Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2.ª SECÇÃO | ||
Relator: | MARIA DA GRAÇA TRIGO | ||
Descritores: | DECISÃO ARBITRAL AÇÃO DE ANULAÇÃO NOTIFICAÇÃO CADUCIDADE PROCESSO ARBITRAL CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM JUNÇÃO DE DOCUMENTO VOTO DE VENCIDO CERTIDÃO ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO MODIFICABILIDADE DA DECISÃO DE FACTO PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ADMISSIBILIDADE DE RECURSO RECURSO DE REVISTA | ||
Data do Acordão: | 09/19/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
Sumário : | Não se verificam os invocados fundamentos para a anulação da decisão arbitral | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - Relatório 1. SOLIDPLANET - Engenharia, Arquitectura e Design de interiores, Lda. intentou a presente acção de anulação de acórdão arbitral contra CARLMAN - Sociedade de Construções, Lda., alegando o seguinte: - A requerente, a requerida e os árbitros acordaram/fixaram que o Tribunal Arbitral deveria proferir acórdão até ao dia 15 de Junho de 2023; - O acórdão arbitral foi notificado à autora via email, no dia 15 de Junho de 2023, às 20h05m, mas, nos termos do disposto no ponto 15 da respectiva Ata da Instalação, os actos do Tribunal Arbitral são notificados através de correio electrónico, considerando-se, para todos os efeitos, as notificações e demais comunicações efectuadas no dia seguinte ao do envio ou no primeiro dia útil seguinte a esse envio sempre que aquele corresponda a dia não útil; ou seja, a eficaz notificação do acórdão arbitral foi efectuada à autora no dia 16 de Junho de 2023, no primeiro dia após o prazo de caducidade previsto para a arbitragem, pelo que o acórdão é anulável nos termos do disposto no artigo 46.º, n.º 3, alínea vii), da Lei de Arbitragem Voluntária; - O acórdão foi notificado sem estar assinado por um dos árbitros, com a indicação, em nota de rodapé, que esse senhor árbitro pretendia votar vencido, mas que não conseguia preparar tal voto no próprio dia 15.06.2023; - O processo arbitral não decorreu conforme a convenção das partes e é anulável por violar a convenção de arbitragem ao ter sido proferido apenas por dois árbitros, tendo-se objectivamente impedido um deles de tomar parte nessa deliberação, e, assim, impedindo-o de se pronunciar sobre a matéria factual a decidir, sobre o direito aplicável e sobre a decisão de acordo com a equidade, conforme as partes elegeram como critério de solução na convenção de arbitragem (cfr. art. 46.º, n.º 3, iv), da Lei de Arbitragem Voluntária). Termina, pedindo que a acção seja julgada procedente, anulando-se o acórdão do Tribunal Arbitral, tribunal que foi constituído para dirimir o litígio entre a requerente e a requerida. 2. A requerida foi citada e deduziu oposição com os seguintes fundamentos: - Por excepção, invocando que a acção de anulação da sentença arbitral é inadmissível, por ter sido apresentada em 1 de Setembro de 2023, no último dia antes de caducar o direito à respectiva propositura, e não ter sido acompanhada de cópia certificada da referida sentença, como exige o art. 46.º, n.º 2, da LAV; - No mais, impugnou os factos alegados na petição, invocando: que o árbitro AA deliberou e participou na decisão, tendo apenas pedido a prorrogação de prazo para a prolação da decisão por pretender fazer voto de vencimento, voto que apresentou posteriormente e do qual resulta que teve conhecimento do projecto de acórdão em 12 de Junho de 2023; - A falta de assinatura do dito árbitro resulta apenas de ter declarado não conseguir apresentar voto de vencido na data da decisão, tendo posteriormente corroborado o que a árbitro presidente fez constar da nota aposta no final da sentença arbitral; - A sentença arbitral foi proferida no prazo geral para conclusão da arbitragem a que se refere o art. 43.º, n.º 1, da LAV, e só o incumprimento deste prazo geraria a caducidade da arbitragem; - Para que o suposto afastamento do critério da equidade pudesse constituir fundamento do pedido de anulação da sentença arbitral seria necessário que tal afastamento tivesse revelado ter tido influência decisiva na resolução do litígio (cfr. art. 46.º, n.º, 3, a), iv), in fine, da LAV), o que a requerente nem sequer alegou. Termina, pedindo que a acção seja julgada improcedente, não se decretando a anulação do acórdão arbitral. 3. A requerente, notificada da oposição, não respondeu à matéria da excepção ali invocada. 4. Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa a excepção invocada pela requerida foi julgada improcedente com a seguinte fundamentação: «Exceção perentória: falta de apresentação de cópia certificada da decisão arbitral com a petição inicial. Diz a requerida que o pedido de anulação da decisão arbitral foi apresentado no último dia antes de caducar o direito à propositura da ação e não foi acompanhado da cópia certificada daquela decisão, como o exige o art. 46º, nº 2, da Lei nº 63/2011 de 14 de dezembro (doravante designada LAV), e que constituindo a junção de tal documento uma condição, um pressuposto do pedido de anulação da decisão arbitral, este não pode ser admitido. Estão provados os seguintes factos com interesse para o conhecimento da exceção (trata[m]-se de factos documentados nos autos): 1- A Autora intentou a presente ação no dia 1 de setembro de 2023. 