Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3444/11.9TBLLE.E2.S2
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ROSA RIBEIRO COELHO
Descritores: LIQUIDAÇÃO
EQUIDADE
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
CONTRATO DE SEGURO
SEGURO DE INCÊNDIO
INCÊNDIO
LIMITE DA RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA
DANOS PATRIMONIAIS
NULIDADE DE ACÓRDÃO
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
OPOSIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO
Data do Acordão: 12/17/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO EM GERAL / ACTOS PROCESSUAIS / ACTOS EM GERAL / ACTOS DOS MAGISTRADOS – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / VÍCIOS E REFORMA DA SENTENÇA.
Doutrina:
- Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, p. 737-8;
- Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2º, p. 172 e 173 ; Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, p. 140;
- Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, 2ª edição, vol. 2º, p. 703,
- Vaz Serra, RLJ, Ano 113, p. 328.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 154.º, N.º 1 E 615.º, N.º 1, ALÍNEAS B) E C).
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 01-07-2010, PROCESSO N.º 1148/07.6TVPRT.P1.S1;
- DE 28-10-2010, PROCESSO N.º 72/06.7TBMTR.P1.S1;
- DE 22-02-2017, PROCESSO N.º 5808/12.1TBALM.L1.S1, TODOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I – Para ressarcimento dos danos causados por incêndio não é de adotar o valor do capital seguro como matriz balizadora, pois que, reportando-se ele à totalidade do conteúdo/recheio do estabelecimento, se desconhece em que concreta extensão o mesmo foi danificado pelo incêndio.

II – Tal elemento será de considerar, mas em paridade com outros, como é caso dos vários orçamentos trazidos aos autos pelas partes enquanto estimativa do custo implicado na reparação dos danos em causa e a quantia que a seguradora aceitou pagar em sede de apelação, tendo-se sempre presente a extensão dos danos abstratamente denunciados pelos factos provados e o valor que normalmente será adequado para ressarci-los.

Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

2ª SECÇÃO CÍVEL




I - AA instaurou contra BB - Companhia de Seguros, S.A., e CC Seguros, S.A., o presente incidente de liquidação de sentença no âmbito da ação declarativa, sob a forma comum, que correu termos entre ambas, alegando que ascendem a € 337.500,00 os danos por si sofridos[1] e cujo ressarcimento foi reconhecido na sentença proferida.

As rés contestaram e, realizado o julgamento, foi proferida sentença que emitiu o seguinte comendo decisório:

condeno a ré BB - Companhia de Seguros, S.A. a pagar à autora a quantia de € 240.000,00 e a ré CC Seguros, S.A. a pagar à autora a quantia de € 30.000,00, deduzidas as respectivas franquias e acrescidas de juros de mora, contados desde a data da citação até integral pagamento, às taxas de juros comerciais sucessivamente em vigor, absolvendo as rés do demais peticionado.


Apelou a ré BB defendendo a sua absolvição do pedido ou, no limite, a sua condenação apenas até ao limite do dano concretamente apurado em sede de averiguações, in casu, até ao montante de € 13.554,29, e com as deduções das franquias contratuais previstas.


No Tribunal da Relação de Évora, veio a ser proferido acórdão que, no conhecimento dessa apelação, emitiu a seguinte decisão:

“Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso em função do que se altera sentença recorrida e fixa-se a quantia líquida em € 50.000, a pagar pela recorrente BB - Companhia de Seguros, S.A., deduzida a franquia, mantendo-se o decidido no demais.”


Inconformada, a autora trouxe a este STJ revista excecional, invocando, além do mais, a existência de contradição entre o acórdão recorrido e outros acórdãos da Relação já transitados em julgado.

A Formação a que alude o nº 3 do mesmo art. 672º do CPC[2] proferiu acórdão considerando inverificado o pressuposto da dupla conformidade exigível, a par de outros, para a admissibilidade da revista a título excecional; e, concomitantemente, ordenou a distribuição do recurso como revista normal.


Nas alegações apresentadas, a autora formula as prolixas[3] conclusões que, extirpadas das atinentes à oposição de julgados invocada como fundamento da revista excecional que não foi admitida, passamos a transcrever:

1 - A Autora AA, não se conformando com o douto Acórdão dele vem interpor Recurso de Revista Excepcional, nos termos do art. 672° n° 1 al. c) e 674° n° 1 als. a), b) e c) do CPC, sendo que veio a Ré BB condenada a pagar a indemnização no valor de €240.000,00 à Autora ora Recorrente. Tendo a Ré recorrido para o Tribunal da Relação que reduziu drasticamente a quantia da indemnização para € 50.000,00, concluindo que não é possível arbitrar uma indemnização com recurso à equidade, no entanto o próprio Tribunal da Relação a quo, recorreu a critérios de equidade para esta redução, atendendo entre os vários orçamentos juntos aos autos - não interpretou e identificou erradamente os valores a ter em consideração como se infra-demonstrara (sic).

INCUMPRIMENTO DOS DEVERES DA RELAÇÃO E CONSEQUENTE NULIDADE - arts. 674° n° 1 al.c) e 615° n° 1 al. b) e c) do CPC;

2 - No douto Acórdão e no que se refere à reapreciação da prova dada como provada, pela1a Instância, e aceite pela Tribunal da Relação a quo, esta escreve no douto acórdão recorrido que:

"A sentença, uma vez que não foi possível quantificar o valor dos danos, socorreu-se do critério de equidade nestes termos:

«Assim, fazendo apelo aos critérios de justiça indicados, temos como limites (opostos) os valores plasmados nos orçamentos apresentados pela autora quanto aos referidos danos e valor da avaliação apresentada pela ré Lusitânia.

«Assim, temos orçamentos apresentados pela autora de € 112.635,40 e de € 408.456.68, bem como avaliação dos danos pela ré de €22.243,33 - fls. 670/676 e 778.

«Mas temos também o valor que a ré BB atribuiu ao recheio.

«Na verdade, como anteriormente foi referido, não podemos olvidar que esta ré aceitou atribuir o valor de €300.000,00 ao recheio quando celebrou o contrato de seguro com a autora.

«Aliás, era esse o valor sobre o qual a autora pagava o respectivo prémio.

«Por outro lado, temos que o orçamento de menor valor apresentado pela autora (€112.635,40) apenas contempla decoração, sendo que o orçamento de maior valor que juntou (€ 408.456,68) reporta-se ainda a revestimentos de madeira, balcão e equipamentos/maquinaria, incluindo pintura e limpeza.

«Assim, sopesando os valores indicados e partindo do valor médio de €300,000,00* aceite pela ré BB quando celebrou o contrato de seguro, aplicando uma depreciação de 20%, atendendo ao decurso do tempo e natural deterioração dos bens, entende-se por adequado fixar a indemnização a suportar pela ré BB, Companhia de Seguros, S.A., em 240.000.00».

