tendo causado a morte por a vítima ter sido prontamente socorrida e submetida a intervenção cirúrgica de urgência, perante todo o circunstancialismo dado como provado) foi perfeitamente gratuita, de surpresa, sem dar qualquer hipótese de reação ao ofendido, não havendo qualquer motivo para essa atitude, mostrando bem a sua baixeza de caráter, sendo a sua atuação pesadamente repugnante, completamente desproporcionada, sem sentido, inexplicável, incompreensível, perante o senso comum e à luz do modo de agir do cidadão médio, não tendo qualquer justificação plausível, denunciando bem o elevado desprezo pelo valor da vida humana.

Perante a singeleza dos factos dados como provados (que são bem reveladores da forma como tudo se passou, da baixeza de carater da atuação do arguido e da especial censurabilidade da sua conduta), concorda-se com a qualificação jurídica constante da decisão sob recurso, concluindo-se que o arguido cometeu o crime pelo qual foi condenado (em autoria material, na forma tentada, um crime de homicídio qualificado, p. e p. nos arts. 131º, 132º, n.º 1 e n.º 2, alínea e) e 22º nºs 1 e 2 al. a) e b) e 23.º do CP).

8.4. Resolvida a questão do enquadramento jurídico-penal dos factos dados como provados, importa, agora, analisar a questão da medida da pena aplicada ao arguido, particularmente se devia ou não ter beneficiado do regime especial destinado a jovens delinquentes previsto no DL 401/82 e se é ou não excessiva e desproporcional a pena de 8 anos de prisão que lhe foi imposta e, em caso afirmativo, se é mais adequado aplicar-lhe uma pena de prisão suspensa na sua execução sujeita a regime de prova.

Assim.

Quanto à “Determinação da medida da pena” consignou-se na decisão impugnada:

Medida concreta da pena:

O crime de homicídio qualificado na forma tentada é punido com uma pena que varia entre os 2 anos, 4 meses e 24 dias e os 16 anos e 8 meses de prisão (arts. 132, n. 1, 23º, n. 2, e 73º, ns. 1, a) e b), todos do CP).

A determinação da medida concreta das penas faz-se em função da culpa do agente e das exigências da prevenção, tendo em conta todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o Arguido (art. 71º do CP). Sendo que, em caso algum, a medida da pena pode ultrapassar a medida da culpa (art. 40º, n. 2, do CP).

Em suma, a culpa e a prevenção constituem os dois termos do binómio que importa ter em conta para encontrar a medida correcta da pena (neste sentido, acórdão do STJ de 17-03-1999, Proc. n.º 1135/98 - 3.ª Secção).

À data dos factos o arguido ainda não tinha completado 21 anos pelo que cumpre apreciar da possibilidade de aplicação ao mesmo do regime penal especial para jovens contemplado no DL 401/82, de 23 de Setembro.

Mas a aplicação de tal regime não é automática, conforme decorre do disposto no art. 4º, que dispõe que “se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos arts. 73º e 74º do Código Penal quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.”.

Com efeito, o regime jurídico para jovens delinquentes foi pensado tendo em vista uma realidade que tem um campo privilegiado de aplicação nas situações em que o cometimento do crime constituiu um episódio isolado na vida do jovem, não sendo desejável que fique imediatamente marcado com a inevitabilidade do cumprimento de uma pena longa de prisão que pode tolher-lhe a própria reinserção, finalidade importante ou mesmo primordial da pena – neste sentido cfr. Ac. RP, de 30.11.2005, disponível em www.dgsi.pt.

Como se refere no Acórdão TRL de 24-10-2006, Proc. 7217/2006-5, disponível in www.dgsi.pt, «Para o juízo sobre a situação concorre o próprio facto criminoso, na medida em que é a revelação do maior ou menor desajustamento do jovem ao acatamento dos valores jurídicos, não devendo esquecer-se que as penas cumprem também finalidades de prevenção geral positiva que não podem ser postergadas para um nível comunitariamente intolerável pelo simples facto de se estar na presença de jovens condenados.

Daí que a atenuação especial em referência se justifique quando, no juízo global sobre os factos, se puder concluir que é vantajosa para o jovem, sem constituir desvantagem para a defesa do ordenamento jurídico.»