2- No final da petição inicial consta: “(…) Documentos juntos: 1. Certidão do Acórdão Arbitral e da Acta da Instalação do Tribunal Arbitral. 2. Requerimento ao Tribunal Arbitral. 3. Resposta do Tribunal Arbitral.” 3 – A Autora não juntou com a petição inicial cópia certificada da decisão arbitral. 4 – Apresentou-a no dia 8 de setembro de 2023, invocando “(…) a impossibilidade de o ter feito com o requerimento inicial causada pela limitação de transmissão de dados da plataforma CITIUS.” Nos termos do disposto no art. 46º, nº 2, e nº 6, da LAV, e na parte que ora importa considerar, o pedido de anulação da sentença arbitral, que deve ser acompanhado de uma cópia certificada da mesma, é apresentado no tribunal estadual competente, e só pode ser apresentado no prazo de 60 dias a contar da data em que a parte que pretenda essa anulação recebeu a notificação da sentença. Acompanhamos a Drª BB quando adianta que a exigência de certificação da cópia da sentença arbitral com o pedido de anulação da decisão arbitral tem como fundamento principal a circunstância de a ação ser apresentada no tribunal que dela irá conhecer e não no tribunal que proferiu a decisão, ao contrário daquele que é o regime recursório geral. Deste modo, a apresentação da dita certidão constitui, efetivamente, um pressuposto, uma condição de admissibilidade da ação, tratando-se inclusivamente de documento que tem de ser remetido ao citando no ato da citação (cf. art. 227º, nº 1, CPC). Significa isto, que não sendo o pedido acompanhado, desde logo, da dita cópia certificada da decisão arbitral, deva ser proferido despacho liminar de indeferimento do pedido no momento em que o processo é apresentado ao julgador pela primeira vez (para determinar a citação e fixar o prazo para contestação, posto que este não é indicado pela LAV – cf. art. 46º, nº 2, al. b), -), por não se mostrar verificada a dita condição da admissibilidade da ação? Uma resposta positiva à questão redundaria, a nosso ver, na prevalência dum formalismo exacerbado e injustificado, em detrimento dos princípios da celeridade e economia processuais que temos como preponderantes, uma vez que a situação suscetível de impedir a apreciação do pedido formulado na ação apresentada atempadamente em juízo pode ser facilmente ultrapassada com a formulação naquele momento processual de um convite ao aperfeiçoamento, mormente, na notificação do autor para apresentar o documento, com a cominação de não o fazendo, a ação não poder ser conhecida, tudo em conformidade com o dever de gestão processual conferido ao juiz pelo art. 6º do CPC (art. 6º do CPC) , ou mesmo ao abrigo do regime previsto no art. 652º, nº 1, al. d), do CPC, considerando que a ação seguirá a tramitação do recurso de apelação, com as necessárias adaptações (art. 46º, nº 2, al. e), da LAV), e o relator tem contato com o processo logo no momento em que ordena a citação. No caso, a ação foi proposta no dia 1 de setembro de 2023, tendo-se como apresentada nessa data. Como resulta da factualidade apurada, a requerente no final da petição inicial indica que junta certidão da decisão arbitral, o que na realidade não faz. No dia 8 de setembro de 2023, apresentou, então, a cópia certificada da decisão e invocou como justificação a impossibilidade de o ter feito com o requerimento inicial causada pela limitação de transmissão de dados da plataforma CITIUS. É certo que apesar do motivo invocado, a autora não cumpriu os termos ou, o prazo, previstos no art. 10º, nºs 1, e 3, da Portaria nº 280/2013, de 26/08. Não obstante, considerando o entendimento já perfilhado quanto à possibilidade de convite à apresentação do documento em falta, e uma vez que, in casu, antes mesmo do processo ter sido apresentado para primeiro despacho, o documento já estava efetivamente nos autos e nem sequer foi necessário proferir despacho naquele sentido, entendemos, por maioria de razão, que a situação foi atempadamente sanada e que a apresentação do documento naquela data não tem qualquer efeito sobre a data em que a ação se considera efetivamente apresentada em juízo. Improcede, por conseguinte, a exceção deduzida pela requerida.». A final, foi proferida a seguinte decisão: «Na sequência da fundamentação de facto e de direito que se deixaram expostos, acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a ação de anulação de decisão arbitral e, deste modo, absolver a requerida do pedido.». 5. Desta decisão, vem a requerente interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça – ainda que sob a denominação de recurso de apelação – formulando as seguintes conclusões: «a) O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa julgou improcedente a ação de anulação da decisão arbitral de anulação do tribunal arbitral ad hoc para julgar o litígio que opunha a Recorrente, SOLIDPLANET - ENGENHARIA, ARQUITECTURA E DESIGN DE INTERIORES, LDA à recorrida CARLMAN – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES LDA, por discordar do douto acórdão proferido e entender que o mesmo viola o disposto no artigo 43.º, n.º 1 da LAV, e artigo 43.º, n.