3. Mas chegado o momento da apreciação da matéria de facto, o douto Tribunal da Relação a quo, errou na interpretação, aplicação e determinação da matéria de facto e concretamente quanto ao valor do orçamento apresentado pela Ré BB (sendo que apenas somou três dos valores apresentados e esqueceu-se do valor principal de €75.100,00 referente a trabalhos de construção civil e substituição de equipamentos) ou seja, o Tribunal da Relação a quo, decidiu mal e erradamente a matéria de facto, tendo inclusive se baralhado nos orçamentos juntos pelas partes (favorecendo a posição da Ré BB) em concreto quanto ao valor do orçamento solicitado pela Ré BB, e junto aos autos, conforme consta ponto 13- e 14- de fl. 5 do douto acórdão recorrido, da matéria dada como provada, designadamente:

"13- A Ré BB solicitou à DD uma avaliação dos danos, tendo concluído que a porta de entrada e a porta interior em alumínio ficaram totalmente destruídas, o revestimento de madeira do texto, paredes e pavimento parcialmente queimado, o palco queimado, o balcão danificado, a instalação eléctrica e os quadros parcialmente danificados, os espelhos destruídos, dois aparelhos de ar condicionado destruídos, os sofás sofreram danos, os cortinados e almofadas destruídos, 3 apliques partidos, a carpete estragada e o projector destruído.

14- A DD obteve junto da empresa "EE", que procedeu à limpeza da fracção, um orçamento no valor de € 75.100,00 referente aos trabalhos de construção civil e substituição de equipamentos, a que acresce a quantia de €2.000,00 para a limpeza, € 15.743,33 para a substituição do recheio e de € 4.500,00 para a reparação das madeiras.”

4 - Ou seja, o douto Tribunal andou mal, ao fundamentar que "Assim, temos orçamentos apresentados pela autora de €112.635,40 e de € 408.456,68, bem como a avaliação dos danos pela ré de €22.243,33 - fls. 670/676 e 778.

5 - Sendo que o orçamento apresentado pela Ré, ora recorrente, está incorrecto, pois este valor de €22.243,33 - é apenas referente a parte dos danos, designadamente a limpeza (€ 2.000,00); a substituição do recheio (€15.743,33) e a reparação das madeiras (€4.500,00) - estamos em falta o valor de €75.100,00 referente aos trabalhos de construção civil e substituição de equipamentos - conforme consta do ponto 14- de fls. 5 do douto acórdão - sendo que este orçamento solicitado pela Ré, ora Recorrente, concluiu que a porta de entrada e a porta interior em alumínio ficaram totalmente destruídas, o revestimento de madeira do texto, paredes e pavimento parcialmente queimado, o palco queimado, o balcão danificado, a instalação eléctrica e os quadros parcialmente danificados, os espelhos destruídos, dois aparelhos de ar condicionado destruídos, os sofás sofreram danos, os cortinados e almofadas destruídos, 3 apliques partidos, a carpete estragada e o projector destruído - perfazendo este orçamento apresentado pela Ré, ora Recorrente, uma quantia total de € 97.343,33, e não a quantia erradamente estipulada no douto acórdão de €22.243,33.

6 - Assim, concluiu o Tribunal da Relação a quo, que:

"Em todo o caso, contra o que a recorrente se insurge é o entendimento que vingou na sentença alegando que não é possível, com recurso a critérios de equidade, «condenar a ora Recorrente (...) na totalidade do capital seguro, ainda que com a aplicação de uma percentagem de depreciação de 20% sobre a totalidade de tal montante, decorrente do decurso do tempo sobre os bens seguros».

Concordamos embora não acompanhemos a recorrente na sua conclusão (como adiante se exporá).

A equidade é a justiça do possível e não a exacta ou, sequer, a desejada. Nesta medida, não cumpre o critério a decisão que tenha por desfecho a fixação do valor da quase totalidade dos bens seguros.


*


No entanto, isto não significa que se tenha que avançar para um valor concreto indicado pela recorrente.

Com efeito, esta alega que o tribunal devia ter atendido ao valor por si indicado e que resulta da sua averiguação do sinistro, uma vez que a A. apenas apresentou orçamentos e não despesas. Acrescenta ainda que a Lei de Contrato de Seguro limita a indemnização (no seu art. ° 128. °) ao dano decorrente do sinistro. Mas isto em nada contraria, sequer, o princípio geral do art. ° 562. ° (também contido no art. ° 483. °, n. ° 1) pois que deste decorre que a indemnização não pode ser superior ao dano. Se, porventura, o dano alegado é inferior ao que realmente se verificou, então caberia ã recorrente ter provado isso mesmo.

Mas estas considerações, que se encontram nas alegações, não podem fazer esquecer que o tribunal não quantificou de maneira nenhuma os danos, ou seja, não deu por provados os valores propostos concretamente por ou outra parte. Claro que «a indemnização a fixar deveria reflectir um dano em concreto, apurado tão rigorosamente quanto possível» mas acontece que tal não foi, precisamente, possível

Ou seja, continuamos presos, por assim dizer, ao critério da equidade.

E quanto à sua aplicação na sentença, já afirmamos que concordamos com a seguradora: não é possível arbitrar uma indemnização, com recurso à equidade, que equivalha à totalidade ou quase totalidade dos danos. Teria como consequência, como a recorrente nota, que a indemnização seria sempre tanto maior quanto maior fosse o valor do seguro. Isto significa que a decisão deve ser alterada reduzindo-se o montante indemnizatório.

O valor do capital garantido não pode deixar se ser tido em consideração tal como também não pode ser deixar de o ser o valor dos orçamentos apresentados pela A..

A recorrente defende, como se viu, que são apenas orçamentos e estes são, acrescentamos nós, uma estimativa, uma avaliação. Não é certa mas, em termos normais, deve ser aceite como aproximada; tal como é uma avaliação também o montante avançado pela recorrente; embora lhe chame «valor dos prejuízos efectivamente averiguados e apurados pelas Rés», isto não está provado. O que está provado, e não deixa de ser curioso, é que a mesma
empresa que fez a avaliação dos danos é a mesma que apresentou o orçamento de € 95.000,00.

Dentro dos vários orçamentos apresentados, há um (n. ° 12; o agora referido) que engloba os diversos arranjos necessários, trabalhos de construção civil e substituição de equipamentos, limpeza, substituição do recheio e reparação das madeiras. Tal orçamento ascende a cerca de € 95.000,00.

E depois existem outros orçamentos bastantes díspares e que são os apresentados pela recorrente e pela recorrida (sendo que neste caso temos orçamentos de € 340.000,00).

E existe também o valor indicado pela recorrente (cerca de € 13.000,00) que não pode deixar de ser tido em conta pois que é um valor por ela assumido e que, nesta medida, é um elemento em que a recorrente está disposta a ceder. No seu recurso, pede que a indemnização seja fixada naquele montante, descontada a franquia.

