Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | SOUSA LAMEIRA | ||
Descritores: | PROCEDIMENTO ESPECIAL DE DESPEJO ARRENDAMENTO PARA HABITAÇÃO OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO LEI APLICÁVEL NULIDADE DE ACÓRDÃO FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO | ||
Data do Acordão: | 09/14/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
Sumário : | I. Aos contratos com prazo de duração inicial superior a 1 ano e inferior a 6 anos a comunicação da oposição à renovação do contrato deve ser efectuada com a antecedência de 120 dias. II. Igual prazo deve ser observado para a comunicação da oposição à renovação do contrato com prazo de duração inicial superior a 1 ano e inferior a 6 anos. III. Estes prazos não se somam mas aferem-se de forma autónoma. IV. O que importa é o prazo que está em curso, que está a decorrer. Se for o prazo do contrato inicial e este for superior a um ano e inferior a 6 anos, a comunicação deve ser efectuada no prazo de 120 dias. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l. AA intentou procedimento especial de despejo contra BB, alegando, em síntese, que: Celebrou contrato de arrendamento com o Requerido e nos termos do art.º 1097 n.º 1 alínea b) do Código Civil, comunicou a oposição à renovação do contrato de arrendamento, com a antecedência de 120 dias, com efeitos a 1 de outubro de 2022. O Requerido ainda não desocupou o locado. Conclui pedindo que seja declarada válida e eficaz a cessação do contrato de arrendamento operada por oposição à renovação do contrato; Que o Requerido seja condenado a desocupar o imóvel, devendo deixá-lo livre e devoluto de pessoas e bens; Que seja declarada a improcedência do pedido de deferimento de desocupação do locado. 2. Contestou o Réu, alegando que o prazo de oposição à renovação que o senhorio deveria cumprir era de 240 dias e não de 120 dias. Requereu ainda, para hipótese da procedência da ação, o diferimento da desocupação do imóvel por razões sociais, nos termos do art.º 15 N NRAU. 3. Notificada para o efeito, a Requerente apresentou novo articulado em que defendeu que o prazo para oposição à renovação era de 120 dias e que não se verificam os requisitos para diferimento da desocupação do imóvel. 3. Oportunamente foi proferida sentença que decidiu: Por todo o exposto, o Tribunal decide julgar improcedente o presente procedimento especial de despejo e em consequência decide não decretar o despejo do Requerido BB e não decretar a desocupação pelo Requerido do imóvel sito na Praça do ... nº ..., 1.º direito, em .... 4. Inconformada, apelou a Autora para o Tribunal da Relação de Évora, que, por Acórdão de 11 de Maio de 2023, revogou a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, e decidiu: «Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente o recurso e, em consequência condenar o Requerido no despejo do locado». 5. Inconformado, o Réu recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões: A. O ora Recorrente deduz Recurso de Revista nos termos e ao abrigo do n.º 1, do artigo 671º, da alínea a) e b) do n.º1, do artigo 674, da alínea c) do n.º1 do mesmo artigo 674º, da primeira parte da al.d) e da segunda parte da al. b), ambas do n.º 1 do artigo 615º, aplicável ex vi art.º 666º, todos do Código de Processo Civil. B. O acórdão recorrido encerra uma clara violação das normas de direito. C. Impunha que o julgador tivesse proferido decisão diversa. D. Isto porque o tribunal de primeira instância na sua sentença, em sede de motivação revelou a sua convicção de forma fundamentada. E. Ao tribunal da relação, é imposto que aprecie criticamente cada uma das questões que lhe são colocadas em sede de recurso. F. Recorremos nos termos do n.º 1 do artigo 671º do CPC. G. O que se faz, nos pressupostos de facto e direito fixados na sentença, designadamente aqueles de que vem de se recorrer. H. Concluiu a sentença de primeira instância julgar improcedente o presente procedimento especial de despejo e em consequência decidiu não decretar o despejo do Requerido BB e não decretar a desocupação pelo Requerido do imóvel sito na Praça do ... nº ..., 1.º direito, em ....” I. Na Apelação deduzida, invocou a recorrente, contra este segmento decisório, a violação do disposto nos n.