Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 1ª SECÇÃO | ||
Relator: | MARIA CLARA SOTTOMAYOR | ||
Descritores: | IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO REAPRECIAÇÃO DA PROVA LEI PROCESSUAL VIOLAÇÃO DE LEI PODERES DA RELAÇÃO EXAME CRÍTICO DAS PROVAS DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO TESTAMENTO DOCUMENTO AUTÊNTICO PROVA POR DECLARAÇÕES DE PARTE PROVA PERICIAL BAIXA DO PROCESSO AO TRIBUNAL RECORRIDO NULIDADE DE ACÓRDÃO | ||
Data do Acordão: | 11/12/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | ANULADO O ACÓRDÃO RECORRIDO E BAIXA DO PROCESSO | ||
Sumário : | I - A avaliação da prova não pode ser considerada desligada da forma da sua produção. II - Ainda que o Supremo não tenha competência para controlar o conteúdo e o resultado dessa prova de livre apreciação, pode controlar o procedimento usado para a sua produção. A correção desse procedimento aumenta a fiabilidade da produção da prova e a probabilidade de a formação da convicção do juiz o conduzir à verdade material. III - O controlo pelo Supremo do mau uso pela Relação dos seus poderes quanto à matéria de facto, deve estender-se para além das situações de remissão para a fundamentação da sentença do tribunal de 1.ª instância, de modo a abranger aquelas outras em que o Tribunal da Relação altera a factualidade provada e não provada sem proceder a uma análise crítica e global da prova. | ||
Decisão Texto Integral: | Processo n.º 2499/17.7T8AVR.P1.S1 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - Relatório 1. AA, residente na Rua ..., em ..., instaurou a presente ação, com processo comum, contra BB, residente na Rua ..., ..., pedindo: a) que seja reconhecida e declarada judicialmente a propriedade da A. sobre o prédio urbano sito em ..., Rua ..., União das Freguesias de ..., ... e ..., inscrito na matriz respetiva sob o artigo ...33 daquela União de Freguesias e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...13 da freguesia de ..., composto por casa de habitação, garagem, jardim e logradouro; b) a condenação do R. a restituir definitivamente a posse do prédio urbano descrito na alínea anterior; c) a condenação do R. a pagar uma indemnização à A. no valor global de € 10.600,00. Articula, para o efeito, que é dona e legítima possuidora do prédio urbano sito em ..., Rua ..., União das Freguesias de ..., ... e ..., inscrito na matriz respetiva sob o artigo ...33 daquela União de Freguesias e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...13 da freguesia de ..., tendo adquirido a propriedade e posse deste prédio por óbito de seu pai CC. Em meados do ano de 2008, a A. anuiu em coabitar com o R. nessa sua identificada propriedade e residência. Porém, passado pouco tempo do início dessa coabitação, as relações entre A. e R. foram-se deteriorando irreversivelmente, designadamente pela violência das atitudes do R. bem como pelas sérias ameaças à integridade física e psicológica que o R. ia fazendo à A. Esta passou a viver em permanente e insuportável clima de terror e a 29/10/2015 viu-se coagida a abandonar a sua residência para obviar à insuportável violência psicológica de que vinha sendo vítima. O R. ocupou ilegitimamente, contra a vontade da A., a residência desta, durante 14 meses. O valor de renda de imóvel com as mesmas características é de cerca de € 400,00, pelo que deverá o R. indemnizar a A. em € 5.600,00. A A. passou a habitar sozinha num quarto arrendado e passou a ser uma pessoa triste, chorosa e isolada, tudo lhe causando um enorme sofrimento, medo, humilhação e vergonha, devendo ser ressarcida em € 5.000,00, a título de danos não patrimoniais. 2. O R., na contestação que apresentou, defendeu que o que a A. herdou de seu pai foi apenas uma vinha sita na Rua ..., .... A A. e o R. começaram a viver juntos, como marido e mulher, em outubro de 2003, numa pequena casa de que a A. era arrendatária em .... E em finais de 2005 tomaram, de comum acordo, a decisão de construir uma moradia no terreno a vinha herdado pela A., aplicando nessa construção as disponibilidades financeiras de que cada um dispunha ou viesse a dispor. Com esse objetivo o R. aplicou na dita construção todas as economias que nessa data possuía, no valor de € 40.000,00, e ainda tudo quanto conseguiu poupar dos seus rendimentos de trabalho, ao longo dos cerca de 10 anos que se seguiram, durante os quais a relação marital se manteve. O R. auferia um salário mensal de cerca de € 1.000,00, enquanto que a A. não ganhava mais de € 570,00/mês. O R. aplicou, ainda, na dita obra, ao longo dos dois anos que demorou a sua construção, todo o seu tempo livre, trabalhando como pedreiro, pintor e ajudante dos diversos técnicos que trabalharam na obra, num total de mais de 1.500 horas de trabalho, o que corresponde a um valor global de trabalho do reconvinte de cerca de € 9.000,00, calculado à razão de € 6,00/hora. A A. e o R. pediram um empréstimo à Caixa Geral de Depósitos, do qual utilizaram o montante de € 95.000,00, empréstimo que vêm pagando, em partes iguais, em prestações mensais de € 220,00, tendo pago cada um, até à presente data, a quantia de € 7.717,14. Na construção da moradia em causa, respetivos muros de vedação, anexos, pátios, poço, canil e arranjos envolventes foram gastos mais de € 180.000,00, tendo sido desembolsados pelo reconvinte os € 85.000,00 gastos na construção para além dos € 95.000,00 do empréstimo bancário. O casal possuía uma aplicação financeira na CGD, no valor de € 25.000,00, tendo a A., na data do vencimento da referida aplicação, transferido para uma conta de que é titular a totalidade daquele dinheiro e, ainda, os frutos civis no valor de € 1.100,00. E deduziu pedido reconvencional requerendo: I - a) que seja reconhecido ao reconvinte, nos termos do nº 1 do artigo 1340.º do Código Civil, o direito a haver para si o prédio identificado no artigo 1.º da petição inicial, mediante o pagamento, pelo reconvinte à reconvinda, da quantia de € 17.717,14, correspondente ao valor do terreno e das obras nele realizadas e pagas pela reconvinda, importância a que deverá ser deduzida a quantia de € 13.050,00 pertencente ao Reconvinte, que a Reconvinda mantém em seu poder, conforme alegado em 60.º a 63.º da contestação, assumindo, ainda, o reconvinte a responsabilidade pelo pagamento integral da quantia em dívida à CGD; b) a condenação da Reconvinda a reconhecer o direito de propriedade do Reconvinte sobre o mencionado prédio; c) a condenação da Reconvinda a entregar, de imediato, o prédio em causa ao Reconvinte, livre de pessoas e bens; d) o cancelamento do registo de qualquer direito da reconvinda sobre o prédio em questão. II - Quando assim se não entenda, deverá a Reconvinda ser condenada: e) a pagar ao Reconvinte a quantia global de € 101.717,14, correspondendo ao valor, em dinheiro e mão-de-obra, por este aplicado na moradia, quantia a que acrescerão juros de mora, à taxa legal, sobre o referido valor, desde a notificação do presente pedido até integral pagamento; f) a reembolsar o Reconvinte de todas as quantias que este venha a ter de pagar à Caixa Geral de Depósitos, com referência ao empréstimo para construção de habitação, igualmente com juros, à taxa legal, desde a data em que tiver sido efetuado o pagamento, até integral reembolso; g) a restituir ao Reconvinte a quantia de € 13.050,00, correspondente a metade do valor das aplicações financeiras do casal, de que se apoderou. 