Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3795/24.2YRLSB.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: CATARINA SERRA
Descritores: REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
ORDEM PÚBLICA INTERNACIONAL
IMUNIDADE JURISDICIONAL
TRIBUNAL ESTRANGEIRO
COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
COMPETÊNCIA MATERIAL
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
TRABALHADOR DE CONSULADO
CREDITO LABORAL
TRIBUNAL DA RELAÇÃO
FORO ADMINISTRATIVO
FORO COMUM
ATO
GESTÃO PÚBLICA
GESTÃO PRIVADA
Data do Acordão: 10/23/2025
Nº Único do Processo:
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. Exercendo os tribunais judiciais jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais (cfr. artigo 211.º da CRP) e não existindo preceito na legislação administrativa, nomeadamente no ETAF, que atribua competência aos tribunais administrativos para proceder à revisão e à confirmação de sentenças estrangeiras, deve a matéria considerar-se abrangida pela competência residual dos tribunais judiciais.

II. Sendo o Estado português susceptível de ser afectado pelo acolhimento do pedido de revisão e confirmação de sentença estrangeira, ele é parte legítima (passiva).

III. Respeitando a sentença revidenda a actos de gestão privada do Estado português e à sua responsabilidade perante pessoa singular no quadro de relação jurídico-laboral, ela versa sobre direitos privados, na acepção do artigo 978.º, n.º 1, do CPC.

IV. Respeitando a sentença revidenda a actos de gestão privada do Estado português, não é aplicável a imunidade de jurisdição.

V. A excepção de ordem pública internacional visa impedir a aplicação de uma norma estrangeira que, pela via indirecta da execução de sentença estrangeira, conduza, em concreto, a um resultado intolerável, pelo que a aplicação de Direito privado laboral estrangeiro a uma relação jurídica à qual é internamente aplicável, em regra, o Direito público português, não constitui, por si só, violação da ordem pública internacional.

Decisão Texto Integral:

I. RELATÓRIO

Recorrente: Estado português, representado pelo Ministério Público

Recorrida: AA

1. AA, residente no Estado de São Paulo, República Federativa do Brasil, intentou a presente acção especial de revisão de sentença estrangeira contra o Estado Português, pedindo que seja revista e confirmada sentença proferida pela ... Vara do Trabalho de Santos, Brasil.

2. O Ministério Público, em representação do Estado português, apresentou oposição, invocando, designadamente, a incompetência do Tribunal da Relação de Lisboa, por competir exclusivamente aos tribunais administrativos e fiscais o conhecimento de todas as questões de natureza administrativa.

3. O Tribunal da Relação de Lisboa proferiu Acórdão com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, julga-se procedente a presente ação, confirmando-se a sentença, que passará a ter eficácia na ordem jurídica portuguesa, proferida pela ... Vara do Trabalho de Santos, Brasil, que condenou o Consulado Geral de Portugal em S. Paulo, Brasil:

“Na obrigação de fazer relativa a:

- Anotação da opção pelo FGTS na CTPS da reclamante.

Na obrigação de pagar relativa a:

- Recolhimentos de FGTS a partir da data de 05.10.1988 na conta vinculada sob pena de execução direta nos autos;

- Pagamento de férias + 1/3 e 13° salário de 2012.

Tudo nos termos da fundamentação que integra este ‘decisum’.

Autorizo, ainda, a dedução de todos os valores já pagos a idênticos títulos aos ora deferidos, já comprovados nos autos, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa da parte reclamante

Liquidação de sentença na forma da lei.

Correção monetária na forma da Súmula 381 do C.TST e juros a partir do ajuizamento da ação, no percentual de 1% ao mês.

Conforme art. 832, §3°, CLT, são salariais as seguintes verbas deferidas nesta sentença: 13° salário.

Responsabilidade pelo recolhimento fiscal e previdenciário pela parte reclamada, observada a discriminação supra, relativos às parcelas objeto de condenação, autorizada a dedução da parte cabível peia parte reclamante.

Custas a cargo da parte reclamada no importe de R$-3.000,00, calculadas sobre o valor da condenação arbitrado em R$ 150.000,00”, cuja responsabilidade foi liquidada nos termos constantes do facto provado nº 2 supra.

Face ao preceituado nos art.º 296º a 306º do CPC, fixa-se à causa o valor processual de € 30.000,01”.

5. O Ministério Público vem agora interpor recurso de revista deste Acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça.

Alega, em conclusão:

A. A norma do artigo 979.º do CPC, quando interpretada no sentido de permitir a revisão de sentenças pelos Tribunais da Relação que dirimam litígios emergentes de relações jurídicas administrativas, deve ser desaplicada por violação do disposto no artigo 212.º, n.º 3 da CRP e consequente inconstitucionalidade, nos termos do artigo 204.º da CRP, o que se requer.

B. Mesmo que se entenda que o ETAF não tem norma que atribua aos tribunais administrativos competência para proceder à revisão e confirmação de sentenças estrangeiras temos de considerar que existe uma clara lacuna na legislação existente.

C. Entendemos que tal lacuna não pode ser resolvida com recurso aos casos análogos, nos termos do artigo 10.º, n.º 1 do Código Civil, visto que, pelas razões supra expostas, o Tribunal da Relação de Lisboa não é o órgão judiciário que deve tomar conta da situação.

D. Ora, a norma a criar pelo julgador, nos termos do artigo 10.º, n.º 3 do Código Civil, é necessariamente uma que permita que o Tribunal Central Administrativo Sul possa apreciar em 1ª instância o processo de revisão e confirmação de sentença dos presentes autos, atenta a separação da jurisdição judicial e da jurisdição administrativa.

E. Por efeito do disposto nos artigos 96.º, alínea a), 99.º, n.º 1, 278.º, n.º 1, alínea a), 576.º, n.º 2 e 577.º, alínea a), todos do CPC, deverá ser julgada procedente a exceção dilatória da incompetência material, que ora se invoca e, consequentemente, deverá a Entidade Demandada Estado Português, ora Recorrente, ser absolvida da instância, no que concerne ao presente pedido de revisão e reconhecimento de sentença estrangeira.

F. Ao entender de forma diferente o Tribunal “a quo” violou o artigo 212.º, n.º 3 da CRP, o artigo 10.º, n.º 3 do Código Civil, os artigos 1.º, n.º 1, 4.º, n.º 1, alínea o), 7.º, 37.º, n.º 1, alínea e) do ETAF e artigos 144.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto.

G. Se assim não se entender, deve ser julgada procedente a exceção de ilegitimidade passiva, visto que os Consulados Portugueses no estrangeiro não têm personalidade jurídica, absolvendo-se o Estado Português da instância.

H. Devendo considerar-se que o Tribunal “a quo” violou o artigo 11.º, n.º 4 da Lei n.º 4/2004, de 14 de janeiro, na sua redação atual, bem como o artigo 4.º, n.º 2, alínea c) da Lei orgânica do MNE, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 121/2011, de 29 de dezembro.

I. Caso assim não se entenda, deverá a presente ação ser julgada improcedente, absolvendo-se em consequência o Estado Português do pedido pelas razões que se irão expor.

J. A requerente, ora recorrida, tinha indiscutivelmente um contrato de trabalho em funções públicas que é um vínculo administrativo de emprego público, com particularidades face ao contrato de trabalho privado, vínculo esse, disciplinado pelo Decreto-Lei n.º 47/2013, de 5 de abril, que regula o regime jurídico-laboral dos serviços periféricos externos do MNE, supletivamente regido pela Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas.

K. Desta forma, torna-se necessário concluir que o vínculo de emprego público entre a requerente, ora recorrida, e o Estado Português é subordinado ao Direito Administrativo e, portanto, os direitos e deveres recíprocos não são privados, mas sim públicos.

L. Não sendo os direitos da requerente, ora recorrida, reconhecidos na sentença brasileira que se pretende rever e confirmar, direitos privados, mas sim públicos, não podia esta sentença ser objeto do processo de revisão e confirmação previsto no CPC, visto que este se limita aos direitos privados.

M. O acórdão, fez assim uma errada interpretação e aplicação do n.º 1 do artigo 978.º do CPC, pelo que entendemos que a presente ação não podia ter sido intentada no Tribunal da Relação de Lisboa, mas sim no Tribunal Central Administrativo Sul.

N. A imunidade de jurisdição apresenta-se como corolário do princípio da igualdade entre Estados e radica numa regra consetudinária de acordo com a qual nenhum Estado Soberano pode ser submetido, contra a sua vontade, à condição de parte perante o foro doméstico de outro Estado (“par in parem non habet judicium”).

O. É hoje dominante a conceção restrita da regra da imunidade de jurisdição, que a restringe aos atos praticados com “jure imperii”, excluindo da imunidade os atos de “jure gestionis”, por tal se entendendo aqueles em que os Estados intervêm como pessoa de direito privado em relações de direito privado, não exercendo poderes públicos no contexto dessas relações.

P.É, portanto, indiscutível que o Estado Português beneficia de imunidade de jurisdição perante os tribunais brasileiros.

Q. No entanto, como já se referiu supra e melhor se explicou, o vínculo de emprego entre o Estado Português e a requerente, ora recorrida, é um vínculo público de direito administrativo, disciplinado pelo Decreto-Lei n.º 47/2013, de 5 de abril, supletivamente regido pela Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas.

R. Efetivamente, nos termos do artigo 12.º da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, tais litígios estão submetidos à jurisdição administrativa.

S. Assim sendo, não podiam os tribunais de trabalho brasileiros ter apreciado um litígio sobre esse vínculo, tendo em conta a imunidade de jurisdição do Estado Português, pelo que, por essa razão, não pode a sentença revidenda ser revista e confirmada em Portugal, visto que este litígio é da exclusiva competência dos tribunais administrativos portugueses.

T. Veja-se a este propósito o Parecer n.º 34-C/2024 do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, a fls. 22 e 23, onde se defende que a preterição da imunidade de jurisdição constituí uma exceção inominada que deve levar à absolvição da instância.

U. Devendo considerar-se que o Tribunal “a quo” violou as regras consuetudinárias sobre imunidade de jurisdição e o artigo 12.º da LTFP.

V. A sentença revidenda versa sobre matéria de exclusiva competência dos tribunais administrativos portugueses, pelo que não lhe é aplicável a alínea c) do artigo 980.º do CPC.

W. Pretende a requerente, ora recorrida, que seja revista e confirmada uma decisão judicial estrangeira proferida por tribunal incompetente, porquanto os tribunais de trabalho brasileiros não têm competência internacional para conhecer de litígios emergentes de relações jurídicas administrativas portuguesas.

X. Das normas do artigo 212.º, n.º 3 da CRP e artigos 1.º, n.º 1 e 4.º, n.º 4, alínea b) do ETAF resulta uma competência exclusiva dos tribunais administrativos para julgar o litígio que foi apreciado pelo tribunal de trabalho brasileiro.

