Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
23243/16.0T8SNT.L1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO MAGALHÃES
Descritores: PRAZO DE CADUCIDADE
DEFEITOS
DENÚNCIA
EMPREITADA
CONDOMÍNIO
TEMPESTIVIDADE
CONTESTAÇÃO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
PROVA DOCUMENTAL
PROVA TESTEMUNHAL
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
Data do Acordão: 06/04/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
A excepção da caducidade do direito de denúncia dos defeitos de um prédio deve ser invocada, tempestivamente, na contestação, sob pena de não poder ser conhecida em sede de recurso.
Decisão Texto Integral:

Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça:


*


Condomínio do Prédio da Rua Ribeiro de Carvalho, nºs 64 e 64-A, ... intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra L..., Lda., pedindo a condenação da ré a:

“a) (…) reparar e eliminar todos os defeitos de construção que supra se alegaram, no prazo máximo de seis meses;

b) Em alternativa ao pedido anterior (…) pagar ao A. o valor global correspondente ao custo efectivo da reparação e eliminação dos referidos defeitos, conforme se apurar na sua avaliação no decurso do processo, nos termos do art. 569º. do Cód Civil.

c) (…) pagar ao A. uma indemnização a quantificar pelo desvalor ou falta de qualidade do prédio, em razão dos alegados defeitos, que não possam de todo ser reparados e eliminados.”

Para tanto alegou, em síntese, que:

- A ré construiu e vendeu o prédio sito na Rua Ribeiro de Carvalho, n.°s 64, 64-A, ..., composto por oito frações, fazendo parte de cada uma delas a respetiva arrecadação no sótão e os lugares de estacionamento na cave ou garagem;

- o referido prédio possui graves defeitos de construção que afetam a sua estrutura e comprometem a sua utilidade e salubridade, e não possui as qualidades asseguradas, razão pela qual assiste à Autora o direito a exigir a eliminação dos vários defeitos ou, em alternativa, uma indemnização correspondente aos respetivos custos.

Citada, a ré contestou, invocando a excepção de caducidade do direito de exigir a reparação dos defeitos e reclamar indemnização, nos termos previstos no art. 1225º, nº 2 do CC, e impugnando parcialmente a factualidade invocada na petição inicial; concluindo pela improcedência da ação.

Notificado da contestação veio o autor, espontaneamente, apresentar novo articulado, pronunciando-se sobre a excepção de caducidade, e pugnando pela sua improcedência.

Apresentados os autos a despacho, decidiu o Juízo Local Cível de ... alterar o valor da causa e, em consequência julgar verificada a exceção de incompetência e determinar a remessa dos autos para o Juízo Central Cível da mesma localidade.

Recebidos os autos no Juízo Central Cível de ..., após uma tentativa de conciliação infrutífera, veio a ser proferida decisão, dispensando a realização de audiência prévia, e relegando a apreciação da excepção de caducidade para a sentença. Na mesma ocasião foi também proferido despacho identificando o objeto de litígio, enunciados os temas da prova, e admitindo os requerimentos probatórios.

Na instrução da causa prévia à realização da audiência final teve lugar uma prova pericial, que culminou com a apresentação do respetivo relatório, tendo os srs. peritos prestado por escrito os esclarecimentos solicitados pelas partes.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença julgando a excepção de caducidade procedente e, consequentemente improcedente a presente acção.

Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação, pedindo que a sentença fosse declarada nula, ou no mínimo, que se considerasse que a mesma violou o disposto no art. 33°, n° 4, da Lei 34/2004, de 29 de Julho, o que tudo impõe que seja substituída por outra decisão que declare tempestiva, bem como parcialmente procedente, por provada, a presente acção.

Foi proferido acórdão que decidiu nos seguintes termos:

“Pelo exposto, acordam os juízes nesta ...ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em:

a) Alterar a decisão sobre matéria de facto, nos termos expostos na fundamentação do presente acórdão;

b) Julgar a apelação parcialmente procedente, revogando, a sentença apelada, e condenando a apelada a eliminar/reparar os defeitos a que se reportam os pontos 5. a 15. dos factos provados ou, em alternativa, pagar ao autor a quantia de € 15.624,40.

Custas (na modalidade de encargos e custas de parte), pela apelada.”

