Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
08P1884
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SIMAS SANTOS
Descritores: RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO
ESPECIFICAÇÕES NECESSÁRIAS
CONCLUSÕES DA MOTIVAÇÃO
CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
Nº do Documento: SJ2008060518845
Data do Acordão: 06/05/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário :
1 – Se nas conclusões da motivação se não especificam os pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados, pois que se dirige genericamente a toda a matéria provada, mesmo a estabelecida com base nos exames e perícias efectuados, e depois a toda a matéria da sua culpabilidade e não indica as provas que, na opinião do recorrente impõem decisão diversa da recorrida, apresentando antes a sua leitura subjectiva de todo o julgamento e que não contém qualquer referência aos suportes técnicos, deve entender-se que não foi cumprido o formalismo dos n.ºs 3 e 4 do art. 412.º do CPP, por respeitar o recurso a matéria de facto
2 – E se essas especificações não constam do texto da motivação, não deve o recorrente ser convidado a corrigir as conclusões da motivação.
3 – Com efeito, o ónus de formular conclusões da motivação do recurso visa, assim, proporcionar ao tribunal um maior facilidade e rapidez na apreensão dos fundamentos deste. E, para isso, aquelas devem conter um resumo preciso e claro dos fundamentos de facto e de direito da tese ou teses defendidas na motivação, de tal modo que possibilite um apreciação crítica ao tribunal de recurso. Daí que, quando o texto da motivação contenha fundamentos que não reaparecem nas conclusões, seja compreensível que se admita a correcção: a impugnação assentou também naqueles fundamentos que não aparecem, ou só aprecem incorrectamente retomados nas conclusões, que importa corrigir.
4 – Mas se no texto que fixa os fundamentos da impugnação não contem algum dos que depois aparecem nas conclusões, também é compreensível que se não admita a correcção do texto da motivação. É que então a impugnação não assentou naquelas razões do pedido que só aparecem nas conclusões.

5 – Quando as conclusões (algumas das conclusões) não encontram correspondência no texto da motivação, está-se perante a insuficiência da motivação que deve ser tratada, no respectivo âmbito, como falta de motivação.

6 – A recente Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, veio, aliás, consagrar esta posição na nova redacção dada ao art. 417.º do CPP. Estabelece no seu n.º 3 que, se a motivação do recurso não contiver conclusões ou destas não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.ºs 2 a 5 do art. 412.º, o relator convida o recorrente a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afectada. Mas logo esclarece, no n.º 4, que tal aperfeiçoamento não permite modificar o âmbito do recurso que tiver sido fixado na motivação. Ou seja, que o texto da motivação constitui o limite da correcção possível das conclusões.

Decisão Texto Integral:
1.
O Tribunal Colectivo do 2.° Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz (proc. n.° 29/05.2MAFIG) condenou o AA como autor de: (i) um crime de homicídio simples do art. 131° do C. Penal (BB), na pena de 14 anos de prisão; (ii) um crime de homicídio qualificado dos art.°s 131.º e 132°, n.°s 1 e 2, al. d) do C. Penal (CC), na pena de 20 anos de prisão; (iii) um crime de homicídio qualificado dos art.°s 131° e 132°, n°s 1 e 2, al. d) do C. Penal (DD), na pena de 22 anos de prisão; (iv) um crime tentado de coacção sexual dos art.°s 22°, n.°s 1 e 2, als a) e c), 23.°, 72.°, n.° 1, 73.°, n.° 1, als a) e b) e 163°, n.° 1 do C. Penal (CC), na pena de 10 meses de prisão; (v) um crime tentado de coacção sexual dos art.°s 22°, n.°s 1 e 2, als a) e c), 23.°, 72.°, n.° 1, 73.°, n.° 1, als a) e b) e 63°, n.° 1 do C. Penal (DD), na pena de 12 meses de prisão; (vi) um crime de ocultação de cadáver do art. 254.°, n.° 1, al. a) do C. Penal (CC), na pena de 18 meses de prisão; (vii) um crime de ocultação de cadáver do art. 254.°, n.° 1, al. a), do C. Penal (DD), na pena de 20 meses de prisão; (viii) um crime de profanação de cadáver, do art. 254.°, n.° 1, al. b), do C. Penal (DD), na pena de 18 meses de prisão; (ix) um crime de denúncia caluniosa do art. 365.°, n.°s 1 e 3, al. a), do C. Penal, na pena de 18 meses de prisão; (x) em cúmulo jurídico foi o arguido condenado na pena única de 25 anos de prisão; (xi) condenado na proibição de conduzir qualquer espécie de veículo motorizado pelo período de 30 meses; (xii) condenado o arguido a pagar aos demandantes RR e EE a quantia global de 115.000 euros, acrescida de juros de mora a contar da data deste acórdão e até integral pagamento; aos demandantes GG e BB a quantia global de 155.000 euros, acrescida de juros de mora a contar da data deste acórdão e até integral pagamento; à demandante GG a quantia global de 100.000 euros, acrescida de juros de mora a contar da data deste acórdão e até integral pagamento; à demandante GG a quantia a liquidar em execução de sentença e correspondente ao dano referente à privação de alimentos, a qual não poderá exceder 50.000 euros, acrescida de juros de mora a contar da data da notificação do pedido de indemnização.