Acresce que, quanto ao crime cometido «(…)a natureza e modo de execução deste e seus motivos determinantes, são circunstâncias que não podem ficar alheias àquele juízo de prognose favorável à ressocialização, podendo condicioná-lo.» (idem)

Tendo presente o que supra ficou dito, somos do entendimento que o arguido não deverá beneficiar do referido regime.

Em primeiro lugar e conforme resulta dos factos provado, o arguido já foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, o que demonstra que o cometimento dos factos ora em análise não foi um acto único na vida do mesmo, sendo sim o seguimento de um percurso criminoso.

Por outro lado, os factos são reveladores duma personalidade violenta, o que impõe uma forte reacção do ordenamento jurídico que não se compadece com os pressupostos subjacentes a uma atenuação especial da pena.

Termos em que ao arguido não será aplicado o referido regime especial para jovens.

Na determinação da medida da pena há a considerar:

- As fortíssimas exigências de prevenção geral quando se nos depara, como no caso, um crime que passa pela afectação de um valor indiscutível e fundamental - individual e socialmente - como é a vida, o bem jurídico primeiro, que sobreleva em relação aos demais, pois é a conditio sine qua non do gozo de todos os outros direitos;

- Quanto ao grau de ilicitude, que é bastante elevado, considerando a natureza das lesões causadas, o perigo para a vida causado e a forma de actuação do arguido;

- O dolo na modalidade mais gravosa, directo;

- O arguido não revelou qualquer sentimento de arrependimento ou compaixão para com a vítima, procurando até atribuir-lhe responsabilidade pelo sucedido;

- Os antecedentes criminais por crime de diferente natureza;

- O que resultou provado a respeito da sua personalidade e condições socioeconómicas e a sua idade.

Por tudo o exposto, considera-se que a pena a aplicar ao Arguido se deverá situar num patamar médio baixo por referência à respectiva moldura abstracta.

Pelo que, será condenado na pena de oito anos de prisão.

Pois bem.

Está em discussão a pena individual do crime de homicídio qualificado tentado em que o recorrente foi condenado (que o mesmo considera excessiva e desproporcional) e a aplicação ou não do regime penal especial para jovens (DL 401/82).

Como sabido, as finalidades da pena são, nos termos do artigo 40.º do Código Penal, a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade 8.

Na determinação da pena, o juiz começa por determinar a moldura penal abstrata e, dentro dessa moldura, determina depois a medida concreta da pena que vai aplicar, para, de seguida, escolher a espécie da pena que efetivamente deve ser cumprida 9.

Nos termos do artigo 71.º, n.º 1 e n.º 2, do Código Penal, a determinação da medida da pena, dentro dos limites fixados na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo-se, em cada caso concreto, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a seu favor ou contra ele.

Diz Jorge de Figueiredo Dias 10, que “só finalidades relativas de prevenção, geral e especial, não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reacções específicas. (...) Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de reintegração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida.”

Mais à frente 11, esclarece que “culpa e prevenção são os dois termos do binómio com o auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena em sentido estrito”.

Acrescenta, também, o mesmo Autor 12 que, “tomando como base a ideia de prevenção geral positiva como fundamento de aplicação da pena, a institucionalidade desta reflecte-se ainda na capacidade para abranger, sem contradição, o essencial do pensamento da prevenção especial, maxime da prevenção especial de socialização. Esta (…) não mais pode conceber-se como socialização «forçada», mas tem de surgir como dever estadual de proporcionar ao delinquente as melhores condições possíveis para alcançar voluntariamente a sua própria socialização (ou a sua própria metanoia); o que, de resto, supõe que seja feito o possível para que a pena seja «aceite» pelo seu destinatário - o que, por seu turno, só será viável se a pena for uma pena suportada pela culpa pessoal e, nesta acepção, uma pena «justa». (…) A pena orientada pela prevenção geral positiva, se tem como máximo possível o limite determinado pela culpa, tem como mínimo possível o limite comunitariamente indispensável de tutela da ordem jurídica. É dentro destes limites que podem e devem actuar pontos de vista de prevenção especial - nomeadamente de prevenção especial de socialização - os quais, deste modo, acabarão por fornecer, em último termo, a medida da pena. (…) E é ainda, em último termo, uma certa concepção sobre a ordem de legitimação e a função da intervenção penal que torna tudo isto possível: parte-se da função de tutela de bens jurídicos; atinge-se uma pena cuja aplicação é feita em nome da estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada; limita-se em seguida esta função pela culpa pessoal do agente; para se procurar atingir a socialização do delinquente como forma de excelência de realizar eficazmente a protecção dos bens jurídicos”.

