Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
9192/18.1T8LSB-A.L1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: LEONEL SERÔDIO
Descritores: RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DUPLA CONFORME
FUNDAMENTAÇÃO ESSENCIALMENTE DIFERENTE
REQUISITOS
INADMISSIBILIDADE
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Data do Acordão: 05/29/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: RECLAMAÇÃO INDEFERIDA.
Sumário :

A fundamentação do acórdão que confirma, por unanimidade, a sentença do tribunal de 1ª instância, apenas tem fundamentação essencialmente diferente, para efeitos do disposto no artigo 671º n.º 3 do CPC, quando a fundamentação da Relação tenha assentado, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam fundamentado e justificado a sentença da 1ª instância, sendo irrelevantes para esse efeito, discrepâncias marginais e secundárias e o reforço argumentativo levado a cabo pela Relação para fundamentar a mesma solução alcançada na sentença apelada.

Decisão Texto Integral:

Processo: 9192/18.1T8LSB-A.L1


Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça


AA interpôs, por apenso aos autos de execução de sentença para pagamento de quantia certa, a presente oposição à execução contra o Fundo de Garantia Automóvel, pedindo que se declare ter havido falta ou nulidade da citação do réu, ora embargante, na ação declarativa que subjaz a presente execução, procedendo- se, consequentemente, a anulação de todo o processado naqueloutra ação desde essa citação.


Para tanto, alegou, em síntese, a nulidade da citação efetuada no âmbito da ação declarativa, na qual foi prolatada a sentença que constitui o título executivo da presente execução, por se ter empregado indevidamente a citação edital.


O Exequente contestou impugnando a generalidade dos factos alegados pelo opoente, defendendo que o mesmo se mostra regularmente citado para os termos da ação onde se formou o título executivo.


A oposição à execução prosseguiu os seus termos e após realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença, em 13.02.2023, que julgou a presente oposição improcedente e, em consequência, determinou o prosseguimento da execução.


O Embargante apelou e por acórdão proferido em 14.12.2023, pelo Tribunal da Relação de Lisboa, sem voto de vencido, a apelação foi julgada improcedente e confirmada a sentença recorrida.


O Embargante interpôs recurso de revista e, para a hipótese, de se entender, haver dupla conforme, revista excecional, apresentando, quanto à admissibilidade da revista ordinária, as seguintes conclusões:


“1- A fundamentação dada pela 1.ª instância limita-se a fazer meras referências às normas legais aplicáveis, adiantando que a citação edital respeitou o texto legal, mas sem dar qualquer explicação para isso.


2- A Relação faz uso de uma presunção judicial, ou seja, sendo certo que se provou que o recorrente, que foi réu/ora, recorrente nos autos de processo de declaração onde foi condenado à revelia, habita num “5.º E” de determinada localidade, o julgador concluiu que “5.º E” ou “5.º Esq” se trata da mesma fração habitacional.


3- Adianta o acórdão a quo que o significado de uma ou outra das anteditas designações é o mesmo.


4- Salvo o devido respeito, esta conclusão, que se traduz numa verdadeira presunção judicial, não é acertada, sendo certo que a frustração da citação pessoal do recorrente, para efeitos da ação declarativa, se deve à confusão feita no processo declarativo no que se reporta ao local de residência do réu/ora, recorrente.


5- Apesar do acórdão recorrido concordar com a decisão da 1.ª instância, uma vez que a aludida presunção adita um outro fundamento jurídico que não foi anteriormente considerado, cremos que se verifica o requisito de recorribilidade, “fundamentação essencialmente diferente”, que permite ao ora, recorrente sindicar o acórdão recorrido no STJ, como revista normal.


6- À cautela, se se entender que há dupla conforme nas decisões proferidas pelas instâncias, deve o vertente recurso ser admitido a título de revista excecional, pois parece-nos que a apreciação do mesmo é necessária “para uma melhor aplicação do direito” porque não se conhece qualquer tratamento jurisprudencial sobre a questão versada, onde para efeitos de regularidade da citação edital o acórdão recorrido considerou que é indiferente identificar a porta onde o recorrente reside, como “5.º E” ou como “5.º Esq.”.


7- Consideramos que esta decisão/conclusão/presunção judicial é, no mínimo, controversa e (com o devido respeito) não faz qualquer sentido, e a sua apreciação servirá de “farol” para semelhantes situações que poderão levar, ou não, ao recurso à citação edital.


(…)


Não foram apresentadas contra-alegações.


Por despacho do relator de 17.04.2024 não foi admitida a revista ordinária, por ter o acórdão recorrido sido proferido sem voto vencido e haver dupla conforme (artigo 671 nº 3, do CPC), tendo-se determinado a remessa dos autos à Formação, para apreciação da admissibilidade da revista excecional, como requer o Recorrente, nos termos e para os efeitos do artigo 672º nº 3 do CPC.