Inconformado recorreu o arguido para a Relação de Coimbra, impugnando somente a matéria de facto provada.

Aquele Tribunal Superior (recurso n.º 29/05.2MAFIG.C1), por acórdão de 20.2.2008, invocando o disposto no art. 420.°, n.º 1, do CPP, decidiu rejeitar o recurso por manifesta improcedência.

Ainda inconformado, recorre agora o arguido para este Supremo Tribunal de Justiça, sustentando que deveria ter sido convidado a suprir a deficiência indicada pela Relação, antes de ser rejeitado o recurso.

Responderam os assistentes RR de Oliveira Isidoro e mulher EE , a assistente FF, o Ministério Público junto do Tribunal recorrido e os assistentes GG e HH, sustentando que não só as conclusões, mas as próprias motivações de recurso do arguido para a Relação, não enunciavam especificamente os fundamentos do recurso, pelo que não havia lugar ao pretendido convite à correcção.

Distribuídos os autos neste Supremo Tribunal de Justiça, teve vista o Ministério Público que, não obstante dever ser o recurso conhecido em conferência (cf. art. 417.º, n.º 3 do CPP) e as demais circunstâncias, se limitou a apor o seu visto.
Colhidos os vistos teve lugar a conferência, pelo que cumpre conhecer e decidir.
2.
E conhecendo.
A única questão que vem colocada no presente recurso consiste em saber se, o recorrente deveria ter sido convidado a completar/corrigir as conclusões da sua motivação dirigida à Relação de Coimbra, antes de ser apreciada e decidida a rejeição do recurso.
Sustenta o recorrente que deveria ter sido convidado a suprir essa alegada insuficiência como vem sendo unanimemente considerado pela jurisprudência, mormente dos ACTC nº 529/2003 de 31.10 e AC do STJ de 30.10.2002 processo nº 2535/02, e AC STJ 2007.09.26 nº 26873, como também o art. 690º, n.º 4 do CPC (conclusão 1ª), jurisprudência e normativos legais violados pela Relação (conclusão 2ª).

Que não podia a Relação decidir não conhecer do recurso de matéria de facto na apreciação assim feita pelo Tribunal colectivo da prova produzida em audiência, «embora tivesse considerado que o arguido não recorreu da matéria de facto nos termos previstos no art. 412.º, n.ºs 3 e 4 do CPP», por não ter indicado os pontos de facto que considera incorrectamente julgados nem as provas que impõem decisão diversa, tudo por referência aos suportes técnicos, deveria antes ter convidado o arguido a corrigir as conclusões do seu recurso, só depois, face à resposta, decidindo a questão (conclusão 3ª)

Daí que em conclusão final (conclusão A) sustente que a decisão recorrida seja nula, nos termos do art. 379.º, n.º. 1, al. c), do CPP, o que requer se declare com as necessárias e legais consequências, reenviando os autos ao Tribunal de 1ª Instância, com vista à repetição do julgamento e melhor apreciação dos factos supra mencionados.

Mas importa fazer, desde já uma correcção a este pedido final.
Mesmo que seja procedente a arguição, o que de seguida se analisará, o resultado nunca poderia ser o que pede o recorrente.
Com efeito, com a declaração da nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia, nunca o recorrente poderia obter o provimento do recurso que interpôs para a Relação: reenvio para a 1.ª Instância, para novo julgamento da matéria de facto.
Aquela declaração de nulidade levaria a que a Relação tivesse de conhecer então a questão que oportunamente não apreciara, assim se sanando a nulidade, e nada mais.
Aliás, a motivação de recurso aponta mais para um erro de julgamento por não ter sido formulado um convite à correcção das conclusões, que no caso se impunha e que terá de ser feito, se for procedente o presente recurso, ficando, ainda assim, o conhecimento da questão de facto dependente da resposta a tal convite, por parte do recorrente. A Relação não conheceu efectivamente da questão de facto colocada pelo recorrente, mas tal se ficou a dever ao entendimento que expressou de que aquele não dera cumprimento às especificações da lei e não era caso de formulação de convite ao recorrente para a correcção.
Conhecida a posição do recorrente, vejamos o teor da decisão recorrida, quanto a esta questão, nos passos essenciais.
A Relação começou por lembrar que, para que pudesse reexaminar a prova teria o recorrente que cumprir o formalismo correspondente, designadamente o do n.º 3 do art. 412.º do CPP, por respeitar a matéria de facto, devendo as conclusões conter:
– quais os pontos de facto que considera incorrectamente julgados (a),
– as provas que impõem decisão diversa da recorrida (b) e
– as que devem ser renovadas (c),
com referência aos suportes técnicos (n.° 4).
E ajuizou, depois, que:

«basta uma simples leitura das conclusões para concluir que no caso em apreciação não foi dado o mínimo cumprimento ao legalmente estipulado e que o recorrente se limitou a tecer considerações genéricas e a emitir opiniões muito pessoais que não escora, sobre o teor fáctico da sentença.