Depois, sendo aplicada pena de prisão, consoante o seu quantum (caso seja aplicada pena de prisão até 5 anos) impõe-se ao tribunal determinar se é caso de a substituir por uma pena não detentiva ou por uma pena detentiva prevista na lei.

Analisando a decisão sob recurso no que respeita à fundamentação da referida pena aplicada ao arguido, verificamos que o tribunal da 1ª instância ponderou, como lhe competia, se o recorrente devia ou não beneficiar do regime estabelecido no DL n.º 401/82, de 23.09, atenta a sua idade (nasceu em 11.12.2002) à data dos factos (01.07.2023), uma vez que tinha então 20 anos de idade, mormente se deveria beneficiar da atenuação especial prevista no seu artigo 4.º, concluindo, pelos motivos que indicou, negativamente e, igualmente fundamentou, de modo concreto, o quantum da pena de prisão imposta, atendendo a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do agente ou contra ele (art. 71.º, n.º 2, do CP).

No essencial, estamos de acordo com as considerações feitas pelo Tribunal Coletivo, quer quanto à não aplicação do disposto no art. 4.º do DL n.º 401/82 (funcionando a jovem idade do arguido como atenuante geral), quer quanto às considerações que teceu relativamente à determinação da medida concreta da pena individual aplicada.

Assim.

Como sabido, o regime especial contido no DL n.º 401/82, de 23.9 (cf. ainda art. 9.º, do CP), visa criar um maior leque de alternativas à aplicação de penas de prisão a jovens que tiverem, à data da prática do crime (art. 1.º, n.º 2, do cit. DL n.º 401/82), entre 16 e 21 anos de idade (sem terem ainda atingido os 21 anos), salvo se se tratar de jovens penalmente inimputáveis em virtude de anomalia psíquica (cf. n.º 3 do mesmo artigo 1.º).

Trata-se de uma opção político-criminal que se fundamenta essencialmente no entendimento de que a delinquência juvenil (quanto a jovens imputáveis), merece um tratamento diferenciado e especial em relação ao regime penal para adultos, por envolver um ciclo de vida «correspondendo a uma “fase de latência social que faz da criminalidade um fenómeno efémero e transitório”»13.

A ponderação do regime de atenuação especial previsto no art. 4.º do citado DL n.º 401/82 é obrigatória, “se for aplicável pena de prisão”, constituindo um poder-dever vinculado que impõe ao juiz, oficiosamente, o dever de usar esse regime, se verificados os respetivos pressupostos.

Para tanto, exige-se ao tribunal que realize um juízo de prognose, assente em factos, suficientemente densificados, no sentido de apurar se havia ou não “sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado” – o que, igualmente, significa, que essa apreciação é feita perante cada caso concreto, não sendo de aplicação automática14.

E, quando se diz que não é de aplicação automática, isto significa que não basta que à data dos factos o arguido tivesse idade compreendida entre 16 e 21 anos para que de imediato e de forma obrigatória se aplicasse a atenuação especial prevista no art. 4.º do citado DL n.º 401/82.

No juízo de prognose a efetuar, para apurar se existem ou não “sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social”, impõe-se ponderar, numa avaliação global dos factos apurados, a natureza e modo de execução do crime, a personalidade do arguido, a sua conduta anterior e posterior ao crime, bem como condições de vida, de forma a averiguar se a moldura da pena de prisão do crime por si cometido é ou não excessiva tendo em vista os fins de socialização do jovem condenado15 (não esquecendo que, só havendo vantagens de reinserção mas, sem prejuízo da defesa do ordenamento jurídico, é que se justifica a referida atenuação especial).

No caso dos autos, a natureza e modo de execução do crime em questão (homicídio qualificado tentado), cometido nas circunstâncias dadas como provadas, é grave, causador de alarme e intranquilidade social, que integra o conceito de “criminalidade especialmente violenta” (art. 1.º, al. l) do CPP), como bem diz o Sr. PGA, tendo revelado uma personalidade violenta e avessa ao direito.