O Recorrente inconformado com esta decisão que não admitiu a revista ordinária, vem reclamar para a conferência, nos termos do artigo 652º n.º 3 do CPC, ex vi artigo 679º do mesmo diploma, apresentando as seguintes conclusões que se transcrevem:


“A. A decisão sob reclamação considerou que em ambas as instâncias, 1.ª e 2.ª, se decidiu, em síntese, que da factualidade julgada provada, foram observadas as diligências previstas nos art.ºs 236.º, 240.º e 241.º do Cód. de Proc. Civil, e que o acórdão recorrido apenas aprofundou a fundamentação e aditou argumentos não considerados na sentença da 1.ª instância, que não obsta à verificação da existência da dupla conforme, impeditiva do recurso de revista normal.


B. Ex adverso, salvo melhor opinião, entendemos que a fundamentação dada pela 1.ª instância se limita a fazer meras referências às normas legais aplicáveis, ao adiantar que a citação edital respeitou o texto legal, mas sem dar qualquer explicação para isso.


C. Já a Relação faz uso de uma presunção judicial, ou seja, sendo certo que se provou que o recorrente, que foi réu/ora, reclamante, nos autos de processo de declaração onde foi condenado à revelia, habita num “5.º E” de determinada localidade, o julgador concluiu que “5.º E” ou “5.º Esq” se trata da mesma fração habitacional.


D. Adianta o acórdão a quo que o significado de uma ou outra das anteditas designações é o mesmo.


E. Salvo o devido respeito, esta conclusão, que se traduz numa verdadeira presunção judicial, não é acertada, sendo certo que a frustração da citação pessoal do réu/ora, reclamante, para efeitos da ação declarativa, se deve à confusão feita nesse processo no que se reporta ao local de residência do réu/reclamante.


F. Apesar do acórdão recorrido concordar com a decisão da 1.ª instância, uma vez que a aludida presunção adita um outro fundamento jurídico que não foi anteriormente considerado, cremos que se verifica o requisito de recorribilidade, “fundamentação essencialmente diferente”, que permite ao ora, reclamante sindicar o acórdão recorrido no STJ, como revista normal, sob pena de não se encontrar assegurado o duplo grau de jurisdição.


G. Na realidade, tal questão só em sede de recurso foi tratada e apreciada, pelo que não pode dizer-se que, quanto a ela, hajam sido proferidas duas decisões conformes e, muito menos, coincidentes. Na verdade, apenas a decisão a que se encontra no acórdão recorrido foi proferida a este propósito.


Termos em que deverá concluir-se pela admissibilidade do recurso de revista normal interposto do Ac. da Relação de Lisboa, nos termos e para os efeitos do art.º 671.º, n.ºs 1 e 3 (a contrario), do Cód. de Proc. Civil devendo, por isso, ser recebida e apreciada a presente reclamação nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 643.º do mesmo diploma.”


O Recorrido não respondeu.


Fundamentação


A questão a decidir é apenas a de saber se a fundamentação do acórdão recorrido é (ou não) essencialmente diferente da sentença confirmada, sem voto de vencido.


I) O despacho reclamado, na sua parte decisória, apresenta o seguinte teor:


Considerando ser entendimento pacífico que a fundamentação do acórdão que confirma, por unanimidade, a sentença do tribunal de 1ª instância, apenas tem fundamentação essencialmente diferente, quando a fundamentação da Relação tenha assentado, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam fundamentado e justificado a sentença da 1ª instância, sendo irrelevantes para esse efeito, discrepâncias marginais e secundárias e o mero reforço argumentativo levado a cabo pela Relação para fundamentar a mesma solução alcançada na sentença apelada, entende-se que, no caso presente, se verifica a dupla conforme ( cf. neste sentido, a título exemplificativo, o recente acórdão do STJ de 10.04.2024, processo n.º 476/10.9TJCBR-AE.C1-A.S1, relator Luís Espírito Santo e os vários nele citados).


Na verdade, as decisões da 1ª e 2ª instância, decidiram a questão da regularidade ou não da citação do Embargante, para os termos da ação declarativa onde foi proferida a sentença exequenda, especificamente se na ação declarativa se fez uso indevido da citação edital, tendo ambas decidido, em síntese, que da factualidade julgada provada que foram observadas as diligências previstas no artigo 236º do CPC e consequentemente não ter sido ilegalmente ordenada a citação edital, e ainda que a citação edital respeitou as formalidades legais, nos termos dos artigos 240º e 241º do CPC. concretamente na afixação do edital na porta da residência conhecida do Embargante.


A circunstância do acórdão recorrido ter aprofundado a fundamentação e aditado argumentos não considerados na sentença da 1ª instância, designadamente rebatendo a argumentação do Apelante quanto a ter havido incumprimento do artigo 240 n.º 2 do CPC, na fixação do edital, por alegadamente ser errada a identificação da residência do Embargante, tendo argumentado que, “em sentido comum, uma fração autónoma situada no «5º Esq.» ou no «5º E» de um prédio são a mesma e única fração autónoma” Diferente seria se, por absurdo, existissem de facto duas frações autónomas no mesmo prédio e andar, uma com a indicação de «Esq.» outra com a indicação de «E». Não é o caso, nem tal foi alegado,” não afasta estar-se perante fundamentação essencialmente coincidente nas duas instâncias.