Com efeito, é patente o incumprimento já que das mesmas não constam e quais os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, quais os segmentos dos depoimentos e declarações que na opinião do recorrente impunham que tivesse havido decisão diversa da proferida pelo tribunal “a quo” nem que suportes técnicos os sustentam.

Limita-se a tecer considerações pessoais sobre o teor do julgamento

Ora, como se disse, não é esta a fórmula legal que tem que obrigatoriamente ser seguida pelo recorrente para defender as suas razões.

Para que cumprisse as exigências legais e assim pudessem ser apreciadas as suas razões, teria o recorrente que ter nelas especificado quais os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, quais os segmentos dos depoimentos que impõem decisão diversa da recorrida e quais os suportes técnicos que as contém, como determinam os n.°s 3 e 4 do art.° 412.°.

O que não aconteceu e que por ser tão evidente, não necessita de maiores explanações.»

Ponderou, então, a Relação, a possibilidade de dirigir ao recorrente o convite a que alude o art. 690°, n° 4 do CPC – aplicável por força do art. 4° do CPP –, apresentação de conclusões corrigidas, o que logo afastou com base nas seguintes considerações:

«constituindo o texto da motivação (stricto sensu) limite absoluto que não pode ser extravasado nas conclusões (e sendo estas, logicamente, um resumo dos fundamentos porque se pede o provimento do recurso há que concluir que as exigências legais constantes dos n.°s 3 e 4 do art.° 412.° se aplicam às motivações, ainda que para estas haja um menor formalismo a cumprir e consequentemente uma maior liberdade no modo de explanação das divergências para com a decisão recorrida.

Quer-se com isto dizer que o tudo o que consta das conclusões tem que estar contido na motivação stricto sensu, ou seja, tudo o que a lei impõe que conste naquelas, tem também que constar nestas.

Ora, no caso “sub judice”, as motivações “stricto sensu” padecem dos mesmos males que as conclusões: o recorrente não faz nelas constar quais os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, quais os segmentos dos depoimentos e declarações que na sua opinião impunham que tivesse havido decisão diversa da proferida pelo tribunal “a quo”, nem, como é evidente, quais suportes técnicos os sustentam.»

Como resulta das conclusões da motivação de recurso para este Tribunal, o próprio recorrente acaba por aceitar que efectivamente, e como entendeu a Relação, as conclusões da sua motivação para aquele Tribunal Superior não cumpriam as especificações prescritas pelos n.ºs 3, als. a) e b) e 4 do art. 412.º do CPP.

E, na verdade, assim é.

São as seguintes as conclusões de motivação do recurso para a Relação:

«1) O presente recurso incide, de forma unívoca, sobre o julgamento da matéria de facto levada a cabo pelo Douto Tribunal Recorrido.

Efectivamente

2) Na perspectiva do recorrente, a unicidade valorativa assente no depoimento das testemunhas, está em manifesta ruptura com a prova produzida e discutida em sede de audiência de discussão e julgamento. Com efeito,

3) A cabal apreciação do material probatório trazido a colação na aludi da sede legitima asserção de que se mostrou incorrectamente julgada o preceito legal vertido no art.° 412º nº 3 alínea a) do Código de Processo Penal a factualidade dada como provada na douta sentença.

Isto é dado ao conteúdo dos depoimentos, estamos perante um caso manifesto de erro na apreciação na prova. Em momento algum a prova apresentada indica directamente o recorrente como responsável pela prática de tais crimes.

Assim como as provas obtidas mediante coacção não devem ser valoradas art.° 124°

Relativamente a reconstituição, o arguido referiu em tribunal que os locais tinham sido indicados pelo Rogério tio da CC.

Assim como as escutas não foram mais do que o assumir de uma culpa que não era sua.

4) Na verdade os depoimentos são lacunosos desconexos e com dados empíricos patente nos autos, não podem nunca servir de base a condenação do arguido.

5) A essa conclusão obsta o matricial principio in dubio pro reo com inequívoca dignidade constitucional advinda da formulação da presunção de inocência plasmada no art.° 32° n.° 2 da Constituição da República Portuguesa que manda valorar qualquer non liquet em matéria probatória, sempre em beneficio da posição processual do arguido.

Com efeito,

6) Sob pena de se esvaziar axiologicamente o estado, nem para lutar contra o crime, pode prescindir desse garante de tutela de direitos inatos a defesa do arguido, como a violação dos direitos adjectivos.

Nestes termos na procedência do presente recurso deve ser reconhecida a errónea valoração da prova perpretada pelo douto tribunal a quo e consequentemente absolvido o arguido dos crimes em que foi condenado.»