Inconformada, recorreu de revista a ré que rematou o recurso com as seguintes conclusões:

“I - O Tribunal a Quo (Tribunal da Relação de Lisboa) na sequência da alteração da matéria de facto, deu como provados os seguintes factos:

(…)

II- O Tribunal a quo, julgou a apelação parcialmente procedente e revogou, a sentença apelada, e condenando a apelada a eliminar / reparar os defeitos a que se reportam os pontos 5. a 15. dos factos provados ou, em alternativa, pagar ao autor a quantia de € 15.624,40.

III– Não se entende como chegou o Tribunal a quo a este valor, atentos os valores defendidos no relatório de peritagem, e, porque os direitos do Recorrido estão caducados

IV A ata da assembleia geral de condóminos n.º 3, datada de 09.02.2013, junta aos autos, da sua ordem de trabalho consta:

Do ponto seis: a comunicação ao construtor legal representante da empresa L..., Lda., os defeitos de construção que estão visíveis e necessitam de reparação, como são, a empena lateral do prédio que está rachada provocando infiltração de humidade nas frações do rés-do-chão direito, do 2.º Esq. e do 3.º Esq.

Do ponto oito: reparação pelo construtor da mancha e infiltração que está no teto da garagem situada no parqueamento do 2.º Drtº.

Do ponto nove: a reparação pelo construtor L..., Lda. da mancha do teto do patamar das escadas junto à garagem

Do ponto dez: o isolamento sonoro dos canos de esgoto do rés-do-chão direito por parte do construtor, para eliminar o som ruidoso que os canos emitem quando os condóminos superiores utilizam o despejo de águas sanitárias produzindo ruídos no quarto do rés-do-chão drt..

Do ponto onze: o isolamento do teto da garagem junto ao portão que emite ruídos insuportáveis no quarto do 1.º Drt.º.

V- Da prova junta, S.M.O. o Tribunal a quo ignorou os documentos juntos pela Recorrente -Docs. N.ºs 3 a 6, que o direito à reparação dos defeitos reclamados pela condómina do ... do aludido prédio, foram feitos em 2013, e, a ação terá dado entrada a 14.07.2016, logo tais direitos estão caducados.

VI- Os defeitos enunciados já eram conhecidos do Autor e Recorrido pelo menos desde 2013, logo mostra-se caducado o direito de reclamar uma indemnização ou a reparação dos enunciados defeitos, conforme decorre do n.º 2 ao art.º 1225.º do Código Civil.

VII- A confirmar a caducidade do direito do Autor e Recorrido, estão as declarações da testemunha arrolada pelo Autor, AA, residente no ... do prédio dos autos, que declarou que (faixa 20210609105333_4016072_2871276): “Reside no prédio desde 2011”. “A infiltração no prédio da garagem já existia em 2013.”. “As estalactites existiam em 2013.”.

VIII- Acresce que os factos 5 a 15 resultaram provados da análise do teor do relatório pericial junto aos autos e da resposta maioritária dos peritos em relação à maioria dos quesitos e unânime em relação a alguns deles.

IX- Os factos 16, 17, 18 e 19 resultaram da análise dos documentos juntos aos autos como sejam a ata n.º 3 da Assembleia de Condóminos (cf. doc. de fls. 42 e ss.), emails/cartas enviadas à Recorrida (cf. docs. De fls. 45, 46v., 47v., 48v. e 53 e ss.).

X- A este respeito – do momento do aparecimento das situações reportadas – relevou ainda o depoimento das testemunhas Eng. BB (que elaborou a pedido do Recorrido o relatório junto aos autos) e AA. A primeira testemunha visitou o prédio em 2015 e referiu que em função do que viu à data é normal que aquelas mesmas situações se verificassem já em 2013 ou mesmo antes. A segunda reside no prédio desde 2011 e referiu que o problema das infiltrações se verifica desde o início, e outras remontam a 2013.

XI- Tratando-se de empreitada, a ação judicial deverá ser proposta no prazo de um ano a contar da recusa da aceitação da obra, da aceitação com reserva, da denúncia dos defeitos ou do reconhecimento da existência destes por parte do empreiteiro (art.º 1224.º, n.ºs 1 e 2 CC).

