Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
202/21.6YHLSB.L1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO BARATEIRO MARTINS
Descritores: PROPRIEDADE INTELECTUAL
PRINCÍPIO DA NOVIDADE
PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE
PRINCÍPIO DO PEDIDO
MARCAS
MARCA NOTÓRIA
CRITÉRIOS DE SELEÇÃO
PEDIDO GENÉRICO
USO PARA FIM DIVERSO
SINAIS DISTINTIVOS
Data do Acordão: 11/14/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA (PROPRIEDADE INTELECTUAL)
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
I - Não é genérico o pedido em que se pede a condenação da ré. a “cessar e abster-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, quaisquer sinais confundíveis (além de um concreto sinal mencionado) com as marcas registadas anteriores da autora, para distinguir quaisquer produtos os serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes”.

II - É certo que o juízo sobre a confundibilidade entre marcas tem de ser feito comparando sinais concretos e tendo presente o que decorre do princípio da especialidade, porém, tal questão, sobre o modo como deve ser feito o juízo de confundibilidade, contende já com o fundo/mérito e não com a ilegal formulação do pedido.

III - O princípio da economia processual, aliado ao dever de gestão material concedido ao juiz - ao dever de o juiz intervir com a finalidade de alcançar um resultado materialmente justo e eficiente - conduzem, hoje, a uma mitigação/flexibilização do princípio do pedido, admitindo-se que o juiz, em prol da efetividade do processo, face aos factos alegados e provados e respeitando os princípios da cooperação e do contraditório, possa decretar uma medida menos radical (que a pedida) e qualitativamente diferente, designadamente, se tal “medida” puder ser extraída como pedido subsidiário não expresso, mas relacionado com o pedido formulado pelo autor.

IV - Tendo o tribunal, na sentença, extraído e interpretado a parte do pedido, em que se aludia à cessação e abstenção de usar “qualquer outro sinal confundível com as marcas anteriores registadas da autora”, como se se referisse a 6 sinais mistos identificados pela autora na PI, passando a apreciar e a formular um concreto juízo de confundibilidade em relação a tais seis sinais mistos (juízo de confundibilidade esse invocado pela autora na PI e contraditado pela ré na contestação), acabando a decidir que três deles preenchiam o risco de confusão e que os restantes três não preenchiam tal risco de confusão e a condenar a ré a cessar e a abster-se de usar três de tais seis sinais mistos e “absolvendo do demais peticionado”, não pode a ré, apenas no recurso de revista, vir invocar que não foi ouvida sobre tal “reformulação” do pedido e que o Acórdão da Relação, ao condenar a ré a cessar e a abster-se de usar tais seis sinais mistos, condenou em objeto diverso do pedido (incorrendo na nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, al. e), do CPC).

V - Constituem as marcas comerciais sinais que geram na mente do público a noção de que tal sinal está a identificar um produto ou serviço e, ao mesmo tempo, estabelecem a ligação entre tal produto ou serviço e a fonte de onde o mesmo provém.

VI - Havendo marcas anteriores que gozem de prioridade, deve a “nova marca”, gozar de “novidade relativa”; o que - apreciação da “novidade relativa” - supõe a realização de uma dupla apreciação: sobre a identidade ou confundibilidade entre o “novo sinal” e os sinais que lhe sejam prioritários; e sobre a identidade ou afinidade/semelhança entre os produtos e serviços a que se destinam uns e outros.

VII - Devendo entender-se que se está perante produtos ou serviços afins/semelhantes quando os mesmos são concorrentes no mercado, quando têm a mesma finalidade ou utilidade e quando, aos olhos do consumidor, há entre eles uma possibilidade de uso substitutivo.

VIII - E devendo entender-se que há semelhança entre marcas quando haja o risco do público/consumidor poder crer que os produtos e serviços que a “nova marca” identifica provêm da empresa titular da “marca anterior”: quando a “nova marca” imite a “marca anterior” e isso gere risco de confusão no espírito de público/consumidor, podendo os traços de confundibilidade entre os sinais ter diversas origens - similitude gráfica, visual, fonética ou qualquer outra.

IX - Sendo que a apreciação da existência de tais traços de confundibilidade - a comparação entre os sinais - deve fazer-se globalmente, através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores, uma vez que o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo e não procede a uma análise das suas diferentes particularidades.

X - Aumentando a notoriedade da marca anterior/prioritária a suscetibilidade de erro/confusão no espírito do público, na medida em que liga mais facilmente a “nova marca” com a “marca anterior”, pelo que, embora a caraterização de uma marca anterior/prioritária, como notória, não seja um requisito de procedência dum “processo de infração”, tal caraterização altera os pressupostos de apreciação dos riscos de confusão e/ou associação.

XI - Devendo entender-se por marca notoriamente conhecida, a marca que é reconhecida pelo grande público consumidor como distinguindo de uma forma imediata um determinado produto ou serviço; sendo fatores indicativos para determinar se uma marca é notoriamente conhecida, designadamente, o grau de conhecimento da marca junto dos meios interessados; a duração, extensão e âmbito geográfico do uso da marca; a duração, extensão e âmbito geográfico de promoção da marca; a duração e âmbito geográfico dos registos da marca; o número de decisões favoráveis ao reconhecimento da marca como notoriamente conhecida.

XII - A comparação das marcas nominativas, tenham ou não significado conceptual, pode ser feita nos planos visual (o menos importante), fonético e ideográfico/concetual.

XIII - Na marca mista, em que coexistem elementos nominativos e figurativos, o elemento nominativo deve, via de regra, ser considerado como o elemento predominante, pois o consumidor médio fará mais facilmente referência ao produto em causa citando o nome desse produto do que descrevendo o elemento figurativo da marca.

XIV - Sendo a autora titular de várias marcas (anteriores) nominativas, em que sempre a letra/elemento “M” é seguida por uma palavra ou algarismo, ocorre similitude concetual com marcas (posteriores) mistas da ré em que o “M” dos sinais da ré é seguido de uma letra ou de uma palavra, podendo fazer acreditar o público/consumidor que os serviços ou produtos identificados por tais 3 marcas mistas são provenientes da mesma fonte de que provêm os produtos identificados pelas marcas da autora; pelo que, em face de tais similitudes fonética e concetual, há o significativo risco do público/consumidor poder acreditar que tais 3 marcas mistas da ré não são mais do que mais uma marca “M” da autora.

XV - O risco de confusão compreende as situações que o público/consumidor, até admitindo que os produtos ou serviços possam ter origem diferente, incorre no risco de pensar que existe alguma ligação, seja meramente económica e/ou comercial, entre as fontes dos produtos ou serviços assinalados (a proteção da marca registada estende-se à prevenção de qualquer associação indevida que possa prejudicar o valor distintivo e o selling power da marca registada).

XVI - Um DPI, enquanto não se extinguir por efeito de uma decisão transitada em julgado, continua a produzir plenamente os seus efeitos, ou seja, a questão da extinção de um DPI não pode ser suscitada e conhecida a título meramente incidental, porém, o RMUE, no seu art. 127.º, n.º 3 (e o art. 252.º do CPI), admite que seja suscitada a extinção de uma marca sem ser por via reconvencional — como sucede no caso de se invocar não existir uso sério nos últimos cinco anos anteriores à instauração da ação - o que configura defesa por exceção, que tem de ser suscitada logo na contestação (e não apenas nas alegações do recurso de revista), em obediência ao princípio da concentração da defesa constante do art. 573.º do CPC.

XVII - O nome de domínio não pode corresponder à reprodução de uma marca de terceiro de conhecimento amplo e generalizado.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I - Relatório

BAYERISCHE MOTOREN WERKE AKTIENGESELLSCHAFT, sociedade comercial alemã com sede em ... (abreviadamente, BMW) instaurou contra TOPCHALLENGE, SGPS, S.A. e NÚMERO UM – REPARAÇÃO DE AUTOMÓVEIS, S.A., com os sinais dos autos, a presente ação de processo comum, pedindo que estas sejam condenadas:

a. A cessarem e absterem-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, a designação M, MFORCE, ou qualquer outro sinal confundível com as marcas M da Autora, no âmbito da sua atividade comercial de serviços (oficinas) de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos ou serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes;

b. A remover e a destruir, a expensas suas, todos os suportes físicos e materiais na sua posse donde conste a designação M, MFORCE, nomeadamente fachadas das oficinas, expositores, móveis, materiais impressos ou institucionais e qualquer outro suporte físico exposto ou usado no interior das oficinas;

c. A remover todas as referências a M, MFORCE ou a OFICINASMFORCE dos sítios de internet das Rés, nas redes sociais Facebook, Instagram, Youtube, Linkedin ou outras ou em qualquer outro formato ou plataforma digital de comunicação comercial;

d. A eliminar todas as fotografias das suas oficinas MFORCE dos sítios de internet das Rés, nas redes sociais Facebook, Instagram, Youtube, Linkedin ou outras ou em qualquer outro formato ou plataforma digital de comunicação comercial;

e. No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, calculada em € 10.000,00 (dez mil euros) por cada dia de atraso no cumprimento da sentença;

E, ainda, “que seja ordenado o cancelamento do nome de domínio “oficinasmforce.pt”, mediante ordem a dirigir à Associação DNS.PT, com sede em Rua ..., ... ..., e com o endereço de e-mail ...”.