Perante estas conclusões não oferece qualquer dúvida a bondade do julgamento efectuado através da decisão recorrida, quando é patente que, nelas, se não especificam os pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados, pois que se dirige genericamente a toda a matéria provada, mesmo a estabelecida com base nos exames e perícias efectuados, e depois a toda a matéria da sua culpabilidade.
Como não indica as provas que, na sua opinião impõem decisão diversa da recorrida, apresentando antes a sua leitura subjectiva de todo o julgamento e que não contém qualquer referência aos suportes técnicos.
Mas deveria ter sido feito o convite à correcção propugnado pelo recorrente?
Este Supremo Tribunal de Justiça (cfr. v.g. o AcSTJ de 07/10/2004, proc. n.º 3286/04-5, com o mesmo Relator) tem vindo a considerar inconstitucional, por violação dos direitos a um processo equitativo e do próprio direito ao recurso, as normas dos n.ºs 3 e 4 do art. 412.º do CPP, na versão da Lei n.º 59/98, na interpretação segundo a qual o incumprimento dos ónus aí fixados, conduz à rejeição do recurso, sem a possibilidade de aperfeiçoamento (cfr. Acs de 26-9-01, proc. n.º 2263/01, de 18-10-01, proc. n.º 2374/01, de 10-04-02, proc. n.º 153/00 e de 5-6-02, proc. n.º 1255/02)

Dessa posição resulta que, não tendo o recorrente dado cabal cumprimento às exigências do n.º 3 e especialmente do n.º 4 do art. 412.º do CPP, nas conclusões da motivação, mas tendo-o feito no texto dessa motivação, não pudesse, sem mais, a Relação rejeitar o recurso em matéria de facto, nem deixar de o conhecer. Entendendo que o recorrente não fornecia os elementos legais necessários para reapreciar a decisão de facto nos pontos que questiona, a solução não era "a improcedência", por imodificabilidade da decisão de facto, mas o convite para a correcção das conclusões.

Assim o vinha decidindo também o Tribunal Constitucional (Acs. n.º 259/03, DR, IIS, de 13.02.02 e n.º 140.04, DR, IIS, de 17-4-04) que distingue a deficiência resultante da omissão na motivação dessas especificações, caso em que o vício seria insanável, da omissão de levar as especificações constantes do texto da motivação às conclusões, situação que impõe o convite à correcção.

Veio o Tribunal Constitucional a declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma do art. 412.º, n.º 2, do CPP, interpretada no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, de qualquer das menções contidas nas suas alíneas a), b) e c) tem como efeito a rejeição liminar do recurso do arguido, sem que ao mesmo seja facultada a oportunidade de suprir tal deficiência (AcTC n.º 320/2002, DR-IA, 07.10.2002), não pode manter-se a decisão da Relação que decidiu não tomar conhecimento dos recursos no que se refere à decisão de facto, por não terem os recorrentes dado cumprimento ao imposto nos n.º 3 e 4 daquele art. 412.º. Nesse caso, a Relação deve tomar posição sobre a suficiência ou insuficiência das conclusões das motivações, sobre a posição assumida pelos recorrentes face à notificação ordenada ao abrigo do n.º 2 do art. 417.º do CPP e ordenar, se for caso disso, a notificação dos recorrentes para corrigirem/completarem as conclusões das motivações de recurso, conhecendo, depois, desses recursos (cfr. neste sentido o AcSTJ de 12/12/2002, proc. n.º 4987/02-5, com o mesmo Relator)

Também esclarecera este Tribunal (AcSTJ de 11/01/2001, proc. n.º 3408/00-5, com o mesmo Relator) que o convite a que se reporta o n.º 4 do art. 690.º do CPC se prende exclusivamente com as conclusões não abrangendo o texto da motivação. Este enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. Assim, no texto da motivação terão de estar especificamente indicados os fundamentos do recurso, fundamentos (ou razões do pedido) que devem reaparecer resumidos nas respectivas conclusões.

O ónus de formular conclusões da motivação do recurso (definiu-se no AcSTJ de 11/01/2001, proc. n.º 3408/00-5, com o mesmo Relator) visa, assim, proporcionar ao tribunal um maior facilidade e rapidez na apreensão dos fundamentos deste. E, para isso, aquelas devem conter um resumo preciso e claro dos fundamentos de facto e de direito da tese ou teses defendidas na motivação, de tal modo que possibilite um apreciação crítica ao tribunal de recurso.

Daí que, quando o texto da motivação contenha fundamentos que não reaparecem nas conclusões, seja compreensível que se admita a correcção: a impugnação assentou também naqueles fundamentos que não aparecem, ou só aprecem incorrectamente retomados nas conclusões, que importa corrigir.

Mas se no texto que fixa os fundamentos da impugnação não contem algum dos que depois aparecem nas conclusões, também é compreensível que se não admita a correcção do texto da motivação. É que então a impugnação não assentou naquelas razões do pedido que só aparecem nas conclusões.

Quando as conclusões (algumas das conclusões) não encontram correspondência no texto da motivação, está-se perante a insuficiência da motivação que deve ser tratada, no respectivo âmbito, como falta de motivação.