º 3 iv) também da LAV, vem dele interpor recurso. b) O âmbito deste recurso circunscreve-se à reapreciação destas duas questões: a primeira saber se o Acórdão do Tribunal Arbitral foi notificado às partes no prazo, e segunda saber se o árbitro de parte, senhor Dr. AA foi ou não impedido de participar na deliberação da decisão arbitral. A reapreciação desta questão, já inicialmente colocada (vide petição inicial com a referência CITIUS n.º ....09). c) As partes estabeleceram na convenção de arbitragem, cláusula F) ponto 15 que os “actos do Tribunal e os actos da Secretária serão notificados aos mandatários através de correio eletrónico com recibo de entrega enviado para os endereços eletrónicos acima referidos, considerando-se, para todos os efeitos, as notificações e demais comunicações efectuadas no dia seguinte ao do envio ou no primeiro dia útil seguinte a esse sempre que aquele corresponda a dia não útil”. d) De acordo com a convenção de arbitragem a notificação foi considerada efectuada no dia 16 de junho e de acordo com a mesma convenção o prazo terminou no dia 15 de junho, pelo que no momento da efetivação da notificação (16.06.2023) já havia caducado a convenção de arbitragem. e) Decorre do voto de vencido do senhor Dr. AA - cf. documento n.º 1 - que o projeto de acórdão completo só foi exibido no dia 15.06.2023, já depois de assinado por todos os árbitros não tendo tido segundo ele, oportunidade de tomar integral conhecimento da decisão final em tempo de a poder discutir ou sugerir alteração ou até oportunidade para elaborar o seu voto de vencido. f) Daqui resulta, que a convenção de arbitragem foi grosseiramente violada, por a decisão final ter sido apenas proferida por dois árbitros, tendo-se objectivamente impedido um deles de tomar parte nessa deliberação “e, assim, pronunciar-se sobre a matéria factual a decidir, sobre o direito aplicável e sobre a decisão de acordo com a equidade, conforme as partes decidiram eleger como critério de solução”. g) Deve admitir-se a junção do voto de vencido do senhor Dr. AA, documento n.º 1, porquanto somente hoje no dia 05/04/2024 teve a Recorrente conhecimento do seu teor, conforme o documento atesta, conforme decorre do disposto no artigo 651.º do CPC.». 6. A requerida contra-alegou nos seguintes termos: «A) Impugnação da espécie do recurso: A requerente e ora recorrente interpôs recurso de apelação do douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 22 de Fevereiro de 2024, com a refª ......36. Apesar de não se encontrar expressamente prevista na lei a recorribilidade do douto Acórdão da Relação que rejeite (como in casu sucedeu) o pedido de anulação da decisão arbitral, a jurisprudência vem admitindo a interposição de recurso de tal decisão. Constitui, contudo, entendimento unânime na doutrina e na jurisprudência que o recurso a interpor da decisão da Relação que rejeite o pedido de anulação da decisão arbitral é de revista e não de apelação. A alteração da espécie do recurso não tem uma relevância meramente formal. Como adiante veremos, com o presente recurso, a recorrente pretende (embora de uma forma encapotada) obter a modificação a decisão de facto constante do douto Acórdão recorrido – é o que se passa com o segmento do recurso referente à suposta falta de participação do Árbitro Dr. AA na prolação da sentença arbitral. Com a interposição de um recurso de apelação e não de revista, a recorrente pretende, no âmbito do presente recurso, viabilizar uma modificação da decisão de facto – o que a lei não lhe permite. Nesta conformidade, a recorrida impugna a admissibilidade do presente recurso como de apelação – art. 638º, nº 6, CPC. B) Quanto à questão da tempestividade da decisão do Tribunal Arbitral: Na sua alegação, a recorrente insiste em confundir a data de notificação da sentença arbitral com a data de recepção dessa notificação. Conforme se concluiu, muito justamente, no douto Acórdão recorrido, (…) o que releva para a anulação da sentença é a data da notificação da decisão às partes. A fundamentação explanada no douto Acórdão recorrido sobre a tempestividade da decisão do Tribunal Arbitral é extremamente clara e irrefutável. Como muito bem se assinala no douto Acórdão recorrido, a própria redacção da lei (ou seja, da LAV) permite verificar a distinção entre os casos em que releva a data da notificação da sentença arbitral e aqueles em que releva a recepção dessa notificação. Ora, o prazo previsto no art. 43º, nº 1, LAV inclui-se entre aqueles em que releva a data da notificação – que, nos casos dos autos, ocorreu, como ficou provado, em 15 de Junho de 2023. O Acórdão da Relação de Lisboa de 9 de Fevereiro de 2023, citado no douto Acórdão recorrido, é igualmente taxativo em relação à data que releva para o cumprimento do prazo para proferir a sentença arbitral – que é a data em que essa sentença é notificada às partes e não a data em que tal notificação foi ou se considere que deva ter sido recebida pelas partes. No mesmo sentido, José Robin de Andrade, in “Lei da Arbitragem Voluntária Anotada”, Almedina, 2019, pág. 154: Sendo a falta de notificação a causa da caducidade, deve reconhecer-se que o simples início do processo de notificação da sentença arbitral – a expedição da carta quando a notificação se fizer por carta registada ou por protocolo – baste, para evitar a