Alegou, muito sinteticamente, que é “proprietária da conhecida e prestigiada família de marcas “M”, as quais se encontram protegidas através de vários registos da União Europeia” e que as RR., disso conhecedoras, “no outono de 2022, procederam ao rebranding da sua rede de oficinas automóvel, tendo adotado a designação Mforce” e vários sinais mistos a partir de tal designação, com o que “imitam de forma flagrante as prestigiadas marcas “M” da A.”, sendo que a forma como o fizeram “corresponde a uma estratégia intencional de aproveitamento da notoriedade e reputação das marcas “M” da A.”.

Regularmente citadas, as RR. apresentaram contestação, impugnando as violações das marcas invocadas pela A. e deduzindo pedido reconvencional consistente na declaração de nulidade do registo da marca U.E. nº 7134158 “M”.

A A. replicou, pedindo a absolvição do pedido reconvencional.

Realizada a audiência prévia, procedeu-se à prolação de despacho saneador – em que se julgou a instância regular, estado em que se mantém – e de despacho a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas da prova.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, a Exma. Juíza proferiu sentença, em 9 de junho de 2023 (completada por despacho de 15.11.2023, que apreciou a nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão), em que decidiu:

“(…)

Julgar parcialmente procedente a ação, e, em consequência, condenar as Rés TOPCHALLENGE, SGPS, S.A. e NÚMERO UM – REPARAÇÃO DE AUTOMÓVEIS, S.A.

a. A cessarem e absterem-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, no âmbito da sua atividade comercial de serviços (oficinas) de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos ou serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes, o sinal verbal “MForce” e os seguintes sinais:
e


b. A removerem e a destruírem, a expensas suas, todos os suportes físicos e materiais na sua posse donde constem os sinais referidos em a), nomeadamente fachadas das oficinas, expositores, móveis, materiais impressos ou institucionais e qualquer outro suporte físico exposto ou usado no interior das oficinas;

c. A removerem todas as referências com os sinais referidos em a) dos sítios de internet das Rés, nas redes sociais Facebook, Instagram, Youtube, Linkedin ou outras ou em qualquer outro formato ou plataforma digital de comunicação comercial;

d. No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor de € 500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento da sentença;

Absolvendo as RR. do demais peticionado.

E julgar o pedido reconvencional improcedente e absolver a Autora do correspondente pedido. (…)”

Inconformadas com tal decisão, dela interpuseram recursos de apelação quer a A. quer as RR., tendo-se, por Acórdão da Relação de Lisboa, proferido em 08/01/2024, concedido total provimento ao recurso da A. e julgado totalmente improcedente o recurso das RR., em função do que, confirmando-se em parte e revogando-se em parte a sentença recorrida, passaram as RR. a ser/ficar condenadas:

“(…)

a. A cessarem e absterem-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, no âmbito da sua atividade comercial de serviços (oficinas) de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos ou serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes, o uso da designação verbal MFORCE e dos seguintes sinais:












e

b. A removerem e a destruírem, a expensas suas, todos os suportes físicos e materiais na sua posse donde constem os sinais referidos em a), nomeadamente fachadas das oficinas, expositores, móveis, materiais impressos ou institucionais e qualquer outro suporte físico exposto ou usado no interior das oficinas;

c. A removerem todas as referências com os sinais referidos em a) e a referência a OFICINASMFORCE dos sítios de internet das Rés, nas redes sociais Facebook, Instagram, Youtube, Linkedin ou outras ou em qualquer outro formato ou plataforma digital de comunicação comercial;

d. No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor de € 500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento da sentença.

e. Mais determinamos o cancelamento do nome de domínio “oficinasmforce.pt”, mediante ordem a dirigir à Associação DNS.PT, com sede em Rua ..., ... ..., e com o endereço de e-mail ....

Mantendo-se a absolvição da A. quanto à reconvenção. (…)”

Ainda inconformados, interpõem agora as RR. o presente recurso de revista, visando a revogação do Acórdão da Relação e a sua substituição por decisão que as absolva dos pedidos formulados na ação e que condene a A. no pedido reconvencional.

Terminaram a sua alegação com as seguintes conclusões:

“(…)

1. O Tribunal a quo violou leis de processo, ao dar provimento a novos pedidos formulados pela Autora em sede de recurso de apelação, mas que não têm correspondência e ultrapassam os pedidos que formulou na Petição Inicial.

2. Por consequência, os pontos I. a., b. e c. do dispositivo do acórdão recorrido, na parte em que se refere aos sinais mistos aí representados, devem ser declaradosnulos, com os fundamentos previstos no artigo 615.º, n.º 1, alínea e) (O juiz condene em objeto diverso do pedido) do CPC – cf. artigo 674º, n.º 1, alínea c) do CPC.

3. Por a arguida nulidade decorrer do previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 615.ºdo CPC,pede-se a este Supremo Tribunal (nos termos do artigo 684.º, n.º 1 do CPC) que se digne supriressa nulidade,suprimindo os sinais mistos acima reproduzidos (e as remissões para os mesmos), dos pontos I. a., b. e c. do dispositivo do acórdão recorrido.

4. Na Petição Inicial a Autora formulou o pedido de condenação das Rés a «a. Cessarem e absterem-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, a designação M, MFORCE, ou qualquer outro sinal confundível com as marcas M da Autora (…)», sendo o trecho sublinhado deste pedido genérico e, como tal, deve ser julgado improcedente.

5. Sobre esta questão, veja-se o douto Acórdão da Conferência da Relação de Lisboa, de 12/10/2022 (Proc. n.º 297/21.2YHLSB.L1, Ref.ª ......32 – ao que se sabe, não publicado), em que estava em causa um pedido semelhante – de proibição do uso de «quaisquer outros sinais distintivos de comércio que contenham a palavra ’pantera’».

6. O mencionado pedido genérico, não é admitido pelo artigo 556.º do CPC, sendo indefinido, por a Autora pretender, antecipadamente, a proibição do uso de «qualquer outro sinal confundível com as marcas M da Autora (…)», o que apenas em concreto poderá vir a ser decidido judicialmente.

7. Em suma, o pedido genérico da parte final do ponto a. da P.I., deve ser julgado improcedente, por processualmente inadmissível, por violar o disposto no artigo 556.º do CPC, e, naturalmente, ser o acórdão recorrido revogado na parte em que julgou procedente esse pedido.

8. O Tribunal a quo considerou que, em face da matéria de facto dada por assente, a marca nominativa M da Autora, é uma marca notória, na acepção do n.º 1 do artigo 234.º do CPI.

9. A qualificação de uma marca como notória constitui uma questão de direito, e, como tal, enquadra-se no âmbito deste recurso – cf. artigo 674.º, n.º 1, alínea a) do CPC.

10. Partindo da matéria de facto dada por provada, e colocando-nos na perspectiva do consumidor médio, afigura-se que a marca da União Europeia n.º 007134158, M (nominativa), não pode ser qualificada como marca notória.

11. Os factos provados 49. a 52., não permitem, de modo nenhum, concluir que a marca nominativa “M” da Autora é notória, a menos que sejam sopesados com muita bondade.

12. Nesta acção, a Autora defende que a sua marca nominativa M goza do estatuto de MARCA NOTÓRIA, apesar de ter oferecido como meio de prova a sondagem «concebid(a) para determinar se a marca M é uma “MARCA DE PRESTÍGIO” na aceção do Regulamento sobre a Marca da União Europeia» - sublinhado por nós.

13. Portanto, a própria Autora,ao utilizar a mencionada sondagem como meio de prova, tomou a iniciativa de fazer um “downgrade” do estatuto da sua marca nominativa M, de marca de prestígiopara marca notória,o que revela que a própria Autora tem alguma falta de confiança nos resultados do estudo de mercado.

14. Conforme as Recorrentes já alegaram na sua apelação, suscitam-se duvidas sobre a interpretação – senão mesmo sobre a credibilidade – dos resultados da dita sondagem, designadamente sobre se o objecto da mesma foi, efectivamente, a marca nominativa M.

15. Se bem se analisarem as respostas dadas, constata-se que se referem ao «logótipo M da BMW» e não à marca M, como seria suposto esperar – vd. respostas constantes dos factos provados 51.1. e 51.3.

16. Apesar de no facto 50. se dizer que a referida sondagem assentou em «um questionário padronizado com a mesma redação traduzido para a língua de cada país», os resultados obtidos no facto provado 52., «Relativamente aos 1002 inquéritos realizados em Portugal, do referido Estudo», referem-se, repetidamente, à «marca M» - e já não ao «logótipo M da BMW», como nas respostas dos factos 51.1. e 51.3.

