Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
10849/17.0T8SNT.L1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: LUIS ESPÍRITO SANTO
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANOS FUTUROS
DANO BIOLÓGICO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
DANOS PATRIMONIAIS
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
ATUALIZAÇÃO
CONTAGEM DOS JUROS
JUROS DE MORA
CITAÇÃO
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
FACTOS CONCLUSIVOS
MATÉRIA DE DIREITO
Data do Acordão: 03/01/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: REVISTA DA RÉ PARCIALMENTE PROCEDENTE.
REVISTA DO AUTOR IMPROCEDENTE.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - A indemnização por dano biológico cobre o esforço acrescido ou suplementar a que o sinistrado se vê obrigado no desempenho da sua actividade laboral, que mantém em posição profissional (categoria) similar à que antes do acidente detinha, bem como a perda de potencialidade para se alcandorar a um patamar superior de rentabilidade em relação à sua actual prestação, com reflexo necessário na diminuição de nível remuneratório a que poderia, noutras circunstâncias e com razoável probabilidade, ascender.
II - Contando o lesado 43 anos à data do sinistro; havendo sofrido défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 15 em 100, sem impossibilidade do exercício da actividade profissional mas com esforços acrescidos no seu desempenho; passando a registar limitação nas tarefas profissionais que obrigam a permanência prolongada na posição de sentado (por exemplo, trabalho à secretária ou exercício da condução), com impossibilidade de realização de viagens de trabalho longas; auferindo no anterior emprego a remuneração no valor bruto de € 110 238,05, que passou agora, no seu novo emprego, para montante sensivelmente inferior; tendo ainda o autor perdido a oportunidade de manter uma carreira ao nível em que se encontrava ao tempo do acidente e de vir a desenvolvê-la em termos de valorização profissional, o que implica a passagem a um nível remuneratório inferior àquele de que poderia, noutras circunstâncias, beneficiar, é equilibrada e equitativa a fixação da indemnização de € 115 000,00 (cento e quinze mil euros) a título de dano biológico (incluindo perda da capacidade de ganho no valor de € 40 000,00), a acrescer aos montantes de € 173 997,13 (cento e setenta e três mil, novecentos e noventa e sete mil e treze cêntimos) referentes a perdas salariais e € 60 000,00 (sessenta mil euros) de danos não patrimoniais, tudo perfazendo o total indemnizatório global de € 348 997,13 (trezentos e quarenta e oito mil, novecentos e noventa e sete e treze cêntimos).
III - A quantia fixada a título de indemnização por danos de natureza não patrimonial eapurada segundo juízos de equidade (como é o caso da indemnização por dano biológico) de forma actualizada, é acrescida de juros de mora contabilizados a partir da data da respectiva decisão judicial (e não da data correspondente à citação da ré), sendo plenamente aplicável a doutrina expressa no AUJ n.º 4/2002, de 09-05-2002, publicado no Diário da República, I Série - A, n.º 164, de 27-06-2002, enquanto que relativamente à indemnização que se prende com o ressarcimento de danos de natureza patrimonial (perdas salariais), os respectivos juros contam-se a partir da data da citação da ré seguradora, nos termos gerais do art. 805.º, n.º 3, do CC.
Decisão Texto Integral:


Processo nº 10849/17.0T8SNT.L1.S1

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção).

I - RELATÓRIO.

AA instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra Ageas Portugal, Companhia de Seguros, S.A.

Alegou essencialmente:

Foi interveniente em acidente de viação que ocorreu entre o motociclo que na altura conduzia e o veículo segurado na Ré, por conduta culposa do condutor deste.

O acidente causou-lhe várias, aliás graves, lesões, que careceram de várias intervenções cirúrgicas com internamento, vários tratamentos, tendo estado três anos sem trabalhar, sem auferir quaisquer rendimentos, e tendo perdido capacidade de ganho para futuro.

Conclui pedindo que seja a R. condenada a pagar-lhe um valor a definir no competente incidente de liquidação ou em execução de sentença, mas nunca inferior a 128.550,00€, acrescido de juros à taxa legal contados desde a citação ou, em alternativa, na referida quantia actualizada de acordo com a taxa da inflação ou os índices de preços por forma a corrigir a desvalorização da moeda, desde a data de propositura da acção e ainda em juros desde a data da sentença.

A R. contestou admitindo a celebração do contrato de seguro conforme apólice que juntou e a culpa exclusiva do condutor do veículo seu segurado na produção do acidente, e impugnando a natureza, alcance e a extensão dos danos peticionados, bem como o seu montante.

Posteriormente, o A. deduziu incidente de liquidação, nos termos do art. 358º do CPC, peticionando a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de 2.625.628,60€, acrescida de juros à taxa legal contados desde a citação ou na referida quantia actualizada de acordo com a taxa de inflação ou os índices de preços por forma a corrigir a desvalorização da moeda, desde a data da propositura da acção e ainda em juros desde a data da sentença.

A R. veio deduzir oposição à liquidação, desde logo pugnando pela sua inadmissibilidade, e no mais contestando os danos e os cálculos indicados pelo A.

O incidente de liquidação foi admitido.

Veio a ser proferida sentença em cuja parte dispositiva consta:

“Em face do exposto, julgo parcialmente procedente a presente acção e, em conformidade:

A) Condeno a R. AGEAS PORTUGAL COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. a pagar à A. AA, por danos patrimoniais:

a) A quantia de 173.997,13€ (cento e setenta e três mil, novecentos e noventa e sete euros e treze cêntimos) a título de perdas salariais.

b) A quantia de 40.000,00€ (quarenta mil euros) a título de perda da capacidade de ganho.

B) Condeno a R. AGEAS PORTUGAL COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. a pagar à A. AA, por danos não patrimoniais:

d) A quantia de 60.000,00€ (sessenta mil euros) a título de dano biológico objectivo.

e) A quantia de 75.000,00€ (setenta e cinco mil euros) a título de dano não patrimonial subjectivo.

C) Condeno a R. AGEAS PORTUGAL COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. a pagar à A. AA os juros de mora que se vencerem sobre tais quantias, à taxa legal aplicável às operações civis, contada do transito em julgado da sentença, até efectivo e integral pagamento.

Apresentou o A. recurso de apelação, o qual veio a ser julgado parcialmente procedente por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 9 de Junho de 2022, nos seguintes termos:

“1 - revoga-se a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de “40.000,00€ (quarenta mil euros) a título de perda da capacidade de ganho”, a qual nesta parte se substitui pelo presente acórdão que condena a Ré a pagar ao A. a quantia de €130.000,00 (cento e trinta mil euros) a título de perda da capacidade de ganho;

2 - Declara-se que a decisão antecedente é actualizadora;

3 – Condena-se a Ré a pagar ao A. juros de mora à taxa legal aplicável às operações civis, sobre o valor referido em 1, desde a data do presente acórdão – 9 de Junho de 2022 – e até integral e efectivo pagamento;

4 – Condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia que, no que respeita exclusivamente ao previsível aumento do défice funcional do Autor que venha a ocorrer depois da presente decisão, vier a ser apurada em liquidação do decidido nestes autos;

5 – revoga-se a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar juros de mora sobre o valor da indemnização por perdas salariais – segmento a) da condenação da sentença recorrida [a) A quantia de 173.997,13€ (cento e setenta e três mil, novecentos e noventa e sete euros e treze cêntimos) a título de perdas salariais] – desde a data do trânsito em julgado da sentença, a qual nesta parte se substitui pelo presente acórdão que condena a Ré a pagar juros de mora à taxa legal aplicável às operações civis desde a data da citação e até integral e efectivo pagamento;

6 - revoga-se a sentença recorrida no seu segmento “C) Condeno a R. AGEAS PORTUGAL – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. a pagar à A. AA os juros de mora que se vencerem sobre tais quantias, à taxa legal aplicável às operações civis, contada do transito em julgado da sentença, até efectivo e integral pagamento”, a qual se substitui pelo presente acórdão, que condena a Ré nos termos que acabamos de referir em 3 e 5, e no que toca às condenações da sentença em “d) A quantia de 60.000,00€ (sessenta mil euros) a título de dano biológico objectivo” e “e) A quantia de 75.000,00€ (setenta e cinco mil euros) a título de dano não patrimonial subjectivo”, condena a Ré a pagar ao A. os juros de mora que se vencerem sobre tais quantias, à taxa legal aplicável às operações civis, contados da data em que a sentença foi proferida, e até efectivo e integral pagamento;

7 - revoga-se o segmento da sentença “Custas por A. e R. em proporção do decaimento, que fixo na proporção de 90% para a A. e de 10% para a R.” o qual se substitui pelo presente acórdão que, em 1ª e 2ª instância, condena em custas o Autor e a Ré, na proporção de 5/6 para o Autor e 1/6 para a Ré”.

Veio a Ré seguradora interpor recurso de revista, apresentando as seguintes conclusões:

i. Procurou afirmar-se no ponto 143 dos factos dados como provados um nexo de causalidade entre o referido nos pontos 131 a 136.2.5 (lesões sofridas pelo Recorrido) e 137 a142 (situação profissionaldo Recorrido) e aperda de emprego do Recorrido e com ela a oportunidade de prosseguir a sua carreira ao serviço da empresa H... ainda que no estrangeiro;

ii. Não é possível concluir diretamente, em termos de facto, que a perda de rendimento por parte do Recorrido não teria ocorrido, nas concretas circunstâncias em que ocorreu, se o Recorrido não tivesse sofrido o acidente dos autos;

iii. A matéria enunciada no ponto 143 tem um caráter manifestamente conclusivo e encerra matéria de direito, que deve ser eliminada, o que se requer;

iv. Relativamente ao ponto 144, entende a Recorrente que o agravamento a nível das articulações mais rápido do que ocorre na normalidade das pessoas não é uma consequência natural (em sentido físico-mecânico) das lesões sofridas pelo Recorrido (pontos 131 a 136.2.5 dos factos assentes);

v. Trata-se antes de uma conclusão normativa (através de um raciocínio abstrato), não fundamentada, que deve ser eliminada do acervo de factos assentes;

vi. Semelhante raciocínio foi levado a cabo pelo Tribunal da Relação de Lisboa para concluir que o Recorrido padecerá de aumento das queixas de dor e uma maior limitação em termos de mobilidade;

vii. Tem-se, assim, por conclusiva toda matéria enunciada no ponto 144 dos factos provados;

viii. O Tribunal da Relação parte da premissa (não comprovada) de que o Recorrido, devido à sua condição atlética, idade e força anímica, chegou ao cargo de diretor geral da H... e seguiria para o estrangeiro mesmo que a H... fechasse em Portugal;

ix. Tendo em conta não se encontrar comprovada a premissa de que parte o Tribunal da Relação de Lisboa, não reconhece justeza e equilíbrio ao montante fixado fixado no Acórdão recorrido em sede de dano patrimonial por perda da capacidade de ganho;

x. Impõe-se,assim, reduzir a indemnização aestetítulo para omontantemais justo e equitativo fixado pela Sentença, isto é, os ditos 40.000,00 €;

xi. As limitações que o Recorrido apresenta em consequência da dismetria dos membros inferiores de que ficou afetado fundamentaram a condenação da Recorrente nas quantias de 60.000,00 € e 75.000,00 €, atribuídas a título de danos biológico objetivo e de dano não patrimonial subjetivo.;

xii. E não estamos perante um dano futuro previsível certo nem perante um dano futuro eventual cujo grau de incerteza seja de tal modo que se possa prognosticar-se que o prejuízo venha a acontecer;

xiii. Nestes termos deverá o Tribunal ad quem revogar o Acórdão recorrido na parte em condena a Recorrente a pagar ao Recorrido “a quantia que, no que respeita exclusivamente ao previsível aumento do défice funcional do Recorrido que venha a ocorrer depois da presente decisão, vier a ser apurada em liquidação do decidido nestes autos”;

xiv. O Tribunal determinou, por aproximação, o valor líquido das remunerações que o Recorrido deixou de auferir durante os anos de 2014 a 2017;

xv. Por se tratar de indemnização obtida pela via da equidade no momento mais recente que pode ser considerado pelo Tribunal, a indemnização atribuída a título de perdas salariais foi, portanto, atualizada;

xvi. Resta assim concluir que os juros moratórios que incidem sobre as perdas salariais são devidos a partir da data da Sentença.

Apresentou o A. contra-alegações com as seguintes conclusões:

I. Devem todas as conclusões presentes nas alegações em resposta ser julgadas improcedentes,

II. E, consequentemente, o recurso da companhia ré indeferido no seu todo,

III. Confirmando-se o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa nas matérias impugnadas, sem prejuízo da impugnação autónoma do aqui recorrido oportunamente apresentada.

Subsidiariamente,

IV. Deve ser admitida a “ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido” uma vez que tal situação se enquadra no âmbito da norma do Artigo 636 do CPC, ex vi Artigo 679 do mesmo livro,

V. Sendo que, salvo elevada e melhor opinião do Venerando Supremo Tribunal de Justiça,

i) a anulação pura e simples dos factos 143 e 144 não será a solução juridicamente mais correcta nem a que reflecte a verdade dos factos,

ii) a redacção dos mesmos sempre poderá ser corregida pelo Venerando Supremo Tribunal de Justiça ou

iii) ou o processo poderá ser devolvido ao Tribunal da Relação de Lisboa para se proceder a novo julgamento nesta matéria, alterando-se a redacção dada aos mencionados factos provados.

Interpôs igualmente o A. revista excepcional, apresentando as seguintes conclusões:

1. A natureza do tema em debate (responsabilidade civil e indemnização do dano futuro, por um lado, e, por outro lado, a incerteza legislativa e jurisprudencial relativa à fixação do montante indemnizatório relativo a danos patrimoniais futuros emergentes de incapacidade preenche, por si só, o pressuposto de admissibilidade da revista excecional constante da alíneas a e b) do n. 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil.