Y. A competência territorial dos tribunais administrativos resulta sempre do artigo 22.º do CPTA que prevê que “Quando não seja possível determinar a competência territorial por aplicação dos artigos anteriores, é competente o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa”, pois admitir outra solução levaria a concluir que a interpretação, validade ou execução de regulamentos, atos e contratos administrativos pudessem ser apreciados por tribunais estrangeiros – uma ingerência intolerável na soberania do Estado Português.

Z. Vigorará também o denominado princípio da territorialidade dos atos jurisdicionais: o beneficiário duma sentença estrangeira, se quiser fazer valer, no território doutro Estado, os direitos que a sentença lhe reconheceu, terá de propor a ínova ação, neste caso, administrativa, afim de obter sentença nacional que lhe seja favorável, podendo nessa ação, quando muito, invocar a sentença estrangeira como prova, como presunção da existência do direito que se arroga.

AA. No sentido de que todo e qualquer trabalhador ao serviço das embaixadas e consulados portugueses possuí como vínculo um contrato de trabalho em funções públicas, nomeadamente por aplicação do artigo 6.º do Decreto-Lei 47/2013, de 5 de abril, veja-se o Parecer n.º 34-C/2024 do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, a fls. 92 a 94, devendo considerar-se que a sentença revidenda versa sobre matéria exclusiva dos tribunais portugueses.

BB. Tendo entendido o contrário, o douto acórdão recorrido violou o artigo 212.º, n.º 3 da CRP e os artigos 1.º, n.º 1, 4.º, n.ºs 1 e 4, alínea b) do ETAF, 12.º da LTFP, 6.º do Decreto-Lei n.º 47/2013, de 5 de abril, 13.º e 22.º do CPTA.

CC. É manifesta a má-fé com que a requerente, ora recorrida, litigou na ação interposta no Brasil, onde pretendeu obter ganhos em manifesta fraude à lei, em violação do artigo 21.º do Código Civil Português.

DD. Em Portugal, nos tribunais administrativos, a requerente, ora recorrida, nunca conseguiria os resultados que conseguiu no Brasil, visto que o Consulado Geral de Portugal em São Paulo não seria obrigado a anotar a opção da Autora, ora Recorrida, pelo FGTS na sua carteira de trabalho, nem a pagar o recolhimento de FGTS na conta vinculada, nem as férias e 13.º salário de 2012.

EE. Já que as duas primeiras obrigações não existem no direito administrativo português e todos os trabalhadores em funções públicas tiveram o pagamento dos seus subsídios de férias e 13.º mês (subsídio de Natal) cortados, em 2012, por razões de ordem pública.

FF. Desta forma, ao dirigir-se aos tribunais de trabalho brasileiros a requerente, ora recorrida, pretendeu usar um verdadeiro fórum-shopping, escolhendo os tribunais onde as suas pretensões poderiam ser mais facilmente atingidas, em detrimento dos tribunais administrativos portugueses que seriam os internacionalmente competentes, nos termos do artigo 22.º do CPTA.

GG. Estamos perante uma situação de fraude à lei e ao não entender desta forma o acórdão violou o disposto no artigo 21.º do Código Civil.

HH. O reconhecimento da sentença do tribunal de trabalho brasileiro conduz a um resultado manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado Português.

II. É manifesta a impossibilidade da existência de contratos de trabalho privados celebrados pelo Consulado Geral de Portugal em São Paulo, dado que a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que no seu artigo 6.º, n.º 3 prevê como modalidades de emprego público a nomeação, o contrato de trabalho em funções públicas e a comissão de serviço.

JJ. Desta forma, defendendo-se num contencioso judicial a existência de um contrato de trabalho, ele sempre se teria de entender como contrato de trabalho em funções públicas e, como tal, a ação revidenda deveria ter sido proposta nos tribunais administrativos, nos termos do artigo 4.º, n.º 4, alínea b) do ETAF.

KK. Entendimento diferente implica um resultado manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado Português, nos termos do artigo 980.º, alínea f) do CPC.

LL. A sentença cuja revisão e confirmação se solicita na presente ação aplicou direito privado laboral brasileiro a uma relação jurídica à qual é aplicável o direito administrativo português, circunstância que ofende também a ordem pública internacional do Estado Português, visto que viola a sua soberania, uma vez que tem de ser a lei administrativa portuguesa a prever o regime aplicável aos titulares de contratos de trabalho em funções públicas com o Estado Português.

MM. A exceção de ordem pública internacional ou reserva de ordem pública, parece ter aqui aplicação, pois da aplicação do direito estrangeiro cogente resulta uma contradição flagrante e atropelo grosseiro ou ofensa intolerável dos princípios fundamentais que enformam a ordem jurídica nacional.

NN. Desde logo, são violados os artigos 209.º, n.º 1, alínea a) e b), 211.º, n.º 1 e 212.º da CRP que consagram a existência na ordem jurídica portuguesa, de uma dualidade de jurisdições, de um lado os tribunais judiciais e do outro os tribunais administrativos e fiscais, a quem está cometido o julgamento das ações que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.

OO. Por outro lado, a sentença brasileira, aplicando a lei laboral brasileira que prevê a irredutibilidade salarial, considerou ainda ilegal a suspensão do subsídio de férias e de Natal de 2012, operado através do artigo 21.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (Lei do Orçamento de Estado de 2012) e aplicada a todos os trabalhadores em funções públicas, incluindo a Autora, ora Recorrida, tendo condenado o Consulado Geral de Portugal em São Paulo a pagar esse valor.

PP. O princípio da igualdade não foi violado, porque quem recebe dinheiros públicos não está em posição de igualdade com os restantes cidadãos, justificando-se o sacrifício adicional em suportar as medidas com vista à redução da despesa estatal.

QQ. O fundamento para tal conclusão aparenta ser, de acordo com a nossa interpretação, o facto de estes funcionários estarem adstritos à prossecução do interesse público.

RR. Efetivamente, tal consideração encontra-se vertida no artigo 269.º, n.º 1da CRP e foi, per se, suficiente para justificar que fossem os funcionários públicos afetados.

SS. Portanto, a sentença brasileira ao aplicar as normas de direito brasileiro que consagram a irredutibilidade salarial, viola o princípio da igualdade previsto nos artigos 13.º e 266.º, n.º 2 da CRP, na medida em que o corte dos subsídios de Natal e de Férias de 2012 à requerente, ora recorrida, resultou da aplicação da lei portuguesa que se aplicou igualmente a todos os restantes trabalhadores com contratos de trabalho em funções públicas da Administração Pública portuguesa.

TT. Deve, assim, entender-se que a sentença brasileira contém uma decisão cujo reconhecimento conduz a um resultado manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado Português, pelo que não pode ser julgada procedente a presente ação.

UU. Atento o exposto, o Tribunal “a quo” violou o artigo 4.º, n.º 4, alínea b) do ETAF, os artigos 3.º e 6.º do CPA, os artigos 13.º, 209.º, n.º 1, alínea a), 211.º, n.º 1, 212.º e 266.º, n.º 2 da CRP, artigo 22.º, n.º 1 do Código Civil e artigo 21.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro”.

6. A autora apresentou contra-alegações em que sustenta, em conclusão, “o rigoroso acerto do douto Acórdão recorrido é indesmentível, pelo que o mesmo deverá ser, crê-se, inteiramente mantido”.

7. Foi proferido o habitual despacho de subida do recurso.

*

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC), as questões a decidir, in casu, são as de saber se:

1.ª) os tribunais judiciais carecem de competência material para a presente acção;

2.ª) o Consulado Geral de Portugal em S. Paulo, Brasil, carecia de personalidade judiciária e, consequentemente, o Estado português é parte ilegítima na presente acção;

3.ª) os direitos em causa têm natureza pública, não podendo a sentença revidenda ser objecto do processo de revisão e confirmação previsto no CPC;

4.ª) existe imunidade de jurisdição do Estado português e, consequentemente, os tribunais brasileiros careciam de competência para proferir a sentença revidenda;

5.ª) existe fraude à lei; e

6.ª) existe violação de princípios da ordem pública portuguesa.

*

II. FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

São os seguintes os factos que vêm provados no Acórdão recorrido:

1 – Por sentença proferida em 04 de abril de 2013, pelo tribunal ... Vara do Trabalho de Santos, Brasil, transitada em julgado, em acção interposta por AA contra o Consulado Geral de Portugal em S. Paulo, Brasil, foi este condenado a:

“Na obrigação de fazer relativa a;

- Anotação da opção pelo FGTS na CTPS da reclamante.

Na obrigação de pagar relativa a:

- Recolhimentos de FGTS a partir da data de 05.10.1988 na conta vinculada sob pena de execução direta nos autos;

- Pagamento de férias + 1/3 e 13° salário de 2012.

Tudo nos termos da fundamentação que integra este ‘decisum’.

Autorizo, ainda, a dedução de todos os valores pagos a idênticos títulos aos ora deferidos, já comprovados nos autos, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa da parte reclamante

Liquidação de sentença na forma da lei.

Correção monetária na forma da Súmula 381 do C.

TST e juros a partir do ajuizamento da ação, no percentual de 1% ao mês.

Conforme art. 832, §3°, CLT, são salariais as seguintes verbas deferidas nesta sentença: 13° salário.

Responsabilidade pelo recolhimento fiscal e previdenciário pela parte reclamada, observada a discriminação supra, relativos às parcelas objeto de condenação, autorizada a dedução da parte cabível peia parte reclamante.

Custas a cargo da parte reclamada no importe de R$-3.000,00, calculadas sobre o. valor da condenação arbitrado em R$ 150.000,00”.

2. O julgado pela 3.ª Vara do Trabalho de Santos, Brasil foi objeto de laudo contabilístico, atualizado até 01/07/2017, o qual foi homologado em 05/06/2018, no qual se liquidaram as responsabilidades do Consulado Geral de Portugal em São Paulo para com a requerente em R$ 249.021,27 (duzentos e quarenta e nove mil e vinte e um reais e vinte e sete centavos), sendo R$ 15.615,08 (quinze mil seiscentos e quinze reais e oito centavos) a título de principal, R$ 8.385,30 (oito mil trezentos e oitenta e cinco reais e trinta centavos) de juros de mora, R$ 220.836,05 (duzentos e vinte mil oitocentos e trinta e seis reais e cinco centavos) de FGTS e R$ 4.184,84 (quatro mil cento e oitenta e quatro reais e oitenta e quatro centavos) de INSS parte do réu, bem como honorários de perito contabilista no montante de R$ 2.800,00 (dois mil e oitocentos reais), pela ré.

O DIREITO

O presente recurso é interposto pelo Ministério Público, em representação do Estado Português, no âmbito de acção declarativa com processo especial de revisão e confirmação de sentença estrangeira.

Pede o Ministério Público, sempre no exercício dos seus poderes de representação, a revogação do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 15.05.2025, que julgou procedente a acção e confirmou a sentença proferida pela 3.ª Vara do Trabalho de Santos, Brasil, condenando o Consulado Geral de Portugal em S. Paulo, Brasil:

Na obrigação de fazer relativa a;

- Anotação da opção pelo FGTS na CTPS da reclamante.