Há, pois, dupla conforme (artigo 671 nº 3, do CPC) e tendo sido o acórdão proferido, sem voto de vencido, não é admissível, revista ordinária.


No entanto, verificando-se os requisitos gerais de admissibilidade da presente revista, quais sejam, a legitimidade de quem recorre (artigo 631º do CPC), ser a decisão proferida recorrível (artigos 671º n.º 1 e 854º do CPC ), ter sido o recurso interposto dentro do prazo legalmente estabelecido para o efeito (artigo 638º do CPC), ser admissível em função do valor da causa e da sucumbência (artigo 629º nº 1 do CPC), os autos serão remetidos à Formação, para apreciação da admissibilidade da revista excecional, como requer o Recorrente, nos termos e para os efeitos do artigo 672º nº 3 do CPC.”


II -O acórdão recorrido manteve a factualidade julgada provada na 1ª instância.


A fundamentação de direito da sentença da 1ª instância é a seguinte ( extratos relevantes):


“ A presente oposição tem como fundamento o disposto na alínea d) do art. 729.º do Código de Processo Civil, na redacção anterior à Lei n.º 117/2019, de 13 de Setembro, isto é, a “falta ou nulidade da citação para a acção declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo.” (…)


A omissão dos deveres de informação e entrega estabelecidos no art. 227.º do Código de Processo Civil, determina, em regra, a nulidade da citação, nos termos do art. 191.º, n.º 1 do mesmo código. (….)


Há, pois, nulidade da citação quando – apesar do conhecimento ou, pelo menos, da cognoscibilidade do acto pelo citando que actue com a diligência devida – não foram integralmente respeitadas, na sua realização, as formalidades prescritas na lei, designadamente, as estabelecidas no art. 227.º do Código de Processo Civil.


(…)


Nos termos do n.º 1 do art. 188.º do Código de Processo Civil, há falta de citação: (…)


c) Quando se tenha empregado indevidamente a citação edital;


Como se sustenta no acórdão da RL de 02.07.2013, proferido no âmbito do processo n.º 9838/08.0YYLSB.L1-A, “As causas de falta de citação, na prática, reconduzem-se a um único fundamento, isto é, à demonstração que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato, por facto que não lhe seja imputável, impendendo, sobre o citando o ónus de o invocar e demonstrar.”.


Como se viu, o uso indevido da citação edital integra umas das situações que a lei comina como falta de citação (art. 188.º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil).


E compreende-se que assim seja, dado que a “citação edital é um meio precário e contingente de chamar o réu a juízo para se defender” (Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, p.422). Sendo um meio menos garantístico de interpelação judicial do que a citação pessoal, foi intenção do legislador reduzir o mais possível a sua utilização, dada a elevada probabilidade de o réu não vir a ter conhecimento da citação, ou não ter conhecimento dela em tempo útil.


Daí que previamente à opção pela citação edital, se tenham de observar as diligências previstas no art. 236.º do Código de Processo Civil. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, p. 226) indicam algumas das situações em que ocorre uso indevido da citação edital: a) (…)d) Citação determinada sem que tenham sido efectuadas as diligências previstas no art. 236.º Acrescentam aqueles autores que “quando a citação edital tenha sido determinada pela verificação judicial de uma situação formal de ausência ou de incerteza justificada a partir dos elementos que foram recolhidos, não parece que possa considerar-se que tenha sido indevidamente seguida a citação edital. Quando o autor tenha prestado todas as informações por si detidas e quando o tribunal tenha cumprido todos os preceitos formais exigíveis perante o circunstancialismo concreto e, apesar disso, seja induzido a adquirir a errada convicção sobre a efetiva ausência ou incerteza dos citandos, não deve afirmar-se a nulidade correspondente à falta de citação.” (ob. e loc. cit.)


(…)


Prescreve o art. 236.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “Ausência do citando em parte incerta”, que: (…)


Conforme decorre do n.º 1, in fine do citado preceito, a obtenção de informação acerca do paradeiro do citando através de diligências a realizar pelas autoridades policiais, apenas deve ocorrer quando o juiz o considere absolutamente indispensável para decidir da citação edital (o mesmo regime já resultava do art. 244.º, n.º 1 do Código de Processo Civil de 1961).


E compreende-se tal restrição ao auxílio das autoridades policiais para obtenção de informação acerca do paradeiro do citando, dada a delicadeza desse género de intervenção, por estarmos no âmbito de direitos, liberdades e garantias constitucionalmente protegidos. Com efeito, tal intervenção só deve ocorrer quando o juiz o considere absolutamente indispensável, dependendo tal ponderação, portanto, de um juízo de absoluta necessidade de intervenção policial, perante as circunstâncias do caso concreto.