XII- Independentemente, deste prazo, a lei considera caducados os direitos se não exercidos dentro do prazo de dois anos a contar da entrega da obra (art.º 1224.º, n.º 2, CC).

XIII- A propositura da ação tem, perentoriamente, de ser intentada durante aquele espaço de tempo, podendo caducar antes do termo de garantia.

XIV- Estes prazos de garantia são, no direito português, prazos de caducidade, não só porque assim dispõem os artigos 1220º, n.º 1 e 1224º, n.º 1, mas também porque, nos casos em que a lei é omissa quanto à qualificação (artigo 1224º, n.º 2 CC), nos termos do artigo 298º, n.º 2 CC, na dúvida, os prazos presumem-se como sendo de caducidade.

XV- Os defeitos já haviam sido denunciados e existiam vertidos na ata n.º 3, da assembleia de condóminos de fevereiro de 2013, conforme documenta o Doc. n.º 2 junto com a contestação.

XVI- Atentas datas de denúncia dos defeitos pelo Recorrido, verifica-se que este ultrapassou o prazo de um ano fixado na lei para reclamar a indemnização e reparação junto do Recorrente, conforme decorre do n.º 2 do art.º 1225.º do Código Civil.

XVII- Tomando por base a ata de fevereiro de 2013, da assembleia de condóminos, que não pode ser ignorada, a denúncia dos defeitos pela condómina do ... por carta de 23.01.2015, e, de 06.02.2015, que a ação deu entrada a 14.07.2016, o direito do Recorrido à data da interposição da ação estava caducado.

XVIII- Logo, decorre que o direito do Recorrido relativamente ao ora Recorrente, caducou, caducidade que se alega com as legais consequências, pelo que, deve o Tribunal ad quem, revogar totalmente o acórdão do Tribunal á Quo e absolver o Recorrente do pedido.

Nestes termos direito e com o mui douto suprimento de V. Exªs. e em face de todo o supra exposto deve

a) O presente recurso de revista ser admitido por provado

E, em consequência,

b) Deve o Douto acórdão do Tribunal ad Quo (Tribunal da Relação de Lisboa), ser integralmente revogado e o Recorrente absolvido do pedido, atenta a exceção perentória de caducidade do direito à ação, nos termos e com os fundamentos supra alegados.

Contra-alegou o autor formulando, a final, as seguintes conclusões:

“01 - A Recorrente sustenta todas as suas conclusões na alegada caducidade do direito de acção, porquanto entende que a denúncia dos defeitos (de construção) em causa lhe foi feita muito para além do prazo de um ano após o conhecimento dos mesmos por parte do ora Recorrido.

02 - E logo conclui “que o direito do Recorrido relativamente ao ora Recorrente caducou, caducidade que se alega com as legais consequências, pelo que deve o Tribunal ad quem revogar totalmente o acórdão do Tribunal a quo e absolver o Recorrente do pedido”. (conclusão XVIII)

03 - A Recorrente alega que “da prova junta, S.M.O., o Tribunal a quo ignorou os documentos juntos pela Recorrente – docs. nºs. 3 a 6, que o direito à reparação dos defeitos reclamados pela condómina do ... do aludido prédio, foram feitos em 2013, e a acção terá dado entrada a 14.07.2016, logo tais direitos estão caducados”, (conclusão V).

04 - E mais refere que “os defeitos enunciados já eram conhecidos do Autor e Recorrido, pelo menos desde 2013, logo mostra-se caducado o direito de reclamar uma indemnização ou a reparação dos enunciados defeitos, conforme decorre do nº.2 do art. 1225º do Código Civil”, (conclusão VI).

05 - Ora, o que a Recorrente vem dizer é que o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa ignorou os documentos que ela (Recorrente) juntou aos autos, bem como desvalorizou os depoimentos das testemunhas AA e Eng. BB (ambas arroladas pelo ora Recorrido), e não relevou que “os factos 16, 17, 18 e 19 resultaram da análise dos documentos juntos aos autos”, tais como a ata nº.3 da assembleia de condóminos de fevereiro de 2013, e outros, tudo como se extrai das conclusões VII, IX, X, XV, e XVII.

