Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | ||||||||||||||||||||||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | |||||||||||||||||||||
Relator: | MARIA DO CARMO SILVA DIAS | |||||||||||||||||||||
Descritores: | RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL RESPONSABILIDADE CIVIL EMERGENTE DE CRIME FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO ERRO DE JULGAMENTO PODERES DE COGNIÇÃO ALTERAÇÃO DOS FACTOS FACTOS ESSENCIAIS DANOS PATRIMONIAIS PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA MATÉRIA DE DIREITO MATÉRIA DE FACTO PRINCÍPIO DISPOSITIVO PRINCÍPIO DO PEDIDO CONDENAÇÃO EM OBJECTO DIVERSO DO PEDIDO | |||||||||||||||||||||
Data do Acordão: | 10/16/2024 | |||||||||||||||||||||
Votação: | UNANIMIDADE | |||||||||||||||||||||
Texto Integral: | S | |||||||||||||||||||||
Privacidade: | 1 | |||||||||||||||||||||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | |||||||||||||||||||||
Decisão: | PROVIDO EM PARTE | |||||||||||||||||||||
Sumário : | I - Os recursos em apreciação respeitam, tão-somente, à condenação nos pedidos de indemnização civil. Assim, e não obstante a irrecorribilidade em termos criminais, atenta a autonomia das regras respeitantes à admissibilidade dos recursos civis face às dos penais, tendo havido agravação no valor das indemnizações em que os recorrentes foram condenados, e considerando os montantes em causa, são os recursos admissíveis nos termos dos artigos 400.º, n.º 3, 629.º e 671.º do Código de Processo Civil. II – Existe falta de fundamentação nas situações em que está em causa uma total ausência de fundamentação, bem como aquelas em que, apesar de estarmos perante uma decisão minimamente justificada, não é possível percecionar qual o percurso lógico do tribunal que conduziu àquele juízo decisório. III – Se o Tribunal da Relação, não obstante considerar que a fundamentação de 1.ª instância é “vaga e lacónica”, consegue alcançar o raciocínio subjacente a essa decisão, embora discorde dele, por existir uma divergência acerca da valoração dos elementos probatórios, trata-se não de falta de fundamentação mas de um erro de julgamento. IV – Como tal, considerando o tribunal de recurso que a prova produzida impunha uma conclusão distinta, inexiste fundamento para que proceda ao reenvio dos autos para a 1.ª instância, podendo o Tribunal da Relação, perante aqueles elementos, revogar a decisão e alterar a matéria factual em conformidade, por tal se inserir dentro dos seus poderes de cognição (art. 431.º, al. a), do CPP), inexistindo, nessa operação, qualquer violação do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. V – A alegação, em sede de pedido de indemnização civil, nomeadamente no que respeita aos prejuízos sofridos, pode ser feita de modo mais, ou menos, pormenorizado, devendo ser considerada, desde que apreensível e suficientemente concretizada. VI - O julgador não se encontra adstrito, de modo estanque, à concreta formulação adotada pelos sujeitos processuais nas peças por eles apresentadas. Tendo por referência a causa de pedir, conformadora do objeto do processo, e os factos essenciais alegados, neste caso, o prejuízo total sofrido pelas demandantes, nada obsta a que o Tribunal da Relação proceda a uma mais concretizada individualização e discriminação dos valores em causa, para melhor se perceber a fixação dos montantes indemnizatórios (que no caso foram alterados), não consubstanciando essa operação qualquer modificação da causa de pedir ou aditamento dos factos essenciais. VII - Em regra, o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista, não tem poderes de intervenção na fixação dos factos materiais da causa, não podendo sindicar a análise – correta ou não – do Tribunal da Relação, sobre a prova produzida, só conhecendo de matéria de direito. VIII - O art. 609.º do CPC estabelece os limites da condenação, prevendo, no seu n.º 1, que «[a] sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir». Assim, caso o Tribunal ultrapasse o valor do pedido, a decisão enferma da nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, al. e), do CPC. IX – Não é admissível a formulação de um pedido genérico, ao abrigo do disposto no art. 566.º, n.º 1, al. b), do CPC, quando, no momento da sua apresentação, as demandantes civis já tinham a oportunidade de determinar de modo definitivo as consequências dos atos ilícitos de que foram alvo, uma vez a utilidade económica do pedido não se encontrava dependente de mais nenhum outro elemento futuro. X - Não basta a mera alegação genérica no sentido de que foram provocados outros prejuízos superiores aos já invocados, sem que seja efetuada uma adequada quantificação monetária, para que tal alegação tenha relevância processual. XI – A condenação em montante superior ao que havia sido peticionado em sede de pedido de indemnização civil constitui uma efetiva violação do princípio do pedido, estando o acórdão a quo, nessa parte, ferido de nulidade, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, al. e), do CPC. XII - A existência de um erro de cálculo no montante indemnizatório poderá ser corrigido, ao abrigo do disposto no art. 380.º, n.º 1, al. b) do CPP, porquanto não importa qualquer modificação essencial, sendo o que resulta do texto do acórdão e dos factos provados. XIII – Havendo vários responsáveis pela prática do facto ilícito são todos eles solidariamente responsáveis pelo pagamento da quantia indemnizatória, nos termos do art. 497.º, n.º 1, do CC, independentemente do concreto benefício que cada um dos coarguidos teve com a prática do crime. | |||||||||||||||||||||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça Relatório I. 1. No processo n.º 2160/18.5T9LRA, do Juízo Central Criminal de ..., Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, por acórdão proferido em 31 de janeiro de 2022, foi decidido, no que aos pedidos de indemnização civil apresentados pelas demandantes União das Misericórdias Portuguesas (UMP) e Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) releva1: • Julgar improcedente, por não provado, o pedido cível formulado pela UMP/FCG contra os arguidos/demandados AA, BB, CC e DD; • Julgar improcedente, por não provado, o pedido cível formulado pela UMP/FCG por danos em produção, a liquidar em execução de sentença; • Julgar parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido cível formulado pela UMP/FCG (na proporção de 50% para cada uma das entidades), e, em consequência: • CONDENAR os arguidos/demandados EE, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia de € 26.088,00 (vinte e seis mil e oitenta e oito euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados da notificação para contestar até integral pagamento; • CONDENAR os arguidos/demandados HH, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia de € 80.809,97 (oitenta mil oitocentos e nove euros e noventa e sete cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados da notificação para contestar até integral pagamento; • CONDENAR os arguidos/demandados II, JJ, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia de € 70.035,36 (setenta mil trinta e cinco euros e trinta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados da notificação para contestar até integral pagamento; • CONDENAR os arguidos/demandados FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados [no processo de candidatura de KK], e de forma solidária a quantia de € 8.300,00 (oito mil e trezentos euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados da notificação para contestar até integral pagamento; • CONDENAR os arguidos demandados supra condenados solidariamente no pagamento das custas do pedido cível, por força e na proporção do respetivo decaimento; • Declarar isenta do pagamento de custas, por força do decaimento, a parceria UMP/FCG, face ao previsto no artigo 4, nº 1, alínea f) do Regulamento das Custas Processuais. 2. Inconformados com o acórdão proferido, os arguidos FF, GG, LL e MM, NN, OO e PP, EE, HH, II e JJ, QQ e RR, bem como as demandantes União da Misericórdias Portuguesas e a Fundação Calouste Gulbenkian interpuseram recurso desse acórdão para o Tribunal da Relação de Coimbra. 3. O Tribunal da Relação de Coimbra julgou os recursos apresentados, tendo decidido: «A) Em julgar parcialmente procedentes o recurso A) interposto por FF e o recurso B) interposto por GG e em consequência: i) - considerar como não provados os factos 174 (no segmento “Apesar de saber que o imóvel não era habitado”, 176, 185, 186, 187 (quanto aos arguidos FF e GG), 189 e 190 (quanto aos arguidos FF e GG), 242, 244, 245 e 246, 360, 361, 368, 369, 370, 371 e 372, 446, 447 (no trecho parte “em execução do plano atrás referido”, 455 (na parte “isto apesar de saber que tal, à data do incêndio, não era verdade”), 457, 458, 459 (na parte em que se refere que “ FF e GG”), 460 (na parte em que se escreve “todos os arguidos”), 461, e 462 (na parte em que se lê “Nenhum dos arguidos”); ii) Condenar o arguido FF pela prática de um crime de prevaricação sob a forma continuada p. e p. pelo artigo 3º, nº 1 e 11º da Lei n.º 34/87, de 16.07 e 30º n.º 2 do Cód. Penal, na pena de 4 anos de prisão, e pela prática de um crime de burla qualificada sob forma continuada, p. e p. pelos artigos 217º, nº 1 e 218º, nºs 1 e 2, alínea a) e 30º n.º 2 do Cód. Penal , na pena de 4 anos de prisão, e em concurso daquelas penas, na pena única de 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 5 (cinco) anos; iii) Condenar o arguido GG pela prática de um crime (continuado) de prevaricação p. e p. pelos artigos 3º, nº 1 e 11º da Lei n.º 34/87, de 16.07 e 30º n.º 2 do Cód. Penal, na pena de 3 anos de prisão, e pela prática de um crime (continuado) de burla qualificada, p. e p. pelos artigos 217º, nº 1 e 218º, nºs 1 e 2, alínea a) e 30º n.º 2 do Cód. Penal na pena de 3 anos de prisão, e em concurso das penas indicadas em i) e ii) , na pena única de 4 (quatro) anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 5 (cinco) anos; iv) Absolver os mesmos arguidos FF e GG, enquanto demandados civis, do pagamento da quantia de 8.300,00 € a título de danos patrimoniais causados no âmbito do processo n.º AT4 Revita (beneficiário KK), em virtude de se ter considerado como não provados os factos 360, 361, 368, 369, 370, 371 e 372; B) Em julgar improcedentes os recursos interpostos por LL e MM (recurso C), NN (recurso D), OO e PP (recurso E), EE (recurso F), HH (recurso G), II e JJ (recurso H), QQ (recurso I), e RR (recurso J). C) Em julgar parcialmente procedentes os recursos interpostos pelas demandantes civis União das Misericórdias Portuguesas (recurso K) e Fundação Calouste Gulbenkian (recurso L) e em consequência: i) Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, a quantia de 17.275,05 €, e por isso condenar os arguidos/demandados EE, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia de € 43.363,05 (quarenta e três mil, trezentos e sessenta e três euros e 5 cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento; ii) Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, a quantia 250,08 €, assim como, em consequência da rectificação do erro material de cálculo quanto aos valores constantes dos documentos indicados no facto provado 316, condenar os arguidos/demandados HH, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de 150.863,00 € (cento e cinquenta mil, oitocentos e sessenta e três euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento. iii) Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG no âmbito do Processo VZ4 Revita suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, as quantias de 6.268,92 €, de 18.461,30 €, de 18.596,20 € e de 30.321,70 €., e condenar os arguidos/demandados JJ, II, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de € 147.686,89 (cento e quarenta e sete mil, seiscentos e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento.» 4. Não se conformando com o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, os arguidos FF, GG, JJ e II interpuseram recurso relativo à sua condenação cível, para este Supremo Tribunal de Justiça. 5. Os recorrentes nos recursos apresentados neste STJ, extraíram as seguintes conclusões: a) FF «1. O douto acórdão recorrido, salvo o devido respeito, efectuou incorrectas interpretação e aplicação das normas legais ao julgar os recursos interpostos das entidades integradoras da parceria UMP/FCG. 2. Essa incorrecção expressa-se na decisão de anulação parcial da parte cível da decisão de 1ª instância quanto à quebra do nexo de causalidade, decidindo que a decisão recorrida “não considerou - injustificadamente - para efeitos de condenação nos pedidos de indemnização civil o ressarcimento de quantias que não constem expressamente dos factos provados com origem na acusação e despacho de pronúncia.”, bem como ao ter decidido que os recursos das demandantes cíveis demonstraram e provaram que estas suportaram pagamentos aos empreiteiros em valor superior ao que constava da acusação. 3. O acórdão recorrido violou o princípio do dispositivo e o princípio do contraditório. 4. Com efeito, o Tribunal a quo substituiu-se à alegação das partes cíveis no requerimento de pedido de Indemnização Civil (PIC) , suprindo a deficiente alegação de factos de que estas peças processuais padecem, e condenando os arguidos (designadamente o aqui recorrente) a pagarem indemnização superior ao pedido formulado na 1ª instância nos PIC. 5. O acórdão recorrido alterou ilicitamente os pedidos formulados pelos demandantes: - Reduziu o pedido do demandados JJ e II - Ampliou o pedido dos demandados HH, fundamentando-se em factos novos que não haviam sido alegados pelos demandantes nos PIC. 6. O acórdão recorrido violou o artigo 5º nº 1 e 2 CPC, aplicável ex vi artº 4º CPP 7. O acórdão recorrido fundamentou-se em factos não alegados pelas demandantes civis no PIC sanando uma pretensa nulidade da decisão de 1ª instância, extinguiu um grau de jurisdição (art.º 379.º, n.º2 do CPP) de que o Recorrente dispunha, assim violando o disposto no art.º 5.º do Código de Processo Civil, ao ter permitido que a demandante FCG viesse, somente em sede de recurso penal, alterar o seu pedido de indemnização. 8. O acórdão recorrido olvidou que os pedidos de indemnização têm que conter quer o pedido, quer a causa de pedir respectiva. 9. Não podem os demandantes em sede de recurso ampliar ou alterar, quer os pedidos, quer as causas de pedir, porque a tanto se opõe o artº 264º CPC, uma vez que essa alteração e ampliação não teve o acordo do recorrente como o exige essa norma processual civil, o que foi olvidado pelo acórdão recorrido. 10. As despesas geradoras do direito de indemnização são tãosomente e apenas as que as demandantes alegaram nos seus PIC e não as alegações recursivas por estas expendidas no recurso penal. 11. O acórdão recorrido acabou por condenar o recorrente e restantes arguidos em quantia superior ao pedido formulado, o que é causa de nulidade prevista no disposto na al. e) do n.º1 do art.º 615.º e do art.º 3.º, n.º1, ambos do CPC. 12. O que sucede, designadamente, no pedido formulado pela FCG (e UMP). Com efeito, esta parceria alegava um prejuízo de € 131.096,35 (sem prova documental nem discriminação factual). E o acórdão recorrido decidiu a condenação do recorrente (solidariamente com os arguidos GG, e HH no pagamento da quantia global de € 148.863,00 !!! 13. O acórdão recorrido constitui uma decisão surpresa, sobre a qual o recorrente não teve oportunidade de se poder pronunciar previamente. 14. O acórdão recorrido decidiu questão nova que não havia sido previamente decidida pela 1ª instância. 15. O que resulta a decisão prolatada pelo acórdão recorrido na condenação do recorrente em quantia superior ao peticionado pela FCG (ou e do PIC da UMP) argumentando que a decisão de 1ª instância não ter justificado, suficientemente, como e quando ocorreu a “quebra do nexo de causalidade” entre a conduta dolosa dos arguidos/ demandados e os valores superiores alegados nos pedidos cíveis formulados pelas demandantes. Ora, esta quebra do nexo de causalidade não foi ponderada nem decidida pelo tribunal de 1ª instância. 16. É inconstitucional a interpretação que o acórdão recorrido fez do artº 497º nº 1 Código Civil (por ofensa do Princípio da Igualdade (art.º 13.º, n.º1 da CRP), ao condenar o aqui Recorrente – e também do arguido GG – no pagamento dos valores atribuídos a título de indemnização civil, de forma solidária (art.º 497.º, n.º1 do Código Civil), e ao não distinguir a ausência de apropriação de qualquer bem, vantagem ou valor destes dois arguidos do efectivo benefício e enriquecimento único e efectivo dos demandados requerentes do apoio ao Fundo Revita, 17. Deve ser anulado e revogado o acórdão recorrido no que respeita aos pedidos de indemnização cível que apreciou e decidiu. 18. O acórdão recorrido violou as seguintes normas: Arts 13.º, n.º1, 18.º, n.º3, 20.º, n.º4 e 32.º da Constituição da República, Arts. 379.º, n.º2, 414.º, n.º4 do Código de Processo Penal, Arts 129.º do Código Penal, Art.º 3.º, n.º1, 5.º, 264º , 590.º, 615.º, n.º1, al. e), e 665.º do Código de Processo Civil, Art.º 497.º do Código Civil. 19. O acórdão recorrido violou seguintes princípios jurídicos: Princípio da Igualdade, Princípio do Pedido, Princípio do Dispositivo, Princípio do Contraditório, Princípio da Igualdade das partes, Princípio da Imparcialidade do Juiz, Princípio do Estado democrático.» b) GG «1. Reporta a presente motivação ao Recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra que, concedendo provimento parcial aos recursos interpostos pelas Demandantes Civis UMP/FCG, dando como provado que esta parceira suportou valores adicionais aos que já resultavam provados em 1.ª instância, condenou o Recorrente a pagar, de forma solidária com os demais co-arguidos/demandados condenados (EE, HH, JJ, II e FF), a quantia de 43.363,05€ no processo REVITA AF7; a quantia de 150.863,00€ no Processo REVITA PO5, e a quantia de 147.686,89€ no Processo REVITA VZ4. 2. Se somarmos os montantes atribuídos pelo Tribunal de 1ª instância (€ 70.035,36) e os que ora foram atribuídos às demandantes no âmbito do mesmo processo de reconstrução REVITA VZ4 pelo Tribunal da Relação de Coimbra (€ 73.648,12), apuramos um total de € 143.683,48, ao invés dos € 147.686,89 constantes do dispositivo do acórdão recorrido. 3. A decisão recorrida padece, por isso, de um erro material de cálculo no somatório da verba atribuída às demandantes a título de danos patrimoniais no processo REVITA VZ4 – constando a mais € 4.003,41 -, que se impõe corrigir, nos termos do n.º2 do art.º 380.º do CPP, devendo passar a constar “iii) (…) a quantia total de € 143.683,48 (cento e quarenta e três mil, seiscentos e oitenta e três euros e quarenta e oito cêntimos) (…)”. 