Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
56/22.5PESTB.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: CELSO MANATA
Descritores: RECURSO PER SALTUM
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
IMPROCEDÊNCIA
Data do Acordão: 10/31/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário :
I - O DL n.º 15/93, de 22 de janeiro contem, três normas que se preveem e punem o tráfico de estupefacientes. Assim e usando a terminologia adotada por Jescheck, o art. 21.º consubstancia o denominado “delito base”, o art. 24.º o deligo agravado e o art. 25.º o delito privilegiado.

II - Assim e para que o agente possa ser condenado pelo crime de tráfico de menor gravidade, é necessário que a ilicitude se mostre consideravelmente diminuída, o que deve ser aferido em função de uma avaliação global dos factos apurados.

III - Tendo o agente atuado com dolo direto, sendo a substancia traficada cocaína e a duração da conduta significativa (mais de 2 anos), tendo-se apurado que a droga foi vendida a um elevado numero de compradores, sendo as necessidades de prevenção geral muito elevadas e as necessidades de prevenção especial muito significativas, (decorrentes, designadamente de o agente não ter outro meio de subsistência, apenas ter parado a conduta por ter sido preso e contar com diversos antecedentes criminais – v-g- uma condenação a 24-09-2013 pela prática, em 2010, de crime de tráfico de droga p. e p. pelo art. 21.º do DL n.º 15/93, de 22-01, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão), não se mostra excessiva a aplicação da pena de 6 anos de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, de 22 de janeiro.
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

Acordam, em conferência, na 5ª secção do Supremo Tribunal de Justiça:

A - Relatório

A.1. A decisão recorrida

Através de acórdão proferido a 27 de maio de 2024, pelo Juízo Central Criminal de ..., AA foi condenado, como autor material e na forma consumada da prática do crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-B anexa, na pena de 6 (seis) anos de prisão efetiva

A.2. O recurso

O arguido não se conformou com essa decisão, pelo que dela recorreu para o Tribunal da Relação de Évora.

Contudo, no despacho que admitiu o recurso, aquele Tribunal considerou que, competente para o apreciar, era este Supremo Tribunal de Justiça pelo que o remeteu para este Alto Tribunal.

O arguido termina as suas motivações com as seguintes conclusões:

“EM CONCLUSÃO:

Emerge o presente recurso da discordância em relação ao acórdão, douto aliás, tirado nos autos que condenou o recorrente na pena de 6 (seis) anos de prisão, pela prática de um crime p. e p. pelo artº 21º do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01.

As razões de discordância com a douta decisão sob recurso são exclusivamente de direito e prendem-se, por um lado, com o entendimento a matéria de facto dada como assente é subsumível ao artº 25º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro, e, por outro, independentemente desta, e sem prescindir, de que a pena aplicada é, em qualquer circunstância, exagerada.

I - Da subsunção da matéria de facto provada ao artº 25º do D.L. 15/93, de 22.01

a) Erradamente o tribunal a quo entendeu subsumir a matéria de facto provada ao tipo do artº 21º do D.L. 15/93, de 22.01.

b) Na verdade, cotejada a factualidade apurada, com o crime pelo qual o recorrente vinha acusado nos autos, temos que o mesmo praticou actos subsumíveis ao referido tipo objectivo, o que não implica que deva ser punido em conformidade com essa qualificação jurídica.

c) Com efeito, a al. a) do artº 25º, do D.L. 15/93 determina que pratica o crime de tráfico de menor gravidade quem, actuando nos moldes previstos no artº 21º do mesmo diploma legal (ou seja, quem sem para tal se encontrar autorizado (. . .) ilicitamente detiver (. . .) substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III) desde que a ilicitude do facto se mostre consideravelmente diminuída, designadamente tendo em conta os meios utilizados, a modalidade ou circunstâncias da acção, a quantidade ou qualidade das plantas, substâncias ou preparações;

d) No caso dos autos, provando-se embora a detenção do aludido produto estupefaciente, e a sua venda nos moldes referidos, (por isso, com a introdução do produto estupefaciente na cadeia de consumo), apesar de a quantidade de produto apreendida já não ser irrelevante, ela não se encontra no patamar quantitativo da que é dominada pelos "verdadeiros traficantes", que auferem os significativos proventos económicos que apontam esta actividade, como uma das mais rentáveis, a nível internacional.

e) E o mesmo se diga quanto às vendas apuradas, que traduzem a multiplicidade de pequenas transacções que caracterizam o "pequeno tráfico", também chamado "tráfico de rua" (pois que quando o tráfico já detém algum relevo, este organiza-se em poucas e rentáveis transacções), em que os actos são praticados mais ou menos "à vista", com o inerente risco para si o próprio;

f) Em boa verdade, a conduta do recorrente apurada nos autos resulta praticada com organização de meios que se patenteia como incipiente, não se lhe encontrando qualquer actuação de dominância organizada, em que o arguido, designadamente, se resguarde por detrás de intermediários que não o conheçam, colocando-se a cobro de riscos, como sucede com os "verdadeiros traficantes", a que se dirige a previsão contida no artigo 21° do citado decreto-lei;

g) Razões pelas quais, ponderadas as circunstâncias referidas, deve concluir-se pela sensível diminuição da ilicitude do facto, a que alude o citado artigo 25° (no seguimento, aliás, da mesma tendência jurisprudencial, que reserva cada vez mais a aplicação do artigo 21° para situações que se poderão denominar de tráfico "de relevo", revelador de alguma elaboração - que não incluídas nas previstas pelo artº 24° "idem" - e não de condutas que se inscrevem num patamar residual do respectivo "nicho de mercado").

h) Assim, uma correcta apreciação da matéria der facto provada e a melhor interpretação dos artigos 21º e 25º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro impõe a subsunção daquela ao tipo do referido artº 25º, al. a) do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro pelo qual o arguido deve ser condenado, devendo fixar-se a pena último terço da moldura penal abstractamente aplicável.

Por cautela e sem prescindir,

i)

II Da medida da pena

j) Muito embora o recorrente esteja consciente da forte necessidade de se punir com rigor e uniformidade o tráfico de estupefacientes entende que a pena que lhe foi aplicada, no caso concreto, é demasiado severa.

k) A pena concreta tem como finalidade principal ser um remédio que, não pondo entre parêntesis a censura do facto, potencie a ressocialização do delinquente.

l) O desiderato da ressocialização, tendo de ser avaliado em concreto, não pode deixar de ter como parâmetro o inconveniente maléfico de uma longa separação do delinquente da comunidade natal que em nada contribui para a respectiva reintegração social posterior.

m) Em boa verdade, o tribunal a quo errou na apreciação dos factos, razão pela qual fez uma errada subsunção dos mesmos à norma do tipo p. e p. artº 21º do D.L. 15/93, de 22.01.

n) Independentemente disso na hora de determinar a medida da pena errou na interpretação e aplicação dos comandos dos artigos 21º do D.L. 15/93, de 22.01 e 71º do Código Penal.

o) Na verdade, na ponderação o tribunal a quo errou na decisão de aplicar ao arguido a pena de 6 (seis) anos de prisão, ainda que esta se situe no primeiro terço da moldura abstractamente aplicável.

p) A verdade é que uma correcta apreciação da matéria de facto dada como assente e a melhor interpretação e aplicação das normas aplicáveis, mormente do artº 71º do Código Penal, impõem a fixação da pena próxima do mínimo legal da moldura penal abstractamente aplicável, ainda ligeiramente acima da mesma, mais concretamente em 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.

q) Tal, é o que, sem prejuízo da diferente qualificação jurídica dos factos como defendeu supra, resulta de uma correcta apreciação dos factos e a melhor interpretação do artº. 21º do D.L. 15/93, de 22.01 e do artº 71º do Código Penal, coisa que, em última instância, o douto Tribunal a quo não fez.

* * *

O acórdão recorrido violou por erro de interpretação e aplicação o disposto nas disposições legais supra citadas.