3. A A., na réplica, defende que o R. sempre se confrontou com constantes problemas pecuniários e por isso era a A. quem, com a ajuda da mãe, pagava a grande maioria dos encargos do quotidiano, incluindo as rendas da residência onde ambos habitavam antes de se mudarem para a moradia objeto destes autos, bem como as prestações do empréstimo bancário. O terreno onde foi implantada a moradia tinha, à data do início da construção, um valor não inferior a € 30.000,00. O Reconvinte acordou com a Reconvinda dar-lhe de empréstimo o valor de € 45.000,00, montante que seria entregue em frações mensais de valor equivalente a metade da fração mensal a pagar à instituição bancária à qual seria solicitado um mútuo de € 95.000,00. A aplicação financeira referida nos artigos 60.º a 63.º da contestação é bem próprio da Reconvinda. 4. Foi proferido despacho saneador e foram elaborados os temas da prova. Procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais. 5. Oportunamente foi proferida sentença na qual se decidiu: “Nos termos e pelos fundamentos expostos: 1º – declaro dissolvida desde outubro de 2015 a união de facto existente entre A. e R.; 2º - julgo a ação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência: a) declaro a A. AA legítima proprietária do prédio urbano sito na Rua ..., ..., União das Freguesias de..., ... e ..., inscrito na matriz respetiva sob o artigo ...33 daquela União de Freguesias e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...13 da freguesia de ..., composto por casa de habitação, garagem, jardim e logradouro; b) condeno definitivamente o R. a restituir à A. a posse do referido prédio; c) condeno o R. a pagar à A. a quantia de € 2.500,00, por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação e até integral pagamento. Absolvo o R. do restante pedido deduzido. 3º - Julgo a reconvenção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência, condeno a A.: a) a restituir ao R. € 13.000,00; b) a pagar ao R. o trabalho deste como ajudante de pedreiro, de pintor e dos diversos técnicos que trabalharam na obra, em grande parte do seu tempo livre, ao longo dos dois anos que demorou a construção da mesma, relegando-se para incidente de liquidação, o apuramento das horas despendidas pelo R. com este trabalho, que não pode exceder as 1.500 horas pedidas; c) a pagar ao R. as despesas suportadas por este com as construções e a pintura referidas em 19 dos Factos Provados, cujo apuramento se relega para incidente de liquidação; d) a pagar ao R. metade do valor das prestações do empréstimo que A. e R. contraíram para a construção da moradia durante o período em que as mesmas foram suportadas pelo R. (desde a data da concessão do empréstimo e até janeiro, inclusive, de 2017); e) juros de mora, à taxa legal, a partir da notificação à A. da reconvenção apresentada e até integral pagamento. Absolvo a A. dos restantes pedidos reconvencionais deduzidos. Custas por A. e R., que se fixam, para já, em 1/3 para a A. e 2/3 para o R.. Registe e notifique.” 6. Desta sentença apelou a autora a título principal, invocando que o réu deve ser condenado a pagar à autora €5.600 pela ocupação do imóvel e que a compensação por danos morais nunca deve ser inferior a €5000. O Réu apresentou recurso subordinado, peticionando modificação da matéria e facto e condenação da autora a pagar, ao Recorrente, metade de todos os encargos por este suportados com o empréstimo bancário, a restituir ao Recorrente metade do saldo da aplicação financeira, na Caixa Geral de Depósitos, de que ambos eram titulares e a absolvição do Recorrente do pagamento de qualquer indemnização, por danos morais, à Recorrida, ou, quando assim não se entenda, a redução do valor indemnizatório arbitrado na sentença recorrida acompanhada de juros de mora desde a decisão e não desde a citação. 7. O acórdão da Relação, após ter procedido a alterações à matéria de facto, decidiu o seguinte: «Nesta conformidade julga-se, e, na total improcedência das alegações de recurso da autora e totalmente das alegações de recurso do Réu decide-se: a. Julgar improcedente o recurso da autora. b. Julgar totalmente procedente o recurso do Réu, alterar a sentença recorrida com a condenação da autora a pagar ao réu os encargos que este efectuou com o empréstimo a liquidar posteriormente; a pagar ½ da aplicação financeira existente na CGD, no valor de €25 000,00 e dos frutos civis dessa aplicação; absolver o réu do pedido de indemnização; a estas quantias acrescerão os juros de mora contados desde a notificação da contestação/reconvenção. c. Quanto ao restante manter-se-á toda a decisão da sentença recorrida. d. Custas por autora e réu na proporção do vencimento – artº 527º do CPC». 8. Inconformada, AA, autora e recorrente nos autos, notificada do acórdão do Tribunal da Relação, veio interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a subir imediatamente nos autos e com efeito devolutivo, formulando na alegação de recurso as seguintes conclusões: «1.ª O TRP ao alterar os pontos 22, 26, 30 e 31 da matéria de facto fixado na 1.ª instância, violou lei substantiva (artigo 342°, n° 1,341°, 371°, 362°,. 370°, 374°, 376°, do CC) e processual (artigo 413°, 466, n°s 1 e 3 do CPC), o que dá à recorrente o direito a recorrer para o STJ e permite a este supremo tribunal alterar a matéria de facto e aplicar-lhe o direito em conformidade, o que se requer. 2.ª Ao não atribuir à autora a compensação monetária peticionada pela ocupação do réu da casa da autora desde a separação dos unidos de facto (judicialmente fixada em outubro de 2015) até à saída do réu da casa (janeiro de 2017) as instâncias violaram o disposto nos artigos 473° n° 1 e 1793°, ambos do CC. 3.ª Ao revogar a atribuição de 2.500€ a título de danos não patrimoniais e ao indeferir o pedido da autora de atribuição de um valor de 5.000€ pelos danos não patrimoniais sofridos na decorrência do comportamento do réu que a levou a ter de abandonar a habitação o TRP violou o disposto nos artigos 483° e 496° do CC. 4.ª O TRP proferiu um acórdão nulo nos termos do artigo 615° d) do CPC ao: -Omitir pronúncia sobre a questão que lhe foi posta pela recorrente de que a manter-se o não pagamento pelo réu do tempo em que ocupou a casa ilegitimamente, então não deveria também a autora ora recorrente, ter de devolver dinheiro ao réu metade das prestações bancárias, do dinheiro aplicado pelo réu na casa porque dela usufruiu; -Pronunciar-se em excesso sobre até quando o réu pagou prestações bancárias uma vez que só existe prova nos autos de que pagou até janeiro de 2017 e o TRP faz a afirmação temerária, falsa e incompreensível de que continuou a pagar até depois de deduzir reconvenção. 