2. A pretensão nos presentes autos formulada pelo autor em sede de recurso de Revista é:

Que seja a companhia de seguros condenada a pagar ao autor o valor 1.817.073,00 Euros e não somente 130.000,00 Euros acrescido de juros à taxa legal contados desde a citação ou na referida quantia actualizada de acordo com a taxa da inflação ou os índices de preços por forma a corrigir a desvalorização da moeda, desde a data de propositura da acção e ainda em juros desde a data da sentença.

3. Na solução de mérito aqui defendida pelo autor/recorrente são relevantes os factos já provados, a aplicação da regra de ouro nesta matéria que é a “teoria da diferença” e o juízo de equidade que o Venerando Supremo Tribunal de Justiça queira efectuar, alterando a condenação respeitante à indemnização pelo o dano patrimonial por perda da capacidade de ganho nos termos e na quantia pretendida pelo autor/recorrente.

4. Na decisão de mérito, em comparação a casos análogos e actualizando as análises, em honra dos critérios legais e da equidade, o Venerando Supremo Tribunal de Justiça poderá ponderar não só os parâmetros do rendimento passado e futuro do autor, a sua esperança de vida e a incapacidade que sofre como consequência adequada do facto ilícito e culposo, como também um previsível brutal aumento da taxa de inflação para valores não conhecidos desde há várias décadas, uma taxa de jurode rentabilidade docapital que não acompanha e não acompanhará esse aumento da taxa de inflação e a previsão de vida do autor como equivalente à sua própria vida profissional e remuneratória útil e real.

5. Nos presentes autos, o julgamento por equidade adquire especial relevância, nomeadamente com a eleição dos concretos parâmetros a que a decisão de mérito ficará vinculada.

6. Quanto a liquidação do prejuízo decorrente do dano patrimonial por perda da capacidade de ganho, i.e., a indemnização pelo dano patrimonial resultante da incapacidade genérica parcial permanente (posterior à consolidação médico-legal) importa eleger os seguintes parâmetros:

a) A consolidação médico legal das lesões ocorreu em 8 de Setembro de 2017; b) A incapacidade do autor foi fixada em 15%;

7. O autor/recorrente tinha na data do acidente uma esperança de vida de 35,14 anos, na data de consolidação médico legal das suas lesões uma esperança de vida de 32,39 e na data em que procedeu à liquidação da indemnização peticionada uma esperança de vida de 30,59 anos.

8. O autor esteve mais de 3 anos com incapacidade total para a execução de qualquer prestação profissional;

9. Devido ao afastamento do mercado laboral o autor continuou até ao final do ano de 2017 e durante parte significativa de 2018 sem conseguir contratar qualquer actividade remunerada.

10. No ano anterior ao acidente (2013) auferiu a título de rendimento por trabalho dependente 110.238,05 Euros.

11. No ano do acidente (2014) auferiu a título de rendimento por trabalho dependente 109.573,86 Euros.

12. Nos anos de 2015, 2016 e 2017 o autor não auferiu qualquer quantia a título de rendimento por trabalho dependente.

13. Em 2018 a título de rendimento por trabalho dependente auferiu 17.494,19 Euros

14. Em 2019 passou a auferir um rendimento de 59.589,32 Euros a título de rendimento por trabalho dependente.

15. A inflação esperada será sempre superior a 2% sendo actualmente de 8,9%.

16. A aplicação dos capitais situar-se-á ente 1% e 2%.

17. O autor recorrente nas presentes alegações e quanto à compensação porperda de capacidade de ganho, procede à liquidação da indemnização que reclama com base em três métodos diferentes e subsidiários:

método:

Quantificandoadiferençasalarial entre os valoresrecebidos antesedepoisdoacidente e considerando que a diminuição salarial é consequência adequada da diminuição do rendimento, concluindo que essa diminuição é de 50.648,73 Euros/ano.

Considerando a esperança de vida de 30,59 anos e a disponibilidade imediata da indemnização. As taxas de inflação e aplicação de capitais referidas e pela aplicação da fórmula de matemática financeira, calcula-se que o valor presente da indemnização será de 1.817.073,00 Euros a 4.326.610,00 Euros, valor menor no qual se pede a condenação da ré.

método;

Ponderando a desvalorização de 15% arbitrada pelo INMLCF à remuneração recebida á data do acidente, isto é 110.238,05 Euros X 15% = 16.535,70 Euros, a esperança de vida, as mencionadas taxas de inflação e de aplicação dos capitais e as fórmulas de matemática financeira.

Considerando a esperança de vida de 30,59 anos e a disponibilidade imediata da indemnização, pela aplicação da fórmula de matemática financeira calcula-se que o valor presente da indemnização é de 593.234,00 Euros a 1.412.649,00 Euros, valor no qual se pede subsidiariamente a condenação da ré.

método:

Por último, ponderando a desvalorização de 15% arbitrada pelo INMLCF à remuneração recebida á data do acidente, isto é 110.238,05 Euros X 15% = 16.535,70 Euros, a esperança de vida e não aplicando as fórmulas de matemática financeira, mas retirando entre 1/3 a 1/4 para compensar a disponibilidade imediata do dinheiro.

Considerando a esperança de vida de 30,59 anos e a disponibilidade imediata da indemnização, retirando a esse valor entre 1/3 e 1/4 calcula-se que o valor presente da indemnização é de 337.218,24 Euros e 379.370,52 Euros, valor no qual se pede subsidiariamente a condenação da ré.

18. O autor/recorrente nas presentes alegações realiza uma reflexão sobre os referidos 3 métodos concluindo que só o primeiro vai ao encontro dos critérios legais de ressarcimentodoprejuízo sofridopeloautor eefectivamente provadonospresentes autos como decorrente das diferenças salariais que sofreu, sofre e sofrerá até ao seu decesso.

19. Nesta conformidade a indemnização que nos ocupa tem como limite mínimo 337.218,24 Euros e limite máximo 4.326.610,00 Euros. Todavia, e pelas razões desenvolvidas ao longo destas alegações e concluídas no parágrafo anterior é indiscutível que só o valor máximoresponde aos comandos normativos que se extraem das normas jurídicas que são convocadas e que se indicarão de novo abaixo, pelo que o presente recurso deverá, em honra ao princípio do pedido, condenar a companhia ré no máximo, i.e, conforme a pretensão formulada na 1ª instância.

Dos restantes pressupostos da responsabilidade civil aquiliana

20. Finalmente, verifica-se a culpa do lesante BB, condutor da viatura matrícula ...-...-GE no produção do facto ilícito e culposo referido nos factos provados, a transferência da responsabilidade civil para a companhia de seguros “A..., SA”, antecessora da ré, através da apólice ...8, que assim surge nestes autos como única responsável civil e indemnizadora dos danos que foram referidos e o competente nexo causal entre os danos e a lesão.

Das normas jurídicas violadas

21. A julgar de outro modo, a douta sentença recorrida fez uma má interpretação e aplicação das normas que se extraem nos Artigos 483, 493, 496, 562, 563, 564, 566 todos do Código Civil e Decreto-Lei n. 291/2007, de 21 de Agosto e ainda das demais normas de direito que o Venerando Supremo Tribunal de Justiça queira aplicar suprindo as insuficiências do recorrente.

Contra-alegou a Ré, apresentando as seguintes conclusões:

a) O Recorrente interpôs recurso excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, com fundamento nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, não procedendo à devida justificação para que o recurso possa ser admitido.

b) Os danos decorrentes da perda da capacidade de ganho têm sido objeto de estudo aprofundado pela jurisprudência e doutrina.

c) Não existem dúvidas na jurisprudência e doutrina quanto aos critérios a utilizar para arbitrar uma indemnização devida a título de perda da capacidade de ganho, cabendo somente ao julgador examinar os factos constantes dos autos e concluir pelo preenchimento ou não desses critérios.

d) O Recorrente pretende discutir, uma vez mais, a mesma factualidade em torno da alegada perda da capacidade de ganho, não existindo, por conseguinte, uma necessidade de apreciação da matéria para uma melhor aplicação do direito.

e) Pelo que deve ser rejeitado o presente recurso excepcional, por falta de fundamento, nos termos do artigo 672.º, n.º 2, do CPC.

Ainda que assim não se entenda, o que não se concede:

f) A matéria enunciada no ponto 143 da matéria de facto, aditada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, tem um caráter manifestamente conclusivo e encerra matéria de direito, que deve, por isso, ser eliminada da matéria de facto.

g) Não obstante, e mesmo tendo por base o ponto 143 da matéria de facto, jamais a indemnização pela perda da capacidade de ganho poderia ser calculada nos termos propostos pelo Recorrente.

h) Porquanto, os meios de prova que constam dos autos desmentem a alegada perda da capacidade de ganho a que se refere o Recorrente.

Por acórdão proferido pela Formação neste Supremo Tribunal de Justiça, datado de 11 de Janeiro de 2023, foi admitida a revista excepcional apresentada pelo A.

II – FACTOS PROVADOS.

Encontra-se provados nos autos que:

1. No dia 26 de Junho de 2014, pelas 15 horas e 30 minutos, ocorreu um acidente de viação na Av. ..., Estrada ..., freguesia de ..., concelho de ..., em que foram intervenientes:

1.1. O Motociclo com 125 cc, matrícula ...-OL-..., conduzido pelo A. e propriedade do mesmo.

1.2. O veículo ligeiro de passageiros, matrícula ...-...-GE, conduzido por BB e propriedade de J..., Lda., NIPC ...7, com sede em ....

2. Na ocasião, a responsabilidade infortunística adveniente da circulação do veículo ...-...-GE estava transferida para a seguradora A..., SA”, antecessora da R., através da apólice ...8.

3. Imediatamente antes do embate, o motociclo do A. seguia na sua faixa de rodagem na direcção .../... e a viatura ...-...-GE seguia no sentido oposto.

4. A dada altura, numa zona antecedente a uma curva, o condutor da viatura ...-...-GE, não conseguir dominar a marcha do veículo de modo a mantê-lo na faixa de rodagem destinada ao seu sentido de trânsito e, ultrapassando o risco longitudinal continuo, que dividia os dois sentidos de trânsito, invadiu a faixa de rodagem onde circulava o A. embatendo com a viatura ...-...-GE na perna esquerda do autor, esmagando-a contra o motociclo que conduzia.

5. Na sequência do embate, o motociclo foi derrubado, ficando paralisado no local e na sua faixa de rodagem, e o A. foi projectado a vários metros de distancia, ficando prostrado na faixa de rodagem.

6. Por escrito, datado de 15-09-2014, a R. comunicou à A. que assumia 100% da responsabilidade adveniente do referido acidente.

7. Do acidente resultaram para o A. traumatismo do ombro esquerdo e da perna esquerda com fractura exposta de grau III B com perda de substância e exposição do foco de fractura e da veia safena tratada com encavilhamento da tíbia e encerramento precoce das feridas, posterior.

8. Após o sinistro a A. foi assistido no local pelos bombeiros e Viatura Médica de Emergência e Reanimação (VMER) tendo sido transportado com suporte ventilatório para o serviço de urgência do hospital de ..., onde foi avaliado clínica e imagiologicamente.

9. O A. foi operado em 26-06-2014, efectuou encavilhamento da tíbia com ETN1 (1 Expert Tibial Nail (haste intramedular de tíbia) e encerramento prematuro das feridas, permaneceu internado no serviço de ortopedia, transferido para o serviço de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva.

10. Em 14-07-2014, o A. foi operado por perda de substância com exposição do foco de fractura e veia safena. Ficou em vacuoterapia.

11. Em 17-07-2014, o A. foi avaliado pela Medicina Física e de Reabilitação do hospital de ... apresentando alterações sugestivas de lesão do nervo peroneal comum, com compromisso motor e sensitivo.

12. Em 28-07-2014, foi operado para desbridamento e encerramento da área cruenta com retalho fasciocutâneo de perfurantes da artéria tibial posterior.

13. A partir de 28-07-2014 apresentou sofrimento da metade anterior do retalho com exsudado purulento. Efectuou hemoculturas com klebsiella pneumoniae sensível ao imipnem2 (15 dias).

14. Em 07-08-2014, foi operado para desbridamento cirúrgico de ½ distal necrosada do retalho + excerto de pele parcial (da zona doadora da coxa direita), por necrose de ½ distal do retalho perfurante tibial posterior da perna esquerda (infecção por klebsiella pneumoniae3)2. Ficou sob vacuoterapia.

15. Em 14-08-2014, foi operado para desbridamento e reconstrução da perna esquerda com retalho livre muscular de gracilis direito. Microanostomosado aos vãos tibiais posteriores esquerdos.

16. Em 19-08-2014, o A. efectuou cobertura do retalho muscular com pele parcial livre colhida da coxa contra lateral. Verificou-se infecção de enxerto/retalho por pseudomonas sensível à gentamicina tendo realizado vários pensos desbridantes, cromocol local e antibioterapia dirigida durante 12 dia com melhoria franca. Foi seguido em Medicina Física e de Reabilitação (MFR), tala tibiotársica para pé pendente à esquerda. Iniciou carga a 04-09-2014.

17. Entre 27-08-2014 e 08-09-2014, o A. fez programa de reabilitação consistente em mobilização articular manual, fortalecimento muscular manual e treino de funcionalidade no leito.

18. O A. teve alta em 08-09-2014, com apoio da marcha por duas canadianas, imobilização por tala gessada na perna esquerda, referenciado para consulta externa de ortopedia e de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR), no hospital de ... e para penso diário no Centro de Saúde ..., correspondente à área de residência dos pais.

19. O A. permaneceu no domicílio, em casa dos pais, em repouso no leito, com necessidade de apoio de terceira pessoa.

20. Em 22-09-2014, o A. recorreu a consulta de ortopedia no Hospital ..., para uma segunda opinião, tendo sido proposta cirurgia.

21. O A. foi avaliado em ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R. em 24-09-2014, os quais referem que:

21.1. à data da alta hospitalar apresentava parestesias de D4 e D5.