Em suma:

- deve revogar-se o acórdão recorrido e substituí-lo por outro que, fazendo uma correcta apreciação da matéria der facto provada e a melhor interpretação dos artigos 21º e 25º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro, conclua pela subsunção daquela ao tipo do referido artº 25º, al. a) do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro e, em consequência, o recorrente em pena que deve fixar-se no último terço da moldura penal abstractamente aplicável, concretamente em 4 (quatro) anos de prisão;

ou, quando assim se não entenda, por cautela e sem prescindir,

- deve revogar-se o acórdão recorrido e substituí-lo por outro que faça correcta uma apreciação da matéria de facto dada como assente e a melhor interpretação e aplicação das normas aplicáveis, mormente do artº 71º do Código Penal e do artº 21º do D.L. nº 15/93, e condene o recorrente numa pena próxima do mínimo legal da moldura penal abstractamente aplicável, ainda ligeiramente acima da mesma, mais concretamente em 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.”

A.3. Resposta do Ministério Público

A propósito do recurso acima aludido foi apresentada, no Juízo Central referenciado, resposta do Ministério Público, na qual se concluiu da seguinte forma:

III – CONCLUSÕES:

1ª – Para uma correcta subsunção jurídico-penal dos factos julgados provados no acórdão assumempreponderânciadecisivaoperíodotemporaljáassazexpressivodurante o qual a conduta delituosa foi desenvolvida (mais de dois anos, apenas cessando com a detenção do Recorrente, seu interrogatório e sujeição à medida de coacção de prisão preventiva), o intuito meramente lucrativo desta (inexistem evidências de que o Recorrente fosse ele próprio consumidor de estupefacientes) e a natureza da substância estupefaciente vendida e detida para venda (cocaína, incluída no grupo das usualmente denominadas “drogas duras”);

2ª – Nas sobreditas circunstâncias (e a despeito da falta de sofisticação da actividade de tráfico e da ausência de sinais de venda, a cada interessado, de quantidade de estupefaciente sensivelmente superior à necessária para o respectivo consumo individual), não é possível concluir que a ilicitude da conduta do Recorrente se mostra diminuída nem, muito menos, consideravelmente diminuída por forma a subsumi-la ao crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p. e p. pelo artº 25º a) do D.L. nº 15/93 de 22/01;

3ª – Assim, ao condenar o Recorrente pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º nº 1 do D.L. nº 15/93 de 22/01, o tribunal fez adequada aplicação do direito aos factos dados como assentes;

4ª – São consabidamente fortíssimas as exigências de prevenção geral do crime de tráfico de estupefacientes;

5ª– Mostram-se igualmente muito acentuadas as necessidades de prevenção especial, dada a pretérita condenação do Recorrente em duas penas de prisão efectiva: a primeira pela prática de um crime de homicídio na forma tentada e um crime de ofensa à integridade física qualificada na forma consumada e a segunda pelo cometimento de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artº 21º nº 1 do D.L. nº 15/93 de 22/01 (esta última, declarada extinta com efeitos a 1 de Dezembro de 2016);

6ª – Mesmo assim, a pena de prisão foi fixada ainda no primeiro terço da respectiva moldura abstracta, a demonstrar que na sua determinação concreta foram devidamente valoradas todas as circunstâncias susceptíveis de favorecer o Recorrente;

7ª – A pena de seis anos de prisão concretamente cominada ao Recorrente deverá ser mantida, por não deixar transparecer violação dos critérios contemplados no artº 71º nºs 1 e 2 do Código Penal, nem desconsideração das finalidades das penas, consagradas no artº 40º nº 1 do mesmo compêndio normativo.”

A.4. Parecer do Ministério Público neste Supremo Tribunal de Justiça

Neste Supremo Tribunal de Justiça o Digníssimo Procurador-Geral-Adjunto acompanhou a posição da sua Colega e concluiu da seguinte forma:

Em face da questão-de-facto revelada, o arguido preencheu, pelo seu comportamento, o tipo-de-ilícito de tráfico de estupefacientes p. e p. na disposição do art. 21º/1 do DL-15/93, de 22/01, com referência à Tabela I-A anexa, e não na do referido art. 25º do mesmo diploma legal;

O tribunal “a quo”, ao aplicar a pena, apreendeu e valorou devidamente a natureza e gravidade do facto-crime e a personalidade do arguido, na sua relação dialéctica e expressão ético-social, aplicando uma sanção que não se afastou expressivamente do seu limite mínimo abstracto.

A.5. Contraditório

Devidamente notificado nos termos do disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, o recorrente não apresentou qualquer resposta

* * *

Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

B - Fundamentação

B.1. âmbito do recurso

O âmbito do recurso delimita-se, como já atrás se referiu, pelas conclusões do recorrente (artigos 402º, 403º e 412º do Código de Processo Penal) sem prejuízo, se necessário à sua boa decisão, da competência do Supremo Tribunal de Justiça para, oficiosamente, conhecer dos vícios da decisão recorrida, a que se refere o artigo 410º, nº 2, do mesmo diploma legal, (acórdão de fixação de jurisprudência nº 7/95 in D.R. I Série de 28 de dezembro de 1995), de nulidades não sanadas (nº 3 do aludido artigo 410º) e de nulidades da sentença ( artigo 379º, nº do Código de Processo Penal).

In casu, são duas as questões colocadas a este Tribunal:

• A qualificação jurídica dos factos apurados (que o recorrente entende serem subsumíveis ao crime de tráfico de menor gravidade, previsto e punível pelo artigo 25º do Dec. Lei 15/93, de 22de janeiro;

• A medida da pena (que o arguido considera excessiva e pede que seja reduzida a 4 anos e 6 meses de prisão)

B.2. Matéria de facto dada como provada e não provada

Para proceder a essa apreciação importa, antes de mais consignar a matéria de facto dada como provada e que serviu de suporte à condenação pela prática do crime de tráfico de estupefacientes previsto e punível pelo artigo 21º do diploma acima referido e a fixação da pena em 6 anos de prisão.

Assim, foi dada como provada e não provada a seguinte matéria de facto:

“III.I. Factos Provados:

Da discussão da causa, com relevo para a decisão da mesma, resultaram provados os seguintes factos:

Advenientes da(s) acusação(ões) pública(s):

Processo principal (5../22):

1. O arguido AA, desde, pelo menos, o inicio do ano de 2021 até 24/07/2023 se dedicou, ininterruptamente, à venda direta de produto estupefaciente, concretamente cocaína, a terceiros toxicodependentes, ou nas imediações de sua residência ou mesmo no interior desta, sita em Rua....

2. Era através da venda de produto estupefaciente que o arguido AA se sustentava, bem como ao seu agregado familiar, sendo, em grande parte do segmento temporal a que se reportam os autos, a sua única fonte de rendimento.

3. Em regra, o arguido AA recebia contactos telefónicos dos seus clientes/ consumidores, marcando encontros com estes para a entrega e recebimento do dinheiro nas ruas próximas de sua residência ou no interior desta ou do prédio onde reside.

4. O arguido detinha cocaína com vários graus de pureza, que vendia a diferentes preços, consoante lhe era pedido pelos compradores, sendo o produto mais puro também mais caro.

5. O arguido por várias vezes deslocava-se ainda junto ao café “A...”, junto à Farmácia..., e também se deslocava à residência de consumidores que o contactam para o efeito.

Concretizando:

6. No dia 14/10/2022, entre as 16h28m. e as 16h58m., o arguido AA, junto à sua residência, recebeu dois dos seus clientes/consumidores aos quais entregou produto estupefaciente e recebeu, em troca, dinheiro, sendo o primeiro BB, condutor do motociclo com a matrícula ..-..-QC, e o segundo o condutor do veículo automóvel de marca Ford, modelo ..., com a matrícula ..-..-JD.

7. No dia 22/11/2022, às 15h26m., CC, fazendo uso do seu veículo automóvel de marca Renault, modelo..., com a matrícula ..-LS-.., dirigiu-se à residência do arguido AA, e este entregou-lhe três pequenos cartuchos de cocaína como peso liquido total de 0,582 gramas com o grau de pureza de 33,4% correspondente a seis doses, recebendo em troca dinheiro.

