Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | MARIA DE DEUS CORREIA | ||
Descritores: | PROPRIEDADE INDUSTRIAL MARCAS REGISTO DE MARCA NULIDADE SINAIS DISTINTIVOS CONFUSÃO IMITAÇÃO | ||
Data do Acordão: | 06/18/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA (PROPRIEDADE INTELECTUAL) | ||
Decisão: | CONCEDIDA A REVISTA | ||
Sumário : | I - Considerando a qualidade das marcas tituladas pela autora, como “marcas fracas” deverá o juízo de confundibilidade em relação à denominação social da ré, sinal usado por esta na sua actividade comercial e nomes de domínio na internet, ser menos severo ou exigente, limitando-se a comparação à parte original. II - Esse confronto entre sinais deve fazer-se através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores, como sublinha a jurisprudência comunitária, ao declarar que o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo e não procede a uma análise das suas diferentes particularidades. III - Esse confronto entre sinais tem como pressuposto o consumidor médio, razoavelmente informado, mas não particularmente atento às especificidades próprias das marcas. IV - De acordo com estes critérios, a utilização pela ré da denominação social “ROSSIO PLAZA HOTEL” não apresenta risco de confusão com as marcas da autora, “HOTEL LISBOA PLAZA” e “PLAZA”, não violando os direitos de propriedade industrial que para esta decorrem da titularidade das referidas marcas nacionais. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na 7.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I - RELATÓRIO HOTÉIS PLASA S.A. intentou a presente acção contra: ROSSIO PLAZA HOTEL, LDA, ambas melhor identificadas nos autos, formulando os seguintes pedidos: «I. Deve a presente acção ser julgada totalmente procedente por provada e, em consequência, deverá ser anulada a denominação social da Ré “ROSSIO PLAZA HOTEL” mais devendo ser efectuadas as comunicações e averbamentos necessários junto do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, ordenando-se o cancelamento dos respectivos registos e matrícula; II. Mais deve a Ré ser condenada a abster-se de usar a expressão “PLAZA” ou “PLASA” e, designadamente as combinações ROSSIO PLAZA e ROSSIO PLAZA HOTEL, para designar serviços hoteleiros independentemente do meio e/ou forma que esse uso possa revestir, nomeada mas não exclusivamente, como denominação social, marca, logótipo, nome de domínio, sinalética, publicidade e merchandising, contas de “social media” como por exemplo no Facebook e Instagram, etc.; III. Em consequência, deverá ser ordenado o cancelamento do registo do nome de domínio “rossioplaza.pt”, devendo ser notificada a Associação DNS para o efeito, mais devendo a Ré ser condenada a cancelar e não mais usar o nome de domínio “rossioplazahotel.com”; IV. Deve ainda ser a Ré condenada no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, nos termos previstos no artigo 349.º, n.º 4, do CPI, em valor a determinar por este Tribunal, por cada dia que a Ré violar o disposto nos anteriores números II e III parte final, a contar da data do trânsito em julgado da sentença e até efectivo e integral cumprimento; V. Mais deve a Ré ser condenada a indemnizar a Autora nos termos do disposto no artigo 347.º do CPI por danos patrimoniais, morais e encargos suportados pela Autora e cujo cálculo final será a liquidar em posterior incidente de liquidação.» Alegou para tanto, em síntese, que é titular da marca nacional n.º 220048 HOTEL LISBOA PLAZA, pedida em 18.03.1983, concedida por despacho de 29.12.1987 e válida até 29/12/2027 para assinalar na classe 43 “restaurantes, fornecimento de refeições self service, snack bar e hotéis” e da marca nacional n.º 249185 PLAZA, pedida em 02.08.1988, concedida por despacho de 22.04.1992 e válida até 03.08.2028 para assinalar na classe 43 “restaurantes, fornecimento de refeições, self service, snack bar e hotéis”. Mais alega que a denominação social da Ré e ainda os domínios rossioplaza.pt e rossioplazahotel.com, constituem uma imitação das marcas da titularidade da Autora, tendo sofrido danos dessa actuação , por parte da Ré. Foi admitida a ampliação do pedido requerida pela Autora, abrangendo os nomes de domínio rossioplazahotel.pt e rossioplaza.hotel.com. Foi proferido despacho saneador-sentença julgando a acção improcedente e absolvendo a Ré Rossio Plaza Hotel, Lda dos pedidos contra ela formulados pela Autora Hotéis Plasa SA. Inconformada, a Autora interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa que proferiu acórdão, dando razão à Autora, julgando, consequentemente, procedente o recurso e, revogando o despacho saneador-sentença recorrido, decidiu: 1. Anular a denominação social da Recorrida, Rossio Plaza Hotel, Lda; 2. Condenar a Recorrida a abster-se de usar os vocábulos PLAZA e/ou PLASA e/ou PLAZA HOTEL (incluido sob a forma do sinal ) para distinguir serviços hoteleiros; 3. Condenar a Recorrida a abster-se de usar os nomes de domínio «rossioplaza.pt», «rossioplazahotel.com», «rossioplazahotel.pt» e «rossioplaza.hotel.com» e a requerer, no prazo de sete dias a contar do trânsito em julgado deste acórdão, o cancelamento do registo dos referidos nomes de domínio. 4. Fixar uma sanção pecuniária compulsória, nos termos previstos no artigo 349.º, n.º 4, do CPI, no valor de €500,00 por cada dia de violação do acima ordenado em 2. e 3. a contar da data do trânsito em julgado do presente acórdão. 5. Condenar a Recorrida a pagar à Recorrente uma indemnização pelos danos causados, relegando-se o seu cálculo para posterior liquidação.» Inconformada agora a Ré, vem interpor recurso de revista, formulando as seguintes conclusões: “A. O presente Recurso de Revista vem interposto do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 04.03.2024, notificado à Recorrente através do Ofício de Ref.ª 21253962, datado de 05.03.2024, e nos termos do qual aquele Venerando Tribunal a quo veio revogar o Despacho Saneador-Sentença, (doravante “Saneador-Sentença”) e decidir que denominação social da aqui Recorrente, o sinal que usa no exercício da sua actividade e os nomes de domínio de que é titular, violam o exclusivo e os direitos de propriedade industrial que para aqui Recorrida decorrem da sua denominação social e da titularidade do registo das marcas nacional n.º 220048 HOTEL LISBOA PLAZA e n.º 249185 PLAZA. B. Mais tendo decidido, nesta senda, que da actuação culposa da aqui Recorrente, a aqui Recorrida sofreu danos, pelos quais deve ser indemnizada, sendo que conforme requerido e por não se mostrar ainda possível contabilizar todos os elementos a atender de acordo com o artigo 347.