17. Essa divergência na “tradução” dos resultados da dita sondagem justifica duvidarda credibilidade intrínsecado referido estudodenotoriedade,posto que, como se disse, à mesma questão, alegadamente colocada em todos os países, por igual, nuns países as respostas colhidas são sobre o «logótipo M da BMW», enquanto em Portugal são apresentados como se fossem sobre a «marca M»…

18. Se as questões sobre a notoriedade foram sobre o «logótipo M da BMW», é manifesto que são perguntas indutoras de respostas, por indicarem que o «logótipo M» (sinal misto) pertence à BMW – esta sim, inquestionavelmente, uma marca de prestígio.

19. Como pode falar-se de «notoriedade espontânea» (cit. facto 51.1) da marca nominativa M, quando a questão que foi colocada era formulada, de modo a induzir as respostas, sobre o «logótipo M da BMW» e não sobre a «marca M», exclusivamente nominativa?

20. Devem interpretar-se os factos provados nos pontos 51. e 52., como não referentes à marca exclusivamente nominativa M, da Autora, mas sobre a sua Marca da União Europeia n.º 18001234 (cf. facto provado 14.2), essa sim constituída pelo logótipo M (no sentido corrente):Uma imagem com captura de ecrã, Retângulo, design Descrição gerada automaticamente

21. A mesma forma enviesada de as instâncias reconhecerem à marca nominativa M a notoriedade de outros sinais distintivos da BMW (como o acima reproduzido), extrai-se dos factos provados 47 e 48.

22. O facto 47. refere-se ao «número de veículos comercializados» em vários países europeus (não incluindo Portugal), «ostentando as marcas M2, M3, M4, M5, M6, M Perfomance e M Sport»… mas não inclui nenhum veículo com a marca nominativa M.

23. E o facto 48. refere-se ao «volume de negócios» em vários países europeus (não incluindo Portugal), «dos produtos da BMW ostentando as marcas M2, M3, M4, M5, M6, M Perfomance» -… mais uma vez nada se dizendo sobre o volume de negócios da marca nominativa M.

24. Ou seja, as instâncias concluíram ser a marca M notória, não por causa de qualquer estudo de notoriedade sobre essa marca (nominativa), nem com base no número de veículos comercializados sob a marca M, nem a partir do volume de negócios adveniente douso da marca M, mas com base em valores atribuíveis a outras marcas e ao «logótipo M da BMW»Uma imagem com design, tapete Descrição gerada automaticamente

25. Aliás, se bem se analisar a decisão sobre matéria de facto, o que resulta impressivo é a ausência total de factos provados sobre o uso da marca nominativa M, que as instâncias “deduziram” a partir do uso de outras marcas da BMW.

26. O que se retira da matéria de facto dada por provada é que não existe nenhuma base factual para se concluir que o consumidor médio de veículos (português ou europeu), sequer conheça a marca nominativa M, visto que nenhum facto provado respeita, especificamente, ao uso dessa marca–como se alertou acima,a respeitodas respostas à “sondagem”para Portugal, algo foi “lost in translation”...

27. Aliás, na decisão sobre matéria de facto refere-se a «marca M», certamente por facilidade de exposição, mesmo quando não é a marca nominativa que está em causa, mas sim a marca mista

28. A título exemplificativo, veja-se o facto provado 59. (manifestamente conclusivo), relativoao uso da«marca M» paraveículos desportivos,apesar de não existir nenhum outro facto, em concreto, demonstrativo do uso da marca nominativa M.

29. Tal conclusão só é possível para quem confundir a marca nominativa M com a marca mista e outras.

30. Essa “confusão” é particularmente relevante para a decisão, por na douta sentença se ter considerado – e muito bem! – que no que concerne à marca , «de natureza figurativa, o distanciamento em relação aos sinais da Ré é ainda mais evidente» - cit. ponto 3.1.10 C), pág. 27 da sentença.

31. Portanto, afigura-se um equívoco “misturarem-se” as referências às marcas nominativa M e mista  , como se apenas de uma única marca se tratasse, e a partir desse erro, atribuir-se à marca nominativa benefícios que só seriam devidos à marca mista.

32. Esse erro de análise resulta da imprecisão da redacção dos supra referidos pontos da matéria de facto, inicialmente explicável, como se disse, por mera facilidade de exposição, mas que, depois, se torna numa interpretação errada da própria redacção “abreviada” desses factos.

33. São disso exemplo, os factos provados 71. e 72., com a redacção seguinte:

71. A página oficial da “BMW M” na rede social Instagram conta com 8,4 milhões de seguidores.

72. Também a página oficial da “BMW M” na rede social Facebook tinha à data da propositura da ação mais de 5 milhões de seguidores.

34. Ora, para além de os referidos números de seguidores serem quantitativamente inexpressivos (a «BMW M» conta com 8,4 milhões de seguidores no Instagram, enquanto Cristiano Ronaldo conta com 621 milhões de seguidores – Cristiano Ronaldo (@cristiano) • fotos e vídeos do Instagram),

35. consta-se que os mencionados perfis do Facebook e do Instagram, denominados por «BMW M», não são nomeados pela marca nominativa,

mas pelo sinal misto .

BMW M GmbH (@bmwm) • fotos e vídeos do Instagram

Facebook

36. Como se crê ter ficado demonstrado, as referências à «marca M» que são feitas na decisão sobre matéria de facto, pautam-se por falta de rigor, e devem ser interpretadas como respeitando a outras marcas da BMW com a letra M (combinadas com números e palavras), e/ou, aos «logótipos M»

- ou  .

37. Em suma, a factualidade dada por provada não permite concluir, de modo nenhum, que a marca nominativa, exclusivamente constituída pela letra M, da BMW, seja uma marca notória, sendo até duvidoso que essa marca seja sequer utilizada.

38. Na realidade, sendo bem interpretada a matéria de facto dada por provada, não existe nenhuma evidência de que marca da União Europeia n.º 007134158, M, tenha sido sequer objecto de uso sério, nos últimos cinco anos anteriores à instauração da acção tramitada nos autos.

39. Ou seja, no caso da marca M, a Autora não logrou cumprir o ónus da prova previsto no n.º 1 do artigo 252.º do CPI - cf. artigo 267.º, n.º 1 do CPI.

40. Nos termos desse preceito legal, a Autora nem sequer tem legitimidade substancial para opor às Rés a titularidade da referida marca nominativa M – isto, sem conceder sobre a ausência de qualquer infração a essa marca ou outra da Autora, decorrente da utilização pelas Rés dos sinais MFORCE, nominativos e mistos.

41. O reconhecimento do estatuto de marca notória constituir matéria de direito, pedindo-se aos Venerandos Conselheiros que se dignem não atribuir essa qualificação à marca da União Europeia n.º 007134158, M.

42. A marca da União Europeia n.º 007134158, M, constituída por uma única letra e que não é objecto de uso sério é totalmente desprovida de distintividade – e, por isso, adiante se defenderá a procedência do pedido reconvencional de declaração de nulidade dessa marca.

43. Sem conceder, sempre se dirá que os sinais distintivos MFORCE não se confundem com nenhuma das marcas da Autora, nem se perfila um qualquer risco de associação entre umas e outras.

44. As Rés criaram a expressão de fantasia MFORCE, em na sua vertente mista, combinaram essa expressão com outros elementos gráficos e figurativos, incluído cores (totalmente distintas das utilizadas nas marcas da Autora), que reforçam a insusceptibilidade de erro ou confusão fácil com as marcas da Autora.

45. Se a Autora criou uma marca fraca, não pode agora pretender que detém um direito de exclusivo sobre uma letra do alfabeto, de forma tão extensiva e absoluta que impeça terceiros de a utilizar na constituição de novas marcas.

46. Neste sentido, no acórdão da Relação de Lisboa de 26/11/2009 (Proc.º 33/06.3TYLSB.L1-6 – in dgsi.pt), concluiu-se:

«6. No caso das marcas «fracas», por integrarem elementos com pouca capacidade distintiva, insusceptíveis de apropriação, pode bastar uma pequena variação para afastar o juízo de confundibilidade, enquanto nas marcas «fortes» o grau de exigência é maior, sendo necessária uma diferença de tipo para afastar esse juízo».

47. Com (muito) interesse para o caso, veja-se ainda o acórdão do Tribunal a Relação de Lisboa de 23/11/2022 (Proc. n.º 454/21.1YHLSB.L1, publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 122/2023, de 26/06/2023, págs. 6 a 64), confirmado, a final, pelo acórdão da 7.ª Secção deste Supremo Tribunal de Justiça de 27/04/2023 (Proc. n.º 454/21.1YHLSB.L1.S1 – in dgsi.pt)

48. Esse douto acórdão da Relação (aliás, confirmativo de sentença de 28/09/2022 e, esta, confirmativa de decisão do INPI), rejeitou o recurso da BMW contra a concessão do registo da marca nacional n.º 657862

49. Opondo a BMW a sua marca nominativa M e as marcas mistas “logo M” também invocadas nos presentes autos, a Relação de Lisboa fundamentou a concessão da marca na insuscptibilidade de erro ou confusão, compreendendo a não associação.

50. Deste acórdão recorreu a BMW para o STJ, advogando a oposição de acórdãos, tendo o STJ decidido, por acórdão de 27/04/2027, rejeitar esse recurso.