21.2. Gaze gorda na região dadora na coxa direita.

21.3. Ferida da perna esquerda sem exsudados ou cheiros. Retalho e enxerto com boa pega.

21.4. Subsistem três pequenas medalhas por epitelizar, um a nível do bordo supero-externo que se comunica com local virtual não serosa entre interface osso/retalho (TAC MIE a 06-09-2014).

21.5. À data estava a usar tala para pé pendente à esquerda, a fazer carga parcial com duas canadianas, a fazer penso de dois em dois dias no Centro de Saúde.

21.6. O RX revelou cavilha estática. bom alinhamento. Afastamento dos topos ósseos.

21.7. Medicina Física e de Reabilitação (MFR) 20 sessões.

21.8. Foi pedida consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR).

22. Em 26-09-2014, o A. foi avaliado em consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no Hospital ..., como serviços clínicos da R. Iniciou tratamentos em 29-09-2014, sendo referido que o A. foi enviado para fisioterapia pós alta hospitalar por pé pendente para recuperação funcional, que tem tala posterior e que esboça movimentos activos dedo pé esquerdo.

23. Em 13-10-2014, o A. foi observado em consulta de ortopedia no hospital de ... tendo efectuado Rx.

24. Em 13-10-2014, o A. foi avaliado em consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no Hospital ..., como serviços clínicos da R. tendo efectuado exame bacteriológico que revelou MRSA4 (Sigla inglesa para Staphylococcus Aureus Resistente à Meticilina, nome de uma bactéria da família da Staphylococcus Aureus (https://www.mdsmanuals.com.pt)” tendo sido alterada a antibioterapia.

25. O A. foi observado na consulta externa de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no hospital de ..., em 15-10-2014, tendo mantido a antibioterapia.

26. Em 20-10-2014 e em 27-10-2014, o A. efectuou consultas de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

27. Em 29-10-2014, em consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., o A. efectuou revisão pós 4 meses de fractura exposta grau III B da perna esquerda, sendo referido: A ser seguido em consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (retalho muscular). A fazer medicina física e de reabilitação. RX: bem ainda sem consolidação tibial. Deve manter cuidados por outras especialidades. Por ortopedia vai iniciar carga total sem canadianas. Ponderar a dinamização da cavilha vs novo encavilhamento. Vem para pensos de vacuoterapia.

28. Em 30-10-2014, em consulta de medicina física e de reabilitação, no Hospital ..., como serviços clínicos da R., refere-se que o A. mantém limitação do movimento de flexão dorsal passivo. Consegue realizar movimentos de flexão interna da perna. Apresenta contracção visível do musculo tibial anterior.

29. Em 31-10-2014, em consulta de medicina física e de reabilitação, no Hospital ..., como serviços clínicos da R., refere-se que: continua a ser seguido em consulta de cirurgia plástica e de reconstituição por retalho muscular. Apresenta penso oclusivo. Rx sem consolidação tibial. Limitação da cinésia.

30. Em 03-11-2014, o A. efectuou consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

31. Em 12-11-2014, o A. efectuou consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no hospital de ....

32. No dia 14-11-2014, o A. foi operado no Hospital ... para extracção do parafuso proximal e osteometria do perónio para melhorar a dinamização. Teve alta no dia 15.

33. Em 17-11-2014, o A. efectuou consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no Hospital ..., como serviços clínicos da R. e de ortopedia no Hospital ..., pós cirúrgico.

34. Em 26-11-2014, o A. efectuou consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no hospital de ....

35. Em 01-12-2014, o A. efectuou consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no Hospital ..., como serviços clínicos da R. e de ortopedia no Hospital ....

36. Em 03-12-2014, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

37. Em 05-12-2014, o A. efectuou consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) e de de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

38. Em 19-12-2014, o A. efectuou consulta de ortopedia no hospital de ... e consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR).

39. Em 22-12-2014, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R. para revisão após seis meses de fractura exposta, referindo-se que mantem fistula. Rx: bom alinhamento. Tem contacto com topos fraturários da tíbia. fistula activa. Medicado com Bactrum.

40. Em 29-12-2014, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

41. Em 29-12-2014 e em 05-01-2015, o A. efectuou consultas de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

42. Em 12-01-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde é descrito que mantem exsudado abundante. Ponderar remoção da cavilha e fistula com colocação de nova cavilha vs fixador externo. Efectuou Rx da perna que revelou encavilhamento medular tibial em relação com fractura do terço distal da diáfise ainda não consolidada, fractura da diáfise peronial em duas localizações em fase de consolidação, densificação em lobulação da projecção das partes moles particularmente na sua vertente posterior e interna a valorizar clinicamente.

43. Em 12-01-2015, o A. efectuou consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no hospital de ....

44. Em 14-01-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde é referido que se opta pela remoção da fistula, substituição de cavilha e osteotomia do perónio. AC: osteossíntese dos ossos da perna e retalhos de cobertura. Para operar no dia 30-01-2015.

45. Em 16-01-2015, o A. efectuou consulta de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde é referido que apresenta melhoria funcional do pé pendente esquerdo. Efectuou também Rx de tórax nos serviços clínicos da R. com resultados dentro dos padrões normais.

46. Em 26-01-2015, o A. efectuou consulta de cirurgia plástica e de reconstituição (CPR) no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

47. Em 28-01-2015, o A. efectuou consulta de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

48. No dia 30-01-2015, o A. foi operado no Hospital ..., como serviços clínicos da R. para EMOS da cavilha e substituição por outra. Teve alta no dia 14-02-2015.

49. No dia 09-02-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., referindo-se que:

49.1. Apresentando pseudartose infectada da tíbia.

49.2. O resultado da bacteriologia staphylococus sensível ao bactrim e linezolide. Medicado com bactrim + fucidine.

49.3. O penso apresenta exsudado da ferida de onde foi feita excisão de fistula.

49.4. Apresenta flutuação proximal a esta fistula que se aspira, com saída de sangue escuro que se aspira para cultura.

49.5. Fez-se penso com Aquacel Ag..

49.6. Mantém pensos 3 vezes por semana.

49.7. Mantém bactrim + fucidine

50. Em 16-02-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde:

50.1. Efectuou penso da ferida anterior do joelho que apresentava ligeiros sinais inflamatórios;

50.2. Ferida de excisão da fistula com exsudado purulento. Foram removidos pontos e agrafes. Mantém pontos.

50.3. Feridas distais da perna sem sinais inflamatórios. Feita remoção dos pontos;

50.4. Ferida externa da perna com sangue. Feita remoção de agrafes alternados.

50.5. Microbiologia negativa.

50.6. Ponderar tratamento na câmara hiperbárica.

50.7. Em 20-02-2015, o A. efectuou consulta de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., como serviços clínicos da R. determinando-se tratamento na câmara hiperbárica.

51. Em 02-03-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., apresentando melhoria dos sinais inflamatórios e diminuição do exsudado. Manteve bactrim e fucidine. Rx com bom alinhamento. contacto ósseo mantido.

52. Em 16-03-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se refere:

52.1. Apresenta diminuição do exsudado;

52.2. Refere dismetria dos membros inferiores de cerca de 2 cm;

52.3. Fistula encerrada.

52.4. Vem a fazer marcha sem canadianas.

52.5. Rx apresenta encurtamento da tíbia com extrusão proximal da cavilha, mantem bom alinhamento. Não existe ainda completa sinostese dos topos fracturários, em particular na incidência de perfil. o perónio apresenta dois traços fracturários, com tendência consolidativa e com ligeiro desalinhamento.

52.6. Deve efectuar tratamentos de medicina física e de reabilitação;

52.7. Mantém antibioterapia com bactrim + fucidine.

52.8. Efectuou penso da ferida anterior do joelho que

53. Em 31-03-2015 o a. terminou os tratamentos de MFR nos serviços da seguradora no Hospital ....

54. Em 01-04-2015 o a. iniciou tratamentos de MFR numa clínica em ....

55. Em 06-04-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde foi feita aspiração de pequena quantidade de sangue com vestígios de pus (abcesso) que foi enviada para microbiologia. Mantém bactrim + fucidine.

56. Em 13-04-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., apresentando fistula com saída de exsudado e lesão na região do retalho com pus, aparentemente sem comunicação. Fez penso com Aquarel Ag. em ambos os locais. Foi remetido para vacuoterapia em ambulatório.

57. Em 15-04-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., para aplicação de vacuoterapia. Prescrito penso 2 vezes por semana. Bacteriologia negativa. Mantem antibioterapia.

58. Em 17-04-2015, o A. efectuou consulta de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., referindo-se haver melhoria da rigidez TT esquerda..

59. Em 20-04-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., para pensos de vacuoterapia. Mantem antibioterapia.

60. Em 27-04-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., referindo-se Rx mantem bom alinhamento.

61. Em 11-05-2015, o A. efectuou consulta de cirurgia plástica e de reconstrução no Hospital ..., como serviços clínicos da R., para remoção da vacuoterapia.

62. Em 11-05-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., referindo-se Rx mantem bom alinhamento. Calo? Mantem bactrim e fucidine. Penso 2 vezes por semana. Refere desde há uma semana rubor e prurido na zona dadora da coxa direita. Mantem antibioterapia.

63. Em 15-05-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., referindo-se mantem antibioterapia e pensos duas vezes por semana. Queixas de gonalgia esquerda de carácter mecânico medial/edema. Edema TT esquerda. Continua tratamentos em ambulatório.

64. Em 25-05-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., referindo-se que o A. refere desde há 4 dias mau estar abdominal e cansaço fácil. Sem alteração na urina ou trânsito intestinal. Mantem penso. Mantem antibioterapia.

65. Em tal data o Rx revelou tendência reparativa com desenvolvimento de calo ósseo. No perónio também, mas sem completa consolidação da linha de fractura e sem desalinhamento valorizável. Considerável espessamento das partes moles da perna no seu terço distal, coexistindo múltiplos clips na região posterior da tíbia.

66. Em 01-06-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., mantendo antibioterapia e vacuoterapia.

67. Em 12-06-2015, o A. efectuou consulta de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., como serviços clínicos da R., mantendo tratamentos de vacuoterapia. Melhoria das cinesias TT esquerda, gonalgia esquerda.

68. Em 15-06-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde referiu ter, desde há uma semana, rubor e prurido da zona dadora da coxa direita. Mantem antibioterapia.

69. Em 22-06-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde ser observou melhoria do rubor e prurido da zona dadora da coxa direita. Rx revelou tendência consolidativa da fractura peronial com calo ósseo ligeiramente irregular. Mantem antibioterapia.

70. Em 29-06-2015, o A. efectuou TAC da perna no Hospital ..., como serviços clínicos da R., que revelou fractura não consolidada da tíbia e do perónio, vários locais abecedados, sobretudo no terço distal da perna com fistulação cutânea anterior, edema generalizado do tecido subcutâneo, distensão capsular ao nível da articulação do joelho com conteúdo líquido, sinais de osteoporose de desuso.

71. Em 06-07-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se fez penso com três orifícios de drenagem e se verificou rubor. Fez desbridamento TC que revelou fractura não consolidada.

72. Em 08-07-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde foram mantidos os pensos.

73. Em 10-07-2015, o A. efectuou consulta de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., como serviços clínicos da R., apresentando gonalgia esquerda, edema e dor mobilidade activa. Mantem pensos.

74. Em 13-07-2015, o A. efectuou consulta de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., como serviços clínicos da R., mantendo pensos e antibioterapia.

75. Em 20-07-2015, o A. efectuou consulta de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., como serviços clínicos da R., para fazer penso.

76. Em 27-07-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., apresentando tumefacção anterior proximal da perna esquerda com flutuação. Foi feita aspiração de cércea de 10 cc de conteúdo amarelo enviado para cultura, mantendo pensos 3 x por semana e antibioterapia.

77. Em 07-08-2015, o A. efectuou consulta de medicina física e de reabilitação no Hospital ..., como serviços clínicos da R., mantendo queixas de gonalgia esquerda e apresentando discreto edema do joelho esquerdo.

78. Em 17-08-2015, o A. recorreu a consulta de psiquiatria com o Prof. Dr. CC apresentando depressão. Efectuou tratamento com Sertralina5 até Agosto de 2017.

79. Em 19-08-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., mantendo pensos e terapêutica.

80. Em 24-08-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., tendo feito Rx que revelou fractura ainda não consolidada, esboçando na união da transição do terço médio para o terço inferior do perónio. Alterações da densidade das partes moles com alguma lobulação podendo em relação com o mecanismo de contensão. Penso: diminuição do exsudado e dos sinais inflamatórios. Mantem penso e antibioterapia.

81. Em 02-09-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., apresentando as feridas encerradas. Mantem penso e antibioterapia.

82. Em 23-09-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., apresentando RX com calo ósseo em formação. Mantem penso e antibioterapia.

83. Em 02-10-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., apresentando feridas encerradas.

84. Em 02-10-2015, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., apresentando melhoria álgica e do edema joelho esquerdo, cinesias mantidas e indolores. Retomou marcha e tapete 15 minutos sem dor. Mantem exsudado e ligeiro edema da ferida. Mantem penso 2 x por semana. continua tratamentos. Estacionário, boa evolução clínico funcional.

85. Em 21-10-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., apresentando as feridas encerradas.

86. Em 16-12-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., mantendo as feridas encerradas. Rx revelou fractura não consolidada no terço inferior da diáfise. Fractura não consolidada da diáfise do perónio com topos alinhados e sinais de remodelação óssea. Presença de múltiplos clips cirúrgicos na região póstero-interna do terço médio da perna, com densificação dos tecidos adjacentes de sugestão inflamatória.

87. Em 18-12-2015, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., mencionando-se: estacionário. Peço 20 sessões para manutenção de um bom estado osteomusculo-articular.

88. Em 23-12-2015, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., na qual se menciona TC com fractura consolidada em ¾ da circunferência. Desenvolveu urticária da perna com prurido e rubor das cicatrizes. Foi pedida consulta de dermatologia.