5.ª Deve o acórdão do TRP ser revogado e substituído por outro que acolha a pretensão da recorrente assim se fazendo Justiça!» 9. O recorrido apresentou contra-alegações nas quais pugna pela manutenção do decidido. 10. A Relatora, após notificar as partes para se pronunciarem, ao abrigo do n.º 1 do artigo 655.º, n.º1, do CPC, sobre um obstáculo à admissibilidade do recurso relativamente à questão da indemnização pela ocupação do imóvel, decidiu não admitir o recurso, por dupla conformidade parcial quanto a esse segmento decisório, decisão que não foi impugnada. 11. Sabido que, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso (artigo 608.º, n.º 2, in fine, do CPC), é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635.º, n.º 3 e 640º n.ºs 1 e 3 do CPC), as questões a decidir são as seguintes: I – Nulidade do acórdão recorrido ao abrigo da al. d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC; II – Violação de lei substantiva e processual na forma como o Tribunal da Relação conheceu a matéria de facto; III – Violação dos artigos 483.º e 496.º do Código Civil na absolvição do réu quanto ao pagamento de compensação por danos morais. Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação A – Os factos Os factos provados, após a modificação pelo Tribunal da Relação do Porto, são os seguintes: 1 – Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...13 da freguesia de ... o seguinte prédio: urbano, situado na Rua ..., ..., com a área total de 900 m2, a área coberta de 219,65 m2, a área descoberta de 680,35 m2, composto de casa de habitação de rés-do-chão, garagem, jardim e logradouro, inscrito na matriz sob o artigo ...33 – fls. 9/10 do apenso A (A). 2 - Este prédio está inscrito, pela Ap. ... de 1994/10/13, a favor da ora A. por sucessão por morte de CC – fls. 9/10 do apenso A (B). 3 - Pela Ap. ...2 de 2007/01/22 encontra-se inscrita hipoteca a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A., para garantia de um empréstimo de € 100.000,00, juros, cláusula penal e despesas não provenientes da mora, no montante máximo assegurado de € 140.738,00 – fls. 10 do apenso A (C). 4 - Da Ap. ...2 de 2007/01/22 consta, ainda, que este empréstimo é concedido também a BB – fls. 10 do apenso A (D). 5 - Por escritura de mútuo com hipoteca celebrada, a 29/01/2007, na filial da Caixa Geral de Depósitos, sita na Rua ..., perante o Notário Lic. DD: a) EE, que outorgou na qualidade de procurador e em representação da Caixa Geral de Depósitos (segunda outorgante), declarou que pela presente escritura a Caixa Geral de Depósitos concede a AA e BB (primeiros outorgantes) um empréstimo de € 100.000,00, importância de que estes se confessam desde já devedores; b) e que em garantia do capital emprestado no valor de € 100.000,00, dos respetivos juros e das despesas emergentes deste contrato, a primeira outorgante constitui hipoteca sob o prédio rústico, composto de terreno a vinha, inscrito na matriz sob o artigo 380, e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...26 – fls. 166/180 (E). 6 - Deste empréstimo foram utilizados € 95.000,00 na construção de uma moradia no prédio identificado em A) (F). 7 - Os AA. viveram em união de facto, como marido e mulher, entre outubro de 2003 e outubro de 2015 (G). 8 - Quando iniciaram a sua vida em comum, A. e R. fixaram a sua residência na pequena casa que a A. então habitava, de que era inquilina, também sita em ... (H). 9 – Ali permaneceram cerca de 3 anos (I). 10 - Só em finais de 2005 tomaram, de comum acordo, a decisão de construir uma moradia no terreno herdado pela A., construção que iniciaram em princípios de 2006 (J). 11 - A ora A. propôs contra o ora R., a 27/12/2016, providência cautelar de restituição provisória de posse, que se encontra apensa sob o nº 2499/17.7...-A, requerendo que lhe fosse restituída a posse do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...13 da freguesia de ... onde habitualmente residia (K). 12 - Por decisão, proferida a 10/01/2017, foi decretada a restituição provisória da posse do prédio urbano, composto de casa de habitação de rés-do-chão, garagem, jardim e logradouro, sito em ..., Rua ..., União das Freguesias de ..., ... e ..., inscrito na matriz respetiva sob o artigo ...33 daquela União de Freguesias e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob a ficha nº ...13 da freguesia de ... a favor da Requerente – fls. 22/28 do apenso A (L). 13 - A 20/01/2017, foi restituída a posse do imóvel à ora A. - auto de restituição provisória de posse de fls. 38 do apenso A (M). 14 – A. e R. decidiram construir uma casa no prédio rústico herdado pela A., destinando tal moradia à habitação de ambos e dos filhos que viessem ter. 15 – Com esse objetivo, a A. e o R. aplicaram na dita construção todas as economias que nessa data (2006) possuíam, de cerca de € 13.000,00 cada um. 16 – O salário do R., como ..., acrescido de prémio de produtividade e horas extraordinárias, ascendia a cerca de € 950,00 líquidos por mês. 17 – A A., como ..., ganhava um salário de cerca de € 600,00 líquidos por mês, valor a que acrescia o que ganhava com as clientes que atendia em casa ao fim do dia e aos domingos. 18 – O R. aplicou, ainda, na dita obra, ao longo dos dois anos que demorou a sua construção, a maior parte do seu tempo livre, trabalhando como ajudante de pedreiro, de pintor e dos diversos técnicos que trabalharam na obra. 19 – O R. construiu a suas expensas: a) o muro em forma de “L”, com 25 metros por 17,5 metros de comprimento, com seis fiadas de blocos à vista e com rede por cima, muro este existente no pequeno quintal situado por detrás da moradia; b) o canil e o galinheiro existentes nesse quintal; c) pintou a caixa do gás; d) o poço existente na moradia. 20 – A. e R. durante todo o tempo em que viveram em comunhão de cama e mesa dividiram, entre si, em partes sensivelmente iguais, todas as despesas. 21 – A A. era dona do terreno a vinha, onde veio a ser construída a casa, terreno esse que tinha, em 2006, um valor de cerca de € 23.000,00. 22 - O Réu após a cessação da união de facto, em outubro de 2015, continuou a pagar metade das prestações do empréstimo, o que fez, pelo menos, até Janeiro de 2017 (Facto modificado pelo Tribunal da Relação) 23 – A prestação do empréstimo é de cerca de € 220,00. 24 – Na construção da moradia em causa, respetivos muros de vedação, anexos, pátios, poço, canil e arranjos envolventes foram gastos cerca de € 124.000,00. 25 – O valor corrente no mercado para a hora de trabalho do trabalhador não especializado é de € 6,00/hora. 26 – Facto eliminado pelo Tribunal da Relação e transferido para os factos não provados 27 – Na data do vencimento da referida aplicação – 17/03/2017 -, por volta das quatro horas da madrugada, a A. transferiu para uma conta de que é titular a totalidade daquele dinheiro. 