8. No dia 07/03/2023, às 10h55m., em frente à sua residência, o arguido AA entregou ao seu cliente/consumidor BB, que ali se deslocou no veiculo de matricula ..-PU-.., cocaína com o peso liquido de 0,411 gramas, recebendo em troca quantia monetária não apurada.

9. No dia 10/03/2023, o arguido AA entregou a BB, que se dirigiu à sua residência, uma quantidade não concretamente apurada de cocaína, recebendo em troca dinheiro.

10. No mesmo dia, pelas 10h53m, o arguido AA entregou produto estupefaciente a um consumidor não identificado que se deslocou à sua residência, recebendo em troca dinheiro.

11. No mesmo dia, cerca das 11h05m., o arguido AA saiu de sua residência e foi ao encontro do seu cliente/consumidor DD, que se encontrava no interior do veículo automóvel de marca Mercedes-Benz, modelo ..., cinzento, com a matrícula ..-DM-.., estacionado em frente àquela, entregou-lhe uma quantidade não concretamente apurada de cocaína e recebeu, em troca, dinheiro.

12. No dia 13/03/2023, pelas 18h57m, o arguido entregou produto estupefaciente a consumidor não identificado com o telefone ...07 tendo-se encontrado com o mesmo na churrasqueira denominada “F...” sita perto da sua residência, recebendo em troca dinheiro.

13. No dia 14/03/2023, pelas 7h21m, o arguido entregou produto estupefaciente a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, recebendo em troca dinheiro.

14. No dia 14/03/2023, pelas 13h04m, o arguido entregou cocaína a DD com o telefone ...91 que para o efeito se deslocou à sua residência, recebendo em troca dinheiro.

15. No dia 15/03/2023, pelas 11h28m, o arguido entregou cocaína a DD com o telefone ...91 que para o efeito se deslocou à sua residência e que o contactou previamente por telefone, recebendo em troca dinheiro.

16. No dia 15/03/2023, pelas 11h45m, o arguido entregou produto estupefaciente a EE, com o telefone ...27, que para o efeito se deslocou à sua residência, após prévio contacto telefónico, recebendo em troca dinheiro.

17. No dia 15/03/2023, pelas 14h11m, o arguido entregou produto estupefaciente a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, que o contactou previamente por telefone, recebendo em troca dinheiro.

18. No dia 16/03/2023, cerca das 15h.51m., o arguido AA saiu da sua residência, dirigiu-se ao veículo automóvel de marca Peugeot, modelo..., com a matrícula ..-UD-.., utilizado pela sua companheira, FF, abriu o porta bagagens, retirou de dentro deste um saco de pequenas dimensões e regressou, imediatamente e em passo acelerado, para a sua habitação.

19. Passados breves minutos, o arguido saiu da sua residência e deslocou-se para as traseiras do café “ A...”, sito junto da sua residência, para ai proceder à venda, como habitual, de produto estupefaciente cocaína a consumidores que o procurassem para o efeito.

20. Assim, nesse dia, às 16h05m, o arguido AA entregou uma quantidade não concretamente apurada de cocaína, recebendo em troca dinheiro, a DD, que ali se deslocou ao encontro do arguido fazendo-se transportar no veiculo de matricula ..-DM-...

21. No dia 18/03/2023, pelas 5h56m, o arguido entregou cocaína a GG, titular do telefone ...00, que para o efeito se deslocou à sua residência, que o contactou previamente por telefone, recebendo em troca dinheiro.

22. No dia 24/03/2023, pelas 19h27m, o arguido entregou produto estupefaciente a consumidor não identificado com o telefone ...79, que o contactou previamente por telefone, tendo combinado encontro nas Bombas de Combustível da BP, recebendo em troca dinheiro.

23. No dia 26/03/2023, pelas 17h29m, o arguido entregou produto estupefaciente a consumidor não identificado, com o telefone ...61, que para o efeito se deslocou à sua residência, recebendo em troca dinheiro.

24. No dia 27/03/2023, pelas 09h56m, o arguido entregou produto estupefaciente cocaína a BB, com o telefone ...91, que para o efeito se deslocou à sua residência, que o contactou previamente por telefone, recebendo em troca dinheiro.

25. No dia 29/03/2023, pelas 9h38m, o arguido entregou um grama de cocaína a consumidor não identificado, utilizador do telefone ...30, que o contactou previamente por telefone, tendo combinado encontro junto da … o “F...”, sita na Rua ..., em ..., recebendo em troca dinheiro.

26. No dia 30/03/2023, pelas 13h22m, o arguido entregou produto estupefaciente cocaína a consumidor não identificado com o telefone ..26 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

27. No dia 30/03/2023, pelas 19h40m, o arguido entregou produto estupefaciente cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

28. No dia 02/04/2023, pelas 17h41m, o arguido entregou produto estupefaciente cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

29. No dia 04/04/2023, pelas 14h41m, o arguido entregou produto estupefaciente cocaína a HH com o telefone ...08 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

30. No dia 07/04/2023, pelas 18h37m, o arguido entregou produto estupefaciente cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...15 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

31. No dia 09/04/2023, pelas 18h45m, o arguido entregou produto estupefaciente cocaína a II com o telefone ...91, tendo-se deslocado à residência desta, recebendo em troca dinheiro.

32. No dia 12/04/2023, cerca das 10h.01m., e mediante dois contactos telefónicos prévios, o consumidor BB dirigiu-se à residência do arguido AA, local onde este lhe entregou uma quantidade não concretamente apurada de cocaína e recebeu, em troca, dinheiro.

33. 33. No dia 13/04/2023, pelas 18h57m, o arguido entregou produto estupefaciente cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

34. No dia 16/04/2023, pelas 10h16m, o arguido entregou produto estupefaciente cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...96 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

35. No dia 18/04/2023, às 10h.41m, o arguido AA, depois de ter recebido dois contactos telefónicos prévios, recebeu no hall de entrada do prédio onde habita o seu cliente/consumidor JJ ao qual entregou cocaína com o peso liquido de 0,753 gramas recebendo, em troca, uma quantia não determinada em dinheiro.

36. JJ acabou por entregar o produto estupefaciente ao consumidor KK, que se encontrava à sua espera no local.

37. No dia 20/04/2023, pelas 18h23m, o arguido entregou cocaína LL com o telefone ...19 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca a quantia de €20,00.

38. No dia 20/04/2023, pelas 20h00m, o arguido entregou 1 grama de cocaína em pedra a MM com o telefone ...30 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

39. No dia 22/04/2023, pelas 20h51m, o arguido entregou 3 doses de cocaína a GG com o telefone ...00 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

40. No dia 30/04/2023, pelas 12h20m, o arguido entregou meia dose de cocaína consumidor não identificado com o telefone ...02 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

41. No dia 1/05/2023, pelas 16h42m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

42. No dia 1/05/2023, pelas 18h13m, o arguido entregou cocaína a NN com o telefone ...05 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

43. No dia 4/05/2023, pelas 117h59m, o arguido entregou cocaína a LL com o telefone ...19, mediante prévio contacto por telefone, combinando encontro no túnel, recebendo em troca a quantia de €20,00.

44. No dia 5/05/2023, pelas 17h52m, o arguido entregou cocaína a NN com o telefone ...05 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

45. No dia 8/05/2023, pelas 09h38m, o arguido entregou cocaína a NN com o telefone ...05 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

46. No dia 10/05/2023, pelas 18h46m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...67 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

47. No dia 12/05/2023, cerca das 17h33m., o arguido encontrou-se na via pública, em frente ao prédio onde habita, com OO e entregou-lhe cocaína com o peso liquido de 0,502 gramas, recebendo em troca dinheiro.

48. No mesmo dia, cerca das 17h59m, o arguido saiu da sua residência e foi ao encontro de PP, que ali se deslocou fazendo uso do seu veículo automóvel de marca Renault, modelo ..., com a matrícula ..-XS-.., e estacionou-a em frente à residência do arguido.