Na obrigação de pagar relativa a:

- Recolhimentos de FGTS a partir da data de 05.10.1988 na conta vinculada sob pena de execução direta nos autos;

- Pagamento de férias + 1/3 e 13° salário de 2012.

Tudo nos termos da fundamentação que integra este ‘decisum’.

Autorizo, ainda, a dedução de todos os valores já pagos a idênticos títulos aos ora deferidos, já comprovados nos autos, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa da parte reclamante

Liquidação de sentença na forma da lei.

Correção monetária na forma da Súmula 381 do C.TST e juros a partir do ajuizamento da ação, no percentual de 1% ao mês.

Conforme art. 832, §3°, CLT, são salariais as seguintes verbas deferidas nesta sentença: 13.º salário.

Responsabilidade pelo recolhimento fiscal e previdenciário pela parte reclamada, observada a discriminação supra, relativos às parcelas objeto de condenação, autorizada a dedução da parte cabível peia parte reclamante.

Custas a cargo da parte reclamada no importe de R$-3.000,00, calculadas sobre o valor da condenação arbitrado em R$ 150.000,00”, cuja responsabilidade foi liquidada nos termos constantes do facto provado n.º 2 supra”.

No caso dos autos, está em causa a revisão e confirmação de uma sentença proferida no Brasil.

Verifica-se que não existe tratado ou convenção internacional relevante, pelo que é aplicável exclusivamente o regime nacional, previsto nos artigos 978.º e s. do CPC.

Nos termos do disposto no artigo 978.º, n.º 1, do CPC, “sem prejuízo do que se ache estabelecido em tratados, convenções, regulamentos da União Europeia e leis especiais, nenhuma decisão sobre direitos privados, proferida por tribunal estrangeiro, tem eficácia em Portugal, seja qual for a nacionalidade das partes, sem estar revista e confirmada”.

Dispõe o artigo 980.º do CPC, que, para que a sentença seja confirmada é necessário:

a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a sentença nem sobre a inteligência da decisão;

b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do país em que foi proferida;

c) Que provenha de tribunal estrangeiro cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais portugueses;

d) Que não possa invocar-se a exceção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afeta a tribunal português, exceto se foi o tribunal estrangeiro que preveniu a jurisdição;

e) Que o réu tenha sido regularmente citado para ação nos termos da lei do país do tribunal de origem e que no processo hajam sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;

f) Que não contenha decisão cujo reconhecimento conduza a um resultado manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado português”.

Segundo o artigo 983.º, n.º 1, do CPC, “[o] pedido só pode ser impugnado com fundamento na falta de qualquer dos requisitos mencionados no artigo 980.º ou por se verificar algum dos casos de revisão especificados nas alíneas a), c) e g) do artigo 696.º”.

E, de acordo com o artigo 983.º, n.º 2, do CPC, “[s]e a sentença tiver sido proferida contra pessoa singular ou coletiva de nacionalidade portuguesa, a impugnação pode ainda fundar-se em que o resultado da ação lhe teria sido mais favorável se o tribunal estrangeiro tivesse aplicado o direito material português, quando por este devesse ser resolvida a questão segundo as normas de conflitos da lei portuguesa”.

O artigo 983.º, n.º 2, do CPC consagra o denominado privilégio da nacionalidade e estabelece um fundamento adicional de impugnação.

Como escrevem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa1[e]ste regime implica um controlo de mérito, cabendo ao Trib. da Relação apreciar os factos dados como provados na sentença revidenda e o direito aplicável, sem que isso signifique proceder a um novo julgamento”.

Por sua vez, nos termos do artigo 984.º do CPC, “[o] tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do artigo 980.º; e também nega oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito”.

Explica-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.07.20112:

O nosso sistema de revisão de sentenças estrangeiras inspira-se basicamente no chamado sistema de delibação, isto é, de revisão meramente formal. O que significa que o tribunal, em princípio, se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz a certos requisitos de forma, não conhecendo, pois, do fundo ou mérito da causa. Ou seja, desde que o tribunal nacional se certifique de que tem perante si uma verdadeira sentença estrangeira, deve reconhecer-lhe os efeitos típicos das decisões judiciais, não fazendo sentido que proceda a um novo julgamento da causa3.

Feito este enquadramento, é altura de analisar cada um dos fundamentos invocados pelo recorrente à luz da disciplina aplicável.

1. Da alegada incompetência material dos tribunais judiciais (cfr. sobretudo, conclusões A a F)

O recorrente Ministério Público começa por alegar que o Acórdão recorrido padece de erro de julgamento, por violação, designadamente, dos artigos 1.º, n.º 1, 4.º, n.º 1, al. o), 7.º e 37.º, n.º 1, al. e), do ETAF, dos artigos 144.º, n.º 1, e 145.º, n.º 1, al. b), da Lei n.º 62/2013, de 26.08, do artigo 979.º do CPC e dos artigos 204.º, 211.º, n.º 1, e 212.º, n.º 3, da CRP.

Entende o recorrente que o Tribunal da Relação de Lisboa era materialmente incompetente para proceder à revisão da sentença brasileira, uma vez que esta se pronunciou sobre um conflito que envolvia uma trabalhadora em funções públicas num Consulado português, relação jurídica que é de natureza administrativa, e que por isso deveria ter sido julgado pelos tribunais administrativos portugueses.

O recorrente invoca, a título subsidiário, que não poderia ser aplicada a norma prevista no artigo 979.º do CPC, por inconstitucional, quando entendida no sentido de permitir a revisão de sentenças que dirimam litígios emergentes de relações de jurídico-administrativas pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

Por último, alega que, inexistindo norma que atribua competência aos tribunais administrativos para a revisão de sentenças estrangeiras, a lacuna deve ser resolvida, não através de recurso aos casos análogos, nos termos do n.º 1 do artigo 10.º do CC, mas através de recurso ao n.º 3 da norma, devendo ser criada pelo julgador uma norma que permita ao Tribunal Central Administrativo apreciar este processo de revisão de sentença estrangeira, em face da separação entre a jurisdição judicial e a jurisdição administrativa.

O Tribunal recorrido rejeitou o entendimento propugnado pelo recorrente, convocando, para o efeito, a seguinte fundamentação:

Dispõe o art. 979º do CPC que ‘para a revisão e confirmação é competente o tribunal da Relação da área em que esteja domiciliada a pessoa contra quem se pretende fazer valer a sentença, observando-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 80.º a 82.º’.

Esta norma, invocada na oposição, regula a competência territorial.

A competência material dos Tribunais da Relação para apreciação das ações especiais de revisão e confirmação de sentença estrangeira resulta do disposto no artº 73º, al. e) da Lei nº 62/2013, de 26 de agosto (com a epígrafe “competência das secções”), integrado no CAPÍTULO IV - Tribunais da Relação, que dispõe: ‘compete às secções, segundo a sua especialização julgar os processos de revisão e confirmação de sentença estrangeira, sem prejuízo da competência legalmente atribuída a outros tribunais’.

Ora, os preceitos da CRP e ETAF citados pelo requerido não atribuem aos tribunais administrativos e fiscais a competência para julgar ações de revisão e confirmação de sentença estrangeira, o que sucede por ter sido intenção do legislador atribuir tais ações às secções dos tribunais da relação, em função da sua especialização, pelo que duas conclusões daqui se extraem: (i) não existe qualquer lacuna na lei, que se imponha suprir por recurso ao disposto no artº 10º, nº 3 do CC; (ii) não é caso de desaplicar a norma de competência citada, bem como o artº 979º do CPC, com fundamento em juízo de inconstitucionalidade”.

Com apoio no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.04.20044, o Tribunal a quo sufragou o entendimento de que a lei atribui aos Tribunais das Relações a competência para proceder à revisão de sentenças estrangeiras, quer sejam emanadas de autoridades judiciais, quer sejam sentenças arbitrais, considerando que “inexiste norma que preveja que as sentenças estrangeiras sejam revistas e confirmadas nos tribunais administrativos, pelo que dúvidas inexistem que essa competência está atribuída aos tribunais comuns, nos termos da competência expressa que decorre da lei, não sendo caso para aplicar o disposto no art. 10.º do CC” e que “também não se verifica qualquer interpretação inconstitucional do art. 979.º do CPC, que determine que os tribunais desapliquem este normativo, porquanto o legislador exprimiu expressamente a sua posição ao atribuir a competência exclusiva ao tribunal das Relações para rever e confirmar as sentenças estrangeiras”.

A posição adoptada no Acórdão recorrido está exposta de forma clara, baseada em fundamentos sólidos e merece a concordância deste Supremo Tribunal.

Veja-se por que razão.

Conforme referido acima, o sistema de revisão concebido no Direito português é um sistema de revisão meramente formal (sistema de delibação), limitando-se o tribunal a verificar se a sentença estrangeira satisfaz ou não os requisitos formais impostos pela lei, sem apreciar do seu mérito ou fundo (cfr. artigo 980.º do CPC). Nesta medida, a natureza da relação jurídica sobre a qual a sentença se pronuncia ou o regime jurídico aplicável ao litígio não constituem critérios para a atribuição de competência em matéria de revisão e confirmação de sentença estrangeira.

Acresce que aos tribunais administrativos e fiscais compete o julgamento de acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais (cfr. artigo 212, n.º 3, da CRP).

Em contrapartida, os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais (cfr. artigo 211.º da CRP) – os tribunais judiciais têm, numa palavra, competência residual.

Ora, não existe preceito na legislação administrativa, nomeadamente no ETAF (Lei n.º 13/2002, de 19.02), que atribua competência aos tribunais administrativos para proceder à revisão e à confirmação de sentenças estrangeiras, pelo que se trata de matéria abrangida pela competência residual dos tribunais judiciais.

Contra isto não vale o argumento, usado pelo recorrente, do artigo 4.º, n.º 1, al. o), do ETAF, estabelecendo que “compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objeto questões relativas a: o) relações jurídicas administrativas e fiscais que não digam respeito às matérias previstas nas alíneas anteriores”.

Partindo do princípio (que se reafirma) de que o processo de revisão e confirmação de sentença estrangeira não envolve a apreciação da relação jurídica ou do litígio sobre a qual a sentença revidenda se pronunciou, aquela disposição legal não é aplicável.

Saliente-se que o pedido de atribuição de eficácia, em Portugal, de uma sentença estrangeira não configura um pedido que, por sua natureza, emerja de qualquer relação jurídico-administrativa ou jurídico-fiscal.

Com fundamento idêntico se afasta a invocada inconstitucionalidade do artigo 979.º do CPC. Se o processo de revisão e confirmação de sentenças estrangeiras prescinde da apreciação do fundo do litígio sobre o qual foi proferida decisão, não existe qualquer razão para considerar que o artigo 979.º do CPC viola o artigo 212.º, n.º 3, da CRP, sendo que este preceito, mencionando expressamente os litígios emergentes de relações administrativas e fiscais, não tem, manifestamente, aplicação na sede processual especial dos autos5.

Perante o exposto, ao abrigo do disposto no artigo 979.º do CPC, conclui-se que a competência para a revisão e a confirmação de sentenças estrangeiras cabe ao Tribunal da Relação (secções cíveis).