ºs 1, al. b) e 2 do 1097º do Código Civil, bem como as regras da interpretação das normas estabelecidas no artigo 9.º do Código Civil. J. O Tribunal da Relação decidiu delimitar o âmbito do recurso, apreciando e decidindo: “- da renovação do contrato de arrendamento e da invalidade da oposição deduzida pela senhoria à sua renovação; e no caso de se concluir pela eficácia da oposição à renovação, - do diferimento da desocupação e da suspensão da entrega do locado.” K. A fundamentação da Relação, sem reflexo no decidido em primeira instância, encerra uma errónea aplicação do direito aos factos. L. Da apreciação jurídica relativa à eficácia da oposição à renovação, atendeu à posição da apelante, quando defende ser de aplicar o “imperativo legal dos 120 dias de pré aviso para a comunicação da cessação por oposição à sua renovação do contrato de arrendamento sub judice,nos termos do artigo 1097º nº 1 al. b) do Código Civil, uma vez que tendo o contrato renovado em 1/10/2019 pelo período de três anos, cessava em 1/10/2022, não relevando aqui o somatório da duração total do contrato, mas sim o período de 3 anos correspondente à última renovação.”. M. Ao invés do defendido em sede de sentença de 1.ª Instância, onde se entendeu que “é aplicável ao contrato de arrendamento em crise o prazo de antecedência de 240 dias para comunicação da oposição à renovação do contrato de arrendamento, previsto na alínea a) do nº 1 do art.º 1097do Código Civil”. N. Conclui que, na versão dada pela Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro, porquanto se trata de um contrato de execução continuada, seria a nova versão da lei aplicável aos presentes autos, por força do disposto nos artigos 14.º deste diploma legal e do artigo 12.º, n.º 2, do Código Civil. O. E que as normas sobre a resolução, a caducidade e a denuncia do arrendamento urbano, por força do disposto no artigo 1080.º do Código Civil, são imperativas. P. Defendemos, desde já, que a interpretação das alíneas do n.º 1, do artigo 1097º do código Civil, podem assumir, em si próprias, algumas dificuldades de aplicação. Q. É disso, também, que o Tribunal da Relação dá conta ao reconhecer que “…a interpretação das alíneas do n.º 1, do artigo 1097º do Código Civil não é isenta de dúvidas …” . R. Mas, o contrato de arrendamento que aqui se discute, teve uma duração inicial de um ano, mas foi sucessivamente renovado por mais de sete anos. S. E, atento, o Tribunal de 1.ª Instância considerou aplicável ao caso em concreto o prazo de 240 dias de antecedência mínima para comunicação da oposição à renovação do contrato de arrendamento. T. Mui doutamente, sustentado no acórdão da Relação do Porto, de 10.12.2019, proferido no processo n.º 2848/18.0YLPRT2, onde se deixou que o prazo de renovação em causa, tendo o contrato perdurado por mais de seis anos por força da renovação sucessiva, devia ser o mais alargado previsto na lei, logo 240 dias. U. Posição que acompanhamos e defendemos. V. Posição também perfilhada pelo douto acórdão proferido por este Supremo Tribunal de Justiça, em 09.03.2021, no processo 8890/18.4T8CBR.C1. S1-1.ª Secção, com o Relator Fátima Gomes, ao referir que: “A não renovação, por oposição do senhorio (…) quando o contrato não atingira ainda os 6 anos, teria de ser feita com a antecedência mínima de 120 dias face ao termo da renovação (…).” W. Que será o mesmo que dizer que o entendimento ali vertido deixa claro que, caso o contrato já tivesse atingido os 6 anos o prazo a aplicar seria o da antecedência mínima de 240 dias. X. A clareza e a segurança jurídica na interpretação e aplicação das leis assumem maior importância, tanto quanto mais estiverem em causa assuntos sensíveis, como o da habitação. Y. Não podemos deixar de sublinhar que, quem tem poder decisório tem a obrigação de, sempre que existam dúvidas, decidir a favor daquele que assume uma posição de inferioridade processual e de desamparo social. Z. Vivemos períodos difíceis no mercado de arrendamento e a pressão a que os inquilinos estão sujeitos por parte dos senhorios, forçando a não renovação dos contratos de arrendamento, não pode encontrar colo nas decisões proferidas por Tribunais com saber e que não estão, nem podem ser, alheios à realidade social. AA. A alteração à lei do arrendamento, com a nova redação do artigo 1097 do Código Civil, decorrente da Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro, surge para proteção ao arrendatário. BB. Como se pode inferir da letra da lei e do espírito do legislador, que ele pretendeu, com as alíneas do artigo 1097º, tornar mais acessível a desocupação dos locados, em desabono dos arrendatários? CC. Vejamos no caso dos autos que o período de duração inicial do contrato foi de um ano, tendo o contrato sido renovado quatro vezes por um ano e uma por três anos. DD. Pelo que dúvidas não subsistem quanto à duração do contrato, 7 anos. EE. O Tribunal de 1.