89. Em 03-01-2016, o A. efectuou consulta de urgência no Hospital ..., como serviços clínicos da R., por recidiva de abertura das locas e reactivação da infecção.

90. Em 04-01-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., na qual se menciona que uma semana após suspensão de antibioterapia iniciou sinais inflamatórios do joelho e perna esquerda, com abertura de fistula na face interna, proximal da perna e tumefacção com calor, rubor e flutuação junto ao foco de fractura. Iniciou terapêutica com Linezolite.

91. Em 06-01-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., na qual efectuou penso, mantendo drenagem.

92. Em 11-01-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., na qual efectuou penso, mantem drenagem, efectuou RX de tórax que não revelou alterações significativas.

93. Em 13-01-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., na qual se na qual se verificou que as hemoculturas são negativas. Penso mantem exsudado.

94. Em 15-01-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se anotou: área de aparecimento de exsudado distal e proximal. Mantem AB/hemoculturas negativas. Continua tratamentos.

95. Em 18-01-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se anotou: Penso: aumento da ferida distal com exsudado abundante, área de aparecimento de exsudado distal e proximal. Mantem AB/hemoculturas negativas. Continua tratamentos.

96. Em 19-01-2016, o A. fez uma ressonância magnética (RM) à perna esquerda que revelou a extensão das locas.

97. Em 26-01-2016, o A. foi operado pelo Dr. DD no Hospital ..., para remoção da cavilha, rimagem e aspiração medular, introdução de cavilha Ender com PMNN + 2g Vancomicina * 4 g Meropnem (com antibioterapia e vacuoterapia), desbridamento de fistulas. Ficou internado. Fez pensos de vácuo. RX mantem alinhamento Cavilha Endomedular. Penso: duas fistulas distais em vias de encerramento. Teve alta dia 09-02-2016 com apoio de marcha por duas canadianas, referenciado para efectuar penso diário no Centro de Saúde.

98. Em 10-02-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

99. Em 12-02-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., anotando-se PO sem complicações, assintomático, dismetria MI FMG 4*. Mantem tratamentos em Centro de Saúde da área de residência.

100. Em 09-03-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., revelando ao RX consolidação da fractura, fistulas encerradas sem reacção inflamatória.

101. Em 14-03-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

102. Em 20-02-2016, o A. efectuou consulta de urgência no Hospital ..., como serviços clínicos da R., por síndrome febril indeterminado. Apresentava aumento das transamilases por hepatite tóxica, permaneceu internado, teve alta no dia 24-03-2016.

103. Em 28-03-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., anotando-se actualmente apirético sem medicação.

104. Em 08-04-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., anotando-se mantem-se estacionário, continua tratamentos.

105. Em 26-04-2016, o A. foi operado no Hospital ..., para extracção da cavilha. Teve alta dia 27-04-2016.

106. Em 03-05-2016, o A. efectuou consulta de seguimento de gastroenterologia.

107. Em 06-05-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R.

108. Em 11-05-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde lhe foi dada alta da especialidade de ortopedia.

109. Em 03-03-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R. onde se mencionou que o A. tem queixas de edema residual + dificuldade F. dorsal pé esquerdo por retracção cicatricial. FNG 4+. Prescrevem-se tratamentos de drenagem venolinfática + Fm + tec para optimização de défice funcional. TTE estacionário. boa evolução clínico-funcional, continua tratamentos.

110. Em 08-06-2016, o A. efectuou consulta de seguimento de gastroenterologia.

111. Em 29-06-2016, o A. efectuou consulta de ortopedia no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde o a. referiu edema vespertino da perna esquerda.

112. Em 01-07-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R. apresentando gonalgia esquerda de caracter mecânico. Cinesias mantidas. Palpação t rotuliano /discreto edema, continua tratamentos.

113. Em 15-07-2016, o A. fez Eco da articulação do joelho esquerdo no Hospital ..., como serviços clínicos da R., que revelou alteração provavelmente inflamatória do LLI e LLE; e Rx do joelho esquerdo que revelou sinais de antecedentes de ligamento plastia de LCA, rectificação de região anterior metafiséria do fémur e ligeiras alterações degenerativas.

114. O A. efectuou consultas de seguimento e diagnóstico de gastroenterologia. Fez ecografia abdominal e colonoscopia em 11-082016.

115. Em 02-09-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

116. Em 21-10-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R..

117. Em 14-11-2016, o A. foi operado no hospital ..., pela especialidade de cirurgia plástica e reconstrutiva, para reconstrução das cicatrizes, tendo sido efectuadas plastias em Z + autoenxerto de gordura. Teve alta em 18-11-2016.

118. Em 02-12-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se verificou a inexistência de intercorrências, boa cicatrização, melhoria do edema da perna esquerda e da flexibilidade da TT esquerda.

119. Em 30-12-2016, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se verificou estar o A. estacionário, com boa evolução clínica e funcional, melhoria da flexibilidade e do edema da perna esquerda.

120. Em 27-01-2017, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se verificou estar o A. estacionário, com continuação dos tratamentos.

121. Em 24-02-2017, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde anotou continuação dos tratamentos.

122. Em 13-03-2017, o A. foi operado no hospital ..., pela especialidade de cirurgia plástica e reconstrutiva, para reconstrução das cicatrizes, com autoenxertos com gordura da perna esquerda. Teve alta em 15-03-2017.

123. Em 31-03-2017, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se anotou cicatriz bem.

124. Em 02-06-2017, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se anotou estacionário.

125. Em 23-06-2017, o A. efectuou consulta de CPR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se anotou mantem tratamentos.

126. Em 24-06-2017, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se anotou boa evolução.

127. Em 21-07-2017, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se anotou estacionário.

128. Em 18-08-2017 o A efectuou RM do joelho esquerdo que revelou ruptura degenerativa ligamentar bursite sem indicação operatória.

129. O A. teve alta em 23-08-2017, tendo retomado o trabalho em 24-08-2017.

130. Em 08-09-2017, o A. efectuou consulta de MFR no Hospital ..., como serviços clínicos da R., onde se anotou que se atingiu o potencial de recuperação e que o A. tem alta.

131. A data de consolidação médico legal das lesões sofridas pelo A. na sequência do acidente é fixável em 08-09-2017, tendo este sofrido de:

131.1. Um período de défice funcional temporário total fixável em 110 dias (entre 23-04-2015 e 18-09-2015);

131.2. Um período de défice funcional temporário parcial fixável em 1061 dias (entre 09-09-2014 e 13-11-2014, entre 16-11-2014 e 29-012015, entre 05-02-2015 e 25-01-2016, entre 10-02-2016 e 19-032016, entre 25-03-2016 e 13-11-2016, entre 18-11-2016 e 12-03-2017, entre 16-03-2017 e 08-09-2017);

131.3. Um período de repercussão temporária na actividade profissional total de 1122 dias (26-06-2014 a 21-07-2017);

131.4. Um período de repercussão temporária na actividade profissional parcial de 49 dias (22-07-2017 e 08-09-2017);

131.5. De sofrimento físico e psíquico, de grau seis, em sete de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional durante o qual apresentou intercorrências, o tipo de traumatismo e os tratamentos efectuados.

132. A A. ficou a padecer, em consequência do acidente e lesões sofridas com o mesmo:

132.1. De um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 15 pontos de 100 [Rigidez da articulação tibiotársica, considerando as sequelas dos movimentos de flexão plantar (Mc 0638) e de dorsiflexão (Mc 0641) como sinérgicas; Dismetria dos membros inferiores (Cap. III nº 7 Mc 0625), com recurso a palmilha compensatória; Joelho esquerdo doloroso (Mf 1310), associado a limitação da flexão do mesmo não valorável enquanto sequela isolada; Afectação permanente do foro psicológico enquadrável em “perturbação de adaptação, com perturbação predominante de outras emoções” (Nb 1203)]. Tais sequelas são compatíveis com o exercício da actividade profissional habitual do A. mas implicam esforços suplementares.

132.2. De dano estético permanente fixável no grau quatro, numa escala de sete graus de gravidade crescente tendo em conta as cicatrizes com que ficou.

132.3. De uma repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer fixável no grau quatro, em sete de gravidade crescente, atenta a repercussão das sequelas nos treinos e participação em maratonas, atendendo a que, ainda que as sequelas não sejam impeditivas de correr, são idóneas a produzir afectação nesta tarefa com repercussão no rendimento e eficácia necessários à prática desta actividade; repercussão em outras actividades de lazer como condução de mota, que abandonou.

132.4. De uma repercussão permanente na actividade sexual é fixável no grau 3, com base na limitação parcial do desempenho por dificuldade em realizar posições, por dor e limitação da mobilidade no membro inferior esquerdo.

133. O A. passou a depender em permanência das seguintes ajudas técnicas:

133.1. Uso de palmilha para compensar a dismetria dos membros inferiores; e

133.2. Uso de meias de contensão elástica para atenuação das queixas de dor e edema no membro inferior esquerdo.

134. O A. ficou a padecer, em consequência do acidente e lesões sofridas com o mesmo, de perturbação de adaptação, com perturbação predominante de outras emoções, que condicionam a eficiência pessoal e profissional do A., que carece em permanência de acompanhamento regular em consultas de Psiquiatria.

135. O A. apresenta:

135.1. Limitação, por dores, na marcha prolongada, na permanência prolongada em posições ortostáticas e de sentado, por edema e dor local, não consegue correr, nem se colocar de cócoras ou de joelhos.

135.2. Alterações da qualidade do sono por ansiedade e revivência do acidente, com insónia com cansaço diurno e diminuição da concentração. Não passa no local do acidente, não anda de motociclo.

135.3. Dificuldade nas posições para efectuar o acto sexual por dores e limitação do joelho e tornozelo esquerdos.

135.4. Dor no joelho e na perna esquerdos, acompanhada de edema mais acentuado vespertinamente, que se agrava ao longo do dia, alivia com a elevação dos membros à noite e uso de contensão elástica diária. Evita tomar medicação pelos antecedentes de hepatite tóxica.

135.5. Passou a andar sempre com o local da cicatriz tapado, mesmo na praia, deixou de praticar ultramaratonas, trail running, maratonas e corrida de fundo, e de treinar seis vezes por semana. Actualmente só faz exercícios no ginásio para reforço muscular da perna, mantendo os exercícios da medicina física e de reabilitação.

135.6. Limitação nas tarefas profissionais que requerem a permanência prolongada na posição de sentado, nomeadamente à secretária e na condução, maxime no pára e arranca citadino e em viagens de trabalho longas. Passou a conduzir um veículo automóvel de mudanças automáticas.

136. A A. apresenta, em consequência do acidente e lesões sofridas com o mesmo e tratamento das mesmas, as seguintes sequelas:

136.1. No membro inferior direito:

136.1.1. área de 17 cm x 27 cm, na face anterior do terço médio e inferior da coxa – área dadora de retalho;

136.1.2. cicatriz vertical na face medial do terço superior e médio da coxa, deprimida, com 12 cm de comprimento - área dadora de musculo.

136.2. No membro inferior esquerdo:

136.2.1. múltiplas cicatrizes, hipocrómicas, em toda a perna e face anterior do joelho, com avulsão muscular;

136.2.2. cicatriz irregular, acastanhada, na face anterior do terço inferior da perna, vertical, com aspecto ulcerado cicatrizado, com 6 cm x 3 cm de maiores eixos;

136.2.3. mobilidade articular do joelho limitada na flexão a 120° (140° Dta.);

136.2.4. mobilidade articular do tornozelo limitada na flexão plantar a 20° (50° Dta.), na flexão dorsal a 10° (20° Dta.), na eversão/inversão;

136.2.5. Dismetria dos MI evidenciada no RX de 16 mm, compensada pelo uso de palminha de 12 mm.

137. O A. à data do sinistrado, tendo nascido em ........1970, tinha 43 anos e era o director geral da H... Portugal para os produtos de força (motores de barcos).

138. Em 2013, o A. auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor bruto de € 109.573,86.

139. Em 2014, o A. auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor bruto de € 110.238,05.

140. Em 2015, 2016 e 2017 o A. não teve rendimentos de trabalho dependente.

141. Em 2018, o A. auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor de 17.494,00€.

142. O autor trabalha para “G..., Lda” auferindo a quantia mensal líquida de 2.299,39 Euros que corresponde ao valor bruto mensal de 4.256,38 Euros.

143. Por causa das lesões sofridas no acidente e do tempo de inactividade que demandaram, o A. perdeu o emprego em que era director geral da H... Portugal e com ele a oportunidade de prosseguir a sua carreira ao serviço da empresa H... ainda que no estrangeiro, emprego no qual e à data do acidente auferia os rendimentos constantes dos factos provados 138 e 139, situando-se, em função das sequelas que lhe resultaram do acidente e em função da perda do emprego e da referida oportunidade, a sua possibilidade de emprego futuro e de obtenção de rendimento no tipo de empresa e nível remuneratório mencionados no facto provado 142.

144. Em consequência da dismetria dos membros inferiores de que ficou afectado, e constante do facto provado 132.1 e a acrescer ao ali consignado, o Autor sofrerá um agravamento a nível das articulações mais rápido do que ocorre na normalidade das pessoas, que acarretará um aumento das queixas de dor e uma maior limitação em termos de mobilidade.

III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS DE QUE CUMPRE CONHECER.

I – Natureza alegadamente conclusiva dos pontos 143 e 144 dos factos dados como provados (recurso da Ré).

II – Montante arbitrado ao A. a título de dano biológico e perda da capacidade de ganho (recursos do A. e da Ré que integrará a matéria da denominada “ampliação do objecto do recurso”).

1. Dano biológico. Natureza e alcance do conceito. Consideração dos factos aditados no acórdão recorrido (pontos 143 e 144) e suas consequências.

2. Montante indemnizatório fixado para momento ulterior (quantia que, no que respeita exclusivamente ao previsível aumento do défice funcional do Autor que venha a ocorrer depois da presente decisão, vier a ser apurada em liquidação do decidido nestes autos).