Improcede, pois, o recurso nesta parte.

2. Das alegadas falta de personalidade judiciária do Consulado Geral de Portugal em S. Paulo, Brasil, e consequente falta de legitimidade do Estado português para a presente acção (cfr., sobretudo, conclusões G e H)

O recorrente pugna ainda pela revogação da decisão recorrida, requerendo a sua absolvição da instância, com fundamento no facto de os consulados serem serviços periféricos externos do Estado Português, na sua qualidade de pessoa colectiva pública, funcionando internamente na dependência do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (MNE), conforme dispõe o artigo 11.º, n.º 4 da Lei n.º 4/2004, de 14.01, na sua redacção atual, bem como o artigo 4.º, n.º 2, al. c), da Lei orgânica do MNE, aprovada pelo DL n.º 121/2011, de 29.12.

Alega o recorrente, mais precisamente, que o Consulado Geral de Portugal em São Paulo, sendo um serviço do Estado, não tem personalidade jurídica e, consequentemente, carece de personalidade judiciária (cfr. artigo 8.º-A, n.º 2, do CPTA). Não podia, assim, ter sido demandado na acção que correu termos no Brasil e, em consequência, o Estado português carece de legitimidade processual para a presente acção.

O raciocínio do Tribunal a quo quanto a esta matéria foi o seguinte:

Estabelece o art. 13º do CPC (que corresponde ao art. 7º do anterior CPC) que:

‘1 - As sucursais, agências, filiais, delegações ou representações podem demandar ou ser demandadas quando a ação proceda de facto por elas praticado.

2 - Se a administração principal tiver a sede ou o domicílio em país estrangeiro, as sucursais, agências, filiais, delegações ou representações estabelecidas em Portugal podem demandar e ser demandadas, ainda que a ação derive de facto praticado por aquela, quando a obrigação tenha sido contraída com um português ou com um estrangeiro domiciliado em Portugal.’.

‘As missões diplomáticas permanentes, nomeadamente as embaixadas, detêm funções de representação de um Estado estrangeiro acreditado noutro país, muito embora não sejam dotadas de autonomia jurídica em relação ao estado acreditado, pelo que se traduzem em entidades representativas do respetivo Estado soberano para os efeitos do disposto no artigo 7.º do CPC. (…)

Embora, a maior parte das hipóteses previstas digam respeito a extensões das sociedades comerciais, o certo é que a referência a delegações ou representações feita no normativo em foco não se restringe a estas, podendo, pois, abranger quaisquer pessoas colectivas de direito privado ou público.’ – Ac. RL de 17/05/2011, proc. nº 137/06.2TVLSB.L1-7, in www.dgsi.pt

Em suma, o Consulado geral de Portugal em S. Paulo, Brasil, réu na ação de onde provém a sentença revidenda, face à lei processual portuguesa (todas as normas invocadas pelo requerido integram a legislação portuguesa), enquanto detentor de funções de representação do Estado Português naquele país, podia ser demandado na referida ação, como foi, detendo personalidade judiciária, soçobrando assim a invocada consequente ilegitimidade do Estado português para a ação de revisão e confirmação.

O requerido invocou artº 8-A, nº 2 do CPTA, do seguinte teor: ‘Tem personalidade judiciária quem tenha personalidade jurídica, e capacidade judiciária quem tenha capacidade de exercício de direitos, sendo aplicável ao processo administrativo o regime de suprimento da incapacidade previsto na lei processual civil.’

Todavia o nº 3 do mesmo preceito dispõe que ‘Para além dos demais casos de extensão da personalidade judiciária estabelecidos na lei processual civil, os ministérios e os órgãos da Administração Pública têm personalidade judiciária correspondente à legitimidade ativa e passiva que lhes é conferida pelo presente Código.’

É o próprio CPTA que ressalva a aplicação do CPC, designadamente quanto aos casos de extensão da personalidade judiciária estabelecidos na lei processual civil, como é o caso do artº 13º do CPC”.

O entendimento do Tribunal da Relação afigura-se plenamente conforme à lei.

De acordo com o DL n.º 51/2021 de 15.06, um Consulado Geral é uma das modalidades de postos consulares, sendo que estes “são os serviços periféricos externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) dotados de atribuições na área consular que prosseguem os objetivos da política externa do Estado” (cfr. artigo 1.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 51/2021).

O Consulado Geral de Portugal em São Paulo é, pois, uma entidade com funções de representação do Estado português perante as autoridades brasileiras. E, não obstante não ter personalidade jurídica, beneficia da extensão da personalidade judiciária quando a acção proceda de acto por ela praticado, podendo, portanto, demandar e ser demandada, nos termos do já referido artigo 13.º, n.º 1, do CPC.

Porém, o exequatur que a requerente pretende que seja conferido à decisão revidenda para, subsequentemente, a executar em Portugal tem necessariamente de passar pelo presente pedido de revisão e confirmação e este tem de ser deduzido contra o Estado português, porquanto só à custa deste podem ser realizados os direitos que lhe foram reconhecidos naquela decisão.

Como se esclarece no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 4.10.20116, “[s]endo uma sentença um acto pelo qual se definem direitos, a atribuição de eficácia a uma sentença estrangeira coloca aquele a quem ela atribui direitos numa posição de, no território nacional, a fazer impor a quem aquela sentença constitui na obrigação de reconhecer aqueles direitos”.

Com interesse para o tema, leiam-se as palavras de Ferrer Correia7:

O acto formal de reconhecimento ou de exequatur não é outra coisa, no fundo, senão a condição necessária (conditio juris) para que a sentença estrangeira possa estender ao Estado do foro os efeitos que lhe competem: os seus efeitos de acto jurisdicional. Antes do exequatur, a sentença estrangeira não produz efeitos no Estado do foro, salvo aquele que se traduz na admissibilidade da própria acção de revisão: a sua eficácia encontra-se num estado de pendência. Quanto à sentença de confirmação, ela não tem valor constitutivo, a não ser na medida em que declara que todas as condições às quais a lex fori subordina o reconhecimento das sentenças estrangeiras se encontram preenchidas. O objectivo do processo de revisão não consiste, assim, na obtenção de uma sentença nacional idêntica à sentença estrangeira, mas de uma sentença nacional que permita que a decisão estrangeira opere na ordem jurídica do foro os efeitos que lhe são próprios, de acordo com a lei do estado de origem”.

Significa isto que, no âmbito do presente processo especial de revisão e confirmação de sentença estrangeira, a legitimidade passiva é aferida em função da finalidade, devendo ser deduzida contra aquele que a sentença revidenda constitui na obrigação de reconhecer os direitos em causa.

Por outras palavras, o pedido de revisão de sentença deve ser formulado contra quem pode ser afectado pelo deferimento deste pedido ou contra quem se pretende fazer valer a acção; ora, esta posição é, in casu, ocupada pelo Estado português.

Perante o exposto, não há dúvidas de que, face à lei processual portuguesa, o Consulado Geral de Portugal em São Paulo, Brasil, podia ser demandado na acção em que foi proferida a sentença revidenda e que o Estado português tem legitimidade passiva no presente processo especial de revisão e confirmação de sentença estrangeira.

Decai, por conseguinte, o recurso também nesta questão.

3. Da alegada natureza pública dos direitos objecto da sentença revidenda (cfr., sobretudo, conclusões J a M)

O recorrente alega que os direitos declarados na sentença revidenda a favor da recorrida têm natureza pública, afirmando, a este propósito, que “os direitos e deveres recíprocos [na relação de emprego público, os direitos e deveres da trabalhadora recorrida e do Estado Português Recorrente] não são privados, mas sim públicos”, concluindo que o Acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento no que toca à aplicação do artigo 978.º do CPC.

Dispõe-se no artigo 978.º, n.º 1, do CPC o seguinte:

Sem prejuízo do que se ache estabelecido em tratados, convenções, regulamentos da União Europeia e leis especiais, nenhuma decisão sobre direitos privados, proferida por tribunal estrangeiro, tem eficácia em Portugal, seja qual for a nacionalidade das partes, sem estar revista e confirmada”.

Retira-se deste preceito que o processo de revisão e confirmação de sentença estrangeira só pode ter por objecto decisões sobre direitos privados. Daí que seja essencial determinar a natureza dos direitos em causa.

Relativamente a esta questão, o Acórdão recorrido discorreu deste modo:

Pode ler-se no aresto do STJ de 25/01/2024, já citado: “O acórdão do STJ de 05-04-2022, Revista n.º 639/20.8YRLSB.S1, relatado pelo Conselheiro Henrique Araújo, já se pronunciou acerca do conceito “direitos privados”, no âmbito de processo de revisão de sentença brasileira que condenou o Estado Português ao pagamento de quantias correspondente a salários de trabalhadores de um Consulado de Portugal no Brasil. Neste aresto entendeu-se que a expressão “decisão sobre direitos privados” deve interpretar-se em termos amplos. Em face da clareza de exposição sobre esta matéria, transcrevemos parte deste aresto a propósito deste tema.

Veja-se o que escreve Luís de Lima Pinheiro, em "Direito Internacional Privado", Volume III, Tomo II, páginas 22 e 23, para clarificar as situações de exclusão da natureza privada:

"(...) não são privadas as situações que, por dizerem respeito a certas atividades públicas estrangeiras só podem ser objeto de regulação na ordem jurídica de um Estado estrangeiro e as situações que são primariamente conformadas por Direito público português. Assim, por exemplo, não são reconhecíveis ao abrigo do Direito de Reconhecimento Internacional Privado as decisões estrangeiras com caráter penal e as decisões proferidas por tribunais estrangeiros em violação da imunidade de jurisdição do Estado português.”

A decisão deve ter por objeto uma relação que no Estado de reconhecimento seja considerada 'privada', à luz do critério da posição dos sujeitos. Este critério relaciona-se com o jus imperii — uma prerrogativa de Direito Público, que designa “posição de autoridade" — faculdade de emitir comandos, gerais ou individuais, que se imponham a outrem, mesmo sem ou contra a vontade desses destinatários. Nesta perspetiva, Direito Público é o sistema de normas que, tendo em vista a prossecução de um interesse coletivo, confere para esse efeito a um dos sujeitos da relação jurídica poderes de autoridade sobre o outro. São de Direito Público as normas que regulam a organização e a atividade do Estado e de outros entes públicos menores, as relações desses entes públicos entre si no exercício dos poderes que lhes competem, bem como as relações dos entes públicos enquanto revestidos de poder de autoridade com os particulares; são de Direito Privado as normas que, visando regular a vida privada das pessoas, não confere a nenhuma delas poderes de autoridade, mesmo quando pretendam proteger um interesse público considerado relevante. No Direito Privado os sujeitos estão em posição de paridade: são relações entre particulares, ou entre os particulares e os entes públicos, quando estes não intervenham revestidos de jus imperii, fazendo com que atuem como se fossem particulares. A principal diferença entre direitos públicos e privados está, assim, nas relações de hierarquia ou de igualdade entre as partes envolvidas.”