06 - E no que respeita à quantia de € 15.624,40, em que foi condenada, a Recorrente ainda diz que “não se entende como chegou o Tribunal a quo a este valor, atentos os valores defendidos no relatório de peritagem, e porque os direitos do Recorrido estão caducados”, conclusões II e III

07 - A Recorrente, ao contrário do que se decidiu no douto Acórdão recorrido, entende que as provas produzidas nos autos impõem que se deva concluir pela procedência da alegada excepção da caducidade do direito de acção, em razão da denúncia dos enunciados defeitos lhe ter sido feita muito para além do prazo de um ano fixado no art. 1225º, nº.2, do Código Civil.

08 - A Recorrente não tem razão, e desde logo, porque não resultou provado que os defeitos enunciados nos pontos 5 a 15 do probatório, (Vd. Acórdão, ponto 3.2.2.2.4), “já eram conhecidos do Autor e Recorrido pelo menos desde 2013”, nem tal se extrai da referida ata nº.3 da Assembleia Geral de Condóminos, realizada em 09-02-2013.

09 - A circunstância alegada na conclusão VI não consta, nem resulta, dos factos provados, mas a Recorrente, de forma abusiva, e sem qualquer fundamento, pretende que se dê agora como assente tal facto, em razão do que refere nas suas conclusões VII, VIII, IX, e X.

10 - A Recorrente não pode ignorar a Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei nº.62/2013, de 26 de Agosto, que no seu art. 46º dispõe que “fora dos casos previstos na lei, o Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece de matéria de direito”.

11 - E neste sentido também se pronunciou o douto Acórdão do S.T.J., de 07/02/2017, onde se concluiu que “com princípio regra, a fixação dos factos materiais da causa, baseados na prova livremente apreciada pelo julgador nas instâncias não cabe no âmbito da revista”, e ainda que “o Supremo Tribunal de Justiça limita-se a aplicar aos factos definitivamente fixados pelo Tribunal recorrido o regime jurídico adequado”.

12 - E tanto basta para que se deva concluir pela manifesta improcedência das conclusões VI a X.

13 - A Recorrente, nesta fase, não pode ter a pretensão de querer ver modificada a factualidade que resultou provada, e muito menos, quando não evidencia a violação de qualquer norma reguladora da força dos meios de prova que cita nas suas conclusões III, IV, V, VII, VIII, IX, X, XV, e XVII.

14 - A Recorrente nunca se refere à existência de qualquer eventual erro na apreciação das provas, mas o que logo se observa é que formula a maioria das suas conclusões nesse sentido.

15 - Na verdade, toda a fundamentação da presente revista assenta na alegada desconsideração dos depoimentos de duas testemunhas e dos vários documentos que a Recorrente juntou aos autos, designadamente a ata nº. 3 da assembleia geral de condóminos, realizada em 09/02/2013.

16 - Ora, nesta parte, dispõe o art. 674º, nº. 3, do C.P.C., que “o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista”, o que logo impõe que o presente recurso nunca possa obter provimento.

17 - O douto Acórdão recorrido, no ponto 3.2.4, faz uma análise coerente e bem fundamentada quanto à questão da alegada caducidade do direito de acção, tendo concluído que a mesma não se verifica no caso concreto.

18 - Por outro lado, deve salientar-se que nem a douta sentença da Primeira Instância, nem o douto Acórdão recorrido se referem, em algum momento, ao que se mostra alegado na conclusão VI.

19 - Em ambos os casos, o prazo de caducidade que relevou para as decisões foi o de um ano para intentar a acção após a denúncia dos defeitos em causa, e não aquele outro, também de um ano para se proceder a tal denúncia após o conhecimento dos mesmos.

20 - Relativamente à denúncia dos mencionados defeitos pelo Recorrido à Recorrente, quer na douta Sentença da Primeira Instância, quer no douto Acórdão recorrido, sempre se considerou que a mesma ocorreu em 10/08/2015.

21 - A divergência das decisões relativamente à caducidade do direito de acção resulta de se ter dado como provado, no primeiro momento, que a acção (só) deu entrada em 09-12-2016, e no segundo, por se ter concluído que a acção “se considera proposta na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono, ou seja, em 17-07-2016”.

22 - A Recorrente não tece críticas à fundamentação do douto Acórdão recorrido, nem impugna a decisão relativa à alteração (aditamento) da matéria de facto, e apenas sustenta que “o direito do Recorrido à data da interposição da acção estava caducado”. (Vd. conclusão XVII).