caducidade. Se a referida conclusão é válida para os casos de notificação por carta registada ou por protocolo, por maioria de razão o é também para os casos de notificação por correio electrónico. Acresce que, como a recorrida invocou na oposição, há que distinguir entre o prazo geral da arbitragem previsto na lei (cfr. art. 43º, nº 1, LAV) e o prazo para proferir a sentença previsto nas regras processuais fixadas para a arbitragem. Só a ultrapassagem do primeiro prazo (e não do segundo) é geradora da caducidade do processo arbitral, implicando a sua imediata extinção. Ora, como decorre do teor da sentença arbitral, não estava em causa, no dia 15 de Junho de 2023, o termo do prazo geral da arbitragem (que só terminaria em 15 de Janeiro de 2024) – mas sim o termo do prazo processual para proferir a sentença arbitral, após as alegações. Sobre a distinção entre um e outro prazo, cfr. o Acórdão da Relação do Porto de 28 de Janeiro de 2021, relatado pelo Senhor Desembargador Aristides Rodrigues de Almeida, em cujo sumário assertivamente se exarou: O prazo do art. 17º do CICAP (regulamento de arbitragem em causa no caso apreciado no citado aresto) não substitui, nos processos deste tribunal arbitral, o prazo do artigo 43º da Lei da Arbitragem Voluntária e a sua ultrapassagem não gera os efeitos fixados neste (caducidade do processo arbitral) e no artigo 46º da mesma lei (anulabilidade da sentença arbitral) – disponível em www.dgsi.pt. Sucede que, tal como se salientou na oposição, o prazo de 60 dias foi fixado nas regras processuais para proferir a decisão e não para proceder à notificação às partes dessa decisão – cfr. nº 31 da Acta de Instalação do Tribunal Arbitral. A questão da suposta intempestividade da decisão arbitral, levantada pela requerente na presente acção e objecto do presente recurso, não tem o menor fundamento. C) Quanto à questão da suposta falta de participação do Árbitro Dr. AA na prolação da sentença arbitral: A recorrente reconhece que não logrou provar que o Árbitro Dr. AA tenha sido impedido de tomar parte na deliberação. Com efeito, a matéria de facto em que a recorrente eventualmente se poderia absurda estribar para fundamentar tal tese foi dada como não provada. A recorrente pretende agora inverter a referida decisão de uma forma duplamente abstrusa. Por um lado, a recorrente junta agora aos autos um documento (a declaração de voto do Árbitro Dr. AA) – que é, no entanto, anterior à data em que foi proferido o douto Acórdão recorrido. Para criar uma aparência de suposta superveniência do referido documento, a recorrente lembrou-se de apresentar uma mensagem em correio electrónico datada de 8 de Abril de 2024 do Árbitro Dr. AA dirigida ao Exmo. Advogado da requerente. Sucede, no entanto, que o documento em causa já havia sido junto aos autos pela própria requerida, com a oposição apresentada em 4 de Dezembro de 2023, com a refª ....66. Ora, com a oposição, a requerente foi notificada do documento em causa. Ou seja, a requerente conhecia, pelo menos desde 4 de Dezembro de 2023, o documento agora junto e, por isso, a sua junção aos autos, com a alegação de recurso, deve ser indeferida, por ser manifestamente extemporânea. Acresce que o documento já junto pela requerida (a declaração de voto do Árbitro Dr. AA), em vez de confirmar a tese do impedimento da participação do referido Árbitro na decisão, vem desmenti-la. Como se alcança do teor da referida declaração de voto, o Árbitro Dr. AA participou na decisão e apenas pelo facto de não podido (ou não ter querido) apresentar de imediato a sua declaração de voto, fê-lo mais tarde. Como é evidente, a apresentação tardia (pelos vistos, só em 12 de Outubro de 2023) da declaração de voto de vencido do Árbitro Dr. AA não tem o condão de tornar anulável a decisão tomada por maioria pelos restantes Árbitros. Se o próprio Árbitro Dr. AA afirma que votou vencido, como pode a recorrente manter a alegação de que o referido árbitro foi impedido de participar na deliberação? Como muito bem se salienta no douto Acórdão recorrido, a sentença arbitral, assinada pela maioria dos Árbitros (como sucede in casu), é inteiramente válida – art. 42º, nº 1, LAV. Por isso, o presente recurso também claudica no segmento da suposta falta de participação do Árbitro Dr. AA na prolação da sentença arbitral. D) Quanto à falta de apresentação tempestiva de cópia certificada da sentença arbitral: O douto Acórdão recorrido julgou improcedente a acção de anulação de decisão arbitral proposta pela recorrente, mas não com fundamento na falta de apresentação tempestiva de cópia certificada da sentença arbitral. Salvo o devido respeito pela posição enunciada no douto Acórdão recorrido, a recorrida entende que a acção deveria ter sido julgada improcedente desde logo por este motivo. A questão não é apenas formal. Com efeito, a lei é taxativa ao prever que, na acção de anulação de sentença arbitral, a prova tem obrigatoriamente de ser oferecida com o requerimento – art. 46º, nº 2, a), LAV. Assim sendo, não é possível aceitar que o regime para a apresentação de cópia certificada da sentença arbitral (em que se baseia todo o processo, visto que a decisão cuja anulação se pede não foi proferida por qualquer tribunal estadual) seja mais complacente do que o regime de apresentação da prova em geral.». II – Meio processual e admissibilidade Assiste razão à recorrida ao invocar ser necessário corrigir o meio processual utilizado pela recorrente. Com efeito, ainda que, no seu requerimento, esta última identifique o recurso interposto como sendo de apelação, o meio recursório legalmente previsto para o efeito é antes o recurso de revista (cfr. arts. 671.