No acórdão desta relação proferido em 27/10/2020, no processo de revisão de sentença estrangeira nº 639/20.8YRLSB-1, in www.dgsi.pt, que versou sobre sentença de tribunal de trabalho brasileiro que condenou o Consulado Geral de Portugal em S. Paulo, Brasil, a pagar a trabalhadores seus determinadas quantias, escreveu-se: “como ensina Luís de Lima Pinheiro a qualificação da decisão estrangeira como decisão sobre direitos privados é feita de acordo com o direito de reconhecimento português, “com base numa interpretação autónoma dos conceitos utilizados para delimitar a previsão da norma de reconhecimento.”

Nomeadamente, quanto ao carater privado da decisão, depois de concordar que o que importa é o objeto da mesma e não a natureza do tribunal que a proferiu, esclarece que “A decisão deve ter por objeto uma relação que no Estado de reconhecimento seja considerada “privada”. Para efeitos desta apreciação a relação tem de ser caraterizada juridicamente perante a ordem jurídica do Estado de origem. É uma qualificação segundo o Direito de reconhecimento do foro com base numa caraterização feita perante a ordem jurídica do Estado de origem.” Em resumo, “o carater privado da relação controvertida deve ser entendido com autonomia relativamente ao direito material interno”.

No caso concreto, face ao conteúdo das decisões a rever, que versam a relação laboral entre o Estado Português e trabalhadores seus a prestar serviço em território brasileiro, não se levanta qualquer questão quanto à qualificação desta relação de um empregador com os seus funcionários como privada, à luz do direito brasileiro e à luz do direito nacional.”

Ainda que a relação jurídica de natureza laboral estabelecida entre a requerente, pessoa singular, e o Consulado de Portugal em S. Paulo, Brasil, objeto da sentença, tenha num dos polos um ente público, a atuação deste não se mostra investida de jus imperii, pelo que a sentença revidenda versa sobre direitos privados, na aceção mencionada”.

A fundamentação expendida no Acórdão recorrido apresenta-se como a fundamentação adequada para a decisão correcta.

Com efeito, a relação jurídica em apreciação na sentença revidenda diz respeito à responsabilidade do Estado português perante pessoa singular no âmbito de contrato de trabalho.

Ora, os direitos desta trabalhadora perante a Administração Pública, se bem que regulados por normas de Direito administrativo [cfr. DL n.º 47/2013, de 5.04, que aprova o Regime Jurídico-Laboral dos Serviços Periféricos Externos do MNE e a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20.06], não podem ser qualificados como direitos de natureza pública.

Como se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27.10.20208, “no caso concreto, face ao conteúdo das decisões a rever, que versam a relação laboral entre o Estado Português e trabalhadores seus a prestar serviço em território brasileiro, não se levanta qualquer questão quanto à qualificação desta relação de um empregador com os seus funcionários como privada, à luz do direito brasileiro e à luz do direito nacional”.

A este propósito saliente-se a proximidade entre o vínculo de trabalho em funções públicas e o vínculo de trabalho em funções “privadas”, tal como resulta do artigo 4.º, n.º 1, da LTFP, que estatui: “É aplicável ao vínculo de emprego público, sem prejuízo do disposto na presente lei e com as necessárias adaptações, o disposto no Código do Trabalho e respetiva legislação complementar com as exceções legalmente previstas (…)”.

Seguindo de perto o raciocínio do tribunal recorrido, entende-se que, na relação laboral em causa, apesar de estarmos perante uma relação entre um ente público e um particular, o Estado português não se mostra investido, na sua actuação, do poder de império (jus imperii). Com efeito, para além da natureza privada dos direitos versados na decisão revidenda, o conflito prende-se com actos de gestão (privada) do Estado português, na medida em que este actua numa posição de paridade relativamente ao particular a que o contrato de trabalho respeita9.

Improcede, assim, também nesta parte, a argumentação do recorrente.

4. Da alegada violação da imunidade de jurisdição do Estado português (cfr., sobretudo, conclusões N a BB)

O recorrente vem ainda invocar a violação do princípio da imunidade de jurisdição, decorrente do princípio par in parem non habet judicium.

Como é comummente sabido, a imunidade de jurisdição é a impossibilidade de um Estado soberano ser sujeito à jurisdição dos tribunais de outro Estado quando esteja em causa o exercício por este do seu jus imperii.

Traduz-se esta imunidade no requisito negativo de jurisdição, de acordo com o qual o tribunal de um Estado não pode julgar outro Estado por actos por este praticados no exercício do seu jus imperii.

Quer isto dizer que a imunidade abrange os actos praticados pelo Estado que manifestam a sua soberania mas não já os actos de gestão tais como os que poderiam ter sido praticados por um particular.

Ora, o que aqui está em causa é, justamente, uma actuação do Consulado / Estado português no quadro do seu poder de gestão (jus gestionis).

Segundo o recorrente, o tribunal brasileiro teria violado a imunidade de jurisdição de que beneficia o Estado português, uma vez que ajuizou causa relacionada com o seu jus imperii, na medida em que só a autoridade de Estado permitira a celebração de contrato de trabalho em funções públicas com a ora recorrida. Este contrato é disciplinado por normas de Direito administrativo, sendo a resolução dos litígios dele emergentes da competência dos tribunais administrativos e fiscais, como decorre do disposto no artigo 12.º da LTFP, segundo o qual “[s]ão da competência dos tribunais administrativos e fiscais os litígios emergentes do vínculo de emprego público”.

Em contraste, diz-se no Acórdão recorrido:

1. A imunidade Jurisdicional dos Estados Estrangeiros constitui uma regra de direito internacional segundo a qual um Estado soberano não pode ser demandado num tribunal de um outro Estado, traduzindo, assim, uma garantia que o Estado disfruta em relação a si próprio e aos seus bens e que impede que outros Estados exerçam jurisdição sobre os atos que realiza no exercício do seu poder soberano.

2. -Na consolidação da teoria relativa da imunidade de jurisdição do Estado, dela se consideram atualmente excluídos os atos de gestão (respeitantes a atos e contratos privados), apenas sendo considerados atos de imunidade de jurisdição dos estados os praticados sob a denominação de atos de império.

3.- Aderindo à teoria da imunidade de jurisdição relativa, a Parte III da Convenção das Nações Unidas Sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e dos Seus Bens (CIJEB) prevê que em certos processos judiciais o Estado não possa invocar a imunidade, recusando-a quando estejam em causa transações comerciais, contratos de trabalho, danos causados a pessoas e bens, propriedade, posse e utilização de bens, propriedade intelectual ou industrial, participação em sociedade ou outras pessoas coletivas e navios de que um Estado é proprietário ou explora.

4.- A imunidade relativa, restringindo a imunidade da jurisdição dos estados estrangeiros aos atos praticados sob o ius imperii, pode já ser considerada como direito consuetudinário internacional.” – Ac. RC de 10/05/2016, proc. nº 2079/15.1T8CBR.C1, in www.dgsi.pt.

Na sentença revidenda foram apreciados direitos de crédito da requerente resultantes de vínculo jurídico laboral com o Consulado Geral de Portugal em S. Paulo, pelo que estão em causa atos de gestão do Estado Português - e não atos revestidos de ius imperii - não sendo aplicável a regra da imunidade de jurisdição.”.

A propósito da imunidade de jurisdição, escreve Lebre de Freitas que “Foi orientação jurisprudencial dominante nesta matéria a de, para além dos acta jure imperii, estender a imunidade de jurisdição dos Estados aos acta jure gestionis (ver, nomeadamente, Ac. do STJ de 27.2.62, Bravo Serra, BMJ, 114, p. 447, citando outra jurisprudência no mesmo sentido).

A orientação actual, tida em conta a evolução registada em diplomas internacionais mais recentes, ainda que não vinculativos para o Estado Português, é no sentido de restringir a imunidade aos acta jure imperii: já assim, obter dictum, no ac. do STJ de 4.2.97 (Fernando Fabião), CJ-STJ, 1997, I, p. 87 e BMJ, 464, p. 473; em decisão expressa, nos acs do STJ de 13.11.02 (Mário Torres), www.dgsi.pt, proc. 01S2172, e de 18.2.06 (Maria Laura Leonardo), www.dgsi.pt, proc. 05S3279”.

Antecipe-se já que a leitura do Acórdão recorrido é acertada.

Com relevância para este ponto, pode ler-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.12.201610:

Só quando um Estado atuar sem o jus imperium é que se entende que esse Estado pode ser responsabilizado noutro Estado e ser submetido à sua jurisdição.

Trata-se de um entendimento que pode ser considerado como uma norma consuetudinária de direito internacional público.

Esta imunidade relativa, imposta pelo recurso crescente ao direito privado por parte dos Estados, é considerada como a mais consentânea com a tendência atual no sentido de responsabilização dos poderes públicos por danos, contratuais ou extracontratuais, causados aos particulares”.

Veja-se ainda, com entendimento semelhante, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.05.201211:

I-O Direito Internacional Público comum (consuetudinário) prevê imunidades de jurisdição civil em relação aos Estados estrangeiros, às organizações internacionais e aos agentes diplomáticos, enquanto ao serviço de um Estado estrangeiro. Já não em relação às missões diplomáticas permanentes (vulgo, embaixadas);

II-A doutrina e a jurisprudência favorecem, hoje, uma concepção restritiva das imunidades de jurisdição dos Estados;

III-São, no entanto, sensíveis as dificuldades na concretização dos actos de gestão pública e dos actos de gestão privada, suscitando-se divisões entre os Estados sobre o critério distintivo a adoptar;

IV-A Convenção das Nações Unidas sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e dos seus Bens, aberta á assinatura em Nova York, em 17 de Janeiro de 2005, apesar de ainda não ter entrado em vigor, pode constituir uma base importante para os tribunais”12.

Também no plano da doutrina é predominante a defesa de uma concepção restritiva da imunidade de jurisdição dos Estados, advertindo-se para a necessidade de distinguir entre actos de gestão pública e actos de gestão privada.

A este propósito, Francisco Ferreira de Almeida13 defende que “quando o Estado estrangeiro for réu, haverá que distinguir entre actos de soberania ou de império (jure imperii) e actos de mera gestão (jure gestionis). Pelos primeiros, não se pode demandar um Estado estrangeiro (a não ser que este a tal se submeta). Já, pelos segundos (por ex. a aquisição de bens ou serviços no estrangeiro), será (mesmo sem renúncia à imunidade) sujeito à jurisdição (normal) como qualquer outra pessoa colectiva”.

Jónatas Machado14 segue idêntica posição, ao escrever:

a imunidade relativa, imposta pelo recurso crescente ao direito privado por parte dos Estados, é considerada por uma parte substancial da doutrina como a mais consentânea com a tendência actual no sentido da responsabilização dos poderes públicos por danos, contratuais ou extra-contratuais, causados aos particulares. Com efeito, tende a considerar-se que a imunidade não pode ser invocada, nomeadamente no caso de transacções comerciais, contratos de trabalho, responsabilidade civil por acções ou omissões danosas, questões de propriedade imobiliária, mobiliária ou intelectual, participações sociais, utilização de embarcações para fins não oficiais, sempre que os elementos de conexão relevantes se encontrem localizados no território do Estado do foro”.