49. Nessa ocasião, o arguido encostou-se à janela do pendura e entregou a PP produto estupefaciente cocaína, recebendo em troca dinheiro.

50. No dia 13/05/2023, pelas 1h52m, o arguido entregou cocaína a GG com o telefone ...00 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

51. No dia 17/05/2023, pelas 19h47m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...79 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

52. No dia 23/05/2023, pelas 16h00, o arguido entregou cocaína QQ com o telefone ...17 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

53. No dia 23/05/2023, cerca das 15h.19m, o arguido AA entregou uma quantidade não concretamente apurada de cocaína a NN que se dirigiu à residência do arguido, mediante um contacto telefónico prévio, recebendo em troca dinheiro.

54. No mesmo dia, cerca das 16h.55m., QQ dirigiu-se à residência do arguido AA, fazendo-se transportar num motociclo de matricula ..-XL-.., que já se encontrava à sua espera, entrou e deste recebeu produto estupefaciente, entregando, em troca, dinheiro.

55. No dia 25/05/2023, pelas 16h13m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...43 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

56. No dia 27/05/2023, pelas 16h52m, o arguido entregou cocaína a QQ com o telefone ...17 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

57. No dia 2/06/2023, pelas 5h34m, o arguido entregou cocaína a consumidora não identificada com o telefone ...80 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

58. No dia 2/06/2023, pelas 10h00m, o arguido entregou cocaína a RR com o telefone ...26 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

59. No dia 5/06/2023, pelas 13h11m, o arguido entregou cocaína a DD com o telefone ...91 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

60. No dia 16/06/2023, pelas 6h15m, o arguido entregou cocaína a consumidora não identificada com o telefone ...80 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

61. No dia 16/06/2023, pelas 12h45m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ..84 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

62. No dia 21/06/2023, pelas 22h16m, o arguido entregou quatro gramas cocaína a consumidora não identificado com o telefone ...80, mediante prévio contacto por telefone, combinando encontro junto da Farmácia...”, sita na Rua ..., em ..., recebendo em troca dinheiro.

63. No dia 24/06/2023, pelas 12h17m, o arguido entregou um grama de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

64. No dia 25/06/2023, pelas 20h35m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...72 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

65. No dia 27/06/2023, pelas 13h37m, o arguido entregou cocaína a HH com o telefone ...08 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

66. No dia 28/06/2023, pelas 10h35m, o arguido entregou cocaína a SS com o telefone ...91 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

67. No dia 28/06/2023, pelas 11h04m, o arguido entregou dois gramas de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

68. No dia 29/06/2023, pelas 17h24m, o arguido entregou um grama de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

69. No dia 3/07/2023, pelas 15h37m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

70. No dia 4/07/2023, pelas 12h11m, o arguido entregou duas doses de cocaína a TT com o telefone ...98 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

71. No dia 5/07/2023, pelas 16h25m, o arguido entregou cocaína a HH com o telefone ...08 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

72. No dia 6/07/2023, pelas 21h10m, o arguido entregou 3 embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...72 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

73. No dia 6/07/2023, pelas 18h35m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

74. No dia 9/07/2023, pelas 15h47m, o arguido entregou 5 embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

75. No dia 10/07/2023, pelas 21h19m, o arguido entregou cocaína a UU com o telefone ..26 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

76. No dia 11/07/2023, pelas 15h44m, o arguido entregou duas embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 mediante prévio contacto por telefone, combinando encontro na Rotunda ..., recebendo em troca dinheiro.

77. No dia 13/07/2023, pelas 13h22m, o arguido entregou 3 embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

78. No dia 14/07/2023, pelas 20h09m, o arguido entregou 3 embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

79. No dia 16/07/2023, pelas 19h46m, o arguido entregou cocaína a consumidora não identificada com o telefone ...85 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

80. No dia 16/07/2023, pelas 12h37m, o arguido entregou cocaína a consumidora não identificada com o telefone ...63 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

81. No dia 18/07/2023, pelas 14h55m, o arguido entregou 5 embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

82. No dia 18/07/2023, pelas 15h13m, o arguido entregou cocaína a LL com o telefone ...19 mediante prévio contacto por telefone, tendo combinado encontro no ..., recebendo em troca dinheiro.

83. No dia 19/07/2023, pelas 00h28m, o arguido entregou cocaína a LL com o telefone ...19 mediante prévio contacto por telefone, tendo combinado encontro no ..., perto da sua residência, recebendo em troca dinheiro.

84. No dia 19/07/2023, pelas 15h18m, o arguido entregou cocaína a NN com o telefone ...05, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro (sessão 10103 fls. 103, apenso interc).

85. No dia 20/07/2023, pelas 15h03m, o arguido entregou 4 embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

86. No dia 22/07/2023, pelas 15h36m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

87. No dia 22/07/2023, pelas 18h50m, o arguido entregou cocaína a SS com o telefone ...91 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

88. No dia 22/07/2023, pelas 21h11m, o arguido entregou 3 embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...70 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

89. No dia 23/07/2023, pelas 13h41m, o arguido entregou cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

90. No dia 23/07/2023, pelas 13h44m, o arguido entregou 4 embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...86 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

91. No dia 23/07/2023, pelas 16h32m, o arguido entregou 4 embalagens de cocaína a consumidor não identificado com o telefone ...07 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

92. No dia 24/07/2023, pelas 10h34m, o arguido entregou 2 embalagens de cocaína a SS com o telefone ...91 que para o efeito se deslocou à sua residência, mediante prévio contacto por telefone, recebendo em troca dinheiro.

93. No dia 24/07/2023, cerca das 11h., o arguido AA encontrou-se com SS, na Rua ..., em ..., conforme previamente combinado por telefone, e entregou-lhe a 2,05 gramas de cocaína, recebendo em troca dinheiro.

94. No mesmo dia, na Avenida ..., em …, o arguido detinha na sua posse no interior dos bolsos das calças que vestia: - seis notas do BCE com o valor facial de €20,00; –uma nota do BCE com o valor facial de €10,00 - três notas do BCE com o valor facial de €5,00; - duas notas do BCE com o valor facial de €50,00 - trinta e três notas do BCE com o valor facial de €20,00; - vinte e três notas do BCE com o valor facial de €10,00, no valor total de €1.135,00 (mil cento e trinta e cinco euros); - um telemóvel com o IMEI ..67; - um telemóvel com o IMEI ...75;

95. O arguido, nessa ocasião, detinha ainda no interior da sua residência, sita na Rua Rua..., em …: - nove embalagens contendo cocaína com o peso liquido de 3.939 gramas com o grau de pureza de 23% correspondente a 4 doses; - uma embalagem contendo cocaína com o peso liquido de 4,785 gramas com o grau de pureza de 64,10% correspondente a 15 doses - uma embalagem contendo de cocaína com o peso liquido de 0,485 gramas com o grau de pureza de 25,6% correspondente a 1 dose; - 1 balança de precisão/digital; - 1 saco de plástico recortado utilizado para embalamento de produto estupefaciente.

96. O arguido vendeu cocaína a LL desde, pelo menos, o início do ano de 2021 cocaína, em número de vezes não apurado, pagando entre €20,00 a €30,00, conforme a quantidade, que se deslocava junto da residência do arguido.

97. O arguido vendeu cocaína EE durante dois períodos temporais, sendo um primeiro compreendido entre o Verão do ano de 2022 e o final daquele ano, e um segundo nos três meses antecedentes à detenção do arguido (ocorrida em julho de 2023), envolvendo o pagamento de €20,00 de cada vez, com deslocação do comprador junto da residência do arguido.

98. O arguido vendeu cocaína HH desde, pelo menos, julho de 2022, dirigindo-se para o efeito à residência da mesma, em número de vezes não apurado, pagando esta cerca de €20,00 de cada vez.

99. O arguido vendeu cocaína KK desde, pelo menos, inicio do ano de 2023, em número de vezes não apurado, pagando este cerca de €25,00 de cada vez.