º instância considerou o prazo de antecedência mínima de 240 dias. FF. A interpretação do Tribunal da Relação, claramente em minoria, defende a aplicação de 120 dias. GG. Sustenta que o artigo 1097º, n.º 1, não se sugere de qualquer forma a soma dos períodos ali previstos, defendendo que, quanto ao período de duração inicial com os respeitantes às renovações, a soma é mesmo excluída pelo elemento “ou”. HH. Tal raciocínio não pode proceder, pois encerraria em si mesmo o propósito que o legislador manifestou ao criar aquele diploma legal, tendo como aspeto fulcral e essencial criar um reforço em matéria de proteção ao inquilino e de corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios, reforçando a estabilidade do arrendamento urbano. II. A convicção do Tribunal da Relação é autónoma, é livre, mas não deve ser completamente alheada da decisão da 1ª instância. JJ. Impunha-se ao julgador, que proferisse decisão diversa. KK. Mais, a sequência lógica do raciocínio sub judice, conduziria a uma solução não desejada pelo sistema e que este Tribunal não poderá acolher. LL. É situação que não pode deixar de ser rejeitada pelo aplicador e pensador do direito e, maxime, por este Tribunal Superior. MM. Como já se referiu, sem prejuízo do que adiante se requererá, a fundamentação da Relação, sem reflexo no decidido em primeira instância, afasta a aplicação do n.º 3., do artigo. 671º do CPC e justifica, nesta parte, o recurso de revista. NN. O entendimento perfilhado pela Relação, encerra uma errónea aplicação do direito aos factos, designadamente por violação do princípio do dispositivo, e dos demais princípios informadores do direito processual civil, pelo que deve ser julgado procedente este recurso. OO. Devendo, em consequência, a decisão ser substituída por outra, que se mostre conforme aos princípios de direito. DO DIFERIMENTO DA DESOCUPAÇÃO. PP. Senhores Juízes Conselheiros, também da posição tomada pelo Tribunal da Relação no que concerne ao diferimento da desocupação do locado, se recorre. QQ. Em sede de oposição ao pedido de despejo, na 1.º instância, foi requerido pelo demandado o diferimento da desocupação, nos termos do disposto no artigo 15º-N, da lei 6/2006, de 27 de fevereiro. RR. O Tribunal da Relação, lançou mão do disposto no artigo 665º, n.º 2 do Código de Processo Civil, considerando desnecessário o cumprimento do contraditório, por já ter sido observado na primeira instância. SS. Ocorre que, o Tribunal está vinculado ao cumprimento da lei e não cumpriu o disposto no artigo 665º, n.º 3 do Código do Processo Civil, onde se declara a obrigatoriedade de ouvir cada uma das partes. TT. Não obstante a requerente, em sede de recurso tenha tomado posição sobre essa matéria, certo é que o requerido/requerente nessa questão em particular, não o pode fazer, o que poderia ter conduzido a decisão diferente. UU. Pelo que, foram violados os princípios subjacentes ao contraditório e direito de defesa atribuído, por lei, ao ora recorrente. VV. O Tribunal da Relação não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão de não ouvir a parte. A fundamentação de direito é inexistente. WW. O acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, enferma, assim, de um vício, que constitui uma causa de nulidade processual, nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. b) do Código do Processo Civil, por absoluta falta de fundamentação. XX. Pelo exposto, verificando-se o incumprimento do disposto no artigo 665, n.º 3, o artigo 615º, n.