No contexto do Direito internacional, e com relevância para a apreciação da matéria em causa, importa notar que, como demonstra o já referido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.05.2012, a imunidade de jurisdição do Estado foi objecto de regulação na Convenção das Nações Unidas sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e dos seus bens, aberta à assinatura em Nova York em 17 de Janeiro de 2005.

Pese embora a referida Convenção não se mostre ainda vigente com tratado internacional vinculativo em geral, a redacção aí proposta quanto aos processos judiciais nos quais os Estados não podem invocar imunidade não pode deixar de configurar um importante instrumento interpretativo quanto a esta matéria.

Ora, a Convenção refere-se, na sua Parte III, aos processos judiciais nos quais os Estados não podem invocar imunidade, aí incluindo expressamente os litígios relativos aos contratos de trabalho (cfr. artigo 11.º).

Aproveitando esta orientação para o caso concreto e na senda do defendido no Acórdão recorrido, tem-se por correcta a premissa de que, de acordo com o Direito internacional de fonte consuetudinária, não é de reconhecer a invocada imunidade de jurisdição quando em causa estão contratos de trabalho celebrados por Estados, suas representações ou seus serviços no exterior.

Neste sentido, e com relevância para a situação concreta em análise, veja-se ainda a posição firmada no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22.06.200515, onde se escreve:

Merece especial referência na jurisprudência portuguesa o Ac. do STJ de 13.11.2002, www.dgsi, que relativamente à questão de saber se, num determinado litígio laboral, está em causa um acto de soberania ou um acto de gestão, chama a atenção para a relevância das funções desenvolvidas pelo trabalhador em causa, importando saber se se trata de funções subalternas, ou de funções de direcção na organização do serviço público do Estado demandado, funções de autoridade ou de representação.

No caso, a Autora exercia as funções de secretariado da actividade da Delegação Comercial da embaixada da Áustria, sob as ordens do Sr. Conselheiro Comercial, Assim, o R. ao comunicar á A. a cessação do seu contrato de trabalho, agiu como um qualquer empregador privado, praticando um acto de gestão e não um acto de soberania, pelo que não beneficia, quanto a esse acto, da imunidade judiciária.”.

Versando também sobre revisão de sentença estrangeira em contexto de relação jurídico-laboral, veja-se o sumário Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10.05.200716:

I. A imunidade de jurisdição dos estados estrangeiros deve ter um âmbito restrito. O princípio da imunidade jurisdicional não se aplica quando o Estado é demandado na qualidade de sujeito de um negócio de direito privado, mas apenas quando o mesmo Estado intervém na relação jurídica na qualidade de Estado soberano, dotado de "jus imperii"

I. Importa atender às funções desenvolvidas pelo trabalhador – se eram funções subalternas ou funções de direcção na organização do serviço público do Estado, funções de autoridade ou de representação.

II. Atendendo às funções exercidas pelo Requerente, contratado como cozinheiro, conclui-se que, sendo as mesmas meramente subalternas, não podem considerar-se abrangidas pelo jus imperii. Tratou-se de um contrato de trabalho de natureza privada”.

Por último, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.01.202417:

Note-se que a circunstância de um dado litígio estar materialmente atribuído aos tribunais administrativos não é determinante para se considerar que o Estado ou entidade administrativa actuou munido de juz imperium, cfr. neste sentido Vieira de Andrade, in “A Justiça Administrativa”, 17.ª ed, 2019, pág. 94, citado no AUJ n.º 51012/18.6YIPRT-A.P1.S1-A, “(…) admite-se generalizadamente a atribuição legal aos tribunais administrativos da resolução de litígios referentes à atividade da Administração, ainda que respeitantes a relações ou incluindo aspetos de direito privado – assim, por ex. considerou-se admissível a atribuição à jurisdição administrativa da competência para julgar ações sobre contratos privados da administração (…), tendo em conta a miscigenação prática do direito público com o direito privado e a necessidade de assegurar o respeito pelos princípios públicos em toda a atuação administrativa (…)”.

Tendo em consideração tudo o que se acaba de expor, e em face da conclusão acima alcançada sobre a natureza privada dos direitos em causa na decisão revidenda, entende-se que o caso respeita à prática de actos de gestão do Estado português, não sendo aplicável a regra da imunidade de jurisdição.

Improcede, assim, a excepção de imunidade de jurisdição invocada pelo recorrente.

5. Da alegada fraude à lei (cfr., sobretudo, conclusões CC a GG)

Alega igualmente o recorrente existir violação do artigo 980.º, al. c), do CPC, uma vez que a sentença revidenda incidiu sobre matéria de exclusiva competência dos tribunais administrativos portugueses e proveio de tribunal estrangeiro cuja competência foi provocada em fraude à lei.

Segundo o recorrente, o tribunal de trabalho brasileiro proferiu sentença sobre litígio emergente de relação jurídica administrativa, disciplinada pelo DL n.º 47/2013, de 5.04, quando a competência exclusiva para tal compete aos tribunais administrativos.

Invoca o recorrente que a requerente litigou com má fé na acção interposta no Brasil, pretendendo obter ganhos em manifesta fraude à lei, uma vez que nos tribunais administrativos portugueses nunca conseguiria os resultados que conseguiu no Brasil: o Consulado Geral de Portugal em São Paulo não seria obrigado a anotar a opção da Requerente pelo FGTS na sua carteira de trabalho, nem a pagar o recolhimento de FGTS na conta vinculada, nem o subsídio de férias e o 13.º salário de 2012, já que as duas primeiras obrigações não existem no Direito administrativo português e todos os trabalhadores em funções públicas tiveram o pagamento dos seus subsídios de férias e 13.º mês (subsídio de Natal) cortados em 2012, por razões de ordem pública.

Conclui o recorrente que, ao dirigir-se aos tribunais de trabalho brasileiros, a requerente escolheu deliberadamente os tribunais onde as suas pretensões poderiam ser mais facilmente acolhidas, em detrimento dos tribunais administrativos portugueses, que seriam os internacionalmente competentes, nos termos do artigo 22.º do CPTA.

Sobre esta questão, o acórdão recorrido discorreu do seguinte modo:

Dispõe o art. 980.º, al. c) do CPC que “para que a sentença seja confirmada é necessário que provenha de tribunal estrangeiro cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais portugueses”.

Em anotação a este preceito escrevem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa, CPC Anotado, Almedina, vol. II, pág. 427, “exige-se que os tribunais portugueses não sejam exclusivamente competentes (art. 63º) e que a competência do tribunal estrangeiro não tenha sido provocada em fraude à lei, ou seja, que não tenha ocorrido uma manipulação de elementos de facto ou de direito dos quais dependa o estabelecimento da competência internacional do tribunal de origem (…).”

O art. 63.º do CPC estabelece as matérias que são da exclusiva competência dos tribunais portugueses:

“a) Em matéria de direitos reais sobre imóveis e de arrendamento de imóveis situados em território português; todavia, em matéria de contratos de arrendamento de imóveis celebrados para uso pessoal temporário por um período máximo de seis meses consecutivos, são igualmente competentes os tribunais do Estado membro da União Europeia onde o requerido tiver domicílio, desde que o arrendatário seja uma pessoa singular e o proprietário e o arrendatário tenham domicílio no mesmo Estado membro;

b) Em matéria de validade da constituição ou de dissolução de sociedades ou de outras pessoas coletivas que tenham a sua sede em Portugal, bem como em matéria de validade das decisões dos seus órgãos; para determinar essa sede, o tribunal português aplica as suas regras de direito internacional privado;

c) Em matéria de validade de inscrições em registos públicos conservados em Portugal;

d) Em matéria de execuções sobre imóveis situados em território português;

e) Em matéria de insolvência ou de revitalização de pessoas domiciliadas em Portugal ou de pessoas coletivas ou sociedades cuja sede esteja situada em território português.”

A matéria objeto da sentença revidenda não está abrangida por qualquer das alíneas do artº 63º do CC.

São do seguinte teor as normas invocadas pelo requerido:

- artº 212.º, n.º 3 da CRP: “Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.”

- artº 1.º, n.º 1 do ETAF: “Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais, nos termos compreendidos pelo âmbito de jurisdição previsto no artigo 4.º deste Estatuto”.

- artº 4º, nº 4, al. b) do ETAF: “ Estão igualmente excluídas do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios decorrentes de contratos de trabalho, ainda que uma das partes seja uma pessoa coletiva de direito público, com exceção dos litígios emergentes do vínculo de emprego público.”

- art. 12.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho: “são da competência dos tribunais administrativos e fiscais os litígios emergentes do vínculo de emprego público.”

- art. 13.º do CPTA: “O âmbito da jurisdição administrativa e a competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria”.

- artº 22º do CPTA: “Quando não seja possível determinar a competência territorial por aplicação dos artigos anteriores, é competente o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.”

Nenhuma destas normas atribui competência internacional exclusiva aos tribunais administrativos, não constituindo equivalente ao disposto no artº 63º do CC.

“… conforme já decidido no citado aresto do STJ de 05-04-2022, estas normas (…) não funcionam como critério de atribuição de competência internacional exclusiva, tarefa que se encontra atribuída tão só ao art. 63.º do CPC.

Também neste aresto se afastou a possibilidade de o art. 212.º, n.º 3, da CRP, funcionar como reserva de competência internacional exclusiva dos tribunais administrativos portugueses, e citando os constitucionalistas Jorge Miranda e Rui Medeiros, conclui que na doutrina dominante inexiste uma reserva absoluta material dos tribunais administrativos por força deste normativo, pelo que também não se mostra possível dali extrair uma reserva absoluta internacional de competência dos tribunais administrativos.” – citado ac. STJ de 25/01/2024.

Impõe-se concluir que a sentença não versa sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais portugueses.

No que respeita à questão suscitada relativamente à fraude à lei, o acórdão recorrido apresenta a seguinte argumentação:

A fraude à lei a que alude o artº 980º, al. c) do CPC respeita à competência do tribunal, distinta da fraude à lei na aplicação das normas de conflito a que se refere o disposto no artº 21º do CC.

Ora, os fundamentos invocados não são aptos a integrar o disposto na al. c) do artº 980º do CPC, pois não vem alegado que a requerente tenha manipulado elementos de facto ou de direito com a finalidade de provocar a competência do tribunal estrangeiro.

Acresce que os elementos constitutivos da fraude à lei invocados também não preenchem a previsão da norma do artº 21º do CC, concretamente que a requerente tenha criado situações de facto ou de direito com o intuito fraudulento de evitar a aplicação da lei que seria competente.”.

Aprecie-se a questão.

