Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00004118 | ||
Relator: | HORTA E VALE | ||
Descritores: | PESCA EM ÉPOCA DE DEFESO FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA | ||
Nº do Documento: | SJ195606190292783 | ||
Data do Acordão: | 06/19/1956 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Referência de Publicação: | DG IªS 05-07-1956; BMJ 58, 324 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | RECURSO PARA O PLENO | ||
Decisão: | FIXADA JURISPRUDÊNCIA | ||
Indicações Eventuais: | ASSENTO 3/1956 | ||
Área Temática: | DIR CRIM - CRIM C/PATRIMONIO. | ||
Legislação Nacional: | D DE 1893/04/20 ARTIGO 43 N1 N2 N3 PAR2 ARTIGO 64. D 17900 DE 1930/01/27 ARTIGO 14. CPP29 ARTIGO 669. D 1029 DE 1914/11/06 ARTIGO 91 PAR3. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO RP DE 1954/02/03 IN BMJ N44 PAG156. ACÓRDÃO RP PROC3238 DE 1953/01/09. | ||
Sumário : | Nas aguas interiores do Pais, a pesca com linha de mão flutuante não pode praticar-se nas epocas de defeso fixadas nos ns. 1, 2 e 3 do artigo 43 do Regulamento de 20 de Abril de 1893, mesmo aos domingos e feriados. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam em Tribunal Pleno: Na comarca de Bragança e em processo de transgressão, foi julgado o reu A, identificado nos autos. Era acusado de num domingo dia 30 de Maio de 1954, no rio Fervença, andar a pescar peixes escalos com linha de mão flutuante, cometendo a infracção prevista e punida pelo n. 3 e paragrafo 2 do artigo 43 do Decreto de 20 de Abril de 1893 e artigo 14 do Decreto n. 17900, de 27 de Janeiro de 1930, visto naquela data correr o tempo defeso para a pesca daquela especie. Pela sentença de folhas 16, foi o dito reu absolvido com o fundamento de que aquele dia 30 de Maio era Domingo e, por isso, nos termos do artigo 14 do Decreto n. 17900, de 27 de Janeiro de 1930, conjugado com o seu paragrafo unico, o reu, pescando por aquela forma, procedeu no uso de uma permissão ou faculdade que a lei lhe confere, não cometendo, portanto, a imputada transgressão. Desta decisão, pelo digno representante do Ministerio Publico foi interposto recurso para a Relação do Porto que, por seu douto acordão de folhas 32, confirmou a sentença absolutoria, pelas razões e fundamentos que que do dito acordão constam. Todavia, o excelentissimo Procurador da Republica junto daquele Tribunal, invocando o artigo 669 do Codigo de Processo Penal e a existencia de acordão da mesma Relação proferido em sentido oposto e condenatorio, em caso perfeitamente identico, interpos recurso extraordinario para este Tribunal na finalidade de se uniformizar a jurisprudencia. E juntando copia do acordão da mesma Relação, datado de 9 de Março de 1955 e concluindo pela condenação de um transgressor acusado de igual facto, ocorrido ate no mesmo dia, apresenta a sua douta alegação de folhas 37 com as conclusões finais de que devera assentar-se a doutrina seguinte: "A pesca com linha de mão flutuante não pode praticar-se nas epocas de defeso determinadas nos ns. 1, 2 e 3 do artigo 43 do Regulamento dos Serviços Aquicolas, aprovado pelo Decreto de 20 de Abril de 1893". Seguindo o processo os seus termos, foi proferido o acordão de folhas 52 que reconheceu e verificou a oposição e a contradição da jurisprudencia sobre a mesma questão de direito e no dominio da mesma legislação. Apresentada foi então a douta e proficiente alegação do ilustre Ajudante do Procurador-Geral que, com precisão e clareza, reune valiosos elementos tendentes a, de harmonia com a opinião do magistrado recorrente, se proferir assento no sentido e com a redacção que indicados foram. Correu o processo os vistos legais e tudo ponderado cumpre conhecer e decidir: Não ha duvida sobre a manifesta oposição entre os dois referidos acordãos, como foi entendido e decidido