A realização de diligências junto da entidade policial depende da formulação de um juízo prévio de absoluta indispensabilidade, tendo em vista decidir se é caso de ordenar ou não a realização da citação edital.


Desta forma, não parece que a lei permita o pedido de auxílio às autoridades policiais de forma arbitrária, dado que tais entidades não têm no seu escopo a realização de investigações em que apenas se discutem interesses privados.


Quer isto dizer que se o juiz concluir pela desnecessidade do recurso às autoridades policiais para decidir da citação edital, tal como aconteceu no caso em apreço, essa decisão não pode acarretar a nulidade do acto.


Por outro lado, compulsados os autos declarativos, verifica-se que a citação edital respeitou integralmente a tramitação prevista no art. 236.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, porquanto, para além de se terem realizado as pesquisas nas bases de dados a que alude o citado preceito, a afixação dos editais decorreu com observância da tramitação prevista nos artigos 240.º e 241.º do mesmo código, pelo que não se verifica qualquer irregularidade na tramitação da citação edital.


No que concerne aos resultados obtidos nas bases de dados, ponderou-se no ac. da RE de 06.10.2016 (www.dgsi.pt), “Se nas autoridades e serviços indicados no art.º 236.º, n.º 1, Cód. Proc. Civil, não existe morada actualizada do réu, porque este nunca a actualizou nos diversos serviços, não é necessária a obtenção de informações junto da autoridade policial para se realizar a citação edital.”


Na verdade, repare-se que na data em que se procederam às pesquisas nas bases de dados do tribunal (em 2015), em três delas ainda constava como morada o réu a “Rua ...”, quando o próprio executado admite que residiu naquela morada até 1999.


Perante o exposto, não se pode concluir pela irregularidade da citação edital concretizada nos autos declarativos, o que determina a improcedência da presente oposição à execução, determinando-se o prosseguimento da execução.”


Por outro lado, a fundamentação do acórdão recorrido é, no essencial, a seguinte:


“Não vemos razão para discordar do acerto da decisão recorrida; senão, vejamos:


( …)


Invoca, em primeiro lugar, o embargante que:


o âmbito dos autos de acção declarativa, não foi ordenada a citação por funcionário judicial na sede da entidade patronal do réu, “P..., Lda”.


27. O embargante trabalha na firma “P..., Lda”, sita na Quinta de ..., desde 1993 até à presente data.


Apurou-se, a este respeito, que:


7. Na base de dados da Segurança Social foi ainda apurada que a entidade patronal do réu, “P..., Lda”, tem a sua sede na “Quinta de ...”.


14. Por requerimento datado de 18.11.2015, o autor Fundo de Garantia Automóvel requereu que se procedesse à citação do réu, na sociedade “P..., Lda, sita na Quinta ...”.


15. Em 23.11.2015 a secção de processos remeteu carta registada com aviso de recepção para citação do réu AA, para a morada sita em “P..., Lda, sita na Quinta ...”, carta que veio devolvida com a indicação de "Não reclamado".


16. Por requerimento datado de 15.12.2015, o autor Fundo de Garantia Automóvel requereu que se procedesse à citação do réu, na sociedade “P..., Lda, sita na Quinta ...”.


17. Em 16.12.2015 a secção de processos remeteu carta registada com aviso de recepção para citação do réu AA, para a morada sita em “P..., Lda, sita na Quinta ...”, carta que veio devolvida com a indicação de "Objecto não reclamado".


Do exposto, resulta que, apesar de se terem obtido duas moradas para a entidade patronal do executado, as cartas enviadas com vista à citação postal no local de trabalho, vieram ambas devolvidas, com a indicação de «objecto não reclamado».


Acresce que a morada constante da base de dados da Segurança Social não corresponde à morada que agora se apurou ser a do seu local de trabalho (os números de polícia são distintos), pelo que a diligência de citação por funcionário judicial ou agente de execução, sempre seria infrutífera.


Improcede, pois, esta argumentação.


Em segundo lugar, invoca o embargante que:


10- Ao indicar-se, na petição, como morada do réu uma morada inexistente e ao constar da carta de citação e do mandado de citação do réu/recorrente o mesmo 5.° Esq., em lugar do 5.° E, verificou-se um erro quanto a indicação de uma morada diversa da morada real do réu.


11- Este erro na morada real do réu inquina e contamina toda a ulterior marcha do processo, pois impediu que aí se fizesse a citação pessoal do réu, ora recorrente, por via postal ou por agente de execução, por causa que não lhe é imputável.


12- Deveria a Mma. Juiz dos autos declarativos subjacentes, antes de ordenar a citação edital do réu, aperceber-se deste lapso da secretaria e ordenar a repetição da carta para citação postal do réu, na sua verdadeira morada.


Ora, a este respeito, cumpre recordar que, em sentido comum, uma fracção autónoma situada no «5º Esq.» ou no «5º E» de um prédio são a mesma e única fracção autónoma…


Diferente seria se, por absurdo, existissem de facto duas fracções autónomas no mesmo prédio e andar, uma com a indicação de «Esq.» outra com a indicação de «E».