Por isso, entendemos que este valor será o limite mínimo, sendo o máximo o valor do menor orçamento apresentado pela recorrida. A diferença entre os dois valores (e note-se que as contas não têm que ser rigorosas) servirá apenas como elemento a ponderar e não como critério fixo."

7 - Refere o Tribunal da Relação a quo, no douto acórdão recorrido que "O valor do capital garantido não pode deixar se ser tido em consideração tal como também não pode ser deixar de o ser o valor dos orçamentos apresentados pela A.. A recorrente defende, como se viu, que são apenas orçamentos e estes são, acrescentamos nós, uma estimativa, uma avaliação. Não é certa mas, em termos normais, deve ser aceite como aproximada; tal como é uma avaliação também o montante avançado pela recorrente; embora lhe chame «valor dos prejuízos efectivamente averiguados e apurados pelas Rés." - ou seja deve ser tido em consideração na apuração do valor de indemnização, o valor do capital garantido (ou seja, o capital seguro de €300.000,00) e os orçamentos apresentados pela Autora AA, ora Recorrente, sendo o orçamento mais baixo apresentado por esta no valor de € 340.000,00 (contendo este orçamento todos os serviços necessários de construção, limpeza, substituição de todos os equipamentos, decoração e pintura), para restituir a situação que existia antes do evento que obrigou a sua reparação; sendo que apenas de a Ré BB, no seu recurso para a Relação se agarrar que estes eram apenas orçamentos, facto é que para fundamentar o seu recurso e posição, também utilizou e fundamentou com base na sua avaliação (orçamento) no valor de € 97.343,33. (sendo que este orçamento constante do ponto 14- do duto acórdão recorrido, não contempla os serviços de pintura, e a decoração).

8 - Sendo que o valor do capital garantido, é de € 300.000,00, valor este aceite pela Ré, BB aquando da celebração do contrato de seguro com a ora Autora AA, e perante os factos dados como provados e o orçamento completo da Autora ora Recorrente, para restituir a situação do recheio do seu imóvel, dúvidas não devem existir que o valor a ser tido em causa, é efectivamente o capital seguro de €300.000,00 sendo que este é o valor sobre o qual a Autora pagava o respectivo prémio - visando sacrificar-se para garantir que perante uma desgraça estaria protegida e segurada.

9 - No douto acórdão recorrido o Tribunal da Relação a quo, concluiu a sua convicção e fundamenta que:

"Note-se que não estamos em condição de avaliar um dano certo mas sim de atribuir uma indemnização por um dano incerto. Ou seja, aquele orçamento de €95.000,00 não pode ser o definitivo, o determinante, tal como o não pode ser a estimativa apresentada pela recorrente. Com todo o risco que uma decisão destas comporta - risco de não ser exacta - entendemos que o valor de € 50.000,00 será o justo.

Claro que nada disto é seguríssimo, certíssimo; mas também não o é o critério aqui em questão."

10 - Facto é que o douto acórdão recorrido, conforme se comprova do supra exposto, o Tribunal da Relação a quo não resolveu as questões suscitadas no recurso que lhe foi presente, somente proferiu acórdão segundo a convicção probatória e a matéria de facto e de direito da 1a Instância - remetendo em tudo para a sentença da 1a Instância sem rebater fundamentemente (sic) as questões postas pela Ré BB, fazendo essencialmente da decisão da 1ª Instância a sua, apesar de no final, sem especificar os fundamentos de facto e direito, decidir que não é possível arbitrar uma indemnização com recurso à equidade, e reduzindo drasticamente o valor da indemnização para €50.000,00 - valor este que é irrisória e não suporta os danos dados como provados e sofridos pela Autora ora Recorrente, não conseguindo a Autora restituir (sic) os danos sofridos com esta quantia injusta e desadequadas, perante a prova dada como provada, os orçamentos em apreço, e crucialmente o capital seguro de €300.000,00 aceite pela Ré Lusitânia e valor sobre o qual a Autora ora Recorrente pagava o respectivo prémio.

11- O homem médio, vive em sociedade e respeita as regras que lhe são impostas, como a celebração de contrato de seguro, pagam grandes quantias por estes (sic), visando um dia perante uma desgraça estarem assegurados os bens, e depois sempre que um cidadão pretende activar o seguro perante um evento que lhe causou grandes danos, as Companhias de Seguro, enrolam na justiça durante anos, e por vezes ainda conseguem sem justificação, como o caso em apreço, este redução drástica da indemnização de € 240.000,00 fixada pela 1ª Instância, tendo a Relação reduzido a indemnização para €50.000,00, sem suporte probatório, sem especificar os fundamentos de facto e direito, e violando a lei processual e a justiça adequada ao caso em concreto.

12 - Perante o exposto verifica-se que o Tribunal da Relação a quo, ao longo do acórdão recorrido andou e fundamentou a sua convicção com recurso a equidade, pois é isto que consta do acórdão recorrido, sendo que finaliza afirmando que não é possível arbitrar uma indemnização com recurso à equidade - sucede que o Tribunal da Relação a quo, não especificou os fundamentos de facto e de direito que justifiquem esta decisão.

13 - A nulidade referida na alínea b) do n.° l do art.° 615.° do C. P. Civil ocorre quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão, violando o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208°, n.° 1, C. R. P. e art. 154°, n.°1, do C.P.Civil).

2.A nulidade da sentença a que se refere a l.a parte da alínea c), do n.°l, do art.° 615.° do C.P. Civil, remete-nos para o princípio da coerência lógica da sentença, pois que entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica. Não está em causa o erro de julgamento, quer quanto aos factos, quer quanto ao direito aplicável, mas antes a estrutura lógica da sentença, ou seja, quando a decisão proferida seguiu um caminho diverso daquele que apontava os fundamentos.

         (…)

 VIOLAÇÃO DA LEI SUBSTANTIVA consistindo no erro de interpretação, aplicação e determinação da norma aplicável e VIOLAÇÃO OU ERRADA APLICAÇÃO DA LEI DE PROCESSO

 53- Por último é de referir que, os actos de interpretação de normas de direito e de valoração jurídica dos factos e das provas, núcleo da função jurisdicional, são insindicáveis.

 54- Tendo o Tribunal da relação a quo, atendendo ao supra-exposto ao longo do presente recurso, violado a lei substantiva (erro de interpretação, aplicação e determinação da norma aplicável) e errado a aplicação da lei de processo.

 55- Assim, há erro de direito quando a essência da função jurisdicional, seja grosseiro, evidente, crasso, palmar, indiscutível e de tal modo grave que torne a decisão judicial numa decisão claramente arbitrária, assente em conclusões absurdas - como é o caso em apreço.