A personalidade do arguido também não deixa de ser reveladora de uma forma de estar na vida, que precisa de se autodisciplinar, pois, não se compreende, como é que depois, de adotar uma conduta tão grave como a descrita nos factos dados como provados, logo a seguir se vai embora, não se preocupando com o estado em que deixara a sua vítima (o que revela também uma certa adequação aos factos).

A circunstância do arguido ser um jovem de 20 anos de idade à data dos factos é de pouco relevo, mesmo considerando que entretanto sofreu uma condenação (condenação transitada em 18.12.2023, pela prática em 10.11.2022 de crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, em 18 meses de prisão suspensa por igual período de tempo, com regime de prova) que não se relacionava com o crime aqui em apreciação, mas de todo o modo revelando uma personalidade avessa ao direito e desajustada às regras sociais e aos valores da comunidade (sendo irrelevante para este efeito que, como é alegado no recurso, tivesse sido apresentado no respetivo processo um requerimento a solicitar que fosse aplicado o perdão da Lei 38-A/2023, de 2.08).

Apesar do seu comportamento posterior, desde que está no EP, mostrar ter sofrido alguma evolução positiva, a verdade é que (tal como se provou) não mostrou arrependimento, revela falta de sentido crítico e adota atitudes de minimização e desvalorização perante práticas similares às que lhe são imputadas.

Dos factos dados como provados, mesmo considerando os relativos às suas condições de vida não resulta, nem pode extrair-se que, na altura em que cometeu o referido crime, estivesse a atravessar uma fase difícil da sua vida, uma vez que, então, tinha condições para levar uma vida conforme ao direito, tendo apoio da avó (... e que sempre lhe proporcionou um lar e o sustentou, apoiando-o e continuando disponível para o receber e apoiar, visitando-o no EP sempre que pode), mas apresentava sentimentos de pertença a grupos de pares, alguns deles co-arguidos em outros processos, era consumidor de estupefacientes desde os 15 anos de idade (apesar de em meio prisional manter-se abstinente, mas desvalorizar a necessidade de qualquer tratamento/acompanhamento para essa problemática) e mesmo a nível escolar teve um percurso instável e foi mantendo algum absentismo.

Ou seja, o facto de o arguido gozar de apoio familiar nos termos dados como provados em nada altera a apreciação feita pelo Coletivo, tanto mais que essa situação já existia antes de cometer o crime aqui em apreço, não tendo constituído motivo para o levar a não cometer o crime em questão nos autos.

Além disso, as dificuldades pelas quais passou na fase de crescimento (tal como muitos outros cidadãos) não o impediam de ter escolhido uma vida conforme ao direito.

Por outro lado, o que se apurou da personalidade do arguido/recorrente (que se pode extrair dos factos dados como provados) mostra que há razões sérias para concluir que se deve afastar a atenuação especial por esta não trazer vantagens para a sua reinserção social.

Considerando a imagem global dos factos dados como provados e a personalidade do arguido, não se pode deduzir que a prática do crime em questão traduza um desvio transitório e ocasional (próprio do período de latência social propiciador da delinquência juvenil), o que mostra ser inviável formular um juízo de prognose favorável à atenuação especial, não se podendo desprezar a própria necessidade de defesa do ordenamento jurídico.

Conclui-se, pois, que não se verificam os pressupostos que justifiquem a aplicação ao arguido da atenuação especial prevista no art. 4.º do citado DL n.º 401/82.

Improcede, pois, a argumentação do recorrente nesta matéria, sendo irrelevante o apelo que faz aos meios de prova (v.g. relatório social e depoimento da testemunha CC), pois, nesta altura os factos já estão definitivamente fixados, como acima foi referido e, apenas se pode atender aos factos apurados e ao que a partir deles se pode deduzir objetivamente.

Portanto, a moldura abstrata do crime cometido a atender tem o limite mínimo de 2 anos 4 meses e 24 dias de prisão e o limite máximo de 16 anos e 8 meses de prisão (arts. 132.º, n.º 1, 23.º, n.º 2 e 73.º, n.º 1, al. a) e al. b), do CP).

Perante a fundamentação apresentada pela 1ª instância não se encontra motivo para corrigir a medida concreta da pena de 8 anos de prisão aplicada.

Com efeito, havia que considerar, que o arguido agiu com dolo direto e com consciência da ilicitude da sua conduta.

Essa culpa e dolo são intensos, tendo presente a ação concreta em questão nos autos, por si praticada.