º e segs. do CPC) cujo regime é assim aplicável. A questão da admissibilidade do recurso de revista de acórdão da Relação proferido em acção de anulação de sentença arbitral, na vigência do actual Código de Processo Civil, encontra-se resolvida em sentido afirmativo pela jurisprudência deste Supremo Tribunal. Nas palavras do sumário do acórdão de 10.11.2016 (proc. n.º 1052/14.1TBBCL.P1.S1), consultável em www.dgsi.pt: «I. A norma constante do nº 1 do art. 671º do CPC não deve interpretar-se no sentido de pretender excluir cabalmente o exercício do duplo grau de jurisdição nas causas em que a Relação haja excepcionalmente actuado, não como tribunal de recurso, mas como órgão jurisdicional que, em 1ª instância, apreciou o objecto do litígio – como ocorre com as acções de anulação de sentença arbitral, necessariamente iniciadas perante esse Tribunal. II. Na verdade, numa interpretação funcionalmente adequada do sistema de recursos que nos rege, não se vê razão bastante para excluir o normal exercício pelo STJ do duplo grau de jurisdição sobre decisões finais proferidas pela Relação, em acções ou procedimentos que, nos termos da lei, se devam obrigatoriamente iniciar perante elas - podendo convocar-se relevantes lugares paralelos, em que o acesso ao STJ está assegurado, relativamente a decisões finais proferidas em causas apreciadas em 1ª instância pelas Relações, como ocorre com as acções especiais de indemnização contra magistrados ou com a revisão de sentença estrangeira. III. É, assim, admissível a revista interposta do acórdão da Relação que apreciou a referida acção anulatória - não incluindo, porém, o seu objecto qualquer reapreciação do mérito da causa, vedado aos Tribunais estaduais pelo art. 46º, nº 9, da LAV, destinando-se o recurso, apenas e estritamente, a apurar da verificação ou inverificação dos específicos fundamentos de anulação da sentença arbitral, invocados pelo autor.». O presente recurso é, pois, admissível. III – Fundamentação de facto Para além dos factos constantes do relatório supra, foram dados como provados os seguintes factos (mantêm-se a numeração, a redacção e a formatação do acórdão da Relação): 5 (sic) - O tribunal arbitral foi constituído pela Ata de Instalação datada de 10.07.2020, a qual tem o seguinte teor:
6 - No dia 15 de junho de 2023 foi proferida decisão arbitral, cujo teor aqui se dá por reproduzido. 7 - O acórdão mostra-se assinado pelo árbitro CC e por DD, Presidente do Tribunal Arbitral, que apôs a final a seguinte nota:
9 - A senhora Dra. DD aceitou o encargo e subscreveu a sua “Declaração de Independência” a 29.03.2021. 10 - No dia 7 de junho de 2023 a Srª Drª DD enviou e-mail às partes com o seguinte teor:
11 - A demandada respondeu nos seguintes termos:
12 - A demandante respondeu nos seguintes termos:
14 - Por vicissitudes várias, nas quais se inclui a suspensão dos prazos judiciais com fundamento na Lei 4-B/2021, foi fixado que o Tribunal Arbitral tinha de proferir sentença, impreterivelmente, até ao dia 15 de junho de 2023. Factos dados como não provados: A) Que na nota de rodapé aposta na sentença arbitral tivesse ficado a constar que o árbitro Dr. AA tinha tomado conhecimento do projeto de acórdão já depois de assinado pelos outros árbitros. B) O árbitro senhor Dr. AA não pode preparar o voto vencido, nem fazê-lo no próprio texto do acórdão porque o projeto só lhe foi apresentado no próprio dia 15.06.2023 já assinado pelos outros árbitros, pelo que era impossível ler o acórdão com 100 páginas e elaborar um voto de vencido num único dia. C) Não pode, assim, pronunciar-se sobre a matéria factual a decidir, sobre o direito aplicável e sobre a decisão de acordo com a equidade, conforme as partes decidiram eleger como critério de solução, na convenção de arbitragem. D) Os senhores Árbitros não reuniram nem para decidirem sobre a matéria de facto nem sobre a decisão jurídica. III – Objecto do recurso Tendo em conta o disposto no n.º 4 do art. 635.º do Código de Processo Civil, o objecto do recurso delimita-se pelas respectivas conclusões, sem prejuízo da apreciação das eventuais questões de conhecimento oficioso. Deste modo, o presente recurso tem como objecto as seguintes questões: • Caducidade do processo arbitral por intempestividade na notificação do acórdão arbitral às partes; • Desrespeito da convenção de arbitragem por alegadamente um dos árbitros ter sido impedido de tomar parte na deliberação. Nas contra-alegações de recurso veio a recorrida suscitar a questão da reapreciação da excepção peremptória por si invocada em sede de contestação. Devidamente qualificada, corresponde tal pretensão a um pedido de ampliação do objecto do recurso, admissível ao abrigo do n.º 1 do art. 636.