III – Momento a partir do qual se contam os juros de mora devidos (recurso da Ré).

Passemos à sua análise:

I – Natureza alegadamente conclusiva dos pontos 143 e 144 dos factos dados como provados (recurso da Ré).

Invoca a recorrente seguradora que a matéria enunciada no ponto 143 dos factos assentes como provados reveste natureza manifestamente conclusiva e encerra matéria de direito, pelo que o mesmo deverá ser eliminado.

Da mesma forma, em relação à matéria constante do ponto 144, a recorrente alega que o agravamento a nível das articulações, mais rápido do que ocorre na normalidade das pessoas, não é constitui uma consequência natural (no sentido físico-mecânico) das lesões sofridas pelo A., constituindo uma conclusão normativa não fundamentada, pelo que o mesmo deve ser eliminado.

Apreciando:

Consta do ponto 143 da matéria de facto dada como assente:

“Por causa das lesões sofridas no acidente e do tempo de inactividade que demandaram, o A. perdeu o emprego em que era director geral da H... Portugal e com ele a oportunidade de prosseguir a sua carreira ao serviço da empresa H... ainda que no estrangeiro, emprego no qual e à data do acidente auferia os rendimentos constantes dos factos provados 138 e 139, situando-se, em função das sequelas que lhe resultaram do acidente e em função da perda do emprego e da referida oportunidade, a sua possibilidade de emprego futuro e de obtenção de rendimento no tipo de empresa e nível remuneratório mencionados no facto provado 142 (O autor trabalha para “G..., Lda” auferindo a quantia mensal líquida de 2.299,39 Euros que corresponde ao valor bruto mensal de 4.256,38 Euros)”.

Consta do ponto 144 da matéria de facto dada como assente:

“Em consequência da dismetria dos membros inferiores de que ficou afectado, e constante do facto provado 132.1 e a acrescer ao ali consignado, o Autor sofrerá um agravamento a nível das articulações mais rápido do que ocorre na normalidade das pessoas, que acarretará um aumento das queixas de dor e uma maior limitação em termos de mobilidade”.

Vejamos:

A redacção dos pontos 143 e 144 foi introduzida pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, não constando do elenco dos factos dados como provados em 1ª instância.

Trata-se de uma modificação operado no âmbito da procedência (parcial) da impugnação de facto apresentada pelo A. e teve a seguinte explicação:

“Ora, tudo isto é a recomeçar com dificuldade, aos 47 anos, numa nova empresa que comercializa genericamente o mesmo tipo de produtos, e que, para ela mesma crescer mas sobretudo para o autor crescer nela, beneficiaria muito do anterior dinamismo e abertura (à vontade, não perturbado) psicológica do autor.

É ainda verdade que sabemos, já vimos anteriormente, que a evolução da condição de saúde, designadamente articular, do autor se vai, com segurança, agravar.

Com estas perspectivas de limitação, podemos então dizer que “No futuro o autor não pode vir a ter uma actividade que lhe permita ter um rendimento na ordem dos 110.000,00 Euros/ano como tinha antes do acidente”?

Com o devido respeito, esta formulação é quase conclusiva: - é conclusiva do estado de coisas anterior (cento e dez mil euros como tinha antes) e do estado de coisas que tem agora (retoma dum exercício funcional relacionado com a comercialização de produtos de força, motores de barco e máquinas para jardim, que aproveita os conhecimentos e competências adquiridas pelo Autor ao serviço da H... e que lhe permitiram chegar a Director Geral, numa empresa nacional que pratica salários mais baixos. Neste sentido, a primeira conclusão (cento e dez mil euros como tinha antes) inclui a empresa H... e inclui o posto profissional alcançado nela e inclui o ter deixado esse lugar em equivalência a ter perdido esse emprego que assim o posicionava.

Não é assim desajustada, porque bem mais factual e concreta, a formulação que o tribunal recorrido usou na alínea d) dos factos não provados, no máximo podendo apontar-se-lhe que não estabelece concretamente uma previsibilidade segura de emprego e rendimento a auferir futuramente.

Os termos latos e desancorados da (consagração como provada) das circunstâncias profissionais e das sequelas, em que a sugestão do recorrente até passa do nível do emprego subordinado para o nível da actividade produtora de rendimento, sem sequer discriminar qual ela seja, levam-nos para um campo imenso de possibilidades onde de todo se pode afirmar que é impossível a alguém voltar a ganhar cem mil euros ao ano – basta especular umas poucas vezes ao ano, nas diversas áreas/formas mais ou menos corriqueiras, e com menos esforço do que o do trabalho diário.

Deste modo, e concluindo, não temos dúvida que o autor, retomando a nossa expressão, a partir do depoimento testemunhal de EE, perdeu o barco ... (deixou de ser director geral da H... Portugal e perdeu com isto a oportunidade de prosseguir a sua carreira ao serviço da empresa H... ainda que no estrangeiro) por causa das lesões sofridas no acidente e mais concretamente pelo tempo que elas lhe determinaram de inactividade forçada, perdendo o nível de rendimento (à data do acidente) referido nos factos provados 138 e 139 e que no futuro, o tipo de emprego adequado e possível para o Autor e o respectivo nível remuneratório se situam como provado no facto 142.

Este é o emprego que o Autor conseguiu a partir do desenvolvimento das suas competências funcionais anteriores, isto é, da sua aprendizagem e evolução profissional anterior e dos conhecimentos que ela lhe trouxe, sendo claro que a idade actual e futura não ajuda quem perdeu o barco, e que as sequelas sofridas lhe cortaram o dinamismo, e a vontade e capacidade de ingressar numa vida profissional muito ocupada e competitiva e por isso muito exigente do ponto de vista físico e mental, tornando-se claro que o Autor terá de se contentar com uma empresa nacional (ou internacional que venha a operar no mercado nacional mas naturalmente de prestígio e predominância inferior à da H..., pelo menos ao nível dos motores de barcos) cujo nível de rendimento dificilmente se situará acima daquele que o Autor agora consegue auferir, segundo o facto provado 142, e que é sensivelmente metade do que auferia.

Assim, procede a pretensão de impugnação do facto não provado descrito sob a alínea d), ainda que não na versão sugerida, mas sim eliminando-se a al. d) dos factos não provados e acrescentando-se aos factos provados um nº 143, do seguinte teor:

143 – Por causa das lesões sofridas no acidente e do tempo de inactividade que demandaram, o A. perdeu o emprego em que era director geral da H... Portugal e com ele a oportunidade de prosseguir a sua carreira ao serviço da empresa H... ainda que no estrangeiro, emprego no qual e à data do acidente auferia os rendimentos constantes dos factos provados 138 e 139, situando-se, em função das sequelas que lhe resultaram do acidente e em função da perda do emprego e da referida oportunidade, a sua possibilidade de emprego futuro e de obtenção de rendimento no tipo de empresa e nível remuneratório mencionados no facto provado 142.

Concluída a apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, em resumo, mantemos a alínea a) dos factos não provados, não aditamos as diferentes fases da esperança média de vida do Autor, e aditamos e alteramos a decisão da matéria de facto nos termos acima expostos, (…)

- adita-se um facto provado com o nº 144, com o seguinte teor: “Em consequência da dismetria dos membros inferiores de que ficou afectado, e constante do facto provado 132.1 e a acrescer ao ali consignado, o Autor sofrerá um agravamento a nível das articulações mais rápido do que ocorre na normalidade das pessoas, que acarretará um aumento das queixas de dor e uma maior limitação em termos de mobilidade".

Apreciando:

É sabido que a actividade probatória a ter lugar no processo judicial só pode incidir sobre factos concretos e nunca sobre juízos valorativos ou conclusões de direito, sob pena de se colocar a fixação dos factos decorrentes da produção de prova num sistema de ligação directa e automática com a função de interpretação e aplicação da lei – exclusivamente reservada ao órgão jurisdicional –, como se não estivessem em causa dois planos rigorosamente distintos que não se confundem nem se sobrepõem.

(Sobre esta temática vide, entre muitos outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relator Tomé Gomes) de 11 de Março de 2021, proferido no processo nº 1205/18.3T8PVZ.P2.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relator Cura Mariano) de 28 de Outubro de 2021, proferido no processo nº 4150/14.8TBVNG.P1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relator Lima Gonçalves) de 25 de Maio de 2021, proferido no processo nº 1011/11.6TBAGH.L1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relator Pinto de Almeida) de 8 de Setembro de 2021, proferido no processo nº 23543/19.8T8LSB.L1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relator Nuno Cameira) de 10 de Janeiro de 2017, proferido no processo nº 761/13.1TVPRT.P1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relatora Maria da Graça Trigo) de 7 de Abril de 2016, proferido no processo nº 7895/05.0TBSTB.E1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relator Garcia Calejo) de 24 de Março de 2015, proferido no processo nº 10795/09.0T2SNT.L1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relatora Prazeres Beleza) de 1 de Outubro de 2015, proferido no processo nº 2104/05.4TBPVZ.P1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Novembro de 2014 (relator Lopes do Rego), proferido no processo nº 444/12.5TVLSB.L1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Setembro de 2019 (relatora Rosa Ribeiro Coelho), proferido no processo n.º 1333/15.7T8LMG.C1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relator Tomé Gomes) de 27 de Abril de 2017, proferido no processo nº 273/14.1TBSCR.L1.S1; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (relatora Ana Paula Boularot) de 15 de Novembro de 2012, proferido no processo nº 20071/1995.E1.S1 todos publicados in www.dgsi.pt).

Com efeito, uma coisa é a materialidade concreta que resulta da actividade instrutória e que se traduz objectivamente na verificação de determinado acontecimento da vida que deverá ser, como tal, descrito; outra, essencialmente diferente, é a abstracta dedução ou a ilação que o observador ou o intérprete entendam retirar, do seu ponto de vista puramente subjectivo, na análise e perspectiva pessoais, sobre os factos sobre que se debruça (tal como efectivamente se verificaram ou foram por este percepcionados).

Em particular, deverá exigir-se maior rigor e especial zelo na destrinça entre matéria de facto e matéria de direito quando a conclusão ou o juízo valorativo enxertado nos factos dados como provados se reconduz directamente à questão jurídica essencial em discussão nos autos, com imediatos reflexos na apreciação de mérito do pleito.

Todavia e sempre prejuízo do que se deixou expresso, cumpre igualmente salientar que, tal como conforme refere António Abrantes Geraldes, in “Recursos em Processo Civil”, Almedina 2022, 7ª edição, a páginas 354 a 355:

“(…) devem ser admitidas com mais naturalidade asserções que, não correspondendo, no contexto da concreta acção, a puras “questões de direito”, sejam algo mais do que puras “questões de facto”, no sentido tradicional.

Sendo sempre difícil o estabelecimento de uma linha de demarcação rigorosa entre o que constitui matéria de facto e matéria de direito, constata-se que o novo sistema determina que a produção de prova em audiência tenha por objecto “temas de prova” (artigo 596º) enunciados na audiência prévia, em vez de incidir sobre “factos” sincopados. Além disso optou-se por integrar a decisão da matéria de facto na própria sentença (artigo 607º, nº 3).

Em face daquela modificação formal e ainda da integração numa única peça processual da decisão de facto e da respectiva integração jurídica, segundo o método pendular que implica a ponderação conjugada de elementos de facto e de questões de direito, é de defender uma maior liberdade no que concerne à descrição da realidade litigada, a qual não deve ser imoderadamente perturbada por juízos lógicos-formais em torno do que seja “matéria de direito” ou “matéria conclusiva” que apenas sirva para provocar um desajustamento entre a decisão final e a justiça material do caso.

(…) Por isso, a patologia da sentença neste segmento apenas se verificará, em linhas gerais, quando seja abertamente assumida como “matéria de facto provada” pura e inequívoca matéria de direito. Abandonando, de vez, um critério formal pretensamente assente numa demarcação rígida entre o que constitui matéria de facto e matéria de direito, importa que se admita que a descrição da realidade que subjaz ao litígio seja feita a partir de outros pressupostos que valorizem os aspectos de ordem substancial”.

Por outro lado, referem Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1985, 2ª edição, a páginas 408 a 409:

“(…) a área dos factos (seleccionáveis para o questionário) cobre principalmente, os eventos reais, as ocorrências verificadas; mas pode abranger também as ocorrências virtuais (os factos hipotéticos) que são, em bom rigor, não factos, mas verdadeiros juízos de facto”.

Sobre este tema escrevem igualmente Miguel Teixeira de Sousa e João Castro Mendes, in “Manual de Processo Civil”, Volume II, AAFDL Editora, 2022, a página 97:

“Afirmar que a selecção dos temas da prova recai sobre factos pressupõe a possibilidade de uma distinção entre matéria de facto e matéria que é de direito. Este é, porém, um dos problemas de mais difícil solução em processo civil. Como critério geral, sujeito naturalmente a ponderadas adaptações para cada caso concreto, pode dizer-se que é matéria de direito toda a que se relaciona com a existência, validade, interpretação ou aplicação das regras jurídicas. Dito de outro modo: na expressão do artigo 674º, nº 1, alínea a), é matéria de direito é aquela em relação à qual se pode verificar um erro de interpretação, de aplicação ou de determinação da norma aplicada. A matéria de facto demarca-se por oposição: ela é, em geral, aquela que respeita à realidade das coisas em relação à qual se pode fazer um juízo de verdade ou falsidade.

No contexto da selecção dos temas de prova a distinção entre a matéria de direito e de facto deve ser relativizada: a matéria de facto relevante é aquela que a matéria de direito considerar que é subsumível a uma previsão legal”.

No caso concreto, o Tribunal da Relação de Lisboa, ao conhecer da impugnação de facto apresentada pelo A., entendeu aditar à matéria dada como provada em 1ª instância dois novos pontos, ora em análise, que resultaram do seu juízo autónomo na reapreciação da matéria de facto.