º 1, al. b), impõe como cominação a nulidade do acórdão. YY. O que se suscita a V. Exas., pelo supra exposto, seja proferida decisão a reconhecer a nulidade do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, quanto ao diferimento da desocupação do Locado. ZZ. Termos em que, deve o processo ser remetido à Relação para o efeito. Conclui pedindo que, nos termos dos artigos 682 e 6840 do Código do Processo Civil, seja dado provimento ao presente recurso, devendo, em consequência, - ser proferida decisão a reconhecer a nulidade do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, quanto ao diferimento da desocupação do Locado, devendo o processo ser remetido à Relação para o suprimento da nulidade invocada; E - o acórdão proferido ser substituído por outro, que se mostre conforme aos princípios de direito. 5. O Tribunal da Relação admitiu o recurso. Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II – FUNDAMENTAÇÃO Foram dados como provados os seguintes factos: 1. A Requerente, na qualidade de cabeça de casal da herança de CC, celebrou com o Requerido um contrato de arrendamento para habitação com prazo certo em 1 de outubro de 2014, nos termos do qual cedeu o gozo da fração autónoma correspondente ao 1.º direito do prédio sito na Praça do..., matriz predial urbana sob o art.º 60 da União de Freguesias, concelho de ..., ao Requerido. 2. Segundo a cláusula segunda do contrato de arrendamento, o contrato de arrendamento foi celebrado pelo prazo de um ano, renovável por iguais e sucessivos períodos de tempo, sem prejuízo do direito das partes se oporem à sua renovação. 3. O contrato de arrendamento tem sido sucessivamente renovado, tendo ocorrido a última renovação em 1/10/2019, pelo período de três anos em virtude da alteração ocorrida ao art.º 1096º nº 1, pela entrada em vigor da Lei 13/19 de 12 de fevereiro, terminando em 1 de outubro de 2022. 4. A renda mensal foi fixada em 200,00 €. 5. A Requerente por carta registada com aviso de receção datada de 9 de março de 2022 e enviada em 10 de março de 2022, comunicou a sua oposição à renovação do contrato de arrendamento. 6. Em 11/03/2022, o Requerido rececionou referida carta de oposição à renovação. III – DA SUBSUNÇÃO – APRECIAÇÃO Verificados que estão os pressupostos de actuação deste tribunal, corridos os vistos, cumpre decidir. A) O objecto do recurso é definido pelas conclusões da alegação do Recorrente, artigo 635 do Código de Processo Civil. Lendo as alegações de recurso bem como as conclusões formuladas pelo Recorrente as questões concretas de que cumpre conhecer são as seguintes: 1ª- O prazo de oposição à renovação do contrato de arrendamento em causa nos autos deveria ser de 240 dias como defende o Recorrente e não de 120 dias como defendeu o Acórdão recorrido? 2ª- Relativamente ao pedido de deferimento da desocupação o Acórdão recorrido enferma da nulidade processual prevista no artigo 615 n.º 1 al. b) do CPC por absoluta falta de fundamentação? Vejamos B) Analisemos a primeira questão 1- Perante a factualidade descrita supra é inequívoco que estamos perante um contrato de arrendamento para fins habitacionais, celebrado entre a Autora e o Réu. A Autora teria comunicado com a antecipação devida a sua oposição à renovação do contrato? Teria a Autora observado o respectivo prazo legal? Ou não? Não existem dúvidas em como o regime aplicável ao contrato sub judice é o previsto no artigo 1097 do Código Civil para a oposição à renovação. Dispõe o artigo 1097.º do Código Civil, relativo à oposição à renovação deduzida pelo senhorio, que: «1 - O senhorio pode impedir a renovação automática do contrato mediante comunicação ao arrendatário com a antecedência mínima seguinte: a) 240 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis anos; b) 120 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a um ano e inferior a seis anos; c) 60 dias, se o prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a seis meses e inferior a um ano; d) Um terço do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação, tratando-se de prazo inferior a seis meses. 2 - A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao termo do prazo de duração inicial do contrato ou da sua renovação. 3 - A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 4 - Excetua-se do número anterior a necessidade de habitação pelo próprio ou pelos seus descendentes em 1.º grau, aplicando-se, com as devidas adaptações, o disposto no artigo 1102.º e nos n.os 1, 5 e 9 do artigo 1103.º1110.