º do CPC («No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.»). IV – Fundamentação de direito 1. Suscita a recorrente a questão da caducidade do processo arbitral por intempestividade na notificação do acórdão arbitral às partes. 1.1. No que ora releva, em sede de petição inicial invocou a requerente que a sua pretensão «radica no direito em obter a anulação do Acórdão Arbitral por (...) a sentença ter sido notificada às partes depois do decorrido o prazo máximo para o efeito fixado no artigo 43.º [artigo 46.º, n.º 3 alínea vii) da LAV].». Alegando os seguintes factos que vieram a ser dados como provados: Cláusula F) - Ponto 15 da Ata de Instalação do Tribunal Arbitral: «Os atos do Tribunal Arbitral e os atos da Secretária serão notificados aos Mandatários das Partes através de correio electrónico com recibo de entrega enviado para os endereços electrónicos acima referidos, considerando-se, para todos os efeitos, as notificações e demais comunicações efetuadas no dia seguinte ao envio ou no primeiro dia útil seguinte a esse sempre que aquele corresponda a dia não útil». 6 - No dia 15 de junho de 2023 foi proferida decisão arbitral, cujo teor aqui se dá por reproduzido. 13 - O acórdão arbitral foi notificado à autora no dia 15 de junho via email. 14 - Por vicissitudes várias, nas quais se inclui a suspensão dos prazos judiciais com fundamento na Lei 4-B/2021, foi fixado que o Tribunal Arbitral tinha de proferir sentença, impreterivelmente, até ao dia 15 de junho de 2023. 1.2. O Tribunal da Relação considerou a dita factualidade dada como provada, apreciando a questão jurídica da caducidade do processo de arbitragem essencialmente em função do disposto no art. 46.º, n.º 3, alínea a), ponto vii), da Lei da Arbitragem Voluntária, conjugado com o previsto no art. 43.º da mesma Lei, concluindo, conforme síntese do ponto 3 do sumário do acórdão recorrido, que «[a] sentença arbitral só é anulável nos termos previstos no art. 46º, nº 3, al. a), ponto vii. da LAV quando o processo de notificação da decisão (envio da mesma por e-mail ou expedição de carta para o mesmo fim) não tiver sido efetuado dentro do prazo máximo estabelecido para a prolação da decisão (cf. art. 43º do mesmo diploma), não constituindo, deste modo, causa de anulabilidade a circunstância de a receção da notificação da decisão ter ocorrido posteriormente.». 1.3. Temos, pois, que a decisão do acórdão recorrido resultou, no essencial, da interpretação das seguintes disposições da Lei da Arbitragem Voluntária: Artigo 46.º, n.º 3, alínea a), ponto vii): «3 - A sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se: a) A parte que faz o pedido demonstrar que: (...) vii) A sentença foi notificada às partes depois de decorrido o prazo máximo para o efeito fixado de acordo com ao artigo 43.º.». Artigo 43.º «1 - Salvo se as partes, até à aceitação do primeiro árbitro, tiverem acordado prazo diferente, os árbitros devem notificar às partes a sentença final proferida sobre o litígio que por elas lhes foi submetido dentro do prazo de 12 meses a contar da data de aceitação do último árbitro. 2 - Os prazos definidos de acordo com o n.º 1 podem ser livremente prorrogados por acordo das partes ou, em alternativa, por decisão do tribunal arbitral, por uma ou mais vezes, por sucessivos períodos de 12 meses, devendo tais prorrogações ser devidamente fundamentadas. Fica, porém, ressalvada a possibilidade de as partes, de comum acordo, se oporem à prorrogação. 3 - A falta de notificação da sentença final dentro do prazo máximo determinado de acordo com os números anteriores do presente artigo, põe automaticamente termo ao processo arbitral, fazendo também extinguir a competência dos árbitros para julgarem o litígio que lhes fora submetido, sem prejuízo de a convenção de arbitragem manter a sua eficácia, nomeadamente para efeito de com base nela ser constituído novo tribunal arbitral e ter início nova arbitragem.». 1.4. Em sede de recurso, veio a requerente invocar essencialmente o seguinte: «As partes estabeleceram na convenção de arbitragem, cláusula F) ponto 15 que os “actos do Tribunal e os actos da Secretária serão notificados aos mandatários através de correio eletrónico com recibo de entrega enviado para os endereços eletrónicos acima referidos, considerando-se, para todos os efeitos, as notificações e demais comunicações efectuadas no dia seguinte ao do envio ou no primeiro dia útil seguinte a esse sempre que aquele corresponda a dia não útil; De acordo com a convenção de arbitragem a notificação foi considerada efectuada no dia 16 de junho e de acordo com a mesma convenção o prazo terminou no dia 15 de junho, pelo que no momento da efetivação da notificação (16.06.2023) já havia caducado a convenção de arbitragem.». Sendo que, na sua resposta, a recorrida afirmou, além do mais, o seguinte: «[C]omo a recorrida invocou na oposição, há que distinguir entre o prazo geral da arbitragem previsto na lei (cfr. art. 43º, nº 1, LAV) e o prazo para proferir a sentença previsto nas regras processuais fixadas para a arbitragem. Só a ultrapassagem do primeiro prazo (e não do segundo) é geradora da caducidade do processo arbitral, implicando a sua imediata extinção. Ora, como decorre do teor da sentença arbitral, não estava em causa, no dia 15 de Junho de 2023, o termo do prazo geral da arbitragem (que só terminaria em 15 de Janeiro de 2024) – mas sim o termo do prazo processual para proferir a sentença arbitral, após as alegações.». 