a folhas 52, não havendo lugar a recurso ordinario visto a decisão não o comportar. Importa, por isso, resolver o conflito por meio de assento competente, devendo a questão ser apreciada a face dos diplomas legislativos seguintes: 1 - Regulamento dos Serviços Aquicolas constante do Decreto de 20 de Abril de 1893; 2 - Decreto n. 1029, de 6 de Novembro de 1914; 3 - Decreto n. 17900, de 27 de Junho de 1930. Resume-se tal questão ao seguinte ponto, juridicamente duvidoso: E ou não permitido, nas epocas do defeso especial e geral, pescar nas aguas interiores com linha flutuante de mão, aos domingos e dias feriados, independentemente de licença? Para melhor elucidação do caso, convem estabelecer desde ja que não ha razão legal para distinguir entre pesca com linha de mão flutuante e pesca com linha flutuante de mão, pois da comparação dos preceitos de lei referentes, resulta que as expressões se equivalem na significação usual de "pesca a linha e pesca a cana" como elucida o Dr. Cunha Gonçalves no Tratado, volume III, pagina 193. Posto isto e apreciando agora o conteudo daqueles diplomas legais, verifica-se o seguinte: a) O Regulamento de 20 de Abril de 1893 dispõe (ns. 1 e 2 do seu artigo 43) a proibição de pesca de certas especies (truta e salmão) em certas e determinadas epocas do ano, ao mesmo tempo que, no n. 3 do citado artigo fixa como epoca do defeso geral da pesca de todas as especies ictiologicas, ali não referidas, o espaço de tempo que vai de 1 de Março a 30 de Junho com excepção do savel, da lampreia e de outros peixes que vivem, alternadamente, na agua doce e na agua salgada. E certo que, logo a seguir, o artigo 64 permite a pesca a linha flutuante de mão, exceptuando apenas aquelas proibições especiais dos ns. 1 e 2 do citado artigo 43. Mas esta permissão do artigo 64 não pode contrariar aquela tão clara disposição que estabelece o defeso geral da pesca, tanto mais que o paragrafo 2 do mesmo artigo 43, vincando a necessidade de fazer respeitar as proibições a que se referem todos os ns. 1, 2 e 3 do artigo 43, expressamente determina que tais proibições respeitam a todos os meios e sistemas de pesca, incluida a pesca com linha de mão flutuante. E neste concludente preceito do paragrafo 2 do mesmo artigo 43, na sua expressa referencia ao n. 3 do dito artigo, reside manifestamente o espirito da lei no sentido de se conservar e manter uma epoca anual de defeso geral para todas as especies não compreendidas em proibições especiais ou em especialissimas excepções. Reportando-nos agora ao aludido Decreto n. 1029, de 6 de Novembro de 1914, verificamos a sua evidente finalidade - a conservação das especies e a sua reprodução abundante. Para tanto, reproduz, mais ou menos, os comandos do artigo 43 do Regulamento de 1893 e no seu artigo 91, paragrafo 3, estabelece as seguintes epocas de defeso da pesca nas aguas interiores: 1 - 20 de Outubro a 31 de Janeiro, para o salmão; 2 - 1 de Novembro a 15 de Fevereiro, para a truta; 3 - De 1 de Março a 30 de Junho para todas as especies de peixes a que se não referem os ns. 1 e 2, salvo, alinea a), a pesca do savel e da lampreia e outros peixes que vivem, alternadamente, na agua doce e na agua salgada. E assim, por lei posterior que teria vindo completar lei anterior e fazer cessar quaisquer duvidas que pudessem existir, ficava confirmada a existencia dos defesos especiais e do defeso geral, este para todas as especies não expressamente exceptuadas e fixado entre 1 de Março e 30 de Junho. Passando agora ao Decreto n. 17900, de 27 de Janeiro de 1930, que regulamenta a pesca desportiva, suas condições e locais em que pode ser exercida, ve-se que tal decreto nada dispõe sobre epocas e tempo de defeso, procurando, porem, fixar o principio da obrigatoriedade de licença para pesca em aguas