Não é o caso, nem tal foi alegado.


Dessa forma, se há-de concluir que as diligências infrutíferas de citação, quer postal quer por funcionário judicial, foram realizadas naquela que agora se demonstrou ser a morada do embargante, desde há cerca de 20 anos, pelo que nenhuma irregularidade se constata nessas diligências.


Não se demonstrando que essas diligências foram realizadas em morada diferente da correspondente à residência do embargante.


Improcede, pois, também esta argumentação.


Em terceiro lugar, invoca o embargante que:


19- No âmbito dos autos de ação declarativa poderia e deveria ser solicitado às autoridades policiais competentes para averiguarem o paradeiro do réu (conforme 24 dos factos provados).


20- Assim, não poderia concluir-se, sem outras diligências - designadamente, como último recurso, a obtenção de informação junto das autoridades policiais -, no sentido de ocorrer ausência em parte incerta, termos em que não poderia ainda optar-se pela citação edital, como forma de garantir o direito de defesa consagrado na lei fundamental.


No caso, efectivamente, não foi pedida qualquer diligência de localização do embargante junto das entidades policiais.


Contudo, tais diligências, nos termos do sobredito artigo 236º, apenas são realizadas quando o juiz o considere absolutamente indispensável para decidir da realização da citação edital


E concorda-se com o juízo efectuado na 1ª instância (quer pelo juiz da acção declarativa quer pelo juiz a quo), no sentido de que essas diligências não eram indispensáveis, na medida em que, tal como demonstrado, apenas se apuraria – na melhor das hipóteses – que a residência do embargante correspondia ao local onde haviam sido realizadas as tentativas de citação postal e por funcionário judicial, sem sucesso – como vimos.


Mostrando-se, também neste prisma, irrelevante a disparidade formal entre a identificação do local como «Esq.» ou «E», sendo, repete-se, um e mesmo local.


Improcede também esta argumentação.

*

Invoca, por fim, o embargante que:


26- Fez-se constar que se colocou um edital à porta do 5.° Esq., n.° 1 da Rua ..., e outro edital na Junta de Freguesia ... (factos provados sob 20 e 21), sendo certo que o número de polícia e a rua antes referidas se situam na freguesia de ... e não, na freguesia de ..., conforme se deu como provado sob o facto 25.


27- Sendo afixado um edital no qual consta como domicílio do réu o Rua ... (factos provados sob 20 e 21), não se pode dizer que se tenha afixado um edital à porta da residência do réu, pois este residia e reside no 5.° E, desse prédio.


28- O facto de não se ter afixado nenhum edital para proceder a citação edital do réu a porta da sua residência gera nulidade da citação, cfr. o art.° 240.°, n.° 2, por remissão do art.° 191.°, n.° 1 do Cód. de Proc. Civil.

*

Apurou-se, a este respeito, que:


20. Por certidão de afixação de editais datada de 30.06.2016, fez-se constar que em 30.06.2016 foi afixada à porta do réu, um edital do mesmo teor do transcrito na cópia antecedente, bem como a afixação de um edital do mesmo teor na Junta de Freguesia ....


21. No edital consta como domicílio do executado “Rua ...”.


25. O embargante fixou residência no 5.° E do n.° 1 da Rua ..., em ..., local onde reside, com o seu agregado familiar, há cerca de 20 anos (a que corresponde a fração autónoma “AH”, descrita sob o n.° .........29, da freguesia de ..., descrita na ... Conservatória do Registo Predial ..., com registo de aquisição a favor do embargante e outra efetuado em 30/06/1999).

*

Novamente, cai por terra a argumentação do embargante, pois este assenta a sua pretensão na disparidade formal entre a identificação do seu local de residência como «Esq.» ou «E».


Concluindo, como o fizemos, que tal disparidade é meramente aparente, pois refere-se ao mesmo local e tem o mesmo significado na linguagem corrente.


Não restando dúvidas que o edital em questão foi afixado à porta do réu, como se certificou e não noutra qualquer porta, que não a que dá acesso ao seu local de residência.


Repare-se que, no requerimento inicial de embargos, o embargante alegou a este respeito, que:


22. Diariamente entram e saiem do 5.º esquerdo do n.º 1 da Rua ..., em ... a citação edital e ninguém viu, nessa altura (30/06/2016), qualquer édito afixado na porta de entrada.


23. Na precedente data havia pessoas em casa do réu/embargante.


24. Se o réu/embargante tivesse reparado na citação edital teria tentado logo apurar o que se passava, como o fez em 16/05/2019, quando reparou no edital do auto de penhora afixado à sua porta (id. no precedente n.º).


25. Naquele dia, a porta do réu/embargante o Sr. oficial de justiça não afixou édito nenhum.


Requerendo, no decurso da audiência final a retificação do exposto nos artigos 22 e 32 e no cabeçalho da petição de embargos, devendo ler-se “5º E” onde se diz “5º Esq.”, nos termos do art. 146 nº 1 do C. P.C. – rectificação que foi judicialmente deferida.