51. Mutatis mutandis, afigura-se linear que o entendimento que foi perfilhado sobre a marca MCARS pelas instâncias e Supremo Tribunal de Justiça no referido processo deve ser seguido no presente,

52. Com efeito, as semelhanças da marca MCARS com as marcas da BMW eram bem maiores do que in casu.

53. Acrescente-se que na presente acção as instâncias desvalorizaram vários factos, sem para tanto oferecerem uma justificação plausível provavelmente por contrariarem o mesmo entendimento de partida e chegada.

54. No facto 35., em que é dado provado que «Outro fabricante de veículos automóveis, a NISSAN, é a titular de vários registos de marca que incluem igualmente a letra “M” na sua composição conjugada com outros elementos, letras ou números, nomeadamente (…)» as marcas “MM” (nominativa), “M37” (nominativa); “M30D” (nominativa), “M56” (nominativa), “M35” (nominativa), “M35h” (nominativa) e “M45” nominativa) – sublinhado por nós.

55. E as instâncias também desvalorizaram a coexistência relevante de várias marcas constituídas com a letra M, referida no facto provado 36: «Existemaindaregistadas as seguintesmarcasconstituídas pela letra “M” estilizada, que estão registadas no âmbito da classe 37ª:», entre as quais destacamos a marca no ponto 36.2., Uma imagem com prateado, círculo, símbolo, roda Descrição gerada automaticamenteda MAZDA MOTOR CORPORATION, que assinala produtos das classes 12.ª e 37.ª – acima listados.

56. Destacam-se também os factos provados 85. e 86. sobre «O uso no comércio das designações “Classe M” e “Classe ML” pela Mercedes-Benz-AG» e «O uso no comércio de marcas M da Nissan».

57. Embora a utilização dessas marcas no comércio tenha sido objecto de um acordo confidencial entre as interessadas, importa destacar que os consumidores desconhecem a existência desses acordos, confrontando-se no giro do comércio com várias marcas M.

58. Na mesma senda de desvalorização sistemática dos factos que contradissessem as teses das instâncias (de reconhecimento do carácter “notório” a uma marca que nem sequer se provou ser usada e do “direito de exclusivo” da BMW sobre a letra M), foram ainda ignoradas – mais uma vez sem justificação plausível -, as marcas da União Europeia n.ºs 94623 e 10050656, respectivamente,





ambas destinadas a assinalar “serviços de construção e reparação”, da classe 37.ª – cfr. factos provados 43. e 44., que aqui se dão por reproduzidos.

59.Resulta do acima alegado que não pode ser reconhecido à Autora um “direito de exclusivo” sobre a letra M, nem de facto, nem de direito.

60.A comparação a fazer é entre os sinais distintivos nominativos e mistos utilizados pelas Rés

MFORCE

OFICINASMFORCE






e

com as marcas da BMW.

61. A única semelhança que se pode encontrar entre essas marcas é a utilização da letra M.

62. No entanto, os sinais utilizados pelas Rés combinam a letra M com outras expressões ou figuras, incluindo neste caso, a utilização de “letterings” específicos, elementos de “design” e cores, que no seu conjunto afastam a susceptibilidade de o consumidor as confundir facilmente.

63. Não ao acaso, na douta sentença proferida nos autos considerou-se – e bem – que, no que concerne à marca , «de natureza figurativa, o distanciamento em relação aos sinais da Ré é ainda mais evidente.» - cit. ponto 3.1.10 C), pág. 27 da sentença.

64. Com efeito, os sinais distintivos de fantasia utilizados pelas Rés possuem um carácter distintivo elevado, que é manifestamente diverso das marcas da BMW.

65. Bem demonstrativo da impossibilidade de erro ou confusão fácil (ou não) entre os sinais em confronto, o que emerge das prolixas alegações da Autora, é a gritante ausência de invocação pela Autora de um singelo caso concreto em que se tivesse verificado um erro, uma confusão, uma associaçãode algum dossinaisMFORCE com alguma das marcas daBMW.

67. Por não se verificar in casu o requisito de imitação de marca da confundibilidade fácil - artigo 238.º, n.º 1, alínea c) do CPI –, conclui-se que os sinais distintivos MFORCE não infringem os direitos de marca da Autora,e,consequentemente,apresenteacção de infracçãodeve serjulgada improcedente, por não provada.

68. A marcadaUnião Europeian.º 7134158, M, daAutora,estánessasituação, na medida em que corresponde a um registo de uma simples letra sem qualquer estilização que lhe confira a necessária eficácia distintiva.

69. Essa marca incorre no disposto no artigo 7.º, nº 1, al. b) do RMUE, por ser desprovida de qualquer carácter distintivo.

70. A ausência de carácter distintivo na marca da União Europeia n.º 7134158, M, constitui uma causa de nulidade absoluta nos termos do artigo 7 (1) (b), ex vi do artigo 59 (1) (a) do RMUE.

71. Nestes pressupostos, o acórdão recorrido incorre em obscuridade, ao considerar que a Autora demonstrou que a marca nominativa M possui distintividade, em função dos resultados de uma sondagem (facto provado 49), cujas respostas ao questionário (cf. facto 51.1.) têm na sua base, afinal, o «logótipo M da BMW».

72. Concluindo-se que a marca da União Europeia n.º 7134158, M, foi registada contrariando o disposto no artigo 7.º (1) (b), deve ser declarada a nulidade do respectivo registo, nos termos do artigo 59.º (1) a) do RMUE, julgando procedente a reconvenção, por provada.

(…)”

A A. respondeu, sustentando que o Acórdão recorrido não violou qualquer norma processual ou substantiva, designadamente, as referidas pelas recorrentes, pelo que deve ser mantido nos seus precisos termos; devendo a revista ser rejeitada nas partes em que existe dupla conforme e julgada totalmente improcedente na parte restante.

Obtidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.


*

*


II – Quanto à admissibilidade da revista

Como resulta do relato inicial, a 1.ª Instância, por sentença de 9/06/2023 (completada por despacho de 15.11.2023, que apreciou a nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão) decidiu:

1. Julgar parcialmente procedente a ação, e, em consequência, condenar as Rés:

a. A cessarem e absterem-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, no âmbito da sua atividade comercial de serviços (oficinas) de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos ou serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes, o sinal verbal “MForce” e os seguintes sinais:


e


b. A removerem e a destruírem, a expensas suas, todos os suportes físicos e materiais na sua posse donde constem os sinais referidos em a), nomeadamente fachadas das oficinas, expositores, móveis, materiais impressos ou institucionais e qualquer outro suporte físico exposto ou usado no interior das oficinas;

c. A removerem todas as referências com os sinais referidos em a) dos sítios de internet das Rés, nas redes sociais Facebook, Instagram, Youtube, Linkedin ou outras ou em qualquer outro formato ou plataforma digital de comunicação comercial;

d. No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor de € 500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento da sentença;

2. Absolver a Ré do demais peticionado na ação.

3. Julgar o pedido reconvencional improcedente e absolver a Autora de tal pedido.

E tendo a Autora e as Rés apelado da sentença de 1.ª Instância, o Tribunal da Relação de Lisboa, no acórdão proferido em 08/01/2024, julgou, por unanimidade, o recurso da Autora totalmente procedente e o recurso das Rés totalmente improcedente, em função do que condenou as Rés:

a. A cessarem e absterem-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, no âmbito da sua atividade comercial de serviços (oficinas) de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos ou serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes, o uso da designação verbal

MFORCE e dos seguintes sinais:



















e

b. A removerem e a destruírem, a expensas suas, todos os suportes físicos e materiais na sua posse donde constem os sinais referidos em a), nomeadamente fachadas das oficinas, expositores, móveis, materiais impressos ou institucionais e qualquer outro suporte físico exposto ou usado no interior das oficinas;

c. A removerem todas as referências com os sinais referidos em a) e a referência a OFICINASMFORCE dos sítios de internet das Rés, nas redes sociais Facebook, Instagram, Youtube, Linkedin ou outras ou em qualquer outro formato ou plataforma digital de comunicação comercial;

d. No pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor de € 500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento da sentença.

Determinando ainda o cancelamento do nome de domínio “oficinasmforce.pt”, mediante ordem a dirigir à Associação DNS.PT, com sede em Rua ..., ... ..., e com o endereço de e-mail ....

E mantendo a absolvição da A. quanto ao pedido reconvencional.

É pois evidente que o Acórdão da Relação recorrido confirmou, sem voto de vencido, a condenação que havia sido imposta às Rés pela sentença da 1.ª Instância, acrescentando-lhe – aqui se situando a divergência – a cessação e a abstenção do uso (por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, no âmbito da sua atividade comercial de serviços/oficinas de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos ou serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes) de mais três sinais, mais exatamente, dos três seguintes sinais:




Do mesmo modo também o Acórdão da Relação recorrido confirmou, sem voto de vencido, a improcedência do pedido reconvencional e a respetiva absolvição da Autora.

Sucedendo que a confirmação, por parte da Relação, da sentença da 1.ª Instância – confirmação parcial em relação à ação e confirmação total em relação à reconvenção – assentou em fundamentação totalmente idêntica.