28 – E igualmente transferiu para uma conta sua os frutos civis dessa aplicação, no valor de € 1.100,00. 29 – O valor locativo da casa de habitação é de € 765,00/mês. 30 – Facto eliminado pelo Tribunal da Relação e transferido para os factos não provados. 31 – Facto eliminado pelo Tribunal da Relação e transferido para os factos não provados. Não se provou qualquer outro facto com interesse para a boa decisão da causa, designadamente que: a) o A. aplicou na construção da moradia tudo quanto conseguiu poupar dos seus rendimentos do trabalho ao longo dos 10 anos que se seguiram; b) o R. era ...; c) o A. trabalhou na construção da moradia mais de 1.500 horas; d) à data em que iniciaram a união de facto, o R. possuía poupanças de mais de € 40.000,00; e) foram desembolsados, exclusivamente, pelo R. os € 85.000,00 gastos na construção para além dos € 95.000,00 do empréstimo bancário; f) o quadro psicossomático depressivo e ansioso de que a A. sofreu ainda hoje se manifesta; g) com a construção da moradia o R. despendeu mais de € 94.000,00; h) a construção da moradia e anexos importou em mais de € 180.000,00; i) A. e R. possuíam uma aplicação financeira na Caixa Geral de Depósitos no valor de € 25.000,00; j) o R. acordou com a A. em dar-lhe de empréstimo o montante de € 45.000,00, montante esse que seria entregue em frações mensais de valor equivalente a metade da fração mensal a pagar à instituição bancária à qual seria solicitado um mútuo de € 95.000,00. k) o valor da aplicação financeira na Caixa Geral de Depósitos no valor de € 25.000,00 pertencia apenas à Autora (aditado pelo Tribunal da Relação) l) A A. saiu de casa a 29/10/2015 por desentendimentos com o R., que tinha um feitio possessivo e controlador, controlando as pessoas com quem a A. convivia (aditado pelo Tribunal da Relação). m) Em resultado de ter de abandonar a casa devido ao feitio possessivo e controlador do R., e ter de ir viver só num quarto arrendado, a A. sofreu, durante uns meses, de um quadro psicossomático depressivo e ansioso (aditado pelo Tribunal da Relação). B) O Direito 1. Nulidade do acórdão recorrido por omissão e por excesso de pronúncia 1.1. Nulidade por omissão de pronúncia Considera a recorrente que o acórdão do Tribunal da Relação é nulo por ter omitido a pronúncia quanto à questão de saber se, sendo o réu absolvido do pedido de condenação em indemnização pela ocupação do imóvel após a cessação da união de facto, não deveria ter sido a autora, igualmente, absolvida do pedido de condenação no pagamento de metade do valor das prestações do empréstimo contraído e de condenação no pagamento da quantia de € 13 000,00 a titulo de remuneração pelo trabalho de construção do imóvel descrito nos autos. A nulidade por omissão de pronúncia encontra-se relacionada com o comando normativo ínsito no artigo 608.º, n.º 2, do CPC, segundo o qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.” e verifica-se quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que estava vinculado a apreciar, conforme dita o artigo 615.º, n.º 1, al. d), do CPC. Este Supremo Tribunal tem vindo a entender, de forma absolutamente pacífica, que “a nulidade da decisão por omissão de pronúncia apenas se verificará nos casos em que ocorra omissão absoluta de conhecimentos relativamente a cada questão e já não quando seja meramente deficiente ou quando se tenham descurado as razões e argumentos invocados pelas partes” – Acórdão do Supremo tribunal de Justiça, de 09-03-2022 (proc. n.º 1600/17.5T8PTM.E1.S1. Neste sentido, vejam-se, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 23-03-2021 (proc. n.º 618/17.2T8ETR.P1.S1, de 12-01-2021 (proc. n.º 379/13.4TBGMR-B.G1.S1) e de 16-11-2021 (proc. n.º 5097/05.4TVLSB.L2.S3). Resulta, assim, que existe um dever de pronúncia quanto a questões que digam respeito ao objeto do processo que hajam sido deduzidas pelas partes ou que devam ser suscitadas oficiosamente (cfr. Acórdão de 11-02-2015, processo n.º 1099/11.0TBCHV.P1.S1 e Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, 2.º Vol., Coimbra Editora, 2.ª edição, pp. 704 e ss.). No caso que nos ocupa, cumpre deixar expresso que está em causa a pronúncia quanto ao pedido de condenação do réu ao pagamento de indemnização pela ocupação do imóvel após cessação da união de facto. Considera a recorrente que a sua pretensão deve proceder, baseando-se num argumento de reciprocidade, já que a autora foi condenada a restituir ao réu o valor por este pago a título de empréstimo e ainda o valor do trabalho aplicado na construção do imóvel. Ora, estando esta nulidade relacionada com questão de direito substantivo que foi excluída do objeto do recurso, por se verificar em relação a ela dupla conformidade, não integra esta espécie de nulidade o thema decidendum. Sempre se dirá, todavia, que, da análise do acórdão da Relação resulta, com clareza, que este tribunal recorrido se pronunciou sobre as diversas matérias colocadas à sua apreciação em sede de apelação, sendo evidente que a ausência de tomada de posição expressa quanto aos argumentos da recorrente – nomeadamente a coerência ou incoerência da manutenção da decisão de absolvição do réu – não implica a conclusão de que aquele tribunal omitiu a pronúncia devida. De facto, não tem o Tribunal da Relação a obrigação de trilhar o caminho apontado pela recorrente, no que ao exercício argumentativo diz respeito, sendo evidente que, tendo sido conhecidas as matérias colocadas à apreciação do Tribunal da Relação, não se vislumbra qualquer omissão de pronúncia. 1.2. Nulidade por excesso de pronúncia, Dispõe o artigo 615.º, n.º 1, als. d) e e), do CPC, aplicável ex vi artigo 666.º, n.º 1, do CPC, que “é nula a sentença quando: (…) d) o juiz (…) conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) o juiz condene em quantidade ou objeto superior ao pedido”. A nulidade da sentença prevista nas alíneas d) e e) do mencionado artigo 615.º, n.º 1, do CPC prende-se, essencialmente, com os comandos normativos extraídos dos artigos 608.º, n.º 2 e 609.º, n.º 1, ambos do CPC, dos quais decorre que “o juiz (…) não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras” e que “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir”. O Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a propugnar o entendimento, absolutamente pacífico, de que “a nulidade por excesso de pronúncia radica no conhecimento de questões que não podiam ser julgadas por não terem sido suscitadas pelas partes, nem serem de conhecimento oficioso (…).” – cfr. Acórdão de 04-06-2021, proc. n.º 3300/15.1T8ENT-A.E1.S2. No caso dos autos, insurge-se a recorrente contra a decisão do Tribunal da Relação, na parte em que decidiu alterar a matéria de facto, em concreto, o facto provado n.º 22, que passou a ter a seguinte redação: “O Réu após a cessação da união de facto, em Outubro de 2015, continuou a pagar metade das prestações do empréstimo, o que fez, pelo menos, até Janeiro de 2017” – realce e sublinhado nosso. Considera a recorrente que tal facto dado como provado não corresponde à verdade e que o mesmo não resultou da prova produzida nos autos. Ora, como é evidente, a circunstância de a recorrente discordar da apreciação sobre a matéria de facto levada a cabo pelo Tribunal da Relação não importa a conclusão de que este tribunal excedeu a pronúncia requerida. Veja-se que a alteração levada a cabo foi requerida pelo réu em sede de impugnação da matéria de facto, tendo a mesma sido, nesta parte, procedente. Considerando, assim, que o Tribunal da Relação alterou o facto n.º 22, na sequência de impugnação da matéria de facto neste sentido, não se vislumbra um qualquer excesso de pronúncia. Improcede, assim, a invocada nulidade. 2. Violação de normas processuais e substantivas A recorrente imputa ao Tribunal da Relação a violação de normas de direito adjetivo e substantivo relativamente aos factos 22, 26, 30 e 31, pugnando pela alteração da decisão de direito em conformidade. Esta questão, tendo em conta a interpretação das conclusões juntamente com a alegação de recurso, deve ser entendida como um pedido para que o Supremo Tribunal de Justiça controle a forma como a Relação procedeu à modificação da matéria de facto ao abrigo do artigo 662.º do CPC. A apreciação da prova é matéria de facto e está excluída da competência do Supremo, mas as condições que justificam a alteração ou a confirmação da decisão da 1.ª instância pela Relação são matéria de direito e, por isso, suscetíveis de ser apreciadas no recurso de revista. O julgamento da matéria de facto constitui o principal objetivo do processo civil declaratório, tendo em conta que dele depende o resultado da ação. Os poderes do Supremo Tribunal são restritos nesta sede. Como dispõe o artigo 662º, n.º 4, do CPC, das decisões da Relação previstas nos n.ºs 1 e 2 não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça estabelecendo, por seu turno, o artigo 674.º, n.º 3, do CPC que o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova. Estatui ainda o artigo 682.º, n.º 2, do CPC, que a decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excecional previsto no n.º 3 do artigo 674º, no domínio da prova vinculada por documento autêntico ou por confissão. Por último, pode ainda o Supremo Tribunal de Justiça, por falta ou contradição dos elementos de facto, decretar a descida do processo ao tribunal recorrido para ampliação ou coerência da matéria de facto. Tem sido pacífico que, não podendo o Supremo censurar o uso feito pela Relação dos poderes conferidos pelo artigo 662.º, n.ºs 1 e 2, já pode verificar se a Relação, ao usar tais poderes, agiu dentro dos limites traçados pela lei para os exercer. Por isso, quando no âmbito do recurso de revista se constate o incumprimento dos deveres legais relativamente a aspetos relevantes para a decisão, o processo deve ser remetido à Relação, a fim de lhes ser dado cumprimento (cfr. Abrantes Geraldes et al, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2020, p.827; Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 08-11-2016, proc. 2002/12; 11-12-2016, proc. n.º 907/13, de 06-03-2014, proc. n.º1387/05, de 24-09-2023, proc. 1965/04). Estão em causa, como afirmam Lebre de Freitas/Ribeiro Mendes/Isabel Alexandre (Código de Processo Civil Anotado, Volume 3.º, Artigos 627.º a 877.º, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2022, p. 177), errores in procedendo, respeitantes ao desenvolvimento do procedimento probatório. Assim, ao Supremo Tribunal de Justiça é possível verificar se a Relação, ao reapreciar a decisão de facto, respeitou essas normas procedimentais previstas nos n.ºs 1 a 3 do artigo 662.º, bem como a norma do artigo 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável à 2.ª instância, que exige a análise crítica das provas e a especificação dos fundamentos decisivos para a formação da convicção do julgador sobre a matéria de facto. Neste sentido, v. também o Acórdão de 19-12-2023, proc. n.º 26936/15.6T8PRT.P2, segundo o qual «A fundamentação de facto das decisões judiciais, in casu, da modificação da matéria de facto, deve ser expressa e percetível para os destinatários da decisão e para a comunidade jurídica, não podendo aceitar-se fundamentações implícitas, gravemente insuficientes ou que decorram de interação entre os factos e o direito». Ao criar um duplo grau de jurisdição em matéria de facto, o legislador pretendeu que o Tribunal da Relação formasse a sua convicção na matéria, estando o Supremo impedido de sindicar esta convicção no que respeita a meios de prova de livre apreciação. Todavia, a Relação tem o dever de reapreciar os meios de prova especificados pelo recorrente, através da audição das gravações ou da leitura das transcrições que porventura sejam apresentadas e conjugar esses meios de prova com outros indicados pelo recorrido ou que se mostrem acessíveis, por constarem dos autos ou da gravação. E, o incumprimento destas normas, relacionadas com a reapreciação da decisão da matéria de facto, pode ser conhecido pelo Supremo Tribunal de Justiça. A Relação deve, assim, empreender a análise crítica dos meios de prova, não se limitando a uma apreciação lobal ou sincrónica da factualidade, podendo o Supremo controlar a fundamentação aduzida pelo Tribunal da Relação quanto à decisão de facto e anular o acórdão recorrido se este não procedeu a uma análise crítica e global da prova. Considerando a remissão realizada pelo artigo 662.º, n.º 3 para o artigo 607.º do CPC, a Relação tem de realizar a análise crítica das provas produzidas na 1.ª instância, extrair, se for caso disso, ilações das presunções judiciais e das presunções legais e ainda formar, nas matérias submetidas à livre apreciação da prova, uma prudente convicção autónoma – e fundamentada - sobre essas provas (art.º 607.º, n.ºs 4 e 5, do CPC). Por aplicação do artigo 662.º do CPC tem-se entendido, numa visão restritiva, que o Supremo pode controlar a forma como a Relação exerceu os seus poderes modificativos da matéria de facto em situações excecionais, que têm sido identificadas como situações de não uso dos poderes-deveres pela Relação. Nos termos do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 02-11-2023, proc. n.º 8988/19.1T8VNG-B.P1.S1), «Os erros processuais/adjetivos, passíveis de configurar o “não uso” que o Supremo pode escrutinar, são apenas os erros que são suscetíveis de ser “caçados” a partir do próprio texto do Acórdão da Relação (têm que estar espelhados no próprio texto/conteúdo do Acórdão da Relação recorrido)». As situações de não uso dos poderes da Relação, como causa do recurso de revista, não excluem a orientação jurisprudencial que alarga os poderes cognitivos do Supremo à censura do mau uso desses poderes (cfr., entre outros, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 05/05/2016, proc. n.º 215/05.5TBRMR.E1.S1, de 18-5-2017, proc. 5164/09 e de 07-09-2017, proc. 959/09). Conforme se estipula no sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04-02-2020, proc. n.º 1136.16.1T8STR.E1.S2, «Às instâncias compete apurar a factualidade relevante; com carácter residual, a intervenção do STJ destina-se a averiguar da observância das regras de direito probatório material, a determinar a ampliação da matéria de facto ou o suprimento de contradições sobre a mesma existentes. Contudo, o STJ pode censurar o mau uso que o tribunal da Relação tenha eventualmente feito dos seus poderes sobre a modificação da matéria de facto, bem como pode verificar se foi violada ou feita aplicação errada da lei do processo (al. b) do n.º 1 do art. 674.º do CPC)». – realce nosso Concretizando em que se traduz este controlo pelo Supremo Tribunal de Justiça, diz-se, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08/06/2011 (proc. n.º 350/98.4TAOLH.S1), “motivar é justificar a decisão de modo a que possa ser controlada, desde logo, pelo tribunal e, naturalmente, pelos sujeitos processuais e pelas instâncias de recurso”. O Tribunal da Relação, sempre que modifica a factualidade do caso, tem, pois, de abordar os factos, principais ou indiciários e apreciar de forma expressa e direta os argumentos das partes. Assim, da fundamentação deve resultar, com clareza, o caminho próprio que o Tribunal da Relação seguiu para formar a sua própria convicção (Acórdão de 18-01-2018, proc. n.º 11615/15.2T8SNT.L1.S1), não podendo ser suficiente uma remissão ou concordância genérica com a fundamentação da 1.ª instância. O controlo pelo Supremo do mau uso pela Relação dos seus poderes quanto à matéria de facto, deve estender-se para além das situações de remissão para a fundamentação da sentença do tribunal de 1.ª instância, de modo a abranger aquelas outras em que o Tribunal da Relação altera a factualidade provada e não provada sem proceder a uma análise crítica e global da prova. Em causa está, em ambos os casos, a proteção da essencialidade do julgamento da matéria de facto para os interesses de ambas as partes e para a promoção da tendencial coincidência entre a verdade judicial e a verdade material. Em consequência, “a reapreciação das provas não pode traduzir-se em meras considerações genéricas, sem qualquer densidade ou individualidade que as referencie ao caso concreto”, devendo o tribunal recorrido «(…) proceder à indispensável análise crítica e respectiva fundamentação das respostas, de modo a justificar a sua própria e autónoma convicção (…)» - (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24/09/2013, proc. n.º1965/04.9TBSTB.E1.S1). Em sede de reapreciação da prova, como se afirmou no Acórdão de 03-11-2009 (proc. n.º 3931/03.2TVPRT.S1), impõe-se à Relação «(…) que analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, quer a testemunhal, quer a documental, conjugando-as entre si, contextualizando-as, se necessário, no âmbito da demais prova disponível, de modo a formar a sua própria e autónoma convicção, que deve ser devidamente fundamentada». Também no Acórdão de 27-10-2009 (proc. n.º 560/09), o Supremo entendeu que «(…) podemos concluir que mau grado a intocabilidade do reexame da matéria de facto, a mesma pode ser sindicada pelo Supremo Tribunal de Justiça por razões de incumprimento da lei substantiva (violação das normas de direito probatório material) e adjectiva (violação das regras de processo, como v.g., não reexame da prova pelo colégio dos Juízes da Relação reunidos em conclave para que resulte um consenso, após dialéctica perante a prova produzida e não fundamentação das respostas).(…) no âmbito da sindicância do direito, pode verificar do cumprimento das normas processuais que regem o julgamento da matéria de facto, designadamente se as respostas à base instrutória foram correctas – não na sua essência, ou conteúdo, por tal competir, como se disse, exclusivamente às instâncias – mas na sua forma. Ou seja, pode verificar se a resposta foi clara, inteligível e explícita, em termos de poder contar com o facto que inequivocamente dela resultou; (…) pode, finalmente, julgar da suficiência da explanação dos elementos que condicionaram a convicção do julgador». No mesmo sentido, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 21/04/2010 (processo 3473/06.4TJVNF-A.P1.S1), dispõe-se que “perante a afirmação que se ouviu a prova gravada e que se concorda com os argumentos de facto, fica-se sem saber as razões, o processo racional utilizado, pelas quais a Relação teve essa concordância”, dizendo-se, em seguida, que tais razões “teriam que assentar numa análise concreta dos meios probatórios em causa, não bastando divagações genéricas sobre a matéria”. Este entendimento está também plasmado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21/03/2012, processo 41/06.4TBCSC.L1.S1, onde se entendeu que “Os princípios que regem o processo civil, nomeadamente os da igualdade e da cooperação (…) não podem fazer impender sobre uns – aqui, as partes – os deveres de cumprimento dos respectivos ónus em sede recursiva (…) e dispensar outros – no caso, o Tribunal – do correspondente ónus de apreciação precisa e específica, que sobre si recai, da apreciação da matéria de facto impugnada”. A avaliação da prova, como afirma Miguel Teixeira de Sousa (in «Prova, poderes da Relação e convicção: a lição da epistemologia – Ac. do STJ 24-09-2023, Proc. 1965/04», Cadernos de Direito Privado, n.º 44, Outubro/Dezembro, 2013, p. 36) não pode ser considerada desligada da forma da sua produção. Ainda que o Supremo não tenha competência para controlar o conteúdo e o resultado dessa prova de livre apreciação, pode controlar a sua forma e o procedimento usado para a sua produção. A correção desse procedimento aumenta a fiabilidade da produção da prova e a probabilidade de a formação da convicção do juiz o conduzir à verdade material. Vejamos, a esta luz, o caso concreto. 