1.5. Saliente-se que, ainda que a respeito de aspectos distintos, tanto a recorrente como a recorrida alegam, com razão, que o acórdão recorrido analisou a questão da tempestividade da notificação do acórdão arbitral às partes em função das regras contidas na Lei da Arbitragem Voluntária, quando devia antes tê-lo feito em função das regras processuais fixadas para a concreta arbitragem, ao abrigo da ampla margem de disposição pelas partes admitida por lei. Assim, a incursão doutrinal e jurisprudencial realizada pelo acórdão recorrido acerca do problema de saber em que momento produz efeitos a notificação das partes, tal como regulada nas acima referidas normas dos arts. 43.º e 46.º da LAV – concluindo que tal ocorre no momento da recepção e não no da emissão da mensagem de correio electrónico –, não atendeu ao facto de que, na Cláusula F) - Ponto 15, da Ata de Instalação do Tribunal Arbitral (“Os atos do Tribunal Arbitral e os atos da Secretária serão notificados aos Mandatários das Partes através de correio electrónico com recibo de entrega enviado para os endereços electrónicos acima referidos, considerando-se, para todos os efeitos, as notificações e demais comunicações efetuadas no dia seguinte ao envio ou no primeiro dia útil seguinte a esse sempre que aquele corresponda a dia não útil.”) está previsto que os actos de notificação produzam efeitos no dia seguinte ao dia da emissão da mensagem de correio electrónico. Contudo, a constatação de que o tribunal a quo não atendeu devidamente à regra adoptada na Cláusula F) - Ponto 15, da Ata de Instalação do Tribunal Arbitral só teria relevância se não ficasse prejudicada pela deficiência no juízo do mesmo tribunal assinalada pela recorrida na acima transcrita passagem das contra-alegações. Na verdade, verifica-se que o acórdão recorrido apreciou a questão da eventual caducidade do processo arbitral em função do regime do art. 43.º da LAV sem previamente esclarecer se a data limite fixada por acordo para a prolação do acórdão do Tribunal Arbitral (15 de Junho de 2023 – cfr. facto provado 14) correspondia ou não ao prazo resultante dos n.ºs 1 e 2 daquele preceito legal. A elucidação desta questão implicaria, em princípio, a devida ponderação daquilo que, a este respeito, foi alegado pela requerida em sede de contestação, e, se necessário, a determinação da ampliação da decisão da matéria de facto em conformidade (cfr. art. 683.º, n.º 3, do CPC): «46º Segundo a Requerente a sentença arbitral seria anulável por ser supostamente intempestiva. 47º Para conjecturar a suposta intempestividade da sentença arbitral, a Requerente recorre a duas falácias: a) Por um lado, confunde o prazo geral da arbitragem, previsto na lei, com o prazo para proferir a sentença, previsto nas regras processuais fixadas para a arbitragem; e b) Por outro lado, confunde a prolação da sentença arbitral com a respectiva notificação às partes. 48º A lei fixa um prazo geral de 12 meses para conclusão da arbitragem, que pode ser livremente prorrogado por acordo das partes ou, em alternativa, por decisão do tribunal arbitral – art. 43º, nº 1 e nº 2, LAV. 49º No caso dos autos, na audiência preliminar, as partes acordaram na prorrogação do prazo geral da arbitragem, fixando o dia 15 de Janeiro de 2022 como último dia do prazo para proferimento da decisão arbitral – cfr. nºs 21 e 144 da sentença arbitral. 50º O prazo geral fixado na audiência preliminar veio a ser posteriormente prorrogado, com a concordância das partes, pelo período adicional de 12 meses (ou seja, até 15 de Janeiro de 2023) – cfr. nº 176 da sentença arbitral. Mais tarde, 51º O prazo geral para conclusão da arbitragem veio a ser de novo prorrogado pelo período adicional de mais 12 meses, mediante a Ordem Processual nº 3 (ou seja, até 15 de Janeiro de 2024) – cfr. nº 191 da sentença arbitral. Portanto, 52º A sentença arbitral foi proferida no prazo geral para conclusão da arbitragem a que se refere o art. 43º, nº 1, LAV. 53º Só a prolação da sentença arbitral fora do prazo geral para conclusão da arbitragem (o que, no caso dos autos, como vimos, não se passou) põe automaticamente termo ao processo arbitral – art. 43º, nº 3, LAV. Ora, 54º O prazo geral para conclusão da arbitragem fixado por lei não se confunde com o prazo que tenha sido fixado no processo para que fosse proferida a decisão final – sendo que só a violação do primeiro prazo está cominada com o termo do processo arbitral.». Se o apuramento de qual era, no caso concreto do processo de arbitragem que culminou com o acórdão ora impugnado, o prazo resultante da aplicação do regime previsto no art. 43.º, n.