4. Ao arrepio da lei, o Tribunal da Relação de Coimbra supriu uma nulidade (falta de fundamentação) invocada pela recorrente FCG, substituindo-se ao Tribunal de 1ª instância, a quem revogou nesta parte a decisão, e, consequentemente, determinou, depois de fazer o apuramento dos valores que foram pagos pela parceria aos empreiteiros (segundo a alegação da Recorrente no seu recurso), condenar o aqui Recorrente – e, bem assim, os demais co-arguidos – nos valores indemnizatórios que resultam do dispositivo. 5. Pese embora o tribunal de recurso tenha o poder (em certos casos !!!) de suprir as nulidades da sentença, trata-se, contudo, de um poder muito reduzido, pois que este só poderá ser exercido negativamente, ou seja, nos casos em que o tribunal recorrido se tenha pronunciado sobre questões de que não podia conhecer! Fora destes casos, o tribunal de recurso NÃO pode exercer o seu poder de suprimento, sob pena de tal exercício conduzir à supressão de um grau de jurisdição, violando a lei constitucional (art.º 32.º, n.º 1 da Constituição). 6. Também dúvidas inexistem de que não há aplicabilidade neste caso da disposição prevista no art.º 665.º do Código de Processo Civil, porquanto tal seria admitir que o Tribunal da Relação se poderia substituir ao Tribunal de 1ª instância, o que configura a violação do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. 7. Se o Tribunal da Relação de Coimbra decidiu que o Tribunal de 1.ª instância não identificou as candidaturas onde detetou irregularidades nem concretizou as irregularidades a que se reportava, utilizando expressões vagas, genéricas e imprecisas, sequer especificou o momento em que entendeu que se verificou a alegada “quebra do nexo causal”, então não é seguramente o Tribunal da Relação que se encontra em condições de decidir a que matéria se reportava o Tribunal de 1ª instância quando proferiu decisão, substituindo-se a este. 8. Perante a nulidade suscitada pela recorrente FCG, por falta de fundamentação quanto ao seu raciocínio lógico-racional que o levou a considerar certa matéria como não provada, impunha-se ao Tribunal de recurso declarar nula nessa parte o acórdão recorrido e ordenar que os autos baixassem à 1ª instância para que fosse elaborada nova decisão da qual passe a constar o exame crítico das provas que sustentaram os factos que deu como não provados nos termos assinalados pelo tribunal de recurso. 9. Ao não tê-lo feito e, ao invés, ter “suprido” essa nulidade da decisão recorrida, o Tribunal da Relação de Coimbra extrapolou os seus poderes, excedeu o seu poder de suprimento indo além do que a lei lhe permite, estando, por isso e consequentemente, o acórdão de que ora se recorre ferido do vício de NULIDADE, que aqui se deixa arguida com todas as consequências legais. 10. Não obstante o Tribunal da Relação ter reconhecido – referindo-o expressamente no acórdão – que existe um problema de alegação por parte das demandantes nos PIC’s, o que impediu o tribunal de recurso de ficar a saber que factos constantes dos pedidos de indemnização civil (mormente os pagamentos feitos a empreiteiros) deveriam ter sido considerados e não o foram, entendeu, em desrespeito pela lei, que a FCG veio indicar “nas tabelas inseridas nas alegações de recurso, a partir do seu art.º 75.º”, documentos que comprovam outras despesas que não as consideradas no acórdão proferido pela 1ª instância, com base nos quais lhe foi permitido sustentar a condenação proferida no acórdão, ora objecto de recurso. 11. Ao decidir, nesta parte, nos termos em que o fez, o Tribunal da Relação de Coimbra abriu um espaço processual à Demandante (!!!) FCG que permitiu a esta reparar o pedido indemnizatório por esta deduzido em sede de PIC, em “jeito” de articulado aperfeiçoado, porquanto é evidente e notório – bastando para tanto ler o PIC – que de tal pedido não resulta a alegação de FACTOS concretos que permitissem ao tribunal – seja ele da 1ª instância ou da Relação – concluir pelos pagamentos aos empreiteiros, em que datas, com reporte a que facturas ou até por que meio. 12. O Tribunal da Relação subverteu todas regras processuais civis, permitindo nesta fase – de recurso de uma decisão final – que uma demandante viesse compor o seu PIC - reparando o irreparável ! -, quando a sede própria para o fazer, nos termos da lei do processo, seria no articulado apresentado no tempo próprio, após notificação do tribunal para esse efeito. 13. De resto, mesmo que no momento em que formulou o seu PIC não estivesse em condições de apurar todos os valores pagos ou era expectável que viesse entretanto a liquidar outros, teria sempre a possibilidade de vir fazer uma ampliação do seu pedido indemnizatório o que, in casu, nem uma, nem outra, entidade desta parceria fez ! 14. Em sede de PIC a UMP limitou-se a aderir aos factos constantes da acusação pública/ pronúncia, reclamando o valor global de 480.848,37€, sendo que a FCG veio contar a história em cada um dos processos, em termos muito semelhantes aos contantes na acusação, reclamando o valor global de 482.848,35€, sendo certo que nenhuma delas alegou ou discriminou quais os valores superiores que suportaram em relação àqueles que já constavam da tabela acusatória, em consequência da conduta dos arguidos, motivo pelo qual, entendeu – e bem – o Tribunal de 1ª instância que não podia dar como provado que esta parceria despendeu montante superior ao constante nos factos provados. 15. De resto, no momento em que a acusação foi proferida (05.07.2019), o processo já continha toda a prova documental referente aos pagamentos alegadamente feitos por esta parceria, pelo que, em bom rigor, as demandantes estavam em condições para alegar, concretizar, identificar, discriminar todos os pagamentos feitos a empreiteiros ou a outras entidades, demonstrando-os documentalmente, fazendo a correcta correspondência entre facturas e comprovativos de pagamento, etc, sendo certo que não o fizeram, optando por alegar um valor global do seu prejuízo em cada processo, remetendo para a prova documental constante dos autos, e protestando juntar outra que nunca juntou, sequer a defesa dela foi notificada para exercer o seu contraditório ! 16. Esta alegação genérica, não discriminada nem detalhada nos pedidos de indemnização formulados no processo – como fez agora a FCG em jeito de reparação do seu PIC -, não permitia ao Tribunal de 1.ª instância – e obviamente também ao tribunal de recurso – concluir que pagamentos foram feitos – se é que foram ! - aos empreiteiros, para além daqueles que já constavam da acusação e que foram dados como provados ou, dito de outro modo, que FACTOS constantes dos PIC’s deveriam ter sido considerados na decisão. 17. Acresce dizer que para além da FCG não ter alegado factos no PIC que permitissem ao Tribunal de 1ª instância considerar que suportou outros valores para além dos que constavam da acusação, veio, ainda, por via do recurso e que mereceu – espante-se !!! – acolhimento pelo Tribunal da Relação, fazer uma ampliação do pedido no Processo AF7 (EE) onde, ao invés dos 42.485,35€ que reclamou no PIC, pediu agora o reconhecimento de 43.363,05€, uma ampliação do pedido no Processo PO5 (HH) no qual, ao invés dos 131.096,35€ reclamados no PIC, pediu agora o reconhecimento de 148.863,00€, e uma redução do pedido no Processo VZ4 (JJ e II) no qual, ao invés dos 182.942,24€ que reclamou em sede de PIC, veio agora reclamar o pagamento do montante global de 147.686,89€. 18. Ao concluir-se no acórdão ora recorrido que mais do que um problema de alegação, estamos perante um problema de prova, tendo, por consequência, considerado que essa prova foi elencada pela FCG na sua alegação de recurso – e não no PIC já formulado no processo –, o Tribunal da Relação desconsiderou em absoluto a disciplina imposta pelo art.º 5 do Código de Processo Civil, permitindo, por essa via, que esta entidade pudesse corrigir, reparar o seu articulado inicial (como se o recurso tivesse sido um convite ao aperfeiçoamento da sua PI), bem sabendo que a lei não o permite! 19. A parte demandante está obrigada a respeitar o ónus de alegação (de FACTOS) e, no caso concreto, não o cumpriu, razão pela qual o Tribunal de 1.ª instância não acolheu os valores reclamados que ficaram acima dos que já constavam da acusação. De resto, e em bom rigor, a prova dos pedidos cíveis em que foram condenados os Recorrentes resultou da alegação do MP e da prova junta por este, porquanto foi o único que cuidou de discriminar em cada processo as facturas emitidas e os correspondentes pagamentos que foram feitos com reporte à prova documental junta aos autos. 20. Não é por isso verdade, como consta do acórdão ora colocado em crise, que as demandantes civis tenham alegado nos seus pedidos de indemnização civil que suportaram pagamentos aos empreiteiros em valor superior ao que constava da acusação, porquanto nestes consta apenas a imputação aos demandados de um valor global em cada processo, correspondente ao valor da obra adjudicada aos empreiteiros e, no caso da FCG, os montantes já suportados por esta entidade no âmbito do protocolo celebrado com a UMP em cada um desses mesmos processos. Para além disto, nada mais ficou alegado, nada mais se concretizou ou discriminou, e menos ainda que tais valores pagos excederam os que já constavam da acusação! 21. Aceitar-se que a FCG fez prova através das tabelas inseridas no seu recurso que comprovam outras despesas que não as consideradas no acórdão da 1ª instância, o Tribunal da Relação violou frontalmente princípios estruturantes do processo civil, designadamente o disposto no art.º 5.º do Código de Processo Civil, 22. E, a permitir-se este tipo de soluções, bastaria a todos os demandantes indicarem em sede de PIC um valor global de prejuízos, sem qualquer alegação, concretização ou discriminação factual dos efetivos prejuízos, podendo, posteriormente e em sede recursiva, reparar esse articulado, discriminando e “fazendo a prova” que antes lhe cabia ter feito e não logrou fazer !!! 23. O Tribunal recorrido estava obrigado a não ter em consideração estes novos valores invocados pela parceria, mantendo, nessa parte – face à improcedência dos recursos dos arguidos na parte cível – a decisão da 1ª instância. Não cabe nos poderes de cognição do Tribunal da Relação aditar facto(s) essencial(ais) não alegado(s) e integrante(s) da causa de pedir, ainda que o(s) mesmo(s) possa(m) resultar do depoimento das testemunhas ou de documentos, os quais, de resto, são meios de prova devem acompanhar o articulado onde é feita a alegação dos factos! 24. O Tribunal da Relação permitiu colmatar uma falta de alegação de factos essenciais e, nessa medida, beneficiou uma das partes (incumpridora do respectivo ónus de alegação) em detrimento da outra. Violou, por consequência, o disposto nos arts.º 5.º e 590.º do CPC e os princípios subjacentes a tais normativos (princípios do dispositivo, da igualdade das partes e da imparcialidade do juiz, conforme decorre da exigência constitucional de salvaguarda de um processo equitativo (art.º 20.º, n.º 4, da CRP)), devendo, por consequência, ser a decisão rcorrida revogada e mantido o já decidido em 1ª instância quanto a esta matéria.» * 25. Mesmo que assim se não entendesse, sem conceder, o Tribunal ora recorrido dá por certos os valores indicados pela recorrente FCG nas suas tabelas inseridas no recurso, sem ter tido a preocupação ou o cuidado de os confrontar com a vasta documentação constante dos autos, donde concluiria rapidamente que alguns deles não podiam ter sido considerados. 26. No Processo REVITA AF7 (EE), a FCG indica o valor de de 104,22€ (último item da tabela), que corresponde à Factura “V/ Fatura 01 N.º FC18”, de 22.10.2018 (fls. 138 do Apenso 30), a qual não está acompanhada de qualquer comprovativo de pagamento porquanto o mesmo não existe no processo, pelo que, e sem prejuízo do que supra se disse quanto à falta de alegação da FCG quanto aos prejuízos em concreto de que se arroga titular, quanto a este processo, esta verba nunca poderia, sequer na tese do douto Tribunal da Relação, ser considerada para efeitos de apuramento final. 27. Também no processo REVITA PO5 (HH), a FCG indica a verba de 8.203,38€, referente à Factura “FAC 2016/79”, de 19.07.2018 (fls. 110 do Apenso 33), cujo comprovativo de pagamento não consta do processo, e também a verba de 250,08€ referente à Factura “V/ Fatura 01 Nº FAC18”, de 22.10.2018 (fls. 138 do Apenso 30), cujo pagamento não se encontra documentado nos autos (razão pela qual tal montante não consta da prova indicada no facto 316 – fls. 138 do Apenso 30). 28. Em relação ao Processo REVITA VZ4 (JJ e II), consta da tabela elaborada pela FCG o montante de 320,32€, respeitante à Factura “V/ Fatura 01 Nº FAC18/”, de 22.10.2018 (fls. 138 do Apenso 30), em relação à qual não existe qualquer prova documental (ou outra) de que tenha sido liquidada pela FCG, e o montante de 6.268,92€, que corresponde a um comprovativo de transferência com o descritivo “TRF.P/LAIDESIL – REMODELAÇOES”, de 05.02.2019 (fls. 125 do Apenso 30), o qual não tem qualquer correspondência com o processo em causa (VZ4), não tendo sequer sido considerado pelo Tribunal de 1.ª instância. Tivesse o Tribunal da Relação consultado tal Apenso – e já se viu que não ! – veria que do mesmo consta a menção manuscrita “este doc por lapso não é daqui” !!! * 29. O Tribunal da Relação quando se pronunciou sobre o recurso interposto pela FCG tinha a perfeita noção – e deixou-o consignado, não se tratando, por isso, de um mero lapso ! – que o valor reclamado por esta entidade em sede de pedido de indemnização civil para o processo REVITA PO5 (HH) ascendia a um total de 131.096,35€ para a parceria, dos quais a FCG já havia suportado 55.643,13€. 30. De forma surpreendente e inexplicável - talvez porque fez tábua rasa de todos os valores descritos pela recorrente na tabela que inseriu no recurso, não cuidando de ler o PIC formulado -, condenou o aqui Recorrente, de forma solidária com HH e FF, no montante total de 150.863,00€! 31. Nos PIC’s, as demandantes reclamaram destes 3 arguidos o pagamento, de forma solidária, do montante total de 131.096,35€; porém, o Tribunal da Relação esquece esses pedidos e adere aos propósitos da FCG vertidos no seu recurso, determinando, por via dele (procedendo, até, a uma retificação do erro material de cálculo quanto aos valores constantes dos documentos indicados no facto provado 316 !), a condenação dos mesmos arguidos no pagamento do valor global de 150.863,00€ ! Com que fundamento legal? O pedido se faz na petição inicial, in casu, no pedido de indemnização civil, e não em sede de recurso, e ao não tê-lo feito, precludiram o direito de vir agora, nesta fase, reclamá-los, não assistindo ao Tribunal da Relação o poder de os sindicar. 32. O Tribunal estava vinculado ao que fora alegado e peticionado pelas demandantes civis, não podendo, em circunstância alguma, condenar o aqui Recorrente – e, bem assim, os demais arguidos que com ele foram condenados - em valor superior àquele que foi reclamado em sede de PIC. 33. Que se saiba – ou pelo menos disso o aqui Recorrente não foi notificado - nenhuma destas demandantes veio fazer uma ampliação do seu pedido indemnizatório no decurso do processo, pelo que a decisão recorrida, além de constituir uma verdadeira decisão-surpresa, está ferida de NULIDADE por manifesta violação do disposto no art.º 615.º, n.º1, al. e) do CPC, e do princípio do pedido previsto no art.º 3.º, n.º1 do mesmo Código, devendo, por consequência, ser revogada nesta parte. * 34. Sem prejuízo do que supra se disse quanto ao facto do Tribunal da Relação ter “suprido a nulidade”, por alegada falta de fundamentação do acórdão de 1ª instância, o que determina a NULIDADE da decisão recorrida, não se nos afigura – ao contrário da tese da recorrente FCG, à qual o Tribunal da Relação aderiu - que aparentemente (nas palavras do tribunal de recurso) a decisão de 1ª instância tenha concluído por uma quebra do nexo causal entre a conduta dos arguidos/ demandados civis e os valores pagos pelas demandantes (UMP/ FCG) além daqueles que constavam da acusação, sequer, que em algum momento tal tenha sido aflorado na referida decisão. 35. Afigura-se-nos que a lógica do Tribunal da Relação lateraliza o pensamento que sustentou o aresto da primeira instância, fazendo o Tribunal da Relação uma incorreta interpretação jurídica desta questão, aderindo acriticamente aos propósitos (ousaríamos dizer, sugestões) da FCG sobre esta matéria. 36. O Tribunal de 1ª instância, em momento algum, reportou a uma “quebra” do nexo de causalidade entre os danos reclamados pelas demandantes – além dos que ficaram provados – e a conduta dos arguidos. O que este Tribunal fez – e parece resultar muito claro da fundamentação do acórdão – foi considerar que as demandantes não cumpriram – como estavam obrigadas – com o ónus de alegação em sede de pedidos de indemnização civil, isto é, não alegaram nem discriminaram quais os valores superiores suportados pela parceria, em consequência da conduta dos arguidos, mesmo decorrendo da documentação junta aos autos a ocorrência de posteriores pagamentos, 37. E isto sem embargo de tal nexo poder ter sido quebrado – sem que tal questão seja posta em causa pela primeira instância ! -, a partir do momento em que as recorrentes (FCG e UMP) tiveram conhecimento das “irregularidades das candidaturas” (o que o acórdão reconhece !), que são necessariamente as envolvidas na polémica do presente recurso, pois foram as únicas que lhes deram origem (com exceção do Processo REVITA AT4 - KK, que redundou em absolvição). 38. A questão de tentar adivinhar - o tal exercício curioso a que a Relação se reporta - quais as irregularidades nas candidaturas, que situações foram essas a que o tribunal se reportava ou o momento em que estas entidades tiveram conhecimento dessas irregularidades, é irrelevante para a questão de fundo em discussão, porquanto o Tribunal de Leiria concluiu dar como não provados os valores superiores suportados pela parceria pelo simples facto de que estes não estavam devidamente alegados ou discriminados nos PIC’s. Logo, perante uma manifesta falta de alegação, que não permitia em circunstância alguma, aferir dos pagamentos que foram feitos aos empreiteiros para além dos que já tinham sido dados como provados, naturalmente que o Tribunal não podia a eles atender ! 39. E isso não se confunde com a questão de saber se houve ou não quebra do nexo de causalidade entre os danos reclamados e a conduta dos arguidos. Se não ficou alegado nem demonstrado nos PIC’s o tribunal ia decidir com base em quê? Ainda, não tendo ficado provado se os arguidos prestaram contributo para alertar tais entidades da existência de irregularidades e da prudência de suspender a execução dos trabalhos de reconstrução em curso, (o que em bom rigor terá ocorrido !), nem o contrário, como poderia e com que prova, abater-se sobre eles a responsabilidade pela reparação do dano ? 40. O único lugar onde o Tribunal tinha a identificação concreta de datas, montantes, facturas e empreiteiros e os documentos que os sustentavam, foi na acusação! Mérito do Ministério Público e não das demandantes, pois que, através dos seus articulados (PIC’s) – que padecem de manifesta falta de alegação e concretização dos danos ! -, naturalmente, que não era possível aferir que pagamentos suportou a parceria para além daqueles que a acusação já continha. 