A ilicitude dos factos apurados é elevadíssima, sendo evidenciada pelo seu modo de atuação muito grave, impondo-se que agisse de outro modo com o ofendido, revelando uma maior desatenção à advertência de conformação ao direito.

De ponderar as consequências da sua conduta, que assumiram elevada gravidade, como se vê pelas lesões sofridas pelo ofendido, dadas como provadas, e, o que é certo é que, da conduta do arguido não redundou a sua morte, dada a pronta assistência médica de que beneficiou, com o auxílio de terceiros, pois o arguido após a facada que lhe deu, até se foi embora.

São muito elevadas as exigências de prevenção geral (necessidade de restabelecer a confiança na validade da norma violada), tendo em atenção o bem jurídico violado (a vida) no crime de homicídio qualificado tentado cometido, que deve ser combatido com maior severidade, embora de forma proporcional à danosidade do caso concreto.

São também muito elevadas as razões de prevenção especial, atendendo ao que se apurou em relação às condições de vida do recorrente e personalidade desajustada aos valores sociais e à comunidade em que se insere, manifestando indiferença pelo bem jurídico violado (desprezo manifestado pelo bem supremo da vida humana).

Pondera-se igualmente o seu comportamento anterior aos factos, tendo, entretanto, sofrido uma condenação (ainda que por crime diverso, mas de tráfico de menor gravidade, sendo condenado em prisão suspensa com regime de prova), bem como o comportamento posterior (sendo que, entretanto, tem estado preso preventivamente, e no EP tem mantido comportamento normativo, frequenta a escola e está no Projeto ..., o que é positivo).

Embora tendo como limite a medida da sua culpa, a necessidade de prevenir a prática de futuros crimes é essencial, sendo que o tipo de crime cometido, na forma tentada, ora em análise, revela bem as carências de socialização do recorrente e sua personalidade propensa ao crime que cometeu.

Considera-se também o que se apurou em relação às suas condições pessoais, familiares (nomeadamente toda a fase de crescimento e percurso que foi seguindo), as quais não o impediam de ter escolhido uma vida conforme ao direito.

Ainda se atenderá à respetiva idade (nasceu em ........2002), quer à data do cometimento do crime em análise (01.07.2023), quer à data em que foi proferida a decisão da 1ª instância, ao tempo entretanto decorrido e, ao efeito previsível da pena sobre o seu comportamento futuro.

Ao contrário do que alega em sede de recurso, pelo que resulta do texto do acórdão recorrido, tendo em atenção a sua idade, crime cometido e posicionamento em relação ao crime cometido (não havendo sequer sinais exteriores de arrependimento ativo), verifica-se que, além de manifestar indiferença pelo bem jurídico violado (bem vida) aqui em apreciação (tendo até se ido embora após ter dado aquela facada na vítima, indiferente ao estado em que ficou), ainda não interiorizou o desvalor da conduta que praticou, não revelando sentido crítico.

Por outro lado, precisa de esforçar-se mais, designadamente no EP, para mudar o seu rumo de vida.

Terá o arguido de melhor refletir sobre o seu percurso de vida, para adquirir consciência crítica, assumir os seus erros, esforçando-se por interiorizar os valores comunitários, assim se preparando/adaptando para levar uma vida conforme ao direito, sendo conveniente e útil que no EP vá igualmente ponderando sobre as consequências dos seus atos (o que, por certo, se tal se justificar, poderá a seu tempo contribuir para beneficiar de medidas flexibilização que o vão preparar para a liberdade, medidas essas a determinar pelo tribunal competente para o efeito).

O facto de o tribunal não dar a mesma relevância que o arguido pretendia quanto às circunstâncias que se apuraram, não significa que tivesse sobrevalorizado a vertente punitiva em detrimento da vertente pedagógica.

O que se passou é que o arguido/recorrente parte de pressupostos errados e sobrevaloriza circunstâncias a seu favor indevidamente e de forma subjetiva, portanto, sem razão.

Também, considerando todas as circunstâncias apuradas, igualmente não transparece que estejamos perante qualquer caso especial que justifique uma atenuação especial da pena (cf. art. 72.º do CP) em relação ao recorrente.

Como ensina Jorge de Figueiredo Dias, «as situações a que se referem as diversas alíneas do nº 2 não têm, por si só, na sua existência objectiva, um valor atenuativo especial, tendo de ser relacionadas com um determinado efeito que terão de produzir: a diminuição acentuada da ilicitude do facto, da culpa do agente ou da necessidade da pena»16.

