Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Relator: | VASQUES DINIS | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Descritores: | RESOLUÇÃO PELO TRABALHADOR JUSTA CAUSA DE RESOLUÇÃO OBJECTO DO RECURSO CONCLUSÕES NULIDADE DE ACÓRDÃO IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO CONTRADIÇÃO | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
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Nº do Documento: | SJ200902120025794 | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Data do Acordão: | 02/12/2009 | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Votação: | UNANIMIDADE | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Texto Integral: | S | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Privacidade: | 1 | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
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Meio Processual: | REVISTA | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
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Sumário : | I - Deve entender-se que o recorrente, tacitamente, excluiu do objecto recurso a impugnação do acórdão no tocante a uma determinada questão que versa apenas no corpo da alegação, não lhe fazendo qualquer referência nas conclusões do recurso - artigo 684.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (CPC). II - A arguição das nulidades do acórdão da Relação deve ser feita, expressa e separadamente, no requerimento de interposição do recurso, sob pena de se considerar extemporânea e não se conhecer das nulidades arguidas somente na alegação de recurso. III - Tal não impede que sejam apreciados os fundamentos e questões objecto do recurso que, embora invocados pelo recorrente como determinantes de nulidade do acórdão, possam configurar, pela forma como foram explanados no texto da alegação, erros de interpretação e aplicação da lei substantiva e/ou adjectiva, posto que o tribunal não está vinculado à qualificação dada pelas partes às questões levantadas. IV - É correcto o juízo de inviabilidade da reapreciação da matéria de facto constante do acórdão da Relação, quando a convicção do tribunal expressa no veredicto sobre a matéria de facto resultou da valoração global das provas oralmente produzidas em audiência - não gravadas -, e não há fundamento legal, no âmbito das regras de direito material probatório, para desprezar os depoimentos valorados na 1.ª instância. V - A contradição na decisão da matéria de facto é um vício que consiste na afirmação de duas ou mais realidades que não podem coexistir, ou na afirmação e negação da mesma realidade, ou seja, consiste em declararem-se provados um ou mais factos cuja existência exclui a existência de outros também declarados provados, ou declararem-se provados e não provados os mesmos factos. VI - Só deve dar-se por verificada a existência de justa causa para a resolução do contrato pelo trabalhador nos termos do art. 441.º do Código do Trabalho se o comportamento ofensivo de direitos ou garantias do trabalhador culposamente assumido pelo empregador for de tal modo grave, em si e pelas suas consequências, que torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho. VII - Carece de justa causa a resolução contratual operada pelo Autor, Director-Geral que reportava directamente ao Vice-Presidente de uma empresa multinacional, fundando-se no facto de este ter procedido à nomeação para Director de Zona, contra a vontade do autor, de uma pessoa que não tinha a sua confiança, apesar de até ali os Directores de Zona serem por si escolhidos e nomeados, se não se demonstrou que o Autor tinha a competência exclusiva da nomeação, ou que a ele cabia a última palavra nessa matéria (e não ao empregador) e se os motivos invocados na carta para fazer cessar o contrato, o foram através de referências genéricas à incompatibilidade da nomeação em causa com a sua permanência em funções, sem a concretização de qualquer facto, reportado ao comportamento profissional do nomeando, susceptível de ser averiguado e apreciado segundo critérios de objectividade, que, fundadamente, legitimasse a oposição do Autor à nomeação, por falta de confiança de profissional. VIII - É indispensável para aferir da impossibilidade, prática e imediata, da subsistência da relação laboral, a invocação pelo Autor, na carta de resolução, e a prova, em juízo, de factos susceptíveis de alicerçar a alegada falta de confiança profissional para se opor à promoção de um trabalhador seu subordinado. | ||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. Em acção proposta no Tribunal do Trabalho de Lisboa, em 15 de Setembro de 2005, AA demandou BB (Portugal) - Transitários Internacionais, Lda., pedindo a condenação desta no pagamento da importância de € 262.781,63, acrescida de juros, tendo, para tanto, alegado, em síntese, que, em 17 de Maio de 2005, resolveu, com justa causa fundada em alteração das suas condições de trabalho, o contrato de trabalho que, desde 31 de Outubro de 1991, vigorava entre as partes, sendo-lhe devida a correspondente indemnização, no valor de € 194.301,45 e, ainda, a importância de € 65.545,04, de mais valias de "stock options", que lhe haviam sido oferecidas, bem como a quantia de € 2.935,14, relativa a parte do salário do mês de Maio de 2005. A Ré, na contestação, defendeu-se por excepção e impugnação, deduziu pedido reconvencional e impetrou a condenação do Autor como litigante de má fé. Por excepção, invocou a incompetência absoluta do tribunal e a ilegitimidade do Autor; em defesa directa, contrariou os fundamentos de facto e de direito do pedido; e, em reconvenção, sustentou ser-lhe devida indemnização, a liquidar em execução de sentença, correspondente a danos directos e indirectos causados por irregularidades cometidas pelo Autor no exercício das suas funções, além da indemnização adveniente da ilícita resolução do contrato sem aviso prévio. Houve resposta do Autor, em que defendeu a improcedência da excepção da ilegitimidade e a inadmissibilidade do pedido reconvencional, o que motivou novo articulado da Ré. Findos os articulados, foi proferido despacho julgando inadmissível o pedido reconvencional, a que se seguiu o saneamento do processo, onde, entre o mais, se julgaram improcedentes as invocadas excepções. Elaborada a condensação, o Autor reclamou, pedindo a rectificação do quesito 10.º da base instrutória, mas a reclamação foi indeferida. Realizada a audiência de discussão e julgamento, durante a qual o Autor juntou documentos para demonstrar que o valor relativo às "stock options" era, em 7 de Junho de 2007, de € 152.028,51, veio a ser proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 74.506,73 — soma das importâncias devidas a título de "stock options" (€ 65.545,04), diferenças de retribuição do mês de Maio de 2005 (€ 2.735,96), e de juros vencidos até à data da sentença (€ 6.225,73) —, acrescida de juros de mora sobre a importância de € 68.281,00, contados a partir da data da sentença até integral pagamento, à taxa legal supletiva, e absolveu-a do demais peticionado. 2. Ambas as partes apelaram: — o Autor arguiu a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, e, para a hipótese de tal arguição não proceder, impugnando a decisão proferida sobre a matéria de facto, sustentou a alteração da decisão da 1.ª instância, no sentido de ser reconhecida a licitude da resolução do contrato, com a condenação da Ré no pagamento da respectiva indemnização, no valor de € 194.301,45, e de a Ré ser condenada a pagar-lhe mais € 90.865,69, a título de valorização das "stock options"; — a Ré impugnou a sentença na parte em que a condenou no pagamento da importância de € 65.545,04, a título de valorização das "stock options". O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu: « - no que toca à apelação da Ré e na parte da apelação do Autor relativa ao valor das "stock options", anular a sentença, ordenando-se a ampliação da matéria de facto, com o correspondente aditamento à base instrutória, após prolação de despacho ao abrigo do art.º 27.º, al. b), do C.P.T., nos exactos termos supra descritos [convidando as partes a completar os articulados com a alegação de factos relativos ao conteúdo e alcance que as partes quiseram dar ao conceito de "stock options"], seguindo-se os ulteriores termos do processo, com a realização de nova audiência de discussão e julgamento - art.º 712.º, n.º 4, do C.P.C.; - no que diz respeito à parte restante da apelação do Autor, indeferir a arguida nulidade da sentença, e negar provimento ao recurso, mantendo-se, nessa parte, a sentença recorrida.» Inconformado, veio o Autor pedir revista, tendo formulado, a terminar a respectiva alegação, as seguintes conclusões: I – O acórdão recorrendo é nulo, por omissão de pronúncia, uma vez que o Tribunal a quo não conheceu da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, II – Sendo certo que, não obstante não ter havido gravação da audiência de discussão e julgamento, dos autos constam os elementos de prova necessários à apreciação tanto da deficiência das respostas ao questionário quanto da contradição das respostas objecto da impugnação do Recorrente (pontos 5 a 9, 11, 15 e 18 da Base Instrutória), III – Nomeadamente o depoimento da testemunha CC, cuja tradução autenticada constitui fls… dos autos, a cópia do contrato de trabalho do Recorrente, junta a fls… dos autos e toda a correspondência trocada entre o referido CC e o Recorrente, IV – Resultando a contradição das respostas do simples confronto das mesmas com os factos dados por assentes na Especificação. V – O acórdão recorrendo interpreta e aplica erroneamente as disposições legais relativas à resolução do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador (art.º 441.º e ss. do CT), VI – Uma vez que a declaração de resolução notificada à Recorrida no dia 17 de Maio de 2005 contém a indicação sucinta dos factos que a justificam, VII – Factos esses dados como provados e, portanto, constitutivos do direito do Recorrente a fazer cessar o seu contrato de trabalho com justa causa. VIII – A resolução do contrato de trabalho, com justa causa, confere ao Recorrente o direito à indemnização peticionada, a tal título, no montante de € 194.301,45, IX – Devendo ainda a Recorrida pagar ao Recorrente não os € 65.545,04 em que foi condenada em 1.ª Instância, mas sim o valor corrigido de € 152.028,51 em virtude da operação de “stock splite”, conforme ampliação do pedido efectuada sem oposição da Recorrida. X – O douto acórdão recorrendo, para além de ser nulo nos termos do disposto sob a alínea d) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC, viola ainda o disposto, nomeadamente, sob os art.os 441.º, 442.º e 444.º do Código do Trabalho, cujas disposições legais interpreta e aplica de forma errónea. Nestes termos e nos mais de Direito que doutamente forem supridos deve o acórdão recorrendo ser julgado nulo por omissão de pronúncia ou, se assim não se entender, deve o mesmo ser revogado e proferido acórdão que reconhecendo a licitude da resolução do contrato de trabalho do Recor-rente condene a Recorrida a pagar-lhe a indemnização peticionada no valor de € 194.301,45, acrescida dos juros legais devidos, e bem assim o valor de € 152.028,51, a título de stock options, ou, ainda, caso assim também não se entenda, deve ser revogado o acórdão recorrendo e proferida decisão que ordene a ampliação da matéria de facto dos pontos 5 a 9, 11, 15 e 18 da Base Instrutória, seguindo-se os demais termos legais, por assim ser de Direito e de JUSTIÇA. A recorrida contra-alegou para defender a confirmação do julgado e, neste Supremo Tribunal, a Exma. Magistrada do Ministério Público pronunciou-se no mesmo sentido, em parecer que veio a merecer a discordância do Autor e manifestação de anuência da Ré. Corridos os vistos, cumpre decidir. II 1. Na 1.ª instância, declarou-se provado o seguinte: 1. Em 31 de Outubro de 1991, autor e ré outorgaram o acordo constante de fls. 34 a 40 dos autos com o seguinte conteúdo: «(...) CONTRATO DE TRABALHO O presente contrato é celebrado em 31 de Outubro de 1991, entre AA ("Trabalhador"); BB (Portugal) - Transitários Internacionais, ("Empregador"); e BB International of Washington, Inc., sociedade sediada em Washington ("EI"). 1. Objecto e Funções. O empregador admite o trabalhador ao seu serviço para exercer funções de Director-Geral ( ... ) (b) O trabalhador aceita prestar os serviços, usando, para tal, toda a sua habilidade, ( ... ) e deverá desempenhar as suas funções de acordo com as instruções fornecidas, ocasionalmente, pelo Conselho de Administração. ( ... ) 3. Retribuição. Como contrapartida do trabalho prestado, de acordo com o estabelecido no presente contrato, o trabalhador auferirá um salário mensal de 822.929$00, acrescido de ajudas de custo para deslocações com o automóvel, no valor de 100.000$00. O título, salário ou outros benefícios do trabalhador serão objecto de ajustamentos pelo Conselho de Administração do empregador ou pela aplicação das leis laborais portuguesas. Adicionalmente, o trabalhador terá o direito de participar nos lucros, um bónus estabelecido em benefício dos trabalhadores essenciais do empregador, considerando-se que a parte recebida pelo trabalhador será sujeita a ajustamentos e, em caso algum, deverá ser considerado um direito adquirido, uma prerrogativa ou uma vantagem adquirida.(...)», tendo o primeiro sido admitido ao serviço, por conta e sob a direcção da segunda [A) dos factos assentes]; 2. A retribuição do A. então acordada era a seguinte: remuneração mensal - Esc. 822.920$00; subsídio mensal de transportes - Esc. 100.000$00 [B) dos factos assentes]; 3. O Autor recebia da Ré um bónus [C) dos factos assentes]; 4. O Autor foi admitido a trabalhar para a Ré para desempenhar as funções de "Managing Director" [D) dos factos assentes]; 5. Ultimamente o A. auferia a seguinte retribuição mensal: retribuição base - 4.901,20 Euros: subsídio de viatura - 800,00 Euros; subsídio de refeição - 112,00 Euros [E) dos factos assentes]; 6. O A. usufruía de um telemóvel da R. que utilizava na sua actividade profissional com um plafond mensal de 75,00 Euros [F) dos factos assentes]; 7. Em 17 de Maio de 2005, o A. fez cessar o seu contrato de trabalho, sob invocação de justa causa, nos termos da comunicação enviada à ré com teor constante de fls. 45 dos autos com o seguinte conteúdo: « ... Assunto: Demissão De acordo com as conversas que temos tido relativamente à nomeação de um Director de Zona para Lisboa; Considerando que decidiu prosseguir unilateralmente com a nomeação de DD para o cargo de Director de zona para Lisboa, de acordo com a sua comunicação geral de ontem sobre a sua nomeação, sem qualquer pré-aviso; considerando que sabe perfeitamente que sempre me opus a tal nomeação e quais as razões subjacentes a essa oposição; e que lhe transmiti claramente que tal nomeação seria incompatível com a minha permanência como Director de País da BB Portugal; Considerando todas as circunstâncias acima e o facto de que conhece perfeitamente a minha posição - o que converte a nomeação de DD numa afronta àquilo que tenho feito e realizado como Director de País durante quase 14 anos, com o sucesso que é público e visível - apresento a minha demissão, com efeitos imediatos, que tem de ser necessariamente considerada como uma demissão com justa causa do trabalhador. Invoco a justa causa desta demissão para todos os efeitos legais, nomeadamente no que se refere ao pedido de indemnização devido a demissão apresentada por justa causa pelo trabalhador, que será formalizada no Tribunal competente, em devido tempo. AA» [G) dos factos assentes]; 8. As funções desempenhadas pelo A. no que concerne à implementação de sistemas e procedimentos, inscreviam-se na "cultura" e "estilo" próprios de uma empresa multinacional como é a Ré [H) dos factos assentes]; 9. A ré avaliava o desempenho do Autor pelos resultados operacionais apresentados [I) dos factos assentes]; 10. De acordo com a estrutura orgânica da ré, o autor reportava directamente ao Sénior Vice-Presidente da Europe Continental, sediado na Alemanha [J) dos factos assentes]; 11. Os District Manager portugueses - dos escritórios de Lisboa e do Porto - eram da escolha e nomeação do A. a quem reportavam directamente [K) dos factos assentes]; 12. No início de 2005, o Sénior Vice Presidente da Europa Continental da Ré manifestou ao autor a intenção de nomear o Sr. DD para desempenhar as funções de District Manager (Lisboa) [L) dos factos assentes]; 13. Em 23 de Março de 2005, o sr. CC - remeteu ao A um e-mail com o teor constante de fls. 49 com o seguinte conteúdo: «... ainda tenho um assunto presente que é o cargo de director de zona para Lisboa ... » [M) dos factos assentes]; 14. Em 30/3/05, o Sr. CC remeteu ao Autor um e-mail, com o teor constante de fls. 50 dos autos, com o seguinte conteúdo: «estou 100% convencido que o DD é a escolha certa e tenho de insistir que proceda a essa alteração ...» [N) dos factos assentes]; 15. Em 8 de Abril de 2005, o Autor remeteu ao Sr. CC um e-mail com o teor constante de fls. 51 dos autos com o seguinte conteúdo: «... sabe que não posso confiar nele (...) que isto significaria uma perda de face inaceitável e uma ofensa para os meus princípios e integridade ... » [O) dos factos assentes]; 16. Em 11/4/05, o Autor recebeu de CC o e-mail cuja cópia [consta] de fls. 41 dos autos com o seguinte conteúdo: «AA (...) disse e insisto que trate de o Victor ser o Director de zona para Lisboa (...) não se trata de um assunto que esteja em discussão ...» [P) dos factos assentes]; 17. Na ausência de qualquer contacto telefónico por parte do CC, o autor, em 15/4/05 enviou-lhe e-mail, cuja cópia [consta] de fls. 43 do processo com o seguinte conteúdo: «... como trabalhador acho que a sua imposição unilateral muda radicalmente as condições em que tenho vindo a exercer o meu cargo de Director Geral...» [Q) dos factos assentes]; 18. Em 27 de Abril de 2005, o Sr. CC remeteu ao Autor via e-mail, com o teor constante de fls. 42 dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido, uma proposta em que a R. se dispõe a pagar-lhe uma indemnização no valor de 91.143,00 Euros [R) dos factos assentes]; 19. O A. não aceitou a proposta [S) dos factos assentes]; 20. Em 16 de Maio de 2005, o Sr. CC, anunciou a promoção de DD a District Manager do escritório de Lisboa [T) dos factos assentes]; 21. O Sr. DD não merecia a confiança pessoal, nem profissional, do Autor [U) dos factos assentes]; 22. Em 16 de Maio de 2005, o Sr. CC, remeteu à Lis - All BB uma comunicação com o teor constante de fls. 52 dos autos em que «anuncio o promoção de DD para o cargo de Director de Zona da nossa delegação em Lisboa» [V) dos factos assentes]; 23. Desde o início do mês de Março de 2005 que os Srs. DD e CC vinham mantendo contactos directos via telefone [W) dos factos assentes]; 24. De acordo com as normas em vigor na R., no período compreendido entre 2001 e 2004 foram oferecidos ao autor diversos lotes de "Stock Options" [X) dos factos assentes]; 25. As acções referidas em 24 eram no número e tinham as datas de atribuição e valores em Bolsa à data sua atribuição e em 17 de Maio de 2005 referidos no gráfico que se segue:
26. A atribuição dos "Stock Options" ao autor foi feita directamente pelo CEO da ré, EE, em reconhecimento pelos serviços relevantes prestados à empresa e tem natureza irreversível [Z) dos factos assentes]; 27. O autor recebia da ré um bónus trimestral que em 1 de Novembro de 1996 correspondia a uma percentagem não concretamente apurada dos 25% dos resultados líquidos mensais [1.º da base instrutória]; 28. Nos últimos doze meses que antecederam a cessação do contrato de trabalho o autor recebeu de bónus um valor médio mensal de 3.364,25 Euros [2.º da base instrutória]; 29. O autor usufruía do telemóvel referido em 6. na sua vida privada e se o valor das chamadas telefónicas ultrapassasse o valor mensal de € 75,00, era-lhe facturado o valor excedente [3.º da base instrutória]; 30. Em 2005 o Sénior Vice Presidente da Europa Continental da R. era o Sr. CC [4.º da base instrutória]; 31. No âmbito das suas funções de "Managing Director' o autor implementava as estratégias empresariais definidas de acordo com os seus superiores [5.º da base instrutória]; 32. Implementava a política de pessoal, inclusive em matéria salarial, definida e aprovada pelos seus superiores [6.º da base instrutória]; 33. Negociava com clientes, fornecedores e outros prestadores de serviços [7.º da base instrutória]; 34. Implementava a estrutura orgânica e funcional dos serviços definidas de acordo com os seus superiores [8.º da base instrutória]; 35. Elaborava orçamentos que sujeitava aos seus superiores para aprovação [9.º da base instrutória]; 36. Os contactos referidos em 23. foram feitos sem o conhecimento do autor [12.º da base instrutória]; 37. Aquando do referido em 7. a ré pagou ao autor as importâncias constantes do recibo de fls. 54 designadamente: € 2.613,97 de ordenado- -base; subsídio de férias de 2004 e 2005; subsídio de Natal de 2005; retribuição de férias não gozadas; € 61,60 de subsídio de refeição (11 dias); € 426,27 de subsídio de viatura; € 3.364,25 de gratificação do mês de Abril de 2005 [facto admitido por acordo das partes]. 2. Importa, neste passo, precisar as questões de que este Supremo Tribunal pode conhecer, tendo presente que o objecto do recurso é delimitado, expressa ou tacitamente, pelas conclusões que devem, necessariamente, traduzir uma síntese dos fundamentos que suportam o pedido de alteração da decisão recorrida [artigos 684.º, n.º 3, e 690.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), na versão anterior à da revisão operada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, e a que se reportam todos os preceitos, neste ponto, indicados sem outra menção], e atendendo ao conteúdo decisório do acórdão impugnado, ao teor do requerimento de interposição do recurso, ao texto da respectiva alegação, das conclusões e das pretensões formuladas pelo recorrente. 2. 1. No segmento final da peça alegatória, onde se consignaram as pretensões a alcançar na revista, o Autor pede (em correspondência com o teor da conclusão IX), subsidiariamente, que a Ré seja condenada a pagar-lhe «o valor de € 152.028,51, a título de stock options». O Tribunal da Relação, enfrentando o problema, colocado por ambas as partes, do direito invocado pelo Autor relativo às "stock options", considerou que, na parte atinente, a decisão proferida sobre matéria de facto enfermava de insuficiência, na medida em que não se apurara qual o conteúdo e alcance que as partes quiseram dar ao conceito de "stock options" e, designadamente, se a atribuição da correspondente mais-valia ao Autor pressupunha a efectiva compra das acções, como a Ré havia alegado no artigo 50.º da contestação, não objecto de quesitação. Considerou, outrossim, não poder a apontada deficiência ser ultrapassada naquele tribunal de recurso, uma vez que o conceito representado pela expressão "stock options" não é um conceito vulgar no dia-a-dia dos tribunais nem da realidade nacional, que a tabela do ponto 25 é dúbia, e que a audiência não foi gravada. E concluiu pela necessidade de ordenar a ampliação da matéria de facto, quanto a esse aspecto, decidindo, em consequência, ao abrigo do disposto no artigo 712.º, n.º 4, anular a sentença e determinar, nos termos supra referidos, a atinente ampliação da matéria de facto, com o correspondente aditamento à base instrutória, após prolação de despacho ao abrigo do artigo 27.º, alínea b), do Código de Processo do Trabalho (CPT). Deste segmento decisório, versando exclusivamente matéria de facto, resulta que o Tribunal da Relação não conheceu do mérito da pretensão do Autor relativa às "stock options". No corpo da alegação da revista, o recorrente, a propósito da decisão, limita-se a manifestar o entendimento de que "a ampliação de tal matéria de facto não pode significar a concessão ao Recorrido de uma nova oportunidade para «reclamar» do Despacho Saneador, já que, (...), podendo fazê-lo, não o fez nos termos e prazos legais", sem, contudo exprimir quaisquer razões de discordância relativamente aos fundamentos e sentido dessa parte da decisão, que, aliás, por incidir sobre a fixação matéria de facto, é irrecorrível, nos termos do n.º 6 do artigo 714.º. Por isso, aquela pretensão — de ver, no presente recurso, a Ré condenada a pagar-lhe «o valor de € 152.028,51, a título de stock options» — não pode ser apreciada. 2. 2. No corpo da alegação da revista, o recorrente começa por se insurgir contra a solução que foi dada pelo acórdão da Relação à questão da nulidade da sentença por omissão de pronúncia — por ele suscitada no recurso de apelação —, imputando ao acórdão violação, por errónea interpretação e aplicação, dos artigos 660.º, n.º 2, 1.ª parte, e 668.º, n.º 1, alínea d). Todavia, nas conclusões do presente recurso, nada é dito quanto a tal matéria, pelo que, em face do disposto no artigo 684.º, n.º 3, tem de entender-se que o recorrente, tacitamente, excluiu do objecto do recurso a impugnação do acórdão no tocante ao segmento em que decidiu indeferir a arguição da nulidade da sentença, razão por que não pode tal questão, versada apenas no corpo da alegação, ser apreciada. 2. 3. Nas conclusões I a IV e X da alegação da revista, o recorrente imputa ao acórdão da Relação a nulidade por omissão de pronúncia, aduzindo que aquele tribunal superior não conheceu da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, quanto aos pontos 5) a 9), 11), 15) e 18) da base instrutória, impondo-se-lhe que dela conhecesse, por constarem dos autos todos os elementos de prova necessários à apreciação da deficiência e contradição das atinentes respostas Dispõe o artigo 77.º, n.º 1, do CPT, que “a arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso”. Tal exigência, justificada por razões de celeridade e economia processual, que, marcadamente, inspiram o processo laboral, visa possibilitar ao tribunal recorrido a rápida e clara detecção das nulidades arguidas e respectivo suprimento, daí que a explanação das razões pelas quais se suscita a nulidade haja de constar do requerimento de interposição de recurso, dirigido à instância recorrida. As razões que justificam o regime especial de arguição das nulidades da sentença estabelecido na lei adjectiva laboral permanecem válidas quando se trate da imputação de nulidades ao acórdão da Relação. Por isso, de há muito, este Supremo, no entendimento de que a remissão constante do artigo 716.º, n.º 1, do CPC – ao mandar aplicar aos acórdãos da 2.ª instância o que se acha disposto nos artigos 666.º a 670.º, e, pois, o regime de arguição de nulidades da sentença da 1.ª instância – contempla, tratando-se de processo laboral, o regime especial consignado no artigo 77.º, n.º 1, do CPT, do que decorre que a arguição das nulidades do acórdão da Relação deve ser feita, expressa e separadamente, no requerimento de interposição do recurso, sob pena de se considerar extemporânea e não se conhecer das nulidades arguidas somente na alegação de recurso. O requerimento de interposição da revista, incorporado a fls. 471 dos autos, não contém qualquer referência à nulidade do acórdão. Tal referência apenas veio a ser feita nas conclusões da revista, modo de proceder que não respeita a exigência contida no n.º 1 do artigo 77.º do CPT, uma vez que a arguição da nulidade do acórdão da Relação, omitida no requerimento de interposição do recurso, e feita só no momento da apresentação da alegação da revista, não cumpre a finalidade prosseguida por aquele preceito que é a de permitir que o tribunal recorrido, no momento em que se debruça sobre o requerimento de interposição, designadamente para apreciar da admissibilidade do recurso, facilmente se aperceba de quais os vícios apontados à decisão impugnada e respectivos fundamentos, de modo a que, rapidamente, deles tome conhecimento, procedendo, se for caso disso, à sanação, do que poderá resultar a desnecessidade de subsistir o recurso – por exemplo, se o suprimento da nulidade conduzir a uma solução favorável à parte recorrente, no tocante ao mérito da causa. A arguição da nulidade mostra-se, por conseguinte, no caso que nos ocupa, intempestiva, do que decorre não poder conhecer-se dela. Tal não impede que sejam apreciados os fundamentos e questões objecto do recurso que, embora invocados pelo recorrente como determinantes de nulidade do acórdão, possam configurar, pela forma como foram explanados no texto da alegação, erros de interpretação e aplicação da lei substantiva e/ou adjectiva, posto que o tribunal não está vinculado à qualificação dada pelas partes às questões levantadas. No corpo da alegação, depois de afirmar, expressamente, que a pretendida alteração da matéria de facto "foi julgada improcedente, na sua totalidade, com a fundamentação expendida em não mais do que página e meia de texto", e que "o acórdão recorrendo escuda-se na inexistência de gravação da audiência de julgamento para sustentar a sua impossibilidade de reapreciação da prova", o recorrente discute a bondade dos fundamentos que levaram o tribunal recorrido a não atender o pedido de alteração da decisão da matéria de facto, acusando-o de errónea interpretação e aplicação do artigo 712.º do CPC, e invoca deficiências e contradições que inviabilizam a solução jurídica do pleito, que não foram tidas em conta, para solicitar a remessa dos autos às instâncias a fim de ser proferida nova decisão sobre a matéria de facto impugnada. A violação do disposto no artigo 712.º do CPC, nos termos em que a recorrente a invoca, não configura qualquer dos vícios típicos da sentença, mas, eventualmente, erro de interpretação e aplicação de lei processual, sendo que tal questão, por não estar contemplada no citado artigo 77.º do CPT, não está sujeita à limitação consignada neste preceito, do que decorre que pode ser conhecida pelo Supremo, quando suscitada na alegação da revista, conforme dispõe o artigo 722.º, n.º 1, do CPC, o que, adiante, se fará. No que toca à existência de insuficiências e contradições na decisão proferida sobre a matéria de facto, susceptíveis de inviabilizar a solução jurídica do pleito, o seu conhecimento cabe no âmbito dos poderes oficiosos do Supremo Tribunal, nos termos do n.º 3 do artigo 729.º do CPC. 2. 4. Em face do que vem de ser dito, temos que as questões a apreciar, por ordem de precedência lógica, são as de saber: — Se o acórdão da Relação incorreu em violação de lei processual, no modo como enfrentou a impugnação da matéria de facto perante ele deduzida; — Se, por insuficiência e contradições na decisão proferida sobre a matéria de facto, deve ser ordenada a ampliação da matéria de facto; — Se ocorreu justa causa para a resolução do contrato por parte do Autor. 3. No recurso de apelação, o Autor solicitou a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, no tocante às respostas aos quesitos 5) a 9), 11), 15) e 18) da base instrutória. Para sustentar tal pretensão, alegou, em síntese, que as respostas dadas aos quesitos 5) a 9) estão em contradição com os elementos de prova que lhe serviram de base e bem assim com a matéria assente sob a alínea H); que a matéria de facto contida nas respostas aos quesitos 11) e 15) mostra-se desconforme com toda a prova que lhe serve de suporte, referida na fundamentação da sentença; que a resposta dada ao quesito 18) está em contradição com a matéria assente sobre a alínea K); e que não foi devidamente valorado o depoimento de uma testemunha. Vejamos o teor dos quesitos e as respostas que mereceram: 5) No âmbito das suas funções de "Managing Director", o A. definia estratégias empresariais? Provado apenas que, no âmbito das suas funções de "Managing Director", o A. implementava estratégias empresariais definidas de acordo com os seus superiores. 6) Definia e implementava a política de pessoal, inclusive em matéria salarial? Provado apenas que implementava a política de pessoal, inclusive em matéria salarial, definida e aprovada pelos seus superiores. 7) Negociava com clientes, fornecedores e outros prestadores de serviços? Provado. 8) Definia e implementava a estrutura orgânica e funcional dos serviços? Provado apenas que implementava a estrutura orgânica e funcional dos serviços definidas de acordo com os seus superiores. 9) Elaborava orçamentos? Provado apenas que elaborava orçamentos que sujeitava aos seus superiores para aprovação. 11) Ao promover o Sr. DD a R. visava "ver-se livre" do A.? Não Provado. 14) A Ré sempre teve intenção de atribuir ao DD o desempenho de funções que o colocavam, em termos práticos, fora da chefia hierárquica do A.? Não Provado. 15) O que esvaziaria as funções do Autor? Prejudicado. 18) A competência para nomear os Districts Managers cabia ao Sénior Vice-Presidente da Europa Continental? Provado apenas o que consta das alíneas L), N), P) e V). Pretendia o Autor que os quesitos que obtiveram respostas restritivas e negativas deviam ter recebido a resposta "Provado" e que a resposta ao quesito 18) deveria ter sido "Não provado". O Tribunal da Relação considerou não poder alterar as respostas aos quesitos 5) a 9), 11) e 15), por não se verificar qualquer dos requisitos previstos nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 712.º do CPC, ou seja, por não constarem dos autos todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os atinentes pontos da matéria de facto, não ter havido gravação das provas [alínea a)], não fornecer o processo elementos que imponham decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas [alínea b)], e não ter sido apresentado, no recurso, documento novo superveniente, com virtualidade para, por si só, destruir a prova em que a decisão assentou [alínea c)]. No tocante à resposta dada ao quesito 18), considerou não existir qualquer contradição, uma vez que ela consistiu em mera remissão para o que consta das alíneas L), N), P) e V) dos factos assentes. Na revista, o Autor defende que, embora não tenha havido gravação da prova, constam dos autos todos os elementos que teriam permitido, se apreciados, alterar a decisão: o depoimento de uma testemunha, produzido em carta rogatória junta aos autos, o contrato de trabalho escrito, a correspondência trocada entre essa testemunha e o recorrente, e as contradições que existem na decisão da matéria de facto. De acordo com a fundamentação do veredicto sobre a matéria de facto, a convicção do tribunal resultou da valoração global das provas oralmente produzidas em audiência, em conjugação com um depoimento vertido em carta rogatória e com o teor dos documentos juntos aos autos, e, em particular, quanto às respostas aos quesitos 5) a 9), 11) e 15), dos depoimentos do legal representante da Ré, e das testemunhas CC (produzido na referida carta rogatória), FF[quesito 11)], e GG [quesitos 11) e 15)]. Não tendo havido gravação da prova, não podia o tribunal de recurso, por por não ter acesso ao teor dos depoimentos oralmente produzidos, averiguar da bondade da apreciação que deles foi feita. Por outro lado, não se vê fundamento legal, no âmbito das regras de direito material probatório, nem o recorrente o invocou, para desprezar tais depoimentos e atender, exclusivamente, aos elementos probatórios constantes dos autos, designadamente de índole documental, para se considerar que o processo fornece elementos de prova bastantes para alicerçar a pretendida alteração. Relativamente às pretensas contradições, no caso de existirem — o que a seguir será averiguado —, só poderiam levar à alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto se do processo constassem os pertinentes elementos de prova, como decorre, a contrario sensu, do n.º 4 do referido artigo 712.º. Não merece, por conseguinte, censura, à luz do disposto no artigo 712.º, n.º 1, do CPC, o acórdão da Relação, quanto ao juízo de inviabilidade da reapreciação da matéria de facto. 4. Segundo afirma o recorrente, sugerindo a existência de uma contradição, do facto constante do ponto 18 do elenco dos factos provados — que reproduz o teor da alínea R) dos factos assentes — decorreria a inevitabilidade de os quesitos 11) e 15) obterem a resposta: "provado"; alega, também, que a resposta ao quesito 18) está em contradição com o teor da alínea K). A contradição na decisão da matéria de facto é um vício que consiste na afirmação de duas ou mais realidades que não podem coexistir ou na afirmação e negação da mesma realidade, ou seja, consiste em declararem-se provados um ou mais factos cuja existência exclui a existência de outros também declarados provados, ou declararem-se provados e não provados os mesmos factos. 4. 1. Consta do referido ponto 18 que, "[e]m 27 de Abril de 2005, o Sr. CC remeteu ao Autor via e-mail, com o teor constante de fls. 42 dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido, uma proposta em que a R. se dispõe a pagar-lhe uma indemnização no valor de 91.143,00 Euros [R) dos factos assentes]". Nos quesitos 11), 14) e 15), perguntava-se se, ao promover o Sr. DD a Ré visava "ver-se livre" do A., se a Ré sempre teve intenção de atribuir ao DD o desempenho de funções que o colocavam, em termos práticos, fora da chefia hierárquica do A., e se este facto esvaziaria as funções do Autor. Como acima se deixou referido, o tribunal respondeu não provado aos dois primeiros quesitos e prejudicado ao último. Não se vê onde possa existir incompatibilidade entre estas respostas e o facto, revelado pelo documento de fls. 42, de a Ré se ter disposto a pagar ao Autor uma indemnização no valor de € 91.143,00, documento esse onde, por um lado, se afirma que se trata de proposta de aceitação do desejo do Autor de "terminar o processo em condições mutuamente convenientes" e se refere, a terminar, que, caso o Autor não concorde com os valores indicados, "não iremos aceitar o seu pedido e queremos que continue a trabalhar para a nossa organização". 4. 2. Da referida alínea K), cujo texto foi reproduzido no ponto 11) do elenco dos factos provados, consta: "Os District Manager portugueses - dos escritórios de Lisboa e do Porto - eram da escolha e nomeação do A. a quem reportavam directamente". No quesito 18) perguntava-se se a competência para nomear os Districts Managers cabia ao Sénior Vice-Presidente da Europa Continental, ao que o tribunal respondeu, como já se mencionou, por remissão para o teor das alíneas L), N), P) e V), reproduzidas nos pontos 12, 14, 16 e 18, onde se dá como demonstrado que, no início de 2005, o Sénior Vice-Presidente da Europa Continental da Ré manifestou ao Autor a intenção de nomear o Sr. DD para desempenhar as funções de District Manager (Lisboa); em 30 de Março de 2005, o Sr. CC remeteu ao Autor um e-mail, com o teor constante de fls. 50 dos autos, com o seguinte conteúdo: «estou 100% convencido que o DD é a escolha certa e tenho de insistir que proceda a essa alteração ...»; em 11 de Abril de 2005, o Autor recebeu de CC o e-mail cuja cópia [consta] de fls. 41 dos autos com o seguinte conteúdo: «AA (...) disse e insisto que trate de o Victor ser o Director de zona para Lisboa (...) não se trata de um assunto que esteja em discussão ...»; em 16 de Maio de 2005, o Sr. CC, remeteu à L..... All BB uma comunicação com o teor constante de fls. 52 dos autos em que «anuncio o promoção de DD para o cargo de Director de Zona da nossa delegação em Lisboa». É de notar que se o tribunal tivesse respondido "não provado" ao quesito 18) — como defendeu o recorrente no recurso de apelação e parece que continua a sustentar —, os dados do problema seriam os mesmos, pois, a contradição, a existir, resultaria do confronto entre os factos vertidos na alínea K) e os factos constantes das outras referidas alíneas, para onde remeteu a resposta ao quesito, deste modo dando como não provado o que nele se perguntava. Ora, a afirmação de que os District Managers de Lisboa e Porto eram da escolha e nomeação do Autor a quem reportavam directamente, constante da alínea K), de modo algum exclui a possibilidade de se declarar provado o que consta da restantes alíneas, cujo teor se transcreveu, revelando passos do processo de promoção de DD para o cargo de Director de Zona de Lisboa. 4. 3. Não existe, assim, qualquer contradição na decisão proferida sobre a matéria de facto susceptível de inviabilizar a solução jurídica do pleito, no que concerne à questão da justa causa da resolução do contrato — sendo que também não se vislumbra insuficiência da mesma decisão, determinante daquela inviabilidade —, por isso que não é de convocar o disposto no n.º 3 do artigo 729.º do CPC. 5. Quanto ao problema da existência de justa causa para a resolução do contrato por parte do Autor, as instâncias coincidiram no entendimento de que a matéria de facto provada não permite dar por verificada a justa causa invocada. O douto acórdão recorrido tratou a questão, discreteando, como segue: "[...] Invocou, o Autor, no que não foi atendido na sentença recorrida, que na nomeação, para "District Manager", de uma pessoa que não era da sua confiança, contra a sua vontade, e as circunstâncias concretas em que ocorreu tal nomeação, constituíram uma desautorização e uma afronta à pessoa do Autor, o qual, aliás, era quem procedia a tal tipo de nomeações. Sendo que indicou, clara e inequivocamente, na carta de rescisão, os factos culposamente praticados pela Ré. Vejamos: No n.º 1 do art.º 441.º do CT estabelece-se que «Ocorrendo justa causa, pode o trabalhador fazer cessar imediatamente o contrato». Não fornece esta disposição qualquer conceito de justa causa de resolução de contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador. Todavia, e à semelhança do que se verifica a propósito da cessação de um tal contrato por iniciativa do empregador - não havendo neste particular qualquer razão suficientemente forte e válida para se privilegiar a posição do trabalhador face à do empregador - é necessário que, em relação àquela e com as devidas adaptações, também se verifiquem os requisitos cumulativos que integram o conceito de justa causa de despedimento estabelecido pelo legislador no art.º 396.°, n.º 1, do mesmo diploma, ao dispor que «o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, tome imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho constitui justa causa de despedimento». Ou seja, à semelhança do que se exige ante a verificação de um comportamento culposamente assumido por um trabalhador e susceptível de justificar o respectivo despedimento imediato, para que se possa justificar a resolução imediata do contrato de trabalho por parte do trabalhador, também será de exigir a verificação cumulativa dos seguintes requisitos: Significa, pois, que é o comportamento que tem de estar na base da impossibilidade de subsistir, de se manter a relação laboral. Tal comportamento tem que significar um proceder, um agir, uma forma de actuar que, perante a generalidade das pessoas do meio social em que se desenrola o contrato de trabalho, que pensam de acordo com os sãos princípios da moral e da convivência sócio-laboral, representa um despoletar de um clima de tensão entre o trabalhador e o empregador, tornando intolerável, insustentável, a subsistência da relação laboral, no sentido de não ser exigível a continuação dessa relação. Para se reconhecer ao trabalhador, a quem é conferida, por contraposição à entidade patronal, uma maior amplitude na sua faculdade de fazer cessar o contrato de trabalho, independentemente de invocação de motivo, bastando, para isso, dar o correspondente aviso prévio, justa causa para a desvinculação, será indispensável a existência de uma particular gravidade da situação legitimadora da desvinculação com justa causa. Quanto à comunicação, prevê o n.º 1 do art.º 442.º do CT que «a declaração de resolução deve ser feita por escrito, com a indicação sucinta dos factos que a justificam ... ». E estabelece o n.º 3 do art.º 444.º do mesmo Código que «Na acção em que for apreciada a i1icitude da resolução apenas são atendíveis para a justificar os factos constantes da comunicação referida no n.º 1 do artigo 442.º». Perante estes dispositivos legais, não há dúvida que o trabalhador que pretenda pôr termo ao contrato de trabalho que mantenha com a sua entidade patronal, com fundamento em justa causa, deve, na carta de rescisão, indicar, ainda que de um modo abreviado, os factos que, na sua perspectiva, integram o conceito jurídico de justa causa para resolução do contrato por sua iniciativa, indicando, sucintamente, as circunstâncias de tempo, lugar e modo como tais factos ocorreram, para, posteriormente, em acção de impugnação dessa resolução, se não ver impossibilitado de demonstrar a invocada justa causa. No caso em apreço, temos que ficou provado, com interesse para as questões suscitadas, que: De acordo com a estrutura orgânica da ré, o autor reportava directamente ao Sénior Vice-Presidente da Europa Continental, sediado na Alemanha. Os District Manager portugueses — dos escritórios de Lisboa e do Porto — eram da escolha e nomeação do A. a quem reportavam directamente. No início de 2005, o Sénior Vice-Presidente da Europa Continental da Ré manifestou ao autor a intenção de nomear o Sr. DD para desempenhar as funções de District Manager. Em 23 de Março de 2005, o sr. CC - remeteu ao A um e-mail com o teor constante de fls. 49 com o seguinte conteúdo: «... ainda tenho um assunto presente que é o cargo de director de zona para Lisboa ...». Em 30/3/05, o Sr. CC remeteu ao Autor um e-mail, com o teor constante de fls. 50 dos autos, com o seguinte conteúdo: «estou 100% convencido que o DD é a escolha certa e tenho de insistir que proceda a essa alteração ... ». Em 8 de Abril de 2005,o Autor remeteu ao Sr. CC um e-mail com o teor constante de fls. 51 dos autos com o seguinte conteúdo: «... sabe que não posso confiar nele (...) que isto significaria uma perda de face inaceitável e uma ofensa para os meus princípios e integridade ...». Em 11/4/05, o Autor recebeu de CC o e-mail cuja cópia constante de fls. 41 dos autos com o seguinte conteúdo: «AA (...) disse e insisto que trate de o Victor ser o Director de zona para Lisboa (...) não se trata de um assunto que esteja em discussão ...». Na ausência de qualquer contacto telefónico por parte do CC, o autor, em 15/4/05 enviou-lhe e-mail, cuja cópia constante de fls. 43 do processo com o seguinte conteúdo: «... como trabalhador acho que a sua imposição unilateral muda radicalmente as condições em que tenho vindo a exercer o meu cargo de Director Geral ...». Em 16 de Maio de 2005, o Sr. CC, anunciou a promoção de DD a District Manager do escritório de Lisboa. O Sr. DD não merecia a confiança pessoal, nem profissional, do Autor. Em 16 de Maio de 2005, o Sr. CC remeteu à Lis - Ali BB uma comunicação com o teor constante de fls. 52 dos autos em que «anuncio o promoção de DD para o cargo de Director de Zona da nossa delegação em Lisboa». Desde o início do mês de Março de 2005 que os Srs. DD e CC vinham mantendo contactos directos via telefone. Por outro lado, é o seguinte o teor da comunicação em que o Autor comunica a sua decisão de rescindir o seu contrato de trabalho com justa causa: «... Assunto: Demissão De acordo com as conversas que temos tido relativamente à nomeação de um Director de Zona para Lisboa; Considerando que decidiu prosseguir unilateralmente com a nomeação de DD para o cargo de Director de zona para Lisboa, de acordo com a sua comunicação geral de ontem sobre a sua nomeação, sem qualquer pré-aviso; considerando que sabe perfeitamente que sempre me opus a tal nomeação e quais as razões subjacentes a essa oposição; e que lhe transmiti claramente que tal nomeação seria incompatível com a minha permanência como Director de País da BB Portugal; Considerando todas as circunstâncias acima e o facto de que conhece perfeitamente a minha posição - o que converte a nomeação de DD numa afronta àquilo que tenho feito e realizado como Director de País durante quase 14 anos, com o sucesso que é público e visível - apresento a minha demissão, com efeitos imediatos, que tem de ser necessariamente considerada como uma demissão com justa causa do trabalhador. Invoco a justa causa desta demissão para todos os efeitos legais, nomeadamente no que se refere ao pedido de indemnização devido a demissão apresentada por justa causa pelo trabalhador, que será formalizada no Tribunal competente, em devido tempo.» E da leitura dessa comunicação o que salta à vista é que o Autor nela incluiu meras referências genéricas àquilo que ele entendia como sendo a incompatibilidade entre a nomeação do DD e a permanência dele, Autor, no respectivo cargo, dizendo, no que toca à sua confiança em tal pessoa, que a Ré "sabe perfeitamente que sempre me opus a tal nomeação e quais as razões subjacentes a essa oposição". Ou seja, e como se salienta na sentença recorrida, o Autor não indica, nessa comunicação, um único facto, um só motivo, objectivamente ponderável, determinante dessa falta de confiança no DD, e que tornava prática e imediatamente impossível a manutenção da relação laboral. Tal carta de rescisão não contém, ainda que de uma forma sucinta, os factos que, na perspectiva do Autor, justificavam a declaração de rescisão. No que toca a essa impossibilidade, é um facto que, tal como ficou provado, os "District Manager" portugueses - dos escritórios de Lisboa e do Porto - eram da escolha e nomeação do Autor, a quem reportavam directamente. Mas disto não resulta que essa competência estivesse atribuída, em exclusivo, ao Autor, e seria estranho que o fosse, já que, por via de regra, é ao empregador que, no domínio da sua gestão empresarial, cabe definir o seu quadro de trabalhadores, mormente quando estão em causa cargos de significativa responsabilidade. Pode, em certas circunstâncias, a entidade patronal delegar essa responsabilidade em outros trabalhadores, como acontecia, no caso concreto, com o Autor. Mas sempre este teria que provar que a Ré não tinha, em termos de contratação, a última palavra a dizer, ou que estava impedida, pelos termos do contrato, de contratar os "District Managers" à margem da vontade do Autor. Esta seria a excepção, que não a regra. E o Autor reportava directamente ao Sénior Vice-Presidente da Europe Continental, sediado na Alemanha, que foi quem contratou o tal DD. Acresce que, sustenta[n]do e provando o Autor que não tinha confiança neste último, teria o mesmo que verter na sua comunicação e de demonstrar em juízo, para fazer vingar a sua tese da justa causa, que essa falta de confiança tinha que ver com razões de natureza profissional, com o cabal desempenho das suas funções e prossecução dos objectivos comerciais da Ré, e não com quaisquer outras, designadamente de ordem pessoal; e sendo de ordem profissional, que esses motivos relevavam em termos objectivos e não de simples conveniência ou mera perspectiva pessoal do Autor; que, na prática, tal significava um esvaziamento e funções do Autor; ou, ainda, que, com essa nomeação, mais não visou a Ré do que comprometer seriamente a sua posição na empresa, designadamente o seu poder e imagem perante esse DD, que seria seu subordinado. Ora, quanto a estes aspectos, a prova foi nula, pelo que tem de se considerar como não demonstrada a impossibilidade prática e imediata do Autor de manter a sua posição contratual. E, como facto constitutivo do seu direito, ao Autor cabia fazer tal prova - art.º 342.º, n.º 1, do Cód. Civil. Assim, bem andou a sentença recorrida em não considerar a justa causa para a rescisão do Autor, quer por deficiência de factos na comunicação escrita, quer pela não prova da mesma. [...]" Na revista, o Autor discorda da fundamentação do acórdão, essencialmente, no ponto em que este considerou indispensável para aferir da impossibilidade da subsistência da relação laboral, a invocação, na carta de resolução, e a prova, em juízo, de factos em que se pudesse alicerçar a alegada falta de confiança profissional para se opor à promoção de um trabalhador seu subordinado, sustentando que os factos que motivaram a resolução, suficientes para integrar a justa causa, foram devidamente referidos na carta e resultaram provados: — a nomeação unilateral do referido trabalhador; — a oposição expressa do Autor a essa nomeação; a circunstância de a nomeação ser da competência própria do Autor; — e a incompatibilidade da nomeação com a permanência do Autor nas funções que desempenhava. A esta argumentação o acórdão respondeu cabalmente, ao considerar que não se demonstrou que o Autor tinha a competência exclusiva da nomeação, ou que a ele, e não à Ré, cabia a última palavra, salientando que os motivos invocados para fazer cessar o contrato, o foram através de referências genéricas à incompatibilidade da nomeação em causa com a sua permanência em funções, sem a concretização de qualquer facto, reportado ao comportamento profissional do nomeando, susceptível de ser averiguado e apreciado segundo critérios de objectividade, que, fundadamente, legitimasse a oposição do Autor à nomeação, por falta de confiança de profissional, concretização essa que, no entendimento deste Supremo, se afigura indispensável a permitir ao empregador discutir, em termos de alegação e prova os motivos factuais invocados, e ao tribunal aferir, objectivamente, da impossibilidade, prática e imediata, da subsistência da relação laboral decorrente da alegada incompatibilidade. Não tendo sido feita a necessária concretização de factos, na carta de resolução, a consequente falta de demonstração dos mesmos, cujo ónus incumbia ao Autor, não pode deixar de conduzir ao juízo de improcedência da justa causa de resolução do contrato, pelos fundamentos explanados no acórdão da Relação que se subscrevem. III Por tudo o exposto, nega-se a revista. Custas a cargo do recorrente. Lisboa, 12 de Fevereiro de 2009. Vasques Dinis (Relator) |