56- Assim, configura um erro grosseiro a condenação da Ré BB numa indemnização no valor de € 50.000,00 atendendo à prova produzida, dos danos sofridos pela Autora, ora Recorrente AA, aos orçamentos juntos pelas partes, sendo o limite mínimo do orçamento de € 97.343,33 (apresentado pela Ré BB) e o limite máximo o orçamento de € 340.000,00 (pela Autora); e crucialmente o capital seguro aceite pela Ré BB no valor de € 300.000,00, e valor sobre o qual a Autora, ora Recorrente pagava o respectivo prémio.

57- Assim, a violação da lei substantiva reconduz-se sempre a um erro: um erro de interpretação ou de determinação da norma aplicável ou de aplicação do direito, como foi o caso em concreto, em que o Tribunal a quo, erro (sic) na interpretação e aplicação dos critérios à equidade (sic), defendendo que não há recurso á equidade, mas seguiu a convicção do Tribunal de 1ª Instância (que defende o recurso à equidade) como sendo suas.

 58- E há erro de julgamento tanto pode começar na interpretação e subsunção dos factos e do direito, como estender-se à sua própria qualificação, o que, em qualquer das circunstâncias, afecta e vícia a decisão proferida pelas consequências que acarreta, em resultado de um desacerto, de um equívoco ou de uma inexacta qualificação jurídica ou, como enuncia a lei, de um erro. - como também foi o caso em apreço, conforme supra-exposto ao longo do presente recurso do incumprimento dos deveres da Relação, e fez a errada interpretação e subsunção dos factos dados como provados e do direito em causa.

 59- A este propósito explicita Teixeira de Sousa que por erro de subsunção se entende aquele que se verifica "sempre que estiver em causa um juízo de integração ou inclusão dos factos apurados na previsão de uma norma" que se considera indevidamente "aplicável ao caso concreto", com a interpretação errónea e infundada "dos conceitos utilizados nessa previsão e a concretização" indevida "dos conceitos indeterminados que se encontram nela".

  60- Pode, assim, dizer-se, em síntese, que esse vício substancial que a lei considera fundamento de violação de lei substantiva advém geralmente de uma interpretação e enquadramento jurídico incorrectos que acabam por afectar o conteúdo da decisão, dando origem ao denominado erro de julgamento e que tanto pode abranger o erro de julgamento de facto como o erro de direito.

61- Erros que, em qualquer das circunstâncias, originam a violação de lei substantiva, onde se incluem a escolha inadequada e a interpretação errónea da norma, bem como a inexacta qualificação jurídica e a falsa determinação das consequências jurídicas referentes ao caso concreto.

 62- Pelo que o douto acórdão recorrido é contrário à lei processual e substantiva, e é contrário ao princípio da justiça adequada ao caso concreto.

 63- Tendo o Tribunal da Relação a quo, erradamente apreciação a prova dada como provada (sic), e decidido alterar e reduzir drasticamente o valor da indemnização sem especificar os fundamentos de facto e de direito e de forma parcial e arbitrária.

64 - Ocorrendo assim o Tribunal da Relação a quo, na violação da lei substantiva, consistindo no erro de interpretação, aplicação e determinação da norma aplicável ao caso em concreto, perante a prova dada como provada (sic), ao abrigo do art. 674° n° 1 als. a) do CPC.

 65 - Bem como tais condições formais da decisão de facto radicam em normas de direito processual disciplinadoras dos limites cognitivos e do exercício dos poderes do Tribunal da Relação em sede de reapreciação dessa decisão, cuja violação e incorrecta aplicação são susceptíveis de servir de fundamento do recurso de revista, ao abrigo do art. 674° n° 1 al. b) do CPC.

66 - Assim, por violação ou errada aplicação da lei de processo deve entender-se o incumprimento das regras e trâmites processuais que se mostram definidos, e que devem ser observados pelo Tribunal e pelas partes, com projecção no âmbito da causa, cujo desrespeito vicia e cerceia os respectivos direitos, afastando o Tribunal do iter processual traçado e querido pelo legislador.

67 - Pelo exposto no presente recurso de revista, a violação e incorrecta aplicação por parte do Tribunal da relação a quo, são susceptíveis de servir de fundamento do recurso de revista, ao abrigo do art. 674° n° 1 als. a) e b) do CPC.


 Ao contra-alegar, a recorrida pediu a manutenção do acórdão recorrido e formulou as seguintes conclusões – aqui se excluindo também as atinentes à invocada inadmissibilidade do recurso como revista excecional -:

1. Não se conformando com o douto Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, o qual veio, com irrepreensível clareza e coesão, reapreciar todas as questões fácticas e jurídicas suscitadas nos presentes autos, julgando parcialmente procedente o recurso interposto pela ora Recorrida, insurge-se a A., ora Recorrente, lançando mão do presente recurso de revista excepcional, apresentando para o efeito argumentação que, salvo o devido respeito por melhor e douta opinião, não poderá, absolutamente, proceder.

   2. Vem a A. ora Recorrente alegar que o douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora incumpriu os deveres da Relação, imputando ao mesmo nulidades previstas no artigo 615.º n.º 1 do CPC, violando, nesta medida, o dever de motivação ou fundamentação das decisões judicias.

  3. Só a absoluta falta de fundamentação integra a previsão da al. b) do n.º 1 do art. 615.º do NCPC, cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento.

  4. O Acórdão não padece de nenhuns dos vícios apontados pela Recorrente.

         (…)

 13. O presente incidente de liquidação por objecto apurar “qual o montante da indemnização devida à autora relativa aos danos elencados nos pontos 10 a 12 dos factos provados da sentença proferida;

  14. Pretende a Recorrente a condenação na totalidade do capital seguro.

  15. Deixando assim antever (salvo o devido respeito) que, maior fosse o capital garantido pela apólice de seguro contratada com a ora Recorrida, maior seria o montante da indemnização arbitrada;

16. Ora, salvo o devido respeito (que é muito), não poderá a ora Recorrida concordar (de todo) com o entendimento perfilhado pela Recorrida.

17. Limitou-se a Recorrente a obter novos orçamentos, os quais juntou aos autos com vista à prova dos factos em discussão.

18. Contudo, defende a Recorrente que deverá ser tido em conta o valor da indemnização o valor do capital garantindo e o orçamento apresentado pela mesma.

   19. Ora, conforme se referiu no douto Acórdão “A indemnização a fixar deveria refletir um dano em concreto, apurado tão rigorosamente quanto possível, mas acontece que tal não foi, precisamente, possível”.

  20. De facto, todos os critérios de avaliação seguidos, e bem assim o valor dos bens danificados tidos em conta pela empresa DD aquando das referidas diligências de averiguação (cujo relatório se encontra junto aos autos a fls. 751/779 – cfr. pontos 13 e 14 dos Factos Provados na sentença proferida nos autos principais), foram minuciosamente analisados pela Veneranda Relação.