E, não é esse o caso dos autos (sendo de afastar qualquer atenuação especial da pena), como facilmente se alcança das considerações acima efetuadas, tendo presente os factos dados como provados.

Assim, tudo avaliado, olhando aos factos apurados e tendo presente o limite máximo consentido pelo grau de culpa do arguido/recorrente, bem como aos princípios político-criminais da necessidade e da proporcionalidade, julga-se adequada e ajustada a pena de 8 (oito) anos de prisão aplicada pela 1ª instância (situada num patamar médio baixo).

Na perspetiva do direito penal preventivo, essa pena de 8 (oito) anos de prisão, mostra-se adequada, equilibrada e proporcionada em relação à elevada gravidade dos factos cometidos em apreciação, satisfazendo as finalidades das penas, tendo em atenção os critérios previstos nos arts. 40.º e 71.º do CP, que foram observados, ao contrário do que alega o recorrente.

Aplicar pena inferior a essa (8 anos de prisão) pelo crime ora em apreciação, era desajustado perante as gravosas circunstâncias do caso concreto e comprometiam irremediavelmente a crença da comunidade na validade das normas incriminadoras violadas, não sendo sequer comunitariamente suportável.

Assim sendo, não se verificam os pressupostos da suspensão da pena, previstos no art. 50.º do CP, como também pedido pelo recorrente.

Em conclusão: improcede a argumentação do recorrente e consequentemente o recurso, sendo certo que não foram violados os princípios e as normas por si invocados.


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III - Decisão

Pelo exposto, acordam nesta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça, em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 UC`s.


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Processado em computador e elaborado e revisto integralmente pela Relatora (art. 94.º, n.º 2, do CPP), sendo depois assinado pela própria e pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos.

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Supremo Tribunal de Justiça, 02.10.2024

Maria do Carmo Silva Dias (Relatora)

José Luís Lopes da Mota (Adjunto)

Antero Luís (Adjunto)

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1. Transcrição, mas sem negritos, nem sublinhados.

2. Da motivação do acórdão sob recurso consta o seguinte:

  A Convicção do Tribunal:

  A audiência de julgamento decorreu com o registo das declarações e depoimentos nela prestados.

  Tal circunstância, permitindo uma ulterior reprodução desses meios de prova e um efectivo controlo do modo como o Tribunal formou a sua convicção, deve, também nesta fase do processo, revestir-se de utilidade e dispensar o relato detalhado dos mesmos.

  Concretizando, considerou-se desde logo o teor de:

  - Relatório de perícia de avaliação do dano corporal de fls. 309 a 311 e 330 a 332;

 - Relatório de exame pericial n.º .......85-BBG do LPC da Polícia Judiciária;

  - Auto de notícia de fls. 36 e 37;

  - Autos de apreensão de fls. 38, 42; 43 e 44;

  - Aditamento de fls. 41;

  - Reportagem fotográfica de fls. 47 a 49;

  - Comunicação de notícia de crime de fls. 52;

  - Auto de inspecção judiciária de fls. 55 a 58

  - Auto de apreensão de fls. 59;

  - Relatório de fls. 68 a 85;

  - Boletim de urgência de fls. 87 e 88;

  - Relatório de fisiatria de fls. 323;

  O arguido prestou declarações procurando demonstrar que nunca teve qualquer intenção de matar a vítima (que não conhecia) e que apenas o atingiu porque ele veio na sua direcção. Naquela noite foi ter com um amigo, sendo que se encontravam lá outros amigos, entre os quais a DD. A determinada altura apareceu a vítima BB, que trazia uma “mini” na mão e começou a oferecer droga aos presentes. A DD exaltou-se e derramou-lhe uma bebida por cima. O BB atirou a garrafa da cerveja e foi ter com os amigos, tendo voltado pouco tempo depois acompanhado de 6 ou 7 pessoas. Deram-lhe um pontapé e começou a ser atingido por várias pessoas. Nesse momento deu uns passos atrás para se defender e abriu a faca que trazia consigo, no sentido de repelir mais agressões. Quando tinha a faca apontada, o BB veio na sua direcção aos saltos e acabou por cair por cima da faca. Negou ter pensado que a vítima era polícia, que tivesse sido ele a iniciar as agressões, que se tivesse afastado do local e tivesse regressado correndo na direcção do BB, anunciando que era assim que se acabava com aquilo. Relativamente à faca, justificou que a tinha para se defender porque já o tinham ameaçado, embora não soubesse concretizar qualquer ameaça.