41. É caso para dizer que a falta de fundamentação não está no acórdão de 1ª instância, mas sim nos pedidos de indemnização civil formulados pelas demandantes! O tribunal não adivinha e, mesmo reconhecendo que o processo contém prova documental de que houve outros pagamentos posteriores, os mesmos não foram alegados pelas demandantes, logo, não puderam ser reconhecidos nem valorados ! 42. A decisão da Relação de Coimbra errou, assim, ao ter considerado que a decisão de 1ª instância não estava suficientemente fundamentada (que, em momento algum, deixou consignado que houve quebra do nexo de causalidade), devendo, por consequência ser, nessa parte, revogada, mantendo-se incólume a decisão de 1ª instância. * 43. No acórdão do douto Tribunal da Relação reconhece-se expressamente que “o arguido GG não retirou qualquer vantagem pessoal (política ou outra) da sua actuação”; que “não se provou que tivessem retirado qualquer benefício material dessa actuação, nem sequer que tenham assim actuado, por exemplo, por razões de simpatia ou amizade”, ou ainda que “a actuação dos arguidos deve ser avaliada como se inserindo num quadro de culpa diminuída, uma vez que não só não retiraram qualquer benefício da prática dos ilícitos, como ainda tiveram como fito imediato a atenuação dos efeitos de um incêndio (resulta aliás dos autos que ambos os arguidos se empenharam de forma muito activa na tentativa de minorar os efeitos dos incêndios)” (cfr. acórdão recorrido). 44. A decisão de condenação solidária proferida pelo Tribunal da Relação de Coimbra (e já antes pelo tribunal de primeira instância), relativamente aos pedidos de indemnização civil, cria uma situação de injustiça calamitosa – porque violadora do princípio da igualdade (art.º 3.º, n.º1 CRP) -que, em nenhuma circunstância se pode aceitar que ocorra e que contraria os princípios básicos da justiça que o direito não pode acolher ! 45. As casas, reconstruídas (reportamo-nos às situações dos autos) foram após a conclusão da sua execução entregues aos seus proprietários, que são os respetivos titulares, verdadeiros e únicos beneficiários dos fundos nelas aplicados, que delas podem dispor livremente, quer utilizando-as para habitar, quer transmitindo a sua propriedade para terceiros, vendendo-as, num contexto de mercado e de procura particularmente vantajosos. Os beneficiários das obras são os co-arguidos do Recorrente! (reportamo-nos, naturalmente, aos arguidos/proprietários apoiados pela parceria mencionados no presente recurso). 46. No âmbito dos presentes autos, em sede de apreciação da requerida, pelo Ministério Público, perda de vantagens económicas resultantes dos factos imputados aos arguidos, e da condenação solidária dos arguidos FF e GG no pagamento dos montantes em causa, pronunciou-se, sábia e ponderadamente o Tribunal de Leiria, pela forma seguinte: ”No que respeita à responsabilidade solidária dos arguidos FF e GG na requerida perda de vantagem económica, mais se refira que, ainda que assim não sucedesse, não decorre dos factos provados que os mesmos se hajam apropriado de qualquer bem ou vantagem económica, pelo que não se vislumbraria possibilidade de condenar solidariamente tais arguidos no pagamento dos respetivos valores (em substituição da sua entrega em espécie).” (cfr. acórdão da 1ª instância, pág. 320). 47. Bem andou, assim, a primeira instância ao ter decidido que não existia fundamento para uma condenação solidária do Recorrente e FF no âmbito da requerida perda de vantagem económica, lamentando-se que a mesma lógica não tenha presidido a decisão do Tribunal quando se pronunciou quanto aos pedidos cíveis deduzidos pelas entidades, por ser em tudo idêntica. 48. A manter-se esta decisão da condenação solidária dos arguidos (todos os afectados pela decisão do Tribunal da Relação), assiste a qualquer destes, penitenciado com pagamento que exceda a sua quota-parte de responsabilidade, exercer direito de regresso dos demais co-arguidos; sendo que, a existir processo executivo das entidades contra os arguidos solidários, estes podem iniciar-se pela penhora dos vencimentos (já escassos), o que é comum neste tipo de processos, de quem nenhum benefício patrimonial recebeu. 49. De outro lado, os proprietários que obtiveram benefício poderão fazer negócio relevante com as casas e reclamar ainda o regresso da quota parte do que eventualmente adiantaram (no caso de o fazerem !) daqueles que nenhum benefício obtiveram, colhendo lucros vantajosos proporcionados pelo processo, consistindo isso numa vantagem intolerável e insuportável pelo nosso sistema jurídico. 50. Portanto, os beneficiários e proprietários das casas não só lucram com o benefício de ficarem com casas novas cujo valor de mercado em muito ultrapassará o valor das obras feitas, como ainda receberão dos co-arguidos uma parcela significativa (2/3 ou 1/2) da importância em que foram condenados em solidariedade, ficando colocados, por força de uma decisão judicial, numa situação de grande vantagem e privilégio, em detrimento de quem nada recebeu e pouco tem para além do parco salário. Tais situações, não só chocam a sensibilidade jurídica de quem ao Direito se dedica, como repugnará à consciência do homem comum! 51. O acórdão da Relação veio, por isso, criar uma profunda desigualdade na repartição das responsabilidades entre co-arguidos, já que EE, HH, JJ e II, são claramente os beneficiários de todo este processo, pois que, não viram o seu património ser confiscado, ficam proprietários do seu bem imóvel reconstruído – ao contrário de GG e FF – e ainda titulares de um direito de poder de vir reclamar destes uma boa parte do valor que terão de liquidar por conta dos PIC’s. É caso para dizer – citando a gíria popular – “ficam com a fama e o proveito”. 52. O acórdão recorrido não teve em consideração esta circunstância, antes ignorou-a, determinando a aplicação de um regime legal (art.º 497.º, n.º1 CC) que, no caso concreto, se afigura inconstitucional por violar – parece-nos óbvio – o princípio da igualdade, devendo, por consequência, ser o Recorrente absolvido dos pedidos cíveis da parceria UMP/ FCG, pelas razões supra expostas, desconsiderando, nos mesmos termos em que o foi em primeira instância, a existência do regime da solidariedade entre este e os seus co-arguidos (proprietários). 53. Sempre se dirá, por hipótese académica, que a condenação solidária do Recorrente no PIC destas entidades, sempre seria, para além de injusta, uma violação grosseira de um preceito constitucional, pois que, em nosso entender, está em causa uma questão, que à míngua de solução visível na legislação comum (que o n.º 2 do artigo 497.º do CC não resolve), assume Dignidade Constitucional, violando claramente o princípio da igualdade plasmado no art.º 13º, n.º 1 da Constituição, rogando-se a esse Venerando Tribunal, que no seu alto desígnio, conceda o acolhimento que merece, 54. Vigorando o regime da solidariedade nos termos do n.º 1 do artigo 497.º do Código Civil (ex vi, artigo 129.º do Código Penal), não pode permitir-se o exercício do direito de regresso plasmado no n.º2 do mesmo preceito, de quem recebeu e fez sua a totalidade do benefício que resultou da prática do facto ilícito, perante quem nada recebeu, padecendo de inconstitucionalidade interpretação diversa.» c) JJ e II « A) O Acórdão recorrido condenou os Recorrentes a pagar solidariamente com os arguidos FF e GG à parceria UMP / FCG a título de indemnização civil “…adicionalmente ao que já resultava provado, as quantias de 6.268,92 €, de 18.461,30 €, de 18.596,20 € e de 30.321,70 €., e condenar os arguidos/demandados JJ, II, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de € 147.686,89 (cento e quarenta e sete mil, seiscentos e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento.” B) Logo, ao referido valor da condenação da 1ª instância de EUR 70.035,36, acresce o total de EUR 73.648,12 respeitante à condenação do acórdão recorrido, perfazendo o valor final de EUR 143.683,48(cento e quarenta e três mil seiscentos e oitenta e três euros e quarenta e oito cêntimos) e não de EUR€ 147.686,89 (cento e quarenta e sete mil, seiscentos e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos) conforme certamente por lapso consta do acórdão recorrido. C) Ante o exposto, é por demais evidente que o douto acórdão enferma de um mero lapso de escrita e/ou de cálculo, pelo que se requer, nomeadamente nos termos e ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 667.º do C.P.C., a sua rectificação, e onde se lê “condenar os arguidos/demandados JJ, II, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de € 147.686,89 (cento e quarenta e sete mil, seiscentos e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos),” se passe a ler “condenar os arguidos/demandados JJ, II, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de € 143.683,48 (cento e quarenta e três mil, seiscentos e oitenta e três euros e quarenta e oito cêntimos)”. D) O presente recurso versa em singelo a condenação dos Recorrentes no pedido de indemnização civil e é admissível nos termos do disposto no artigo 400.º, n.º3 do C.P.P. e do n.º 1 do artigo 44.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, porquanto se verificam preenchidos os requisitos seguintes: (i) o valor do pedido é superior à alçada do Tribunal recorrido e (ii) a decisão impugnada é desfavorável aos recorrentes em valor superior a metade desta alçada. E) Entendem os Recorrentes que mal andou o Tribunal recorrido ao revogar o acórdão proferido em 1ª instância na matéria do pic a que foram condenados. F) O acórdão sob recurso viola o artigo 5.º do CPC ex vi artigo 4.º do CPP, porquanto nos Pics apresentados a parceria UMP/FCG limitou-se a aderir à acusação/pronuncia onde apenas eram narrados prejuízos na ordem dos EUR 70.035,36. G) Não obstante, apesar das demandadas se limitarem a aderir aos factos constantes da acusação/pronuncia, peticionaram em sede de pic a condenação dos Recorrentes no pagamento do valor de EUR 182.942,24. H) Tudo sem invocar ou apresentar qualquer facto ou documento justificativo de tal valor. I) Logo atenta a falta de alegação de factos essenciais no que toca ao valor de danos que ultrapassa o constante na acusação, nunca o Tribunal recorrido podia ter atendido aos factos e documentos extemporaneamente alegados e indicados pela FCG em sede recursiva. J) E isto porque em sede recursiva não é possível às partes carrear novos factos / factos essenciais aos autos ou indicar meios probatórios. K) Mal andou o Tribunal da Relação ao decidir que “… conclui que a decisão recorrida deve ser parcialmente revogada nesta parte cível, por não considerar -injustificadamente- para efeitos de condenação nos pedidos de indemnização civil o ressarcimento de quantias que não constem expressamente dos factos provados com origem na acusação e despacho de pronúncia.” L. Os factos conducentes à condenação agora imposta de 143.683,48 (cento e quarenta e três mil seiscentos e oitenta e três euros e quarenta e oito cêntimos), carecem de total justificação por falta de alegação e documentação pelas demandantes em sede de pic, devendo o acórdão recorrido por tal motivo ser revogado. M) Em processo crime a não impugnação de documentos não tem qualquer efeito cominatório - vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30-01-1998, disponível em www.dgsi.pt. N) Sem nunca conceder, o que apenas por mero zelo de patrocínio se alvitra, nunca o Tribunal recorrido podia ter considerado o pagamento de EUR 6.268,92 alegado em sede de recurso pela FCG, porquanto o mesmo não só não foi devidamente justificado como - por incrível que pareça - também não encontra qualquer respaldo no indicado documento de fls 125 do apenso 30, o qual faz expressa menção no próprio corpo encontrar-se junto aos presentes autos por lapso. O) Logo o pedido deduzido pelas demandantes e a que os Recorrentes foram condenados carece de causa de pedir. P) Pelo exposto, o acórdão recorrido viola o artigo 5.º do C.P.C., ex vi artigo 4.º do C.P.P, e os artigos 410.º e 427.º do C.P.P., com todas as legais consequências, devendo ser revogado. Q) Sempre sem conceder, sempre se dirá que andou ainda mal o acórdão recorrido por não ter atendido à interrupção do nexo de causalidade entre o comportamento enganoso imputado aos recorrentes e aos valores peticionados pelas demandantes em clara violação dos artigos 217º, nº 1 e 218º, nº 1 e nº 2, alínea a) do Código Penal. R) Para se verificar o preenchimento do crime de burla “é necessário que: da astúcia resulte o erro ou engano; do erro ou engano resulte a prática de acto(s) pela vítima; da prática de acto(s) resulte, finalmente, o prejuízo patrimonial. Em sede de imputação objectiva do evento à conduta do agente, a burla é, assim, um crime complexo, que comporta um triplo nexo de causalidade”. - Ac. do STJ de 09/05/2002, disponível em www.dgsi.pt S) Quando a astúcia e erro deixam de existir, quebra-se o nexo causal entre o comportamento e o dano, o que se verificou in casu após a instauração do inquérito - Julho 22 de 2018 - que está na origem dos presentes autos e que foi de conhecimento público. T) Após tal data, já não foi o comportamento enganoso dos Recorrentes que determinou as demandadas a agir, mas sim a sua liberdade de decisão e de autodeterminação que determinou a conclusão das obras em curso, tudo sem prejuízo de terem conhecimento de irregularidades nas candidaturas. U) Do exposto resulta que não se pode concluir que os valores a que o acórdão recorrido condenou os Recorrentes a título de pedido civil se tenham ficado a dever à sua conduta enganosa, impondo-se a revogação do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra. -vide Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 19.02.2014. V) Erradamente decidiu o Tribunal recorrido que a parceria UMP / FCG não obstante ter conhecimento do comportamento enganador dos Recorrentes, sempre teria de cumprir o contrato celebrado com os empreiteiros, justificando assim a existência de pagamentos posteriores à data do conhecimento como justificados e imputados aos Recorrentes, colocando a questão ao nível da responsabilidade civil – vide al. f), fls. 562 do acórdão recorrido. W) Coonestando a lista dos factos julgados provados verifica-se que nada resulta alegado nos pics, bem como nenhuma prova produzida e consequentemente nada resultou provado em sede de primeira instância quanto a essa matéria da responsabilidade civil, nomeadamente quanto a indemnização da parceria UMP/FCG por incumprimento de contrato de empreitada. X. Logo, não podia o Tribunal recorrido ter decidido tal matéria Y. O Tribunal da Relação de Coimbra decidiu que o acórdão de 1ª instância padecia de deficiente fundamentação no que à matéria dos pics diz respeito e em clara violação do artigo 410, n.º 2 CPP e da al. a) do artigo 431 do CPP, sem dispor de elementos suficientes no processo, cuja falta é reconhecido e apontada pelo próprio nomeadamente no que toca às apontadas faltas de indicação da data de conhecimento das irregularidades e dos processos em que a parceria decidiu continuar com as obras não obstante ser conhecedora das irregularidades, supriu tal falta e alterou a decisão do Tribunal de 1ª Instância sobre a matéria de facto. Z. Tudo, sem prejuízo de nos autos inexistirem elementos para tanto e nomeadamente a data em que a parceria teve conhecimento das irregularidades das candidaturas e dados para aferir da sua responsabilização ao nível da responsabilidade civil junto dos empreiteiros. AA. O acórdão recorrido constitui uma verdadeira decisão surpresa para os Recorrentes, em claro prejuízo do seu direito de defesa. AB. Em Suma: o acórdão recorrido viola o artigo 5.º do CPC, ex vi artigo 4.º do CPP, os artigos 410.º, 427.º, al. a) do artigo 431º do C.P.P e os artigos 217º, nº 1 e 218º, nº 1 e nº 2, alínea a) do Código Penal. AC. Desta feita, entendem os Recorrentes que o Tribunal recorrido nada podia ter decidido nesse conspecto ao nível da alteração da decisão da matéria de facto, devendo também por este fundamento ser revogado o que determinará a absolvição dos Recorrentes – vide Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 07 Junho 2006, disponível em www.dgsi.pt.» 6. As demandantes Fundação Calouste Gulbenkian e União das Misericórdias Portuguesas apresentaram respostas aos recursos interpostos invocando, em suma, que o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação não padece de qualquer vício, devendo ser mantida, nos seus precisos termos, a decisão proferida. 7. O Senhor PGA junto deste STJ, teve vista nos autos, consignando que por estar em causa nos recursos interpostos para este Supremo Tribunal apenas matéria cível, não lhe incumbindo a representação de nenhuma das partes envolvidas no litígio, carecia de legitimidade e interesse em agir, razão pela qual não emitia pronúncia. 8. No exame preliminar a Relatora ordenou que fossem colhidos os vistos legais, tendo-se realizado depois a conferência e, dos respetivos trabalhos, resultou o presente acórdão. Fundamentação II. 9. No que interessa ao conhecimento dos recursos, foram dados como assentes na decisão recorrida, os seguintes factos considerados provados, relativos à parte cível: APOIOS CONCEDIDOS POR UMP/FCG NO ÃMBITO DO PROTOCOLO « I) Processo REVITA AF7 (UMP/FCG) requerente EE (Apenso 7) 269. No dia ... 09.2017, a arguida EE apresentou um requerimento para apoio, pelo Fundo REVITA, de reconstrução de uma casa sita na Rua da ..., ..., à qual corresponde o artigo matricial nº .63 da Freguesia de ..., prédio de que era comproprietária e que havia adquirido por herança (fls. 3 a 15 Apenso 7). 270. Nesse requerimento, por si assinado, a arguida assinalou que o referido imóvel era a sua habitação permanente. 271. O que não correspondia à verdade, pois a requerente é residente em ..., mais concretamente em ..., França, e, quando se desloca a Portugal, permanece na Rua ..., .... 272. Facto que era do conhecimento do arguido GG. 273. Para instruir a candidatura, a requerente juntou faturas de consumo de eletricidade e de água que não dizem respeito ao imóvel visado no requerimento (fls. 30 a 32 do Apenso 7). 274. E alterou a morada fiscal para aquela morada (fls. 3 Anexo V). 275. Não obstante saber que tal correspondia à verdade, o arguido GG, com data ... .09.2017 emitiu e assinou parecer com o seguinte teor: “A CM confirma que o prédio em apreço corresponde a habitação própria e permanente do requerente, embora seja comproprietária com o cunhado SS (fls. 10 Apenso 7). 276. Em execução do plano atrás referido, o arguido FF, com a mesma data, declarou concordar com o parecer, propondo a aprovação da candidatura (fls. 11 Apenso 7). 277. Com o intuito de instruir a candidatura, a arguida EE dirigiu-se à arguida AA, secretária da Junta de Freguesia de ..., solicitando-lhe que emitisse um atestado de residência no imóvel a reconstruir, facto que era falso. 278. O que a arguida AA fez, no dia ... .10.2017, emitindo e assinando, “atestado de residência”, em nome/pelo Presidente da Junta de Freguesia, no qual fez constar “Atesta para os devidos efeitos que EE, portadora do Cartão de Cidadão nº ........ . .Z2, NIF .......43, tem a sua residência na Rua da ...”. Mais fez constar “Por ser verdade e nos ter sido pedido se passa o presente atestado que vai ser assinado e autenticado com selo branco em uso nesta Junta de Freguesia (fls. 16 Apenso 7). 279. A arguida AA, que cumpriu quatro mandatos como membro da Junta de Freguesia de ..., sabia que a arguida EE, quando permanecia em Portugal, tinha residência na Rua ..., ou seja, mesmo em frente às instalações da própria Junta de Freguesia. 280. A arguida EE, na posse do documento assim emitido, juntou o mesmo aos documentos que instruíam o seu requerimento para apoio pelo Fundo REVITA. 281. No dia seguinte, para melhor simular que morava no referido local e instruir o requerimento de forma congruente, a arguida EE, apesar de ter um cartão de cidadão válido até ... .08.2019, solicitou a renovação do cartão de cidadão em ... .10.2017, o qual foi emitido em ... .10.2017, sob pretexto de alteração do endereço, indicando agora a Rua da ..., ... (fls. 171 a 178-A do Apenso 7). 282. Por saberem que o apoio solicitado não era legítimo, os arguidos FF e GG não apresentaram, de imediato, o processo à Comissão Técnica, apenas o tendo feito em ... de 2017, após terem garantido o financiamento para as primeiras habitações. 283. O processo AF7 foi analisado nas reuniões da Comissão Técnica de 30.11.2017 e 15.12.2017, sendo validado e proposto para aprovação pelo Conselho de Gestão. 284. Os membros da CT só validaram o processo por terem acreditado nas informações da requerente e dos arguidos FF e GG de que a habitação em causa era uma residência permanente daquela (fls. 14 e 15 Anexo VII). 285. Em ... de 2017 a parceria UMP/FCG aceitou executar e financiar a obra, no âmbito do protocolo firmado, na sequência de reuniões com diversas entidades, por ter sido validada pela Comissão Técnica do REVITA e por haver confirmação, por parte da autarquia de ..., de que se tratava de uma habitação permanente (fls.32 e ss., 40 Anexo XVI). 286. Todavia, caso soubessem que a requerente não habitava no local, nem mesmo nas deslocações que fazia a ..., a responsável pela UMP, TT, e a responsável pela FCG, UU não teriam aceite executar e financiar a obra. 287. A obra foi adjudicada a “L.., Unipessoal, Lda” pelo preço de 62.008,10 € (fls. 190 a 197 Apenso 7). 288. Em 2.4.2018, 16.05.2018, 15.06.2018, 6.08.2018 e 30.08.2018 a “L.., Unipessoal, Lda” emitiu as faturas n.ºs FAC 1/.50, 1/.55, 1/.61, 1/.71, 1/.74 no valor total de 26.088€, fatura essa relativa a parte das obras de reconstrução realizadas no imóvel sito na Rua da ..., que foram apresentada à UMP, para pagamento. 289. A UMP procedeu ao pagamento das referidas faturas, nos dias 05.04.18, 24.05.18, 09.08.2018, e 04.09.2018, por transferência bancária, para a conta PT.. .... .... .... .... .... 6 de que é titular a construtora, sendo ressarcida em 50% desse valor pela FCG (fls. 94 e 199 a 207 do Apenso 7). 290. A arguida EE agiu de forma livre, voluntária e consciente, com intenção de obter atestado de residência falso e de fazer constar, da identificação civil e do formulário REVITA informações falsas, por forma a induzir em erro as entidades responsáveis pelo financiamento, para obtenção de um apoio financeiro no valor de 62.008,10 €, que sabia ser ilegítimo, com o inerente prejuízo das entidades financiadoras. 291. A arguida AA agiu da forma descrita livre, voluntária e conscientemente, com intenção de emitir um documento com teor não correspondente à verdade, violando a fé pública de que o mesmo é merecedor, ciente de que o mesmo permitia à requerente indicar um local de residência desconforme com a realidade. 292. Por seu turno, os arguidos FF e GG agiram, em tudo quanto vem descrito, livre, voluntária e conscientemente, em execução do seu plano supra descrito, aderindo ao propósito da arguida EE, o qual vinha ao encontro do mesmo, 293. … e conduzindo contra direito, enquanto responsáveis pela Câmara Municipal de ..., todo o processo AF7, em violação do artigo 20º nº 1 do REVITA, das deliberações dos órgãos do Fundo, e do protocolo assinado, com o desiderato de fazerem reabilitar imóveis que não reuniam condições para beneficiarem de apoio pelo Fundo REVITA e entidades protocoladas. 294. Ao fornecerem informações falsas quanto à habitação permanente da requerente, os arguidos FF, GG e EE agiram com intenção de induzir em erro os demais membros da Comissão Técnica do Revita assim os levando a aprovar a atribuição da obra à UMP/FCG e a concederem, por essa via, um benefício indevido equivalente ao valor das referidas obras e agiram, por sua vez, com intenção de induzirem em erro os representantes daquelas entidades, assim os levando a realizar e pagar as obras. 295. Deste modo, os referidos arguidos lograram proporcionar a EE um benefício de 26.088€, correspondente ao valor parcial da reabilitação, com o inerente prejuízo das entidades financiadoras, só não tendo logrado obter o valor restante por razões alheias à sua vontade. 296. Os arguidos FF e GG não se abstiveram de agir da forma descrita, apesar de estarem cientes da qualidade de ... do primeiro e de ..., até ........2017 e, após essa data, de funcionário, do segundo, sabendo que violavam os deveres de isenção, imparcialidade e prossecução do interesse público. 297. Em tudo quanto foi descrito, todos os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que praticavam factos proibidos e punidos por lei penal. * J) Processo PO5 REVITA UMP/FCG requerente HH (Apenso 33) 298. A arguida HH decidiu requerer apoio ao Fundo REVITA para a reconstrução de um imóvel correspondente ao artigo matricial nº .19 da Freguesia de ... prédio descrito na Conservatória de Registo Predial de ... sob o nº 6743, o qual era de sua propriedade e do seu marido (fls. 8 a 16 do Apenso 33). 299. Apesar de atingido pelo incêndio de ... de 2017, o referido imóvel que se situa na Rua do ..., estava desabitado desde há cerca de 30 anos e apenas era usado como armazém. 300. A arguida, por sua vez, residia a escassos metros daquele imóvel, na Rua do ..., em habitação que não ardeu. 301. O arguido BB é filho da arguida HH e ..., actividade que exerce sob a firma “J...” a qual tem sede na mesma Rua do ... (fls. 37 Apenso 33). 302. A arguida HH era sabedora dos critérios de atribuição de apoio somente às habitações permanentes. 303. O arguido BB, enquanto construtor, foi adjudicatário de múltiplas obras de reconstrução efetuadas no âmbito do REVITA. 304. Como tal, a arguida HH decidiu simular que o imóvel para o qual era solicitada a reconstrução era situado na Rua do ..., morada, de resto, que constava em toda a documentação oficial da arguida requerente. 305. Como tal, em data anterior a ... .09.2017, a arguida HH dirigiu-se ao GORR, onde indicou, para figurar no formulário, a sua morada referida, no nº 26, mas com os dados identificativos do prédio situado no nº 32, omitindo qualquer informação sobre a caracterização do edificado como habitação permanente ou outra situação, após o que o assinou (fls. 8 a 11 do Apenso 33). 306. Para instruir o requerimento, o arguido BB elaborou e assinou um orçamento com, além do mais, o seguinte teor: “para a reconstrução de habitação, sito em Rua do ..., freguesia de ..., concelho de .... A destruição da habitação deveu-se a incêndio florestal ocorrido a 17 de jun de 2017 (fls. 37 a 40 do Apenso 33). 307. A arguida submeteu o requerimento juntamente com o orçamento referido, entre outros documentos, para apreciação. 308. O arguido GG conhecia a requerente e o seu filho. 309. Não obstante ser sabedor de que o imóvel onde residia a arguida requerente e onde o arguido BB tinha a sede da sua empresa não tinha ardido, o arguido GG, com data de ... .09.2017, em representação da Câmara Municipal de ..., elaborou parecer confirmando que “A CM confirma que o prédio em apreço correspondia a habitação própria e permanente do requerente” (fls. 12 Apenso 33). 310. Em execução do plano atrás referido, o arguido FF, com a mesma data, declarou concordar com o parecer, propondo a aprovação da candidatura (fls. 13 Apenso 33). 311. Por saberem que o apoio solicitado não era legítimo nem prioritário, os arguidos FF e GG não apresentaram, de imediato, o processo à Comissão Técnica, apenas o tendo feito em ... de 2017, após terem garantido o financiamento para as verdadeiras habitações permanentes. (fls. 26 Apenso 33). 312. O processo PO5 foi analisado na reunião da CT de 15.12.2017, sendo validado e proposto para aprovação pelo Conselho de Gestão (fls. 15 Anexo VII). 313. Os membros da CT presentes só validaram o processo por terem acreditado nas informações constantes do requerimento e documentos que o instruíam, e dos arguidos FF e GG de que a habitação em causa era uma residência permanente daquela. 314. A CM... sugeriu que a obra fosse financiada pela UMP/FCG, entidades que só a aceitaram, na sequência de reuniões com diversas entidades, em virtude de ter sido validada pela Comissão Técnica do REVITA, por haver confirmação, por parte da autarquia de ..., de que se tratava de uma habitação e permanente (Anexo XX; fls. 28 e ss., 32 e ss., 40 Anexo XVI). 315. A UMP/FCG decidiu adjudicar a obra à sociedade “C...”, pelo preço de 80.809,97€ (fls. 117, apenso 33). 316. A obra foi executada, sendo emitidas as faturas e autos de medição e efetuados os pagamentos pela UMP, por transferência bancária para o construtor, sendo a UMP posteriormente reembolsada em 50% pela FCG. (fls. 102 a 113; 198 e 199 do Apenso 33; 78 a 105 do Anexo XVI). 317. A parceria UMP/FCG não teria aceite financiar e pagar a obra caso as respetivas representantes, TT e UU tivessem sabido que o imóvel em questão não era habitação permanente da requerente e que esta residia a escassos metros do local. 318. A arguida HH agiu da forma descrita livre, voluntária e conscientemente, com intenção de fazer constar do formulário REVITA informações falsas, para obtenção de um apoio financeiro que sabia ser ilegítimo e que veio a ter o valor de 80.809,97€. 319. Por seu turno, os arguidos FF e GG agiram, em tudo quanto vem descrito, livre, voluntária e conscientemente, em execução do seu plano supra descrito, aderindo ao propósito da arguida HH, o qual vinha ao encontro do mesmo, 320…. E conduzindo contra direito, enquanto responsáveis pela Câmara Municipal de ..., todo o processo PO5 em violação do artigo 20º nº 1 do Regulamento REVITA e das deliberações dos órgãos do Fundo, e em violação do protocolo firmado com a UMP/FCG, com intenção de fazerem reabilitar imóveis não destinados a habitação permanente. 321. Ao fornecerem informações falsas quanto à habitação permanente do requerente, os arguidos FF, GG e HH agiram com intenção de induzir em erro os demais membros da Comissão Técnica do REVITA, levando-os a não rejeitarem o requerimento e a concordarem com a entrega à UMP/FCG, para financiamento. 322. Mais agiram com intenção de induzir em erro tais instituições, na pessoa das representantes nomeadas, levando-as aceitar o financiamento e a determinar o pagamento integral da obra, com o inerente prejuízo não inferior a 80.809,97€, que suportaram em partes iguais. 323. Deste modo, os referidos arguidos lograram proporcionar à arguida HH um benefício ilegítimo de, pelo menos 80.809,97€, correspondente ao valor da reconstrução do imóvel. 324. Os arguidos FF e GG não se abstiveram de agir da forma descrita, apesar de estarem cientes da qualidade de Presidente da Câmara do primeiro e de Vereador, até ........2017 e, após essa data, de funcionário, do segundo, sabendo que violavam os deveres de isenção, imparcialidade e prossecução do interesse público. 325. Nenhum dos arguidos se absteve da conduta descrita, mesmo sabendo ser proibida e punida por lei penal. K) Processo VZ4 REVITA UMP/FCG requerente JJ (Apenso 30) 326. A arguida JJ e o seu marido, o arguido II, decidiram requerer apoio ao Fundo REVITA para a reconstrução de um imóvel correspondente ao artigo matricial urbano nº .80 da Freguesia de ..., prédio descrito na Conservatória de Registo Predial de ... sob o nº ..13, o qual era propriedade do casal (fls. 27/28 do Apenso 30). 327. Apesar de atingido pelo incêndio de ... de 2017, o referido imóvel que se situa na Rua do ..., ..., apenas era usado sazonalmente, tendo o casal residência habitual em .... 328. Cientes de que não teriam direito a receber qualquer apoio caso referissem tal situação, os arguidos procederam a alteração de moradas para a Rua do ..., ..., tendo a arguida JJ requerido a emissão de novo C.C. e ambos os arguidos alteraram o respetivo domicílio fiscal, com efeitos desde 03.08.2017 (fls.7, 31 e 32 do Apenso 30). 329. O arguido GG conhecia o edificado e os requerentes, sabendo que os mesmos tinham adquirido aquele imóvel há alguns anos, apenas o usando ocasionalmente. 330. Não obstante, remeteu o processo VZ4 perante a Comissão Técnica em reunião de 04.09.2017, como sendo processo distribuído à UMP/FCG, sendo prestada informação de que se tratava de uma “reconstrução total em fase de projecto (Anexo VII, fls. 7). 331. Tendo o técnico da CCDRC e membro da CT, VV, devolvido o processo, face a dúvidas quanto à caracterização do edificado (fls. 6 Apenso 30). 332. Então, de comum acordo, em 07.09.2017, foi preenchido o formulário do requerimento REVITA, em nome da arguida JJ, indicando a morada de ..., assinalando que o edificado era “habitação permanente”, e incluindo, no local destinado a observações, a menção da “Necessidade urgente de habitar na casa” (fls. 9 a 12 do apenso 30). 333. A arguida assinou o requerimento assim preenchido, após o que os arguidos o submeteram para apreciação. 334. Em 21.09.2017 a funcionária do GORR, WW, assegurou à CCDRC que o edificado era habitação permanente. 335. O arguido GG procurou encaminhar o processo para financiamento pela UMP, elaborando parecer referindo que “A CM confirma que o prédio em apreço correspondia a habitação própria e permanente do requerente”. 336. Em execução do plano atrás referido, o arguido FF, com a data de 25.09.2017, declarou concordar com o parecer, propondo a aprovação da candidatura (fls. 166 Apenso 30). 337. Contudo, a UMP/FCG não tinha, em Outubro de 2017, informação bastante sobre o processo ou a intervenção requerida (fls. 1761/1763 do vol. 6). 338. Por saberem que o apoio solicitado não era legítimo nem prioritário, os arguidos FF e GG só voltaram a apresentar o processo à CCDRC no final do ano de 2017, após terem garantido o financiamento para verdadeiras habitações permanentes. 339. O processo VZ4 foi analisado na reunião da CT de 23.03.2018, sendo aprovado apenas porque os arguidos FF e GG lograram convencer os restantes membros de o edificado era habitação permanente, sendo aprovada a proposta de financiamento pela UMP/FCG (fls. 18 Anexo VII). 340. Por sua vez, a parceria UMP/FCG só aceitou a realização da obra na sequência de reuniões com diversas entidades, em virtude de ter sido validada pela CT do REVITA, por haver confirmação, por parte da autarquia de ..., de que se tratava de uma habitação e permanente. 341. E porque os próprios arguidos requerentes afirmaram a UU, representante da FCG, que aquela era a sua habitação permanente desde a respetiva reforma. 342. Com efeito, a relutância da UMP/FCG em aceitar a obra, por o valor da mesma ser considerado excessivo, foi ao ponto de ter sido solicitada a intervenção da CT para ser fixado um valor máximo da reconstrução (fls. 8, 85 e 86 do Apenso 30). 343. A UMP/FCG decidiu adjudicar a obra à sociedade “Construções...” pelo valor total de 182.548,23 € (Apenso 30 a fls. 13). 344. A obra foi parcialmente executada, sendo emitidas as faturas melhor descritas na Listagem de fls. 121 do apenso 30, no valor de 70.035,36 €, pago pela UMP, por transferência bancária efetuada para o construtor e fornecedor, sendo posteriormente reembolsada em 50% pela FCG. (fls. 121 a 124 e 126 a 144 e 167 a 170 do Apenso 30). 345. A parceria UMP/FCG não teria aceite financiar e pagar a obra caso as respetivas responsáveis, TT e UU, tivessem sabido que o imóvel em questão não era habitação permanente da requerente. 346. Os arguidos JJ e II agiram da forma descrita livre, voluntária e conscientemente, com intenção de fazerem constar do formulário REVITA informações falsas, para obtenção de um apoio financeiro que sabiam ser ilegítimo, no valor de2 347. Por seu turno, os arguidos FF e GG agiram, em tudo quanto vem descrito, livre, voluntária e conscientemente, em execução do seu plano supra descrito, aderindo ao propósito dos arguidos JJ e II, o qual vinha ao encontro do mesmo, 348. … e conduzindo contra direito, enquanto responsáveis pela Câmara Municipal de ..., todo o processo VZ4 em violação do artigo 20º nº 1 do Regulamento REVITA, das deliberações dos órgãos do Fundo, e em violação do protocolo firmado com a UMP/FCG, com intenção de fazerem reabilitar imóveis não destinados a habitação permanente. 349. Ao fornecerem informações falsas quanto à habitação permanente da requerente, os arguidos agiram com intenção de induzir em erro os demais membros da Comissão Técnica do REVITA, levando-os a não rejeitarem o requerimento e a concordarem com a entrega à UMP/FCG, para financiamento. 350. Mais agiram com intenção de induzir em erro tais instituições, na pessoa das representantes nomeadas, levando-as aceitar o financiamento e a determinar o pagamento da obra, com o inerente prejuízo de 70.035,36 € que suportaram em partes iguais. 351. Os arguidos FF e GG não se abstiveram de agir da forma descrita, apesar de estarem cientes da qualidade de ... do primeiro e de ..., até ........2017 e, após essa data, de funcionário, do segundo, sabendo que violavam os deveres de isenção, imparcialidade e prossecução do interesse público. 352. Nenhum dos arguidos se absteve da conduta descrita, mesmo sabendo ser proibida e punida por lei penal. A. Quanto ao processo REVITA AF7, a UMP e a FCG suportaram ainda as quantias constantes dos documentos de Fls. 120, 121, 122, 123, 124, 125 do Anexo XVI, no valor total de 17.275,05 €, pelo que, atento o demais já considerado provado, suportaram um total de € 43.363,05. B. Quanto ao processo REVITA PO5, resultando deste recurso que a UMP e a FCG suportaram ainda a quantia 250,08 € constante da fatura junta a fls. 138 do Apenso 30, e rectificando ainda o erro de cálculo quanto aos valores constantes dos documentos indicados no facto provado 316), apura-se o valor total de 150.863,00 €. C. Quanto ao processo REVITA VZ4, a UMP e a FCG, suportaram ainda as quantias constantes das faturas e comprovativos de pagamento constantes de fls. 125 do Apenso 30 no valor de 6.268,92 €; de fls. 120, 121 do Anexo XVI no valor de 18.461,30 €, fls. 122, 123 do Anexo XVI no valor de 18.596,20 €, de fls. 124, 125 ainda do Anexo XVI no valor de 30.321,70 €.»3 III. Como sabido, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação que apresentou (art. 412.º, n.º 1, do CPP). Neste caso concreto os recorrentes discordam apenas da respetiva condenação cível de que foram alvo na decisão que impugnam da Relação de Coimbra, precisamente na parte em que agravou a sua condenação cível na 1ª instância. Tendo por referência as conclusões apresentadas, verifica-se que, sumariamente, as questões invocadas pelo recorrente FF resumem-se a saber se o acórdão recorrido: a) É nulo, por supressão de um grau de jurisdição, por ter permitido que o demandante FCG viesse em sede de recurso alterar o pedido de indemnização civil, sem observar o disposto no art. 264.º do Código de Processo Civil; b) Violou o princípio do dispositivo (permitindo que as demandantes civis ampliassem a causa de pedir e o pedido no recurso, sem o acordo do recorrente, inobservando o disposto no art. 264.º do Código de Processo Civil) e o princípio do contraditório; c) É nulo, nos termos do disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º e do artigo 3.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, por ter condenado os arguidos em quantia superior à que havia sido peticionada (processo PO5), violando o princípio do pedido e, igualmente constituindo uma decisão surpresa e a decisão de uma questão nova, para além de haver erro de interpretação da decisão da 1ª instância; d) Não deveria ter condenado solidariamente os arguidos, adotando uma interpretação inconstitucional do artigo 497.º, n.º 1 do Código Civil (por ofensa do Princípio da Igualdade). Por seu turno, as questões invocadas pelo recorrente GG resumem-se a saber se o acórdão recorrido: a) Tem um erro material de cálculo, quanto ao somatório dos valores constantes do ponto iii) do dispositivo; b) Supriu, de forma ilegal (por excesso de pronúncia, ferindo igualmente de nulidade o acórdão da Relação), a nulidade de falta de fundamentação, o que teve por consequência a eliminação de um grau de jurisdição; c) Admitiu uma reparação/concretização de factos essenciais do pedido de indemnização civil nas alegações de recurso, em violação do ónus de alegação e do art. 5.º do Código de Processo Civil, não cabendo à Relação aditar factos essenciais não alegados e integrantes da causa de pedir, ainda que possam resultar de meios de prova indicados no pedido de indemnização civil, tendo assim beneficiado uma das partes (no caso as demandantes civis) e violado os artigos 5.º, 590.º do Código de Processo Civil, bem como os princípios subjacentes a tais normas (princípios do dispositivo, da igualdade das partes, da imparcialidade do juiz), pelo que deve ser revogada a decisão recorrida e mantida a decisão da 1ª instância; d) Deu como provados valores que não se encontravam sustentados em qualquer documentação; e) É nulo, por ter condenado os recorrentes em valor superior ao constante do Pedido de Indemnização Civil (processo PO5), violando o princípio do pedido e, igualmente constituindo uma decisão surpresa e a decisão de uma questão nova, para além de haver erro de interpretação da decisão da 1ª instância; f) Não deveria ter condenado solidariamente os arguidos, adotando uma interpretação inconstitucional do art. 497.º, n.º 1, do Código Civil (por ofensa do Princípio da Igualdade). Finalmente, as questões invocadas pelos recorrentes JJ e II resumem-se a saber se: a) O acórdão recorrido enferma de um lapso de escrita e/ou de cálculo, quanto ao somatório dos valores constantes do ponto iii) do dispositivo; b) As demandantes não alegaram, no pedido de indemnização civil apresentado, factos essenciais, no que toca ao valor dos danos, ficando precludido o ónus de alegação com todas as consequências legais (o mesmo é dizer que não podia a Relação atender aos novos factos alegados em sede recursiva, nunca antes alegados, não podendo ir além da condenação da 1ª instância, uma vez que na fase de recurso não é possível carrear novos factos essenciais aos autos ou indicar meios de probatórios); c) O Tribunal recorrido não podia ter considerado o pagamento de € 6.268,92, alegado em sede de recurso pela Fundação Calouste Gulbenkian, porquanto o mesmo não encontra respaldo no indicado documento de fls. 125 do apenso 30; d) O acórdão recorrido deveria ter atendido à interrupção do nexo de causalidade entre o comportamento enganoso imputado aos recorrentes e os valores peticionados pelas demandantes; e) O Tribunal da Relação de Coimbra estava impedido de suprir a deficiente fundamentação e procedido à alteração da decisão do Tribunal de 1.ª Instância sobre a matéria de facto, constituindo, nessa parte, uma decisão surpresa, com prejuízo para os seus direitos de defesa. Vejamos em primeiro lugar se são admissíveis os recursos para o STJ. Como referido, os recursos aqui em apreciação respeitam, tão-somente, à condenação nos pedidos de indemnização civil formulados pelas demandantes Fundação Calouste Gulbenkian e União das Misericórdias Portuguesas (de ora em diante FCG e UMP, respetivamente). Nesta medida, no que respeita à condenação civil, os pedidos deduzidos pelas demandantes foram julgados parcialmente procedentes, em 1.ª instância, tendo os demandados FF e GG, aqui recorrentes, sido condenados no pagamento solidário da quantia global de € 185.233,33 (cento e oitenta e cinco mil, duzentos e trinta e três euros e trinta e três cêntimos). Por sua vez, os recorrentes II e JJ foram nessa sede condenados no pagamento de € 70.035,36 (setenta mil, trinta e cinco euros e trinta e seis cêntimos). Tendo sido interposto recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, este veio a alterar os termos da referida condenação tendo decidido: «1) Quanto ao processo REVITA AF7, a UMP e a FCG suportaram ainda as quantias constantes dos documentos de Fls. 120, 121, 122, 123, 124, 125 do Anexo XVI, no valor total de 17.275,05 €, pelo que, atento o demais já considerado provado, suportaram um total de € 43.363,05. 2) Quanto ao processo REVITA PO5, resultando deste recurso que a UMP e a FCG suportaram ainda a quantia 250,08 € constante da fatura junta a fls. 138 do Apenso 30, e rectificando ainda o erro de cálculo quanto aos valores constantes dos documentos indicados no facto provado 316), apura-se o valor total de 150.863,00 €. 3) Quanto ao processo REVITA VZ4, a UMP e a FCG, suportaram ainda as quantias constantes das faturas e comprovativos de pagamento constantes de fls. 125 do Apenso 30 no valor de 6.268,92 €; de fls. 120, 121 do Anexo XVI no valor de 18.461,30 €, fls. 122, 123 do Anexo XVI no valor de 18.596,20 €, de fls. 124, 125 ainda do Anexo XVI no valor de 30.321,70 €.» Ora, no que respeita à condenação civil, dispõe o artigo 400.º, n.º 2, do Código de Processo Penal que «[s]em prejuízo do disposto nos artigos 427.º e 432.º, o recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade desta alçada». Acresce que, nos termos do n.º 3 desse normativo, se estabelece que «[m]esmo que não seja admissível recurso quanto à matéria penal, pode ser interposto recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil.» A redação de tal normativo foi conferida pela Lei n.º 59/98, de 25 de agosto, diploma que para além de acrescentar a expressão «só», fez constar uma nova exigência anteriormente não existente – a de que o valor do pedido tem de ser superior à alçada do tribunal recorrido4. Por sua vez, o n.º 3 do artigo 400.º do Código de Processo penal veio estabelecer a autonomia das regras respeitantes à admissibilidade dos recursos civis face às dos penais, podendo aqueles ser admitidos, não obstante exista irrecorribilidade em termos criminais. Tal normativo, foi introduzido pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, constando da Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 109/X, que lhe deu origem, que «[p]ara garantir o respeito pela igualdade, admite-se a interposição de recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil mesmo nas situações em que não caiba recurso da matéria penal». É, assim, manifesto que mesmo não sendo admissível o recurso penal, nos termos do artigo 400.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, as partes poderão recorrer da decisão em matéria civil, ficando a ação civil independente da penal. Como tal, e não dispondo expressamente o Código de Processo Penal os termos relativamente aos quais os recursos cíveis são admissíveis, necessariamente se terá de recorrer às regras constantes do Código de Processo Civil, nomeadamente o artigo 671.º do Código de Processo Civil, em conformidade com o disposto no artigo 4.º do Código de Processo Penal. Tendo havido agravação no valor das indemnizações em que os recorrentes foram condenados, e considerando os montantes a que os respetivos demandados foram condenados, podemos concluir que são os recursos admissíveis nos termos dos artigos 629.º e 671.º do Código de Processo Civil ex vi do art. 4.º do CPP. Assim sendo, analisaremos as questões colocadas pelos recorrentes, tratando-as (no momento próprio) nos cinco principais temas a seguir indicados que importa apreciar para o efeito. 1. Da nulidade do acórdão recorrido (por falta de fundamentação e da supressão de um grau de jurisdição) Vêm, desde logo, os recorrentes invocar que a decisão proferida pelo Tribunal da Relação padece de nulidade, por violação do duplo grau de jurisdição. Consideram, assim, os recorrentes que o Tribunal da Relação, deparando-se com a nulidade, por falta de fundamentação, da decisão da 1.ª instância, estava obrigado a reenviar os autos a esse Tribunal, para que fosse suprido o referido vício. Ora, as demandantes civis interpuseram recurso do acórdão proferido pelo Tribunal de 1.ª instância, tendo o Tribunal da Relação determinado a revogação parcial da referida decisão e consequente aditamento de três factos à matéria assente. Pode, então, ler-se, no referido aresto, no que nesta parte importa, que: «c) Iniciando então a apreciação dos recursos, ambos os recorrentes começam por invocar a falta de fundamentação, ou ao menos a incompreensão quanto à decisão recorrida. Recorde-se que o tribunal a quo julgou provados os factos relacionados com os pedidos de indemnização civil que já constavam da acusação/pronúncia (designadamente quanto às entregas de dinheiro por parte dos financiadores ao empreiteiros), mas considerou como não provado “que em consequência das condutas dos arguidos (e sem prejuízo dos factos supra provados quanto os mesmos), a parceria UMP/FCG despendeu montante superior ao descrito nos factos provados, assim como considerou não provado “que existem, danos ainda em produção em consequência da conduta dos arguidos”. Para fundamentar não ter dado como provados aqueles factos (aos quais, como vimos, se refere genericamente como sendo todos aqueles em que o dispêndio ultrapassou o descrito nos factos provados), escreveu o tribunal a quo seguinte (p. 262 da decisão recorrida no formato pdf): “Quanto aos pedidos cíveis apresentados, constata-se que os mesmos aderem aos factos descritos na acusação, com exceção dos montantes de danos alegados pela UMP/FCG, sem que resultem alegados e discriminados quais os valores superiores suportados por tal parceria, em consequência da conduta dos arguidos (e não obstante decorra da documentação junta a ocorrência de posteriores pagamentos). Tendo resultado da prova produzida em audiência (depoimentos de UU e TT) que situações existiram em que a parceria decidiu concluir as obras em curso, não obstante o conhecimento de irregularidades nas candidaturas, não é possível concluir que os montantes superiores alegados nos pedidos cíveis formulados pela UMP/FCG se ficaram a dever à conduta enganosa praticada pelos arguidos donde tais factos resultem não provados. d) Este trecho surge como vago e genérico, designadamente na parte em que se escreve que “situações existiram”, sem que essas situações sejam minimamente determinadas ou identificadas. Assim como o mesmo trecho acima transcrito surge como vago e impreciso quando se refere a “irregularidades nas candidaturas” sem que determine que candidaturas eram essas, e especialmente a que irregularidades se refere. Aparentemente (e dizemos aparentemente porque a fundamentação é, como vimos, vaga e lacónica) a decisão recorrida pretenderá que ocorreu a quebra do nexo causal entre a conduta dolosa dos arguidos/demandados civis (que permitiu, como vimos, a condenação dos mesmos nos valores pagos pelas demandantes descritos na acusação), e os valores pagos pelas mesmas demandantes, mas apenas os que são referidos na acusação, e não nos pedidos de indemnização civil. Mas se é esse o caso, então fica por explicar porque razão tal ocorre. e) Desde logo, como referimos, não se determinam que “irregularidades” seriam essas; presumindo que quando a decisão recorrida se refere a “irregularidades” estará a referir-se à conduta astuciosa dos requerentes dos processo de financiamento que se apresentaram como habitações permanentes não o sendo, fica por saber se essas irregularidades são as verificadas em cada um dos processos de financiamento em causa nesta instância civil de recurso (ou seja, o REVITA AF7, o REVITA PO5, o REVITA VZ4 e o Revita AT4), ou se noutros processos de financiamento que não estes, e nesse caso em quais; note-se que no pequeno trecho da decisão recorrida se escreve “que situações existiram” sem que se discriminem minimamente essas situações. Para além de não se saber se as irregularidades em causa são as verificadas nestes processos em concreto ou em outros processos, ainda menos se sabe relativamente ao momento em que supostamente as recorrentes civis teriam tomado conhecimento dessas irregularidades. A recorrente FCG faz um exercício curioso no sentido de tentar adivinhar o momento do conhecimento dessas irregularidades. Assim, levanta a hipótese de as demandantes civis terem tomado conhecimento de irregularidades nas candidaturas numa das seguintes datas: - ... .07.2018 – data da publicação da revista ... onde foram levantadas as primeiras suspeitas da existência de desvios de donativos por parte da comunicação social e que motivou a abertura do inquérito criminal dos autos; - ... .10.2018– data constante da ata do CG do Fundo REVITA em que se concluiu pela necessidade de reavaliar dois processos de apoio atribuídos à parceria UMP/FCG1; - ... 02.2019 – data em que o Sr. Inspetor XX remeteu à Eng. TT, ... e representante da UMP, um pedido de informação relativamente aos pagamentos efetuados nos processos em questão. E mais adiante no recurso, a mesma demandante ainda no desenvolvimento do mesmo exercício especulativo relativamente ao momento do conhecimento das suspeitas, escreve: (i) se considerarmos a data de 18.07.2018, os valores fixados relativamente ao processo REVITA AF7 não correspondem aos indicados no dispositivo do Acórdão Recorrido, por terem seguramente sido consideradas para o respetivo cálculo os valores constantes das faturas emitidas em 06.08.2018 e 30.08.2018 e, portanto, após a publicação da notícia da revista Visão; (ii) por sua vez, se considerarmos a data de 15.10.2018, também verificamos que, quanto ao processo REVITA PO5, foram consideradas para o cálculo dos valores fixados pelo Tribunal a quo faturas emitidas após aquela data, inclusivamente, de 20193, pelo que também não poderá ser este o momento a partir do qual terão deixado de ser contabilizados os valores imputados aos arguidos; (iii) já se considerarmos a data de 08.02.2019, verifica-se igualmente que terão sido consideradas na condenação do pedido cível referente ao mesmo processo REVITA P05, faturas posteriores àquela data4, pelo que também não poderá ser este o momento considerado pelo Tribunal a quo. Enfim, assim se ilustra à saciedade da absoluta ininteligibilidade da decisão recorrida nesta parte, atenta a indefinição do momento que terá considerado como aquele em que os demandantes civis teria que cessar os pagamentos aos empreiteiros. f) E ainda quanto à questão defendida pela decisão recorrida de os demandantes civis deverem suspender os pagamentos, devemos ainda observar o seguinte: Os pagamentos que a decisão recorrida defende que deveriam ter sido suspensos não eram efectuados pelos demandantes civis aos proprietários dos imóveis (ou seja, aos arguidos que astuciosamente provocaram a transferência patrimonial que se concluiu ser indevida); os pagamentos foram feitos aos empreiteiros, que procederam a obras nos imóveis, na sequência de um contrato de empreitada assinado entre as partes. Nessas circunstâncias, os demandantes civis limitaram-se a cumprir o que já estava contratualmente acordado com o empreiteiro, contrato esse feito num contexto em que todos julgavam que era legítimo o pedido de financiamento. Assim, quem seria prejudicado com a suspensão dos pagamentos seria o terceiro (o empreiteiro) e não os arguidos, especialmente nos casos em que já tinha efectuado a parte da obra cujo pagamento reclamava. Em última instância seriam os demandantes civis a ser responsabilizados contratualmente pelos empreiteiros por incumprimentos do contrato. Nestas condições, suspender o pagamento a terceiros (os empreiteiros) completamente alheios à eventual prática do crime, surgiria como injustificado. Acrescente-se que ainda que existissem suspeitas que algum dos processos de financiamento teriam ocorrido irregularidades, atenta a complexidade dos autos, os demandantes civis só poderiam ter a certeza da responsabilidade dolosa dos arguidos após o trânsito em julgado da decisão que definitivamente estabelece essas responsabilidades, que é este acórdão. Assim se conclui que a decisão recorrida deve ser parcialmente revogada nesta parte cível, por não considerar - injustificadamente - para efeitos de condenação nos pedidos de indemnização civil o ressarcimento de quantias que não constem expressamente dos factos provados com origem na acusação e despacho de pronúncia. g) Questão diferente, relaciona-se com o apuramento dos valores foram efectivamente suportados pelos demandantes civis para além dos já considerados no acórdão sob recurso. O acórdão sob recurso afirma que não foram “alegados e discriminados quais os valores superiores suportados por tal parceria”. E nos pedidos de indemnização civil formulados respetivamente pela UMP (vol. XI, fls. 2813 e ss.), e pela FCG (vol. XI., fls. 2830 e ss.) não se discriminam os valores pagos para além do que já constava da acusação; a propósito de cada processo de financiamento, as demandantes civis indicam o valor total despendido (incluindo o já referido na acusação/pronúncia). Assim, quanto ao processo REVITA AF7, a UMP indica no art 46º do seu pedido de indemnização civil (fls. 2817 v.) o valor total despendido (85.697,09 €), o mesmo sucedendo quanto à demandante civil FCG no art 75º do seu pedido de indemnização civil (fls. 2837), alegando que foi despendido o mesmo valor num total de 85.697,09 € em obras, projecto e apetrechamento. Quanto ao processo REVITA PO5, (beneficiária e demandada HH), a demandante FCG, no art 87º do seu pedido de indemnização civil, alega que foi pago à sociedade empreiteira a quantia total de 131.096,35 €, dos quais suportou 55.643,13 €, o mesmo sucedendo quanto à demandante UMP no referido art 46º do seu pedido de indemnização civil, repetindo a menção a esse valor no final do seu pedido. E por fim, quanto ao processo n.º REVITA VZ4 (beneficiários II, JJ), a FCG no art 107º do seu pedido de indemnização civil alega que foi pago - ao empreiteiro que realizou a obra no imóvel em causa - o valor total de 91.471,23 €, o mesmo sendo alegado pela recorrente UMP no respectivo pedido de indemnização civil. h) Ora esta forma de alegar genérica dificulta de sobremaneira a aferição dos pagamentos que teriam sido feitos aos empreiteiros para além dos que já ficaram provados no acórdão sob recurso, pagamentos esses que já constavam descritos na acusação e no despacho de pronúncia. Assim, com a excepção dos pagamentos referidos pelo recorrente FCG (aos quais nos referiremos infra), ficamos efectivamente sem saber que factos constantes dos pedidos de indemnização civil (mormente os pagamentos feitos a empreiteiros) deveriam ter sido considerados, não o tendo sido. De todo o modo, mais do que um problema de alegação (os demandantes, apesar de tudo, alegaram que despenderam montantes superiores aos referidos na acusação, tendo este acórdão da Relação acima considerado admissível que possam ser contempladas outras despesas, que não as expressamente referidas na acusação), estamos perante um problema de prova. Note-se que tendo sido considerado na decisão recorrida como não provado “que em consequência das condutas dos arguidos (e sem prejuízo dos factos supra provados quanto os mesmos), a parceria UMP/FCG despendeu montante superior ao descrito nos factos provados, cabe aos recorrentes - para reverter o sentido da decisão recorrida - indicar a prova que impõe que aquela asserção não corresponde à realidade; para que este tribunal de recurso possa considerar outras despesas feitas pelos demandantes civis (que não as já consideradas na decisão recorrida), os recorrentes deveriam discriminar a prova que dita que essas despesas foram efectuadas. j) A demandante FCG, de forma mais modesta e limitada comparativamente ao pretendido no pedido de indemnização civil deduzido, indica nas tabelas inseridas no respectivo recurso, a partir do art 75º da sua motivação, documentos que comprovam outras despesas que não as consideradas no acórdão sob recurso. E a indicação e avaliação desses documentos permite provar: i) no que respeita aos prejuízos causados pelos arguidos no âmbito do processo REVITA AF7, não foram consideradas no acórdão sob recurso as faturas e comprovativos de transferência constantes de fls. 114, 115, 116, 117, 118, 119 do Anexo XVI e fls. 138 do Apenso 30 (na parte que refere Habitação AF7 EE), pelo que se logra documentalmente provar que a parceria FCG/UMP incorreu num prejuízo adicional de mais € 17.275,05 €; ii) - no que respeita aos prejuízos causados pelos arguidos no âmbito do processo REVITA PO5, não foi considerada a fatura constante de fls. 138 do Apenso 30 (na parte em que refere Habitação PO5 HH) no valor de 250,08 €. Acresce ainda, quanto este processo PO5, que resultando do facto provado n.º 316. que “A obra foi executada, sendo emitidas as faturas e autos de medição e efetuados os pagamentos pela UMP, por transferência bancária para o construtor, sendo a UMP posteriormente reembolsada em 50% pela FCG. (fls. 102 a 113; 198 e 199 do Apenso 33; 78 a 105 do Anexo XVI), a soma dos valores constantes desses documentos referenciados nesse facto provado 316 é de 150.612,92 € (correspondente a 9.656,00 + 20.907.03+ 11329,72 + 8203,38 + 4525,95 + 51997,24 + 10953,35 + 30.258,00 + 2.290,25 + 492,00). Somando a este valor o montante de 250,08 € (da factura FAC 18 acima referida) apura-se que foi indicada prova documental nos autos que permite sustentar a condenação dos demandados no pagamento da quantia 150.863,00 € (corrigindo-se assim este erro de cálculo). iii) Quanto ao processo REVITA VZ4, não foram consideradas pelo Tribunal a quo as faturas e comprovativos de pagamento constantes de fls. 125 do Apenso 30 e fls. 120, 121, 122, 123, 124, 125 do Anexo XVI. Daqui resulta que tendo os demandantes civis alegado nos seus pedidos de indemnização civil que suportaram pagamentos aos empreiteiros em valor superior ao que constava na acusação, devem ser julgados parcialmente procedentes os recursos K) e L), mas apenas quanto às despesas que resultem da prova indicada nos recursos (os identificados documentos juntos aos autos), e que são as acima assinaladas.» Sucede, contudo, que, ao contrário do que é afirmado pelos recorrentes, a referida decisão não considerou que o acórdão de 1.ª instância fosse nulo, por falta de fundamentação. É certo que o acórdão em causa refere que da fundamentação da 1.ª instância não consta mais do que um trecho “vago”, “genérico” e “impreciso”, sendo a mesma “vaga e lacónica”. Todavia, não obstante essas considerações, o acórdão não proferiu decisão no sentido de existir uma falta de fundamentação. Importa, assim, destrinçar, os casos em que existe uma efetiva falta de fundamentação, daqueles outros em que se considera existir um erro de julgamento, em que é, ainda, possível suprir essa deficiência mediante o recurso aos elementos de prova constantes do processo5. Ora, a nulidade da decisão, por falta de fundamentação, prevista nos artigos 379.º, n.º 1, alínea a) e 374.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal, abrange as situações em que está em causa uma total ausência de fundamentação, bem como aquelas em que, apesar de estarmos perante uma decisão minimamente fundamentada, não é possível percecionar qual o percurso lógico do tribunal que conduziu àquele juízo decisório (ou seja, casos em que há uma insuficiente fundamentação que é equiparada a falta de fundamentação). Contudo, tal não se confunde com a circunstância de a fundamentação ser débil ou inconsistente, sendo, todavia, possível apreender o sentido lógico que sustenta a decisão proferida. Nesta senda, uma motivação inadequada ou escassa afeta o valor doutrinal da sentença proferida, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em sede recursiva, não estando, contudo, afetada pelo vício da nulidade6. Ora, em nenhum momento do acórdão proferido, o Tribunal da Relação julga verificada a nulidade invocada, de falta de fundamentação, decorrendo desse texto decisório que conseguiu alcançar o raciocínio subjacente à decisão da 1.ª instância tendo, contudo, discordado do mesmo. Nesta medida, existe não uma falta de fundamentação, mas, antes, uma divergência acerca da valoração dos elementos probatórios constantes dos autos, uma vez que, segundo o juízo do tribunal de recurso, a prova produzida impõe uma conclusão distinta. Em face de tal análise, foi determinada a revogação parcial da decisão que havia sido proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, por a Relação ter considerado existir um erro de julgamento e, nessa medida, a consequência foi ter aditado os factos acima indicados que deu como provados. Assim sendo, percebe-se que a Relação não tenha declarado a nulidade da decisão (porque não era, nomeadamente, a falta de fundamentação que estava em causa, mas antes a errada avaliação da prova pela 1ª instância, o erro do julgamento). Nesta medida, a invocação, por parte dos recorrentes, no sentido de que o processo deveria ter sido reenviado para a 1.ª instância, sob pena de violação do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, não tem qualquer aplicabilidade neste caso, pois que a alteração factual operada insere-se, plenamente, dentro dos poderes de cognição do Tribunal da Relação (que conhece de facto e de direito), nos termos constantes do artigo 431.º, al. a), do Código de Processo Penal. Como tal, tando em atenção tendo em atenção a matéria de facto que fora alegada nos pedidos de indemnização civil, a par da constante da acusação, peça processual para onde os demandantes civis remeteram, o Tribunal da Relação dispunha de todos os elementos de prova, nos termos em que o fez. Tal significa do mesmo modo, que não há qualquer excesso de pronúncia, face à matéria que, perante as questões colocadas em sede de recurso pelos demandantes civis, tinha de conhecer. Portanto, até ao contrário do que os recorrentes alegam, a Relação não procedeu ao suprimento da fundamentação da 1ª instância, a qual, como acima se referiu, não foi em nenhum momento declarada nula. Assim, não constitui a alteração factual que introduziu (por ter considerado existir erro de julgamento da 1ª instância, o que cabia nos seus poderes de cognição), qualquer decisão surpresa (sendo certo que os demandados civis sempre tiveram a oportunidade de se defender não só desde que foram notificados para contestar os pedidos cíveis, como em audiência de julgamento, assim como na resposta aos recursos apresentados pelos demandantes civis apreciados na decisão da Relação, não podendo alegar que foram prejudicados nos seus direitos de defesa, mesmo em matéria cível). Em face do exposto, improcedem as nulidades da decisão recorrida, arguidas pelos recorrentes, bem como a demais argumentação invocada sobre esta matéria. 2. Da violação do princípio do dispositivo e do princípio do contraditório Invocam, ainda, os recorrentes, a violação do princípio do dispositivo e do princípio do contraditório, supostamente por o Tribunal da Relação ter colmatado a falta de alegação, por parte das demandantes civis, de factos essenciais, omitidos no pedido de indemnização civil apresentado e que teriam sido incluídos em sede de recurso, sem o seu acordo (em inobservância, portanto, do disposto no art. 264.º do Código de Processo Civil). Ora, estabelece o artigo 71.º do Código de Processo Penal que «[o] pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei». Ademais, dispõe o artigo 5.º, n.º 1 do Código de Processo Civil que «[à]s partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas». Nesta medida, na ação cível, o autor deverá invocar o facto constitutivo da situação jurídica material que quer fazer valer. Ora, no caso da responsabilidade civil extracontratual derivada da prática de um crime, a causa de pedir que subjaz à interposição da ação é complexa, devendo o demandante alegar os factos que integram a prática do crime em apreço, a culpa, bem como os danos que foram causa adequada desse ato ilícito. No essencial, o pedido cível, deduzido no âmbito do processo-crime, tem como causa de pedir o facto ilícito criminal, equivalendo, assim, aos factos que constituem o pressuposto da responsabilidade criminal7. Nos presentes autos, as demandantes civis FCG e UMP, nos pedidos de indemnização civis juntos aos autos, apresentam de forma cabal e completa as circunstâncias relativas aos factos voluntários, ilícitos, culposos e geradores de danos que imputam aos demandados, em plena consonância, aliás, com a acusação pública proferida. A questão controvertida refere-se, mais concretamente, à alegação dos danos que teriam sido provocados pelas respetivas condutas integradoras de crimes pelos quais os arguidos foram condenados. Ora, na referida peça processual, as demandantes individualizam, por referência a cada um dos processos que está em causa – AF7, PO5 e VZ4 – os valores globais despendidos com os mesmos. É certo, contudo, que não o fazem distinguindo, dentro de cada um desses processos, qual o valor e data de cada um dos pagamentos efetuados. Do mesmo modo, na factualidade considerada provada pelo Tribunal de 1.ª instância, é também apenas considerado – e feito constar nesse acervo factual – um montante global, embora sendo feita referência às faturas que foram tidas em consideração8. Por outro lado, o Tribunal da Relação, nos factos agora dados como provados, desdobra alguns desses montantes, sendo certo que o faz estabelecendo, também, um valor total, por referência aos documentos relevantes para a prova do mesmo9. Tal questão prende-se, assim, com a amplitude ou liberdade de conformação dos poderes do Tribunal de Recurso, no que respeita à fixação – e alteração – da matéria de facto. Ora, nos termos do n.º 2 do já citado artigo 5.º do Código de Processo Civil: «Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.» Como tal, se é certo que, relativamente aos factos integradores da causa de pedir, vigora o princípio do dispositivo previsto no n.º 1 do artigo 5.º do Código de Processo Civil, recaindo sobre o autor o dever de alegação dos factos essenciais que integram a mesma, decorre do n.º 2 do mencionado normativo que os tribunais podem considerar os factos instrumentais que resultem da instrução da causa, bem como os factos complementares ou concretizadores que provenham dessa atividade e integrem a relação jurídica material devidamente individualizada pela causa de pedir10. In casu, importa verificar se, conforme é referido pelos demandados civis, aqui recorrentes, o Tribunal da Relação efetivamente aditou factos que não haviam sido alegados nos pedidos de indemnização civil e se, na afirmativa, tal aditamento é ofensivo dos princípios invocados pelos recorrentes. Ora, como já se referiu, os prejuízos sofridos pelas demandantes civis foram alegados em sede processualmente adequada para o efeito: no pedido de indemnização civil apresentado por cada um deles. A específica discriminação de todos os pagamentos efetuados a cada um dos empreiteiros, por referência a cada um dos processos, não é um facto essencial, integrador da causa de pedir. A alegação pode ser feita de modo mais, ou menos, pormenorizado, devendo ser considerada, desde que apreensível e suficientemente concretizada. Afigura-se que, in casu, os factos aditados pelo Tribunal da Relação encontram-se integrados nos factos essenciais alegados pelos demandantes civis. Na verdade, o julgador não se encontra adstrito, de modo estanque, à concreta formulação adotada pelos sujeitos processuais nas peças por eles apresentadas. Tendo por referência a causa de pedir, conformadora do objeto do processo, e os factos essenciais alegados, neste caso, o prejuízo total sofrido pelas demandantes, nada obsta a que o Tribunal proceda a uma mais concretizada individualização e discriminação dos valores em causa, para melhor se perceber a fixação dos montantes indemnizatórios (que no caso foram alterados), não consubstanciando essa operação qualquer modificação da causa de pedir ou aditamento dos factos essenciais. O Tribunal da Relação adotou (na sua liberdade de redação e melhor expressão da sua decisão), apenas, uma mera formulação diferente da alegada, optando por discriminar naquela parte os valores em causa e, de seguida, indicando ou não, um montante global final (em cada um dos processos AF7 e PO5 foi também indicado um valor global total suportado e no VZ4 não foi indicado). Ora, «na redacção da matéria de facto o julgador não está sujeito aos exactos termos e expressões empregues pelas partes nos articulados, pelo que, reconduzindo-se a matéria de facto provada, no seguimento da instrução, ao alegado pela autora, nos articulados, não há lugar à aplicação do comando contido na al. b), do n.º 2, do art. 5.º, do CPC, nem ocorre qualquer violação dos princípios do dispositivo, do contraditório ou da igualdade»11. Não se verifica, assim, que o Tribunal da Relação, de algum modo, se tivesse substituído às partes, aperfeiçoando o que os demandantes civis haviam alegado no pedido de indemnização civil. Deste modo, não se pode afirmar que a decisão proferida tenha apreciado uma questão nova ou que consubstancie uma decisão-surpresa, uma vez que a factualidade aditada respeita à prova dos prejuízos que haviam sido alegados anteriormente (nos respetivos pedidos cíveis) pelas demandantes civis, sujeitos a contraditório e alvo de produção de prova em sede de audiência de discussão e julgamento e que haviam sido erradamente julgados pela 1ª instância. De resto, como resulta do supra exposto, os demandantes civis cumpriram nos pedidos cíveis o ónus de alegação dos factos essenciais integrantes da causa de pedir e do pedido, indicando igualmente os meios de prova como lhes competia, tendo observado o disposto no art. 5.º do Código de Processo Civil. É, pois, errada a conclusão dos recorrentes quando sustentam o contrário, inclusive quando erradamente partem do princípio que os factos aditados pela Relação, acima referidos, constituem uma violação do disposto nos artigos 5.º e 590.º do Código de Processo Civil, bem como dos princípios subjacentes a tais normas (particularmente princípios do dispositivo, da igualdade das partes e da imparcialidade do juiz), assim como quando alegam incorretamente que o pedido e a causa de pedir foram alterados em sede de recurso pelos demandantes civis, sem o seu acordo e com violação do disposto no art. 264.º do Código de Processo Civil. Improcede, pois, a argumentação dos recorrentes, sendo certo que a responsabilidade civil pelo pagamento dos danos causados dados como provados decorre dos respetivos crimes que cometeram, pelos quais igualmente foram condenados (a diferença entre a condenação cível na 1ª instância e na 2ª instância neste caso é apenas a nível do valor dos danos a pagar, uma vez que, no mais, se verificam todos os pressupostos que obrigam os demandados civis, aqui recorrentes, a indemnizar os demandantes civis nos valores adiante melhor indicados). 3. Da ausência de prova de documental Invocam, ainda, os recorrentes GG e JJ e II que o Tribunal da Relação de Coimbra não dispunha de elementos probatórios que lhe permitisse decidir, nos termos em que o fez. Ora, estabelece o artigo 682.º do Código de Processo Civil que: «1 - Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado. 2 - A decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excecional previsto no n.º 3 do artigo 674.º. 3 - O processo só volta ao tribunal recorrido quando o Supremo Tribunal de Justiça entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou que ocorrem contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito.» Nesta medida, o artigo 674.º do Código de Processo Civil dispõe, no que aos fundamentos da revista respeita, que: «1 - A revista pode ter por fundamento: a) A violação de lei substantiva, que pode consistir tanto no erro de interpretação ou de aplicação, como no erro de determinação da norma aplicável; b) A violação ou errada aplicação da lei de processo; c) As nulidades previstas nos artigos 615.º e 666.º. 2 - Para os efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, consideram-se como lei substantiva as normas e os princípios de direito internacional geral ou comum e as disposições genéricas, de caráter substantivo, emanadas dos órgãos de soberania, nacionais ou estrangeiros, ou constantes de convenções ou tratados internacionais. 3 - O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.» Decorre, assim, do referido normativo legal que é à 1.ª instância e ao Tribunal da Relação que compete o apuramento da factualidade relevante para a decisão do litígio pelo que, em regra, o Supremo Tribunal de Justiça não possui poderes de modificação da matéria de facto por eles fixado12. Como tal, este Supremo Tribunal, enquanto tribunal de revista, não tem poderes de intervenção na fixação dos factos materiais da causa, não podendo sindicar a análise – correta ou não – do Tribunal da Relação, sobre a prova produzida, só conhecendo de matéria de direito. Assim, a incorreta apreciação dos elementos probatórios dos autos, nomeadamente documentais, não é passível de ser objeto do recurso de revista, sem prejuízo das exceções consagradas no referido n.º 3 do artigo 722.º do Código de Processo Civil: - quando se verifique a ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto; ou - quando haja violação de norma legal que fixe a força probatória de determinado meio de prova. Ora, afirmando os recorrentes, nas suas alegações recursivas, que a documentação junta impunha uma diferente conclusão, tal consubstancia um eventual erro de convicção ou de julgamento, não sindicável por este Tribunal13. Nesta senda, uma vez que os documentos em causa – faturas e comprovativos de pagamento – não têm força legal e se encontram sujeitos à livre apreciação de prova por parte do Tribunal, não compete a este Supremo Tribunal de Justiça indagar o ora pretendido pelos recorrentes. Como tal, «[e]stando em causa documentos particulares (…) a respectiva força probatória é mediada pela livre convicção que os meios criaram no espírito do julgador, a qual – fora dos casos de força probatória legal imperativa – deve ser respeitada pelo tribunal de revista». Assim sendo, «[é] definitivo o juízo formulado pelo tribunal da Relação, no âmbito do disposto no art. 662.º. n.º 1, do CPC, sobre a prova sujeita à livre apreciação, não podendo ser modificado ou censurado pelo STJ, cuja intervenção está limitada aos casos da parte final do n.º 3 do art. 674.º do mesmo Código»14. Além disso, sendo aplicáveis as regras do processo penal, os poderes cognitivos do STJ estão definidos no art. 434.º do CPP, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito, não se verificando neste caso (porque houve recurso para a Relação, não se tratando de recurso direto do acórdão da 1ª instância) a situação prevista no art. 432.º, n.º 1, al. c), do CPP, para os recorrentes poderem invocar os fundamentos previstos no art. 410.º, n.º 2 e n.º 3, do CPP. Daí que, também por esta via, não pudessem pôr em crise a decisão sobre a matéria de facto dada como provada no acórdão da Relação sob recurso. E, mesmo podendo este Supremo Tribunal conhecer oficiosamente dos fundamentos previstos no art. 410.º, n.º 2 n.º 3 do CPP, sempre se adiantará, que lido e relido o texto da decisão recorrida, para além dos factos apurados permitirem proferir uma decisão (o que mostra a sua suficiência), não se deteta qualquer contradição entre a fundamentação e a decisão (sem prejuízo das correções de lapso material e do erro de direito que adiante se irá fazer, não foi exposto qualquer raciocínio ilógico ou contraditório na fundamentação de facto que apontasse para decisão contrária à da condenação dos arguidos/demandados/recorrentes), sendo certo que a avaliação feita pelo Tribunal da Relação na parte aqui em apreciação não contraria as regras da experiência comum e tão pouco evidencia qualquer erro relevante de que o homem médio facilmente se desse conta. Assim, não ocorrendo qualquer dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2, do CPP, nem qualquer nulidade de conhecimento oficioso, podemos concluir que está definitivamente fixada a decisão sobre a matéria de facto constante da decisão sob recurso. Ademais, no recurso interposto apresentado pelos recorrentes JJ e II, estes pretendem, ainda, impugnar os factos considerados provados por entenderem que, de acordo com a prova produzida, não se poderia concluir que os valores a que o acórdão recorrido condenou os Recorrentes se tenham ficado a dever à sua conduta enganosa. Sucede que, conforme se referiu, também a questão referente à prova dos prejuízos – inclusivamente as alegações relativas à alegada interrupção do nexo causal – respeitam, apenas, à decisão sobre a matéria de facto e sua fundamentação. Nesta medida, trata-se, meramente, de uma discordância acerca da apreciação da prova, entre as duas instâncias, que não compete, a este Tribunal, indagar, por não se integrar na exceção prevista no referido artigo 722.º, n.º 3 do Código de Processo Civil. E, porque se trata ainda de uma questão de prova, como acima se explicou (e foi assim que foi entendido pela Relação, e bem, ao contrário do que alegam os recorrentes), está vedado ao STJ a sua sindicância, tendo em atenção os seus poderes de cognição (cf. art. 434.º do CPP). Assim, em face do exposto, improcede o alegado pelos recorrentes. 4. Da condenação por valor superior ao pedido de indemnização civil Ademais, os recorrentes invocam, ainda, a nulidade do acórdão proferido pela Relação, uma vez que a condenação é superior ao que havia sido peticionado em sede de pedido de indemnização civil. Ora, compulsado o pedido de indemnização cível apresentado pelas demandantes civis verifica-se que as mesmas assentam o seu petitório na existência de danos patrimoniais, subdividindo os mesmos por referência a cada um dos processos, nos termos seguintes: i. AF7 Nesta sede, alega a demandante FCG, no seu pedido de indemnização civil, para além dos demais factos de onde decorre a prática de um facto voluntário ilícito e culposo (correspondente à prática do ilícito criminal imputado a cada um dos arguidos e em consonância com os termos da acusação pública) que: «[…] caso soubessem que a Arguida e a Demandada EE não habitava no local, nem mesmo nas deslocações que fazia a Portugal, a parceria FCG/UMP nunca teria aceitado executar e financiar a obra nem alterar o respetivo projeto e apetrechamento de material. Obra essa que foi adjudicada à sociedade L.., Unipessoal, Lda, estando em causa o valor global de € 85.697,07 (oitenta e cinco mil seiscentos e noventa e sete euros e sete cêntimos ) o qual inclui obras, projeto e apetrechamento. Deste valor global, a FCG suportou 50%, i.e. € 42.485,35 (quarenta e dois mil quatrocentos e oitenta e cinco euros e trinta e cinco cêntimos) que lhe são devidos).» ii. PO5 À semelhança da alegação efetuada nos termos explicitados no processo AF7, no que respeita à quantificação dos danos no processo PO5, alega a demandante FCG o seguinte: «A Câmara Municipal de ... sugeriu que a obra fosse financiada pela parceria FCG/UMP, que só a aceitaram, na sequência de reuniões com diversas entidades e em virtude de ter sido validada pela Comissão Técnica do Fundo REVITA em consequência da confirmação, por parte da autarquia, de que se tratava de uma habitação própria e permanente. Significa isto que, fosse a parceria FCG/UMP conhecedora da verdadeira situação subjacente à candidatura, nunca teria aceitado financiar e executar as obras de revitalização que vieram a ser adjudicadas à sociedade C..., estando em causa o valor global de € 131.096,35 (cento e trinta e um mil e noventa e seis euros e trinta e cinco cêntimos) o qual inclui obras, trabalhos a mais, projeto e apetrechamento. Deste valor global, a FCG suportou € 55.643,13 (cinquenta e cinco mil seiscentos e quarenta e três euros e treze cêntimos) que lhe são devidos.» iii. VZ4 Finalmente, no que respeita ao processo VZ4, relativamente à quantificação dos danos causados pelas condutas dos arguidos, alega a FCG, no seu pedido de indemnização civil que: «A obra em que se materializou o apoio indevido foi adjudicada à sociedade Construções...", estando em causa o valor global de € 182.942,24 (cento e oitenta e dois mil novecentos e quarenta e dois euros e vinte e quatro cêntimos) o qual inclui obras e apetrechamento. Deste valor global, a FCG suportou 50%, i.e. € 91.471,23 (noventa e um mil quatrocentos e setenta e um euros e vinte e três cêntimos que lhe são devidos.» A referida demandante cível termina, assim, a sua peça processual peticionando: «Nestes termos, a Demandante requer que o Pedido de Indemnização Civil seja julgado procedente, por provado, e, consequentemente, que os Demandados (Arguidos acima identificados) sejam condenados a pagar à Demandante uma indemnização nos seguintes termos: (i) os Arguidos FF e GG solidariamente no pagamento de € 482.848,35 (quatrocentos e oitenta e dois mil, oitocentos e quarenta e oito euros e trinta e cinco cêntimos) acrescidos de juros à taxa legal devidos desde a produção do dano até efetivo e integral pagamento por referência aos processos REVITA AF7, PO5, VZ4, AT4 e MS10; (ii) as Arguidas EE e AA solidariamente no pagamento de € 85.697,07 (oitenta e cinco mil, seiscentos e noventa e sete euros e sete cêntimos) acrescidos de juros à taxa legal devidos desde a produção do dano até efetivo e integral pagamento por referência ao processo REVITA AF7; (iii) os Arguidos HH e BB solidariamente no pagamento de € 131.096,35 (cento e trinta e um mil e noventa e seis euros e trinta e cinco cêntimos) acrescidos de juros à taxa legal devidos desde a produção do dano até efetivo e integral pagamento por referência ao processo REVITA PO5; (iv) os Arguidos JJ e II solidariamente no pagamento de € 182.942,24 (cento e oitenta e dois mil, novecentos e quarenta e dois euros e vinte e quatro cêntimos), acrescidos de juros à taxa legal devidos desde a produção do dano até efetivo e integral pagamento por referência ao processo REVITA VZ4; […] (vil) todos os Demandados ainda pelos danos ainda em produção, os quais terão de ser liquidados em sede de execução de sentença.» Por sua vez, a Demandante UMP, no pedido de indemnização civil apresentado, refere que: «46. No âmbito da concessão do apoio foram gastos pela requerente, até ao presente, os seguintes valores, que integraram ilicitamente o património dos demandados através da conduta que a acusação descreve:
47. Esses valores integram o dano causado por cada um dos demandados no que se refere à habitação de que são titulares e para a qual obtiveram indevido apoio financeiro, pelo que deverão responder no que a essa parte respeita [como se verá em regime de solidariedade]. 48. A conduta dos demandados FF e GG possibilitou que a conduta de cada um dos demandados fosse possível em termos de gerar o dano que causaram, pelo que aqueles acusados deverão responder, em regime de solidariedade, pela totalidade do dano. 49. Há danos ainda em produção, que terão de ser liquidados em oportuno momento processual, em sede de execução de sentença.» Verifica-se, assim, que ambas as demandantes civis foram absolutamente claras, tendo dirigido um pedido líquido e concreto, por referência a cada um dos processos, sendo que, relativamente aos arguidos FF e GG, foi-lhes também dirigido um pedido líquido, muito embora o mesmo se referisse à soma de todos aqueles valores relativos a cada um dos processos concretamente considerados. Todavia, para além dos referidos pedidos líquidos que foram apresentados, as demandantes civis referem, ainda, que devem os recorrentes, aqui demandados civis, ser condenados no pagamento dos «danos ainda em produção, os quais terão de ser liquidados em sede de execução de sentença». Ora, a 1.ª instância, no acórdão proferido, julgou parcialmente procedentes os pedidos líquidos formulados e deu como não provado que existissem ainda danos em produção. Por sua vez, o Tribunal da Relação de Coimbra debruçou-se, também, sobre os pressupostos que fundamentavam os referidos pedidos, tendo concluído pela condenação dos arguidos nos seguintes termos: «Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, a quantia de 17.275,05 €, e por isso condenar os arguidos/demandados EE, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia de € 43.363,05 (quarenta e três mil, trezentos e sessenta e três euros e 5 cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento; ii) Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, a quantia 250,08 €, assim como, em consequência da rectificação do erro material de cálculo quanto aos valores constantes dos documentos indicados no facto provado 316, condenar os arguidos/demandados HH, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de 150.863,00 € (cento e cinquenta mil, oitocentos e sessenta e três euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento. iii) Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG no âmbito do Processo VZ4 Revita suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, as quantias de 6.268,92 €, de 18.461,30 €, de 18.596,20 € e de 30.321,70 €., e condenar os arguidos/demandados JJ, II, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de € 147.686,89 (cento e quarenta e sete mil, seiscentos e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento.» Os recorrentes invocam, então, a nulidade do acórdão, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Civil, por ter condenado as demandantes em valor superior ao pedido. Ora, o princípio do dispositivo, contemplado no artigo 5.º do Código de Processo Civil, atribui às partes a disponibilidade acerca do objeto do litígio, comportando um limite máximo ao conhecimento do Tribunal e à possibilidade de este condenar em quantidade superior ou objeto diverso ao do pedido15. Como tal, dispõe o artigo 552.º, n.º 1, alínea d) e e) do Código de Processo Civil, relativamente à petição inicial, que deve o autor expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à ação, bem como formular o pedido. «O pedido é, grosso modo, o efeito que o autor ou sujeito processual equiparado pretende obter com a acção ou a reconvenção ou a enunciação da tutela jurisdicional que visam obter por via judicial (artigo 498º, nº 3, do Código de Processo Civil). É um corolário do princípio do dispositivo, por via do qual se pretende significar que as partes dispõem em regra do processo e da relação jurídica controvertida»16. Assim, na ação cível, o autor deverá formular o pedido ou pedidos pretendidos, «(…) o qual se apresenta duplamente determinado: por um lado, o autor afirma ou nega uma situação jurídica subjetiva, ou um facto jurídico, de direito material, ou manifesta a sua vontade de constituir uma situação jurídica nova com base num direito potestativo; por outro lado, requer ao tribunal a providência processual adequada à tutela do seu interesse (…). O pedido do autor, conformando o objeto do processo, condiciona o conteúdo da decisão de mérito, com que o tribunal lhe responderá: o juiz, na sentença (…).»17. Nesta medida, o artigo 609.º do Código de Processo Civil estabelece os limites da condenação, prevendo, no seu n.º 1, que «[a] sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir». Em conformidade, caso o Tribunal ultrapasse o valor do pedido, a decisão enferma da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Civil, que estabelece que “[é] nula a sentença quando (…) o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido”. Compulsados os pedidos formulados, temos, assim, por verificados os seguintes limites objetivos, por referência a cada um dos processos concretamente considerados aqui em causa18: - AF7 - € 85.697,09 - PO5 - € 131.096,35 - VZ4 - € 182.942,24 Por sua vez, foram as seguintes as condenações efetuadas pelo Tribunal da Relação de Coimbra: - AF7 - € 43.363,05 - PO5 - € 150.863,00 - VZ4 - € 147.686,89 Verifica-se, assim, de modo manifesto, que, no âmbito do processo PO5, o montante em que os demandados civis foram condenados excedeu, em € 19.766,65, o valor do pedido inicialmente apresentado por cada uma das demandantes civis. Ora, da fundamentação adotada pelo acórdão do Tribunal da Relação, decorre que esse aresto considerou que podiam ser tidos em consideração valores acima daqueles que constavam da acusação, desde que resultassem dos elementos probatórios constantes dos autos, uma vez que as demandantes haviam alegado a existência de tais prejuízos superiores. É certo que, como se referiu, a par dos pedidos líquidos deduzidos, as demandantes apresentam um pedido genérico: «danos ainda em produção, os quais terão de ser liquidados em sede de execução de sentença» (que como vimos acima a 1ª instância julgou improcedente). No que respeita à possibilidade de deduzir pedidos genéricos, estabelece o artigo 566.º, n.º 1 do Código de Processo Civil que: «É permitido formular pedidos genéricos nos casos seguintes: a) Quando o objeto mediato da ação seja uma universalidade, de facto ou de direito; b) Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil; c) Quando a fixação do quantitativo esteja dependente de prestação de contas ou de outro ato que deva ser praticado pelo réu.» Sucede, contudo, que os valores tidos em consideração pelo Tribunal da Relação relativamente ao processo PO5 referem-se a despesas que tiveram lugar em momento anterior ao da dedução do pedido de indemnização civil. Nesta medida, a utilidade económica do pedido não se encontrava dependente de mais nenhum outro elemento futuro, pois que, naquele momento, as demandantes civis já tinham a oportunidade de determinar de modo definitivo as consequências dos atos ilícitos de que foram alvo19. Assim sendo, tal pedido genérico, efetuado ao abrigo do disposto no artigo 566.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, não é legalmente admissível, porquanto todas as consequências do facto ilícito se encontravam já plenamente definidas. Por outro lado, como é bom de ver, a não ser na circunstância excecional de ser permitida a formulação de um pedido genérico, não basta a mera alegação genérica no sentido de que foram provocados outros prejuízos superiores aos já invocados, sem que seja efetuada uma adequada quantificação monetária, para que tal alegação tenha relevância processual. Como tal, tendo sido proferida condenação dos demandados HH, FF e GG em quantidade superior ao que havia sido peticionado em sede de pedido de indemnização civil, o acórdão recorrido ultrapassou os limites do pedido, assim o excedendo. Assim, a Relação ao decidir nos termos em que o fez – ultrapassando os referidos limites do pedido – erra de direito, pois que tal decisão constitui uma efetiva violação do princípio do pedido, conforme, aliás, é invocado, pelos recorrentes. Ademais, a mesma representa, ainda, uma decisão surpresa, sendo, como tal, prejudicial aos direitos de defesa dos recorrentes/demandados. Em consequência, julga-se verificada a invocada nulidade do acórdão a quo, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea e) do Código de Processo Civil, impondo-se restringir a condenação proferida ao pedido deduzido, o que se efetuará a final. Fica, nessa medida definida a responsabilidade civil pelos danos resultantes da respetiva conduta criminosa dos arguidos/demandados HH, FF e GG (portanto, relativamente ao processo PO5, limitado ao montante de 131.096,35€). Procedem, pois, nesta parte, conforme o acima indicado, os recursos dos demandados FF e GG. 5. Do erro de cálculo Invocam, ainda, os recorrentes GG, JJ e II, a existência de um erro de cálculo no que respeita ao processo VZ4, sendo que o valor em dívida seria € 143.683,48 e não € 147.686,89. Preceitua o artigo 380.