No ponto 143 o Tribunal da Relação de Lisboa considera provado, por ter resultado (a seu ver) da actividade instrutória prosseguida nos autos, que por causa das lesões sofridas no acidente e do tempo de inactividade que demandaram o A. deixou de poder beneficiar do emprego que mantinha na altura do acidente (director geral da H... Portugal) e, do mesmo modo, da oportunidade de prosseguir a sua carreira ao serviço da empresa no estrangeiro (para onde esta se deslocalizou) e que, em função das sequelas que lhe resultaram do acidente e em função da perda da referida oportunidade, gorou-se igualmente a possibilidade de emprego futuro numa empresa que lhe proporcionasse o nível remuneratório antes auferido.

Ou seja, basicamente o que isto significa é que, encontrando-se até à eclosão do acidente o A. integrado numa determinada estrutura organizativa em empresa de renome, na qual desempenhava com assinalável êxito as funções que lhe estavam cometidas, devido ao seu enérgico empenho, singular capacidade e invulgar vitalidade e entusiasmo, após três anos de paragem e havendo sido gravemente assolado por lesões que lhe diminuem a sua capacidade de trabalho, o mesmo A. já não conseguirá ascender ao nível de posição profissional cimeira que os seus anteriores atributos lhe asseguravam (é o que essencialmente se retira da expressão, utilizada neste contexto no acórdão recorrido por referência à prova testemunhal produzida, “perdeu o barco ...”).

Trata-se, portanto, da descrição de uma determinada realidade que inclui, de facto, projecções sobre o futuro, mas que assenta, pelos motivos exaustivamente apontados, no conjunto da prova produzida nos autos, que o Tribunal da Relação de Lisboa valorou (em reapreciação ao veredicto da 1ª instância).

Não obstante as inevitáveis dúvidas que a sua redacção naturalmente suscita, tal facto 143 terá de ser entendido nestes exactos termos e de forma rigorosa e restritiva (referindo-se basicamente à perda de oportunidade de trabalhar na empresa H..., agora no estrangeiro, com a obtenção de um nível salarial que agora, face à afectação física e psicológica, não consegue alcançar).

Não constituirá, assim entendido, o ponto 143 um juízo valorativo ou conclusivo, mas a afirmação de uma determinada realidade percepcionada no plano das suas consequências futuras, assente na convicção que o próprio Tribunal da Relação formulou.

De resto, desta formulação de facto – tal como se encontra expressa - não resulta qualquer efeito directo e automático conectado com a interpretação jurídica e/ou aplicação da lei ao caso concreto.

Ao invés, estamos perante uma factualidade que será objecto da necessária apreciação crítica e subsunção no âmbito do enquadramento de direito a realizar noutra sede, como sucede com qualquer outra factualidade que venha a ser considerada provada pelas instâncias.

O que significa que a matéria constante do ponto 143 dos factos provados não determina ou impõe, por si própria, qualquer solução jurídica como efeitos imediatos e necessários na solução jurídica do litígio.

A discussão que verdadeiramente seria legítimo suscitar era a da adequação destes factos, ora dados como provados, aos concretos elementos de prova que os autos revelaram e a forma como os mesmos neles se conseguem afinal sustentar.

Poder-se-á, em tese, questionar se tal ligação, em termos de elevada probabilidade, tal como se encontra descrita no ponto 143 dos factos assentes, tem verdadeira, efectiva e segura correspondência nos elementos probatórios reunidos nos autos, ou seja, se se pode afirmar que resulta, com a necessária segurança, da prova que o A. logrou produzir.

Só que, tratando-se de um aditamento determinado no acórdão recorrido prolatado pelo Tribunal da Relação, carece este Supremo Tribunal de Justiça de poderes para realizar tal sindicância, nos termos gerais dos artigos 674º, nº 3, e 682º, nº 2, do Código de Processo Civil.

Por seu turno, no ponto 144 o Tribunal da Relação de Lisboa considera provado que em consequência da dismetria dos membros inferiores de que ficou afectado, o Autor sofrerá um agravamento a nível das articulações mais rápido do que ocorre na normalidade das pessoas, que acarretará um aumento das queixas de dor e uma maior limitação em termos de mobilidade.

A análise da questão aqui suscitada pela seguradora recorrente é muito semelhante à que foi feita quanto ao ponto 143.

Trata-se de uma descrição de uma determinada realidade, com projecções futuras, que está devidamente fundamentada e que recolhe o importante apoio das regras da experiência comum, atendendo à profunda gravidade e considerável extensão das lesões de que o A. lesado foi efectivamente vítima em consequência do acidente sub judice, para o qual não contribuiu a título de culpa.

Estamos ainda aqui nos limites do plano da matéria de facto, plenamente sustentada nos vastos elementos de prova reunidos nos autos (documentação de natureza médica e clínica) e nas próprias regras da experiência comum.

Pelo que se mantém a factualidade constante dos pontos 143 e 144 dos factos assentes como provados (aditados no acórdão recorrido).

II – Montante arbitrado ao A. a título de dano biológico e perda da capacidade de ganho (recursos do A. e da Ré que integrará a matéria da denominada “ampliação do objecto do recurso”).

Na sentença de 1ª instância foram fixados os seguintes montantes indemnizatórios:

- A título de perdas salariais - € 173.997,13 (cento e setenta e três mil, novecentos e noventa e sete mil e treze cêntimos;

- A título de perda da capacidade de ganho - € 40.000,00 (quarenta mil euros);

- A título de danos não patrimoniais - € 60.000,00 (sessenta mil euros);

- A título de dano biológico (dano não patrimonial subjectivo) - € 75.000,00;

- e ainda os juros de mora que se vencerem sobre tais quantias contados a partir do trânsito em julgado da sentença.

Tudo perfazendo o total indemnizatório global de € 348.997,13 (trezentos e quarenta e oito mil, novecentos e noventa e sete e treze cêntimos), acrescidos de juros nos termos supra expostos.

Interposto recurso de apelação por parte do A., foi impugnada a fixação da verba de € 40.000,00 (quarenta mil euros) atribuída a título de perda da capacidade de ganho (que o A. entende dever-se fixar-se no valor já por si calculado de € 2.625.628,60) e o termo inicial da contagem de juros que, a seu ver, deve reportar-se à data da sentença (em 4 de Janeiro de 2022), quanto aos danos não patrimoniais, e à data da citação quanto à indemnização por danos decorrentes das perdas salariais ocorridas antes da prolação da sentença.

Mais concluiu, nessa sede, o A. que deveria a seguradora responsável ser condenada em nova quantia, a liquidar em execução de sentença, calculada em função do aumento de desvalorização do autor face ao “dano biológico futuro” que vier a ser verificado na sua pessoa, após a data da pronúncia da sentença.

No acórdão recorrido a quantia de 40.000,00€ (quarenta mil euros), atribuída a título de perda da capacidade de ganho, foi aumentada para €130.000,00 (cento e trinta mil euros), sendo nesse particular a decisão actualizadora.

Foi a Ré condenada ainda a pagar ao A. juros de mora à taxa legal aplicável às operações civis, sobre o valor referido, desde a data do presente acórdão – 9 de Junho de 2022 – e até integral e efectivo pagamento.

Outrossim no acórdão recorrido, na sequência da apelação apresentada, foi a Ré condenada ainda a pagar ao Autor a quantia que, no que respeita exclusivamente ao previsível aumento do défice funcional do Autor que viesse a ocorrer depois da presente decisão e a ser apurada em liquidação do decidido nestes autos.

Alterou-se igualmente a sentença no que se refere ao pagamento de juros de mora sobre o valor da indemnização por perdas salariais – € 173.997,13 (cento e setenta e três mil, novecentos e noventa e sete euros e treze cêntimos) – cuja contagem passou a ter como início a data da citação, e o pagamento de juros de mora que se vencerem sobre tais quantias, que passou a ter como termo inicial - quanto às quantias de 60.000,00€ (sessenta mil euros) a título de dano biológico objectivo e 75.000,00€ (setenta e cinco mil euros) a título de dano não patrimonial subjectivo -, a data em que a sentença foi proferida.

Interpostos recursos de revista independentes por parte do A. e da Ré seguradora, ambos admitidos (o primeiro pela Formação dado tratar-se de uma revista excepcional) está em causa a apreciação das seguintes questões jurídicas:

1º- Dano biológico. Natureza e alcance do conceito. Consideração dos factos aditados no acórdão recorrido (pontos 143 e 144) e suas consequências.

A Ré seguradora pugna pela redução do valor da indemnização constante no acórdão recorrido para o montante fixado na sentença (€ 40.000,00), a título de perda da capacidade de ganho integrada nas consequências do denominado dano biológico.

Por sua vez, o A. pretende o aumento da condenação da seguradora, a título de perda de capacidade de ganho (dano futuro previsível) – para € 2.126.070, 13 (face ao princípio da limitação do pedido, na medida em que o valor por si calculado nas alegações de revista ascende a € 4.326.610,00).

Vejamos:

A figura do dano biológico tem sido alvo de inúmeras e vastíssimas abordagens na jurisprudência nacional, encontrando-se actualmente perfeitamente consolidados o seu o conceito, natureza e âmbito de abrangência.

Escreveu-se, a este propósito, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Novembro de 2016 (relator Lopes do Rego), proferido no processo nº 175/05.2TBPSR.E2.S1, publicado in www.dgsi.pt:

“A compensação do dano biológico tem como base e fundamento a relevante e substancial restrição às possibilidades exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou reconversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar: na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável - e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, - erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais; e sendo naturalmente tais restrições e limitações particularmente relevantes em lesada com 18 anos de idade, ficando as perspectivas de evolução no campo profissional plausivelmente afectadas pelas irremediáveis sequelas, físicas das gravosas lesões corporais sofridas.

E, nesta perspectiva, deverá aditar-se ao lucro cessante, decorrente da previsível perda de remunerações, calculada estritamente em função do grau de incapacidade permanente fixado, uma quantia que constitua justa compensação do referido dano biológico, consubstanciado na privação de futuras oportunidades profissionais, precludidas irremediavelmente pela capitis deminutio de que passou a padecer a recorrente, bem como pelo esforço acrescido que o já relevante grau de incapacidade fixado irá envolver para o exercício de quaisquer tarefas da vida profissional – considerando-se, em termos de equidade, que representará compensação adequada desse dano biológico o valor de € 15.000, que acrescerá assim ao montante de €85.000 arbitrado pelo acórdão recorrido”.

Ou seja, a limitação funcional em que se consubstancia o denominado dano biológico tem como fundamento a efectiva redução das capacidades físicas e psicológicas do sinistrado, constituindo grave lesão do direito fundamental do lesado à sua integridade física, da qual pode derivar, ou não, conforme os casos, a correspondente perda da capacidade de ganho.

(Sobre esta matéria, vide, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Janeiro de 2017 (relator Oliveira Vasconcelos), proferido no processo nº 1862/13.7TBGDM.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Setembro de 2019 (relatora Rosário Morgado), proferido no processo nº 2706/17.6T8BRG.G1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 2021 (relator Abrantes Geraldes), proferido no processo nº 730/17.8T8PVZ.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 2021 (relatora Rosa Tching), proferido no processo nº 2545/18.7T8VNG.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Outubro de 2018 (relator Hélder Almeida), proferido no processo nº 3643/13.9TBSTB.E1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Março de 2013 (relator Salazar Casanova), proferido no processo nº 565/10.9TBPVL.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Maio de 2011 (relator Gregório de Jesus), proferido no processo nº 7449/05.0TBVFR.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Maio de 2009 (relator Fonseca Ramos), proferido no processo nº 298/06.0TBSJM.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Setembro de 2011 (relator Vieira Cunha), proferido no processo nº 26422/18.2T8LSB.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Janeiro de 2023 (relator António Barateiro Martins), proferido no processo nº 5986/18.6T8LRS.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Dezembro de 2022 (relator Aguiar Pereira), proferido no processo nº 2517/16.6T8AVR.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Novembro de 2022 (relator António Magalhães), proferido no processo nº 9957/19.7T8VNG.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Maio de 2019 (relator Oliveira Abreu), proferido no processo nº 1046/15.0T8PNF.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Fevereiro de 2022 (relatora Maria da Graça Trigo), proferido no processo nº 1082/19.7T8SNT.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt).

Importa, ainda, a este propósito aludir ao teor do recente acórdão proferido por este Supremo Tribunal de Justiça, datado de 17 de Janeiro de 2023, em que foi relator o Juiz Conselheiro António Barateiro Martins e adjuntos o ora relator do presente acórdão e a ora 1ª adjunta, que igualmente o subscreve.

Todas as considerações aí expendidas sobre esta matéria, aceites unanimemente pelos juízes conselheiros que integraram o presente colectivo, valem agora, de pleno, para a apreciação e decisão da situação sub judice.

Escreveu-se nesse aresto:

“(…) tendo a lesada ficado afetada “apenas” com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, sendo as lesões sofridas e as sequelas que apresenta compatíveis com o exercício da atividade profissional habitual, mas implicando esforços suplementares, não há lugar à atribuição de indemnização a título de danos patrimoniais futuro mas tão só à atribuição de indemnização a título de dano biológico.

Trata-se de posição/entendimento que, num contexto recursivo semelhante, já expusemos no Acórdão deste STJ de 30/11/2021 (proferido no processo 1544/16.8T8ALM.L1.S1, em que, inter alia, referimos o seguinte:

“(…)

E o primeiro tema a dilucidar tem a ver com a circunstância da A. pretender ao longo de todo o processo – quer na PI, quer na apelação, quer agora na revista – que lhe seja concedido um montante indemnizatório a título de perda futura de capacidade de ganho e um outro montante indemnizatório a título de dano biológico, quando o Acórdão recorrido apenas lhe concedeu um montante indemnizatório a título de indemnização por dano biológico.