  Esta dinâmica descrita pelo arguido não faz sentido, na medida em que não se mostra verosímil que o mesmo conseguisse dar uns passos atrás, tirar a navalha do bolso, abri-la, aproximar-se e desferir o golpe, ao mesmo tempo que estavam várias pessoas a agredi-lo, designadamente o BB, que estava de frente para si. Acresce também que o arguido não logrou explicar o facto de, sendo dextro e encontrando-se o BB à sua frente, o tenha atingido do lado direito. Também não apresentou explicação plausível para o facto de a pessoa atingida ter sido precisamente aquela que primeiro se dirigiu ao grupo onde se encontrava e a quem a DD já havia atirado a bebida. Tal como não foi capaz de explicar o motivo pelo qual, ao sentir-se ameaçado por todas aquelas pessoas, não fugiu do local e optou por ficar e utilizar a faca que tinha na sua posse.

  A versão do arguido (que já apresentava as fragilidades referidas) caiu por terra face às declarações objectivas, escorreitas e sinceras de BB, que descreveu o motivo pelo qual foi ter com o grupo do arguido – estava com uns amigos, ficou para trás e perguntou se os tinham visto; a imediata reacção de uma das raparigas que lá se encontravam (DD), que de imediato começou a dizer que ele era bófia e que tinha de sair dali, partiu-lhe a cerveja que tinha na mão e atirou-lhe à cara o whisky que estava a beber; o abandono do local para ir procurar os amigos, que quiseram ir pedir explicações do sucedido; o momento em que regressou ao local e a imediata reacção do arguido – perguntando-lhe se tinha ido chamar os amigos, tendo-lhe de imediato desferido uma chapada e fugido do local; o confronto físico que se iniciou entre todos e o regresso do arguido, dizendo “querem ver como isto acaba”, ao mesmo tempo que lhe desferiu uma facada. Não se apercebeu que tinha uma faca, só sentiu “uma coisa a espetar”. Não conhecia o arguido nem nenhuma das demais pessoas que o acompanhavam. Após se ter apercebido que tinha levado uma facada, um dos seus amigos levou-o para o local onde veio a ser assistido.

  A testemunha GG confirmou o que foi dito pelo BB, afirmando que o arguido se dirigiu de imediato àquele, não tendo sido atingido por acaso (como o arguido pretendeu fazer crer).

  As testemunhas DD e HH faziam parte do grupo onde se encontrava o arguido e pretenderam, sem sucesso, sustentar a versão daquele. Foi evidente a parcialidade dos seus depoimentos e a relutância em estarem a prestar declarações em Tribunal. Ainda assim a testemunha DD acabou por confirmar que efectivamente pensaram que a vítima era polícia “alguém disse que era paisana”.

  As testemunhas CC, inspector da Polícia Judiciária, e II, amigo do ofendido, nada acrescentaram relativamente à demais prova produzida.

  Em face do que ficou exposto, dúvidas não restaram ao Tribunal de que os factos ocorreram da forma supra descrita.

  Quanto à intenção do arguido, a mesma extrai-se por inferência da prova dos factos objectivos, conjugada com as regras da experiência comum. Inexiste qualquer dúvida de que o mesmo quis e procurou tirar a vida ao BB, o que só não logrou alcançar devido à pronta e eficaz assistência médica e cirúrgica que lhe foi prestada. Se outra fosse a sua intenção teria actuado de maneira diferente: não teria dito “querem ver como isto acaba”; teria fugido do local ou teria brandido a faca em movimentos laterais, de corte, ao invés de desferir um golpe em profundidade. E da forma de actuação do arguido infere-se ainda que o mesmo agiu movido por motivos fúteis, insignificantes e de forma frívola, apenas pelo prazer de causar sofrimento, demonstrando desprezo pelo valor jurídico da mais elevada dignidade que é a vida.