º n.º 1 do Código Civil.» À questão concreta de se determinar qual o prazo legal que o senhorio deve usar para impedir a renovação automática do contrato mediante comunicação ao arrendatário, se os 240 dias previstos na al. a) do n.º 1 do artigo 1097 citado ou se 120 dias da al. b) do mesmo normativo, responderam de forma diversa as instâncias. Enquanto a primeira instância deu razão ao Réu, dizendo que o prazo seria de 240 dias, a Relação entendeu que a razão se encontrava do lado da Autora e o prazo seria de 120 dias. Em nossa opinião a razão encontra-se do lado do Acórdão recorrido. Vejamos Não existem dúvidas em como estamos perante um contrato de arrendamento para habitação, com prazo certo, um ano. O contrato é de 1. 10. 2014 e foi celebrado por um ano. Segundo a cláusula segunda do contrato de arrendamento, o contrato de arrendamento foi celebrado pelo prazo de um ano, renovável por iguais e sucessivos períodos de tempo, sem prejuízo do direito das partes se oporem à sua renovação. O contrato de arrendamento tem sido sucessivamente renovado, tendo ocorrido a última renovação em 1/10/2019, pelo período de três anos, terminando em 1 de outubro de 2022. Por carta de 9. 03. 2022 a Autora comunicou a sua oposição á renovação que o Réu recebeu em 11.03.2022. A autora terá cumprido o prazo de 120 dias previsto na al. b) do n.º 1 do artigo 1097 em apreço, antecedência essa prevista para a oposição à renovação dos contratos de arrendamento para habitação com prazo «de duração inicial do contrato ou da sua renovação for igual ou superior a um ano e inferior a seis ano». E entendemos que o fez de forma correcta pois que o contrato celebrado entre a Autora e o Réu foi por um ano e o prazo da renovação que estava em curso era de 3 anos. Ora, o estatuído no artigo 1097 em causa é claro. Aos contratos com prazo de duração inicial superior a 1 ano e inferior a 6 anos a comunicação da oposição à renovação do contrato deve ser efectuada com a antecedência de 120 dias. Igual prazo deve ser observado para a comunicação da oposição à renovação do contrato com prazo de duração inicial superior a 1 ano e inferior a 6 anos. E estes prazos não se somam mas aferem-se de forma autónoma. O que importa é o prazo que está em curso, que está a decorrer. Se for o prazo do contrato inicial e este for superior a um ano e inferior a 6 anos, a comunicação deve ser efectuada no prazo de 120 dias. Se a renovação do contrato estiver a decorrer e for também por um prazo superior a um ano e inferior a 6 anos, de igual modo a comunicação deve ser efectuada no prazo de 120 dias. Não se somam os prazos do contrato inicial e as suas renovações para determinar se a comunicação deve ser no prazo de 240 ou de 120 dias. A lei não prevê a duração de vigência do contrato de arrendamento. Prevê o prazo da sua duração inicial ou o prazo da sua renovação. Nada impede, por exemplo, que o contrato inicial seja de 1 ano e a sua renovação seja de 7 anos. Nesta hipótese, se estiver a decorrer o prazo da renovação do contrato a comunicação da oposição à renovação deverá ser de 240 dias. Não podemos aceitar o entendimento expresso no Ac. R. Porto de 10.12.2019, Proc. N.º 2848/18.OYLPRT2, invocado pelo Recorrente, no qual se defendeu que «a antecedência mínima para a comunicação pela senhoria da sua oposição à renovação do contrato, era de 240, pelo facto de o contrato celebrado em 2008, ter durado mais de 6 anos». Como deixamos expresso o que releva não é o período de vigência total do contrato (prazo inicial mais as suas renovações) mas sim o prazo pelo qual o contrato foi celebrado, prazo inicial, ou o prazo da sua renovação, prazos estes que são aferidos de forma autónoma. Não se somam os prazos (inicial e das renovações) para se determinar qual o prazo em que deve ser efectuada a comunicação á oposição da renovação do contrato. Neste sentido, que nos parece ser unânime na doutrina bem como maioritário, senão unânime na jurisprudência, podemos ver toda a vasta referência feita no Acórdão recorrido, permitindo-nos citar, por todas, apenas a seguinte nota: «Em matéria de oposição à renovação do contrato, tanto por iniciativa do senhorio como do arrendatário, são introduzidas alterações significativas nos artigos 1097.º e 1098.º. Dado que o art. 1095.