A recente Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, veio, aliás, consagrar esta posição na nova redacção dada ao art. 417.º do CPP, vigente aquando da prolação da decisão recorrida.

Com efeito, estabelece no seu n.º 3 que, se a motivação do recurso não contiver conclusões ou destas não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.ºs 2 a 5 do art. 412.º, o relator convida o recorrente a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afectada.

Mas logo esclarece, no n.º 4, que tal aperfeiçoamento não permite modificar o âmbito do recurso que tiver sido fixado na motivação. Ou seja, que o texto da motivação constitui o limite da correcção possível das conclusões.

E, na verdade, já se vinha pronunciando este Supremo Tribunal, como se deu notícia (cfr. v.g. o AcSTJ de 27/04/2006, proc. n.º 1287/06-5, com o mesmo Relator), pela necessidade de formulação de convite ao recorrente para completar as conclusões da motivação, mas só quando o recorrente formule pretensões e proceda a especificações no texto da motivação, mas exprima deficientemente tais pretensões e especificações nas respectivas conclusões.

O texto da motivação constitui, pois, um limite intransponível ao convite à correcção. Sujeita, como está, a apresentação da motivação a um prazo peremptório, apresentada a mesma, não pode ela ser aditada, através da correcção das conclusões, de matéria que o seu texto não contenha. Se o texto da motivação não contém os elementos, tidos em falta ou deficientemente expostos nas conclusões, não há lugar ao convite para correcção, por não poderem, nesse caso, ser aditados.

Face a esta orientação constante do Tribunal Constitucional e deste Supremo Tribunal de Justiça, vejamos se, no caso, o texto da motivação permitia e impunha a formulação do convite à correcção das respectivas conclusões.

Para tal importa considerar o texto da motivação de recurso do arguido para a Relação, do seguinte teor:

«Vem o recurso interposto do acórdão de fls 2451 a fls 2504 proferido pelo Tribunal Colectivo em 31 de Julho de 2007 que condenou o recorrente AA como autor
1. Condenar o arguido, como autor de um crime de homicídio simples, p. e p. pelo art. 131.º do CP de que foi vítima a BB, na pena de 14 anos de prisão;
2. Condenar o arguido, como autor de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts. 131.º e 132º do CP, de que foi vítima a CC, na pena de 20 anos de prisão;
3. Condenar o arguido, como autor de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts. 131.º e 132.º do CP’, de que foi vítima a DD, na pena de 22 anos de prisão;
4. Condenar o arguido, como autor de um crime tentado de coacção sexual, p. e p. pelos arts. 22º 23º 72º 73º l63º do CP, de que foi vítima a CC, na pena de 10 meses de prisão;
5. Condenar o arguido, como autor de um crime tentado de coacção sexual, p. e p. pelos arts. 22°1/2/a/c, 23º 72º 1, 73º .8 f(
1 do CP, de que foi vítima a DD, na pena de 12 meses de prisão;
6. Condenar o arguido, como autor de um crime de ocultação de cadáver, p. e p. pelo art. 254 do CP, de que foi vítima o cadáver da CC, na pena de 18 meses de prisão;
7. Condenar o arguido, como autor de um crime de ocultação de cadáver, p. e p. pelo art. 254 do CP, de que foi vitima o cadáver da DD, na pena de 20 meses de prisão;
8. Condenar o arguido, como autor de um crime de profanação de cadáver, p. e p. pelo art. 254 do CP, de que foi vítima o cadáver da DD, na pena de 18 meses de prisão;
9. Condenar o arguido, como autor de um crime de denúncia caluniosa, p. e p. pelo art. 365 do CP na pena de 18 meses de prisão;
10. Condenar o arguido na proibição de conduzir qualquer espécie de veículo motorizado pelo período de trinta meses;
11. Condenar o arguido a pagar aos demandantes RR e EE a quantia global de 115.000 euros, acrescida de juros de mora a contar da data deste acórdão e até integral pagamento;
12. Condenar o arguido a pagar aos demandantes GG e BB a quantia global de 155.000 euros, acrescida de juros de mota a contar da data deste acórdão e até integral pagamento;
13. Condenar o arguido a pagar à demandante GG a quantia global de 100.000 euros, acrescida de juros de mora a contar da data deste acórdão e até integral pagamento;
14. Condenar o arguido a pagar à demandante GG a quantia a liquidar em execução de sentença e correspondente ao dano referente à privação de alimentos, a qual não poderá exceder 50.000 euros, acrescida de juros de mora a contar da data da notificação do pedido de indemnização;
Com os quais não se concorda.
E não se concorda pelas razões a seguir expostas:
Quanto á matéria de facto, que ora se impugna, tendo-se em atenção a factualidade dada como verificada e os suportes técnicos juntos aos presentes autos e que a sustentam,
A)Como se depreende do requerimento de interposição de recurso a presente peça espelha o inconformismo do recorrente com a assunção factica eleita pelo Tribunal “a quo”.
Efectivamente, entende o recorrente, que a douta decisão está inquinado por uma deficiente valoração do material probatório sujeito à douta apreciação do Tribunal.
B) Os Tribunais normalmente podem ser caracterizados como o espaço do dissenso, o areópago onde se degladiam versões dessintónicas do mesmo pedaço de história.
Os presentes autos é um exemplo claramente demonstrativo dessa enunciação geral.
Deram-se como provados os factos supra referidos.
Perante tal factualidade eleita como consubstanciando para o recorrente os “pontos de facto incorrectamente julgados”-art 412º n 3,al.a)
C) Assim a convicção do Tribunal alicerçou-se, quanto aos factos nos depoimentos das testemunhas.
Só que, e salvo o devido respeito, não se fez prova credível na audiência de discussão e julgamento dos factos imputados ao recorrente que permitissem a prolação da sua condenação.
Vejamos:
D) Depoimentos V... e Manuel ...., inspectores da Polícia Judiciária que participaram nas investigações tendentes a determinarem a autoria dos crimes, casset. n lidas rotações 0750 a final, no lado B das rotações 0001 a final e no lado A da casset n 12 das rotaç 0001 a 0750 depoimentos que são questíonados porquanto o arguido mencionou que tinha sido coagido a confessar.
Depoimento de E...., funcionária da delegação da Procuradoria da República de Santa Comba Dão.
Esta testemunha prestou esclarecimentos sobre o teor de duas conversas que o arguido manteve com a depoente, ambas nas instalações do Tribunal Judicial de Santa Comba Dão.
Onde a mesma referiu que o recorrente se queixou de ter sido mal tratado pela polícia judiciária, e ela ter dito “que ele tinha direitos e que tinha havido mais pessoas que se queixaram e saíram a chorar dos interrogatórias da polida judiciária”
A mesma testemunha referiu que o recorrente descreveu a roupa que a CC trazia vestido. Cassete 17, lado A, contador 1608 até final, cassete 17, lado B, contador 000 até 1221)
Ora em momento algum o recorrente descreveu a roupa da CC pois como foi referido e esta nas fotos tiradas aquando da recolha de parte do cadáver, a descrição do soutien mencionada pela testemunha não coincide.
O depoimento da testemunha Ana ..., não foi valorado, mas o que é certo é que a mesma em julgamento só demonstrou como os direitos constitucionais do recorrente foram colocados em causa, pois a mesma foi confrontada com o facto de ter prestado declarações e vir em sede de audiência afirmar o contrário, ou seja, tinha declarado que linha visto a CC no dia do seu desaparecimento por volta das 18h.
Sendo assim nunca, poderia ser imputado ao recorrente a pratica de tal crime pois a essa hora o mesmo estava com a sua mulher, cassete 26 lado A das rotações 1920 a 2111.
O depoimento de António ...., o qual também não foi valorado e onde o mesmo refere ter visto “uma moça” que depois identificou como sendo a CC por volta das 8h da noite, e também não exclui que pudesse ser no dia do desaparecimento da mesma, cassete 26 lado B rotações 1894 a 2277.
O depoimento de José ..., o qual testemunhou em como no dia do desaparecimento da DD tinha visto o recorrente no seu quintal por 14.25. Cassete 24 lado A rotações 0914 a final e no lado B das rotações 0001 a 1732.
E) Evidentemente que todos os elementos probatórios sujeitos à apreciação do Tribunal são por este valorados livremente.
Mas, livre apreciação da prova, não é sinónimo de arbítrio, nem, muito menos, um convite a uma insindicável discricionariedade.
Pelo contrário “significa, por um lado, que a exigência de objectividade é ela própria um princípio de direito, ainda no domínio da convicção probatória, e implica, por outro lado, que essa convicção só será válida se for fundamentada, já que de outro modo não poderá ser objectiva” – Castanheira Neves, sumários de Processo Criminal, pág.50. Livre apreciação da prova, é pois, algo de obrigatoriamente informado por um momento crítico e racional, iluminado por critérios lógicos, empíricos e científicos que tomem objectiva a decisão. Isto é, “a convicção tem de se mostrar ‘objectivável e motivável’, portanto capaz de impor se aos outros” – Figueiredo Dias, Direito processual Penal, pág.205.
F) Face à prova produzida na audiência de discussão e julgamento, a douta sentença não poderia dar como assentes os factos que se elencaram como susceptíveis de críticas.