Conforme escreve Luís Correia de Mendonça18, citando Miguel Teixeira de Sousa,“só quando a competência dos tribunais portugueses for exclusiva para apreciação de um determinado objecto se justifica a recusa de reconhecimento da sentença estrangeira proferida sobre esse objecto por um tribunal que, segundo a jurisdição portuguesa não é competente Se assim não suceder, a jurisdição portuguesa, não podendo ignorar que a regra é a existência de competências concorrentes, aceita a competência do tribunal estrangeiro, pelo que qualquer decisão proferida nessa condições por esse órgão provém de tribunal competente segundo a norma de conflitos da jurisdição portuguesa”. Por outro lado, “a proveniência da decisão revidenda de outro tribunal que não aquele que possui uma competência exclusiva, não impede a revisão e confirmação da sentença pelos tribunais portugueses, pois que, perante a jurisdição portuguesa, deve ter-se por precludida a invocação da eventual incompetência do tribunal que proferiu aquela decisão”19.

Ora, tendo presente o elenco das matérias da exclusiva competência dos tribunais portugueses, tal como enunciadas no artigo 63.º do CPC, é visível que o objecto da decisão revidenda não está em causa.

Por outro lado, as normas de atribuição de competência previstas no ETAF, no CPTA e na restante legislação de Direito administrativo invocada pelo recorrente não funcionam como critério de atribuição de competência internacional exclusiva. Como se disse, esta matéria encontra-se exclusivamente regulada no artigo 63.º do CPC20.

No plano jurisprudencial atente-se ainda no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5.04.202221, em que se conclui que “só revela carácter exorbitante da competência do tribunal estrangeiro quando essa competência pessoal não apresente qualquer conexão pessoal ou territorial com a relação controvertida dirimida na sentença revidenda, nem resulte da autonomia da vontade, do critério dos efeitos ou do critério da necessidade22.

No caso concreto, a acção que correu termos no tribunal brasileiro respeita a uma trabalhadora ao serviço do Estado português que exercia a sua actividade no estado brasileiro e aí residia, sendo estes, inequivocamente, dois elementos de conexão significativos.

Conclui-se, portanto, que a competência do tribunal de origem não foi provocada com fraude à lei nem com violação das regras de competência exclusiva dos tribunais portugueses.

6. Da alegada violação da ordem pública portuguesa (cfr., sobretudo, conclusões HH a UU)

Invoca, por fim, o recorrente que a sentença a rever ofende a ordem pública internacional do Estado português porque envolve a aplicação da lei laboral brasileira a relações jurídicas às quais é aplicável o Direito administrativo português, pelo que o Acórdão recorrido padece de erro de julgamento, por violação dos artigos 209.º, n.º 1, als. a) e b), 211.º, n.º 1, e 212.º, da CRP bem como dos artigos 22.º, n.º 1, do CC e 980.º, al. f), do CPC.

O Tribunal recorrido dedicou grande atenção a esta questão, respondendo de uma forma que merece integral concordância.

Diz-se no Acórdão recorrido:

(…) “Só há que negar a confirmação das sentenças estrangeiras quando contiverem em si mesmas, e não nos seus fundamentos, decisões contrárias à ordem pública internacional do Estado Português – núcleo mais limitado que o correspondente à chamada ordem pública interna, por aquele historicamente definido em função das valorações económicas, sociais e políticas de que a sociedade não pode prescindir, e que opera em cada caso concreto para afastar os resultados chocantes eventualmente advenientes da aplicação da lei estrangeira.” (Ac. STJ de 21/02/2006, proc. nº 05B4168, in www.dgsi.pt).

Por tratar de situação idêntica, transcrevemos os fundamentos expostos no acórdão desta Relação, proferido em 27/10/2020, já citado, com os quais concordamos:

As relações jurídicas sobre as quais as decisões se debruçaram, ou seja, a relação entre os funcionários dos serviços periféricos externos do Estado Português e este, nesta veste de empregador, são materialmente direito laboral, seja em Portugal, seja no Brasil.

Como já referimos, a estes trabalhadores aplica-se, por via do disposto no art. 2º nº1 do Decreto-Lei n.º 47/2013, de 5 de abril, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.

Este diploma regula o vínculo de trabalho em funções públicas (art. 1º nº1), remetendo parte desse regime para o Código do Trabalho (que, em Portugal, regula o “direito privado laboral”), nos termos do respetivo art. 4º.

Mas, especificamente quanto à aplicação desta lei aos serviços periféricos externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, estabelece o nº5 do art. 1º do diploma que: «A aplicação da presente lei aos serviços periféricos externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, relativamente aos trabalhadores recrutados para neles exercerem funções, incluindo os trabalhadores das residências oficiais do Estado, não prejudica a vigência:

a) Das normas e princípios de direito internacional que disponham em contrário;

b) Das normas imperativas de ordem pública local;

c) Dos instrumentos e normativos especiais previstos em diploma próprio.

Ou seja, mesmo em termos de direito interno, o direito público aplicável ao caso concreto admite, quanto a certos aspetos, a aplicação de direito “privado” (no sentido de não público) às relações de emprego publico e, concretamente, quanto às concretas relações de emprego público do caso concreto admite a aplicação de normas imperativas de ordem pública local, sem distinguir, obviamente, se tais normas serão de natureza privada ou pública.

O único princípio que conseguimos retirar das normas internas é de que, por regra, às relações de emprego público se aplica direito público, mas que a essas relações também se pode, em determinadas circunstâncias, aplicar direito privado.

Assim sendo, não conseguimos concluir pela existência de um princípio estruturante do sentido ético-normativo da ordem jurídica interna com o conteúdo alegado que obrigue, por via da cláusula de reserva da ordem pública internacional, ao afastamento da aplicação de direito privado laboral estrangeiro a relações jurídicas às quais é domesticamente aplicável o direito público português.

Passando ao segundo segmento da alegação dirigida à invocação da reserva de ordem pública internacional, verifica-se que o princípio alegado como violado é uma regra constitucional que tutela direitos fundamentais, o princípio da igualdade, pelo que sempre termos que verificar se, com esta decisão, resulta uma desigualdade material.

O requerido argumenta a existência de desigualdade no afastamento da lei portuguesa pelos tribunais de trabalho brasileiros dado que a lei afastada por aqueles tribunais foi aplicada igualmente a todos os restantes trabalhadores da administração pública portuguesa.

O princípio da igualdade, encontra-se consagrado na CRP nos seguintes termos: Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei (art. 13º, nº 1, concretizando o nº 2 do preceito este princípio geral).

A proteção conferida por este direito abrange a proibição do arbítrio (proíbe diferenciações de tratamento sem justificação objetiva razoável ou identidade de tratamento em situações objetivamente desiguais) e da discriminação (não permite diferenciações baseadas em categorias subjetivas ou em razão dessas categorias).

Na sua vertente de proibição de arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controlo: nem aquilo que é fundamentalmente igual deve ser tratado arbitrariamente como desigual, nem aquilo que é essencialmente desigual deve ser arbitrariamente tratado como tal.

Valendo como princípio objetivo de controlo esta regra “não significa em si mesma, simultaneamente, um direito subjetivo público a igual tratamento, a não ser que se violem direitos fundamentais de igualdade concretamente positivados (por exemplo, igualdade dos cônjuges) ou que a lei arbitrária tenha servido de fundamento legal para atos da administração ou da jurisdição lesivos de direitos e interesses constitucionalmente protegidos.”

Na vertente de proibição de discriminações a regra não significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciações de tratamento. “O que se exige é que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da proporcionalidade, da justiça e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo constitucionalmente impróprio.”

Gomes Canotilho e Vital Moreira sublinham ainda que as decisões mais recentes do Tribunal Constitucional continuam a assinalar corretamente que o princípio da igualdade obriga a que se trate por igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, não impedindo a diferenciação de tratamento, mas apenas as discriminações arbitrárias, irrazoáveis, ou seja, as distinções de tratamento que não tenham justificação e fundamento material bastante, sendo o ponto central da discussão em torno do princípio da igualdade “saber se existe fundamente material bastante para diferenciações de tratamento jurídico, o que nem sempre é fácil de averiguar…”

No caso concreto temos trabalhadores dos serviços periféricos externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros que, prestando o seu trabalho no Brasil, se entenderam prejudicados por um ato regulamentar (Decreto Regulamentar nº 3/2013) que procedeu à indexação dos salários dos reclamantes a cotação fixa do euro a partir de setembro de 2013.

Este ato, aplicado a todos os trabalhadores dos serviços periféricos externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros em todos os locais e países onde estes se encontram, regulamenta o disposto no nº1 do art. 12º do Decreto-Lei n.º 47/2013 de 27 de abril - «As tabelas remuneratórias dos trabalhadores dos SPE do MNE, fixadas por país e por categoria, em euros, salvo nos casos em que seja obrigatório o pagamento na moeda local, são aprovadas por decreto regulamentar, o qual deve estabelecer os respetivos critérios.»

Os trabalhadores a prestar serviço no Brasil estão numa situação objetivamente diversa dos demais trabalhadores da administração pública portuguesa e mesmos dos demais trabalhadores dos serviços periféricos do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

A própria lei reconhece a diversidade destes trabalhadores em relação aos demais trabalhadores da administração pública (com a regra do art. 12º do Decreto-Lei n.º 47/2013) e reconhece mesmo a diferenciação destes trabalhadores entre si, de local para local, de país para país, ao prever, no nº4 do já referido art. 12º que: «Em caso de acentuada perda de poder de compra em qualquer país pelo efeito isolado ou conjugado da inflação e da variação cambial, designadamente quando se verifique que a remuneração base mensal é inferior ao salário mínimo local, pode haver lugar à revisão intercalar das respetivas tabelas remuneratórias.»

Não pode, assim, argumentar-se com a violação do princípio da igualdade entre estes específicos trabalhadores representados da requerente e todos os demais trabalhadores da administração pública portuguesa.

E a ausência de similitude que permitisse a conclusão pela violação do princípio da igualdade resulta, quanto a nós, tanto mais evidente quanto o resultado que se entende violador é uma sentença judicial.

A sentença revidenda não formou caso julgado em relação a todos os outros trabalhadores da administração pública portuguesa, nem o formou sequer em relação aos demais trabalhadores dos serviços periféricos externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Nem nunca o poderia fazer, pois enquanto que, por via do comando constitucional, a lei não pode operar discriminações, um processo judicial não obedece à mesma lógica, porque o tribunal julga um caso em concreto e não todos os outros casos equiparáveis existentes.

O princípio constitucional da igualdade não exige a qualquer tribunal, nacional ou estrangeiro, que julgue como se legislasse, não sendo esse o alcance do preceito constitucional em causa. Assim, por esta via não surpreendemos igualmente qualquer fundamento para fazer operar a cláusula de reserva de ordem pública internacional do Estado português.”

Em suma, não se observa que o reconhecimento da sentença do tribunal de trabalho brasileiro conduza a um resultado manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado Português.”.

O Tribunal recorrido segue de perto o entendimento vertido no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27.10.2020 (já citado).

Em reforço das conclusões alcançadas, leia-se o que escrevem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa23 a propósito da al. f) do art. 980.º do CPC:

É mister cindir a ordem pública internacional da ordem pública interna, abrangendo esta princípios e normas imperativas que limitam a autonomia privada (art. 280.º, n.º 2, do CC), enquanto aquela “exprime um conjunto de princípios nacionais que vedam a aceitação interna de decisões estrangeiras, por contrariedade a valores muito significativos” e profundos do direito interno (art. 22.º do CC, cf. Menezes Cordeiro, Tratado da Arbitragem, pp. 445-446)”.