º deixou de estabelecer um prazo de duração mínima do contrato, aquelas normas vieram, em consonância,estabelecer a diversificação dos períodos de pré-aviso, criando uma relação de correspondência entre a maior ou menor duração do contrato e a maior ou menor amplitude do prazo de pré-aviso para comunicar a oposição à renovação, devendo o concreto tempo de pré-aviso ser medido por referência ao período (inicial ou renovado) em cujo final se pretende a extinção do contrato(…)” Maria Olinda Garcia, “Alterações ao Regime Substantivo do Arrendamento Urbano – apreciação crítica da reforma de 2012”, Coimbra, 2012, acessível em https://portal.oa.pt/upl/%7Becadb67f-8992-44be-a237-81927f8474f2%7D.pdf. E nem se diga, como pretende o Recorrente, que posição diversa está implícita no Ac. do STJ de 09.03.2021, Proc. N.º 8890/18.4T8CBR.C1.S1. Não, este Acórdão do STJ nem sequer equacionou esta problemática uma vez que ela não foi questionada. E, se a questão não foi colocada não é possível supor aquilo que eventualmente iria na mente do decisor se tal questão fosse colocada. Isso é abusivo deduzir até pelo quadro geral do caso em apreço naquele Acórdão. Aliás, podemos mesmo concluir em sentido contrário ao pugnado pelo Recorrente e afirmar que caso a questão tivesse sido abordada, que não foi, eventualmente, para não dizer muito certamente a posição que se acolheria seria em sentido oposto à defendida pelo Recorrente. Desta forma e quanto a esta questão nenhuma censura merece o Acórdão recorrido, pois que tendo a Autora /senhoria comunicado a oposição á renovação no prazo de 120 dias a uma renovação do contrato de arrendamento habitacional, renovação essa cujo prazo era superior a um ano mas inferior a 6 anos, tal comunicação foi tempestivamente efectuada. C) Resolvida a primeira questão importa analisar a 2ª- questão: Relativamente ao pedido de deferimento da desocupação o Acórdão recorrido enferma da nulidade processual prevista no artigo 615 n.º 1 al. b) do CPC por absoluta falta de fundamentação? O Recorrente defende nas suas conclusões que a fundamentação de direito é inexistente e, por isso, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, enferma, assim, de um vício, que constitui uma causa de nulidade processual, nos termos do artigo 615º, n.º 1, al. b) do Código do Processo Civil, por absoluta falta de fundamentação. Salvo o devido respeito por opinião contrária não assiste razão ao Recorrente. O Acórdão recorrido fundamentou a razão da sua decisão. Consta do Acórdão o seguinte: «Para o caso de se julgar eficaz a oposição à renovação supra analisada, requereu o demandado o diferimento da desocupação, nos termos do disposto no artigo 15º-N, da lei 6/2006, de 27 de fevereiro, pedido que quedou prejudicado na sentença recorrida, em virtude de se ter concluído pela ineficácia da cessação do contrato e que cumpre agora conhecer, por via do disposto no artigo 665º, n.º 2 do Código de Processo Civil, desnecessário se mostrando o cumprimento do contraditório, por já ter sido observado na primeira instância». O Acórdão é claro ao expor a razão pela qual não mandou cumprir naquela instância o disposto no artigo 665 n.º 2 do Código de Processo Civil. Fê-lo porque entendeu que o contraditório sobre esta questão já havia sido exercido na primeira instância sendo desnecessário voltar a repeti-lo. Ora, a invocada nulidade processual, prevista no artigo 615 n.º 1 al. b) do Código de Processo Civil, só existe quando não há nenhuma fundamentação, quando a fundamentação é inexistente. Já não se verifica tal nulidade se a fundamentação for escassa ou insuficiente (que não é caso). A decisão da Relação, o Acórdão recorrido, neste particular encontra-se devidamente fundamentada. Deste modo, atenta a clareza da situação, entendemos que não se verifica a invocada nulidade, impondo-se a improcedência desta questão. D) Em suma, entendemos que se impõe a improcedência total das alegações do recorrente, devendo ser dada resposta negativa às questões deduzidas pelo Réu/recorrente, razão pela qual se nega a revista. III – DECISÃO Pelo exposto, decide-se negar a revista, confirmando a decisão recorrida. Custas pelo Recorrente. Lisboa, 14 de Setembro de 2023 José Sousa Lameira (relator) Conselheiro Nuno Pinto de Oliveira Conselheira Maria de Fátima Gomes |