Quanto à ação, entenderam ambas as Instâncias, identicamente, verificar-se o risco de confusão entre os sinais das Rés (de que foi decretada a cessação e abstenção do uso quer na sentença quer no acórdão da Relação) e as marcas prioritárias da BMW/Autora.

Quanto à reconvenção, entenderam ambas as Instâncias, identicamente, que o registo da marca da UE n.º 7134158 M não padece de nulidade, como as Rés haviam invocado, por falta de capacidade distintiva.

Estamos pois perante uma situação de dupla conforme que, de acordo e nos termos do disposto no artigo 671.º/3 do CPC, dita a irrecorribilidade – a inadmissibilidade de revista – da decisão de condenação das Rés/Recorrentes relativamente à designação verbal MForce e aos sinais

 e , bem como dita a irrecorribilidade da decisão de absolvição da BMW do pedido reconvencional, pois, em síntese, o Acórdão da Relação recorrido foi proferido sem que tenha sido emitido qualquer voto de vencido e a fundamentação que conduziu a tal condenação e absolvição é idêntica à da decisão da 1.ª instância1.

Por conseguinte:

Não se admite a revista na parte que tem por objeto o pagamento da sanção pecuniária compulsória.

Não se admite a revista na parte que tem como objeto a reconvenção.

Admite-se a revista na parte que tem por objeto os restantes sinais, mais exatamente, os sinais:













*

III – Fundamentação de Facto

III – A – Factos Provados

1. A Ré Topchallenge, SGPS, S.A. é uma sociedade comercial que tem por objeto “Gestão de Participações sociais de outras sociedades como forma indireta de exercício de atividades económicas”.

2. A Topchallenge, SGPS, SA tem um capital social de € 31.425.756,00 (trinta e um milhões quatrocentos e vinte e cinco mil setecentos e cinquenta e seis euros) e os seguintes membros do Conselho de Administração para o quadriénio 2019-2022: AA (...); BB (...); e CC (...).

3. Segundo o Registo Central do Beneficiário Efetivo, o Beneficiário Efetivo da Ré Topchallenge é o ...do Conselho de Administração, AA, o qual detém uma percentagem de 51% do capital social da sociedade.

4. A Ré “Número Um – Reparações de Automóveis, S.A.” é uma sociedade comercial que tem por objeto “Revisão e reparação de automóveis e a venda de peças e acessórios de automóveis. Revisão e reparação de motociclos e a venda de peças e acessórios de motociclos. Compra e venda de motociclos e de veículos automóveis”.

5. A “Número Um – Reparação de Automóveis, SA” tem um capital social de € 1.112.300,00 e os seguintes membros do Conselho de Administração para o quadriénio 2019-2022: AA (...; BB (...); e CC (...).

6. Segundo o Registo Central do Beneficiário Efetivo, o Beneficiário Efetivo da Ré Número Um é o ... do Conselho de Administração, AA.

7. No outono de 2020, as Rés procederam ao rebranding da sua rede de oficinas automóvel, tendo adotado a designação MForce, a qual têm vindo a usar desde então.

8. A BMW é uma empresa mundialmente conhecida, sendo fabricante de veículos automóveis, motociclos e suas peças e acessórios.

9. A origem da BMW remonta a 1916, com o fabrico de motores para aviões.

10. Desde então, a BMW passou também a fabricar motores para outros tipos de veículos.

11. Em 1923, a BMW lançou o seu primeiro modelo de motociclo e, cinco anos depois, em 1928, iniciou a atividade de produção de veículos automóveis.

12. Atualmente, o Grupo BMW conta com mais de 125 mil colaboradores em todo o mundo.

13. Tendo 31 unidades de fabrico e montagem em 15 países e uma rede de pontos de venda global.

14. A BMW é titular de diversos registos de marca M, nomeadamente, os seguintes:

14.1. Marca da União Europeia (nominativa) n.º 007134158 M, requerida em 05.08.2008 e registada em 24.11.2009, para assinalar automóveis e peças para os mesmos; acessórios para veículos automóveis, incluídos na classe 12;

14.2. Marca da União Europeia n.º 18001234, , requerida em 18.12.2018 e registada em 20.01.2021, para assinalar, entre outros, veículos; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos, na classe 12.

14.3. Marca de registo internacional n.º 1456163, , com designação da União Europeia, registada em 17.01.2019, com reivindicação de prioridade de 09.08.2018, e que assinala “vehicles and conveyances; powertrains, including engines and motors, for land vehicles; parts and fittings for vehicles as well as wheels and tyres, and continuous tracks for vehicles, hub caps”, na classe 12;

14.4. Marca da União Europeia n.º 18001222 , , requerida em 18.12.2018 e registada em 20.01.2021, para assinalar, entre outros, veículos; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos, na classe 12.

15. A BMW é ainda titular dos seguintes registos de marca M:

15.1. Marca da União Europeia n.º 17955439 M Power, requerida em 14.09.2018 e registada em 14.02.2019, para assinalar, entre outros, veículos e meios de transporte; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos, na classe 12 e trabalhos de instalação, limpeza, reparação e manutenção de veículos e meios de transporte, componentes e acessórios para veículos, rodas, pneus, motores, dínamos para veículos terrestres, filtros para motores e máquinas, filtros de ar, filtros de óleo, sistemas, tubos e panelas de escape, catalisadores, motores de arranque, turbocompressores, radiadores de refrigeração para motores, dispositivos de comando para motores e máquinas, bombas, compressores e ventiladores, robôs, geradores de eletricidade, máquinas distribuidoras, aparelhos para mudanças e aparelhos de transporte, na classe 37.

15.2. Marca da União Europeia n.º 15695133 M Sport, requerida em 27.07.2016 registada em 02.10.2017, para assinalar automóveis e peças estruturais para os mesmos; acessórios para veículos motorizados, desde que compreendidos na classe 12.

15.3. Marca de registo internacional n.º 1093414 M Performance, com designação da União Europeia como território de proteção, registada em 11.07.2011 e que reivindica prioridade de 07.02.2011, para assinalar, entre outros, motor vehicles and partsthereof, na classe 12.

15.4. Marca da União Europeia n.º 1771468 M2, requerida em 24.07.2000 e registada em 27.08.2001 para assinalar, entre outros, veículos automóveis e respetivos componentes, incluídos na classe 12; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água, na classe 12.

15.5. Marca da União Europeia n.º 82883 M3, requerida em 01.04.1996 e registada em 12.08.1999, para assinalar, entre outros, automóveis e respetivas peças na classe 12.

15.6. Marca da União Europeia n.º 1951532 M4, requerida em 13.11.2000 e registada em 11.02.2002, para assinalar, entre outros, veículos automóveis e respetivos componentes, incluídos na classe 12; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água, na classe 12.

15.7. Marca da União Europeia n.º 82859 M5, requerida em 01.04.1996 e registada em 12.08.1999, para assinalar, entre outros, automóveis e respetivas peças, na classe 12.

15.8. Marca da União Europeia n.º 1771492 M6, requerida em 24.07.2000 e registada em 17.09.2001, para assinalar, entre outros, veículos automóveis e respetivos componentes, incluídos na classe 12; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água, na classe.

16. Em 24.04.2020, a Ré Topchallenge apresentou no INPI o pedido de registo da marca nacional n.º 641487 MForce para assinalar inter alia produtos da classe 12 (automóveis e assessórios) e serviços da classe 37 (reparação automóvel).

17. Em 11.05.2020 a BMW enviou uma carta à Topchallenge a solicitar a desistência do pedido de registo da marca nacional n.º 641487 MForce, nos termos que constam do documento nº 66, cujo teor se dá por reproduzido.

18. Em 06.07.2020 a BMW apresentou reclamação contra o pedido de registo da marca nacional n.º 641487 MForce, onde invocou a titularidade de vários registos de marca M.

19. Por despacho de 29.10.2020 o INPI considerou a reclamação da BMW procedente e recusou o registo da marca nacional n.º 641487 MForce para todos os produtos e serviços.

20. No dia 09.06.2020, a Ré Topchallenge apresentou junto do INPI o pedido de registo da marca nacional n.º 644287 MExpert para assinalar inter alia produtos da classe 12 (automóveis e assessórios) e serviços da classe 37 (reparação automóvel).

21. Em 24.07.2020, a BMW enviou nova carta à Topchallenge, reiterando as objeções que já manifestadas na carta de 11.05.2020 e a solicitar a desistência do pedido de registo da marca nacional n.º 644287 MEXPERT, nos termos que constam do documento nº 69, cujo teor se dá por reproduzido.

22. Em 21.08.2020 a BMW apresentou reclamação contra o pedido de registo da marca nacional n.º 644287 em termos semelhantes à reclamação contra a marca nacional n.º 641487 MForce, nos termos que constam do documento nº 70, cujo teor se dá por reproduzido.

23. Por despacho de 08.01.2021 o INPI considerou a reclamação da BMW procedente e recusou o registo da marca MExpert para todos os produtos e serviços.

24. Em 14.07.2020, a Ré Topchallenge apresentou junto do EUIPO o pedido de registo da marca da União Europeia n.º 18272588

 para assinalar inter alia produtos da classe 12 (automóveis e assessórios) e serviços da classe 37 (reparação automóvel).

25. Em 14.08.2020, a Ré Topchallenge apresentou junto do INPI o pedido de registo da marca nacional n.º 648029  

para assinalar inter alia produtos da classe 12 (automóveis e assessórios) e serviços da classe 37 (reparação automóvel).

26. Tendo tomado conhecimento de mais estes dois pedidos de registo de marca, no dia 10.09.2020, a BMW interpelou novamente a Ré Topchallenge nos termos que constam do documento nº 73, cujo teor se dá por reproduzido.

27. A referida carta datada de 10.09.2020 não teve qualquer resposta da parte da Ré Topchallenge.

28. No dia 09.11.2020, a BMW apresentou reclamação contra o pedido de registo da marca nacional n.º 648029 MForce Mobility Force nos termos que constam do documento nº 74 cujo teor se dá por reproduzido.

29. No mesmo dia 09.11.2020, a BMW deduziu também reclamação contra o pedido de registo da marca da UE n.º 18272588 MForce Mobility Force nos termos que constam do documento nº 75 cujo teor se dá por reproduzido.

30. O registo da marca nacional n.º 648029 foi recusado por decisão do INPI de 24 de junho de 2021.

31. O processo de registo da marca da UE n.º 18272588 encontra-se atualmente pendente.

32. As Rés registaram o nome de domínio oficinasmforce.pt em 25 de abril de 2020.

33. Existem, entre outras, as seguintes marcas registadas que incorporam o termo FORCE:

− Marca da UE n.º 14648679 CUSTOM FORCE, registada na classe 12;

− Marca da UE n.º 15634108 ASSISTING FORCE, registada na classe 12;

− Marca da UE n.º 10531341 BRUTE FORCE, registada na classe 12;

− Marca da UE n.º 18055470 FORCE ONE, registada na classe 12;

− Marca da UE n.º 10196574 DYNA FORCE, registada na classe 37;

− Marca nacional n.º 464163 ELITE FORCE, registada na classe 37;

− Marca da UE n.º 16398133 RAIL FORCE ONE, registada nas classes 12 e 39.

34. Existem, entre outras, as seguintes marcas compostas por representações estilizadas da letra “M” para a classe 12ª:

34.1. Marca da U.E. n.º 3244721 “M” (figurativa);

34.2. Marca da U.E. n.º 3450954 “M” (figurativa);


34.3. Marca da U.E. n.º 3457728 “M” (figurativa);


34.4. Marca da U.E. n.º 3668472 “m” (figurativa);


34.5. Marca da U.E. n.º 3716115 “M” (figurativa);


34.6. Marca da U.E. n.º 4031753 “M” (figurativa);


34.7. Marca da U.E. n.º 4228763 “m” (figurativa);


34.8. Marca da U.E. n.º 4262796 “M” (figurativa);

34.9. Marca da U.E. n.º 5176664 “m” (figurativa);

34.10. Marca da U.E. n.º 5840053 “M” (figurativa);

34.11. Marca da U.E. n.º 5903943 “M” (figurativa);

Conforme documentos nº 1 a 11 juntos com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido.

35. Outro fabricante de veículos automóveis, a NISSAN, é a titular de vários registos de marca que incluem igualmente a letra “M” na sua composição conjugada com outros elementos, letras ou números, nomeadamente os seguintes:

35.1. Marca da U.E. n.º 2284065 “MM” (nominativa);

35.2. Marca da U.E. n.º 5214762 “M37” (nominativa);

35.3. Marca da U.E. n.º 6167167 “M30D” (nominativa);

35.4. Marca da U.E. n.º 8704207 “M56” (nominativa);

35.5. Marca da U.E. n.º 9064064 “M35” (nominativa);

35.6. Marca da U.E. n.º 9064072 “M35h” (nominativa);

35.7. Marca da U.E. n.º 9064098 “M45” (nominativa).

Conforme documentos nº 12 a 18, cujo teor se dá por reproduzido.

36. Existem ainda registadas as seguintes marcas com a constituídas pela letra “M” estilizada, que estão registadas no âmbito da classe 37ª:


36.1. Nº 94623 , protegida na classe 37 desde 01.04.1996


36.2. Nº 1357983 , protegida nas classes 12 e 37 desde 03.03.2017;


36.3. Nº 10050656 , protegida na classe 37 desde 28.07.2011;


36.4. Nº 10312627 , protegida na classe 37 desde 19.09.2011;


36.5. Nº 111282341 , protegida na classe 37 desde 22.10.2012;


36.6. Nº 15348113 , protegida na classe 37 desde 19.04.2016;


36.7. Nº 18104962 , protegida na classe 37 desde 07.08.2109;


36.8. Nº 18188921 , protegida na classe 37 desde 29.01.2020;


36.9. Nº 18189612 , protegida na classe 37 desde 28.01.2020;


37. A Marca da U.E. n.º 3450954 abrange os seguintes produtos assinados da classe 12ª: Veículos agrícolas; veículos adaptados para utilização agrícola; veículos adaptados para utilização com máquinas agrícolas; veículos adaptados para utilização em jardins; veículos adaptados para utilização em silvicultura e horticultura; veículos destinados ao transporte de animais; veículos destinados à disseminação de fertilizantes; veículos para misturar forragem; veículos equipados para escavar, despejar, transportar carga, carregar e basculantes; veículos com pás carregadoras e/ou pás escavadoras incorporadas; tratores; reboques; camiões basculantes; veículos terrestres puxados por tratores; uniões para reboques; atrelagens de reboque; atrelagens de reboques para veículos; reboques para veículos; camiões; tratores de semi-reboque; peças e acessórios para os artigos atrás referidos.

38. A Marca da U.E. n.º 3668472 “m” abrange os seguintes produtos assinados da classe 12ª: carrinhos de compras; carrinhos de compras equipados com suportes para transportar crianças.

39. A Marca da U.E. n.º 3716115 “M” abrange os seguintes produtos assinados da classe 12ª: divisões sobre carris.

40. A Marca da U.E. n.º 4228763 “m” abrange os seguintes produtos assinados da classe 12ª: cintos de segurança para assentos (bancos) de veículos, cintos de segurança para veículos destinados a crianças; cadeiras de segurança para veículos destinadas a crianças; correias de segurança e imobilizadores para veículos, todos para utilização em alcofas, cadeiras ou estruturas de segurança para veículos para crianças; cadeiras de criança amovíveis para veículos para utilizar com correias de segurança ou com cintos de segurança de veículos; acessórios de retenção vendidos sob a forma de kit para utilização com quaisquer dos artigos atrás referidos; aparelhos de nsegurança para veículos destinados a crianças; carros de bebé, cadeiras com rodas, carros e transportadores munidos de rodas, todos contendo ou para utilizar com alcofas de transporte ou carros de bebé com quatro rodas; correias e imobilizadores, todos para utilizar em carros de bebé, cadeiras com rodas, carros de bebé com quatro rodas ou com transportadores munidos de rodas contendo alcofas de transporte; peças e acessórios para todos os produtos atrás citados; todos os produtos atrás referidos incluídos na classe 12.

41. A Marca da U.E. n.º 5840053 abrange os seguintes produtos assinados da classe 12ª: Veículos náuticos e aparelhos de locomoção por água

42. O titular da Marca da U.E. n.º 3457728 “M” é a Motorola Trademark Holdings, LLC que se dedica ao fabrico de telefones, telemóveis e outros equipamentos de telecomunicações e respetivos acessórios.

43. A Marca da U.E. nº 94623 abrange os seguintes produtos assinados da classe 37ª: serviços de construção e reparação.

44. A Marca da UE nº 10050656 abrange os seguintes produtos assinados da classe 37ª: serviços de construção e reparação.

45. A titular da marca UE Nº 10312627 a sociedade alemã Matrium GmbH, é uma empresa que se dedica à prestação de serviços de logística, compras por grosso e serviços relacionados com questões alfandegárias.

46. A titular da marca UE Nº 111282341 Merivaara Corporation, é uma sociedade vende produtos e presta serviços relacionados com tecnologia direcionada para a prestação de cuidados de saúde.

47. De acordo com dados recentes, o número de veículos comercializados na Alemanha, no Reino Unido, em França, Espanha, Itália, Áustria, Finlândia e na Suécia ostentando as marcas M2, M3, M4, M5, M6, M Performance e M Sport Package foram os seguintes:

Marca Período Unidades vendidas

M2 2016 mais de 2.000

M3 2012-2016 mais de 7.050

M4 2014-2016 mais de 13.050

M5 2012-2016 mais de 4.550

M6 2012-2016 mais de 2.400

M Performance 2012-2016 mais de 42.400

M Sport Package 2012-2016 mais de 860.000

48. De acordo com informação disponível, o volume de negócios na Alemanha, no Reino Unido, em França, Espanha, Itália, Áustria, Finlândia e na Suécia dos produtos da BMW ostentando as marcas M2, M3, M4, M5, M6, M Performance foram os seguintes:

Marca Período Volume de negócios em €

M2 2016 mais de €90.000.000,00

M3 2012-2016 mais de €223.000.000,00

M4 2014-2016 mais de €670.000.000,00

M5 2012-2016 mais de €340.000.000,00

M6 2012-2016 mais de €170.000.000,00

M Performance 2012-2016 €1.500.000.000,00

49. O reconhecimento da marca da BMW foi confirmado pelos resultados de uma sondagem realizada pelo Institut Für Demoskopie, entre setembro e outubro de 2018, concebido para determinar se a marca M é uma “marca de prestígio” na aceção do Regulamento sobre a Marca da União Europeia.

50. Para a realização do referido Estudo foram inquiridos 8261 indivíduos com idades a partir dos 16 ou 18 anos residentes na Áustria, Bélgica, França, Alemanha, Portugal, Espanha, Países Baixos e Reino Unido através de um questionário padronizado com a mesma redação traduzido para a língua de cada país.

51. Das respostas ao questionário foram retiradas as seguintes conclusões gerais:

51.1. Quanto à notoriedade espontânea, o nível de notoriedade do logótipo M da BM varia entre 52% na Bélgica e 32% nos Países Baixos, sendo que 42% de todos o[s] inquiridos nos oito Estados-membros da UE dizem inicialmente que já viram o logotipo ou, respetivamente que lhes parece familiar;

51.2. Relativamente ao conhecimento ativo, conclui-se que entre as pessoas interessadas em carros desportivos ou em carros de classe média ou de luxo com características desportivas o nível de conhecimento ativo é de 34%, tendo a maior percentagem sido verificada na Alemanha (43%) e a mais baixa em Espanha (27%);

51.3. Quanto à qualidade percecionada dos produtos, o logótipo M da BMW desfruta de uma reputação positiva, com mais de metade de todos os inquiridos familiarizados com o logótipo M da BMW a classificar a qualidade dos produtos vendidos sob este logótipo como “alta” (58%) - cf. Resumo do Estudo e Tabelas 4 e 5 e Quadros 20 e 21 do Doc. n.º 45.

52. Relativamente aos 1002 inquéritos realizados em Portugal, do referido Estudo resultam as seguintes demonstrações:

52.1. 47% do total dos inquiridos afirmam estar familiarizados com a marca M;

52.2. 66% dos inquiridos que estão familiarizados com a marca M atribuem-lhe uma reputação positiva (qualidade elevada dos produtos vendidos sob a marca);

52.3. 57% dos inquiridos que afirmam ter muito ou algum interesse em carros desportivos ou de gama média ou de luxo estão familiarizados com a marca;

52.4. 72% dos inquiridos que afirmam ter muito ou algum interesse em carros desportivos ou de gama média ou de luxo e que estão familiarizados com a marca M atribuem-lhe uma reputação positiva (qualidade elevada dos produtos vendidos sob a marca).

53. A Ré conhece a marca da Autora referida em 14.2

54. A marca é composta por 3 linhas oblíquas, de cor azul claro, azul escuro e vermelho, acopladas a um M maiúsculo, em itálico, de cor cinzento degradê.

55. A marca   é composta por 3 linhas oblíquas, acopladas a um «M» maiúsculo, em itálico, de cor cinzento degradê.

56. O sinal  é composto por um retangulo em fundo vermelho, com o vocábulo «mforce» em letras minúsculas e brancas, inserido no centro.

57. O sinal  é composto pelo vocábulo «mforce», em letras minúsculas, a cinzento e preto, com a referência «mobility force» em rodapé (de tamanho inferior), seguido do desenho estilizado de um veículo.

58. As diversas marcas registadas M da BMW têm vindo a ser extensiva e ininterruptamente utilizadas na União Europeia em relação a produtos, da classe 12.

59. A marca M é usada para distinguir os veículos da BMW integralmente desportivos ou nas gamas mais desportivas dos diversos modelos, munidos de peças que permitem uma performance elevada na condução diária, inspiradas no desporto motorizado, que cumprem elevados padrões de funcionalidade, design, qualidade e vida útil.

60. Os produtos assinalados pela marca M são produzidos a partir de materiais de qualidade superior, encontrando-se subjacente um rigoroso processo de desenvolvimento e produção e exaustivos testes de qualidade.

61. Mais concretamente, a marca da União Europeia n.º 007134158 M é amplamente usada pela BMW para designar automóveis e suas peças componentes e acessórias, sendo disso exemplo os catálogos, anúncios publicitários e outras formas de comunicação comercial abaixo identificados:

• Páginas 10, 11 e 12 do Catálogo do modelo “BMW M2 Competition”, publicado em julho de 2018 – cf. Doc. n.º 16 que se junta;

• Páginas 3, 4, 5, 7, 8, 9, 10 e 11 do Catálogo do modelo “BMW M5”, publicado em outubro de 2018 – cf. Doc. n.º 17 que se junta;

• Catálogo de 2016 dos modelos “BMW X5 M” e BMW X6 M” – cf. Doc. n.º 18 que se junta;

• Print screens obtidos em outubro de 2019 da loja online da BMW com exemplos de várias peças e componentes automóveis vendidos com a marca M – cf. Doc. n.º 19 que se junta;

• Exemplos de anúncios publicitários divulgados na imprensa nos anos de 2015 e 2016 fazendo a alusão a competições automóveis vencidas por pilotos da BMW com carros com equipamentos da gama M – cf. Doc. n.º 20 que se junta;

62. A marca internacional (com designação da UE) n.º 1093414 M Performance é extensivamente usada pela BMW para distinguir peças componentes automóveis em diversos materiais de comunicação comercial, como se comprova dos seguintes elementos:

• Página 12 do Catálogo do modelo “BMW M2 Competition”, publicado em julho de 2018 – cf. Doc. n.º 16;

• Página 11 do Catálogo do modelo “BMW M5”, publicado em outubro de 2018 – cf. Doc. n.º 17;

• Catálogo de peças, componentes e equipamentos M Performance de 2017 – cf. Doc. n.º 21 que se junta;

• Lista de preços de peças, componentes e equipamentos M Performance de 2018 – cf. Doc. n.º 22 que se junta;

• Print screens obtidos em outubro de 2019 da loja online da BMW com exemplos de várias peças e componentes automóveis vendidos com a marca M Performance – cf. Doc. n.º 23 que se junta;

63. Como é sobejamente reconhecido pelos consumidores, a marca da União Europeia n.º 001771468 M2 é usada há vários anos para designar modelos de automóveis fabricados e comercializados pela BMW, como exemplificado nos documentos abaixo indicados:

• Catálogo do modelo “BMW M2 Competition”, publicado em julho de 2018 – cf. Doc. n.º 16;

• Catálogo do modelo “BMW M2 Coupé”, elaborado em 2016 para o mercado austríaco – cf.Doc. n-º 24 que se junta;

• Catálogo do modelo “BMW M2 Coupé”, elaborado em 2017 para o mercado espanhol – cf.Doc. n-º 25 que se junta;

• Catálogo do novo modelo “BMW M2 Coupé”, elaborado em 2015 – cf. Doc. n-º 26 que se junta.

64. Do mesmo modo, as marcas M3 (Marca da União Europeia n.º 82883) e M4 (Marca da União Europeia n.º 1951532) também são intensamente usadas para assinalar modelos de automóveis da BMW, como se depreende dos SEGUINTES catálogos:

• Catálogo dos modelos “BMW M3 Berline”, “BMW M4 Coupé” e “BMW M4 Cabriolet”, elaborado em 2017 para o mercado francês – cf.Doc. n-º 27;

• Catálogo dos modelos “BMW M3 Berlina”, “BMW M4 Coupé” e “BMW M4 Cabrio”, elaborado em 2016 para o mercado italiano – cf.Doc. n-º 28;

• Catálogo dos modelos “BMW M3 Berlina”, “BMW M4 Coupé” e “BMW M4 Cabrio”, elaborado em 2017 para o mercado italiano – cf.Doc. n-º 29;

• Catálogo dos modelos “BMW M4 Coupé”, “BMW M4 Convertible” e “BMW M3 Saloon”, elaborado em 2015 – cf.Doc. n-º 30;

• Catálogo dos modelos “BMW M4 Coupé”, “BMW M4 Convertible” e “BMW M3 Saloon”, elaborado em 2016 – cf.Doc. n-º 31;

65. A marca M5 (Marca da União Europeia n.º 82859) corresponde igualmente à designação de um modelo de automóvel da BMW e também é amplamente usada na União Europeia, conforme se demonstra pelos catálogos que se juntam:

• Catálogo do modelo “BMW M5”, publicado em outubro de 2018 – cf. Doc. n.º 17;

• Catálogo do modelo “BMW M5”, elaborado em 2016 para o mercado espanhol – Doc. n.º 32;

• Catálogo do modelo “BMW M5”, elaborado em 2016 para o mercado francês – cf.Doc n.º 33;

• Catálogo do modelo “BMW M5”, elaborado em 2016 para o mercado italiano – cf.Doc. n.º 34;

• Catálogo do modelo “BMW M5”, elaborado em 2016 – cf.Doc. n-º 35.