Hoje – antes mesmo do preambulo da Portaria 377/2008, de 26-05, vir falar em “dano biológico”– fala-se em “dano biológico” para aludir à lesão causada ao corpo e à saúde do lesado, à lesão causada à integridade física e psíquica que a todos assiste; e reconhece-se que o dano causado por tal lesão merece ser reparado independentemente de repercussões sobre a sua capacidade de ganho.

Acrescentando-se, em abono de tal tese, que o homem, na sua integridade psico-somática, desenvolve a sua existência terrena na sua vida e realização profissionais e na sua vida relacional – relacionando-se e interagindo com os demais seres humanos – pelo que pode haver dano corporal, nesta faceta da sua vida relacional, tenha ou não havido qualquer rebate anátomo-funcional.

Porém, também se refere e avisa, que há que evitar “super-equações” de danos (com indemnizações em duplicado ou em triplicado), importando não esquecer “que há zonas de tangência e até de intersecção entre vetores diferenciados e autonomizados duma mesma realidade”.

Tradicionalmente, a análise dualista – patrimonial / não patrimonial – sempre abarcou todo o campo da discussão que os danos corporais comportavam, situando-se toda a discussão em volta da parametrização ressarcitória de tal tipo de danos e da autonomização de um ou outro parâmetro de avaliação, sempre inserido num dos termos da referida dualidade; e, agora, ainda que se erija em categoria autónoma de dano o que (dano biológico), antes, não passava dum parâmetro de avaliação doutro dano, importa que avaliação global não dê lugar a duplicações.

Daí que, após um momento inicial – em que alguns chegaram a admitir que o “dano biológico” seria um “tertium genus”, com um lugar próprio que não caberia no clássico dualismo patrimonial/não patrimonial – se tenha passado a entender que o mesmo (autónomo ou não) cabe em tal dualismo, sem prejuízo de poder ter uma vertente patrimonial e uma vertente não patrimonial, sendo que, quando está em causa e se pretende indemnizar o dano causado por uma incapacidade permanente geral (que impõe ao lesado esforços acrescidos no desempenho da sua profissão, mas que não se repercute numa perda da capacidade de ganho), se está perante a vertente patrimonial do “dano biológico (…)”.

Em síntese, a lesão do direito ao corpo e à saúde é, enquanto dano autónomo, fonte de obrigação de indemnização, a suportar pelo autor do facto ilícito e em benefício de quem viu a sua integridade corporal beliscada, independentemente de quaisquer consequências pecuniárias ou atuais repercussões patrimoniais de qualquer natureza, mas a sua avaliação tem que ser acompanhada duma correta delimitação de realidades e conceitos, para que não haja sobreposições. (…)”

E é justamente por isto – estando “apenas” provado (pontos 62 e 64) que a A. “está afetada de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 14,8 pontos” e que “tais lesões e as sequelas que a A. apresenta são compatíveis com o exercício da atividade profissional habitual, mas implicam esforços suplementares”, e não estando provada qualquer concreta perda da capacidade de ganho – que aquilo que a A./recorrente pretende ver indemnizado a título de perda futura de capacidade de ganho (agora, com a quantia de € 71.723,45€) só possa ser indemnizado, como foi, como dano biológico, na sua vertente patrimonial (como acertadamente foi considerado e decidido no acórdão recorrido.

Daí que tenhamos começado por dizer que a questão da indemnização pelo chamado dano patrimonial futuro (colocada pela A.) e a questão do montante da indemnização pelo chamado dano biológico (colocada pela R,) são dois aspetos e faces da mesma questão jurídica, uma vez que do que se trata é da correta e devida configuração jurídica dos danos sofridos pela A.: de indemnizar todos os danos que sejam de indemnizar, mas evitando “super-equações” de danos (com indemnizações em duplicado ou em triplicado).

Assim, como foi feito pelo entendimento que fez vencimento no Acórdão recorrido, do que se trata é de calcular/fixar o montante indemnizatório que há de reparar a IPG (também chamado de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica) de 14,8 pontos de que a A. ficou a padecer.

E temos, como único critério legal para a sua fixação – nunca é demais enfatizá-lo, para que não paire a menor dúvida – tão só a equidade (cfr. art. 566.º/3 do C. Civil).

O que não significa que em situações como a presente – isto é, sempre que se visa encontrar um capital que se vai diluir ao longo de vários anos – se rejeite a ajuda da lógica matemática; que não se usem, como auxiliar, como instrumento de trabalho, fórmulas matemáticas, que podem ter o mérito de impedir involuntárias discricionariedades e subjetivismos, na medida em que obrigando o julgador à externalização, passo a passo, do seu juízo decisório e a uma maior “densificação” da fundamentação da decisão, contribuem para impedir raciocínios mais ligeiros e/ou maquinais na fixação de indemnização”.

O que significa, desde logo, que haverá que destrinçar escrupulosamente se verificou ou não – e em que termos – perda da capacidade de ganho por parte do sinistrado afectado que, não obstante o evento lesivo sofrido, logrou prosseguir o desempenho da sua prestação laboral em actividade da mesma natureza daquela que antes desenvolvia.

Na situação sub judice, o julgamento (mormente, a matéria dada como provada em 1ª instância e pontualmente modificada no acórdão recorrido) revelou o seguinte quadro factual:

- O lesado contava 43 anos à data do sinistro.

- Sofreu um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 15 em 100, sem impossibilidade do exercício da actividade profissional, mas com esforços acrescidos no seu desempenho (divergindo o acórdão recorrido da sentença de 1ª instância quanto à equivalência de 15 em 100 a 15% de incapacidade permanente e parcial).

- Passou a registar limitação nas tarefas profissionais que obrigam a permanência prolongada na posição de sentado (por exemplo, trabalho à secretária ou exercício da condução), com impossibilidade de realização de viagens de trabalho longas.

- O A. deixou o emprego que tinha, bem como a possibilidade de auferir o nível remuneratório (como director geral da A., à data do sinistrado, auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor bruto de € 110.238,05).

- Na sequência do sinistro e por via dele nos anos de 2015, 2016 e 2017 o A. não teve rendimentos de trabalho dependente.

- Em 2018, o A. voltou a estar empregado auferindo rendimentos de trabalho dependente no valor de € 17.494,00, trabalhando actualmente, para G..., Lda, auferindo a quantia mensal líquida de 2.299,39 Euros que corresponde ao valor bruto mensal de 4.256,38 Euros.

- O A. perdeu a oportunidade de manter uma carreira ao nível em que se encontrava ao tempo do acidente sofrido e de vir a desenvolver carreira, nestes termos de valorização profissional, fora de Portugal, o que implica a passagem a um nível remuneratório inferior àquele de que beneficiava.

Ou seja, depois de um tempo de paragem na actividade profissional do A., ocorrido entre a data do acidente (26 de Junho de 2014) e o momento da consolidação das lesões (21 de Julho de 2017), ou seja, 1122 dias (37 meses e 4 dias), o A. voltou a desempenhar a sua actividade profissional, embora com um nível remuneratório inferior ao que auferia antes da verificação do acidente.

Revertendo as considerações assinaladas supra para a situação sub judice, verifica-se que tendo ficado o A. afetado com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica (de 15 em 100), as lesões sofridas e as sequelas que apresenta são, todavia, compatíveis com o exercício da actividade profissional habitual, implicando, contudo, esforços suplementares.

Note-se que não se trata assim do apuramento de qualquer tipo de incapacidade parcial permanente, com a avocação das regras do direito laboral, inexistindo cabimento para as formulações matemáticas longamente expostas na revista apresentada pelo A.

Do que se trata é da aplicação unicamente de juízos de equidade, nos termos gerais do artigo 566º, nº 3, do Código Civil, que permitiram calibrar um montante indemnizatório que abranja a menor potencialidade do acidentado no desempenho das funções laborais que, não obstante as lesões sofridas e respectivas sequelas, consegue desenvolver na mesma área económica ou empresarial.

O sinistrado é deste modo compensado, no âmbito próprio do dano biológico, pelo esforço acrescido ou suplementar que implica agora o desempenho da sua actividade laboral, que mantém em posição profissional (categoria) similar à que antes do acidente detinha, bem como pela perda de potencialidade para se alcandorar a um patamar superior de rentabilidade relativamente à sua actual prestação, com reflexo necessário na diminuição de nível remuneratório a que poderia, noutras circunstâncias e com razoável probabilidade, ascender.

Escreveu-se sobre a natureza do dano biológico no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Abril de 2022 (relator Fernando Batista), proferido no processo nº 96/98.9T8PVZ.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt:

“Este dano vem sendo entendido como dano-evento, reportado a toda a violação da integridade físico-psíquica da pessoa, com tradução médico-legal, ou como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com repercussão na sua vida pessoal e profissional, independentemente de dele decorrer ou não perda ou diminuição de proventos laborais. É um prejuízo que se repercute nas potencialidades e qualidade de vida do lesado, susceptível de afectar o seu dia-a-dia nas vertentes laborais, sociais, sentimentais, sexuais, recreativas. Determina perda das faculdades físicas e/ou intelectuais em termos de futuro, perda essa eventualmente agravável em função da idade do lesado. Poderá exigir do lesado, esforços acrescidos, conduzindo-o a uma posição de inferioridade no mercado de trabalho. Ou, por outras palavras, é um dano que se traduz na diminuição somático-psíquica do indivíduo, com natural repercussão na vida de quem o sofre.

Ora, o dano biológico tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial, como pode ser compensado a título de dano moral; tanto pode ter consequências patrimoniais como não patrimoniais. Ou seja, depende da situação concreta sob análise, a qual terá de ser apreciada casuisticamente, verificando-se se a lesão originará, no futuro, durante o período activo do lesado ou da sua vida, e por si só, uma perda da capacidade de ganho ou se se traduz, apenas, numa afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, sem prejuízo do natural agravamento inerente ao decorrer da idade. Tem a natureza de perda ‘in natura’ que o lesado sofreu em consequência de certo facto nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar.

Como quer que seja visto ou classificado este dano, o certo é que o mesmo é sempre ressarcível, como dano autónomo, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial ou do dano não patrimonial. É indemnizável em si mesmo, independentemente de se verificarem consequências para o lesado em termos de diminuição de proventos.

(…) Com efeito, uma incapacidade permanente parcial não se esgota na incapacidade para o trabalho, constituindo em princípio um dano funcional, mas sempre, pelo menos, um dano em si mesmo que perturba a vida da relação e o bem-estar do lesado ao longo da vida. Pelo que é de considerar autonomamente esse dano, distinto do referido dano patrimonial, não se diluindo no dano não patrimonial, na vertente do tradicional pretium doloris ou do dano estético.

O lesado não pode ser objecto de uma visão redutora e economicista do homo faber. A incapacidade permanente (geral) de que está afectada a vítima constitui, nesta perspectiva, um dano em si mesmo, cingindo-se à sua dimensão anátomo-funcional.

A incapacidade permanente geral (IPG) corresponde a um estado deficitário de natureza anatómica-funcional ou psicosensorial, com carácter definitivo e com impacto nos gestos e movimentos próprios da vida corrente comuns a todas as pessoas. Pode ser valorada em diversos graus de percentagem, tendo como padrão máximo o índice 100. Esse défice funcional pode ter ou não reflexo directo na capacidade profissional originando uma concreta perda de capacidade de ganho”.

Na situação presente, a Ré seguradora aceitou, por ajustado e adequado, o montante indemnizatório de € 40.000,00 fixado na sentença de 1ª instância (que veio a sofrer o considerável aumento para € 130.000,00 no acórdão recorrido, não obstante constar do respectivo texto que seria justa e equilibrada a verba de € 40.000,00, que apenas foi afastada ou contrariada pelos efeitos decorrentes da factualidade que veio a ser aditada sob o ponto 143 dos factos provados).

Vejamos:

Perante a factualidade dada como demonstrada, consideramos que o valor total de € 115.000,00 (cento e quinze mil euros), integrado no âmbito do dano biológico que importa ressarcir, resultante da soma entre o valor de € 75.000,00 e de € 40.000,00 (ambos aceites aliás pela seguradora responsável) está perfeitamente em linha com a quantificação de indemnizações a este título realizadas noutros acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça relativamente a situações similares ou equiparáveis, correspondendo portanto ao padrão estabelecido no órgão jurisdicional de cúpula do nosso ordenamento jurídico.

Tal quantificação representa efectivamente, em termos equilibrados e razoáveis, a compensação devida ao A. pelo défice funcional permanente que o obriga a desempenhar as suas funções com esforços suplementares e acrescidos, bem como pela perda de rentabilidade que não lhe permite, objectivamente, recuperar o nível remuneratório e as condições de progressão na sua carreira profissional que estariam razoavelmente ao seu alcance, não fora as consequências negativas infligidas na pessoa do A. por força do sinistro que o vitimou.

Vide neste tocante:

- o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Maio de 2017 (relatora Maria da Graça Trigo), proferido no processo nº 2028/12.9TBVCT.G1.S1, que quantificou o dano biológico em € 170.000,00 numa situação de afectação de défice funcional permanente muito mais grave que a sofrida pelo A. (29 pontos versus 15, sendo a idade do lesado relativamente aproximada (41 versus 45 anos), onde foi decidido que:

“Resultando da factualidade provada que o autor: (i) tinha 41 anos à data do acidente; (ii) ficou a padecer de Défice Funcional Permanente da Integridade Físico Psíquica fixado em 29 pontos; (iii) exercia profissão (trolha na construção civil) que exige elevados níveis de força e destreza físicas, tendo as lesões sofridas determinado que: “O Autor ficou ainda com dificuldade de marcha, não consegue “acelerar” o passo, correr, agachar-se ou mesmo colocar-se de joelhos.”; “Ficou com dor no joelho direito, tal como na região lombar, tipo “moedeira”, permanente, agudizada com esforços de carga e marcha, que o obrigam a tomar diariamente analgésicos; ficou com a sensação de “perna pesada”.”; “Em consequência do acidente de viação, das lesões e respectivas sequelas, o A. ficou a padecer ao nível do membro inferior direito de limitação da flexão do joelho a 110º.”; “Todas as sequelas que o A. sofreu com o relatado acidente não só o acompanham até à data da sua reforma laboral, como o acompanharão até ao termo da sua vida activa.”, afigura-se justo e adequado fixar, a partir da data da consolidação médico-legal das lesões, em € 170.000 a indemnização por perda geral de ganho/dano biológico”.