21. De facto, salvo o devido respeito, que é muito, não pode a ora Recorrida concordar, de forma alguma, com a pretensão da Recorrente, e tendo a Veneranda Relação recorrido a juízos de equidade para fixação do montante a arbitrar para efeitos de indemnização nos casos como o dos presentes autos, deverá manter-se.

22. Determina o artigo 566.º, n.º 3 do C.C. que “Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”. Ora, in casu, com o recurso a critérios de equidade, a Veneranda Relação fixou o montante de €50.000,00, o qual deverá ser mantido.

  23. Deve o tribunal julgar equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (art.º 566.º, n.º 3, do CCiv.).

 24. A equidade, como justiça do caso, mostra-se apta a colmatar as incertezas do material probatório, bem como a temperar o rigor de certos resultados de pura subsunção jurídica, na procura da justa composição do litígio, fazendo apelo a dados de razoabilidade e equilíbrio, tal como de normalidade, proporção e adequação às circunstâncias concretas.


  Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo questões submetidas à nossa apreciação as de saber se:

  - O acórdão recorrido padece das nulidades que a recorrente lhe atribui;

- É de manter o valor indemnizatório fixado no acórdão impugnado com recurso a critérios de equidade.


II – Vêm descritos como provados os seguintes factos:

  A) Na sentença objeto de liquidação consideraram-se provados os seguintes factos:

   1. A autora é dona e legítima proprietária da fração “H” do prédio urbano sito na Avenida …, n.º …, freguesia de …, concelho de …, inscrita na matriz predial urbana sob o artigo 3636º, destinado a bar, denominado “A 8”, com o alvará de licença n.º 1…3/88 emitido em 22 09 1988 pela Câmara Municipal de …, para o exercício da atividade de Bar.

   2. Tendo a aquisição do mesmo sido financiada com recurso a um crédito imobiliário concedido pelo Banco “FF, S.A.”.

  3- Pelo que celebrou um contrato de seguro com a ré CC, denominado “Multi-riscos (estabelecimentos) - Comércio”, titulado pela apólice n.º 0…4-00… .000 ….2, com início em 01.02.2009, celebrado por um ano e seguintes, o qual cobria, com interesse para o caso, atos de vandalismo, maliciosos ou de sabotagem, nos termos e com os limites constantes das “Condições Particulares”, com o capital limitado à quantia de € 88.540,00, sujeito a uma franquia em caso de sinistro correspondente a 10% do valor da indemnização, com um mínimo de € 100,00.

 4- De acordo com as condições particulares ficou garantida a reconstrução em novo, no valor de € 88.540,00 da fração, limitada à quantia de € 50.000,00 por sinistro, acrescida da quantia limite de € 2.500,00 pela remoção de escombros, e de € 175,00 por peça em caso de quebra de vidros, deduzida de uma franquia de €50,00.

  5- E acordou com esta ré que “O contrato não será alterado ou anulado, nem paga qualquer indemnização em caso de sinistro, sem o prévio consentimento do FF, S.A., agência …”.

  6- E celebrou com a “GG Seguros, S.A.”, entretanto incorporada por fusão na sociedade “BB – Companhia de Seguros S.A.”, um contrato de seguro do ramo Multi-Riscos – Estabelecimentos, titulado pela apólice nº 34…01.

  7- De acordo com as condições particulares acordadas os riscos cobertos consistiam:

  - Cobertura base de Conteúdo, indemnizável até ao montante de €300.000,00; - Coberturas facultativas;

   - Atos de vandalismo ou Maliciosos, indemnizável até ao montante de €300.000,00;

  - Roubo de Dinheiro, indemnizável em 1% do capital seguro no máximo de €500,00;

 - Danos no imóvel (não seguro), indemnizável até ao montante de €1.500,00;

 - Responsabilidade Civil, indemnizável até 20% do capital seguro para a cobertura de Conteúdo, no máximo de €15.000,00;

    - Demolição e Remoção de Escombros: 10% dos prejuízos indemnizáveis no máximo de €5.000,00;

  - Quebra de Vidros, Espelhos, Pedras e Loiças Sanitárias: 1% do capital seguro no máximo de €1.500,00;

  - Quebra de reclames ou Painéis Publicitários: até €1.000,00;        

- Queda ou Quebra de Antenas: até €1.000,00;

  - Queda ou Quebra de painéis Solares: 1% do capital seguro no máximo de €1.500,00;

 - Reconstituição de documentos: até €2.000,00;

 - Danos em Bens dos Empregados: até €750,00;

  - Privação de uso do Local Arrendado/Ocupado: até 20% do capital seguro para a cobertura Conteúdo, no máximo de €3.000,00;

  7 - Na proposta do contrato de seguro com a Real, assinada em 5.6.2003, a autora declarou que a atividade desenvolvida no estabelecimento era a de “restauração (snack-bar)” e que os produtos que comercializava predominantemente eram a “restauração” e, numa alteração, declarou que a atividade desenvolvida no estabelecimento era a de “snack-bar”, e que os produtos que comercializava predominantemente eram as bebidas.

         A autora encontrava-se inscrita no Serviço de Finanças de … para o exercício da atividade de exploração de Bar, com o CAE 5…2.

9 - Em 23 de Agosto de 2010 deflagrou um incêndio na fração supra identificada e segurada pelas apólices já mencionadas, causado por fogo posto provocado por agente ou agentes não identificados, tendo corrido o competente inquérito com o n.º 712/10.0G… e que foi arquivado por essa razão.

  10 - A temperatura gerada pelo incêndio teve influência nos elementos estruturais e revestimentos das paredes. Na laje do teto da zona do corredor, das instalações sanitárias e na copa as armaduras do betão sofreram dilatações, fraturaram o betão e originaram o desprendimento e colapso do reboco do revestimento. Na zona da entrada é possível detetar paredes com fissuras sob os painéis queimados. Só com a remoção total do revestimento de madeira será possível avaliar toda a extensão dos danos.

 11 - O incêndio provocou danos diretos e indiretos nas paredes da fração, os diretos causados pelas temperaturas elevadas a que as paredes estiveram expostas tendo resultado na fratura do reboco e cedência do betão armado, que por seu lado originou a fissuração e o desprendimento do reboco. Verificam-se danos indiretos na instalação elétrica, tendo ardido os tubos plásticos embutidos nas paredes, assim como o isolamento dos cabos elétricos no seu interior. Para a sua substituição é necessária a remoção das madeiras, abertura de roços no reboco, aplicação de novas tubagens e caixas e fecho dos roços com reboco e pintura. As fissuras no betão danificaram o aço dos elementos estruturais. As ombreiras das portas ficaram danificadas e têm de ser refeitas e realizado um novo encastramento de ferragens do aro e dobradiças da nova porta.

 12 - O incêndio provocou ainda danos no interior do estabelecimento, designadamente na maquinaria, decoração, pintura, balcão, e consumíveis, por ação das chamas e do fumo.