Contudo, nesta sede recursória, a embargante não persistiu na sua alegação de inexistência de edital afixado à sua porta, aceitando a factualidade provada na sentença, mas escudando-se por detrás daquela discrepância formal, que, como vimos, consideramos irrelevante.


Improcedendo, pois, também esta argumentação e, em consequência, a apelação.”


III -Apreciando do mérito da reclamação apresentada nos termos do artigo 643º, nº 1, do Código de Processo Civil:


Dispõe o artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil: “Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte”.


Como se referiu no despacho reclamado, é entendimento pacífico do STJ, que a fundamentação do acórdão que confirma, por unanimidade, a sentença do tribunal de 1ª instância, apenas tem fundamentação essencialmente diferente, para efeitos do disposto no artigo 671º n.º 3 do CPC, quando a fundamentação da Relação tenha assentado, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam fundamentado e justificado a sentença da 1ª instância, sendo irrelevantes para esse efeito, discrepâncias marginais e secundárias e o mero reforço argumentativo levado a cabo pela Relação para fundamentar a mesma solução alcançada na sentença apelada.


Neste sentido, entre outros, os seguintes acórdãos do STJ:


De 19.05.2020, processo n.º 840/18.0T8STR-A.E1-A.S1, relatora Maria João Vaz Tomé, com o sumário: I – Ao considerar a “fundamentação essencialmente diferente” como obstáculo à verificação da dupla conforme, o legislador teve em vista os casos em que a confirmação da sentença pelo Tribunal da Relação assenta num enquadramento normativo absolutamente distinto daquele que foi levado em linha de conta na decisão do Tribunal de 1.ª Instância, o que não se verifica quando as instâncias se movem no âmbito do mesmo quadro jurídico: o instituto do caso julgado. II - O maior desenvolvimento da argumentação não implica que o raciocínio jurídico-subsuntivo se deva ter por fundamentalmente diverso. (…);


De 07.07.2015, processo n.º 542/13.8T2AVR.C1.S1, relator Lopes do Rego, com o sumário:


“1. A alteração do conceito de dupla conformidade, enquanto obstáculo ao normal acesso em via de recurso ao STJ, operada pelo actual CPC (mandando atender a uma diferença essencial nas fundamentações que suportam a mesma decisão das instâncias), obriga o intérprete e aplicador do direito a – analisada a estruturação lógico argumentativa das decisões proferidas pelas instâncias, coincidentes nos respectivos segmentos decisórios - distinguir as figuras da fundamentação diversa e da fundamentação essencialmente diferente.


2. Não é qualquer alteração, inovação ou modificação dos fundamentos jurídicos do acórdão recorrido, relativamente aos seguidos na sentença apelada, qualquer nuance na argumentação jurídica por ele assumida para manter a decisão já tomada em 1ª instância, que justifica a quebra do efeito inibitório quanto à recorribilidade, decorrente do preenchimento da figura da dupla conforme.


3. Só pode considerar-se existente uma fundamentação essencialmente diferente quando a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação tenha assentado, de modo radicalmente ou profundamente inovatório, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam justificado e fundamentado a decisão proferida na sentença apelada – ou seja, quando tal acórdão se estribe decisivamente no inovatório apelo a um enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado daquele em que assentara a sentença proferida em 1ª instância – não preenchendo esse conceito normativo o mero reforço argumentativo levado a cabo pela Relação para fundamentar a mesma solução alcançada na sentença apelada.”


Na fundamentação cita, no mesmo sentido: o acórdão proferido pelo STJ em 10/2/05, no P. 6543/13.9YYPRT-A.P1-A.S1:


“1. Confirmando a Relação a decisão de 1ª instância, sem qualquer voto de vencido, a admissibilidade do recurso de revista está dependente do facto de ser empregue fundamentação substancialmente diferente (art. 671º, nº 3, do CPC de 2013)


2. Tal não sucede quando a Relação se limita a reforçar, em termos cumulativos ou subsidiários, a fundamentação empregue pela 1ª instância.


Ou seja: não constitui fundamentação essencialmente diferente o mero reforço ou aprofundamento das razões jurídicas que já haviam ditado a sucumbência do recorrente em 1º instância.”


De 29.09.2020, processo n.º 665/14.6TBEPS-E.G1.S1, relator Ricardo Costa, com o sumário:


“I - Existe dupla conformidade decisória, que obsta à admissibilidade do recurso de revista normal e ao conhecimento do seu objecto, nos termos do art. 671.º, n.º 3, do CPC, do acórdão da Relação que confirma, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na primeira instância, se a Relação sindica a bondade da sentença recorrida à luz do enquadramento normativo e da motivação jurídica crucial usada em primeira instância, e, ademais, não modifica a matéria de facto de forma relevante para essa motivação jurídica, de modo a verificar-se que se atinge na parte dispositiva da decisão o mesmo resultado pretendido na acção quanto aos segmentos decisórios objecto do recurso e da apreciação de conformidade.