23 - O douto Acórdão recorrido emendou a decisão da Primeira Instância, tendo procedido à alteração (aditamento) da matéria de facto, e em consequência, aplicou o regime jurídico adequado à factualidade que resultou provada.

24 - E assim, a douta decisão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, em termos de facto e de direito, mostra-se devidamente fundamentada, pelo que deverá ser confirmada.

Nestes termos, deverá negar-se provimento ao presente recurso de REVISTA, e assim, confirmar-se o douto Acórdão recorrido. (…) “

Cumpre decidir.

Estão provados os seguintes factos:

“1. A sociedade Ré construiu e vende o edifício sito na Rua Ribeiro de Carvalho n.°s 64 e 64-A, ..., concelho de ..., o qual é composto por 8 frações autónomas fazendo parte integrante de cada uma delas a respetiva arrecadação no sótão e lugares de estacionamento na cave ou garagem.

2.A cave ou garagem coletiva do prédio não foi individualizada como fração autónoma.

3. O prédio possui licença de utilização n.º ...56, emitida em 12-10-2010.

4. A entrega do prédio ao condomínio ocorreu no ano de 2012.

5. Existem infiltrações de origem pluvial na parede norte da garagem e na laje do teto da garagem.

6. Essas infiltrações indiciam impermeabilização deficiente na zona do ralo do terraço do... e junto ao vértice norte poente.

7. Na parede norte da garagem as humidades existentes derivam de fenómenos de capilaridade.

8. No teto da garagem correspondente ao terraço do..., junto ao ralo de drenagem da laje observam-se algumas estalactites.

9. Na parede sul da garagem existe reboco solto/descolado.

10. Na base das paredes da bomba da escada existe humidade resultante de capilarização.

11. A parede lateral esquerda da cave aparenta ser de alvenaria tradicional em tijolo cerâmico revestido de reboco.

12. A passagem do coletor pelo teto do quarto apenas se verifica no ..., sob o 1. ° andar esquerdo.

13. O ruído provocado, aquando das descargas, no interior do... deve-se a um inadequado isolamento das tubagens.

14. Existem algumas discrepâncias na colocação dos tubos de queda e coletores em relação ao projeto, não sendo estas discrepâncias causa do ruido.

15. Verifica-se uma deficiente impermeabilização da laje do terraço do..., fenómenos de capilaridade nas paredes periféricas da cave, nas paredes da caixa da escada e nos pilares interiores.

16. Da ata numero 3 da Assembleia Geral de Condóminos, realizada em 09-02-2013 consta no ponto seis o seguinte: “comunicação ao construtor legal representante da empresa L..., Lda. dos defeitos de construção que estão visíveis e necessitam de reparação, como são a empena lateral do prédio que está rachada provocando infiltração de humidade nas frações do..., ... e...”, no ponto oito “reparação pelo construtor da mancha e infiltração que está no teto da garagem situado no parqueamento do 2.° dto.”, no ponto nove “ reparação pelo construtor L..., Lda. da mancha do teto do patamar das escadas junto à garagem”, ponto 10 “isolamento sonoro dos canos de esgoto do ..., por parte do construtor, para eliminar o som ruidoso que os canos emitem quando os condóminos superiores utilizam o despejo de águas sanitárias, produzindo ruídos insuportáveis no quarto do r/c direito”.

17. Por carta de 23 de janeiro de 2015 endereçada pela condómina residente no r/c direito à Ré, constante de fls. 45 e que aqui se dá por integralmente reproduzida, reportava, entre outros, mau isolamento da canalização proveniente das suites dos andares superiores, canalização que se encontra no teto do quarto principal, tapada com uma caixa de pladur, a qual não tem qualquer tipo de insonorização ou isolamento acústico.

18. No dia 6 de fevereiro de 2015 a mesma condómina enviou à Ré carta de igual teor.

19. A 10 de Agosto de 2015 a Dra. CC, na qualidade de advogada da Administração do Condomínio enviou à Ré o email e a carta constantes de fls. 52 v. e ss. e que aqui se dão por integralmente reproduzidos e na qual refere: - várias infiltrações de água na fachada lateral, escada de acesso e garagem coletiva (na qual existem dois tipos distintos de infiltração: gravítico e por percolação); -isolamento defeituoso do terraço; - teto da caixa da escada com mau acabamento, pintura não executada de acordo com a norma de bem pintar; - parede lateral esquerda da cave com sinais de degradação, devido à humidade por via das infiltrações de água. Esta parede de acordo com relatório, não foi construída de acordo com o projeto de estabilidade aprovado pela Câmara Municipal ...; a parede construída não é de betão armado como consta do projeto, não havendo qualquer referência de alteração àquele projeto, no livro de obra, ou qualquer assunção de responsabilidade do técnico responsável pela construção; - rede de drenagem de águas residuais domésticas não está conforme o projeto.

20. Em 14-07-2016 o autor apresentou nos serviços do Instituto da Segurança Social o requerimento/impresso cuja cópia se acha a fls. 13 e v., no qual, nomeadamente, requer àquele instituto a concessão do “benefício de Apoio Judiciário”, assinalando para o efeito as quadrículas relativas às modalidades de “Dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo” e “Nomeação e pagamento da compensação de patrono”.

21. No mesmo requerimento/impresso referido em 20., o autor inscreveu os seguintes dizeres manuscritos, adiante dos dizeres impressos “Propor ação -tipo de ação”: “Acção Condenação Construtora Edifício”.

22. O Instituto da Segurança Social enviou ao réu o ofício com o nº...70, de 10-11-2016, comunicando-lhe que “o seu pedido foi DEFERIDO por despacho proferido em 07-11-2016 na(s) modalidade(s) de Dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, Nomeação e pagamento da compensação de patrono, por se ter comprovado a insuficiência económica.”

23. O Conselho Regional da Ordem dos Advogados enviou ao réu o ofício datado de 07-11-2016, cuja cópia se acha a fls. 14 v., com o seguinte teor:

“Na sequência do requerimento de protecção jurídica formulado por V.Ex.a, cuja referência se indica em epígrafe, de acordo com a Lei 34/2004, de 29 de Julho com as alterações introduzidas pela Lei 47/2007, de 28 de Agosto, informa-se que o seu pedido foi DEFERIDO por despacho proferido em 07-11-2016 na (s) modalidade (s) de Dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, Nomeação e pagamento da compensação de patrono, por se ter comprovado a insuficiência económica invocada.

Na mesma data, foi diligenciado junto da Ordem dos Advogados, no sentido de esta proceder à nomeação oficiosa do patrono, conforme solicitado, devendo V.Ex.a prestar a este profissional toda a sua colaboração. O Apoio Judiciário requerido destina-se: - Acção declarativa de Condenação - Propôr Acção Com os melhores cumprimentos,”.

24. A petição inicial dos presentes autos deu entrada no Tribunal em 10-12-2016, e foi subscrita pelo Sr. Dr. DD.

25. O custo da reparação dos aspetos descritos em 5. a 15. foi calculado em € 15.624,40, acrescendo IVA.”

Foram dados como não provados os seguintes factos:

a) que o edifício possua graves defeitos de construção que afetem a sua própria estrutura e comprometam a sua utilidade e salubridade.

b) que no prédio existam vários locais com infiltrações de águas residuais exteriores;

c) que a falta de isolamento seja visível em toda a garagem nas paredes junto ao chão.

d) que as estalactites sejam visíveis em todo o teto da garagem;

e) sem prejuízo do que resultou provado em 9., que existam várias quedas de reboco apodrecido em resultado de muitas infiltrações;

f) que o teto da caixa da escada se encontre em mau estado de acabamento, com uma pintura mal executada e inacabada;

g) que a parede lateral esquerda da cave não tenha sido construída de acordo com o projeto de estabilidade aprovado pela Câmara Municipal ...;

h) que de acordo com o projeto a parede referida em 11. devesse ser de betão armado.

i) que a parede existente referida em 11. Coloque em causa a estabilidade e estrutura do próprio edifício.

j) sem prejuízo do que resultou provado em 12., que a rede de drenagem das águas residuais domésticas do edifício não esteja conforme o projeto uma vez que no rés do chão existem coletores no teto das frações.

k) que a colocação indevida de tais coletores provoque um exagerado ruido no interior das habitações.

l) sem prejuízo do referido em 5, 7, 8, 9 e 10, que as partes comuns do edifício não tenham a qualidade mínima necessária e esperada de um prédio.

m) que se verifiquem desconformidades significativas entre o construído e o projetado que ponha em causa a estrutura e segurança do edifício.