  13 - A Ré BB solicitou à DD uma avaliação dos danos, tendo concluído que a porta de entrada e a porta interior em alumínio ficaram totalmente destruídas, o revestimento de madeira do texto, paredes e pavimento parcialmente queimado, o palco queimado, o balcão danificado, a instalação elétrica e os quadros parcialmente danificados, os espelhos destruídos, dois aparelhos de ar condicionado destruídos, os sofás sofreram danos, os cortinados e almofadas destruídos, 3 apliques partidos, a carpete estragada e o projetor destruído.

   14 - A DD obteve junto da empresa “EE”, que procedeu à limpeza da fração, um orçamento no valor de € 75.100,00 referente aos trabalhos de construção civil e substituição de equipamentos, a que acresce a quantia de € 2.000,00 para a limpeza, € 15.743,33 para a substituição do recheio e de € 4.500,00 para a reparação das madeiras.

  15- A HH a pedido da ré CC efetuou uma peritagem constatando danos na instalação elétrica, portas exteriores, sistema de deteção de incêndio e nos revestimentos dos quartos de banho e da copa. Com base no orçamento proposto pela empresa “EE”, a ré estimou o valor dos prejuízos cobertos em €11.000,00, pelo que propôs à autora a indemnização de € 9.900,00, correspondendo àquele valor uma vez deduzida a franquia.

 16- A autora apresentou vários orçamentos às seguradoras:

  - da “II, Lda”, no montante de € 347.127,83 para trabalhos de construção, substituição e limpeza;

  - da “JJ, Lda”, no valor de € 112.635,00, referente a decoração;

- da “KK, Lda” no valor de €340,568,00 referente a trabalhos de construção, substituição dos equipamentos e decoração;

  - da “LL, Lda” no valor global de € 11.638,00 referente à substituição dos equipamentos hoteleiros;

  - da “MM, Lda” no valor de €7.747,27 referente à substituição do equipamento de som e imagem.

  17- À data do incêndio a autora encontrava-se a auferir um rendimento mensal de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) acrescido de IVA, respeitante à cedência de exploração do estabelecimento a “NN, Actividades Hoteleira e Turísticas, Lda”.

 18 - Com o incêndio o contrato foi resolvido, face à impossibilidade da cessionária poder explorar o estabelecimento e, consequentemente, deixou a autora de receber as prestações cujo valor mensal era de € 651,89.

 19- A exploração do estabelecimento era a única fonte de rendimento da autora, que passou a depender economicamente de familiares para tal.

  20 - A autora participou o incêndio às rés.

 21 - Toda esta situação tem feito com que a autora tenha dificuldades em dormir, esteja sempre agitada, numa situação de desespero.

  22 - Teme perder o imóvel devido à impossibilidade de fazer face ao cumprimento das prestações mensais do empréstimo bancário ao FF.

 23 - A ré CC, concluída a averiguação, enviou diretamente à autora o respetivo recibo de indemnização, no montante total a indemnizar de € 9.900,00, alertando-a para o facto do recibo dever ser devidamente carimbado e validado pelo credor hipotecário, o FF, S.A.

 24 - Em resposta ao envio deste recibo, a autora, por carta datada de 30 de Março de 2011, recusou o valor proposto.

 25 - Em 6.6.2011 a ré BB comunicou à autora por carta registada que não iria proceder ao pagamento de qualquer indemnização uma vez que foram prestadas falsas declarações pela autora.

 26 - Após a aquisição da fração a autora removeu o pavimento do chão e colocou piso flutuante.

 27- A autora não procedeu ao pagamento atempado das prestações devidas ao FF para amortização do crédito imobiliário relativo a esta FF relativas a Dezembro de 2010 a Fevereiro de 2011”.

B) 1.º- A autora solicitou à “OO, Lda”, a elaboração de orçamento referente a decoração, o qual foi emitido, com data de 07.08.2017, no valor de €112.635,40, conforme doc. de fls. 670/674, cujo teor se dá por reproduzido.

2.º- A autora solicitou à “PP - Manutenção e Serviços, Ldª”, a elaboração de orçamento, referente a trabalhos de construção, substituição e limpeza, o qual foi emitido, com data de 17.08.2017, no valor de € 408.456,68, conforme doc. de fls. 675/676, cujo teor se dá por reproduzido.


III – É altura de abordarmos as questões suscitadas.


Das nulidades imputadas ao acórdão:  

Ao longo das conclusões 1. a 9., a recorrente transcreveu assinaláveis passagens da fundamentação do acórdão e foi tecendo juízos críticos ao raciocínio adotado, assinalando que, ao invés do que aí se considerou, o orçamento apresentado pela ré, ora recorrida, ascendia ao valor total de € 97.343,33, e não ao montante de € 22.243,33, e defendendo, em suma, a falta de acerto da decisão emitida quando fixou em € 50.000,00 o valor da indemnização devida.

E dessas considerações críticas arrancou, sem outras explicações, para a atribuição ao acórdão das nulidades previstas nas alíneas b) e c) do nº 1 do art. 615º - suas conclusões 10. a 13..


É manifesta a falta de razão da recorrente.

A violação do dever de motivação, instituído no art. 154º, nº 1, gera, nos termos do art. 615º, nº 1, b), a nulidade da decisão.

 “A exigência de motivação é perfeitamente compreensível. Importa que a parte vencida conheça as razões por que o foi, para que possa atacá-las no recurso que interpuser. (…) A decisão é um resultado, é a conclusão de um raciocínio; não se compreende que se enuncie unicamente o resultado ou a conclusão, omitindo-se as premissas de que ela emerge.[4]

Mas é corrente e unânime o entendimento segundo o qual só a falta absoluta de fundamentação de facto ou de direito gera a nulidade em causa, com o que se não pode confundir a fundamentação medíocre ou insuficiente que, repercutindo-se no mérito da decisão, podendo comprometê-lo, não produz nulidade.[5]

Ora, é bom de ver que ao acórdão impugnado não pode ser assacado este vício que a recorrente, aliás, não se esforçou em caraterizar.

Dele constam os fundamentos de facto – descrição da materialidade fáctica tida como demonstrada – e os fundamentos de natureza jurídica que subjazem ao comando decisório emitido.

Poderá pôr-se em causa o mérito da decisão, mas não a sua irregularidade formal com este fundamento.

 

A oposição entre os fundamentos e a decisão, vício caracterizado na alínea c) do nº 1 do art. 615º, pressupõe a existência de um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária – conclusão não permitida pelas premissas – à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la.

Ou, dito de outro modo, tal vício ocorre “quando existe incompatibilidade entre os fundamentos e a decisão, ou seja, (nos casos) em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final.[6]

Nada disto ocorre no caso dos autos em que é absoluta a coerência lógica existente entre os fundamentos e decisão emitida.

Mais uma vez, poderá estar em causa o mérito da decisão mas não a sua regularidade formal.

Não se verificam, pois, os vícios formais invocados.


Sobre o valor fixado com recurso à equidade:

O valor encontrado pelas instâncias, com recurso à equidade, para ressarcir os danos causados por incêndio que foi feito deflagrar em imóvel da autora tem, de facto, assinalável diferença.

A sentença fixou-o em € 240.000,00 e o acórdão impugnado reduziu-o para € 50.000,00.


A 1ª instância, após constatar a falta de demonstração do valor dos danos sofridos e a consequente necessidade de recurso à equidade para encontrar o valor da indemnização devida à autora, raciocinou do seguinte modo:

 “Assim, fazendo apelo aos critérios de justiça indicados, temos como limites (opostos) os valores plasmados nos orçamentos apresentados pela autora quanto aos referidos danos e valor da avaliação apresentada pela ré Lusitânia.

Assim, temos orçamentos apresentados pela autora de € 112.635,40 e de € 408.456,68, bem como avaliação dos danos pela ré de € 22.243,33- fls.670/676 e 778.

Mas temos também o valor que a ré BB atribuiu ao recheio.

Na verdade, como anteriormente foi referido, não podemos olvidar que esta ré aceitou atribuir o valor de € 300.000,00 ao recheio quando celebrou o contrato de seguro com a autora.

Aliás, era esse o valor sobre o qual a autora pagava o respectivo prémio.

Por outro lado, temos que o orçamento de menor valor apresentado pela autora (€112.635,40) apenas contempla decoração, sendo que o orçamento de maior valor que juntou (€408.456,68) reporta-se ainda a revestimentos de madeira, balcão e equipamentos/maquinaria, incluindo pintura e limpeza.

Assim, sopesando os valores indicados e partindo do valor médio de € 300.000,00, aceite pela ré BB quando celebrou o contrato de seguro, aplicando uma depreciação de 20%, atendendo ao decurso do tempo e natural deterioração dos bens, entende-se por adequado fixar a indemnização a suportar pela ré BB - Companhia de Seguros, S.A., em € 240.000,00.


Já a Relação fundou a sua decisão na seguinte argumentação e raciocínio:

“Em todo o caso, contra o que a recorrente se insurge é o entendimento que vingou na sentença alegando que não é possível, com recurso a critérios de equidade, «condenar a ora Recorrente BB (…) na totalidade do capital seguro, ainda que com a aplicação de uma percentagem de depreciação de 20% sobre a totalidade de tal montante, decorrente do decurso do tempo sobre os bens seguros».

Concordamos embora não acompanhemos a recorrente na sua conclusão (como adiante se exporá).

A equidade é a justiça do possível e não a exacta ou, sequer, a desejada.

Nesta medida, não cumpre o critério a decisão que tenha por desfecho a fixação do valor da quase totalidade dos bens seguros.

No entanto, isto não significa que se tenha que avançar para um valor concreto indicado pela recorrente.

Com efeito, esta alega que o tribunal devia ter atendido ao valor por si indicado e que resulta da sua averiguação do sinistro, uma vez que a A. apenas apresentou orçamentos e não despesas. Acrescenta ainda que a Lei de Contrato de Seguro limita a indemnização (no seu art.º 128.º) ao dano decorrente do sinistro. Mas isto em nada contraria, sequer, o princípio geral do art.º 562.º (também contido no art.º 483.º, n.º 1) pois que deste decorre que a indemnização não pode ser superior ao dano. Se, porventura, o dano alegado é inferior ao que realmente se verificou, então caberia à recorrente ter provado isso mesmo.

Mas estas considerações, que se encontram nas alegações, não podem fazer esquecer que o tribunal não quantificou de maneira nenhuma os danos, ou seja, não deu por provados os valores propostos concretamente por ou outra parte. Claro que «a indemnização a fixar deveria reflectir um dano em concreto, apurado tão rigorosamente quanto possível» mas acontece que tal não foi, precisamente, possível.

Ou seja, continuamos presos, por assim dizer, ao critério da equidade.

E quanto à sua aplicação na sentença, já afirmamos que concordamos com a seguradora: não é possível arbitrar uma indemnização, com recurso à equidade, que equivalha à totalidade ou quase totalidade dos danos. Teria como consequência, como a recorrente nota, que a indemnização seria sempre tanto maior quanto maior fosse o valor do seguro.

Isto significa que a decisão deve ser alterada reduzindo-se o montante indemnizatório.

O valor do capital garantido não pode deixar se ser tido em consideração tal como também não pode (…) deixar de o ser o valor dos orçamentos apresentados pela A. A recorrente defende, como se viu, que são apenas orçamentos e estes são, acrescentamos nós, uma estimativa, uma avaliação. Não é certa mas, em termos normais, deve ser aceite como aproximada; tal como é uma avaliação também o montante avançado pela recorrente; embora lhe chame «valor dos prejuízos efectivamente averiguados e apurados pelas Rés», isto não está provado. O que está provado, e não deixa de ser curioso, é que a mesma empresa que fez a avaliação dos danos é a mesma que apresentou o orçamento de € 95.000,00.

Dentro dos vários orçamentos apresentados, há um (n.º 12; o agora referido) que engloba os diversos arranjos necessários, trabalhos de construção civil e substituição de equipamentos, limpeza, substituição do recheio e reparação das madeiras. Tal orçamento ascende a cerca de € 95.000.

E depois existem outros orçamentos bastantes díspares e que são os apresentados pela recorrente e pela recorrida (sendo que neste caso temos orçamentos de € 340.000,00).

E existe também o valor indicado pela recorrente (cerca de €13.000) que não pode deixar de ser tido em conta pois que é um valor por ela assumido e que, nesta medida, é um elemento em que a recorrente está disposta a ceder. No seu recurso, pede que a indemnização seja fixada naquele montante, descontada a franquia.

Por isso, entendemos que este valor será o limite mínimo, sendo o máximo o valor do menor orçamento apresentado pela recorrida. A diferença entre os dois valores (e note-se que as contas não têm que ser rigorosas) servirá apenas como elemento a ponderar e não como critério fixo.

Note-se que não estamos em condição de avaliar um dano certo mas sim de atribuir uma indemnização por um dano incerto. Ou seja, aquele orçamento de € 95.000 não pode ser o definitivo, o determinante, tal como o não pode ser a estimativa apresentada pela recorrente.

Com todo o risco que uma decisão destas comporta - risco de não ser exacta - entendemos que o valor de €50.000 será o justo.

Claro que nada disto é seguríssimo, certíssimo; mas também não o é o critério aqui em questão.”


Estando demonstrados todos os factos que evidenciem a existência da obrigação de indemnizar, nomeadamente, a verificação de danos, mas sendo impossível determinar com precisão o valor exato destes últimos, surge, como panaceia, a possibilidade instituída no nº 3 do art. 566º do CC, de o julgador, recorrendo a juízos de equidade, fixar o montante de indemnização devida, mas sempre dentro dos limites que tiver por provados.


Nas palavras de Vaz Serra[7]O poder de fixação equitativa do dano não é absoluto, pois o tribunal deve ponderar as circunstâncias do caso concreto e atender ao montante que normal ou ordinariamente terão atingido nessas circunstâncias os danos causados ao lesado.”


É o juízo de equidade formulado pela Relação sobre o valor adequado para ressarcir os danos sofridos que a recorrente discute, tanto mais que o uso de juízo da mesma natureza feito pela 1ª instância levara à fixação de valor substancialmente diverso.

Ao STJ, como se sabe, cabe apenas o julgamento da matéria de direito – art. 682, nº 1.[8]

Daí que este tribunal venha entendendo que lhe não cabe a determinação exata do quantitativo a arbitrar com base na equidade, já que esta se alicerça, “(…) não na aplicação de um critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto (…)

Na verdade, a substância do juízo de equidade, formulado pelas instâncias para obter o valor indemnizatório arbitrado ao lesado - podendo, porventura, revelar-se injusto ou inadequado às particularidades do caso concreto - não é, nem pode ser, quando considerado em si mesmo, «ilegal» ou violador do ordenamento jurídico objectivo, já que o apelo à equidade traduz precisamente a realização pelo julgador de juízos assentes em critérios não normativos, de modo a possibilitar ou corrigir uma rígida e estrita aplicação do direito às concretas e particulares situações da vida…”[9]

Por, isso “(…) não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», mas tão somente uma apreciação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se move o referido juízo equitativo a formular pelas instâncias face à individualidade do caso concreto (…)”[10].

E assim, “(…) mais do que discutir e reconstruir a substância do casuístico juízo de equidade que esteve na base da fixação pela Relação do valor indemnizatório arbitrado, em articulação incindível com a especificidade irrepetível do caso concreto, plasmada nas particularidades singulares da matéria de facto fixada, importa essencialmente verificar, num recurso de revista, se os critérios seguidos e que estão na base de tais valores indemnizatórios são passíveis de ser generalizados para todos os casos análogos – muito em particular, se os valores arbitrados se harmonizam com os critérios ou padrões que, numa jurisprudência actualista, devem sendo seguidos em situações análogas ou equiparáveis (…)”[11]


Vejamos então, tendo em conta os expostos limites de intervenção do STJ nesta matéria.

Não se reconhece razoabilidade ao critério – proposto pela recorrente, na esteira do que se entendeu em 1ª instância – que adota o valor do capital seguro – 300.000,00 euros - como matriz balizadora, como principal elemento de referência, do juízo de equidade a formular, pois que, reportando-se ele à totalidade do conteúdo/recheio do estabelecimento, se desconhece em absoluto em que concreta extensão o mesmo foi danificado pelo incêndio.

Não sendo tal elemento de desprezar, será ponderado, mas em paridade com outros, como é caso dos vários orçamentos trazidos aos autos pelas partes enquanto estimativa do custo implicado na reparação dos danos em causa e a quantia de € 13.000,00 que a ré Lusitânia aceitou pagar em sede de apelação, desta feita reconhecendo a existência de danos nesse valor. E, naturalmente, ter-se-á sempre presente a extensão dos danos abstratamente denunciados pelos factos provados e o valor que normalmente será adequado para ressarci-los.

Dos orçamentos apresentados pela autora – factos nºs 16 e B) 1º e 2º - que abrangem a totalidade dos trabalhos (construção civil, substituição dos equipamentos e decoração) o mais baixo ascende a € 340.568,00 e deve ser ponderado como ponto referencial máximo da indemnização adequada a ressarcir os danos de ocorrência certa mas de valor incerto.

Como referência do mínimo a arbitrar, dispomos do valor de € 13.000,00 que a recorrida defendeu, em sede de apelação, ser o adequado a ressarcir os danos que tem como apurados.

Mas a par destas balizas meramente norteadoras, dispomos de um outro elemento que, sendo embora igualmente incerto, visto à luz das regras da experiência comum, aponta com maior probabilidade o que, em termos de projeção, será de considerar como mais adequado para ressarcir os danos em causa.

Estamos a referir-nos ao orçamento referido no ponto 14 - que comtempla a realização da totalidade dos trabalhos (construção civil, substituição de equipamentos, limpeza, substituição de recheio e reparação de madeiras) -, encomendado pela própria recorrida a entidade por si escolhida e a quem deu credibilidade, onde se estima em cerca de 97.000,00 euros o custo da reparação desses mesmos danos.

Sem ser, por si só, determinante, cremos tratar-se do dado disponível que maior aptidão possui para, em termos de normalidade, nos indicar, dentro da incerteza naturalmente presente na formulação do juízo de equidade, o valor aproximado da indemnização a arbitrar.

Assim, temos como adequado fixar em € 90.000,00 a indemnização devida pela ré BB à autora.


Nestes termos, a revista procede parcialmente.


IV – Pelo exposto, julga-se a revista parcialmente procedente, e alterando-se o acórdão impugnado, vai a ré BB - Companhia de Seguros, S.A., condenada a pagar à autora a quantia de € 90.000,00, deduzida a respetiva franquia.

Custas a cargo de ambas as partes na proporção do respetivo decaimento.


Lisboa, 17.12.2019


Rosa Maria M. C. Ribeiro Coelho (Relatora)

Catarina Serra

João Bernardo

___________

[1] Enunciados nos nºs 10-12 dos factos julgados como provados na sentença proferida na ação declarativa a que o presente incidente corre por apenso.
[2] Diploma a que respeitam as normas doravante referidas sem menção de diferente proveniência.
[3] Em intolerável violação do espirito de síntese que é próprio da natureza das conclusões, enquanto resumo dos fundamentos pelos quais o recorrente pede a anulação ou a alteração da decisão recorrida – art. 639º, nº 1 do CPC
[4] Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2º, págs. 172 e 173.
[5] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 140 e Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, 2ª edição, vol. 2º, pág. 703.
[6] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I, pág. 737-8
[7] RLJ, Ano 113, pág. 328
[8] A este campo se reconduzindo igualmente a alteração do julgamento dos factos nos casos aludidos no art. 682º, nº 2 do CPC.
[9] Acórdão de 28.10.2010, proc. nº 72/06.7TBMTR.P1.S1, relator Cons. Lopes do Rego, acessível em www.dgsi.pt
[10] Acórdão de 1.7.2010, proc. 1148/07.6TVPRT.P1.S1, relator Cons. Lopes do Rego, acessível em www.dgsi.pt
[11]Acórdão de 22.2.2017, proc. 5808/12.1TBALM.L1.S1, relator Cons. Lopes do Rego, acessível em www.dgsi.pt