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal que “o tribunal procede, oficiosamente ou a requerimento, à correcção da sentença quando a sentença contiver erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial” e, no n.º 2, que “se já tiver subido recurso da sentença, a correcção é feita, quando possível, pelo tribunal competente para conhecer o recurso”. Ora, face aos valores constantes da factualidade, é manifesto que estamos perante um erro de cálculo20, que poderá ser corrigido nos termos do referido normativo legal, sem que importe modificação essencial, atendendo a que é o que resulta do texto do acórdão e dos factos provados. Desta forma, afigura-se ser de retificar o texto do acórdão recorrido, na página 567, pelo que onde se lê «a quantia de € 147.686,89 (cento e quarenta e sete mil seiscentos e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos)» deve ler-se «a quantia de € 143.683,48 (cento e quarenta e três mil, seiscentos e oitenta e três euros e quarenta e oito cêntimos)». Em consequência, retifica-se igualmente o dispositivo do acórdão recorrido nos seguintes termos: Onde se lê: « iii) Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG no âmbito do Processo VZ4 Revita suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, as quantias de 6.268,92 €, de 18.461,30 €, de 18.596,20 € e de 30.321,70 €., e condenar os arguidos/demandados JJ, II, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de € 147.686,89 (cento e quarenta e sete mil, seiscentos e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento.» Deve ler-se: «iii) Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG no âmbito do Processo VZ4 Revita suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, as quantias de 6.268,92 €, de 18.461,30 €, de 18.596,20 € e de 30.321,70 €., e condenar os arguidos/demandados JJ, II, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de € 143.683,48 (cento e quarenta e três mil, seiscentos e oitenta e três euros e quarenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento». Com a retificação efetuada, fica nessa medida (portanto, relativamente ao processo VZ4, limitado ao montante de € 143.683,48) definida a responsabilidade civil pelos danos resultantes da respetiva conduta criminosa apurada dos arguidos/demandados (aqui também recorrentes) FF, GG, JJ e II. Procede, pois, nesta parte o pedido de correção do erro material de cálculo formulado pelos recorrentes GG, JJ e II. 6. Da solidariedade da condenação Finalmente, insurgem-se, ainda, os recorrentes FF e GG relativamente à circunstância de terem sido condenados ao pagamento da indemnização civil em regime de solidariedade com os demais arguidos. Entendem que tal é violador do princípio da igualdade, por resultar provado que não foram retiradas vantagens económicas da sua atuação, sendo que as casas – reconstruídas – foram entregues aos seus proprietários, sendo os respetivos titulares os verdadeiros e únicos beneficiários dos fundos nelas aplicados. Ora, dispõe o artigo 129.º do Código Penal que «[a] indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil.» Por sua vez, o artigo 483.º, n.º 1 do Código Civil estabelece que «[a]quele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação». In casu, consideraram-se verificados todos os pressupostos da responsabilidade civil contidos no art. 483.º, n.º 1, do Código Civil, a saber: i. a existência de um facto (voluntário) do lesante; ii. a ilicitude do facto; iii. o nexo de imputação do facto ao lesante; iv. a existência de dano; v. e o nexo de causalidade entre o facto e o dano21. A causa de pedir do pedido cível enxertado na ação penal, assenta nos respetivos crimes imputados aos arguidos. Daí serem os recorrentes/arguidos/demandados responsáveis pelo pagamento dos prejuízos causados. Ou seja, a responsabilidade civil extracontratual decorre da prática de determinados factos ilícitos e culposos. Como foi explicado na decisão recorrida, verificam-se todos os pressupostos da responsabilidade civil. Efetivamente, tendo em conta o factualismo dado como provado, ficou demonstrada a existência do facto ilícito e culposo praticado (no que aqui interessa) pelos recorrentes, a existência de danos patrimoniais sofridos pelos demandantes civis, bem como o nexo de causalidade entre o facto ilícito cometido pelos lesantes e os danos sofridos pelas lesadas (art. 563.º, n.º 1, do Código Civil). Todavia, como se viu, não há apenas uma pessoa responsável pelo prejuízo verificado. Ora, nestes casos, prevê o artigo 497.º do Código Civil que: «1. Se forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade. 2. O direito de regresso entre os responsáveis existe na medida das respectivas culpas e das consequências que delas advieram, presumindo-se iguais as culpas das pessoas responsáveis.» Em decorrência do referido normativo, foram os demandados FF e GG condenados ao pagamento solidário dos valores em dívida, a par dos coarguidos proprietários das casas reconstruídas. Tal condenação é absolutamente alheia aos benefícios económicos que tenham, ou não, advindo para estes demandados, decorrendo apenas do facto de serem civilmente responsáveis pela ocorrência de um dano. Tendo dado causa ao mesmo, através da sua participação na prática de um crime, facto voluntário que levaram a cabo, os mesmos terão, necessariamente, de ser responsabilizados pelo prejuízo que ocasionaram, independentemente de não terem obtido qualquer benefício ou vantagem. Deste modo, e nos termos do citado artigo 497.º, n.º 1 do Código Civil, os demandados são solidariamente responsáveis com os demais arguidos, perante os lesados, pela totalidade da indemnização, com vista a corrigir os prejuízos a que deram causa, inexistindo qualquer fundamento que sustente uma eventual limitação da sua responsabilidade a qualquer parcela da indemnização22. Ademais, não será, também, de proceder, a alegação de que uma condenação nestes termos viola o princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa que dispõe que: «1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. 2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.» De facto, não se vislumbra em que medida a condenação solidária dos demandados poderá ser ofensiva do referido princípio, em decorrência da circunstância de os demais coarguidos terem tido um determinado benefício com a prática do crime – a reconstrução das suas casas – e os demandados FF e GG não, porquanto, como já se referiu, a pretensão indemnizatória e a sua responsabilidade visa corrigir o prejuízo motivado pela prática de um facto ilícito, não se traduzindo a condenação solidária em qualquer tipo de discriminação entre os vários responsáveis pelo mesmo. Ademais, sempre se refira que, em sede de direito de regresso, conforme se encontra previsto no n.º 2 do artigo 497.º do Código Civil, sempre os responsáveis, nomeadamente os aqui recorrentes, poderão exigir o pagamento, entre si, na medida das respetivas culpas e das consequências que delas advierem. Assim, improcede toda a argumentação dos recorrentes FF e GG nesta matéria, não havendo qualquer interpretação inconstitucional do art. 497.º, n.º 1, do Código Civil. Em conclusão: sem prejuízo do acima decidido, incluindo correção efetuada, no mais julgam-se improcedentes os recursos ora em apreciação, sendo certo que não foram violadas as demais normas e/ou princípios invocados pelos recorrentes, designadamente, nas vertentes genéricas, conclusivas e abstratas por eles assinaladas, nem se deteta que tivessem sido feitas eventuais interpretações inconstitucionais, nomeadamente do art. 32.º, n.º 1, da CRP que, na matéria cível aqui em apreciação, nem é aplicável. Decisão IV. Pelo exposto, acordam nesta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça, em: a) Conceder parcial provimento aos recursos de GG, JJ e II e, consequentemente, retificar o acórdão recorrido: - na página 567, onde se lê «a quantia de € 147.686,89 (cento e quarenta e sete mil seiscentos e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos)» deve ler-se «a quantia de € 143.683,48 (cento e quarenta e três mil, seiscentos e oitenta e três euros e quarenta e oito cêntimos)»; - no dispositivo, onde se lê: « iii) Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG no âmbito do Processo VZ4 Revita suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, as quantias de 6.268,92 €, de 18.461,30 €, de 18.596,20 € e de 30.321,70 €., e condenar os arguidos/demandados JJ, II, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de € 147.686,89 (cento e quarenta e sete mil, seiscentos e oitenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento.» Deve ler-se: «iii) Considerar que se provou que a parceria UMP/FCG no âmbito do Processo VZ4 Revita suportou, adicionalmente ao que já resultava provado, as quantias de 6.268,92 €, de 18.461,30 €, de 18.596,20 € e de 30.321,70 €., e condenar os arguidos/demandados JJ, II, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de € 143.683,48 (cento e quarenta e três mil, seiscentos e oitenta e três euros e quarenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento». b) Conceder parcial provimento aos recursos de FF e GG e, em consequência, alterar o acórdão recorrido, condenando os arguidos/demandados HH, FF e GG a pagar à UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia total de 131.096,35 € (cento e trinta e um mil, noventa e seis euros e trinta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a notificação para contestar até integral pagamento; c) Negar provimento aos mesmos recursos interpostos pelos demandados civis, quanto ao mais pedido. d) Condenar os recorrentes, enquanto demandados civis, no pagamento das custas processuais respetivas, na proporção do respetivo decaimento (art. 523.º do CPP). * Processado em computador e elaborado e revisto integralmente pela Relatora (art. 94.º, n.º 2, do CPP), sendo assinado pela própria e pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos. * Supremo Tribunal de Justiça, 16.10.2024 Maria do Carmo Silva Dias (Relatora) António Augusto Manso (Adjunto) Horácio Correia Pinto (Adjunto) ______
1. Transcrição do dispositivo. 2. Ainda que no acórdão da Relação não figure o valor, no acórdão da 1ª instância então sob recurso, consta o valor de 182.548,23 €. 3. Os factos reproduzidos sob os números 269 a 352 figuravam já no acórdão da 1ª instância e os indicados sob as letras A a C foram aditados pelo Tribunal da Relação de Coimbra no acórdão sob recurso. 4. Nos termos do artigo 44.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, a alçada dos tribunais de 1.ª instância é de € 5.000,00, sendo a da Relação de € 30.000,00. 5. Neste sentido, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15 de fevereiro de 2023, processo n.º 38/17.9YGLSB.S1, relatado pela Conselheira Ana Barata Brito, onde se pode ler que «[n]ão interessa conhecer da nulidade como se de um exercício académico se tratasse, quando o tribunal que julga o recurso da matéria de facto, porque em contacto com as provas, pode superar as deficiências de fundamentação, confirmando a boa decisão (de fundo) apesar de eventuais deficiências (de forma). Ou procedendo à correcção da matéria de facto, quando for caso disso. Esta oportunidade esvazia as valências da nulidade de sentença decorrente de um menos perfeito exame crítico da prova (arts 379.º, n.º 1, al. a) e 379.º, n.º 2, do CPP).», disponível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/c7dcd6bda2db075d80258994005a27e8?OpenDocument. 6. Neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de setembro de 2010, processo n.º 7208/05.0TBOER.E1.S1, relatado pelo Conselheiro Álvaro Rodrigues, cujo sumário se encontra disponível em disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-civel-2010.pdf. 7. Neste sentido, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26 de outubro de 2016, processo n.º 953/09.3TASTR.E2.S1, relatado pelo Conselheiro Pires da Graça, disponível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b1d351e68a305b41802580590052cd5f?OpenDocument. 8. Veja-se, para melhor compreensão: - por referência ao processo AF7, o facto n.º 288, onde se pode ler que: «288. Em 02.04.2018, 16.05.2018, 15.06.2018, 06.08.2018 e 30.08.2018 a "L.., Unipessoal, Lda Lda", emitiu as faturas nºs FAC 1/.50, 1/.55 1/.61, 1/.71, 1/..4, no valor total de 26.088€ (…)»; - por referência ao processo PO5, os factos n.os 315 e 316, onde se pode ler que: «315. A UMP/FCG decidiu adjudicar a obra à sociedade C..., pelo preço 80.809,97€ (fls. 117 Apenso 33); 316. A obra foi executada, sendo emitidas as faturas e autos de medição e efetuados os pagamentos pela UMP, por transferência bancária para o construtor, sendo a UMP posteriormente reembolsada em 50% pela FCG. (fls. 102 a 113; 198 e 199 do Apenso 33; 78 a 105 do Anexo XVI).» - por referência ao processo VZ4, o facto n.º 344, onde se pode ler que: «344. A obra foi parcialmente executada, sendo emitidas as faturas melhor descritas na listagem de fls. 121 do Apenso 30, no valor global de 70.035,36€, pago pela UMP, por transferência bancária efetuada para o construtor e fornecedor, sendo posteriormente reembolsada em 50% pela FCG. (fls. 121 a 124 e 126 a 144 e 167 a 170 do Apenso 30)» 9. O Tribunal da Relação altera a matéria factual, nos seguintes termos: «1) Quanto ao processo REVITA AF7, a UMP e a FCG suportaram ainda as quantias constantes dos documentos de Fls. 120, 121, 122, 123, 124, 125 do Anexo XVI, no valor total de 17.275,05 €, pelo que, atento o demais já considerado provado, suportaram um total de € 43.363,05. Serão assim os arguidos/demandados EE, FF e GG condenados a pagar à parceria UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia de € 43.363,05 (quarenta e três mil trezentos e sessenta e três euros e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados da notificação para contestar o pedido de indemnização civil até integral pagamento (e não apenas 26.088,00 € como constava da decisão recorrida, mas também não a quantia de 85.697,09 € como se pretendia nos pedidos de indemnização civil) 2) Quanto ao processo REVITA PO5, resultando deste recurso que a UMP e a FCG suportaram ainda a quantia 250,08 € constante da fatura junta a fls. 138 do Apenso 30, e rectificando ainda o erro de cálculo quanto aos valores constantes dos documentos indicados no facto provado 316), apura-se o valor total de 150.863,00 €. Serão assim os arguidos/demandados HH, FF e GG condenados a pagar à parceria UMP/FCG, a título de danos patrimoniais causados, e de forma solidária, a quantia de € 150.863,00 € (cento e cinquenta mil oitocentos e sessenta e três euros), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados da notificação para contestar até integral pagamento. 3. Quanto ao processo REVITA VZ4, a UMP e a FCG, suportaram ainda as quantias constantes das faturas e comprovativos de pagamento constantes de fls. 125 do Apenso 30 no valor de 6.268,92 €; de fls. 120, 121 do Anexo XVI no valor de 18.461,30 €, fls. 122, 123 do Anexo XVI no valor de 18.596,20 €, de fls. 124, 125 ainda do Anexo XVI no valor de 30.321,70 €.»↩︎ 10. Neste sentido, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de fevereiro de 2018, processo n.º 633/15.1T8VCT.G1.S1, relatado pela Conselheira Maria da Graça Trigo, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-civel-2018.pdf. 11. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de fevereiro de 2018, processo n.º 633/15.1T8VCT.G1.S1, relatado pela Conselheira Maria da Graça Trigo, cujo sumário se encontra disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-civel-2018.pdf. 12. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de abril de 2013, processo n.º 1911/07.8TBVFR.P1.S1, relatado pela Conselheira Ana Paula Boularot, cujo sumário se encontra disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-civel-2013.pdf 13. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 3 de fevereiro de 2011, processo n.º 320/1999.P1.S1, relatado pelo Conselheiro Bettencourt de Faria, cujo sumário se encontra disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-civel-2011.pdf. 14. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de abril de 2019, processo n.º 4148/16.1T8BRG.G1.S1, relatado pelo Conselheiro Fernando Samões, disponível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/5fc6db620f8545b9802583d7004e9b5e?OpenDocument. 15. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de março de 2018, processo n.º 1054/11.0TJVNF.G1.S1, relatado pela Conselheira Fernanda Pereira, cujo sumário se encontra disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-civel-2018.pdf. 16. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de abril de 2005, processo n.º 05B942, relatado pelo Conselheiro Salvador da Costa, disponível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/acce0304c67bcbe08025703d005c27cb?OpenDocument. 17. Freitas, José Lebre de, e Alexandre, Isabel, “Código de Processo Civil Anotado”, Almedina, 4.ª edição, Volume 2.º, página 490. 18. In casu, uma vez que se trata de vários factos ilícitos, o valor relevante para este efeito será o das várias parcelas concretamente consideradas e não o valor total. V. o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de abril de 2013, processo n.º 1718/02.9JDLSB.L1-B.S1, relatado pelo Conselheiro Santos Cabral, onde se pode ler, em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-criminal-2013.pdf, que: «II - Os limites da condenação contidos no art. 661.º, n.º 1, do CPC, têm de ser entendidos como referidos ao valor do pedido global e não às parcelas em que aquele valor se desdobra. III - Este entendimento, porém, tem como pressuposto a existência de um único facto ilícito. IV - Quando os factos ilícitos são totalmente autónomos entre si, a obrigação de indemnizar equaciona-se autonomamente em relação a cada um dos mesmos, pelo que não é admissível considerar como integrante do limite indemnizatório uma parcela relativa a factos ilícitos que não se provaram.» 19. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31 de janeiro de 2019, processo n.º 21190/16.5T8LSB-B.L1-A.S1, relatado pelo Conselheiro Bernardo Domingos, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-civel-2019.pdf 20. € 70.035,36 + 6.268,92 + € 18.461,30 + € 18.596,20 + € 30.321,70 = € 143.683,48. 21. Cf. Antunes Varela e Pires de Lima, Código Civil Anotado, I vol., 4ª ed., Coimbra Editora, 1987, p. 471. 22. Neste sentido, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 4 de julho de 2018, processo n.º 816/09.2IDLSB.L3.S1, relatado pelo Conselheiro Manuel Braz, com o sumário disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2024/06/sumarios-criminal-2018.pdf |