ºs 1 e 2 da LAV, implicaria a consideração dos factos alegados pela requerida, verifica-se que, nas circunstâncias concretas dos autos, não se mostra porém necessário determinar a ampliação da matéria de facto, uma vez que o resultado sempre seria/será o mesmo, ainda que – na perspectiva mais favorável à requerente, ora recorrente –, se entenda que o prazo que consta do facto provado 14 (“Por vicissitudes várias, nas quais se inclui a suspensão dos prazos judiciais com fundamento na Lei 4-B/2021, foi fixado que o Tribunal Arbitral tinha de proferir sentença, impreterivelmente, até ao dia 15 de junho de 2023”) reveste a natureza de prazo de caducidade. Com efeito, se se admitir, como pretende a demandante, ora recorrente, que tal prazo é um prazo de caducidade, então sê-lo-á nos exactos termos em que foi definido, isto é, como sendo o prazo limite para “proferir sentença”. E se assim for, não pode deixar de se concluir que o mesmo foi respeitado pelo tribunal arbitral, já que ficou provado (facto 6) que, «[n]o dia 15 de junho de 2023 foi proferida decisão arbitral, cujo teor aqui se dá por reproduzido». Não pode é, como parece resultar da posição assumida pela requerente, criar-se um sistema híbrido, de acordo com o qual o prazo acordado pelas partes para a prolação da decisão arbitral («até ao dia 15 de junho de 2023») seria interpretado como sendo o prazo limite para notificar a decisão arbitral às partes. Interpretação essa que levaria a que, estando provado (facto 13) que «[o] acórdão arbitral foi notificado à autora no dia 15 de junho via email», em razão da previsão da Cláusula F) - Ponto 15, da Ata de Instalação do Tribunal Arbitral (as notificações produzem efeitos no dia subsequente à data do envio da mensagem de correio electrónico), se considerasse incumprido o referido prazo. Temos, pois, que – repita-se – a ser qualificado, de acordo com a recorrente, como prazo de caducidade do processo de arbitragem, o prazo descrito no facto provado 14 valerá nos precisos termos em que foi definido, isto é, como prazo limite para a decisão arbitral ser proferida (e não para ser notificada). E, sendo assim, tal prazo foi respeitado. Deste modo, improcede este fundamento da pretensão recursória. 2. Passemos a apreciar a questão do invocado desrespeito da convenção de arbitragem por, alegadamente, um dos árbitros ter sido impedido de tomar parte na deliberação. A este respeito, afirma-se na fundamentação do acórdão recorrido o seguinte: «A autora não logrou demonstrar, como alegou, e como lhe competia, que o árbitro, senhor Dr. AA, foi impedido de tomar parte na deliberação. O acórdão mostra-se, efetivamente, assinado apenas por dois árbitros, pelas razões que nele foram explicitadas, mediante a nota final nele aposta pela Srª árbitro presidente, e sem qualquer desconformidade com a convenção e/ou com a LAV, nomeadamente, com o nº 1, do art. 42º, segundo o qual, “1 - A sentença deve ser reduzida a escrito e assinada pelo árbitro ou árbitros. Em processo arbitral com mais de um árbitro, são suficientes as assinaturas da maioria dos membros do tribunal arbitral ou só a do presidente, caso por este deva ser proferida a sentença, desde que seja mencionada na sentença a razão da omissão das restantes assinaturas.” Improcede, assim, e mais uma vez a pretensão da requerente (...)». Insurge-se a recorrente contra este entendimento, alegando essencialmente o seguinte: - «Decorre do voto de vencido (...) que o projeto de acórdão completo só foi exibido no dia 15.06.2023, já depois de assinado por todos os árbitros não tendo tido segundo ele, oportunidade de tomar integral conhecimento da decisão final em tempo de a poder discutir ou sugerir alteração ou até oportunidade para elaborar o seu voto de vencido. - Daqui resulta, que a convenção de arbitragem foi grosseiramente violada, por a decisão final ter sido apenas proferida por dois árbitros, tendo-se objectivamente impedido um deles de tomar parte nessa deliberação (...)». - Para o efeito, «deve admitir-se a junção do voto de vencido do senhor Dr. AA, documento n.º 1, porquanto somente hoje no dia 05/04/2024 teve a Recorrente conhecimento do seu teor (...)». Vejamos. Antes de mais, esclareça-se que não cabe pronúncia sobre o pedido de junção do documento consistente na declaração de voto de vencido do árbitro que não assinou o acórdão, na medida em que, como invocado pela recorrida, essa declaração foi junta aos autos com a contestação, tendo a sua relevância sido apreciada pelo Tribunal da Relação em sede de motivação da decisão de facto (ver págs. 19 a 21 do acórdão recorrido), dando-se como não provados os pontos B) a D) que a recorrente pretende que sejam dados como provados. Ora, a decisão da matéria de facto não é sindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça (cfr. art. 674.º, n.º 3, do CPC); de qualquer forma, sempre se dirá que a pretendida alteração da matéria de facto (em sentido que permitisse sustentar a tese de que o árbitro vencido teria sido impedido de participar na deliberação do Tribunal Arbitral), estando em contradição com o teor da certidão do acórdão do Tribunal Arbitral apresentada pela demandante, ora recorrente, sem ter impugnado a autenticidade e veracidade do conteúdo da dita certidão, estaria necessariamente condenada ao insucesso. 3. Improcedendo ambos os fundamentos da pretensão da recorrente, fica prejudicada a apreciação da questão suscitada pela recorrida em sede de ampliação do objecto do recurso. V – Decisão Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente, confirmando-se, com fundamentação não inteiramente coincidente, a decisão do acórdão recorrido. Custas pela recorrente. Lisboa, 19 de Setembro de 2024 Maria da Graça Trigo (relator) Paula Leal de Carvalho Catarina Serra |