- o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Outubro de 2018 (relator Hélder Almeida), proferido no processo nº 3643/13.9TBSTB.E1.S1, em que a lesada contava 29 anos de idade, tendo sofrido um défice funcional permanente, sem impossibilidade para o trabalho (embora sem lograr obter os rendimentos que, de outra forma, teria possibilidade de auferir), de 21.689 + 5 de danos futuros, onde se fixou a indemnização por dano biológico em € 90.000,00.

- o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 2021 (relator Nuno Pinto de Oliveira), proferido no processo nº 644/12.8TBCTX.L1.S1, onde o lesado, que contava na altura do acidente 32 anos, apresentando um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 40 pontos, foi fixada indemnização, a título de dano biológico em € 500.00,00, sendo certo que se tratava de uma situação de afectação do lesado incomparavelmente mais grave que a tratada nos presentes autos.

Desse mesmo aresto consta um importante apanhado jurisprudencial sobre a quantificação do dano biológico em diversas situações apreciadas no Supremo Tribunal de Justiça que, pela sua indiscutível utilidade, aqui se transcreve permitindo aquilatar da justeza e adequação do montante indemnizatório a título de dano biológico pelo que optamos:

“— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 25/05/2017, Maria da Graça Trigo, para uma incapacidade de 25%, sinistrado com 41 anos, indemnização de € 170.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 15/02/2017, Fernanda Isabel Pereira, para uma incapacidade de 27%, sinistrado com 21 anos, indemnização de € 108.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 11/02/2016, João Trindade, para uma incapacidade de 32 pontos, sinistrado com 26 anos, indemnização de € 140.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 19/09/2019, Maria do Rosário Morgado, para uma incapacidade de 32 pontos, sinistrado com 45 anos, indemnização de € 200.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 09/07/2015, Pires da Rosa, para uma incapacidade de 36 pontos, sinistrado com 58 anos, indemnização de € 100.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 26/01/2012, João Bernardo, para uma incapacidade de 40%, sinistrado com 28 anos, indemnização de € 80.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 21/01/2016, Tavares de Paiva, para uma incapacidade de 40,35 pontos, sinistrado com 21 anos, indemnização de € 136.500,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 16/03/2017, Maria da Graça Trigo, para uma incapacidade de 41 pontos, sinistrado com 19 anos, indemnização de € 250.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 29/01/2019, Pedro Lima Gonçalves, para uma incapacidade de 44 pontos, sinistrada com 24 anos, indemnização de € 95.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 07/03/2017, José Rainho, para uma incapacidade de 45 pontos, sinistrado com 24 anos, indemnização de € 190.000,00;

—Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 19/06/2019, Catarina Serra, para uma incapacidade de 65 pontos, sinistrada com 45 anos, indemnização de € 195.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 17/11/2015, Gabriel Catarino, para uma incapacidade de 65 pontos, sinistrada com 20 anos, indemnização de € 400.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 12/12/2017, Roque Nogueira, para uma incapacidade de 70 pontos, sinistrada com 31 anos, indemnização de € 238.879,10

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 23/10/2018, Henrique Araújo, para uma incapacidade de 72 pontos, sinistrado com 54 anos, indemnização de € 350.000,00

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 12/03/2015, Maria Clara Sottomayor, para uma incapacidade de 73 pontos, sinistrada com 20 anos, indemnização de € 280.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 06/07/2017, Fernanda Isabel Pereira, para uma incapacidade de 87%, sinistrado com 44 anos, indemnização de € 150.000,00;

— Ac. Supremo Tribunal de Justiça, de 10/09/2019, José Rainho, para uma incapacidade de 100 pontos, sinistrado com 7 anos, indemnização de € 450.000,00”.

A indemnização global líquida a atribuir ao A. fixar-se-á nos seguintes termos:

- A título de perdas salariais - € 173.997,13 (cento e setenta e três mil, novecentos e noventa e sete mil e treze cêntimos;

- A título de danos não patrimoniais - € 60.000,00 (sessenta mil euros);

- A título de dano biológico (dano não patrimonial subjectivo) - € 115.000,00;

Sendo o total de 348.997,13 (trezentos e quarenta e oito mil, novecentos e noventa e sete mil e treze cêntimos), coincidente com o valor encontrado na sentença de 1ª instância.

Em sentido oposto, a indemnização peticionada pelo A. a título de dano biológico - € 2.625.628,60 –, perante o quadro factual apurado, é absolutamente irrealista e completamente desfasada dos critérios jurisprudenciais supra assinalados, não encontrando neles o menor paralelo ou cabimento.

Conforme se assinalou supra, o A. conseguiu felizmente retomar, com relativa normalidade, a sua actividade laboral habitual, embora com esforços acrescidos ou suplementares no desempenho da respectiva prestação.

Não se trata, nesta sede, do apuramento de uma incapacidade temporal permanente corrente no domínio da jurisdição laboral que poderia transportar os valores indemnizatórios para outra dimensão completamente distinta.

Logo, a revista do A., não obstante a prolixidade do seu argumentário, não poderá proceder, por todos os motivos apontados.

Cabe ainda referir que o aditamento pelo Tribunal da Relação de Lisboa do facto nº 143 não justificará, a nosso ver, a alteração do montante indemnizatório (global, em termos de dano biológico, de € 115.000,00 - e que inclui a verba de € 40.000,00, por perda da capacidade de ganho - que se entende mais equilibrado), não sendo, portanto, de aceitar o aumento de € 40.000,00 para € 130.000,00, a título de perda da capacidade de ganho na medida em que tal factualidade, de natureza aleatória, não o justifica e, nessas circunstâncias, tal alteração contenderia nitidamente com os padrões jurisprudenciais assentes em situações similares.

Saliente-se que tal quantificação (€ 115.000,00) que se operou, em termos globais, relativamente ao dano biológico é, como se frisou supra, equitativa e respeita escrupulosamente os padrões estabelecidos pela jurisprudência (sendo todos os casos de fixação de montante consideravelmente superiores correspondentes a situações em que o lesado sofreu prejuízos incomensuravelmente mais graves do que os infligidos ao A., justificando-se amplamente tal diferenciação).

Por outro lado, o carácter acentuadamente relativo e profundamente aleatório da factualidade dada como provada no ponto 143 permite apenas, no fundo e na plano de apreciação jurídica, formular algumas conjecturas e não verdadeiras projecções de prejuízos certos ou altamente prováveis.

Por isso mesmo, tal factualidade não deverá contribuir para o aumento do montante indemnizatório devido ao lesado.

Neste sentido, cumpre especialmente atentar em que:

Em rigor, não existe prova (nem o ponto 143 sugere o contrário) que o A. tenha deixado o cargo de director geral da H... – barcos a motor –, em Portugal, como consequência directa e necessária das lesões sofridas em virtude do acidente, ou seja, que a referida empresa o dispensou por causa do seu estado de enfermidade ou diminuição física (sendo certo que todas as perdas salariais sofridas pelo tempo de inactividade forçada serão contempladas na decisão judicial).

Ao invés, encontra-se demonstrada a simples perda de oportunidade em relação a um possível (incerto) emprego a firmar com a H... no estrangeiro – que poderia acontecer ou não -, e cujas vicissitudes são totalmente desconhecidas (é isto o que significa, no fundo, a expressão “perda do barco H...” referenciada no acórdão recorrido).

Ou seja, de seguro, real e concreto temos apenas que, não fora o acidente sofrido, o A. teria naturalmente outra potencialidade para alcançar um melhor estatuto remuneratório, superior ao que hoje aufere.

Fica aliás por saber – e a prova produzida nos autos não o esclareceu cabalmente - se o A. seria, ou não, convidado a integrar a estrutura da H... fora de Portugal (a deslocalização de empresas corresponde amiúde a fenómenos de reestruturação interna para efeitos de poupança de custos logísticos); em que categoria e com que remuneração; por quanto tempo e com que evolução ou condicionantes profissionais; e, para além disso, qual a efectiva diferença entre tal hipotética posição que o A. (talvez) viesse a alcançar e a que ocupa presentemente a nível laboral, cujas perspectivas de melhoramento salarial são em rigor desconhecidas (e não deixam em absoluto de ser possíveis).

Não pode ainda deixar de dizer-se que a referida e concreta perda da oportunidade de vir a trabalhar, na posição profissional que detinha, na empresa H... no estrangeiro é matéria que não consta sequer da concreta e especificada alegação do A., enquanto tal, quer na petição inicial, onde se limitou a referir, a este propósito, no artigo 40º “toda a vida do autor foi sinónimo de actividade, foi realizada nos termos e em moldes dinâmicos e lucrativos expostos, até que em Junho de 2014 o acidente de viação referido o arredou da sua actividade profissional”, quer nos articulados supervenientes que apresentou nos autos, onde apenas se alude, nos artigos 90º e 91º “Devido ao afastamento do mercado laboral (mercado em que o A. se insere muitíssimo competitivo, com elevada oferta e menor procura) que decorreu da data do facto ilícito e culposo ocorrido em 26 de Junho de 2014 e até à data da consolidação médico legal das lesões em 8 de Setembro de 2017, o autor continuou nesse final do ano de 2017 e durante parte significativa de 2018 sem conseguir contratar qualquer actividade remunerada, e com este fado, só em 2018 conseguiu contratar uma actividade remunerada, tendo nesse ano recebido o valor de 17.494,19 Euros”.

Por tudo isto a factualidade vertida no ponto 143, não obstante as judiciosas justificações constantes do acórdão recorrido, não é, a nosso ver, suficiente para conduzir ao aumento da quantificação indemnizatória a título de dano biológico (incluindo a perda da capacidade de ganho), que se nos afigura absolutamente equilibrada e razoável.

Daí a procedência, neste ponto, da revista apresentada pela Ré seguradora e consequente improcedência da revista apresentada pelo A.

2º - Montante indemnizatório fixado para momento ulterior (quantia que, no que respeita exclusivamente ao previsível aumento do défice funcional do Autor que venha a ocorrer depois da presente decisão, vier a ser apurada em liquidação do decidido nestes autos).

Entende a Ré seguradora que, neste ponto do acórdão recorrido, não estamos perante um dano futuro previsível certo, sendo o grau de incerteza de tal modo que não se pode prognosticar que o prejuízo venha a acontecer.

Vejamos:

Face à matéria de facto dado como provada neste tocante (por via do aditamento introduzido pelo Tribunal da Relação) – não considerada conclusiva pelos motivos enunciados supra -, entende-se que se justifica perfeitamente a condenação neste pedido genérico, que é assim de manter.

É seguramente provável que o A., na sequência das lesões sofridas, veja aumentar, infelizmente, o seu défice funcional, o que obrigará a uma revisão em alta do valor indemnizatório a título de dano biológico.

Porém, a respetiva liquidação dependerá sempre e em qualquer circunstância da efectiva verificação, no plano factual, do dito aumento de défice funcional que competirá ao A. demonstrar (provando que o mesmo se encontra fora do âmbito e alcance que justificou a indemnização ora liquidada, extrapolando-a).

3º - Data do início da contagem dos juros.

Sustenta a Ré seguradora que os juros que incidem sobre as perdas salarias devem ser contados a partir da sentença.

Apreciando:

A quantia fixada a título de indemnização por danos de natureza não patrimonial e apurada segundo juízos de equidade (como é o caso do dano biológico), em termos actualizadores, é acrescida de os juros de mora contabilizados a partir da sentença que os fixou (e não da data correspondente à citação da Ré), sendo plenamente aplicável a doutrina expressa no acórdão uniformizador de jurisprudência nº 4/2002, de 9 de Maio de 2002, publicado no Diário da República, Iª Série-A, nº 164, de 27 de Junho de 2002.

(Neste sentido, vide, entre muitos outros arestos, a seguinte jurisprudência:

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Novembro de 2021 (relatora Maria João Vaz Tomé), proferido no processo nº 590/13.8TVLSB.L1.S1;

- o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 2021 (relator Nuno Pinto de Oliveira), proferido no processo nº 644/12.8TBCTX.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt, que considerou a data do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça na medida em que a indemnização encontrada foi actualizadora nesse aresto (o que não acontece na situação sub judice).

- o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Abril de 2022 (relator Fernando Batista), proferido no processo nº 96/18.9T8PVZ.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt).

Já relativamente à indemnização que se prende com o ressarcimento de danos de natureza patrimonial (perdas salariais), os respectivos juros contam-se a partir da data da citação da Ré seguradora, nos termos gerais do artigo 805º, nº 3, do Código Civil.

IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção) conceder provimento parcial à revista da Ré, fixando-se o valor indemnizatório global em 348.997,13 (trezentos e quarenta e oito mil, novecentos e noventa e sete mil e treze cêntimos), coincidente com o valor encontrado na sentença de 1ª instância, acrescido do valor a liquidar respeitante exclusivamente ao aumento do défice funcional do Autor que venha a ocorrer depois da presente decisão, incluindo ainda o pagamento de juros de mora que se contam, relativamente aos danos de natureza patrimonial (perdas salariais) desde a data da citação da Ré, e ao dano biológico e indemnização por danos morais (apurados com recurso à equidade e de forma actualizadora) desde a data da sentença de 1ª instância, até ao efectivo e integral pagamento à taxa legal prevista para as operações civis; negar a revista apresentada pelo A.

Custas da revista da Ré recorrente, 1/6 (um sexto) por esta e 5/6 (cinco sextos) pelo A.; custa da revista interposta pelo A. a cargo deste.

Lisboa, 1 de Março de 2023.

Luís Espírito Santo (Relator)

Ana Resende

Maria José Mouro

V – Sumário elaborado pelo relator nos termos do artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil.