Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
347/21.2T8PNF.P1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: FERREIRA LOPES
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
LESADO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
DANOS PATRIMONIAIS
ASSISTÊNCIA DE TERCEIRA PESSOA
DANOS FUTUROS
QUANTUM DOLORIS
EQUIDADE
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
CONFIRMAÇÃO IN MELLIUS
DUPLA CONFORME PARCIAL
Data do Acordão: 09/19/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA
Sumário :
I - A indemnização por danos não patrimoniais é fixada segundo os critérios do nº3 do art. 496º do CCivil, avultando essencialmente a gravidade do dano, o grau de culpa do agente e a sua situação económica, e ainda, por força do art. 8º, nº3, do CCivil, o que vem sendo decidido pelos tribunais, em especial o STJ, em casos semelhantes.

II – É justa e equitativo atribuir uma indemnização de €200.000,00 por danos morais ao lesado, vítima de acidente de viação, sem qualquer culpa sua, que à data do acidente tinha 40 anos, era um homem activo e saudável, que em consequência do acidente ficou paraplégico, que sofreu dores intensas (de grau 7/7), com dano estético permanente de grau 5/7, repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer no grau 6/7, com a vida sexual fortemente limitada por impotência coeundi, por ausência de ereção, tendo ficado afectado de um défice funcional de integridade físico-psíquico de 72 pontos, dependente da ajuda de terceira pessoa para os actos quotidianos, e que ao longo do tempo vai necessitar de consultas e tratamentos, o que tudo lhe provoca sentimentos de angústia, revolta e tristeza.

III – A indemnização pela necessidade do auxílio de uma terceira pessoa, calculada em função da esperança de vida do autor e o custo desse auxílio, deve sofrer um abatimento pelo “benefício da antecipação”, em face da possibilidade do autor rentabilizar a indemnização imediatamente disponibilizada, que equitativamente se fixa em 10%.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


AA, intentou a presente acção sob a forma de processo comum contra Seguradoras Unidas, SA. (Tranquilidade), alegando em síntese que ocorreu um acidente de viação, que se ficou a dever a culpa exclusiva do condutor segurado da R., pelo que esta é responsável pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que lhe advieram do aludido acidente.

Conclui pedindo que a R. seja condenada a pagar-lhe:

a) A quantia de € 14.392,10 referente às perdas salariais decorrentes de incapacidade temporária absoluta de que o autor padece, nos termos da Portaria 377/2008 e artigo 564º do Código Civil, acrescida das quantias devidas a título de perdas salariais até que se encontrem consolidadas as suas lesões;

b) Declarar-se ter o Autor ficado a padecer de uma incapacidade permanente parcial a ser determinada de acordo com a Tabela de Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, condenando-se a Ré a pagar ao Autor indemnização devida pela referida incapacidade;

c) Um indemnização relativa ao dano patrimonial futuro nos termos melhor descritos no presente articulado;

d) Indemnização pela violação do direito à integridade física e psíquica de acordo com o Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica a fixar em montante nunca inferior a € 100.000,00;

e) Indemnização pelo prejuízo de afirmação pessoal sofrido pelo mesmo em consequência do acidente;

f) Indemnização pelo quantum doloris a ser atribuído numa escala de grau 3 a 7;

g) A pagar ao autor a quantia de € 930,00 a título de despesas realizadas em consultas, exames, medicamentos, tratamentos;

h) A quantia e € 4.506,03 devida a título de deslocações em veículo próprio, como melhor descrito nos artigos 62º a 70º para onde se remete por uma questão de economia processual;

i) A quantia de € 1.621,79 devida pelos bens propriedade do autor que ficaram destruídos em consequência do acidente, como melhor descrito no artigo 71º para onde se remete;

j) A quantia de € 58,42 devida a título de manutenção da cadeira de rodas;

k) A quantia de € 1.271,44 devida a título de IVA referente às duas últimas faturas, uma de instalação de elevador no edifício onde o autor reside (fatura 2020/57 correspondente à ultima tranche prevista no orçamento, Iva no montante de € 508,99) e outra correspondente ao pagamento final das obras de reabilitação da habitação do autor (fatura nº 2020/46, IVA no montante de € 762,45);

l) A quantia de € 228,42 devida pelas intervenções necessárias ao aumento da capacidade elétrica do quadro das partes comuns do edifício para que o elevador pudesse funcionar (€ 152,50) e pelo consequente aumento da conta de eletricidade (€ 75,92), nos termos melhor descritos nos artigos 79º a 81º, devendo a Ré ser condenada a pagar ao autor mensalmente todas as despesas por si suportadas, doravante, com o aumento do consumo de energia elétrica nas partes comuns em virtude do uso do elevador;

m) As despesas de manutenção do elevador, nelas se incluindo quer o valor mensal presente e futuro do contrato de manutenção do elevador, quer todas as despesas inerentes ao seu normal e devido funcionamento, nomeadamente substituições de peças necessárias;

n) A quantia de € 55,35 referente à primeira mensalidade do contrato de manutenção do elevador já paga pelo autor;

o) A proceder à instalação de plataforma de elevador de escada a instalar na escadaria de acesso ao patamar do elevador na entrada do edifício e a pagar ao autor a quantia de € 9.970,00, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, no total de € 12.263,10 a título de fornecimento e instalação de plataforma de elevador de escada como melhor descrito nos artigos 85º a 87º da PI;

p) A reconhecer necessitar o autor de assistência de terceira pessoa em número de horas a determinar e a pagar ao autor a quantia devida a título de prestação suplementar para assistência a terceira pessoa;

q) A pagar ao autor subsídio para frequência de ações no âmbito da reabilitação profissional;

r) Quantias estas acrescidas de juros à taxa legal em vigor a cada momento;

s) Seja a Ré condenada nas prestações em espécie, de assistência médica, medicamentosa e farmacêutica, assistência psicológica e psiquiátrica, serviços de reabilitação médica ou funcional para a vida activa do autor e a fornecer-lhe todas as ajudas técnicas necessárias que correspondem ao estado mais avançado da ciência e da técnica e que lhe proporcionarão as melhores condições de vida, bem-estar e saúde possíveis.


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O ISS apresentou um pedido de reembolso de subsídio de doença no valor de € 6.811,58, sobre o qual houve transacção homologada por sentença.

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Na contestação, a Ré assumiu a responsabilidade pelo sinistro, impugnando parte dos danos peticionados, mais alegando o pagamento parcial dos mesmos. Conclui que a acção deve ser julgada em função da prova produzida em audiência de julgamento.

O Autor deduziu incidente de liquidação, designadamente quanto ao pedido da alínea p), que liquidou em € 647.539,20.


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Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, tendo condenado a Ré a pagar ao Autor:

a) a título de dano pela perda da capacidade de ganho (com inclusão do dano biológico e indemnização por défice funcional temporário), a quantia global de € 300.000,00 (trezentos mil euros), mas descontando o que recebeu, de € 25.719,23 – vinte e cinco mil setecentos e dezanove euros e vinte e três cêntimos, operando a devida compensação tem direito a receber a quantia global de € 274.280,77 (duzentos e setenta e quatro mil duzentos e oitenta euros e setenta e sete cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa de 4% ao ano, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento;

b) a título de danos não patrimoniais, a quantia global de € 300.000,00 (trezentos mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da presente sentença, até efectivo e integral pagamento;

c) A título de perdas salariais, a quantia global de € 31.814,40 (trinta e um mil oitocentos e catorze euros e quarenta cêntimos), já tendo recebido, contudo, tal montante através da R. e do ISS;

d) de despesas suportadas pelo A. em virtude do acidente (de consultas, tratamentos, medicamentos, deslocações e bens destruídos), desde a data do acidente até 27-11-2020, o montante global de € 7.057,82 (sete mil e cinquenta e sete euros e oitenta e dois cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a data da citação até integral e efectivo pagamento;

e) a quantia de € 58,42 (cinquenta e oito euros e quarenta e dois cêntimos) devida a título de manutenção da cadeira de rodas, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a data da citação até integral e efectivo pagamento,

f) a quantia de € 299,10 (duzentos e noventa e nove euros e dez cêntimos) devida a título de IVA referente factura 2021/22 de 23/07/2021 da plataforma de elevador de escada a instalar na escadaria de acesso ao patamar do elevador na entrada do edifício, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a data da notificação até integral e efectivo pagamento;

g) a quantia de € 228,42 (duzentos e vinte e oito euros e quarenta e dois cêntimos) devida pelas intervenções necessárias ao aumento da capacidade elétrica do quadro das partes comuns do edifício para que o elevador pudesse funcionar (€ 152,50) e pelo consequente aumento da conta de eletricidade (€ 75,92), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a data da notificação até integral e efectivo pagamento;

h) a título de consumos acrescidos de energia nas partes comuns do edifício, a quantia de € 435,60 (quatrocentos e trinta e cinco euros e sessenta cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a data da notificação até integral e efectivo pagamento, correspondentes aos consumos entre os meses de março de 2021 e junho de 2022 inclusive, acrescida de todos os acréscimos de consumo de energia futuros;

i) as despesas com conservação e assistência ao elevador (contrato de manutenção celebrado e junto aos autos) entre os meses de Março de 2021 e Setembro de 2022, a quantia de € 1.071,57 (mil e setenta e um euros e cinquenta e sete cêntimos), bem como as futuras, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a data da notificação até integral e efectivo pagamento;

j) as despesas por este suportadas em tratamentos de fisioterapia e acupunctura, entre a data da alta e a do incidente de liquidação efectuado, no montante global de € 8.900,30 (oito mil e novecentos euros e trinta cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde a data da notificação até integral e efectivo pagamento;

k) todas as despesas de manutenção do elevador, nelas se incluindo quer o valor mensal presente e futuro do contrato de manutenção do elevador, quer todas as despesas inerentes ao seu normal e devido funcionamento, nomeadamente substituições de peças necessárias, reparações, vistoriais, taxas camarárias, entre outras;

l) todas as despesas inerentes à manutenção, assistência, reparação, substituição da plataforma de elevador de escada nelas se incluindo o valor mensal presente e futuro do contrato de manutenção;

m) a reconhecer necessitar o autor de assistência de terceira pessoa fixada em 8h diárias, a € 6,16/hora, pela qual deverá o A. ser compensado, no montante global de € 647.539,20 – seiscentos e quarenta e sete mil quinhentos e trinta e nove euros e vinte cêntimos (€ 6,16 x 8h x 365 dias x 36 anos), deduzidas as quantias já entretanto liquidadas pela Ré de € 14.400,00 – catorze mil e quatrocentos euros (e outras que a R. venha a pagar a este título ou outro), pelo que tem o A. direito a receber a este título € 633.139,20 (seiscentos e trinta e três mil cento e trinta e nove euros e vinte cêntimos);

n) o subsídio para frequência de acções no âmbito da reabilitação profissional, que venha a ser considerada adequada e necessária;

o) a prestar e/ou pagar a assistência médica, medicamentosa e farmacêutica, assistência psicológica e psiquiátrica, serviços de reabilitação médica ou funcional Tratamentos médicos regulares Consultas da especialidade Cirurgias ou idas ao bloco quando necessário, e Exames médicos, para toda a vida activa do autor, relacionadas com o acidente dos autos;

p) a fornecer e/ou pagar ao A. todas as ajudas técnicas necessárias que correspondem ao estado mais avançado da ciência e da técnica e que lhe proporcionarão as melhores condições de vida, bem-estar e saúde possíveis, para colmatar as sequelas/consequências do acidente dos autos, nomeadamente cadeira de rodas manual e cadeira de rodas eléctrica com funções eléctricas de assento, almofada para cadeira de rodas, cadeira de banho com acessórios – almofada suave, aparadeira, apoios de braço, cama articulada de casal, colchão de prevenção e sua manutenção/substituição, elevador de transferência, cestas de transferência e respectivos acessórios, componentes e manutenção;

q) a proceder à adaptação de veículo automóvel, substituição, manutenção, acrescida dos custos de aquisição de uma viatura que se fixa em valor nunca inferior a € 40.000,00 (quarenta mil euros);

r) ao pagamento de táxi ou outro transporte conduzido por terceiros, enquanto o autor não dispuser de viatura adaptada, nomeadamente para se deslocar a tratamentos, consultas e exames, o que, nesta data, terá um custo que se fixa em € 78,00 (setenta e oito euros) por semana;

s) na melhor adaptação do domicílio do A. (além do já realizado) com o devido custo de manutenção/reparação/substituição dos elementos colocados (nomeadamente no WC) e adaptação de local de trabalho às necessidades do Autor.


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A Ré interpôs recurso da sentença, em que além de impugnar a decisão sobre a matéria dos factos 74 e 75, questionou:

i) os valores de indemnização por danos não patrimonial e dano biológico;

ii) a indemnização pela necessidade de ajuda de terceira pessoa;

iii) a indemnização pelos danos constantes dos factos provados nºs 74 e 75;

iv) se o recebimento imediato das quantias relativas a danos futuros deve ou não ser objecto de desconto.


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Na parcial procedência da apelação, a Relação do Porto alterou a sentença, tendo condenado a Ré a pagar ao Autor, já descontando a estas quantias os montantes parcelares entregues de 14.000,00 euros (catorze mil euros) e 25.719,23€ (vinte e cinco mil, setecentos e dezanove euros e vinte e três cêntimo), nos seguintes termos:

1. O montante da indemnização relativa aos danos não patrimoniais que se fixa em cento e cinquenta mil euros (150.000,00);

2. O montante de 135.000,00 (cento e trinta e cinco mil euros) a título de dano biológico;

3. O montante de 544.864,32 (quinhentos e quarenta e quatro mil, oitocentos e sessenta e quatro euros e trinta e dois cêntimos) euros a título de despesas pela assistência de terceira pessoa, deduzidas das quantias já entregues pela apelante;

4. No montante de 180.000,00 (cento e oitenta mil euros) a titulo de lucros cessantes.

5. No montante que vier a ser liquidado quanto à quantificação do custo concreto de aquisição dos objectos e serviços constantes dos factos provados nº 74 e 75.

Manteve o restante da sentença decisão recorrida, incluindo o relativo às condenações de juros.


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É a vez do Autor interpor recurso de revista, cujas alegações conclui do seguinte modo:

1. Vem o presente recurso interposto da decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto nos autos em epígrafe que alterou a decisão proferida em 1ª instância em relação ao montante da indemnização pelos danos não patrimoniais, a indemnização devida ao A. – fixada em 1ª instância em € 300.000,00 - como ressarcimento da vertente patrimonial e do dano biológico, o montante da indemnização devida pela necessidade de assistência de terceira pessoa e da correção monetária e desconto pela entrega antecipada do capital

2. A Sentença proferida em 1ª instância entendeu fixar ao A. uma indemnização abrangente que abarca não só a indemnização devida pela perda de capacidade de ganho, mas também o dano biológico e o défice funcional temporário que, no entender do Julgador, não se autonomizam, tendo em atenção a sua idade à data do sinistro (39 anos), a esperança média de vida ativa do lesado (70 anos) o rendimento médio líquido do apelado, que à data do acidente era de €795,36€ mensais (14 meses) e o seu défice funcional permanente na integridade físico-psíquica de 72 pontos, com IPATH.

3. Insurgiu-se a ré, agora recorrida, contra a Douta Sentença por entender que o A. se encontrava integralmente ressarcido de todos os prejuízos patrimoniais inerentes ao défice funcional temporário de que padeceu em consequência do sinistro, pelo que mal andou a Sentença de 1ª instância ao incluir naquela indemnização abrangente o défice funcional temporário, devendo ser considerada a idade do A. à data da consolidação médico-legal da lesões (42 anos) para fixação do dano patrimonial futuro e ser ainda feito um desconto na indemnização atendendo à antecipação do capital, requerendo fosse a indemnização arbitrada ao A./Recorrente fixada em € 230.000,00 (atendendo a que a mesma se mostra fixada de um modo abrangente).

4. O Défice funcional temporário corresponde ao período durante o qual o Sinistrado, em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, teve sua autonomia condicionada nas atividades diárias (excluindo a profissional), o qual coincide com o período de internamento, fixado em 1033 dias e que a Recorrente não coloca em causa (pontos 1 a 16 dos factos provados)

5. Nos termos do disposto no Anexo I da Portaria 377/2008 de 26 de maio, na redação que lhe foi dada pela Portaria 679/2009 de 25 de junho, o Sinistrado tem direito a ser ressarcido com uma compensação por cada dia de internamento no montante a fixar entre € 20,52 e € 30,78, que o Recorrente requereu fosse fixada em € 30,78 e arbitrada ao indemnização nunca inferior a € 31.795,74, acrescida de juros computados desde 27-11-2020 até efetivo e integral pagamento, sendo que e ao contrário do alegado pela Recorrida deste montante não foi o Recorrente ressarcido.

6. De facto da Douta Sentença de 1ª instância resulta que “desde a data do acidente (30/01/2018) até à data da consolidação médico-legal das lesões (27/11/2020) o A. esteve sem trabalhar, sendo certo que o seu vencimento líquido médio mensal é de € 795,36 (factos 29º e 62º dados como provados). Razão pela, considerando os meses que esteve sem laborar (34), o aludido salário médio e o proporcional dos subsídios de férias e de Natal (o equivalente a seis meses de salário), o A. terá direito a € 31.814,40 de perdas salariais.

7. Uma vez que o A. já recebeu do ISS € 6.811,58 de subsídio de doença e € 50.722,05 de perdas salariais pagas pela R., nada mais tem a receber a este título, sendo que o excedente (€ 25.719,23) será imputado (subtraído) na indemnização por incapacidade que tem a receber

8. Confundindo a Recorrida a Repercussão Temporária na Atividade Profissional (Período o qual a vítima, em virtude da evolução das lesões, teve sua autonomia profissional condicionada), com o Défice Funcional Temporário, que corresponde ao período durante o qual o Sinistrado, em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, teve sua autonomia condicionada nas atividades diárias (excluindo a profissional).

9. O Tribunal da Relação do Porto, entendeu, na prestativa do Recorrente bem, que a indemnização da perda da capacidade de ganho não deverá incluir o dano biológico e o défice funcional temporário, calculando-os separadamente, não obstante e apesar dessa separação decidiu o TRP que:

Quanto aos lucros cessantes que o “termo final não é, neste caso, o da esperança de vida, mas sim o da data da reforma, neste caso 67 anos, pois, trata-se de um dano patrimonial que cessa com a reforma e que depois dessa data é exclusivamente ressarcido através do dano biológico.

10. Como já referido nas alegações de recurso para o TRP do Recorrente como vem sendo jurisprudência unânime dos nossos tribunais não é o tempo de vida ativa do recorrido ou o número de anos que falta atingir para a idade da reforma, mas sim para a idade correspondente à esperança média de vida da vítima (isto é, o que importa é o tempo provável de vida da vítima).

11. No que se refere ao valor da esperança de vida, a decisão do TRP fixou a mesma em 74 anos, o que nos parece incorreto visto que e de acordo com o PRODATA deve-se considerar que a esperança de vida da população em Portugal, é de 81,10 anos, pelo que a mesma deverá ser de considerar pelo menos, como o fez o Recorrente de 78 anos.

12. Como decidiu o acórdão do STJ de 16.01.2024 (P. 3527/18.4T8PNF.P2.S1):

Isto porque, como refere o acórdão recorrido, «as necessidades básicas do lesado não cessam obviamente no dia em que deixar de trabalhar por virtude da reforma, sendo manifesto que será nesse período temporal da sua vida que as suas limitações e situações de dependência, ligadas às sequelas permanentes das lesões sofridas, com toda a probabilidade mais se acentuarão» (Acs. STJ de 28/9/95, CJ, T3:36, de 27/7/2002, CJ, T 2:128, de 10/11/2016 e de 7/03/2019, estes últimos, como os demais sem outra indicação, in www.dgsi.pt).”

13. Assim e atendendo a que o A. auferia uma retribuição mensal ilíquida da € 1.142,54 (ponto 29 dos factos provados) para fixação do montante indemnizatório. Como decidiu o Tribunal da Relação do Porto no Acórdão proferido no processo nº 148/12.9TBVLP.P1, de 23-10-2014 “… aquilo que o lesado perde realmente - a situação que existiria se não fosse o evento (art. 562 do CC) -, é o salário ilíquido e não o líquido.” “Quanto à dedução de impostos, entende-se (neste sentido, já vai o ac. do TRP de 31/10/2013, 7794/09.6TBMTS.P1, com o mesmo relator, não publicado) que a posição correcta é de considerar que estes são descontados do vencimento do trabalhador por conta de outrem e são portanto parte do pagamento do trabalho produzido pelo mesmo, embora venham depois a ser destinados ao Estado e não ao trabalhador. Os impostos respeitam assim às relações entre os lesados e o Estado, não devendo ser os lesantes ou as suas seguradoras a beneficiar com as vicissitudes que têm a ver com essas relações. Se a entidade patronal pagava 1000 ao trabalhador dos quais 100 acabavam por ir para o Estado, se a seguradora apenas pagar 900 não está a repor a situação anterior. Isto é, em termos globais, uma percentagem de rendimentos que iam para o trabalho (embora depois passassem para o Estado, que depois redistribuiria parte em prestações que são considerados retribuição indirecta do trabalho), passavam a fazer parte dos rendimentos do capital financeiro (por deixarem de sair dele). Não pode ser.

14. Assim e seguindo a mesma linha do TRP no acórdão citado, os fatores a ter em conta no cálculo da indemnização da perda da capacidade de ganho são:

- A perda de capacidade é equivalente a 77% (5% agravamentos futuros);

- A remuneração mensal a ter em conta é de € 1.142,54 pelo que o valor da perda mensal equivale a € 879,76. Os meses são 14; logo, o valor da perda anual é de € 879,76 x 14 = € 12.316,64

- Os anos a ter em conta são os da esperança média de vida, no caso, mais 38, a contar de Novembro de 2020. (€ 468.032.32)

- Uma taxa de juros de 2%. (€ 9.360,65)

- Uma inflação anual de 0,5%. (€ 2.340,16)

- Ganhos de produtividade de 0,375%. (€ 1.755,12)

- Promoções profissionais de 0,375%. (€ 1.755,12)

Tudo no montante global de € 483.243,37, mesmo diminuindo 10% em virtude da entrega imediata do capital o valor da indemnização seria de € 434.919,03.

15. Desta forma, num puro juízo de equidade, atendendo aos fatores enunciados, à perda da capacidade de ganho, dano biológico (no valor de € 150.000,00 como decidido no Ac. do TRP), défice temporário e o facto de o A. não poder exercer a sua atividade habitual, entende o recorrido que a se entenderia como justa uma indemnização fixada em cerca de € 450.000,00, deduzidos os montantes já liquidados pela Recorrida.

16. Não obstante e caso assim não se entenda, poderá e deverá sempre o Tribunal, fixar indemnização que entenda justa e qualitativa, de valor superior ao arbitrado, quantificando diferentemente os diversos danos que devem ser reparados ou compensados.

17. A Relação do Porto entendeu ser de fixar a título de danos não patrimoniais a quantia de €150.000,00 porque da análise de casos análogos, conclui que o valor pedido e fixado é desajustado dos padrões da nossa jurisprudência e da indemnização fixada em casos semelhantes.

18. Como é jurisprudência unânime dos tribunais superiores a indemnização a fixar pelos danos não patrimoniais sofridos por um sinistrado deverá assumir um papel significativo e não meramente simbólico

19. As lesões sofridas pelo A. com o acidente em causa nos presentes autos, físicas e emocionais e alterações radicais da sua vida social, profissional e familiar foram de tal forma que a própria Recorrida entende justo e equitativo a fixação de uma indemnização pelos danos não patrimoniais em € 250.000,00

20. Existem inúmeros casos análogos em que as indemnizações arbitradas são substancialmente superiores aquelas referidas no Acórdão em crise (Ac. de 01.03.2018, P. 773/07.0TBALR.E1.S1: €400.000,00; acórdão de 23.05.2019, P. 2476/16: €250.000,00; acórdão de 19.09.2019, P. 2706/17.: €200.000,00; acórdão de 09.05.2023, P. 7509/19.).

21. O A., com 39 anos á data do acidente, em consequência do acidente, ficou com as lesões e sequelas melhor descritas nas alegações de recurso para onde se remete por uma questão de economia processual.

22. Comparativamente com as decisões proferidas nos processos referidos em 20, e atentas as lesões sofridas pelo Recorrente é diminuta a indemnização arbitrada pelo Tribunal da Relação do Porto no acórdão em crise é desajustada dos padrões da nossa jurisprudência e da indemnização fixada em casos semelhantes, pelo deverá ser mantida a indemnização arbitrada na Sentença de 1ª instância, ou caso assim não se entenda ser a mesma reduzida á quantia indicada pelo recorrida de € 250.000,00

23. Entendeu o Tribunal da Relação do Porto “correto e ajustado dever proceder-se a uma dedução, para compensar o recebimento antecipado do capital, situada à volta dos 10%”

24. Para tal o Acórdão em crise refere que recebendo o Recorrente cerca de 1 milhão de euros, o qual aplicado à taxa de juro do mercado, produzirá anualmente a quantia de € 35 mil euros, que multiplicada por 33 anos implica 1.155.000,00 euros.

25. Esquece-se o Tribunal a quo que o A. despende mensalmente quantias avultadas em tratamentos fisioterapia, deslocações, medicamentos tratamentos médicos, elevadores, plataforma de escada, entre outros, pelo que os cálculos efetuados pelo tribunal da Relação, salvo o devido respeito, parecem-nos ilusórios e nunca o Recorrente poderia obter, mesmo em circunstâncias ideais de mercado (que não existem) uma quantia de € 1.155.000,00 euros.

26. Assim entendemos não ser de aplicar qualquer desconto ao capital entregue e devido ao recorrente, aliás na senda do já decidido pelo STJ no acórdão de Janeiro de 2024, supra referido e transcrito nas alegações de recurso para onde se remete.

27. No que se refere ao montante a arbitrar ao lesado pela necessidade de auxilio de terceira pessoa entendeu o acórdão do Tribunal da Relação que ao A. é devida a quantia de € 605.404,80 euros, deduzida de 10%, partindo do pressuposto que a esperança média de vida de um cidadão português é de 74 anos de idade, devendo ser considerado para o efeito os dados do Prodata e fixar-se a esperança média de vida em 78 anos de idade como o fez a Sentença de 1ª instância, sendo a Recorrida, como ali o foi, ser condenada a pagar ao recorrente a quantia de € 633.139,20 depois de deduzida a quantia de € 14.400,00 já liquidada pela Recorrida, sem qualquer desconto pela entrega antecipada do capital.

Contra alegou a Recorrida pugnando pela improcedência da revista e a confirmação do acórdão recorrido.


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Objecto do recurso:

- Quantum indemnizatório a título de: i) dano patrimonial futuro; ii) dano biológico; iii) danos não patrimoniais;

- indemnização pela assistência de 3ª pessoa e dedução de 10% no valor da indemnização pelo recebimento antecipado do capital.


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Fundamentação.

Vem provada a seguinte matéria de facto:

1. No dia ... de Janeiro de 2018, cerca das 13h30m, na Estrada Nacional ..., ao quilómetro 25,034, saída da A4, freguesia de ..., concelho de concelho de ..., ocorreu um embate, onde foram intervenientes: Um motociclo com cilindrada 125 cc, marca Kawasaki, matrícula ..-..-EJ, propriedade de BB, conduzido na altura do acidente pelo seu irmão, o aqui Autor, AA, um veículo automóvel ligeiro de passageiros, marca Opel, matrícula ..-..-PU, propriedade de J..., Lda, conduzido, na altura do acidente, por CC.

2. O veículo de matrícula EJ, propriedade da irmã do autor e conduzido por este, circulava na Estrada Nacional ..., no sentido L..., P..., numa velocidade ‘moderada’, pela sua hemi-faixa de rodagem, atento o sentido da marcha em que seguia, circulando com atenção ao tráfego de peões e veículos que se fazia sentir, quando foi subitamente embatido pelo veículo PU, que, saindo da A4, não respeitou o sinal de STOP, invadindo a faixa de rodagem onde circulava o EJ.

3. A Estrada Nacional ..., cerca do quilómetro 25, à saída da autoestrada A4 configura uma reta com mais de 2 Km de extensão, de perfil plano com ligeira inclinação.

4. O piso era e é de asfalto betuminoso, encontrando-se em perfeitas condições de conservação, sem buracos, nem irregularidades.

5. O tempo estava seco, bem como o pavimento, ultrapassando a visibilidade os 2000 metros.

6. O limite de velocidade no local do acidente é, em toda a sua extensão, de 90 km/h.

7. O autor circulava na referida estada nacional 106 a uma velocidade inferior aos 90 km/h.

8. O veículo PU circulava ‘sem prestar atenção ao trânsito’, nomeadamente àquele que circulava na nacional 106, como era o caso do veículo conduzido pelo autor.

9. No local do acidente compareceram duas ambulâncias do INEM e uma ambulância dos Bombeiros Voluntários de ..., tendo o A. sido transportado para o Centro Hospitalar T..., EPE.

10. Em virtude do acidente, o A. sofreu politraumatismo com os seguintes traumas: Fratura apófises espinhosas C7, D1 e D3 Fratura articular C6-C7 e transversa esquerda C7 (sem listeses) Fratura corpo D3 Fratura-luxação D6-D7, com fraturas da transversa esquerda de D6 e bilateralmente D7 Fratura corpo D8 e transversas direitas D8 e D9 Hematoma agudo intra-canelar entre C3 e C6 e em D6-D7 Luxação do cotovelo esquerdo Luxação trapézio-MTC + carpo – 2º MTC + fratura proximal F2 polegar mão esquerda Fratura ramo isquío-púbico direito.

11. Foi submetido a intervenção cirúrgica: instrumentação pedicular D4- D5-D7-D8-D9 com APL + laminectomia D6 e parcial D7; CRIF luxação carpo – 1º e 2º MTC mão esquerda com fios Kirschener; CRIF luxação cotovelo esquerdo com cravo Steinemann – imobilização com tala à esquerda + 1º dedo mão esquerda.

12. Esteve internado na UCIP (unidade de cuidados intensivos polivalente) durante um período de 8 dias e posteriormente transferido para o Serviço de Ortopedia do Centro Hospitalar T..., EPE.

13. Em ... de Fevereiro de 2018 foi transferido para o CR... (Centro de Reabilitação ...) onde ficou internado a realizar programa de reabilitação até ...-07-2018.

14. Enquanto no CR... o Autor apresentava: Derrame pleural, tendo sido realizado RX tórax a 06-03-2018 e avaliado por pneumologista consultor do CR... que considerou que a etiologia do derrame pleural à esquerda necessitava de investigação diagnóstica, foi encaminhado para avaliação para o CH.... Em 16-03-2018 realizou toracentese com drenagem de 160cc de líquido pleural, em 03-04-2018 realizou ecografia torácica que demonstrou derrame de médio volume à esquerda, a 12-04-2018 foi ao CH... e foi decidido manter vigilância; Citocolestase (que consiste numa diminuição ou interrupção do fluxo biliar. Na presença de colestase, o fluxo da bile é prejudicado em algum ponto entre as células do fígado (que produzem bile) e o duodeno (o primeiro segmento do intestino delgado)) Anemia Quadro de febre a 19-06-2018 com ponto de partida provável em infeção da ferida operatória Rouquidão (em virtude de pólipo na corda vocal, em provável relação com trauma da intubação de Janeiro de 2018) Onicocriptose (dor ou inflamação que ocorre no dedo quando a borda lateral da unha fere a pele adjacente, enterrando-a ao seu redor. Isto acontece porque a pele forma uma barreira ao crescimento da unha e, como esta é mais dura e não para de crescer, ela adentra a pele causando os sintomas mais comuns como dor e inflamação). Bexiga neurogénica (disfunção da bexiga (flácida ou espática) causada por lesão neurológica. Os sintomas podem incluir incontinência por transbordamento. O risco de complicações graves (por ex. infeções reincidentes, refluxo vesico ureteral e disreflexia automática) é elevado, tendo que fazer algaliações intermitentes). Intestino neurogénico, com resolução Hemorroidas Agravamento dos espasmos noturnos Déficite de vitamina D

15. A 5 de Julho de 2018 o Autor foi transferido para a Medicina Física e Reabilitação do Hospital ..., onde realizou programa de reabilitação integral e abrangente.

16. Em Março de 2020, com a declaração do estado de emergência, o Hospital ... fechou as portas a todos aqueles que eram estranhos ao serviço, pelo que o Autor ficou privado de receber visitas, facto que se manteve inalterado até 27 de Novembro de 2020, sendo que em 14 de Outubro de 2020 testou positivo a Sars cov 2 e finalmente em 27 de Novembro de 2020 foi programada alta para o domicílio, mantendo programa de reabilitação em ambulatório, devendo continuar o programa de reabilitação integrado e abrangente para estimular o potencial funcional que apresenta, o que até à presente data e não obstante as suas inúmeras solicitações à Ré ainda não logrou iniciar.

17. Desde a data do acidente e até à presente data o autor sofre de ‘imensas e torturantes’ dores físicas, nomeadamente dores ao nível da coluna cervical,

18. Ficou com a sua mobilidade reduzida, necessitando do auxílio de uma cadeira de rodas para se conseguir deslocar.

19. Perdeu, em consequência do acidente, toda a autonomia a que estava habituado, pois não consegue, nomeadamente, efectuar a sua higiene diária sozinho, vestir-se, preparar a sua alimentação, bem como praticar os demais atos da vida doméstica, condicionado e limitado como ficou estando totalmente dependente de terceiros.

20. Tem ainda dificuldade em dormir as horas necessárias ao seu repouso, por não conseguir uma posição cómoda que lhe permita estar deitado sem dores, necessitando da ajuda de terceiros para durante a noite o mudarem de posição, atentas as dores que sente e a incapacidade de o fazer sozinho.

21. O programa de reabilitação integral e abrangente que realizou pelo menos até ao ano de 2020 e que deverá continuar, constituiu um processo ‘extremamente doloroso’ pois que os movimentos que era obrigado a realizar lhe causam ‘imensas dores’.

22. Tomou e toma, por prescrição médica, relaxantes, analgésicos e anti-inflamatório, tais como Lidocaina, Diosmina, Rivaroxabano, Paracetamol, Diazepam, Chinchocaína, Bisacodilo, Gelatina + Glicerol G Gel Rect Bisn, Fluconazol, Ácidos Gordos Hiperoxigenados, Benzidamina, Sildenafil Sandoz.

23. Necessita, ainda, para uso no seu dia-a-dia de 6 esponjas de higiene, Saba – solução antissética de base alcoólica, luvas não esterilizadas, compressas, lidocaína gel lubrificante, algalia Foley, sacos de urina com torneira (3x/dia), 7 vezes por dia saco e esvaziamento, soro fisiológico (3x/dia), seringas (2x/dia), resguardos de plástico e sondas de esvaziamento vesical Nelaton.

24. O A. necessita de realizar 4 a 5 sessões semanais de programa de fisioterapia de manutenção, os quais ainda não lograram iniciar-se por falta de autorização da Ré para o efeito.

25. Necessita, ainda, o A. da ajuda de terceira pessoa, quer para a execução dos normais e especiais cuidados de higiene de que necessita, quer para a confeção das suas refeições, quer para a preparação (lavagem e passagem a ferro) do seu vestuário e ajuda a vestir-se, quer para ir ao WC, quer para se deitar e levantar, quer mesmo durante a noite porque tem que ser virado regularmente (em virtude das dores de que padece), o que lhe retirou toda a qualidade de vida que tinha.

26. O A. submeteu-se a consultas de ortopedia, exames e tratamentos.

27. O Autor sofre de stress pós-traumático com deficit das funções cognitivas (atenção, concentração, memória).

28. O Autor sente diariamente dores por todo o corpo, vendo-se impossibilitado de caminhar, sendo que necessita de medicação diária para que as possa suportar, sofrendo de ansiedade, fobias várias, pesadelos frequentes, alterações de memória, que condicionam a qualidade de vida, quer em termos anímicos, quer em termos funcionais.

29. À data do acidente, o Autor exercia as funções correspondentes à categoria profissional de ..., no M..., S.A., , ..., com um salário médio ilíquido de € 1.142,54, líquido médio de € 795,36 e base de € 670,00 (conforme docs. n.ºs 6 e 118 a 122 da PI, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, designadamente: € 670,00 a titulo de retribuição de base; € 52,81 a título de subsídio de transporte; € 118,00 a título de subsídio de alimentação; € 78,75 a título de retribuição por trabalho noturno; € 118,89 a título de prémio mensal de produtividade; € 54,42 por trabalhar ao domingo).

30. Fruto das lesões que sofreu, e nos períodos em que as dores e as limitações se agudizam, o Autor fica abatido, triste, desanimado e menos expansivo.

31. O autor nasceu a ...-...-1978, conforme doc. n.º 7 da PI, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

32. Era uma pessoa saudável, não padecendo de quaisquer lesões ou sequelas que o limitassem, pessoal ou profissionalmente.

33. Era uma pessoa alegre, extrovertida e de bom humor, muito dada a convívios sociais com familiares e amigos.

34. Fazia caminhadas regularmente, frequentava o ginásio, participava em passeios em grupo de motociclo, atividades que realizava com familiares e amigos e que lhe davam imenso prazer e cuidava de si e dos seus com afeto e dedicação.

35. Atentas as dores, as limitações físicas, a dependência constante de terceiros para a realização das tarefas mais básicas de um ser humano, tudo de que padece em virtude do acidente, tornou-se uma pessoa taciturna, triste e irrascível, evitando constantemente a presença de familiares e amigos, recusando-se a falar com os mesmos por qualquer forma, mesmo por telefone ou videoconferência, sentindo uma constante sensação de pânico sempre que tem que sair de casa.

36. O autor ficou impedido de andar necessitando da ajuda de uma cadeira de rodas para o fazer, passou a necessitar de usar algálias diariamente, vivendo angustiado com a ideia de ficar com limitações permanentes na sua vida.

37. Sente a sua vida normal ter-lhe sido roubada, necessitando do apoio da mulher e filha, para as inúmeras atividades que fazia normalmente e que agora não consegue.

38. Não consegue proceder, sem ajuda, à sua higiene diária, à confeção dos seus alimentos, a qualquer saída à rua, a realizar o simples ato de se vestir, a ir ao WC, como sempre fez normalmente, atentas as dores e as limitações de que padece, pelo que necessita para o efeito da ajuda constante de terceiros, sentindo-se revoltado sempre que tem que pedir essa ajuda.

39. Não pode, sozinho, ir passear, ir às compras, apenas e só porque não consegue movimentar-se, pelo que e mais uma vez ficou a depender de terceiros para o fazer.

40. Deixou de fazer as suas normais caminhadas diárias, em virtude das dores que o impedem de o fazer e da impossibilidade de usar as suas pernas para o efeito, não tendo conseguido praticar qualquer desporto até à data da propositura da acção.

41. Fica triste e chora muitas vezes sem qualquer motivo aparente, tendo-se tornado uma pessoa triste e revoltada por ter perdido a sua independência e depender de terceiros para a realização de quase todos os atos da vida corrente.

42. Toda esta situação e a incerteza do futuro causa no autor grande tristeza, angústia e revolta, bem como receio de lhe advirem lesões no futuro por força das lesões sofridas em virtude do acidente em causa nos presentes autos.

43. O A. apresenta as seguintes sequelas: − Ráquis: Não apresenta capacidade por passar de deitado para sentado sem apoios. Impossibilidade de se manter na posição de sentado sem apoio dos membros superiores. − Membro superior esquerdo: Limitação na pronação do cotovelo esquerdo, a cerca de 30º. Rigidez na 1ª metacarpofalângica do polegar esquerdo. − Membro inferior direito: Força muscular 0 nos membros inferiores com marcada espasticidade, com ação de clónus muscular no membro inferior esquerdo na realização de flexão passiva dos membros inferiores.

44. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 27/11/2020. O Período de Défice Funcional Temporário Total sendo assim fixável num período de 1033 dias. O Período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total sendo assim fixável num período total de 1033 dias. O Quantum Doloris fixável no grau 7/7. O Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica fixável em 72 pontos. As sequelas descritas, em termos de Repercussão Permanente na Atividade Profissional, são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, sendo, no entanto, compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional. O Dano Estético Permanente é fixável no grau 5/7. A Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer é fixável no grau 6/7. A Repercussão permanente na Atividade Sexual é fixável no grau 5/7. O A. necessita das seguintes ajudas técnicas permanentes: ajudas medicamentosas; tratamentos médicos regulares; ajudas técnicas; adaptação do domicílio, do local de trabalho e do veículo; e de ajuda de terceira pessoa.

45. As Dependências Permanentes de Ajudas consistem em: ▪ Ajudas medicamentosas, conforme prescrição pelos médicos assistentes, de acordo com o previsto na página 10 do relatório da Prof. DD, junto em 13/08/2021 (e secundado nesta parte pelo relatório pericial do INML), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. ▪ Tratamentos médicos regulares, tais como acompanhamento em consulta de MFR (4 vezes por ano) e Urologia (1 vez por ano). Tratamentos fisioterapêuticos mantidos de acordo com prescrição por MFR, pelo menos 3 vezes por semana, para sempre). ▪ Ajudas técnicas, designadamente, cadeira de rodas, cadeira de banho, meias de compressão elástica, cama articulada e a respetiva substituição e manutenção dos equipamentos, assim como os restantes referidos nas páginas 10 e 11 do relatório da Prof. DD, na página 6 da nota de alta do Hospital ... e na adenda 1.1 do relatório do Hospital ..., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. ▪ Adaptação do domicílio, do local de trabalho e do veículo, designadamente de adaptação do domicílio, que já tem vindo a ser realizada mas ainda não está otimizada, adaptação de carro para permitir a utilização pelo examinando, melhorando a sua autonomia, e eventuais alterações no local de trabalho caso seja possível reconvertê-lo profissionalmente, numa ação conjunta com a entidade patronal. ▪ Ajuda de terceira pessoa, com dependência da mesma para a realização de atividades de vida diária, fixável em 8h diárias.

46. O autor despendeu em consultas e tratamentos e medicamentos a quantia de € 930,00.

47. Desde que foi transferido para o Hospital ... em 05-07-2018, todos os finais de semana a mulher do autor deslocava-se ao referido hospital, à sexta-feira para recolher o autor, bem como a sua roupa para lavar, que passava o final de semana em casa com a família e deixava-o no estabelecimento hospitalar no domingo.

48. A partir do mês de Março de 2020 o A. deixou de poder vir passar o final de semana com a família e mesmo de receber quaisquer visitas, sendo que e não obstante a mulher do A. tinha que se deslocar ao Hospital ... todas as semanas para levantar a roupa suja do autor, tratar da mesma e regressar ao hospital para aí entregar roupa limpa para essa semana.

49. Desde que o autor deu entrada no Hospital ..., todos os finais de semana teve que despender 4 viagens (L...-Hospital...., Hospital ... - L... e no regresso L...-Hospital...., Hospital ... - L...) e entre o Hospital ... e o local de residência do autor distam 39,4 quilómetros (conforme doc. n.º 93 da PI, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), pelo que todos os finais de semana o autor (ou a sua mulher para seu benefício) percorria 157,60 (39,4 x 4) quilómetros para, e até 08 de Março de 2020, recolher o autor e a sua roupa e a partir dessa data recolher a roupa do autor, tratar da mesma e levá-la de novo ao hospital, tendo o autor (ou a sua mulher) percorrido nessas deslocações 19.384,80 quilómetros em viatura própria, com o valor mínimo de € 6.978,53 e a título de portagens por cada deslocação a quantia de € 2,15, no montante global de € 1.057,80 (492 deslocações x € 2,15), tendo a R. já pago ao A. a título de deslocações a quantia global de € 3.530,30.

50. Em consequência do acidente em causa nos presentes autos ficaram destruídos todos os bens (roupa, calçado, telemóvel, entre outros) que o autor tinha em sua posse, no montante global de € 1.621,79 : Calças de ganga, marca Salsa, no valor de € 139,00 Sweatshirt, marca Salsa, no valor de € 64,90 T-shirt, marca Salsa no valor de € 49,90 Sapatilhas, marca adidas no valor de € 120,00 Capacete NEXX SX 100 BLAST, no valor de € 197,99 Casaco pele, marca Dainese, no montante de € 530,00 Luvas pele, marca SHOEI, no valor de € 120,00 Telemóvel marca Sony Xperia Z1 Compact, no valor de € 399,90

51. O veículo automóvel ligeiro de passageiros, marca Opel, matrícula ..-..-PU, propriedade de J..., Lda, conduzido, na altura do acidente, por CC, tinha a sua responsabilidade civil emergente de acidentes de viação transferida, à data do acidente, para a Ré, por contrato de seguro, com a apólice nº ........11.

52. A Ré assumiu a responsabilidade pelo acidente a 22 de Fevereiro de 2018.

53. A Ré já disponibilizou ao autor algumas das ajudas técnicas de que aquele necessita, nomeadamente, Cadeira de Rodas (a qual necessitará de manutenção e mais tarde possivelmente substituição), cama articulada, almofada anti escara e cadeira de banho.

54. Apesar de já ter a Ré disponibilizado ao autor a cadeira de rodas necessária ao seu transporte, certo é que não vem liquidando as quantias despendidas pelo autor quer numa bomba de ar para encher os pneus, quer nas reparações que se vêm mostrando necessárias, no montante global de € 58,42.

55. Também já foram feitas obras de reabilitação da casa de morada de família onde o autor reside, de acordo com os orçamentos apresentados pelo autor e aceites pela Ré.

56. Não obstante a Ré ter liquidado a quantia devida pelas obras realizadas na residência do autor e pela instalação do elevador para que o autor possa aceder à sua habitação, certo é que não procedeu à liquidação da quantia devido a título de IVA de € 299,10.

57. Em virtude do necessário aumento da capacidade elétrica do quadro das partes comuns para que o elevador pudesse funcionar, o autor teve que despender a quantia de € 152,50, e um consequente aumento da conta de eletricidade todos os meses, tendo o A. já pago a quantia de € 75,92 (deduzindo os usuais € 9,00 despendidos mensalmente pelo condomínio), tendo o condomínio optado por não ter acesso ao elevador, o qual se destina a uso exclusivo do autor que apenas necessita do uso do mesmo em consequência do acidente em causa nos presentes autos.

58. A instalação de um elevador exige que seja regularmente feita a sua manutenção, tendo a Ré sido confrontada com a escolha de um contrato de manutenção mais completo com o valor de € 80,00/mês e um contrato de manutenção mais simples com o valor mensal de € 50,00, tendo a Ré optado pelo contrato com o valor mensal de € 50,00/mês, contrato esse que a mulher do sinistrado celebrou em nome do autor em virtude de aquele se encontrar incontactável no Hospital ....

59. O autor já liquidou a quantia de € 55,35 referente à primeira mensalidade do contrato de manutenção.

60. Atenta a necessidade de uso de cadeira de rodas, para que o autor se consiga deslocar é necessária a instalação de plataforma de elevador de escada a instalar na escadaria de acesso ao patamar do elevador na entrada do edifício, que por lapso do perito averiguador e do empreiteiro responsável pela obra não foi inicialmente colocado na obra realizada e sem esta plataforma de elevador de escada o autor não consegue aceder ao exterior do edifício onde reside em virtude da existência de escadas, sendo que é impossível ser levado ao colo, pois quer a mulher, quer a filha não conseguem suportar, nem têm que o fazer, o peso do autor.

61. O orçamento da colocação desta plataforma foi submetido à aprovação da R., no montante de € 9.970,00, acrescida de IVA à taxa legal em vigor, sendo que até à presente data a Ré só pagou o valor da colocação, faltando pagar o valor do IVA de € 299,10.

62. De 30 de Janeiro de 2018 a 27 de Novembro de 2020 o Autor deixou de auferir o seu salário e respectivos subsídios.

63. Até à data da entrada da acção em juízo, a R. procedeu ao pagamento ao A. das seguintes quantias: transporte, tal como referido, de € 3.530,30; assistência clínica € 193,25; farmácia € 878,61; perdas salariais € 50.722,05; subsídio de readaptação da habitação, que inclui a colocação de plataforma de elevador de escada para acesso ao exterior do edifício onde reside, de € 45.988,06; ajuda de terceira pessoa, de € 14.400,00.

64. O ISS pagou ao A. a título de subsídio de doença a quantia de € 6.811,58, que a R. se obrigou a pagar àquele.

65. Não obstante ter o A. ficado impedido de realizar as atividades desportivas e de lazer que realizava antes do acidente, certo é que iniciou- se no desporto adaptado – Vela Adaptada – que de acordo com opinião médica (conforme Doc. n.º 1 do incidente de liquidação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido), “é um desporto que promove a autonomia total na atividade, um aumento das capacidades físicas ao nível do equilíbrio e força muscular, uma eficaz integração social e por conseguinte um aumento da autoestima e da condição psicológica, pelo que se aconselha a sua prática”, exigindo a prática da vela adaptada que o A. seja proprietário dos meios necessários à sua prática, os quais orçam na quantia de € 12.028,01.

66. Em virtude do acidente o A. ficou paraplégico e com impotência coeundi por ausência de ereção, sendo que por vezes, mas muito raramente, e já nem com a ajuda de medicação específica consegue ter ereção e em virtude da sua impotência sexual o A. sente-se diminuído enquanto homem, afirmando regularmente à sua mulher “eu agora não te consigo satisfazer, sou um zero à esquerda” e à data do acidente o A. e sua mulher andavam a tentar engravidar pois que ter um outro filho era o sonho do A., sendo que, mesmo e apesar de saber que o poderá fazer com ajudas próprias, refere que não é a mesma coisa e que nunca mais poderá fazer com um outro filho aquilo que fazia com a sua filha.

67. O A. já pagou: - Em consumos acrescidos de energia nas partes comuns do edifício, a quantia de € 435,60, correspondentes aos consumos entre os meses de março de 2021 e junho de 2022 inclusive (conforme Docs. 4 a 23 do incidente de liquidação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); - Em despesas com conservação e assistência ao elevador (contrato de manutenção celebrado e já junto aos autos) entre os meses de março de 2021 e Setembro de 2022, a quantia de € 1.071,57.

68. Em tratamentos de fisioterapia e acupunctura, entre outros o A. despendeu a quantia global de € 8.900,30.

69. Enquanto que os tratamentos de fisioterapia fornecidos pelos serviços da Ré apenas consistiam em tratamentos de manutenção (apenas à parte superior do corpo), os demais tratamentos realizados pelo A. destinam-se a trabalhar todo o seu corpo, desta forma impedindo que o A. perca a massa muscular na parte inferior do corpo, a qual por estar imobilizada necessita de mais trabalho que as demais.

70. As necessidades medicamentosas do A. consistem, nomeadamente, e actualmente de forma mensal: de esponjas com sabão 12x20m (pack de 24), algália de foley 2 vias latex siliconado 30 ml Ch14 (30 unidades), saco de urina c/ válvula Anti-ret c/ torneira puxar 2L (30 unidades), seringa com Luer Central estilizada 10 ml (60 unidades), resguardos para incontinência 60x90cm (180 unidades), Penso absorvente masculino lvl 2 Tena men (embalagem 20 unidades), solução desinfetante Sterillium 500ml (2 unidades), soro fisiológico 60 ml (7 unidades), compressa esterilizada de TNT 4cam 5(pc) 10x10cxm (271unidades) luvas de exame vinil s/pó M (1 caixa), venex forte 450mg x 60 comprimidos (1 caixa), paracetamol Sandoz 1000 x 20 comprimidos (1 caixa), diazepam Pharmakern 10 mg x 60 comprimidos (1 caixa), dulcolax 5 mg x 40 comprimidos (1 caixa), microlax 450/45mg/5ml x 6 enemas (5 caixas), sildenafil Sandoz 50 mg x 4 comprimidos (1 caixa), durex sensilube KY – gel intim Lubr 75 ml (4 caixas), Faktu pomada retal (1 caixa), Corpitol sol. Cutânea 50 ml (2 caixas), Lidonostrum gel 2% 30 g (4 caixas), Ditropan 5mg x 60 comprimidos (2 caixas), Betmiga 50mg x 30 comprimidos (1 caixa), Xarelto 10mg x 30 comprimidos (1 caixa), neutrogena corpo hid prof loção Psec 750 ml (4 unidades, meias elásticas AD plus 201 CL 2 s/ biq bege (III) (2 unidades) e outros conforme prescrição médica, de acordo com o estabelecido a páginas 10 e 11 do Relatório da Prof. Dra. DD, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

71. O A. necessita, ainda, de tratamentos médicos regulares, nomeadamente: fisioterapia 12 x/mês, como já vem fazendo na Clínica do Dr. ..., fisioterapia neurológica como já vem fazendo na clínica E.........., em ..., tratamentos de acupuntura, antibioterapia no caso de infeção urinária, entre outros necessários ao bem-estar físico e emocional do A..

72. O A. necessita, também, de consultas da especialidade: medicina física e de reabilitação, neurologia (as quais ocorriam 4 vezes por ano, com recurso a ressonâncias magnéticas e eletromiografias auxiliares de diagnóstico, anestesiologia medicina da dor, 3 vezes por ano com recurso a bloco operatório para infiltração de toxina, com apoio a mecanismo) e urologia (com ecografias vesicais e renais e estudos urodinâmicos), com cirurgias ou idas ao bloco quando necessário (o A. padece de uma lesão no nervo ciático, pelo que foi necessária uma ida ao bloco por forma a introduzir toxina no musculo da nádega, com uso de epidural, tendo sido informado pelo médicos que esta situação se iria repetir, sem previsão de quantas vezes por ano.

73. O A. necessitará de exames médicos que as especialidades possam requerer e como refere a Prof. DD no seu relatório “essencialmente, estudos analíticos com bacteriológicos de urina e antibiograma”.

74. Bem como necessitará, ao longo do tempo, das ajudas técnicas já aludidas, que compreendem, nomeadamente, cadeira de rodas manual e cadeira de rodas elétrica com funções elétricas de assento, almofada para cadeira de rodas, cadeira de banho com acessórios – almofada suave, aparadeira, apoios de braço, cama articulada de casal, colchão de prevenção e sua manutenção/substituição, elevador de transferência, cestas de transferência e respetivos acessórios, componentes e manutenção, num valor indeterminado mas não superior a € 315.450,00, bem como custos inerentes a taxas camarárias e outras devidas pelo elevador, em valor indeterminado mas não superior a 600,00/ano e ainda custos de manutenção da plataforma de escada, num valor indeterminado mas não superior a € 300,00/ano.

75. O autor necessita da adaptação de um veículo automóvel, com a aplicação de selecção automática da relação de transmissão (10.02); de Travão de Serviço (20.06); e de Acelerador manual (25.04) num valor indeterminado mas não superior a € 10.500,00.

76. O A. necessitará, ainda, do pagamento pela Ré de táxi ou outro transporte conduzido por terceiros, enquanto não dispuser de viatura adaptada, nomeadamente para se deslocar a tratamentos, consultas e exames, o que, nesta data, terá um custo de cerca de € 78,00/semana, bem como da adaptação do domicílio já realizada com o devido custo de manutenção/reparação/substituição dos elementos colocados (nomeadamente no WC) e eventual adaptação do local de trabalho às necessidades do A..

77. De acordo com os esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito ao relatório pericial, quanto à necessidade de ajuda de terceira pessoa durante 8h/dia, “o sinistrado apresenta uma paraplegia de nível alto, com afetação do tronco. Assim não tem funcionalidade nos membros inferiores e não tem capacidade de segurar o tronco sem apoio externo, como sejam os braços, nem de passar sozinho da posição de deitado para sentado. Tem alguma autonomia nas transferências de e para a cadeira de rodas. Assim é de prever que o examinando necessite de ajuda de terceiros para todas as atividades que obriguem a transferir da posição de deitado para sentado e que necessitem de estabilidade do tronco, tais como levantar da cama, vestir-se, tratar da sua higiene, como tomar banho e fazer a barba, comprar produtos para a alimentação, transportá-los para o seu domicílio e armazená-los devidamente, preparar as refeições, gerir os resíduos produzidos, entre outras atividades. Também é necessário ter em conta que caso tenha a infelicidade de cair ao chão, não tem nenhuma possibilidade de se levantar sem ajuda de uma terceira pessoa, pelo que também é de considerar esta necessidade de vigilância em caso de acidente.”


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Fundamentação de direito.

O princípio base da responsabilidade civil extracontratual consta do nº1 do art. 483º do CCivil segundo o qual “Aquele que com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.”

Do dispositivo legal citado retira-se que a responsabilidade civil extracontratual pressupõe um facto voluntário e ilícito, o nexo de imputação do facto ao agente, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

Na presente revista não é questionada a verificação dos aludidos pressupostos, estando apenas em causa a fixação do montante indemnizatório nos termos suscitados nas conclusões do recurso.

Estabelece-se no art. 564º do Código Civil que:

1. O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, mas também os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência das lesões.

2. Na fixação da indemnização pode ainda o tribunal atender aos danos futuros, desde que previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior.

Por sua vez, a obrigação de indemnizar, a cargo do causador do dano, deve reconstituir a situação que existiria “se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação” (art. 562º do CC).

Não sendo isso possível ou quando a reconstituição natural não repare integralmente os danos, ou seja excessivamente onerosa para o devedor, deve a indemnização ser fixada em dinheiro (art. 566º do CC).

E se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará segundo a equidade, (nº3 do art. 566º do Código Civil).

Estes os princípios básicos. Vejamos o caso presente.

Da indemnização por perda de capacidade de ganho e dano biológico.

É hoje consensual na jurisprudência do STJ que ao arbitrar-se indemnização pelo dano patrimonial futuro deve ter-se em consideração não apenas a parcela dos rendimentos salariais directa e imediatamente perdidos em função do nível de incapacidade laboral do lesado, mas também o dano biológico sofrido pelo lesado, perspectivado como diminuição somático-psíquica e funcional, com substancial e notória repercussão na vida pessoal e profissional de quem o sofre.

Como referido no acórdão deste Tribunal 09.05.2023, P. 7509/19, “o dano biológico que emerge da incapacidade geral permanente, de natureza patrimonial, reclama a indemnização por danos patrimoniais futuros, independentemente de o mesmo se repercutir no respectivo rendimento salarial, consubstancia um “dano de esforço”, na medida em que o lesado para desempenhar as mesmas tarefas e obter o mesmo rendimento, necessitará de uma maior actividade e esforço suplementar.” (Neste sentido, no plano jurisprudencial, por exemplo, os acórdãos do STJ de 16/06/2016 (p. nº 364/06), de 05/12/2017 (p. nº 505/15), de 22/02.2022 (p. 1082/19) e de 21/04/2022 (p. 96/18).

No caso dos autos resultou provado que:

O acidente que vitimou o Autor ocorreu em ... de Janeiro de 2018, a um mês de completar 40 anos de idade;

À data do acidente, exercia as funções de Operador Especializado, no M..., S.A., ..., com um salário médio ilíquido de € 1.142,54;

O acidente deixou o Autor politraumatizado (cf. facto 10 supra);

A data da consolidação médico-legal das lesões foi fixada como tendo ocorrido em 27 de Novembro de 2020;

Por causa do acidente, o Autor é portador de défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 72 pontos, sendo as sequelas impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, mas compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional

A sentença de 1ª instância avaliou o dano de perda de capacidade de ganho e o dano biológico sem os distinguir, e num juízo de equidade fixou a indemnização por “perda da capacidade de ganho, contabilizado como dano futuro” em € 300.000,00, valor a que deduziu €25.719,23 já recebidos, resultando assim o direito à indemnização de € 274.280,77.

O Autor não recorreu da sentença, tendo-o feito apenas a Ré.

O acórdão recorrido, que começou por referir que “o caso julgado favorável ao apelado incluiu o valor global do objecto do recurso e não os montantes parcelares invocados pelo apelante”, distinguiu o dano biológico dos lucros cessantes (perdas salariais), valorando o primeiro com a quantia de €135.000,00, e os segundos em €180.000,00, assim atribuindo ao Autor uma indemnização por dano patrimonial futuro/dano biológico no montante de €315.000,00, superior à fixada na sentença a este título.

Pretende o Recorrente que o dano patrimonial futuro por perda de capacidade de ganho e dano biológico, deve ser fixado “em cerca de € 450.000,00, deduzidos os montantes já liquidados pela Recorrida”, ou pelo menos “em valor superior ao arbitrado”. (conclusões 15ª e 16ª).

Trata-se de pretensão que não pode ser atendida.

O Autor/recorrente não interpôs recurso da sentença de 1ª instância, conformando-se com a decisão nela tomada que fixou em €300.000,00 a indemnização a título de dano patrimonial futuro, por perda de capacidade de ganho e dano biológico. A aceitação da decisão, equivale à renúncia ao recurso (art. 632º, nº2, do CPC).

Acresce que tendo o acórdão recorrido melhorado a situação do Autor – na medida em que aumentou a indemnização por dano patrimonial futuro/dano biológico de €300.000,00 para €315.000,00 – verifica-se uma dupla conforme em face da jurisprudência uniformizada pelo AUJ nº 7/2022, DR, série nº1, de 18.10.2022: “em acção de responsabilidade civil extra-contratual fundada em facto ilícito, a conformidade decisória que caracteriza a dupla conforme impeditiva da revista, nos termos do art. 671º, nº3 do CPC, avaliada em função do benefício que o apelante retirou do acórdão da Relação é apreciado separadamente, para cada segmento decisório autónomo e cindível em que a pretensão indemnizatória global se encontra decomposta.”

Por conseguinte, neste particular, a revista improcede.


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Da indemnização por danos não patrimoniais.

Regem os artigos 496º, nº3 e 494º do CCivil.

A indemnização a atribuir por danos não patrimoniais é a que resulta do desgosto, da dor, do desespero em que uma pessoa se vê por estar diminuída fisicamente, suportando dores e incómodos com lesões que permanecem e que a usura do tempo tende a agravar. (acórdão do STJ de 21.03.2013, P.565/19, www.dgsi.pt).

Nas palavras de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 9ª edição, pag. 549, “…os danos não patrimoniais, embora insusceptíveis de uma verdadeira e própria reparação, porque inavaliáveis pecuniariamente, podem ser, em todo o caso, de algum modo compensados. E mais vale proporcionar à vítima essa satisfação do que deixá-la sem qualquer amparo.”

Trata-se de conferir ao lesado a possibilidade de aquisição de meios materiais ou espirituais que, razoavelmente, lhe possam proporcionar uma qualquer autogratificação ou satisfação capaz de iludir o dano sofrido. A reparação do dano não patrimonial deve ser feita de forma condigna, sendo de rejeitar as indemnizações miserabilistas ou meramente simbólicas. (cf. , por todos, o acórdão do STJ de 19.01.2016, CJ/STJ, I, p. 91 e ss)

O seu montante será fixado equitativamente pelo tribunal tendo em conta as circunstâncias referidas no art. 494º do CC, ou seja, o grau de culpa do agente, a situação económica deste e as demais circunstâncias do caso, entre as quais se contam as lesões sofridas e os correspondentes sofrimentos, não podendo esquecer-se ainda, para evitar soluções demasiadamente marcadas pelo subjectivismo, os padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência.

“A ponderação sobre a gravidade do dano não patrimonial que se reflecte na fixação do montante indemnizatório deve ter em conta uma ideia de proporcionalidade. A danos mais graves correspondem montantes mais elevados. A lesões de maior gravidade correspondem danos mais graves”, escreve Maria Manuel Veloso, “Danos não Patrimoniais, in “Comemorações dos 35 anos do Código Civil, Volume III, Coimbra Editora, p. 543 e 544).

A doutrina e a jurisprudência têm teorizado sobre os modos de expressão do dano não patrimonial, nele distinguindo como mais significativos e importantes, o chamado “quantum doloris”, que sintetiza as dores físicas e morais sofridos no período de doença e de incapacidade temporária, o “dano estético” que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima, “o prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, que respeita á inserção social do lesado, nas suas variadíssimas vertentes (familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural, cívica), o “prejuízo da saúde geral e da longevidade” (aqui avultando o dano da dor e o défice de bem estar), que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e corte na expectativa de vida, o “pretium juventutis” que realça da especificidade da frustração do viver em pleno a primavera da vida.

No caso, a sentença de 1ª instância fixou a indemnização no valor actualizado de €300.000,00 acrescida de juros de mora a contar da sentença, valor que a Relação baixou para €150.000,00.

O Recorrente pugna para que seja repristinado o quantum fixado na sentença.

Socorrendo-nos da jurisprudência mais recente do STJ, como indicador ou auxiliar na questão da proporcionalidade, julgamos assistir alguma razão ao Recorrente, justificando-se uma subida da indemnização a este título.