100. O arguido vendeu cocaína CC desde, pelo menos, inicio do ano de 2023, em número de vezes não apurado, pagando este cerca de €10,00 a €25,00 de cada vez

101. O arguido vendeu cocaína GG desde, pelo menos, julho de 2022, em número de vezes não apurado, pagando este entre €20,00 a €40,00 de cada vez, consoante a quantidade, que se deslocava junto da residência do arguido.

102. O arguido vendeu cocaína VV desde, pelo menos, julho de 2022, em número de vezes não apurado, pagando este cerca de €20,00 de cada vez, que se deslocava junto da residência do arguido.

103. O arguido destinava o produto estupefaciente que lhe foi apreendido, a ser vendido a todos os terceiros revendedores e/ou consumidores de cocaína que o contactassem para o efeito.

104. Os telemóveis apreendidos eram utilizados pelo arguido para estabelecer contactos com terceiros, fornecedores, revendedores e consumidores, na atividade de tráfico que desenvolvia.

105. As quantias monetárias apreendidas constituem o lucro decorrente das vendas de estupefaciente efetuadas pelo arguido.

106. Os restantes objetos apreendidos, como a balança e sacos de plástico recortados, serviram para a preparação, doseamento, acondicionamento e preservação da cocaína.

107. O arguido fazia do trafico de estupefacientes modo de vida, dele retirando quantias monetárias elevadas com as quais fazia face às despesas pessoais e familiares.

108. Todo o dinheiro e telemóveis apreendidos na posse do arguido foram por ele obtidos ou através de troca por cocaína ou com os lucros obtidos com a venda desses produtos.

109. O dinheiro provinha dessa atividade, na medida em que tais substâncias eram adquiridas pelo arguido a um preço inferior ao preço de revenda, o que permitia a obtenção de um lucro.

110. O arguido desenvolveu esta atividade não obstante conhecer as características estupefacientes das substâncias detidas e transacionadas, e as consequências nefastas e aditivas que as mesmas provocavam nas pessoas que as consumiam.

111. Apesar de estar ciente da natureza estupefaciente do produto em causa, logrou possuí-lo e entregá-lo a troco de dinheiro, com vista à sua disseminação por um número elevado de consumidores, obtendo assim lucros financeiros, conforme, aliás, sucedeu.

112. Ao arguido não lhe são conhecidos hábitos de trabalho ou outras fontes de rendimento lícitas.

113. O arguido tinha perfeito conhecimento do tipo de estupefaciente que preparava, transportava, ilicitamente detinha e vendia, bem como da natureza e características dos mesmos.

114. O arguido vendia o produto estupefaciente que detinha a toxicodependentes/consumidores que o procuravam, junto à sua residência ou noutros locais públicos, por um preço superior àquele por que o haviam adquirido, assim realizando mais-valias financeiras.

115. O arguido agiu livre, voluntaria e conscientemente, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.

Factos alusivos ao NUIPC 42.../22... (atual apenso B):

116. No dia 17/12/2021, o arguido tinha guardado no interior de sua residência, sita em Rua..., ..., os seguintes produtos estupefacientes, objetos e dinheiro: a) 7,145 gramas de cocaína, com o grau de pureza de 22,3%, suficientes para 7 doses médias individuais diárias; b) 3,483 gramas de cocaína, com o grau de pureza de 18,6%, suficientes para 3 doses médias individuais diárias; c) sete saquetas de redrate, produto vulgarmente utilizado no corte de cocaína; d) duas balanças de precisão; e) um telemóvel de marca F2, com o IMEI ...34; e f) 505,00€ (quinhentos e cinco euros), divididos em notas com o valor facial de 5,00€, 10,00€, 50,00€ e 100,00€ e cinco moedas de 1,00€, sendo destes €20,00 (1 nota de €10,00 e 2 notas de €5,00) foram encontrados na carteira do arguido e o restante (€485,00) no interior de uma cómoda existente no quarto do arguido (comum face à companheira do mesmo).

117. Os 7,145 gramas de cocaína, acima descritos, estavam dividas em cinco pequenos cartuchos e os 3,483 gramas de cocaína estavam divididos em 6 pequenos cartuchos, prontos para entregar ao cliente/consumidor.

118. O arguido pretendia vender todo o produto estupefaciente que detinha a toxicodependentes, seus clientes, por um preço superior àquele por que o havia adquirido, assim realizando mais-valias financeiras.

119. O arguido não tinha atividade laboral ou outras fontes de rendimento lícito.

120. O arguido tinha perfeito conhecimento da natureza e das características do produto estupefaciente que detinha.

121. Sabia ainda o arguido que não se encontrava autorizado a cultivar, produzir, oferecer, preparar, vender e ceder qualquer tipo de produto estupefaciente.

122. O arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado de deter, oferecer, guardar, vender, ceder e distribuir produto estupefaciente, designadamente cocaína e heroína, aos clientes/consumidores que o procurassem, bem sabendo que não estava autorizado a fazê-lo.

123. Mais sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

Da postura assumida em julgamento pelo arguido:

124. O arguido confessou na sua quase integralidade os factos, face a cuja prática se declarou arrependido.

Do contexto vivencial do arguido:

125. O processo de desenvolvimento de AA, cidadão cabo-verdiano, decorreu no contexto da sua numerosa família – é o oitavo de uma fratria de nove irmãos – cujo modo de vida desde sempre esteve ligado à agricultura de subsistência, onde passou a trabalhar com os pais, após o 4º ano de escolaridade.

126. Com o objetivo de superar a condição de pobreza em que vivia, o arguido, em 1988, emigrou para Portugal – ..., onde já se encontravam alguns dos seus irmãos, que o acolheram e apoiaram na sua inserção sócio laboral.

127. Entre 1989 e 1992, AA viveu em Espanha- ..., residindo com um irmão e trabalhando na construção civil.

128. No retorno a este país, o arguido fixou-se em ..., onde se encontravam outros familiares, tendo sido nesta fase que se desencadearam os problemas de saúde mental que deram origem às intervenções ao nível psiquiatria, designadamente internamentos e acompanhamento em ambulatório, na sequência da esquizofrenia que lhe foi diagnosticada.

129. A vinda em definitivo do arguido para ... verificou-se em 2002, sucedendo-se os episódios de descontrolo comportamental e alegado surto psicótico, associados ao consumo excessivo de álcool, tendo em 2004 sido condenado a uma pena de prisão efetiva de quatro anos e seis meses de prisão, pela prática de um crime de homicídio na forma tentada e de ofensa à integridade física.

130. A liberdade condicional que lhe foi concedida veio a ser razoavelmente cumprida, residindo com os irmãos, aderindo ao acompanhamento psiquiátrico e ao injetável que lhe está prescrito.

131. No plano afetivo AA mantém desde 2007 um relacionamento conjugal com uma concidadã que tinha emigrado para Portugal nesse ano, nascendo em 2008 o primeiro filho do casal, sendo a subsistência familiar assegurado pelos rendimentos de trabalho da companheira, empregada de limpeza, sendo irregular o que era auferido pelo arguido na construção civil.

132. Posteriormente AA veio a ser condenado numa pena de prisão efetiva de cinco anos e seis meses, por crime de tráfico de estupefacientes, que cumpriu integralmente no EP de ..., retornando à liberdade em dezembro de 2016.

133. A vida do arguido prosseguiu no contexto da família constituída, composta pela companheira, e filho, nascendo em 2019 a filha do casal, continuando AA a ser acompanhado pelo departamento de psiquiatria do Hospital de ..., onde mensalmente realizava medicação injetável.

134. Tal como anteriormente a manutenção familiar foi sendo maioritariamente assegurada pelo trabalho da companheira, pois a variabilidade e instabilidade do humor e saúde mental de AA impediam-no de manter um desempenho laboral contínuo na construção civil.

135. No final de dezembro de 2020, o filho mais velho do arguido foi internado no Hospital de ... e diagnosticado com diabetes tipo 1, tendo em sequência a companheira do arguido deixado de trabalhar para prestar àquele a necessária assistência.