Tendo em linha de conta que a condenação foi baseada na prova testemunhal produzida e Relatórios de autópsia de fls. 186 a 193 (BB), 1.511 a 1.521 (DD).
Relatório de autópsia e de antropologia forense de fls. 1.186 a 1.191 (CC).
Odontograma de fls 168.
Relatório pericial que consta de fls. 180 a 182, referente ao cadáver recolhido na F. da Foz e cabelos que também foram recolhidos por ocasião da recuperação desse cadáver.
Informação de serviço de f 301.
Mapa de localização de fia 374 e correspondente fotografia de fia 375.
Documentos de fls. 376 a 385, referentes à ampla divulgação por órgãos de comunicação social do aparecimento do cadáver que viria a ser identificado como sendo da BB.
Auto de busca de fls. 492 e 493.
Relatório de antropologia forense de fls. 1.345 a 1.350 (CC).
Relatório de exame a cadáver de fls. 36 a 38 (BB), 642 a 644 (DD), 802 e 803 (CC).
Autos de exame directo de fls. 56, 78, 467, 503, 504, 614, 616 - A, 789, 817.
Fotografias de fls. 7 a 18, 45 a 51, 53, 86, 120 a 124, 468, 469, 505, 506, 526, 527, 609, 615, 635 a 641, 645 a 657, 708, 709, 771 a 777, 790 a 797, 804 a 807.
Cota de fls 890.
Termo de recebimento de fls. 525.
Relatório pericial que consta de fls. 478 a 488, especialmente na parte referente ao vestígio 9 (cabelos), relatório pericial que consta de fls. 719 a 730, especialmente na parte em que nele se menciona o vestígio n 2 (zaragatoa recolhida no interior da bagageira do veículo do arguido, junto ao trinco da porta), conjugados com o relatório pericial que consta de fls. 1.442 a 1.463, especialmente na parte em que a fls. 1.462 se fazem referências aos vestígios 2 (sangue da DD) e 9 (cabelos da CC).
Relatório pericial que consta de fls. 1.574 a 1.578.
Informação de serviço que consta de fls 768 a 770, referente à recuperação de parte de um cadáver que viria a ser identificado como sendo o da CC.
Documentos de fls. 101 a 135, 216 a 220, do apenso n.º 1 08/06.9GBSCD.
Informação de serviço que consta de fls. 610/611, referente à recuperação de um cadáver que viria a ser identificado como sendo o da DD.
Autos de interrogatório de fls. 517 a 521, 1.389 a 1.391, 1.419 a 1.423, levados em consideração apenas relativamente aos factos de que o arguido se encontrava acusado por referência ao crime de denúncia caluniosa.
Documentos de fls. 1.012 a 1.015, 1.170 a 1.176, 1.195, 1.197, 1.275 a 1.280, 1.438, 1.439, 1.493.
Relatório pericial que consta de fls. 2.425 a 2.434,
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Em momento algum a prova apresentada indica directamente o recorrente como responsável pela prática de tais crimes.
Assim como as provas obtidas mediante coação não devem ser valoradas art°124°
Relativamente a reconstituição, o arguido referiu em tribunal que os locais tinham sido indicados pelo Rogério tio da CC.
Assim como as escutas não foram mais do que o assumir de uma culpa que não era sua.
Cabe referir, neste momento, que em audiência de julgamento, o arguido revelou que só assumiu a autoria das condutas que descreveu no primeiro interrogatório, pelo facto de anteriormente ter sido violentado, física e psiquicamente, por parte dos investigadores da PJ, em especial pelo inspector V.., e pela circunstância de lhe ter sido dito por esses mesmos investigadores que a defensora oficiosa que lhe tinha sido nomeada estava conluiada com o tribunal e que, por j não lhe restava outra alternativa que não fosse a de assumir, perante a M. Juiz de Instrução, a confissão que já tinha levado a efeito no seu interrogatório na PJ. Cassete n.º 5 voltas 1 a 806 do lado A.
A conjugação dos aludidos vectores, caldeada com o princípio in dubio pró reo importaria a existência de uma dúvida razoável, sempre esgrimível, unicamente, em benefício da posição processual do arguido.
A metamorfose desta factualidade, tal como se propugna, implicaria, necessária e obrigatoriamente, a absolvição do arguido, o ora aqui recorrente.
Os direitos constitucionais do arguido foram colocados em causa, desde o início.
O mesmo, nunca foi tratado como presumível autor mas sim como culpado. Pelo que não se verificou o in dubio pró reo que é o garante do arguido perante a lei.
Para existir comportamento criminoso, terá sempre que existir o iter criminis. Que não existiu por parte do arguido.
Quanto à matéria de facto:
Quanto a prova testemunhal, não foi produzida prova testemunhal cabal que prove os factos da acusação.
Assistiu-se aqui a uma adulteração da prova testemunhal, as testemunhas conversaram umas com as outras, relatavam o que se passava na sala de audiências e discutiam os factos.
Para esse facto contaram certamente com a ajuda da comunicação social, que desde que o arguido foi detido, relataram todas as “possíveis provas” existentes, todos os dados do processo desde horas, hábitos, roupa usada pelas vítimas etc.
Foi só preciso ler os jornais, estudar bem os dados e vir testemunhar.
Pelo que tal prova não tem qualquer credibilidade.
Aliás foram as próprias testemunhas que enalteceram o carácter, personalidade e postura do arguido, dizendo mesmo que não tinham “nada contra ele, só depois de saberem dos factos”, ou seja depois de lhes terem sido dito pela polida judiciária ou pela comunicação social, aí mudaram as suas histórias, tendo decidido acusá-lo e afirmar que o mesmo tinha condutas impróprias. E que condutas serão essas?
O arguido devia ser inocente até prova em contrário
Os direitos constitucionais do arguido foram colocados em causa, desde o início.
O mesmo nunca foi tratado como presumível autor mas sim como culpado. Pelo que não se verificou o in dubio pró reo que é o garante do arguido durante todo o processo.
Para existir comportamento criminoso, terá sempre que existir o iter criminis. O que não existiu por parte do arguido.
O arguido foi tratado como culpado, foi acusado de ser um serial killer e um psicopata, quando não existe nenhuma decisão no processo.
Toda a forma como foi conduzido o processo, as fugas de informação condicionaram toda a defesa e todo o julgamento.
Relativamente ao arguido, não existe provas concretas que o liguem as vitimas.
Não foram encontrados quaisquer vestígios seus.
Logo não existe nexo causalidade que ligue o arguido aos crimes. Nexo causalidade entre fados descritos e provados e os resultados.
Como diz o Prof. Costa Andrade
O processo penal, reconhece o principio nemo tenetur se ipsum accusare, onde desde logo existe a tutela jurídico — constitucional de valores ou direitos fundamentais, como a presunção de inocência.
Ainda no plano constitucional, há que ter em linha de conta o preceituado no art. 32 4 que prescreve a nulidade das provas obtidas mediante coacção.
A mesma sanção, esta prevista para as provas auto -incriminatórias obtidas a custa de coacção, ameaças, perturbações de memória ou da capacidade de avaliação, ou meios enganosos.
Por ultimo disser se a que este principio não comporta cortes, nem sequer graduações e nesse sentido utilizando uma conhecida metáfora de RADBRUCH, o principio terá de colher o respeito tanto do juiz que “habita o andar nobre da casa, onde predominam formas esmeradas de tratamento”como da polícia criminal que ocupa a “cave do edifício, onde a regra é o recurso a processos mais rudes de tratamento”.»