O Direito:

O tribunal considerou improcedente a excepção de caducidade do prazo de um ano a contar da denúncia, arguida com fundamento no art. 1225º, nº 2 do CC.

Assim, considerou que não chegou a decorrer um ano entre a denúncia consubstanciada na carta que a administração do condomínio enviou á ré em 10.8.2015 e a data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono, ou seja, em 17.7.2016, data em que a acção se deve considera proposta, nos termos do nº 4 do art. 33º da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, com as alterações introduzidas pela Lei nº 47/2007, de 29 de Julho.

Argumenta a recorrente que dos depoimentos das testemunhas eng. BB (que visitou o prédio em 2015) e AA (que reside no prédio desde 2011), do teor do relatório pericial (que está na base dos factos 5 a 15), dos documentos como a acta de 9.12.2013 e de emails/ cartas (que estão na base dos factos 16 a 19) resulta que os defeitos já eram conhecidos pelo autor desde 2013, que os mesmos já haviam sido denunciados e que tinha já decorrido não apenas o prazo de 1 ano a contar da denúncia como o prazo de 2 anos a contar da entrega (art. 1224º, nºs 1 e 2 do CPC), sendo que, atenta a data da denúncia dos defeitos, se verifica que o autor ultrapassou o prazo de um ano fixado no nº 2 do art. 1225º do CC.

Porém, e salvo o devido respeito, a recorrente labora em vários equívocos.

Um deles reside, desde logo, na circunstância de invocar documentos e depoimentos de testemunhas para fazer prova do conhecimento pelo autor dos defeitos e da sua denúncia. Ora, as provas não são factos, têm apenas por função a demonstração da realidade dos factos, não podem substituir-se aos factos.

Além disso, está vedado a este Supremo considerar matéria de facto diferente da fixada nas instâncias, a não ser que se verifique a ofensa de alguma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova ou que fixe a força de determinado meio de prova, circunstâncias que não foram invocadas pela recorrente.

Também não se percebe a invocação do documento da acta quando o teor desta se encontra dado como provado no facto 16.

Outro dos equívocos em que a recorrente labora tem a ver com os diferentes prazos de caducidade.

É que tendo invocado na contestação a excepção de caducidade limitada ao direito de exigir a reparação dos defeitos e reclamar indemnização, nos termos previstos no art. 1225º, nº 2 do CC, a recorrente vem invocar, também, no recurso, o art. 1224º do CC.

Porém, a caducidade tem de ser invocada tempestivamente, ou seja, na contestação (arts. 333º, nº 2 e 303º do CC e art. 573º, nº 1 do CPC; Ac. STJ de 17.11.2016, proc. 861/13.3TTVIS.C1.S2, em www.dgsi.pt).

Como assim, não pode o recorrente invocar em sede de recurso a caducidade do art. 1224º do CC.

Resta, assim, a invocada caducidade do direito de indemnização, não podendo ser apreciada a caducidade do direito de denúncia, que não foi tempestivamente invocada.

Ora, apreciando o caso sub judice, verifica-se que a denúncia não se verificou, como parece pretender a recorrente, na data da acta do condomínio, em 2013. A recorrente não fez qualquer prova de que nessa data o autor lhe tenha comunicado quaisquer defeitos. Com efeito, apenas se prova que os defeitos foram comunicados pela advogada da administração do condomínio em 10 de Agosto de 2015.

Improcede, assim, a questão da caducidade.

A recorrente também se insurge contra o valor da indemnização mas não apresenta qualquer argumento. E não havendo fundamentos de direito, também o recurso, nesta parte, não pode deixar de improceder.

Sumário (art. 663º, nº 7 do CPC):

“A excepção da caducidade do direito de denúncia dos defeitos de um prédio deve ser invocada, tempestivamente, na contestação, sob pena de não poder ser conhecida em sede de recurso”.

Pelo exposto, acorda-se em negar a revista e confirmar o acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.


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Lisboa, 4 de Junho de 2024

António Magalhães (Relator)

Jorge Arcanjo

Manuel Aguiar Pereira