II - Não obsta à fundamentação essencialmente coincidente dos julgados o desenvolvimento, dogmático e interpretativo. a cargo da segunda instância, relativo aos fundamentos usados pela primeira instância, desde que tais integrações normativas e doutrinais não coloquem em causa ou transmutem para diverso enquadramento a manutenção da aplicação e preenchimento do regime jurídico aplicado em comum - neste caso, a normatividade inscrita no art. 186.º, n.ºs 1, 2 e 3, do CIRE para efeitos de qualificação da insolvência e afectação dos sujeitos qualificados como administradores e gerentes, de direito ou de facto, responsáveis pela causação ou agravamento da situação de insolvência -, e, portanto, essa evolução e adição não sejam centrais para a construção do silogismo judicial que conduz à parte dispositiva da decisão.”


De 10.04.2024, processo 476/10.9TJCBR-AE.C1-A.S1, relator Luís Espírito Santo, com o sumário: I – Havendo o acórdão recorrido corroborado no essencial a fundamentação nuclear e decisiva constante da sentença de 1ª instância, não atribuindo o menor relevo à alegação produzida pela A. quanto ao dito pagamento de tornas e respectivas consequências jurídicas e entendendo não censurar – antes reafirmar em absoluto – o bem fundado da decisão de conhecimento imediato do mérito da causa, sem necessidade de produção de prova a realizar na fase processual subsequente, constituiu-se dupla conforme impeditiva da interposição de revista (normal) nos termos do artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil.


(…)


III – Embora o acórdão recorrido haja desenvolvido com maior detalhe esta temática (o que bem se compreende em função da extensão e alcance das alegações da apelação), o que é certo é que a fundamentação jurídica essencial que perfilhou é precisamente a que foi adoptada em 1ª instância, não se vislumbrando que haja encetado qualquer percurso jurídico substantivamente diverso daquele que o juiz a quo já antes havia trilhado.”


No caso presente, o acórdão recorrido negou provimento à apelação, confirmando, por isso, inteiramente o sentido decisório acolhido na sentença apelada e para alcançar o juízo de improcedência do recurso, moveu-se fundamentalmente nos mesmos plano e enquadramento normativo que haviam estado subjacentes à sentença.


Como se referiu, no despacho reclamado as decisões da 1ª e 2ª instância, decidiram a questão da regularidade ou não da citação do Embargante, para os termos da ação declarativa onde foi proferida a sentença exequenda, especificamente se na ação declarativa se fez uso indevido da citação edital, tendo ambas decidido, que da factualidade julgada provada resulta que foram observadas as diligências previstas no artigo 236º do CPC e consequentemente não ter sido ilegalmente ordenada a citação edital e ainda que a citação edital respeitou as formalidades legais, nos termos dos artigos 240º e 241º do CPC. concretamente na afixação do edital na porta da residência conhecida do Embargante.


Deste modo, a sentença e o acórdão assentam numa fundamentalmente idêntica ratio decidendi, a diferença de fundamentação que se vislumbra radica na circunstância de a Relação ter aprofundado as razões jurídicas que já suportavam a sentença proferida em 1ª instância, reforçando a argumentação jurídica que conduzia à não verificação da nulidade da citação, por não se ter empregue indevidamente a citação edital, fazendo-o, desde logo, em resposta à argumentação adiantada pelo Embargante nas suas conclusões da apelação.


Por outro lado, como é entendimento pacifico na jurisprudência, como se constata nos acórdãos supra citados, não cabem no referido conceito de fundamentação essencialmente diferente os casos em que – movendo-se inquestionavelmente a Relação, no que respeita à efetiva ratio decidendi do acórdão proferido, no campo dos mesmos institutos ou figuras jurídicas – se limita a aditar um mero reforço argumentativo no que toca à idêntica solução jurídica do pleito que alcançou.


O Reclamante sustenta nas conclusões D) a G) que a fundamentação é essencialmente diferente por que o acórdão recorrido fez um uso errado de uma presunção judicial, por ter considerado que ele habita num “5.º E” ou num “5.º Esq” se trata da mesma fração habitacional e que esse fundamento não foi anteriormente considerado.


Sobre esta questão, na sequência do Recorrente, ter defendido na apelação, que: “Ao indicar-se, na petição, como morada do réu uma morada inexistente e ao constar da carta de citação e do mandado de citação do réu/recorrente o mesmo 5.° Esq., em lugar do 5.° E, verificou-se um erro quanto a indicação de uma morada diversa da morada real do réu.”


Consta do acórdão recorrido: “Ora, a este respeito, cumpre recordar que, em sentido comum, uma fração autónoma situada no «5º Esq.» ou no «5º E» de um prédio são a mesma e única fração autónoma…


Diferente seria se, por absurdo, existissem de facto duas frações autónomas no mesmo prédio e andar, uma com a indicação de «Esq.» outra com a indicação de «E».