fluviais, conforme se depreende do seu artigo 14. No entanto e no plano de fomentar o amadorismo da pesca, declara livre e isenta de licença a pesca com linha de mão flutuante, aos Domingos e dias feriados, nas aguas dominio publico, salvo nas reservadas por legislação geral ou especial e nas concedidas nos termos deste decreto. Porem, esta isenção e esta liberdade relativa naqueles dias qualificados tem de entender-se como condicionadas e subordinadas aos preceitos reguladores da pesca nas epocas do defeso geral e do defeso especial estabelecidas por lei anterior. Realmente, procurou este diploma estabelecer zonas de concessão de pesca desportiva em condições que, sem negarem ao Erario condigna contribuição, se traduzem por vantagens incontestaveis para o repovoamento das aguas fluviais, não so nas zonas concedidas mas em todas as outras onde a pesca continuara livre para todos, nos termos da lei. Estes "termos da lei", não podem deixar de ser e de representar aquelas limitações originadas pelas epocas do defeso geral e especial, acrescendo a exigencia de uma licença anual, dispensavel porem para a pesca com linha flutuante de mão nos Domingos e dias feriados. Mas tudo sem prejuizo daqueles defesos estabelecidos nas leis anteriores e nomeadamente no paragrafo 2 do artigo do artigo 43 do Regulamento de 1893 que sujeita a esses defesos todos os meios e sistemas de pesca com referencia expressa a inclusão da pesca com linha de mão flutuante. Nem seria logico que, sem disposição expressa, se formulassem, por um lado, medidas proteccionistas de repovoamento e, por outro lado, se permitisse todo o ano a pesca a linha sem respeito pelos defesos. O que e razoavel e susceptivel de contemplar todos os interesses e que, fora do regime especial das concessões do Decreto n. 17900, todos possam pescar conformando-se, porem, com os regulamentos que alem dos meios e sistemas de pesca estabelecem o defeso geral e os defesos especiais, podendo uns pescar todos os dias da semana desde que estejam munidos de competente licença que, todavia, e dispensavel aos Domingos e dias feriados para a pesca com linha flutuante de mão. Ficaria assim respeitada a proibição nas epocas do defeso e concedida ao amadorismo menos abonado a possibilidade de se entreter e divertir nos dias de ocio e descanso. No sentido desta proibição, durante o defeso geral, se vinha manifestando o Tribunal da Relação do Porto como se ve dos acordãos de 3 de Fevereiro de 1954, no Boletim, n. 44, pagina 156, e de 9 de Janeiro de 1953 (processo n. 3238) e ainda do acordão oferecido em confronto, neste autos e para base deste recurso. Em igual sentido opina tambem Cunha Gonçalves, no Tratado, volume III, local citado. Tambem nesta corrente se manifestam as entidades oficiais e os tecnicos, como se ve dos pareceres transcritos, a folhas 65 e 66, embora revelando certas divergencias no campo da discussão do assunto. Por todas estas razões e fundamentos e ja que a questão, tendo sido trazida ao Pleno do Tribunal, tem que ser resolvida com a finalidade de se evitarem decisões contraditorias, se decide no sentido de se acatar e respeitar o defeso geral da pesca, formulando o seguinte assento apenas para a fixação de jurisprudencia: Nas aguas interiores do pais, a pesca com linha de mão flutuante não pode praticar-se nas epocas de defeso fixadas nos ns. 1, 2 e 3 do artigo 43 do Regulamento de 20 de Abril de 1893, mesmo aos Domingos e dias feriados. Sem imposto de justiça. Lisboa, 19 de Junho de 1956 Horta e Vale (Relator) - Amaral Cabral - A. Baltasar Pereira - Filipe Sequeira - Eduardo Coimbra - Julio M. de Lemos - Sousa Carvalho - Beça de Aragão - A. G. Pereira - Manuel Pereira Brandão - Antero Cardoso - Lencastre da Veiga - Agostinho Fontes - Mario Estevão da Silva Cardoso - Piedade Rebelo. |