º, do Código de Propriedade Intelectual (doravante “CPI”), para a determinação do respectivo montante, relega o seu cálculo para posterior liquidação. C. Certo é que, no entendimento da Recorrente, com o devido respeito, tais segmentos decisórios do Venerando Tribunal a quo enfermam de erro de julgamento, nomeadamente, no que concerne aos critérios por si perfilhados para aferição da existência de uma situação de confundibilidade entre as marcas, firma e nome de domínios em apreço, e que culminaram na respectiva decisão de violação do direito de propriedade industrial da Recorrida pela Recorrente e, consequente, prática de concorrência desleal, configurando este o 1.º Erro de Julgamento vertido no Acórdão recorrido. D. Com efeito, é certo que a lei não proíbe que determinada denominação social ou marca insira algum elemento já constante outro sinal distintivo, desde que, pela sua natureza, estrutura ou composição, seja insusceptível de gerar o erro ou a confusão no comércio, tendo em conta o consumidor médio ou padrão, sendo assim proibido a adopção de expressão e/ou vocábulo semelhante susceptível de induzir em erro ou confusão o público em geral e os operadores económicos em particular. E. A este propósito, demonstrou a Recorrente que nenhuma censura merece o segmento decisório proferido pelo Tribunal da 1.ª Instância, ao ter considerado que os vocábulos semelhantes “HOTEL” e “PLAZA” não se revelam susceptíveis de induzir em erro o consumidor, na medida em que HOTEL apenas indica a categoria de serviços e PLAZA apenas se refere à palavra “praça” em língua espanhola; sendo, por sua vez, a diferença assinalada quanto aos vocábulos “LISBOA” e “ROSSIO” suficiente para que a Recorrente e a Recorrida possam coexistir no mercado, sem que exista qualquer risco de confusão por parte do consumidor. F. Acresce que, ainda que as decisões das Autoridades competentes em matéria de admissibilidade de firma (Registo Nacional de Pessoas Colectivas) e de domínios (Associação DNS.PT), possam não ser definitivas, é certo que as mesmas deverão ser valoradas e tidas em conta em sede de apreciação e caso de dúvida, desde logo, atento o facto de as referidas Entidades procedem, diariamente, à averiguação de casos de confundibilidade (ou não) tendo vasta experiência na matéria, sendo que in casu perante o confronto da denominação social e domínios requeridos pela Recorrente e as marcas da Recorrida que já existem desde 1987 e 1992, nenhuma dúvida tiveram de que as mesmas poderiam coexistir no mercado, sem existir qualquer risco ou perigo de qualquer confusão. G. Ora , as palavras HOTEL e PLAZA são de utilização comum e frequente no sector de actividade da Recorrente e da Recorrida e, por esse motivo, tais vocábulos são insusceptíveis de apropriação industrial – pelo menos na sua vertente proteccionista do direito de exclusividade –, pois que os mesmos não detêm sequer capacidade distintiva per se, encontrando-se, assim, comprometido o seu âmbito de protecção por um juízo de confundibilidade menos severo através da apreciação dos vocábulos não coincidentes (isto é, da parte original) – cfr. neste sentido, os Acórdãos proferidos pelo TRL, em 08.10.2009, no âmbito do Processo n.º 79/2002.L1-8; em 20.12.2017 no âmbito do Processo n.º 271/17.3YHLSB.L1-7 e em 26.11.2009, no Processo n.º 33/06.3TYLSB.L1-6. H. Trata-se , por isso, de uma marca débil constituída por duas expressões integrantes da linguagem comum, pelo que a simples alteração morfológica da denominação social ou a mera adição de elemento figurativo basta para afastar um qualquer juízo de confusão, sendo que é o que efectivamente sucede quando confrontadas as marcas e sinais “HOTEL LISBOA PLAZA” e “ROSSIO PLAZA HOTEL”, pois que basta variação em apreço para que se revele, adequadamente, afastado qualquer risco de confusão do consumidor. I. Assim, encontrando-se assim as palavras não coincidentes “LISBOA” e “ROSSIO” colocadas em diferente ordem, o que se revela suficiente para alterar totalmente a percepção fonética que é dada ao consumidor, sendo por isso “HOTEL LISBOA PLAZA” e “ROSSIO PLAZA HOTEL” totalmente distintos e distantes, que não surgem sequer associados. J. E, por isso, por isso, se conclui que a marca Recorrida e a firma e domínios da Recorrente em causa não se reconduzem, de forma alguma, a um mesmo sentido literal, não havendo por isso qualquer risco e/ou perigo de confundibilidade entre ambas. K. Salvo melhor entendimento, erra o Venerando Tribunal a quo ao retirar às referidas expressões a globalidade da percepção que alcançam pela conjugação de todos os seus vocábulos, tendo as palavras “Rossio” e “Lisboa” aqui um papel preponderante, sendo essa mesma preponderância que as destaca e distingue, pois que, veja-se que se não se considerasse tais vocábulos, no exercício de juízo de confundibilidade entre a Recorrente e a Recorrida, ambas as marcas seriam compostas por elementos todos eles sem capacidade distintiva e insusceptíveis de serem registáveis e de titularidade exclusiva. L. Pelo que, forçosamente se conclui que é a percepção da globalidade que é dada por cada um destes elementos que permite perceber o que está em causa: Lisboa Plaza ou Rossio Plaza, sendo que o vocábulo “Plaza” falecendo de qualquer capacidade distintiva, por ser de uso corriqueiro e trivial, não poderá ditar, per se, qualquer confundibilidade, pelo que, com o devido respeito, sempre se conclui pelo erro de apreciação e julgamento pelo Venerando Tribunal a quo. M. No mais, importa salientar que a distinção entre as marcas da Recorrente e da Recorrida é, sem margem de dúvidas, acentuada pela utilização de sinal misto pela Recorrente, onde surge em destacado e evidenciado o vocábulo “ROSSIO”, através de elemento figurativo, assegurando deste modo a efectiva distintividade – a nível gráfico, fonético e figurativo –, relativamente aos sinais da Recorrida, onde predomina, uma vez mais, o vulgar vocábulo “PLAZA”. N. Termos em que, recorrendo a um juízo de confundibilidade numa perspectiva global e não dissecada – como procede em erro o Venerando Tribunal a quo – , sempre se constata que visão do conjunto dos sinais em confronto se revela totalmente distinta, o que permite ao consumidor distinguir os produtos das diferentes marcas da Recorrente e da Recorrida. O. Pelo que, afastada a sustentada confundibilidade entre as marcas da Recorrida e da Recorrente, seja do confronto da denominação social (e respectivos domínios com iguais menções), seja do confronto dos sinais em apreço, ou das marcas em causa em termos globais, sempre se conclui que inexistindo qualquer risco e/ou perigo de confusão para o consumidor comum, inexiste, pois, qualquer violação do direito de propriedade industrial da Recorrida e por consequência inexiste igualmente qualquer acto de concorrência desleal praticado pela Recorrente, não se encontrando assim preenchida a previsão normativa contida na alínea a), do n.º 1, do artigo 311.º, do CPI. P. Com efeito, sempre se conclui que o Acórdão recorrido enferma de erro de julgamento e apreciação do disposto nos artigos 249.º e 311.º, do CPI, bem como do artigo33.