136. À data a que se reportam os factos sujeitos a julgamento, o arguido mantinha-se a viver com a companheira e filhos na mesma habitação, situada num bairro social conotado com diversas problemáticas sociais, continuando a realizar mensalmente o injetável que lhe estava prescrito no âmbito do acompanhamento psiquiátrico.

137. No plano económico, a situação económica do casal era precária, encontrando-se a companheira a assegurar o apoio do filho, e tendo o arguido um exíguo salário como grelhador de carne no café “A...”, sito junto à sua residência.

138. É neste contexto de dificuldades económicas, que o arguido adotou os comportamentos descritos nos autos.

139. No presente momento, a companheira do arguido encontra-se a frequentar um curso de formação profissional de “cozinha e pastelaria”, assegurando a sua subsistência e a dos dois filhos, através da bolsa da formação, das prestações familiares e da confeção de bolos por encomenda.

140. Ao longo da medida de coação de prisão preventiva que lhe foi aplicada, AA tem mantido um comportamento adequado às regras prisionais, encontrando-se inativo, continuando a aderir ao injetável, que lhe está prescrito, pois valoriza a estabilidade que aquela substância lhe permite.

141. Ao longo da reclusão, o arguido tem recebido as visitas regulares da companheira, tendo também já sido visitado pela irmã e sobrinho.

Do passado criminal dos arguidos:

142. Do CRC do arguido constam os seguintes antecedentes criminais: a) pelo cometimento de 1 crime de homicídio na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º e 131º do Código Penal, e de 1 crime consumado de ofensas à integridade física qualificada, p. e p. pelos artigos 143º, 144º, alínea d) e 246, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, por factos ocorridos em 27/06/2005, mediante acórdão proferido em 8/03/2005, transitado em julgado em 28/03/2005, na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão efetiva (Proc. N.º 33../02... das 5º e 6ª Varas Criminais de Lisboa); b) por 1 crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º do DL n.º 15/93, de 22 de janeiro, alusivo a factos ocorridos em 8/10/2010, mediante acórdão datado de 24/09/2013, transitado em julgado a 30/10/2013, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão (Proc. N.º 9.../10... da Vara de Competência Mista de ...); c) pela autoria, em 5/02/2019, de 1 crime de consumo de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 40º, n.º 1, com referência à Tabela I-C anexa ao DL n.º 15/93, de 22 de janeiro, por factualidade tida lugar em 5/02/2018, sancionada por sentença de 23/09/2020, transitada em julgado a 23/10/2020, na pena de 90 dias de multa (Proc. N.º 12.../19... do Juízo Local Criminal de ... – J1).

***

III.II. Factos não provados:

Não resultou cabal e inequivocamente demonstrado:

Autos principais:

A. Que a embalagem retirada de veículo automóvel, no contexto explicitado em 18), contivesse no seu interior produto estupefaciente.

B. Que o início das aquisições referenciadas em 96) antecedesse ao ano de 2018, envolvendo o pagamento de importâncias superiores a €30,00.

C. Que o início das aquisições alusivas ao consumidor indicado em 97) antecedesse ao início do ano de 2021.

NUIPC 42.../22... (atual apenso B):

D. Que na habitação do arguido, no contexto explicitado em 116), tivesse sido ainda encontrado: - 5,037 gramas de heroína, com o grau de pureza de 16,2%, suficiente para 8 doses médias individuais diárias; - 16,860 gramas de cocaína, com o grau de pureza de 82,6%, suficientes para 69 doses médias individuais diárias; - 1 outra (terceira) balança de precisão.

E. Que a importância detetada no interior de cómoda do quarto do arguido (partilhado pela companheira), no contexto explicitado em 116) (€485,00), derivasse da venda de produto estupefaciente aos seus clientes/consumidores.”

B.3. O Direito

B.3.1. A qualificação jurídica dos factos apurados

Entende o recorrente que os factos apurados devem ser subsumíveis ao crime de tráfico de menor gravidade – previsto e punível pelo artigo 25º do Dec. Lei 15/93, de 22 de janeiro – e não pelo crime de tráfico – previsto e punível pelo artigo 21º, nº 1 do mesmo diploma legal.

E sustenta essa abordagem no seguinte:

(…) apesar de a quantidade de produto apreendida já não ser irrelevante, ela não se encontra no patamar quantitativo da que é dominada pelos "verdadeiros traficantes", que auferem os significativos proventos económicos que apontam esta actividade, como uma das mais rentáveis, a nível internacional;

(a)s vendas apuradas, que traduzem a multiplicidade de pequenas transacções que caracterizam o "pequeno tráfico", também chamado "tráfico de rua" (pois que quando o tráfico já detém algum relevo, este organiza-se em poucas e rentáveis transacções), em que os actos são praticados mais ou menos "à vista", com o inerente risco para si o próprio;

a conduta do recorrente apurada nos autos resulta praticada com organização de meios que se patenteia como incipiente, não se lhe encontrando qualquer actuação de dominância organizada, em que o arguido, designadamente, se resguarde por detrás de intermediários que não o conheçam, colocando-se a cobro de riscos, como sucede com os "verdadeiros traficantes", a que se dirige a previsão contida no artigo 21° do citado decreto-lei.

E com estes argumentos conclui que os factos são subsumíveis ao tráfico de menor gravidade acrescentando que “a jurisprudência reserva cada vez mais a aplicação do artigo 21° para situações que se poderão denominar de tráfico "de relevo", revelador de alguma elaboração - que não incluídas nas previstas pelo artº 24° "idem" - e não de condutas que se inscrevem num patamar residual do respectivo "nicho de mercado".

Ora, desde logo importa consignar que o Dec. Lei 15/93, de 22 de janeiro contem três normas que se reportam ao tráfico de estupefacientes: Os artigos 21º, 24º e 25.

A esta realidade se reportou Jescheck1 quando escreveu o seguinte: Cuando a partir de um delito base y mediante la adición de elementos se forman nuevos tipos penales que aparecem como especiales modalidades de aquel delito base, nos hallamos frente a una variante dependiente. Los elementos adicionales puedem expressar tanto uma agravación como uma atenuación del contenido de injusto o de cuylpabilidade del delito base. Se distinguen, según esto, variantes cualificadas y privilegiadas

Ou seja, o artigo 21º constitui o “delito base”, o artigo 24º o delito cualificado” e o artigo consagra o “delito privilegiado”.

Serve esta introdução para significar que não faz sentido o recorrente reportar-se à não existência de elementos que fariam com que os factos pudessem ser subsumíveis ao crime de tráfico de estupefacientes agravado (artigo 24º do diploma citado), tais como os” significativos proventos económicos, a actividade, a nível internacional ou actuação de dominância organizada” …

Voltando ao caso em apreço dispõe o artigo 25º do mesmo Dec. Lei que os limites máximo e mínimo da moldura abstrata prevista no crime base (artigo 21º) podem decrescer “se a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações”

Sublinhe-se que não basta que a ilicitude diminua, sendo imprescindível que “diminua consideravelmente”

No acórdão recorrido justificou-se o afastamento do crime privilegiado com a seguinte justificação:

“Importa contudo atender, no que ao eventual preenchimento do tipo, a diversos “patamares” de gravidade da contudo do agente e, consequentemente, distintos graus de censura ético-jurídica.

Vejamos então:

Com o artigo 25.º do DL n.º 15/93, foi criado o tipo legal de crime de tráfico de menor gravidade. Este subtipo de crime, privilegiado, estatui as punições para os casos em que preenchendo a atuação do agente a previsão dos artigos 21.º e 22.º, “a ilicitude se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações”.

A tipificação do artigo 25.º pretende permitir ao julgador que, sem prejuízo do natural rigor na concretização da intervenção penal relativamente a crimes desta natureza, encontre a medida justa de punição em casos que, embora porventura de gravidade ainda significativa, ficam aquém da gravidade do ilícito justificativa da tipificação do artigo 21.º e encontram resposta adequada dentro das molduras penais previstas no artigo 25.º, resposta que nem sempre seria viável e ajustada através dos mecanismos gerais de atenuação especial da pena (artigos 72.º e 73.º do Código Penal).