A excepção de ordem pública internacional / reserva de ordem pública visa impedir a aplicação de uma norma estrangeira que, pela via indirecta da execução de sentença estrangeira, conduza, no caso concreto, a um resultado intolerável.

A excepção é aferida em função do possível resultado da aplicação da norma estrangeira no caso concreto, não comportando juízo de desvalor sobre a norma.

Por outras palavras: para concluir pela violação ou não dos princípios de ordem pública internacional importa atender ao resultado da aplicação da lei estrangeira ao caso concreto, mas atender a este resultado com o intuito de impedir que se concretize um resultado intolerável (e não apenas diferente da solução que seria encontrada mediante aplicação do direito nacional) ou uma contradição flagrante com os princípios fundamentais e inderrogáveis da lei nacional24.

O Direito internacional privado assenta no princípio da tolerância para com as regras do sistema jurídico estrangeiro, do respeito pela diversidade de regulamentações e do reconhecimento da diferença entre as várias ordens jurídicas25.

Quer isto dizer, em suma, que a aplicação de Direito privado laboral estrangeiro a uma relação jurídica à qual é internamente aplicável, em regra, o Direito público português, não constitui, por si só, uma violação da ordem pública internacional.

Mais precisamente, não pode considerar-se ofensiva do princípio constitucional da igualdade uma decisão judicial que aplica a uma determinada trabalhadora dos serviços periféricos externos do MNE no Brasil condições diversas das de outros trabalhadores da administração pública portuguesa exclusivamente em função do circunstancialismo do caso concreto.

Note-se que é a própria lei a diferenciar, em termos de tratamento jurídico, estes trabalhadores dos demais trabalhadores da administração pública, ponto que é devidamente assinalado na decisão recorrida.

Em conclusão, não se vislumbra que o resultado do reconhecimento da sentença revidenda colida de uma forma intolerável com os princípios e as normas fundamentais da ordem jurídica portuguesa, designadamente com os consagrados no Direito da União Europeia ou em quaisquer convenções internacionais em vigor na ordem jurídica portuguesa ou na CRP, pelo que a alegação em contrário do recorrente tem de improceder.


***


Tudo visto, impõe-se julgar totalmente improcedente o recurso.

*


III. DECISÃO

Pelo exposto, nega-se provimento à revista e confirma-se o Acórdão recorrido.


*


Custas pelo recorrente.

*


Lisboa, 23 de Outubro de 2025

Catarina Serra (relatora)

Isabel Salgado

Maria da Graça Trigo

__________





1. Cfr. Abrantes Geraldes / Paulo Pimenta / Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil anotado, Vol. II, Coimbra, Almedina, 2020, pág. 432.↩︎

2. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.07.2011 (Proc. 987/10.5YRLSB.S1) (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/146e58c5f2016691802578db003c7862?OpenDocument).↩︎

3. Pode ver-se ainda, no mesmo sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2.07.2020 (Proc. 224/18.4YRGMR.S1) (não publicado no site da DGSI), cujo sumário é: “I - O nosso sistema de reconhecimento das sentenças estrangeiras é informado pelo princípio da revisão predominantemente formal, ou seja, pelo controlo da regularidade formal ou extrínseca da sentença estrangeira, que dispensa a apreciação dos seus fundamentos de facto e de direito. II - Deve tão-somente tomar-se em linha de conta a decisão contida na sentença estrangeira e não os respectivos fundamentos, como era geralmente entendido na vigência da versão anterior do preceito, por ser mais compatível com o nosso sistema de controlo das sentenças estrangeiras, que é fundamentalmente de revisão formal (ou de delibação). E pode ver-se também o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2.12.2020 (Proc. 1289/19.7YRLSB.S1) (não publicado no site da DGSI), cujo sumário é: “I - O regime interno do direito português, excluídas convenções e outras fontes internacionais, consagra um sistema de simples revisão formal das decisões estrangeiras. II - Na ação de revisão e confirmação de sentença apenas se verifica se a decisão estrangeira está em condições de produzir efeitos em Portugal, isto é, se se verificam os requisitos taxativamente indicados nos arts. 978.º e ss. do CPC. III - O requerente necessita deste processo para a tutela do seu direito de ver reconhecida e confirmada a sentença estrangeira em que foi parte. IV - As decisões que respeitem ao exercício das responsabilidades parentais não são definitivas e podem ser sempre alteradas desde que se verifiquem factos ou circunstâncias que tenham aptidão a preencher a superveniência legitimadora de uma alteração. V - Mesmo revista a decisão dos autos, a recorrente sempre pode invocar/opor que há uma decisão posterior que regulamenta o exercício das responsabilidades parentais e alegar que a decisão que o requerente pretende seja revista, foi alterada por outra. Mas tal circunstância não é obstáculo à revisão”. Por fim, vejam-se ainda os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23.03.2021 (Proc. 2652/19.9YRLSB.S1) (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/6fa02bf0ff9e6574802586a1005a9d74?OpenDocument), e de 25.01.2024 (Proc. 1932/22.0YRLSB.S1) (https://juris.stj.pt/1932%2F22.0YRLSB.S1/gUzDaiKftcQLSGxfepU23sqi8cs?search=tc1do90CvpTnGptchvo).↩︎

4. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.04.2004 (Proc. 04B705) (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b19fac13bf00794e80256e99003f6364?OpenDocument).↩︎

5. A posição que se aqui acolhe foi igualmente adoptada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.01.2024 (Proc. 1932/22.0YRLSB.S1) (já citado), no qual, sobre o mesmo tema, se afirmou que “inexistindo norma que preveja que as sentenças estrangeiras sejam revistas e confirmadas nos tribunais administrativos, essa competência está atribuída aos tribunais comuns, concretamente, às secções dos Tribunais da Relação”.↩︎

6. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 4.10.2011 (Proc. 529/11.5YRLSB-1) (https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/33a5dfbd5ec8fb9480257941004ae569?OpenDocument).↩︎

7. Cfr. Ferrer Correia, Lições de Direito Internacional Privado - Aditamentos, Coimbra, 1973, pp. 45-46.↩︎

8. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27.10.2020 (Proc. 639/20.8YRLSB-1) (https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/827b6d97a4d9aa328025861f004f1e74?OpenDocument).↩︎

9. Neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5.04.2022 (Proc. 639/20.8YRLSB.S1) (não publicado no site da DGSI).↩︎

10. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.12.2016 (Proc. 25603/21.6T8LSB.L1.S) (https://juris.stj.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2016:2079.15.1T8CBR.C1.S1.9E?search=ZZwrdFMnQdC7U0jm-t8).↩︎

11. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.05.2012 (Proc. 137/06.2TVLSB.L1.S1) (https://juris.stj.pt/ecli/ECLI:PT:STJ:2012:137.06.2TVLSB.L1.S1.EC?search=hkR2vXK2dF9l5dcq_fE).↩︎

12. No mesmo sentido, vejam-se os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19.01.2023 (Proc. 25603/21.6T8LSB.L1.S1) (http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/9e4e95a984a78e16802589400059d275?OpenDocument), de 15.05.2013 (Proc. 2807/10.1TVLSB.S1) (não publicado no site da DGSI), de 29.05.2012 (Proc. 137/06.2TVLSB.L1.S1) (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/47AAB1D40FB6DE5180257A3200341C01), de 4.02.1997 (Proc. 809/96) (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b5792135ad656ab9802568fc003b6015?OpenDocument), de 25.11.2014 (Proc. 1298/13.0TTLSB.L1.S1) (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/2494d0bd1a82f0d280257dab005d4332?OpenDocument), de de 4.06.2014 (Proc. 2075/12.0TTLSB.L1.S1) (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/581e6b6b0905e3cc80257cee0032fccd?OpenDocument), e de 25.01.2024 (Proc. 1932/22.0YRLSB.S1) (já citado). Conforme se observa neste último, só no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.12.2006 (respeitante à responsabilidade do Estado por erro judiciário) e em dois acórdãos que respeitam à condenação de Estado estrangeiro no pagamento de serviços de saúde (os referidos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19.01.2023 e de 29.05.2012) é que foi declarada a excepção dilatória de imunidade jurisdicional, por se entender que as relações entre as partes estavam aí reguladas por normas de direito público, dirigidas exclusivamente aos titulares de um poder de autoridade ou de soberania, para lhes atribuir direitos especiais ou para lhes impor deveres especiais.↩︎

13. Cfr. Francisco Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. I, 3.ª edição, Coimbra, Almedina, 2022, pp. 472-473.↩︎

14. Cfr. Jónatas Machado, Direito Internacional – Do Paradigma Clássico ao pós 11 de Setembro, 4.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2013, pp. 240-241.↩︎

15. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22.06.2005 (Proc. 2014/2005-4) (https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/599ed61db9fbf91b8025708400523244?OpenDocument).↩︎

16. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10.05.2007 (Proc. 750/2007-6) (https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/6dddf2103e33f61f802572fe003a0bbf?OpenDocument).↩︎

17. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.01.2024 (Proc. 1932/22.0YRLSB.S1) (https://juris.stj.pt/1932%2F22.0YRLSB.S1/gUzDaiKftcQLSGxfepU23sqi8cs?search=tc1do90CvpTnGptchvo).↩︎

18. Cfr. Luís Correia de Mendonça, “Acção de Delibação”, O Direito, 2020, III, pp. 510 e 511.↩︎

19. No sentido de que na interpretação da al. c) do art. 980.º do CPC se exige apenas que os tribunais portugueses não sejam exclusivamente competentes e que a competência do tribunal de origem da sentença a rever não tenha sido provocada em fraude à lei, veja-se também Abrantes Geraldes / Paulo Pimenta / Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil anotado, cit., pp. 426 e s.↩︎

20. Neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.01.2024 (já diversas vezes citado).↩︎

21. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5.04.2022 (Proc. 639/20.8YRLSB.S1) (não publicado no site da DGSI).↩︎

22. Cfr., no mesmo sentido, Luís de Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado, Vol. III, Tomo II, Lisboa, AAFDL, 2019, p. 222.↩︎

23. Cfr. Abrantes Geraldes / Paulo Pimenta / Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil anotado, cit., pp. 428 e s.↩︎

24. Neste sentido, vejam-se os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 31.01.2021 (Proc. 585/22.0YRLSB.S1) (http://www.gde.mj.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a38ccb604133f4cc80258949003adf3e?OpenDocument), de 22.04-.2021 (Proc. 78/19.3YRLSB.S1) (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/cbdfaf11274e5d1c802586d800470bea?OpenDocument&ExpandSection=1), e de 23.09.2021 (Proc. 2247/20.4YRLSB.S1) (http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0ad9a653d026b8da8025875a0033f0c4?OpenDocument&Highlight=0,2247%2F20.4YRLSB.S1).↩︎

25. Veja-se a propósito o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.09.2021 (Proc. 2247/20.4YRLSB.S1) (https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0ad9a653d026b8da8025875a0033f0c4?OpenDocument).↩︎