2.1. Os fundamentos invocados pelo Tribunal da Relação para modificar a matéria de facto foram os seguintes: «O número 22 dos “factos provados” foi considerado provado que “Após a cessação da união de facto em outubro de 2015, o R. pagou metade da prestação do empréstimo até janeiro de 2017 (inclusive).” Com a impugnação apresentada o Réu pretende que o tribunal altere este facto no sentido de se considerar provado que “O Réu após a cessação da união de facto, em Outubro de 2015, continuou a pagar metade das prestações do empréstimo, o que fez, pelo menos, até Janeiro de 2017”. Sustenta para o efeito que no artigo 27º da sua reconvenção, deduzida em 06.10.2017, o ora Recorrente alega que: “Empréstimo que vêm pagando, em partes iguais, em prestações mensais de cerca de € 220,00 desde a data da sua constituição, até à presente data”. E que depois da Reconvenção não foi deduzido qualquer outro articulado pelo ora Recorrente, onde, nomeadamente, fosse alegado até quando continuou a pagar as ditas prestações, ao Banco. Esta matéria foi incluída nos temas de prova sob o nº9, onde se questiona se “O empréstimo referido em E) vem sendo pago, em partes iguais, em prestações de cerca de €220,00, desde a data da sua constituição, até à presente data, tendo pago cada um a quantia de €7.717,14.” (sublinhado nosso). A decisão sobre este facto tem ínsita a ideia de que o ora Recorrente deixou de fazer os referidos pagamentos a partir de Janeiro de 2017 – o que além de não corresponder à verdade, excede a matéria alegada pelas partes nos respectivos articulados, uma vez que o Recorrente continuou a fazer os pagamentos a que estava obrigado, para além da data em que deduziu a sua Reconvenção que foi o seu último articulado. A matéria constante do facto nº 26º deve ser julgada “não provada”, uma vez que a aplicação financeira com o saldo de €25.000,00, existente na Caixa Geral de Depósitos, era titulada pela Recorrida e pelo Recorrente, e como tal, resulta a presunção de que a referida quantia pertence a ambos em partes iguais. Esta presunção não pode considerar-se ilidida pelo simples facto de a própria Recorrida ter dito à testemunha FF que depositara na referida Caixa €25.000,00 que herdara de uma amiga. A matéria dos números 30 e 31 dos “factos provados” foi alegada pela Autora e foi considerada provada exclusivamente com base no depoimento desta. Ora o depoimento da Autora, com exclusão de qualquer outro elemento de prova, não pode ser considerado prova bastante para a matéria por si alegada, e como tal devem ser julgados como não provados. Acrescenta que a afirmação de que o Recorrente tem um “feitio possessivo e controlador” é manifestamente conclusiva - ou seja, constitui matéria que apenas o Tribunal poderia concluir da alegação e prova de factos concretos, factos que a Recorrida, na verdade, não provou. A este propósito nunca poderão bastar as convicções pessoais da autora, acerca do “feitio” do Recorrente – até porque, contra essa opinião da autora não tinha este último como exercer o contraditório... Por outro lado, As declarações da Recorrida também não se podem considerar prova bastante para se dar como assente que ela “sofreu durante uns meses de um quadro psicossomático depressivo e ansioso” e que esse quadro resultou, numa relação de causa e efeito, do dito feitio possessivo e controlador do ora Recorrente. Ora a existência, ou não, “de um quadro psicossomático depressivo e ansioso” só através de exame pericial poderia ser comprovado, o mesmo acontecendo com a alegada relação de causa e efeito entre um tal quadro e a conduta do Réu. Vejamos. O artigo 27º da contestação foi impugnado no artº 2º da contestação e como tal não deve ser dado como assente ao abrigo do disposto no artº 574º, nºs 1 e 2 ex vi 587º do CPC. Entendemos, mesmo assim, que o Réu/apelante tem razão pelas seguintes razões: O empréstimo foi contraído por autora e réu. Resultou dos depoimentos das partes que a prestação mensal era suportada pelos dois - segundo declarações da autora, o réu “enchia a despensa”; o réu declarou que dava dinheiro à autora para esta que esta depositasse na conta do empréstimo; nesta “conta corrente” de “deve e haver”, temos de considerar que na economia doméstica os encargos eram suportados pelos dois (encher a despensa pode redundar até num encargo maior do que o montante da prestação), nos quais se inclui a prestação em causa. Tendo em conta que o empréstimo foi contraído por ambos, que eram titulares de uma conta comum “adjudicada” ao empréstimo, as quantias aí depositadas presumem-se comuns e em partes iguais, sendo o seu pagamento comum- artº 516º do CC. Deve proceder a impugnação nesta parte alterando-se a redacção do ponto nº 22 dos factos assentes, que passa a ter a seguinte redacção:- “O Réu após a cessação da união de facto, em Outubro de 2015, continuou a pagar metade das prestações do empréstimo, o que fez, pelo menos, até Janeiro de 2017”. Igualmente assiste, ao Réu/apelante, razão quanto aos restantes pontos da sua impugnação. A conta bancária na CGD com uma aplicação de €25 000,00 era titulada por autor e réu, presumindo-se comuns e em partes iguais as quantias aí existentes, ao abrigo do disposto no artº 516º do CC já referido. A autora não logrou a prova do contrário, sendo o depoimento da sua mãe FF muito próximo e como tal “interessado”, não sendo suficientemente robusto para ilidir a presunção- cfr 350º do CC. Deve ser julgado o artº 26º da matéria assente como não provada. Igualmente devem ser julgados como não provados os factos constantes dos nºs 30º e 31º da matéria assente, por um lado a patologia depressiva deve ser comprovada com certificação médica, por outro não existem testemunhos fortes para a sua prova, não podendo valer a declaração da autora, por estarmos em presença de um facto que a favorece. O mesmo se passa com a matéria constante do facto nº 31º, as declarações da autora não se mostram por si suficientes para fazer a sua prova- cfr 352ºe 358º do CC». 2.2. Para a modificação do facto n.º 22 o acórdão recorrido baseia-se apenas no seguinte: «O empréstimo foi contraído por autora e réu. Resultou dos depoimentos das partes que a prestação mensal era suportada pelos dois - segundo declarações da autora, o réu “enchia a despensa”; o réu declarou que dava dinheiro à autora para esta que esta depositasse na conta do empréstimo; nesta “conta corrente” de “deve e haver”, temos de considerar que na economia doméstica os encargos eram suportados pelos dois (encher a despensa pode redundar até num encargo maior do que o montante da prestação), nos quais se inclui a prestação em causa. Tendo em conta que o empréstimo foi contraído por ambos, que eram titulares de uma conta comum “adjudicada” ao empréstimo, as quantias aí depositadas presumem-se comuns e em partes iguais, sendo o seu pagamento comum- artº 516º do CC». Ora, o acórdão recorrido apenas tece considerações de direito, mas não indica qual o meio ou meios de prova em que se baseia para afirmar que o réu teria pago as prestações para além de janeiro de 2017, o que seria necessário para concluir, como concluiu, que as prestações foram pagas, pelo menos, até janeiro de 2017. A questão da data limite do pagamento das prestações do empréstimo no contexto dos autos surge como uma questão de facto – uma ocorrência da vida real – e não como uma questão de direito ou como o resultado da aplicação de normas jurídicas. Encontramo-nos, pois, no domínio da matéria de facto, uma vez que o apuramento das realidades se faz à margem da aplicação direta da lei, por averiguação de factos cuja existência ou não existência não depende da interpretação a dar a qualquer norma jurídica (cfr. Amâncio Ferreira, Manual dos recursos em processo civil, 9.