Sem preocupação de exaustividade vejamos alguns arestos mais recentes deste Tribunal, consultáveis em www.dgs.pt.:

No acórdão de 11/01/2024, P. 76/13, considerou-se proporcional aos danos não patrimoniais sofridos pela Autora/sinistrada, com 37 anos de idade à data do acidente, com défice funcional de integridade psíquico-físico de 9 pontos; consolidação das lesões cerca de 3 anos após o acidente, “quantum doloris” avaliado em 4 numa escala de 7; submetida a terapêuticas medicamentosas agressivas durante cerca de um ano, apresenta um quadro de humor depressivo, com episódios de ansiedade, necessitando de apoio psicológico, e deixado a prática desportiva (caminhadas e bicicleta), a indemnização de € 45.000,00.

No acórdão de 07/05/2024, P. 807/18, considerou-se equitativa a quantia de €55.000,00 a título de danos não patrimoniais, no quadro factual em que o sinistrado tinha 37 anos à data do acidente e 40 anos à data da consolidação das lesões; com défice funcional de integridade psíquico-físico de 17 pontos; “quantum doloris” de grau 6/7; dano estético de grau 3/7; repercussão na actividade sexual de grau 3/7; repercussão na actividade desportiva e de lazer de grau 3/7; irritabilidade constante, desconforto e ansiedade.

No sumário do Acórdão de 14/05/2024, P. 2736/19, lê-se:

“É equitativa a atribuição da compensação no montante de €50.000,00 por danos não patrimoniais ao A/lesado, de 72 anos de idade, colhido numa passadeira (…) violentamente projectado no solo e sofrendo luxação do ombro direito e que em consequência das sequelas decorrentes das lesões sofridas, registou um défice temporário funcional de 19 dias (…) “quantum doloris” no grau 5/7; um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 20 pontos em 100; dano estético permanente no grau 3/7, e que neste contexto deixou de poder utilizar a mão direita para as mais elementares tarefas do dia a dia (…) necessitando da ajuda de terceiros para a realização das tarefas básicas diárias, durante o resto da vida (…) sentindo-se por tudo isto deprimido e muito triste, sem gosto pela vida, impotente e revoltado, com pesadelos e desânimo constantes, quando antes do atropelamento era uma pessoa activa e dinâmica”;

Acórdão de 20/06/2023, P. 2833/17: “ É adequada a quantia de €150.000,00 fixada no acórdão recorrido como compensação por danos não patrimoniais no seguinte quadro: sinistrada com 35 anos à data do acidente; “quantum doloris” de grau de 7 em escala de 7; défice funcional de integridade psíquico-físico de 53 pontos; elevado prejuízo de afirmação pessoal: à data do acidente era uma mulher jovem, que praticava nos tempos livres uma arte marcial, que ficou impossibilitada de praticar, deixou de poder ter uma vida sexual satisfatória, danos que foram avaliados, respetivamente, nos graus 5 e 6 numa escala de 0 a 7; dano estético de grau 5/7; a isto acrescem as graves limitações que a Autora apresenta, como consequência das lesões sofridas no acidente: impossibilidade de estar muito tempo em pé, nem muito tempo sentada, impossibilidade de levantar pesos superiores a 4 kg, de subir ou de descer escadas, necessidade permanente de tratamentos médicos regulares, a saber: tratamentos de fisioterapia e acompanhamento médico-psiquiátrico, o que se traduz numa acentuada redução da qualidade de vida.”

Acórdão de 06/02/2024, P. 21244/17:

“Não diverge de modo flagrante dos padrões de avaliação jurisprudencial do dano de natureza não patrimonial sofrido pelo autor, jovem de 23 anos, que num acidente de viação a que não deu causa, sofreu graves lesões físicas com um grau de quantum doloris de 6/7, que viriam a demandar até à consolidação médico legal um período de cerca de dois anos e meio e provocaram um défice de integridade psíquico-físico de 61 pontos numa escala de 100, e a persistência de dores físicas, incómodos e mal estar que as sequelas das lesões lhe causam, o valor de €175.000,00.”

Fazendo um exercício de comparação entre os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor e os danos de idêntica natureza descritos nos arestos supra referidos, designadamente nos acórdãos de 20/06/2023 (P. 2833/17) e de 06.02.2024 (P.21244/17) – onde se atribuíram as indemnizações mais elevadas – verifica-se que as lesões e sequelas que atingiram o Autor superam aquelas, evidenciando um quadro de maior e intensa gravidade.

Avulta a circunstância de, sem qualquer culpa sua, aos 40 anos ter passado de um homem activo, que praticava desporto, para uma cadeira de rodas, totalmente dependente de terceiros para as tarefas básicas do dia a dia, tendo sofrido dores intensas (de grau 7/7), com défice funcional de integridade físico-psíquico de 72 pontos, com a vida sexual fortemente limitada por impotência coeundi por ausência de ereção, dano estético permanente de grau 5/7, repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer no grau 6/7, numa situação em que continua a necessitar de ajudas medicamentosas, tratamentos médicos regulares, de ajuda de terceira pessoa, o que tudo lhe provoca sentimentos de angústia, revolta e tristeza.

Tomando como critério as orientações da doutrina e da jurisprudência supra citadas e a gravidade dos danos morais sofridos pelo Autor entendemos que na particularidade deste caso é ajustado e equitativo atribuir a quantia de €200.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.


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Da indemnização devida pela necessidade de ajuda por terceira pessoa.

Consideraram as instâncias que o estado do Autor requer a ajuda permanente de uma terceira pessoa, que esta necessidade implica uma despesa que constitui um dano patrimonial que a Recorrida deve suportar, o que esta, diga-se, não questiona.

A sentença valorou este dano em € 647.539,20, considerando a idade do Autor à data do acidente, a esperança média de vida, o número de horas diárias (8h) e o valor equitativo de € 6,16/hora, ao qual subtraiu €14.400,00 já pagos pela Ré, reconhecendo assim o direito do Autor a receber € 633.139,20.

Outro foi o entendimento da Relação que para o efeito ponderou:

“O autor terá direito a esse valor, portanto desde a data em que terminou o internamento 05-07-2018 até à data da esperança de vida (74 anos), ou seja, 28.2.2052, perfazendo 33 anos e oito meses.

Dos factos provados nada resulta sobre a dimensão concreta desse prejuízo.

Quanto ao valor diária mensal existe um valor indicativo constante do anexo V da portaria 679/2009, na versão actualizada pela portaria 679/2009, de 25.6 (6,16 euros por hora).

Acresce que ao estarmos perante um dano futuro que irá perdurar durante 33 anos, o seu valor exato não é passível de fixação.

Pelo que se reputa adequado usarmos os mecanismos do no n.º 3 do art. 566.º do CC1.

Teremos ainda de frisar, face ao teor das alegações do autor, que o seu pedido concreto não diz respeito a 15 meses por ano, ou incluiu acréscimos legais ou horas extraordinárias, nada tendo sido sequer alegado (e provado) nessa matéria.

Ora, o valor constante da portaria (6,16 euros) parece ser o mínimo actual para limitar esse dano. Bastará dizer que implica uma quantia semanal de 246 euros, o qual nem sequer incluiu os demais descontos legais necessários sejam eles IVA na modalidade de prestação de serviços ou impostos e descontos legais.

Acresce que foi esse o valor aceite e liquidado pela apelante nas despesas que já suportou nesta matéria.

E, a sua liquidação efectiva implica 6,16 x 8 horas diárias x 365 dias x 33 anos e 8 meses = 605.404,80 euros.”

E com fundamento no recebimento antecipado fez incidir um abatimento de 10%, assim fixando a indemnização na quantia de € 544.863,52.

O Recorrente pugna para que seja repristinado o valor fixado na sentença, considerando que deve ser considerada como esperança média de vida 78 anos e não 74, e não efectuado qualquer abatimento. A Recorrida defende a confirmação da decisão recorrida.

Não há motivo para alterar o decidido na Relação.

Estamos perante um dano patrimonial futuro, em que não é possível averiguar o valor exacto dos danos desde logo por ser impossível determinar por quantos anos ainda viverá o Autor. Como assim há que julgar equitativamente, “dentro dos limites que tiver por provados” (art. 566, nº3 do CCivil).

A decisão recorrida utilizou os critérios habituais da jurisprudência para a fixação do valor indemnizatório por este tipo de dano (cf. o acórdão do STJ de 10.04.2024, P. 551/19), afigurando-se ajustado considerar 33 anos e 8 meses, a partir da data em terminou o internamento (05.07.2018), o que lhe permitirá responder às despesas com a necessidade de 3º pessoa até à idade de 74 anos, a esperança média de vida para os nascidos em 1978, conforme dados da Prodata referido no acórdão, representa solução equilibrada e razoável que por isso se confirma.

Também não merece censura o abatimento de 10% pela entrega imediata do valor indemnizatório. A antecipação da disponibilidade imediata do capital referente à indemnização por este dano futuro, que não o seu pagamento faseado ao longo do tempo previsto ou previsível, justifica uma dedução sob pena de haver um enriquecimento sem causa, face à possibilidade do Autor rentabilizar o valor recebido.(cf. os acórdãos do STJ de 30.03.2017, P. 2233/10, de 12.11.2019, P. 468/15, e de 06.02.2024, P. 21224/17).

O desconto de 10% é equitativo, além de estar em linha com a jurisprudência mais recente deste Tribunal.

Termos em que a revista procede parcialmente.

Decisão.

Pelo exposto, julga-se a revista procedente em parte, e nessa medida altera-se o valor de indemnização a título de danos não patrimoniais, que ora se fixa em €200.000,00 (duzentos mil euros), mantendo-se no mais o acórdão recorrido.

Custas por Recorrente e Recorrido, na medida do decaimento.

Lisboa, 19.09.2024

Ferreira Lopes (relator)

A. Barateiro Martins

Maria de Deus Correia