Para preencher o conceito vago de “menor gravidade“, na vertente da quantidade da droga relevante, importa considerar nomeadamente o período de tempo da atividade, o número de pessoas identificadas como adquirentes, a repetição de vendas ou cedências, as quantidades adquiridas e vendidas e os montantes pecuniários envolvidos, e por isso “deve atender-se não apenas às quantidades transacionadas de cada vez pelo arguido mas à totalidade do produto vendido a todos os consumidores” (Acórdãos do STJ, de 19/09/91, BMJ, 409.º - 456, e de 13/02/91, BMJ, 404.º-188).

Ou seja, é necessário atender a um conjunto de circunstâncias que, isolada ou conjuntamente, podem tornar a ilicitude do facto consideravelmente diminuída

Nesta apreciação global dos factos assumem particular relevo os meios utilizados, a saber: a organização ou logística, a modalidade ou circunstâncias da ação (tráfico ocasional ou de circunstância, tráfico habitual, a intensidade do tráfico), isto é, o grau de perigosidade para a difusão da droga, a qualidade das substâncias ou preparados, a quantidade da droga transacionada, como releva ainda a personalidade do arguido (se o arguido é ou não consumidor ou toxicodependente, o facto de o arguido fazer do tráfico de droga o seu modo de vida ou para assegurar o seu próprio consumo e a sua subsistência) – Acórdãos do STJ, de 2/06/99, in www.dgsi.pt, de 29/05/2003, CJ/STJ, ano XI, Tomo II, a pág. 204 e segs, de 31/05/95, BMJ, 447.º-178 e segs, de 11/10/95, BMJ, 450.º-110, de 9/01/97, CJ, Acs STJ, Tomo.1, a pág. 172, de 12/06/97, CJ, Acs STJ, Tomo II, a pág. 233, de 27/06/98, BMJ, 473.º - 166, e, na doutrina, Lourenço Martins, Droga e Direito, a pág. 125).

No caso em apreço, e em face do evidenciado supra em sede de fundamentação fáctica, haverá de analisar a ação (ou ações) do aqui arguido, por forma a, após, subsumi-la numa ou noutra vertente incriminatória penal.

Neste plano diremos:

Na realidade feita acolher no processo originariamente numerado com o n.º 42.../22... encontra-se apenas em causa a detenção, em 17/12/2021, de produto estupefaciente (cocaína), substância também ela destinada à venda, porém sem detalhe ou concretização de atos de venda.

Nos autos principais, sintetiza-se e descreve-se (aqui com concretização detalhada) a ação do arguido, contendente à venda de estupefacientes (cocaína), ao longo de um período de sensivelmente ano e meio, a, pelo menos, 20 consumidores diferentes.

As vendas são diretas e ao consumidor final, sendo quanto a alguns dos indivíduos indicados como compradores repetidas no tempo, implicando a entrega de importâncias que se compreendem, maioritariamente, entre os €10,00 e os €30,00.

O arguido assegura, previamente às vendas, a repartição das dosagens individualizadas, auferindo percentagem do valor das vendas.

O contexto de atuação em ambos os NUIPC´s é em tudo uniforme, destacando-se uma ação de detenção conducente à venda ao consumidor final, no mesmo contexto de espaço e em plano de subsunção a uma mesma dinâmica temporal, havendo, além do mais, coincidência quanto à substância colocada em venda ou forma para tanto utilizada.

Nesta medida, e sendo o crime de tráfico de estupefacientes um crime de trato sucessivo ou de execução permanente, deverá ser o arguido punido no âmbito de um único desígnio de vontade e ação, cedendo pois a imputação concursal de crimes (neste sentido, vide Acórdão da Relação de Coimbra de 23/09/2020 – Relator: Rosa Pinto – Proc. N.º 58/13, in www.dgsi.pt).

Vejamos em que termos então:

Na aceção global dos autos vislumbramos uma mesma ação, conducente à venda ao consumidor final, sendo o meio atuacional simplificado, assente na realização de contactos prévios por telefone com efetivação de entregas presenciais, pressupondo, a título prévio, a separação das quantias detidas em doses individuais.

Dir-se-á pois, no espectro passível de incluir-se no domínio do fenómeno do tráfico, poder a atuação revelar-se num patamar algo rudimentar, desprovido de maior organização ou complexidade.

Porém, a atuação do agente é manifestada ao longo de um já relevante de tempo (cerca de ano e meio), consubstanciando-se na transação de uma chamada “droga dura” – cocaína – assumindo um “público alvo” já relevante, de pelo menos 20 indivíduos consumidores.

Afigura-se-nos pois, na visão de conjunto da ação do arguido, que a mesma suplantará já a dinâmica ínsita ao chamado tráfico de menor gravidade (do artigo 25º do DL n.º 15/93), passando já a integrar, ainda que num patamar relativamente baixo de gravidade, o tráfico (geral) do artigo 21º do citado normativo (com referência à Tabela I-B anexa àquele normativo).”

Concorda-se inteiramente com esta abordagem, a qual se mostra em consonância com a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça.

Com efeito e apenas para darmos um exemplo, decidiu-se no acórdão de 30 de abril de 2008, deste Alto Tribunal, o seguinte:

I - O crime de tráfico de menor gravidade contempla, como a própria denominação indica, situações em que o tráfico de estupefacientes, tal como se encontra definido no tipo base, se processa de forma a ter-se por consideravelmente diminuída a ilicitude, ou seja, em que se mostra diminuída a quantidade do ilícito.

II - A título exemplificativo, indicam-se no preceito como índices, critérios, exemplos padrão ou factores relevantes de graduação da ilicitude, circunstâncias específicas, mas objectivas e factuais, verificadas na acção concreta, nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações objecto do tráfico, os quais devem ser analisados numa relação de interdependência, já que há que ter uma visão ou perspectiva global, uma mais ampla e correcta percepção das acções desenvolvidas (actividade disseminadora de produtos estupefacientes) pelo agente, de modo a concluir-se se a conduta provada fica ou não aquém da gravidade do ilícito justificativa da integração no tipo essencial, na descrição fundamental do art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01.

(…)

V - A sua aplicação (do artigo 25º) tem como pressuposto específico a existência de uma considerável diminuição do ilícito; pressupõe um juízo positivo sobre a ilicitude do facto, que constate uma substancial diminuição desta, um menor desvalor da acção, uma atenuação do conteúdo de injusto, uma menor dimensão e expressão do ilícito. Os pressupostos da disposição respeitam, todos eles, ao juízo sobre a ilicitude do facto no sentido positivo, constatando, face à específica forma e grau de realização do facto, que o caso se situará substancialmente aquém da necessidade de pena expressa pelo limite mínimo do tipo base.

VI - Os índices ou exemplos padrão enumerados no preceito, a par de outros, são atinentes, uns, à própria acção típica (meios utilizados, modalidade, circunstâncias da acção), outros ao objecto daquela acção (qualidade ou quantidade do estupefaciente), ou seja, pertinem todos ao desvalor da conduta, à execução do facto, fazendo parte do tipo de ilícito, não entrando em acção qualquer consideração relativa ao desvalor da atitude interna do agente, à personalidade deste, a juízo sobre a culpa.

VII - Haverá que proceder à valorização global do episódio, não se mostrando suficiente que um dos factores interdependentes indicados na lei seja idóneo em abstracto para qualificar o facto como menos grave ou leve, devendo valorar-se complexivamente todas as circunstâncias. O critério a seguir será a avaliação do conjunto da acção tendo em conta o grau de lesividade ou de perigo de lesão (o crime de tráfico é um crime de perigo abstracto) do bem jurídico protegido (saúde pública).”

Face ao exposto entende-se não merecer o acórdão recorrido qualquer censura, devendo o recurso improceder

B.3.2. A medida da pena

B.3.2.1 Introdução

Nos termos do disposto nos nº 1 e 2 do artigo 40º do Código Penal e como refere Figueiredo Dias2, “(a)s finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela de bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade”, sendo que, “a pena não pode ultrapassar, em caso algum, a medida da culpa” pois isso, “mesmo que em nome das mais instantes exigências preventivas, poria em causa a dignitas humana do delinquente e seria assi, logo por razões jurídico constitucionais, inadmissível.”