º,do Decreto-Lei n.º129/98,de 13 de Maio (Regime Jurídico do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, doravante “RJRNPC”) e, por consequência, padece igualmente de erro de apreciação o juízo valorativo da confundibilidade entre a Recorrente e a Recorrida. Q. Nestes termos, deve o erro de julgamento vertido no presente segmento ser julgado totalmente procedente e, em consequência, deve ser proferido Acórdão que revogue o Acórdão recorrido e que mantenha o Saneador- Sentença proferido pelo Tribunal da 1.ª Instância, em todo o seu teor e extensão, o que desde já se requer para todos os efeitos e demais consequências legais. R. Acresce que, salvo melhor opinião, o Acórdão recorrido enferma ainda – por consequência do 1.º Erro de Julgamento supra evidenciado –, de erro quanto ao Direito de Indemnização da Recorrida, pois que, o Venerando Tribunal a quo olvida à apreciação e julgamento quanto ao preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil nos termos do disposto no artigo 347.º, do CPI, nomeadamente, quanto à verificação e efectiva existência de danos (patrimoniais e não patrimoniais) parcamente invocados pela Recorrida, não tendo igualmente procedido a um qualquer juízo valorativo quanto ao crivo da “gravidade” que estes últimos danos não patrimoniais estão sujeitos, nos termos do disposto no artigo 496.º, n.º 1, do CC. S. A este propósito, a Recorrente demonstrou que responsabilidade em causa – tal qual como prevista no n.º 1, do artigo 347.º, do CPI – emergente de factos ilícitos constitui, assim, uma fonte das obrigações, impondo ao lesante a obrigação de indemnizar os danos causados pela sua conduta sempre que estejam reunidos os seus pressupostos que coincidem com os pressupostos inerentes à responsabilidade civil nos termos do disposto no artigo 483.º, do Código Civil (doravante “CC”), nomeadamente: o facto, a ilicitude, o dolo ou mera culpa, o dano e o nexo causal entre o facto e o dano. T. Pressupostos estes que competirão ao lesado, aqui supostamente a Recorrida, o ónus de alegação e prova, (cfr. neste sentido, o Ac. da TRL, em 09.11.2022, no Proc. n.º 160/21.7YHLSB.L1-PICRS; o Ac. do TRP, em 03.06.2016, no Proc. n.º 75/11.EALSB; e o Ac. do TRC, em 28.01.2014, no Proc. n.º 53/12.9TBTCS.C1). U. Não se revelando assim suficiente a mera constatação da violação do direito de propriedade industrial da Recorrida e da mera culpa da Recorrente, para concluir, sem mais, pela existência de danos patrimoniais e não patrimoniais, em erro de julgamento e apreciação dos pressupostos inerentes ao disposto no artigo 347.º, do CPI, como erroneamente procede o Venerando Tribunal a quo. V. Assim, demonstrou a Recorrente que não se encontram preenchidos os pressupostos inerentes à responsabilidade em causa, nomeadamente, por não se verificar a prática de qualquer facto ilícito, na medida em que inexiste qualquer perigo de confusão ou associação no espírito dos consumidores entre as marcas da Recorrida e a denominação social, domínio e sinal da Recorrente e por consequência não se verifica qualquer violação do direito de propriedade industrial daquela e qualquer acto enquadrável como concorrência desleal (cfr.artigo 311.º, do CPI). W. Não merecendo assim qualquer censura e/ou reparo o Despacho Saneador-Sentença proferido pelo Tribunal de 1.ª Instância, no sentido de a marca, denominação social (e domínios) e o sinal da Recorrente assegurarem a necessária distintividade relativa aos da Recorrida, pois que, conforme demonstrado a propósito do 1.º Erro de Julgamento – explanado nos artigos 10.º a 90.º, das Alegações de Recurso, e nas presentes conclusões de A) a Q), que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais. X. Com efeito, demonstrou a Recorrente que o juízo sobre a confundibilidade deverá limitar-se à parte original, isto é, in casu à parte não coincidente “ROSSIO” e “LISBOA”, tal como perfilhado pelo Tribunal de 1.ª Instância, a qual se afigura manifestamente suficiente para a assegurar a necessária distinção entre as Partes. Y. Mais tendo demonstrado, no que concerne em específico aos sinais da Recorrente e Recorrida, que o sinal da primeira é um sinal misto e o da segunda um sinal nominativo, sendo evidente que o sinal da Recorrente detém um elemento figurativo, neste caso “ROSSIO” em destacado, assegurando a efectiva distintividade relativamente aos sinais da Recorrida, onde predomina, uma vez mais, o vulgar vocábulo “PLAZA”. Z. Assim, não se têm por preenchidos os dois requisitos da responsabilidade civil prevista no artigo347.º, n.º 1, do CPI –nomeadamente o(i)facto e a(ii) ilicitude –, por não se verificar a violação do direito de propriedade industrial da Recorrida, pela Recorrente, nem qualquer acto de concorrência desleal ao abrigo do disposto no artigo 311.º, do CPI. AA. No que concerne em específico à alegada conduta culposa da Recorrente, não restam dúvidas que ainda que a Recorrente pudesse conhecer, como efectivamente conhecia, a existência das marcas em causa e da Recorrida, certo é que em momento algum a mesma configurou como possível ou sequer concebível que existisse um qualquer perigo e/ou risco de confusão entre os elementos distintivos da sua denominação social, domínios e sinal com os da Recorrida. BB. Tendo assim a Recorrente adoptado todos os procedimentos necessários ao registo, legal e lícito, da sua denominação social (e marca) e respectivos domínios, mais tendo procurado informar-se e diligenciado pela adopção da tramitação legalmente prevista junto das Entidades/Autoridades competentes, o que efectivamente cumpriu. CC. A este propósito, veja-se que a convicção da Recorrente foi criada e fomentada com a concessão de certificado de admissibilidade de firma pelo Registo Nacional de Pessoas Colectivas, o qual ao não encontrou qualquer causa de confundibilidade, tendo tal atribuição sido feita já no pressuposto da existência da denominação social da Recorrente, que remonta a 1989 e 1992, como “Hotéis Plasa, S.A.” e “Plaza”; bem como aquando da concessão dos domínios da Recorrente em cumprimento das Regras de Registo de Nome de Domínio.pt, tendo a Autoridade responsável DNS concedido os mesmos sem quaisquer reparos. DD. Com efeito, com o devido respeito, o Venerando Tribunal a quo erra ao concluir sem mais que a Recorrente teria motivos razoáveis para saber, antes de iniciar o uso da sua denominação social e domínios, que se encontrava a violar o direito de propriedade intelectual da Recorrida, pois que, nem em sede dos presentes autos a referida questão de confundibilidade entre as Partes e os seus serviços e, por consequência, a violação do direito de propriedade intelectual da Recorrida se encontra a ser pacificamente tratada pelo douto Tribunal de 1.ª Instância e pelo Venerando Tribunal a quo. EE. No mais, é notório e evidente que a Recorrente adoptou todas as diligências necessárias e que lhe eram exigíveis nos termos da legislação aplicável e de acordo com o critério do “homem/empresário” medianamente diligente e cuidadoso, não se verificando por isso qualquer censura da conduta da mesma, pois que em face das circunstâncias concretas não podia, nem devia, a mesma agir de modo diverso. FF. Termos em que, resulta que o raciocínio perfilhado pelo Venerando Tribunal a quo enferma de erro de julgamento e apreciação quanto ao preenchimento do pressuposto da culpa inerente à responsabilidade civil in casu, pois que a mesma não se verifica nem sequer na modalidade de mera culpa. GG. Já no que concerne aos pressupostos do dano e nexo de causalidade, veja-se que inexistindo qualquer conduta ilícita praticada culposamente pela Recorrente, inexiste, igualmente, qualquer dano sofrido pela Recorrida assacável à Recorrente, não obstante é certo que a Recorrida, em momento algum dos seus articulados a mesma alega, nem tão pouco prova, qualquer facto relativo à produção de danos patrimoniais ou não patrimoniais, HH. Nomeadamente os factos essenciais que subjazem ao alegado lucro obtido pela Recorrente e à relação que este tem, alegadamente, com a confusão e desvio de clientes da Recorrida; ou mesmo os factos essenciais subjacentes aos danos emergentes e lucros cessantes que peticiona, nem se preocupando a Recorrida em alegar minimamente em que circunstâncias, como, em que datas e ocasiões é que se verificou a alegada perda de lucros e danos emergentes, não alegando um único dano a este propósito. II. Sendo notória e flagrante a omissão da Recorrida por relação à alegação e prova dos alegados danos não patrimoniais, não concretizando a mesma sequer em que termos é que se verificou tal pretenso “desprestígio”, a “degradação da imagem de um produto ou serviço”, ou mesmo em que termos se deu a referida, pela doutrina, “banalização”, ou que danos relativos a estados psicológicos adversos se verificaram. JJ. Pelo que, atendendo às referidas omissões e que sempre culminaram num incumprimento flagrante do ónus de alegação que impende sobre a Recorrida, não podia o Venerando Tribunal a quo concluir, sem mais, pela existência e verificação dos referidos danos, como fez em evidente erro de apreciação e julgamento quanto ao preenchimento dos pressupostos do dano e nexo de causalidade que subjazem ao direito indemnizatório, previsto nos termos do disposto no artigo 347.º, n.º 1, do CPI. KK. Sendo certo que, a Recorrida nada alega igualmente a respeito da gravidade dos danos não patrimoniais alegadamente sofridos, olvidando assim ao crivo legal previsto no artigo 496.º, do CC, pelo que operando o princípio da auto-responsabilidade das partes, inerente ao princípio dispositivo – segundo o qual estas sofrem as consequências jurídicas prejudiciais da sua negligência ou inépcia na condução do processo –, sempre que conclui que deveria ter sido julgada improcedente a indemnização peticionada pela Recorrida. LL. Atendendo a todo o exposto supra, é por demais evidente que inexistem danos concretos produzidos na esfera jurídica da Recorrida, seja a título de danos patrimoniais, e bem assim, quaisquer danos não patrimoniais relativos à imagem e desprestígio da Recorrida ou reconduzidos a qualquer confusão gerada nos consumidores. MM. Nestes termos, forçosamente se conclui pelo não preenchimento de todos os pressupostos (cumulativos) inerentes à responsabilidade civil prevista nos termos do disposto no artigo 347.º, do CPI, e que não dispensa a conjugação com o direito substantivo consagrado no artigo 483.º e no artigo 496.º, n.º 3, ambos do CC. NN. Motivo pelo qual, deve ser proferido Acórdão que determine a revogação do Acórdão recorrido, por erro de julgamento quanto ao preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil e à apreciação do princípio da auto-responsabilidade das Partes (corolário do Princípio do Dispositivo), e ainda em erro de interpretação quanto aos artigos 347.º, do CPI, e os artigos 483.º e 496.º, n.º 3, ambos do CC, o que desde já se requer para todos os efeitos e demais consequências legais. OO. Sem prejuízo, caso assim não se entenda – o que não se concede e apenas por mero dever de patrocínio se acautela –, deve ser ordenada, em caso de dúvida fundada, a produção de novos meios de prova junto do Tribunal de 1.ª Instância, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 662.º, n.º 1, alínea b), do CPC, devendo nessa sequência ser proferida nova Sentença nos presentes autos. NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, (i) Deve o presente Recurso de Revista ser admitido, e julgado procedente, por provado; E em consequência, (ii) Deve ser proferido Acórdão que determine a revogação do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa e, em consequência, mantenha o Despacho Saneador-Sentença proferido pelo Tribunal de 1.ª Instância. Ou caso assim não se entenda Deve ser proferido Acórdão que determine a revogação do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa e, em consequência, determine a baixa dos autos ao Tribunal de 1.ª Instância para produção de prova, nos termos no artigo 662.º, n.º 1, alínea b), do CPC, devendo nessa sequência ser proferida Sentença pelo mesmo. Assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!” A Autora/Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais pugnou pela improcedência do recurso e consequente confirmação do acórdão recorrido. II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Das instâncias vêm dados como provados os seguintes FACTOS: 1. Encontra-se registada a marca nacional n.º 220048 HOTEL LISBOA PLAZA, concedida em 29.12.1987, da titularidade da Autora, abrangendo os seguintes produtos da classe 43 da classificação internacional de Nice: restaurantes, fornecimento de refeições, self service, snack bar e hotéis. (vd. documento 4 junto com a petição inicial). 2. Encontra-se igualmente registada a marca nacional n.º 249185 PLAZA, concedida em 22.04.1992, da titularidade da Autora, abrangendo os seguintes produtos da classe 43 da classificação internacional de Nice: restaurantes, fornecimento de refeições, self service, snack bar e hotéis. (vd. documento 5 junto com a petição inicial) 3. O hotel explorado pela Autora encontra-se situado na Travessa ..., .... (assente por acordo das partes) 4. A Ré tem a denominação social de Rossio Plaza Hotel, Lda. e o hotel explorado pela mesma encontra-se situado na Rua..., .... (assente por acordo das partes) 5. A Ré é titular dos nomes de domínio www.rossioplazahotel.pt, www.rossioplaza.pt, www.rossioplazahotel.com e www.rossioplaza.hotel.com. (matéria confessada pela Ré) 6. A Ré, no âmbito da sua actividade, usa o sinal . (matéria confessada pela Ré) . 7. A sociedade Rossio Plaza Hotel, Lda, pessoa colectiva n.º .......86, foi constituída em ........2020, tem sede na Rua..., ... Lisboa, e tem por objecto social a construção e exploração de estabelecimentos hoteleiros, empreendimentos turísticos, comerciais e similares. (ADITADO pelo TRL) 8. A sociedade Hotéis Plasa, SA, pessoa colectiva n.º .......63, foi constituída em ........1952, datando a actual denominação de ........1989, tem sede na Travessa ..., ... Lisboa, e tem por objecto social o exercício da indústria hoteleira. (ADITADO pelo TRL) 9. Em 29.04.2022 foi certificado pelo Notário do cartório notarial da sociedade “AA” sito em ..., que consultado o sítio na internet com o endereço www.booking.com e feita uma pesquisa por “rossio plaza hotel” foi direcionado para uma página com um conjunto de imagens e dizeres, incluindo opções de reserva (“Reserve agora”) sob o título “Rossio Plaza Hotel”, o mesmo tendo ocorrido com a consulta feita no endereço www.hoteis.com e www.tripadvisor.com, dando-se aqui por reproduzidas as cópias das imagens extraídas que constam do documento junto com a petição inicial como doc. n.º12.(ADITADO pelo TRL) 10. A Ré promove os referidos serviços hoteleiros sob a designação “ROSSIO PLAZA HOTEL”, também através das respectivas redes sociais no Facebook e Instagram. (ADITADO pelo TRL) 11.A Ré depositou no registo comercial relativamente aos anos de 2020 e 2021, os seguintes dados quanto aos seus resultados líquidos: 2020: (- € 387,14); 2021: (€ 30.455,37). (ADITADO pelo TRL) 12. A Autora despendeu €30,00 com o pedido de certidão do registo comercial, €219,94 com o certificado notarial do teor do website e € 7,00 com o pedido de certidão das contas depositadas pela Ré. (ADITADO pelo TRL). III - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Decorridos os vistos, cumpre decidir, tendo presente que são as conclusões das alegações recursivas que delimitam o objeto do recurso, estando vedado ao tribunal de recurso conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, com excepção daquelas que são de conhecimento oficioso (cfr. art. 635º nº 4, 639º nº 1, 608º nº 2, ex vi art. 679º, todos do CPC). Assim, tendo em conta as conclusões de recurso formuladas, as questões que importa apreciar são as seguintes: 1. Saber se a denominação social ROSSIO PLAZA HOTEL, LDA, o sinal que a Ré usa no exercício da sua actividade . e os nomes de domínio de que é titular violam os direitos de propriedade industrial que para a Autora HOTÉIS PLASA SA decorrem quer da sua denominação social quer da titularidade das marcas n.º 220048HOTEL LISBOA PLAZA e n.º 249185PLAZA. 2. Saber se a Ré está vinculada ao dever de indemnizar pelos prejuízos causados à Autora, em consequência da violação dos direitos de propriedade industrial de que esta é titular. 1. A fim de nos debruçarmos sobre a primeira questão equacionada, importa evidenciar o quadro normativo em que nos movemos: Desde logo, dispõe o art.º 1.º do Código de Propriedade Industrial (CPI)1que “A propriedade industrial desempenha a função de garantir a lealdade da concorrência, pela atribuição de direitos privativos sobre os diversos processos técnicos de produção e desenvolvimento da riqueza”. Tal como bem evidencia o preâmbulo do referido diploma legal, “a propriedade industrial assume hoje um papel de enorme relevância para o crescimento económico, para a criação de emprego e para o desenvolvimento do sistema de inovação, conquistando uma importância crescente no valor das empresas, tanto de carácter tecnológico como comercial, ao permitir garantir o retorno dos investimentos que estas realizam em inovação e ao criar vantagens competitivas que lhes permitem responder, com maior eficácia e segurança, aos desafios impostos pela globalização dos mercados.”2 E, assim, nos termos do disposto no art.º 4.º n.º 4 do CPI, “os registos de marcas, (…) constituem fundamento de recusa ou de anulação de denominações sociais ou firmas com el[a]es confundíveis, se os pedidos de autorização ou de alteração forem posteriores aos pedidos de registo.” E isto sucede assim porque, o registo de uma marca confere ao seu titular o direito de propriedade e do exclusivo da marca para os produtos ou serviços a que esta se destina, conforme resulta do art.º 210.º n.º 1 do CPI. Mais dispõe o art.º 249.º n.º 1 alínea a) que “ o registo da marca confere ao seu titular o direito de impedir que terceiros, sem o seu consentimento, de usar, no exercício de actividades económicas, qualquer sinal se esse sinal for idêntico à marca e for usado em relação a produtos ou serviços idênticos aos produtos ou serviços abrangidos pelo registo”. Ao abrigo do n.º1 do art.º 249.º, é nomeadamente proibido, nos termos do n.º2, als. d) e e), a utilização do sinal, no todo ou em parte, como firma ou denominação social ou como parte característica dessa firma ou denominação; bem como a utilização do sinal em documentos comerciais e na publicidade. Por sua vez, a atribuição das firmas e denominações sociais está sujeita à observância dos princípios da verdade e da novidade, nos termos e condições previstos no título III do Regime Jurídico do Registo Nacional de Pessoas Colectivas (Decreto-Lei nº 129/98, de 13 de Maio), e o respectivo registo confere o direito ao seu uso exclusivo (art. 3.º do RJRNPC). Dispõe o art.º 33.º, n.ºs 1 do supra referido diploma legal, sobre o princípio da novidade, que as “as firmas e denominações devem ser distintas e não susceptíveis de confusão ou erro com as registadas ou licenciadas no mesmo âmbito de exclusividade (…)”. E nos termos do n.º 2: “os juízos sobre a distinção e a não susceptibilidade de confusão ou erro devem ter em conta o tipo de pessoa, o seu domicílio ou sede, a afinidade ou proximidade das suas actividades e o âmbito territorial destas”. De acordo com o n.º 5 do mesmo preceito, nos juízos sobre a distinção e a não susceptibilidade de confusão ou erro, deve ser considerada a existência de marcas e logótipos já concedidos que sejam de tal forma semelhantes que possam induzir em erro sobre a titularidade desses sinais distintivos. Por seu turno o art.º 208.º do CPI define que “A marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, cor, a forma do produto ou da respetiva embalagem, ou por um sinal ou conjunto de sinais que possam ser representados de forma que permita determinar, de modo claro e preciso, o objeto da proteção conferida ao seu titular, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.” Sendo que nos termos do art.º 209.º do CPI: “1. Não satisfazem as condições do artigo anterior: a) As marcas desprovidas de qualquer caráter distintivo; b) Os sinais constituídos, exclusivamente, pela forma ou por outra característica imposta pela própria natureza do produto, pela forma ou por outra característica do produto necessária à obtenção de um resultado técnico ou pela forma ou por outra característica que confira um valor substancial ao produto; c) Os sinais constituídos, exclusivamente, por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica, a época ou meio de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos; d) As marcas constituídas, exclusivamente, por sinais ou indicações que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio. 2 - Os elementos genéricos referidos nas alíneas a), c) e d) do número anterior que entrem na composição de uma marca não serão considerados de uso exclusivo do requerente, exceto quando, na prática comercial, os sinais tiverem adquirido eficácia distintiva.” Evidenciado o quadro legal em causa, importa analisar a questão concreta, à luz desse mesmo quadro legal. A Ré, agora Recorrente, discorda dos critérios perfilhados pelo Tribunal da Relação, que presidiram à aferição da existência de confundibilidade entre as marcas tituladas pela Autora e a firma e domínios utilizados pela Ré e que conduziram à decisão de considerar a conduta da Ré violadora dos direitos de propriedade industrial da Autora e consequente prática de concorrência desleal. E conclui, designadamente, que a lei não proíbe que determinada denominação social ou marca insira algum elemento já constante de outro sinal distintivo, desde que, pela sua natureza, estrutura ou composição, seja insusceptível de gerar o erro ou a confusão no comércio, tendo em conta o consumidor médio ou padrão. Defende que é o caso, ou seja, não há qualquer risco de confundibilidade entre os sinais que utiliza e as marcas tituladas pela Autora. Terá razão? Vejamos: É indubitável que da comparação entre as marcas da Autora, n.º 220048 HOTEL LISBOA PLAZA e n.º 249185 PLAZA, concedidas, respectivamente, em 29-12-1987 e 22.04.1992, e a denominação social e domínios usados pela Ré, ressalta a inclusão nestes da palavra “plaza” que é elemento integrante das primeiras. É, igualmente, certo que as referidas marcas abrangem produtos da classe 43 da classificação internacional de Nice: restaurantes, fornecimento de refeições, self service, snack bar e hotéis. E que a área de negócio da Ré é a mesma, explorando um hotel situado na Rua ..., usando o sinal supra, ostentando a designação verbal “ROSSIO Plaza Hotel”. O Hotel explorado pela Autora situa-se na Travessa ...(perto da Avenida ...) e é designado por “HOTEL LISBOA PLAZA”. Perante este contexto fáctico, a questão está em saber se a utilização por parte da Ré, da palavra “Plaza” quer na sua denominação social, quer nos domínios na internet, quer no sinal usado para distinguir serviços hoteleiros, é susceptível de induzir o público em erro ou criar confusão no consumidor e por conseguinte, constituir um acto de concorrência desleal, punido por lei. a)Quanto à firma ou denominação social: A firma, na sua acepção subjectiva, consagrada pelo sistema jurídico português, é o nome comercial do comerciante, um sinal distintivo do comerciante enquanto titular de certa empresa, de uso obrigatório, quer para os comerciantes em nome individual, quer para as sociedades comerciais, como resulta do estipulado pelos artigos 18º, nº 1 e 13º, nº 2, do Código Comercial, 9º, nº 1, c) e 10.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), e 37 e 38º, do RJRNPC. Com efeito, a firma tem por função essencial individualizar a sociedade, ou o comerciante em nome individual, por forma a distingui-los de outros, especialmente, na área do mercado onde se apresentam e se esgotam os seus produtos, ou no campo da sua exploração específica, e, ao mesmo tempo, esclarecer o mercado da espécie a que pertencem e, indirectamente, servir como um pólo de atração de clientela. Para tanto, os princípios da novidade e da verdade da firma, consagrados nos artigos 3º, 33º, nº 1 e 32º, nº 1, do RJRNPC, com referência aos artigos 275º e 200º, do CSC, exigem que estas sejam distintas de outras que se encontrem inscritas no registo comercial, de modo a evitar a confusão ou erro pelo público com as registadas ou licenciadas, no mesmo âmbito de exclusividade. Ainda quando a lei permita a inclusão de elementos utilizados por outras firmas, já registadas, ou com designações de instituições, notoriamente, conhecidas pelo público, exige que os seus elementos componentes sejam verdadeiros e não indutores em erro sobre a identificação, natureza ou actividade do seu titular, com a inerente incursão na proibição, a que alude o artigo 62º, do RJRNPC, que a eventual conduta infractora do uso legal da firma ou denominação confere aos interessados, bem como na indemnização pelos danos daí emergentes. É que o princípio da novidade, como bem resulta do preceituado pelo nº 2, do artigo 33º, do RJRNPC, ao dispor que “os juízos sobre a distinção e a não susceptibilidade de confusão ou erro devem ter em conta o tipo de pessoa, o seu domicílio ou sede, a afinidade ou proximidade das suas actividades e o âmbito territorial destas”, destina-se a assegurar a função identificadora das firmas, permitindo a fácil identificação por terceiros dos comerciantes com os quais se relacionam.”4 Ora, analisada a denominação social da Ré “ROSSIO PLAZA HOTEL, LDA”, não obstante a inclusão do elemento comum “PLAZA”, em relação às marcas nominativas5 da Autora, afigura-se-nos que tal elemento comum não é prevalente, ou seja, o mais adequado a perdurar na memória do público. E assim é, precisamente, pelo diminuto carácter diferenciador da referida palavra “plaza”. Na verdade, e dito de outro modo, como referiu a sentença da 1.ª instância, o referido termo tem uma capacidade distintiva baixa por se tratar de expressão “de uso comum ou trivial”. Repare-se que é muito frequente a utilização desta palavra que significa “praça” em língua castelhana, mas que utilizada na identificação de estabelecimentos que prestam serviços de hotelaria e de restauração, vem associada a uma ideia de requinte, sofisticação e exclusividade desse estabelecimento, motivo pelo qual é tão utilizada. Basta uma breve pesquisa na internet para verificar que a palavra “plaza” é, igualmente, utilizada na designação de condomínios e centros comerciais6. Confirma-se, pois, através desta observação que resulta dos dados da experiência comum, que a utilização comum da palavra “Plaza” se destina a associar, a determinado bem ou serviço, a referida ideia de sofisticação, qualidade e exclusividade. Assim, não sendo a palavra “plaza” o elemento diferenciador da denominação social da Ré, tão pouco a palavra “Hotel”, o que verdadeiramente assume tal carácter diferenciador é a palavra “ROSSIO” que cremos suficiente para afastar a susceptibilidade ou mesmo o risco de confusão com as marcas da Autora, designadamente a HOTEL LISBOA PLAZA, cujo elemento eminentemente diferenciador é “LISBOA”. Em reforço do que fica exposto não podemos deixar de chamar a atenção para o que se designa por “marcas fracas”, classificação em que se inserem as marcas tituladas pela Autora. Marcas fracas são “aqueles sinais que, embora apresentando um mínimo de capacidade distintiva, são constituídos quase exclusivamente por elementos de uso comum ou trivial, ou contêm símbolos ou prefixos e sufixos (“EURO”, “SUN”, “TEX”, “GAL”) de uso muito vulgarizado” Este tipo de marcas é susceptível de registo válido e do benefício da consequente protecção, posto que se trate de um sinal minimamente dotado de eficácia distintiva”7, porém, «o carácter de marca fraca implica que seja mais estreito o seu âmbito de protecção, no confronto com marcas potencialmente confundíveis» Nestas situações, «constitui entendimento generalizado que o juízo sobre a confundibilidade deverá ser menos severo, já que a comparação com outras marcas deverá limitar-se à parte que seja original»8. Assim, de acordo com estes critérios, considerando a qualidade das marcas tituladas pela Autora, como “marcas fracas” deverá então o juízo de confundibilidade em relação à denominação social da Ré ser menos severo ou exigente, limitando-se a comparação á parte original. E, in casu, temos em confronto as componentes LISBOA (da marca da Autora) e ROSSIO (da denominação social da Ré). Ora, apesar de “Rossio” corresponder ao nome pelo qual é conhecida uma das praças mais emblemáticas do centro de “Lisboa” (a Praça D. Pedro IV), não são tais palavras susceptíveis de serem confundidas pelo público medianamente atento e esclarecido. Aqui chegados, importa ainda, em sede de análise dos critérios que hão-de presidir ao juízo de confundibilidade dos sinais aqui em apreço, analisar qual o tipo de consumidor a que nos estamos a referir, bem como a forma como esse consumidor apreende ou interage com os sinais em apreço. A este propósito refere o Supremo Tribunal de Justiça 9 que no confronto dos sinais, a fim de aferir da sua confundibilidade, temos em vista um consumidor que não apresenta “especiais qualidades de perspicácia, subtileza ou atenção, já que, no frenético universo do consumo, o padrão é o do consumidor médio, razoavelmente informado, mas não particularmente atento às especificidades próprias das marcas”. Nesta matéria, “a regra de ouro da comparação entre sinais é que esta deve fazer-se através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores, como sublinha a jurisprudência comunitária, ao declarar que o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo e não procede a uma análise das suas diferentes particularidades”10. “Esta apreciação global deve, no que respeita à semelhança visual, auditiva ou conceptual das marcas em causa, basear-se na impressão de conjunto produzida pelas marcas, atendendo, designadamente, aos elementos distintivos e dominantes destas. (…) a percepção das marcas que tem o consumidor médio do tipo de produto ou serviço em causa desempenha papel determinante na apreciação global do risco de confusão. Ora, o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo e não procede a uma análise das suas diferentes particularidades”11 Assim, “é por intuição sintética e não por dissecação analítica” que deve proceder-se à comparação entre os sinais, já que "o que importa ter em conta é a impressão global, de conjunto, própria do público consumidor, que, desvalorizando pormenores, se concentra nos elementos fundamentais dotados de maior eficácia distintiva”.12 Ora, confrontado o público consumidor com os sinais em apreço – marcas nominativas PLAZA e HOTEL LISBOA PLAZA não será induzido em erro confundindo-as com a denominação da Ré que é ROSSIO PLAZA HOTEL. Do conjunto de tais sinais, como já resulta do exposto, face ao diminuto carácter distintivo das palavras “Hotel” e “Plaza”, o que prende a atenção do público consumidor é o elemento dotado de maior eficácia distintiva, respectivamente, LISBOA e ROSSIO, que face à sua tão acentuada diferença, não permite qualquer confusão entre eles. Refira-se ainda quanto às marcas nominativas, que a semelhança fonética adquire uma particular importância, pois os fonemas são retidos pela memória mais rapidamente que a grafia.13 Assim, é patente a diferença fonética que resulta do acto de pronunciar HOTEL LISBOA PLAZA e ROSSIO PLAZA HOTEL. Outro aspecto que assume significativa relevância prende-se com a força distintiva dos sinais em causa, uma vez que os sinais fortes tendem a perdurar especialmente na memória do consumidor14. É o caso dos referidos fonemas ROSSIO e LISBOA. b) Quanto ao sinal figurativo usado pela Ré: . Quanto ao sinal figurativo usado pela Ré, no âmbito da sua actividade comercial e ao qual se aplicam todos os considerandos supra expostos relativamente à denominação social, acresce que o risco de confusão com as marcas da Autor ainda é muito mais remoto. Repare-se que, para além da componente figurativa do sinal que, por si só, se destaca das componentes meramente nominativas das marcas da Autora, as palavras comuns “PLAZA HOTEL” aparecem escritas em letra de tamanho reduzido, dando evidente destaque à palavra ROSSIO que assume uma clara preponderância. Ou seja, necessariamente, o consumidor é levado a guardar na memória o nome que aparece destacado assegurando, também por isso, distintividade relativamente às marcas registadas da Autora que apenas apresentam sinais nominativos. Por isso, concluímos que, atendendo à visão de conjunto dos sinais em confronto, não são eles susceptíveis de gerar qualquer confusão no consumidor, por não haver entre eles semelhança que possa induzi-lo em erro, quanto á proveniência ou titularidade dos mesmos. c) Quanto aos domínios «rossioplaza.pt», «rossioplazahotel.com», «rossioplazahotel.pt» e «rossioplaza.hotel.com» Importa, por fim, analisar se existe similitude entre estes domínios da titularidade da Ré e as marcas registadas da Autora. Dispõe o art.º 9.º n.º 1 c) das Regras de Registo de Nomes de Domínio.pt que: “1. Para além das proibições previstas para cada hierarquia de .pt, o nome de domínio não pode: (…) c) Corresponder a nomes que induzam em erro ou confusão sobre a sua titularidade, nomeadamente por coincidirem com marcas notórias ou de prestígio pertencentes a outrem.” Ora, considerando o já acima exposto quanto ao sinal usado pela Ré e à denominação social desta e que tem aqui inteira aplicação, entendemos igualmente que os nomes de domínio usados pela Ré, ao incluírem o vocábulo “rossio” não se mostram susceptíveis de induzir em erro ou confusão sobre a sua titularidade pois é este vocábulo “rossio” que se apresenta com caracter distintivo, em relação à palavra Lisboa que integra uma das marcas da Autora, sendo as expressões “Hotel” e “plaza” de uso comum e banal no ramo da hotelaria e restauração. Também quanto aos domínios da titularidade da Ré, pelas razões expostas, está afastada a possibilidade de o consumidor ser levado a entender que a proveniência do estabelecimento hoteleiro da Autora é a mesma do estabelecimento hoteleiro da Ré, como a Autora invocou. Não parece provável que o público em geral, os operadores económicos e parceiros de negócio sejam levados a crer nessa origem empresarial comum ou que exista uma relação de grupo entre as empresas, ficando assim de algum modo postos em causa os direitos exclusivos que para a Autora resultam do registo das suas marcas. Saliente-se ainda que a pesquisa que o público consumidor fizer na internet, como é habitual neste tipo de serviços – reservas hoteleiras – através dos mencionados domínios, encontrarão o hotel da Ré ROSSIO PLAZA HOTEL , com todo o descritivo das respectivas qualidades e serviços disponíveis, não se vislumbrando que exista qualquer risco de confusão com o hotel que a Autora explora – HOTEL LISBOA PLAZA – e muito menos, que em consequência dessa confusão exista um risco de desvio da clientela. Como já ficou supra referido, na aferição da confundibilidade entre os sinais em análise, por parte do público consumidor, tem necessariamente de se ter em conta a natureza do bem ou do serviço abrangido. E, neste contexto, como resulta dos dados da experiência comum, o consumidor que pretende realizar uma reserva num hotel, para si ou para a família, quer seja em deslocação de trabalho quer seja em lazer, centra-se nas características do hotel, na localização, no tipo de serviços prestados, no preço, entre outros, sendo em geral pouco relevante, ou mesmo indiferente, a identificação da entidade proprietária ou a circunstância de pertencer a um determinado grupo empresarial15. Concluímos, assim, ao invés da conclusão a que chegou o Tribunal da Relação de Lisboa, que a denominação social da Ré, o sinal que usa no exercício da sua actividade, bem como os nomes de domínio de que é titular, por não apresentarem risco de confusão com as marcas da Autora, não violam os direitos de propriedade industrial que para esta decorrem da titularidade das suas marcas nacionais n.º 220048HOTEL LISBOA PLAZA e n.º 249185PLAZA. 2. Quanto à questão de saber se a Ré está vinculada ao dever de indemnizar pelos prejuízos causados à Autora, em consequência da violação dos direitos de propriedade industrial de que esta é titular, terá necessariamente de ter resposta negativa, em face da conclusão a que se chegou no ponto anterior. Com efeito, decorre do exposto, que não existe por parte da Ré a prática de quaisquer actos que possam ser qualificados como concorrência desleal, tal como vêm definidos no art.311.º do CPI e designadamente na alínea a) referindo-se aos “actos susceptíveis de criar confusão com a empresa, o estabelecimento , os produtos ou os serviços dos concorrentes(…)”. Assim sendo, não se verificando a violação ilícita de qualquer direito de propriedade industrial da Autora, por parte da Ré, falece o direito daquela a qualquer indemnização nos termos do disposto no art.º 347.º do CPI. IV - DECISÃO Por tudo o que fica exposto, acordam os Juízes desta 7.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, em conceder a revista, revogando o acórdão recorrido e por consequência, absolver a Ré/Recorrente dos pedidos contra a mesma formulados. Custas pela Autora/Recorrida. Lisboa, 18 de junho de 2024 Maria de Deus Correia (relatora) António Barateiro Martins Maria dos Prazeres Beleza _______ 1. Aprovado pelo D.L. n.º110/2018 de 10 de Dezembro, transpondo as Directivas (EU) 2015/2436 e (EU) 2016/943. 2. Demonstrativo do relevo desta matéria, precisamente em consequência do seu impacto no desenvolvimento económico, é o labor da União Europeia neste âmbito da protecção da propriedade industrial. Assim, na UE, o quadro jurídico das marcas registadas baseia-se num sistema de registo de marca a quatro níveis, que coexiste com os sistemas de marcas nacionais harmonizados através da diretiva sobre as marcas comerciais (Diretiva (UE) 2015/2436, de 16 de dezembro de 2015, que aproxima as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas). Para além das vias nacionais, outras vias possíveis para a proteção das marcas comunitárias são a via do Benelux, a marca da UE, introduzida em 1994, e a via internacional. O Regulamento (UE) 2017/1001, de 14 de junho de 2017, sobre a marca da União Europeia, codifica e substitui todos os anteriores regulamentos da CE sobre a marca da UE. A codificação foi realizada por motivos de clareza, dado que o sistema de marcas da UE já tinha sido objeto de alterações substanciais em várias ocasiões. A marca da UE tem caráter unitário e produz os mesmos efeitos em toda a UE. O Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) é responsável pela gestão da marca e do desenho ou modelo da UE. O regulamento sobre a marca da UE fixa igualmente os montantes das taxas a pagar ao EUIPO. São fixados a um nível que garante que as receitas que produzem cobrem as despesas do EUIPO e complementam os sistemas de marcas nacionais existentes.A Diretiva 98/71/CE, de 13 de outubro de 1998, aproximou as disposições nacionais em matéria de proteção jurídica dos desenhos e modelos. O Regulamento (CE) n.º 6/2002 do Conselho, de 12 de dezembro de 2001 (na sua versão alterada), instituiu um sistema comunitário para a proteção dos desenhos e modelos. A Decisão 2006/954/CE do Conselho e o Regulamento (CE) n.º 1891/2006 do Conselho, ambos de 18 de dezembro de 2006, ligaram o sistema de registo de desenhos ou modelos da UE ao sistema internacional de registo dos desenhos ou modelos industriais da OMPI. 3. Vide a este propósito FERRER CORREIA; Lições de Direito Comercial, I, 1973, p.283. 4. Acórdão do STJ de 28-09-2010, Processo 235/05.0TYLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt 5. Marcas nominativas são aquelas que integram um sinal ou conjunto de sinais nominativos, estando essencialmente em causa um fonema; marcas figurativas serão aquelas em que se usa uma dada figura ou emblema, encontrando-se fundamentalmente em jogo um desenho; marcas mistas integram simultaneamente elementos nominativos e elementos figurativos. Vide a este respeito CARLOS OLAVO, Propriedade Industrial, p.38. 6. São meros exemplos “Picoas Plaza”, “Olaias Plaza” ou “Amoreiras Plaza”. 7. PEDRO SOUSA E SILVA, Direito Industrial, Noções fundamentais, 2.ª Edição, Almedina, p.153. 8. Idem, p.154. 9. Acórdão de 13-07-2010, Processo n.º 3/05.9TYLSB.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt 10. PEDRO SOUSA E SILVA, ob.cit, p.173. 11. Vide Acórdão do TJUE, de 11-11-1997 caso SABEL BV/Puma AG, disponível in https://curia.europa.eu/juris 12. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18-03-2003, Processo 03A545, disponível em www.dgsi.pt 13. CARLOS OLAVO, ob.cit., p52. 14. Como se refere no Acórdão do STJ de 18-03-2003, Processo 03A545, já supra citado. 15. A menos que estivéssemos em presença de uma marca de prestígio que é aquela que goza de elevado grau de notoriedade junto do público, é a marca célebre ou famosa (v.g. Hotel Ritz). Sobre a distinção entre marca de prestígio e marca notória, Acórdão do STJ de 13-07-2010, Processo n.º 3/05.9TYLSB.P1.S1 |