  Cumpre ainda referir que a ausência de arrependimento do arguido resultou para nós evidente em face do seu comportamento em audiência. No decurso das declarações de BB, quando lhe estava a ser perguntado se o arguido já lhe havia pedido desculpa, este sinalizou que queria falar, tendo o Tribunal interpretado tal gesto como demonstração de vontade de se desculpar perante aquele. Quando lhe foi dada a palavra verificou-se que o que o arguido afinal pretendia era questionar a vítima acerca das declarações que tinha acabado de prestar! E quando foi chamado à atenção de que lhe tinha sido dado a palavra não para questionar ofendido, mas sim no pressuposto de que queria pedir desculpa, referiu que “posso pedir mas o que queria era perguntar-lhe uma coisa”! Tal conduta demonstrou à saciedade que o pedido de desculpas apresentado não foi sincero, inexistindo qualquer acto demonstrativo de arrependimento.

  A respeito da personalidade do arguido e suas condições de vida, considerou-se o teor do CRC e relatório social juntos aos autos, que nenhuma reserva suscitaram, sendo que o depoimento da avó do arguido, EE nada mais acrescentou ao que já constava do relatório social.

 Com respeito ao pedido de reembolso deduzido pela ULSBA, considerou-se a factura junta., conjugada com a demais documentação clínica a que supra se aludiu.

  Os factos relativos ao pedido de indemnização civil deduzido por BB resultaram provados em face das suas declarações que, como já se disse, nenhuma reserva suscitaram ao Tribunal, conjugadas com o depoimento das testemunhas GG e JJ, mão do demandante, que relatou de uma forma objectiva e sincera o sofrimento causado ao seu filho, conjugados com as regras da experiência comum.

3. Assim, entre outros, Ac. do STJ de 13.07.2005, proferido no processo nº 2122/05, relatado por Henriques Gaspar (consultado no site da dgsi).

4. Ibidem.

5. Se o agente da PSP encosta uma arma à cabeça da vítima por mero exibicionismo e prime o gatilho, matando-o; se o agente andava de relações cortadas com a vítima há quatro anos por motivo de desvio de águas; se a vítima exerce o direito de queixa face a uma agressão física de um sobrinho; se a vítima recusa continuar a ser amante do agente; se o agente atinge a tiro um companheiro de café apenas porque este pretendia dissuadi-lo de ir à procura da mulher e do amante para os matar; se o agente mata a vítima porque ela lhe disse que se ia embora – cfr. Albuquerque, Paulo Pinto de, “Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, Universidade Católica Editora, 3.ª ed. Atualizada, pág. 512 e 513.

6. Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayette, Código Penal Anotado e Comentado, Quid Juris, Sociedade Editora, Lda, Lisboa, 2008, p. 345.

7. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2008, p. 351.

8. Anabela Rodrigues, «O modelo da prevenção na determinação da medida concreta da pena», in RPCC ano 12º, fasc. 2º (Abril-Junho de 2002), 155, refere que o art. 40.º CP condensa “em três proposições fundamentais, o programa político-criminal - a de que o direito penal é um direito de protecção de bens jurídicos; de que a culpa é tão só um limite da pena, mas não seu fundamento; e a de que a socialização é a finalidade de aplicação da pena”.

9. Neste sentido, Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, Parte geral II, As consequências jurídicas do crime, Editorial Notícias, 1993, p.198.

10. Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit., p. 72.

11. Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit., p. 214.

12. Jorge de Figueiredo Dias, "Sobre o estado actual da doutrina do crime”, RPCC, ano 1º, fasc. 1º (Janeiro-Março de 1991), p. 29.

13. Assim, entre outros, Ac. do STJ de 11/06/2003, proferido no processo nº 03P1657 (relatado por Henriques Gaspar), consultado no site www.dgsi.pt.

14. A este propósito ver, entre outros, Ac. do STJ de 7/12/2006, proferido no proc. nº 06P4077 (relatado por Pereira Madeira), de 14/06/2006, proferido no proc. nº 06P2037 (relatado por Simas Santos), de 3/03/2005, proferido no proc. nº 04P4706 (relatado por Henriques Gaspar), de 14/10/2003, proferido no proc. nº 04P218 (relatado por Pereira Madeira), todos consultados no mesmo site.

15. Neste sentido, ac. STJ de 6/05/2021, proferido no proc. nº 793/19.1S7LSB.S1 (relatado por Helena Moniz), consultado no mesmo site.

16. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, Parte geral II, As consequências jurídicas do crime, p. 302.