Não é o caso, nem tal foi alegado.


Dessa forma, se há-de concluir que as diligências infrutíferas de citação, quer postal quer por funcionário judicial, foram realizadas naquela que agora se demonstrou ser a morada do embargante, desde há cerca de 20 anos, pelo que nenhuma irregularidade se constata nessas diligências.


Não se demonstrando que essas diligências foram realizadas em morada diferente da correspondente à residência do embargante.


Mais adiante acrescenta:


Novamente, cai por terra a argumentação do embargante, pois este assenta a sua pretensão na disparidade formal entre a identificação do seu local de residência como «Esq.» ou «E».


Concluindo, como o fizemos, que tal disparidade é meramente aparente, pois refere-se ao mesmo local e tem o mesmo significado na linguagem corrente.


Não restando dúvidas que o edital em questão foi afixado à porta do réu, como se certificou e não noutra qualquer porta, que não a que dá acesso ao seu local de residência.


Repare-se que, no requerimento inicial de embargos, o embargante alegou a este respeito, que:


22. Diariamente entram e saiem do 5.º esquerdo do n.º 1 da Rua ..., em ... a citação edital e ninguém viu, nessa altura (30/06/2016), qualquer édito afixado na porta de entrada.


23. Na precedente data havia pessoas em casa do réu/embargante.


24. Se o réu/embargante tivesse reparado na citação edital teria tentado logo apurar o que se passava, como o fez em 16/05/2019, quando reparou no edital do auto de penhora afixado à sua porta (id. no precedente n.º).


25. Naquele dia, a porta do réu/embargante o Sr. oficial de justiça não afixou édito nenhum.


Requerendo, no decurso da audiência final a retificação do exposto nos artigos 22 e 32 e no cabeçalho da petição de embargos, devendo ler-se “5º E” onde se diz “5º Esq.”, nos termos do art. 146 nº 1 do C. P.C. – rectificação que foi judicialmente deferida.


Contudo, nesta sede recursória, a embargante não persistiu na sua alegação de inexistência de edital afixado à sua porta, aceitando a factualidade provada na sentença, mas escudando-se por detrás daquela discrepância formal, que, como vimos, consideramos irrelevante.”


Como se constata a questão do local onde foi fixado o edital, foi aprofundada pelo acórdão recorrido em resposta à argumentação aduzida pelo Apelante e, ao contrário, do que defende não constitui qualquer fundamento jurídico essencialmente diferente.


Como consta da fundamentação do citado acórdão do STJ de 29.09.2020, relator Ricardo Costa, aqui 1º adjunto, para se verificar uma fundamentação essencialmente diferente é necessário “(…) o obstáculo recursório da “dupla conforme” não se preenche com “qualquer alteração, inovação ou modificação dos fundamentos jurídicos do acórdão recorrido relativamente aos seguidos na sentença apelada, qualquer nuance na argumentação jurídica assumida pela Relação para manter a decisão já tomada em 1ª instância”.


(…)


só se podendo considerar existente essa fundamentação essencialmente diferente se “a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação tenha assentado, de modo radicalmente ou profundamente inovatório, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam justificado e fundamentado a decisão proferida na sentença apelada – ou seja, quando tal acórdão se estribe decisivamente no inovatório apelo a um enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado daquele em que assentara a sentença proferida em 1ª instância.”


Ora, no caso, o acórdão recorrido, ao contrário do que defende o Recorrente, não recorreu a qualquer presunção judicial, nos termos do artigo 349º do Código Civil , como defende o Recorrente, sendo certo que não aditou qualquer novo facto, aos fixados na sentença recorrida, limitando-se a contrariar a argumentação do apelante, com base na factualidade julgada provada e na própria alegação dele nos embargos.


De resto, da interpretação do acórdão recorrido, o que resulta quanto a esta questão é ter entendido ser irrelevante que na identificação da fração onde habita o Recorrente constasse «5º Esq.», quando corretamente era «5º E», dado que não está provado, nem sequer foi alegado, que existam duas frações autónomas no mesmo prédio e andar, uma com a indicação de «Esq.» e outra com a indicação de «E».


Por conseguinte, continuamos a entender que a circunstância do acórdão recorrido ter aprofundado a fundamentação e aditado argumentos não considerados na sentença da 1ª instância, designadamente rebatendo a argumentação do Apelante quanto a ter havido incumprimento do artigo 240 n.º 2 do CPC, na fixação do edital, não afasta estar-se perante fundamentação essencialmente coincidente.


Decisão


Pelo exposto, indefere-se a reclamação apresentada, mantendo-se a decisão singular reclamada que desatendeu a admissibilidade do recurso de revista face à constituição de dupla conforme nos termos do artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil.


Custas pelo Recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.


Oportunamente, remeta à Formação, nos termos do n.º 3 do artigo 672º do CPC.


Lisboa, 29. 05. 2024

Leonel Serôdio (Relator)

Ricardo Costa (1º adjunto)

Maria Olinda Garcia (2ª adjunta)