Por outro lado, continuando a acompanhar esse Mestre e citando o acórdão recorrido, a determinação definitiva da pena é alcançada através de um procedimento que decorre em três fases distintas: na primeira investiga-se e determina-se a moldura penal (medida abstrata da pena) aplicável ao caso; na segunda investiga-se e determina-se a medida concreta (dita também individual ou judicial); na terceira escolhe-se (de entre as penas postas à disposição pelo legislador e através dos mecanismos das penas alternativas ou das penas de substituição) a espécie de pena que, efetivamente, deve ser cumprida.

Como decorre do nº 1 do artigo 71º do Código Penal, a medida concreta da pena tem como limite máximo a culpa do agente, como limite mínimo razões de prevenção geral (consubstanciadas no quantum da pena imprescindível à tutela dos bens jurídicos e das expetativas da comunidade), sendo subsequentemente afinada por razões de prevenção especial espelhadas nas funções que a mesma desempenha (seja a função primordial de socialização, seja qualquer uma das funções subordinadas de advertência individual ou segurança ou inocuização3).

Escrito de outra forma e usando as palavras de Anabela Miranda Rodrigues, sobre o exposto modelo de determinação concreta da medida da pena:

«Em primeiro lugar, a medida da pena é fornecida pela medida da necessidade de tutela de bens jurídicos, isto é, pelas exigências de prevenção geral positiva (moldura de prevenção). Depois, no âmbito desta moldura, a medida concreta da pena é encontrada em função das necessidades de prevenção especial de socialização do agente ou, sendo estas inexistentes, das necessidades de intimidação e de segurança individuais. Finalmente, a culpa não fornece a medida da pena, mas indica o limite máximo da pena que em caso algum pode ser ultrapassado em nome de exigências preventivas4

Para terminar este excurso falta referir que, nos termos do nº 2 daquele mesmo artigo 71º, na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente as elencadas exemplificativamente nessa mesma norma.

Sobre as circunstâncias, que relevam para a determinação da medida da pena, quer pela via da culpa, quer pela da prevenção, refere Figueiredo Dias5, que as mesmas se podem agrupar em:

“1. Fatores relativos à execução do facto”, esclarecendo que: Toma-se aqui a “execução do facto” num sentido global e complexo, capaz de abranger “o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente”, “a intensidade do dolo ou da negligência” e ainda “os sentimentos manifestados na preparação do crime e os fins e os motivos que o determinaram (...);

“2) Fatores relativos à personalidade do agente”, em que inclui: a) Condições pessoais e económicas do agente; b) Sensibilidade à pena e suscetibilidade de ser por ela influenciado; e c) Qualidades da personalidade manifestadas no facto; e

“3) Fatores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto”, esclarecendo que no que respeita à vida anterior ao facto há que averiguar se este surge como um episódio ocasional e isolado no contexto de uma vida de resto fiel ao direito, que poderá atenuar a pena ou se existem condenações anteriores, que poderão servir para agravar a medida da pena.

Também Maria João Antunes refere que podem ser agrupados nas alíneas a), b), c) e e), parte final, do n.º 2 do art.71.º, do Código Penal, os fatores relativos à execução do facto; nas alíneas d) e f), os fatores relativos à personalidade do agente; e na alínea e), os fatores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto. 6

B.3.2.2 O caso concreto

Passando agora ao caso concreto, importa desde logo referir que, embora solicitando que a pena seja diminuída para 4 anos e 6 meses de prisão, o recorrente não invoca factos que justifiquem a redução da pena que lhe foi aplicada.

Com efeito. Embora se reporte ao facto de ser oriundo de outro país (o que não assume particular significado já que o arguido tem residência em Portugal) a sua pretensão assenta, fundamentalmente, na diferente qualificação jurídica dos factos por ele cometidos, matéria já anteriormente por nós abordada.

Entretanto, o acórdão recorrido justificou a pena aplicada nos seguintes termos:

Contra o arguido pesa o dolo, agora perspetivado sob o ponto de vista volitivo, que se revelou em plano de dolo direto, porquanto AA sempre representou a ilicitude da sua conduta (artigo 14º, n.º 1 do Código Penal e artigo 71º, n.º 2, alínea b) do Código Penal).

A ilicitude e gravidade do facto demonstram-se num patamar relevante, atentas as consequências nefastas intimamente relacionadas com proliferação do mercado de tráfico de estupefacientes (gerando comportamentos aditivos e de danosidade social e desenvolvendo uma chamada economia paralela e ilícita).

Do ponto de vista preventivo, impõe-se assim, em plano de prevenção geral, exteriorizar uma mensagem de combate a fenómenos altamente prejudiciais do funcionamento das sociedades modernas.

No plano da prevenção especial, são também as mesmas de considerar em patamar já considerável, sendo de destacar, em desfavor do arguido, a duração temporal da sua ação, o tipo de substância transacionado (não incorporado nas chamadas drogas leves), bem como a circunstância do mesmo apresentar já antecedentes criminais, designadamente por crimes relacionados com a posse de estupefacientes, ditando já a anterior inserção em meio prisional (e vindo a iniciar o cometimento dos novos factos pouco tempo depois da sua libertação).

Em seu favor deverá, em especial, considerar-se a sua postura em julgamento, com confissão generalizada dos factos, bem como o contexto de ocorrência inicial dos factos, marcado por fragilidade económica, a condição de saúde do arguido, e o seu enquadramento em plano familiar.”

Ora, tendo em conta o acima exposto e o facto de o crime pelo qual o recorrente foi condenado ser punível como pena de 4 a 12 anos de prisão, não entendemos que a pena de 6 anos que lhe foi aplicada – que se situa, como o arguido reconhece, no primeiro terço da respetiva moldura penal – seja, de modo algum, excessiva.

Aliás, tendo em conta, designadamente, a natureza da substancia que era traficada (cocaína), o período de atuação do agente (mais de dois anos), o elevado número de indivíduos a quem vendeu a droga, a circunstância de só ter parado de vender por ter sido detido, o desconhecimento de outro modo de vida e os graves antecedentes criminais (v.g. a condenação pela prática de crime de tráfico de droga punível pelo artigo 21º do Dec. Lei 15/93, de 22 de janeiro na pena de 5 anos e 4 meses com referência a factos praticados em 2010), poderíamos inclusivamente inclinar-nos para a conclusão contrária…

Concluindo, também nesta matéria se entende que não haver fundamento para censurar o acórdão recorrido.

D – Decisão

Por todo o exposto, decide-se negar provimento ao recurso interposto por AA, mantendo-se a decisão recorrida.

Condena-se o recorrente nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça, em 5 (cinco) U.C. (artigos 513º, nº 1, do Código de Processo Penal e 1º e 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais7 e sua tabela III anexa).

Supremo Tribunal de Justiça, d.s. certificada

(Processado e revisto pelo relator - artigo 94º, nº 2 do Código de Processo Penal)

Os Juízes Conselheiros,

Celso Manata (Relator)

Jorge Gonçalves (1º Adjunto)

João Rato (2º Adjunto)

________




1. (cf. Tratado de Derecho Penal, Parte General”, Edição Bosch, pág. 363).

2. “Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime” 4ª reimpressão, pág. 227 e sgs.↩︎

3. Figueiredo Dias, ob. citada 223 e sgs.↩︎

4. Cf. “O modelo de prevenção na determinação da medida concreta da pena”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, n. º2, abril-junho de 2002, págs. 181 e 182.↩︎

5. Cfr. “Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime”, Editorial Notícias, pág. 245 a 255.↩︎

6. Cf. “Consequências Jurídicas do Crime”, Lições para os alunos da FDC, Coimbra, 2010-2011.↩︎

7. Aprovado pelo Decreto Lei nº 34/2008, de 26 de fevereiro e na redação atualmente vigente↩︎