ª edição, Almedina, Coimbra, 2009, p. 267). O tribunal recorrido devia, pois, ter procedido a uma análise crítica e global da prova documental e testemunhal presente nos autos e indicar os meios de prova em que funda a sua convicção de que o réu pagou as prestações do empréstimo para além de janeiro de 2017, o que seria necessário para revogar o entendimento do tribunal de 1.ª instância plasmado no facto 22 segundo o qual as prestações foram pagas até janeiro de 2017 (inclusive). 2.3. Para a modificação do facto provado n.º 26 o acórdão recorrido entende que «A conta bancária na CGD com uma aplicação de €25 000,00 era titulada por autor e réu, presumindo-se comuns e em partes iguais as quantias aí existentes, ao abrigo do disposto no artº 516º do CC já referido. A autora não logrou a prova do contrário, sendo o depoimento da sua mãe FF muito próximo e como tal “interessado”, não sendo suficientemente robusto para ilidir a presunção- cfr 350º do CC». Ora, esta asserção não se funda na apreciação global da prova, dado que a recorrente alega ter apresentado um testamento (e outros documentos) que comprova essa herança de 25.000,00 euros, tal como entendeu a sentença do tribunal de 1.ª instância, que não se baseou apenas no testemunho da mãe da autora para assim decidir. Em consequência, carece de ser ampliada a matéria de facto neste ponto para permitir avaliar se se verifica ou não violação do direito probatório material, dado que o testamento é um documento autêntico, que faz prova plena dos factos praticados pela autoridade ou oficial público (artigo 371.º, n.º 1, do Código Civil). Ainda que as declarações nele contidas possam ser livremente apreciadas pelo juiz, o dever de analisar de forma crítica toda a prova exige que o acórdão recorrido proceda à ponderação do conteúdo do testamento (e demais documentos juntos ao processo) na modificação da matéria de facto relativa à origem sucessória ou não dos 25.000 euros depositados na conta do casal. 2.4. Quanto aos factos n.º 30 e 31, relativos à doença psiquiátrica da autora, o acórdão recorrido entende que as declarações da recorrida não se podem considerar prova bastante para dar como assente que ela sofreu um quadro depressivo na sequência das conduta do companheiro concluindo que «Igualmente devem ser julgados como não provados os factos constantes dos nºs 30º e 31º da matéria assente, por um lado a patologia depressiva deve ser comprovada com certificação médica, por outro não existem testemunhos fortes para a sua prova, não podendo valer a declaração da autora, por estarmos em presença de um facto que a favorece. O mesmo se passa com a matéria constante do facto nº 31º, as declarações da autora não se mostram por si suficientes para fazer a sua prova- cfr 352ºe 358º do CC». Ora, sendo o depoimento de parte (bem como as declarações de parte) admitido no nosso sistema jurídico (artigo 466.º do CPC), a circunstância de ser livremente apreciado pelo juiz, na parte em que não representa confissão, não implica que possa ser afastado sem uma apreciação crítica do mesmo, estando o julgador, no tribunal de recurso, sujeito ao dever de ouvir e apreciar de modo crítico o seu conteúdo, traduzindo o seu percurso mental na fundamentação do acórdão, para poder esclarecer as partes e o tribunal ad quem porque razão entendeu que tal depoimento (ou declaração de parte) era merecedor de uma valoração positiva, ou se, pelo contrário, não reunia as condições para tal, devendo ser afastado. A certificação médica constitui sem dúvida um meio de prova relevantíssimo para demonstrar a existência de um quadro depressivo, mas está aberta a possibilidade legal de considerar provada esta patologia, de sintomas conhecidos pela generalidade das pessoas, por depoimento de parte ou declarações de parte que mereçam a confiança do julgador pela forma coerente, sincera, clara e impressiva como pode ser prestado. Não há qualquer regra probatória que imponha que a ausência de prova pericial afaste necessariamente a fiabilidade de um depoimento de parte ou das declarações de parte para demonstrar a existência de um quadro depressivo decorrente da conduta de outrem, in casu, o companheiro. Tem-se entendido que, no domínio da relação interpessoal, o testemunho de parte, quando verse sobre factos que ocorreram entre as partes, sem a presença de terceiros intervenientes, pode ter a maior utilidade para a decisão (cfr. Abílio Neto, “Anotação ao artigo 466.º”, Novo Código de Processo Civil Anotado, Edições Jurídicas Lda., Lisboa, 2013, p. 169). É de ponderar que, nos processos crimes de violência doméstica, considera-se que as declarações da vítima, relativamente a factos da vida íntima que ocorrem sem a presença de terceiros, são a prova rainha, pelo que nenhuma razão existe para, em processo civil, afastar, sem mais, a relevância das declarações da autora sobre o seu estado depressivo e a atitude controladora do companheiro causadora de tal sintomatologia. Também não se pode afirmar, de acordo com os princípios probatórios do processo civil, como parece ter feito o acórdão recorrido – se bem se compreendeu a sua exígua fundamentação e o alcance da referência aos artigos 352.º e 358.º, ambos do Código Civil – que o feitio de uma pessoa não pode ser provado por depoimento de parte, livremente apreciável, mas apenas por confissão do declarante quando lhe é desfavorável. Assim sendo, deve o processo baixar para reapreciação fundamentada da prova e ampliação da matéria de facto no que diz respeito aos factos constantes do testamento junto aos autos. 3. Anexa-se sumário elaborado nos termos do n.º 3 do artigo 667.º do CPC: I - A avaliação da prova não pode ser considerada desligada da forma da sua produção. II - Ainda que o Supremo não tenha competência para controlar o conteúdo e o resultado dessa prova de livre apreciação, pode controlar o procedimento usado para a sua produção. A correção desse procedimento aumenta a fiabilidade da produção da prova e a probabilidade de a formação da convicção do juiz o conduzir à verdade material. III - O controlo pelo Supremo do mau uso pela Relação dos seus poderes quanto à matéria de facto, deve estender-se para além das situações de remissão para a fundamentação da sentença do tribunal de 1.ª instância, de modo a abranger aquelas outras em que o Tribunal da Relação altera a factualidade provada e não provada sem proceder a uma análise crítica e global da prova. III – Decisão Pelo exposto, decide-se na 1.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça conceder a revista, anulando-se o Acórdão recorrido e determinando-se que o processo baixe ao Tribunal da Relação do Porto, para que aí se proceda à reapreciação e ampliação da matéria de facto impugnada, nos termos expostos, e se aplique depois o direito tido por adequado à matéria factual que vier a ser dada como assente. Custas pela parte vencida a final. Lisboa, 12 de novembro de 2024 Maria Clara Sottomayor (Relatora) Henrique Ataíde Antunes (1.º Adjunto) Anabela Luna de Carvalho (2.ª Adjunta) |