Perante este texto, não merece censura a decisão da Relação de não formular o convite a que alude os art.ºs art. 690°, n° 4 do CPC e 417.º, n.º 3 do CPP.
Na verdade, das especificações que já se viu serem necessárias para desencadear o reexame da questão de facto com a amplitude pretendida pelo recorrente, só se encontram, no texto da motivação, referências a suportes técnicos de gravação. Mas, mesmo essas não se referem, como é suposto pela norma, aos meios de prova que impõem uma decisão diversa da tomada quanto aos pontos concretos enunciados pelo recorrente.
É que, não só não se especificam os pontos de facto que se consideram incorrectamente julgados, como não se procura estabelecer que os meios de prova que se indicam imponham decisão diversa.
Antes se referem todos os meios de prova e todos os factos provados, mesmo aqueles que estão provados por exames, cuja credibilidade e valor probatório, nem no recurso são abalados.
Antes questiona o recorrente em bloco a matéria de facto apurada, procurando sobrepor a sua visão do que sucedeu em todo o julgamento à que o Tribunal de 1.ª Instância obteve e acolheu na decisão de facto.
Ora, tem decidido uniformemente este Supremo Tribunal de Justiça (cfr. v.g. o AcSTJ de 9/3/2006, proc. n.º 461/06-5, de 9/2/2006, proc. n.º 4389/05-5, de 15/12/2005, proc. n.º 2951/05-5, de 16/6/2005, proc. n.º 1577/05-5 e de 17/2/2005, proc. n.º 4716/04-5, todos com o mesmo Relator) que, se o recorrente se dirige à Relação não se limitando a indicar alguma prova, com referência a suportes técnicos, mas na totalidade desses depoimentos e não qualquer segmento dos mesmos, acaba por não indicar as provas que impõem uma decisão diversa quanto à questão de facto.

É que o recurso de facto para a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1 .ª instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes é um remédio jurídico destinado a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros.

E se o recorrente não faz, nem nas conclusões, nem no texto da motivação, as especificações ordenadas pelos nºs. 3 e 4 do art. 412.º do CPP, não há lugar ao convite à correcção das conclusões, uma vez que o conteúdo do texto da motivação constitui um limite absoluto que não pode ser extravasado através do convite à correcção das conclusões da motivação.

No caso sujeito, já se viu, o recorrente também não procede no texto da motivação às especificações devidas, pelo que vem andou a Relação em não formular o convite à correcção das conclusões.

Aliás, nem na motivação do recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, procura em boa verdade demonstrar, como lhe competia, através da exegese da motivação de recurso que dirigiu à Relação, que esse Tribunal Superior errara e que, contra o que decidira, da motivação constavam todas as especificações, ficando-se por afirmações genéricas e abstractas.

3.

Pelo exposto, acordam os juízes da (5.ª) Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente, com a taxa de Justiça de 6 Ucs.

Lisboa, 5 de Junho de 2008

Simas Santos (Relator)

Santos Carvalho