66. A marca M6 (Marca da União Europeia n.º 1771492) é igualmente amplamente usada na União Europeia para designar uma gama de modelos de automóveis da BMW:

• Catálogo dos modelos “BMW M6 Grand Coupé”, “BMW M6 Coupé” e BMW M6 Cabrio”, elaborado em 2016 para o mercado austríaco – cf.Doc. n-º 36;

• Catálogo dos modelos “BMW M6 Grand Coupé”, “BMW M6 Coupé” e BMW M6 Cabrio”, elaborado em 2016 para o mercado espanhol – cf.Doc. n-º 37;

• Catálogo dos modelos “BMW M6 Grand Coupé”, “BMW M6 Coupé” e BMW M6 Cabriolet”, elaborado em 2016 para o mercado francês – cf.Doc. n-º 38;

• Catálogo dos modelos “BMW M6 Grand Coupé”, “BMW M6 Coupé” e BMW M6 Cabrio”, elaborado em 2016 para o mercado italiano – cf.Doc. n-º 39;

• Catálogo dos modelos “BMW M6 Grand Coupé”, “BMW M6 Coupé” e “BMW M6 Convertible”, elaborado em 2015 – cf.Doc. n-º 40.

67. Além dos documentos apresentados especificamente para fazer prova do uso da marca da UE n.º 007134158 M e da marca internacional n.º 1093414 M Performance, a prova de que estas duas marcas são amplamente usadas pela BMW resulta também dos catálogos dos diversos modelos de automóveis juntos para prova do uso das demais marcas, os quais contêm exemplos de referências tanto a M como a M Performance para descrever os equipamentos e tecnologias aplicados nos automóveis designados com as marcas M2, M3, M4, M5 e M6.

68. Tal é o caso dos seguintes documentos:

• Doc. n.º 25, páginas 4, 9, 11, 13, 14, 18, 19;

• Doc. n.º 28, páginas 2, 12, 13, 18;

• Doc. n.º 31, páginas 3, 7, 11, 20, 22, 23, 24, 25, 27, 34, 35, 36, 40, 41 e 42;

• Doc. n.º 37, páginas 7, 9, 13, 14 e 21.

69. As RR não usam a marca “mforce Mobility Force” na produção/comercialização de veículos, correspondendo antes a uma rede de oficinas que presta serviços na área da reparação: a mudança de óleo e filtros, substituição de pneus, travões, lâmpadas e amortecedores, a reparação de furos e outros serviços de reparação de automóveis.

70. A página oficial da “BMW M” na rede social Instagram conta com 8,4 milhões de seguidores.

71. Também a página oficial da “BMW M” na rede social Facebook tinha à data da propositura da ação mais de 5 milhões de seguidores.

72. Em Portugal, a marca M da BMW também é reconhecida na imprensa e em blogs relacionados com automóveis.

73. Num artigo do sítio de internet www.autoblog.pt dedicado à gama desportiva dos automóveis da BMW a marca M é referida como “a célebre letra M”.

74. As Rés estão a usar o sinal MForce no território português para distinguir serviços de oficina de reparação automóvel. (confessado – cf. Ata de 17.04.2023)

75. A Ré Topchallenge possui mais de 80 oficinas e tem uma nova solução integrada de serviços de reparação automóvel com a designação MForce. (confessado – cf. Ata de 17.04.2023)

76. No sítio da internet a designação MFORCE surge como a primeira referência das marcas elencadas como pertencentes à Topchallenge. (confessado – cf. Ata a de 17.04.2023))

77. As oficinas MFORCE do Grupo Topchallenge são exploradas pela Ré Número Um – Reparação de Automóveis, S.A.. (confessado – cf. Ata de 17.04.2023))

78. A designação MFORCE começou a ser usada nas oficinas de reparação automóvel do Grupo Topchallenge no final do mês de outubro de 2020. (confessado – cf. Ata de 17.04.2023))

79. Com feito, no dia 27 de outubro de 2020 foi publicitado o “nascimento” de uma nova rede de oficinas MFORCE. (confessado – cf. Ata de 17.04.2023))

80. No âmbito da referida atividade comercial, além da designação MForce, as Rés estão igualmente a usar os seguintes sinais: (confessado – cf. Ata de 17.04.2023))







81. As Rés usam o nome de domínio “oficinasmforce.pt” para comunicar comercialmente os seus serviços (oficinas) de reparação automóvel com a designação MFORCE. (confessado – cf. Ata de 17.04.2023))

82. O nome de domínio “oficinasmforce.pt” foi registado em data posterior às marcas registadas M da BMW, sem a autorização desta (confessado – cf. Ata de 17.04.2023).

83. A letra M da BMW corresponde à inicial Motorsport.

84. A letra M da Topchallenge assume o significado de Mobilidade.

85. O uso no comércio das designações “Classe M” e “Classe ML” pela Mercedes-Benz-AG está regulado através de um acordo celebrado em 1997 entre aquela sociedade e a BMW.

86. O uso no comércio de marcas M da Nissan encontram-se regulados por um acordo global celebrado entre aquela empresa e a BMW, em 2007, nos termos do qual os direitos da BMW sobre M foram reconhecidos e respeitados pela Nissan.


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III – B – Factos não provados

Não se provou que:

a) Com exceção da marca , as Rés conhecem as restantes marcas da Autora.


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IV – Fundamentação de Direito

Começa a presente revista, na parte em que é admissível e em que pode ser conhecida, por nos colocar perante as questões processuais da nulidade do Acórdão por, segundo as RR./Recorrentes, este ter condenado em objeto diverso do pedido (incorrendo na previsão do artigo 615.º/1/e) do CPC); e da violação da lei de processo por, segundo as RR./Recorrentes, a A. ter formulado um pedido genérico não permitido pelo art. 556.º do CPC.

Trata-se de questões que estão interligadas – ambas têm a ver com o modo como o pedido foi formulado pela A. – e em que, logicamente, se coloca em 1.º lugar a questão respeitante à formulação (ou não) de um pedido genérico.

Vejamos, então:

Como consta do relato inicial, a A., na PI, pediu a condenação das RR. a “cessarem e absterem-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, a designação M, MFORCE, ou qualquer outro sinal confundível com as marcas M da Autora, no âmbito da sua atividade comercial (oficinas) de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos os serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes”.

Sustentando agora, no recurso de revista, as RR./Recorrentes que tal pedido, assim formulado, é genérico (e que não é um dos pedido genéricos permitidos pelo artigo556.º do CPC), na medida em que a A./BMW não pode obter antecipadamente a proibição de qualquer outro sinal confundível com as marcas M, o que só pode ser decidido judicialmente em concreto; para o que as RR. se apoiam no exposto no Acórdão da Conferência da Relação de Lisboa, de 12/10/2022 (Proc. n.º 297/21.2YHLSB.L1, Ref.ª 19046632), em que estaria “em causa um pedido semelhante” e em que se terá considerado que “o juízo de confundibilidade de cada sinal deve ser aferido em concreto e por referência aos produtos e serviços para os quais foi pedido o seu registo”, acrescentando-se que a proteção do sinal registado “é balizada e recortada, no seu âmbito de proteção, para os produtos ou serviços para os quais foi solicitado o registo e não pode estender-se para uma infinidade de situações que escapam desse quadro concreto; e tendo-se concluído que, “perante o pedido genérico e extremamente elástico [formulado] e atenta a necessidade da matéria em causa ter de ser obrigatoriamente analisada em concreto (com apelo e conjugação dos fatores que supra enunciamos), jamais a pretendida condenação poderia proceder (…) sendo de manter a rejeição dessa condenação (…) na linha da sentença recorrida”.

E terminam as RR./Recorrentes a solicitar que, pretendendo a A., antecipadamente, a proibição do uso de «qualquer outro sinal confundível com as marcas M», o que apenas em concreto poderá vir a ser decidido judicialmente, deve tal pedido ser julgado improcedente, por processualmente inadmissível, por violar o disposto no artigo 556.º do CPC.

As RR./Recorrentes não têm razão e o seu raciocínio – e a interpretação que fazem do Acórdão da Conferência que invocam – incorre num patente equívoco.

Como é evidente, o juízo sobre a confundibilidade entre marcas tem de ser feito em concreto e tendo presente o que decorre do princípio da especialidade, porém, o que se acaba de dizer (e que preenche o raciocínio do Acórdão da Conferência invocado) tem já a ver com o fundo/mérito da pretensão e não com a ilegal formulação (ou não) de um pedido genérico.

Como é sabido, o pedido deve ser certo e determinado, sendo considerado genérico (e não admissível, afora as situações previstas no art. 566.º do CPC) “quando é indeterminado no seu quantitativo; e como esta indeterminação implica iliquidez podemos considerar expressões equivalentes as de pedido genérico e pedido ilíquido2.

Mas, pedir, como a A. fez, que as RR. cessassem e se abstivessem de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, a designação M, MFORCE, ou qualquer outro sinal confundível com as marcas M da Autora, nada tem de genérico/ilíquido (ou sequer vago ou ambíguo), sucedendo, isso sim, que, depois, na apreciação de fundo/mérito, tendo o juízo de confundibilidade que ser feito em relação a sinais concretos – e constando estes do processo – se colocará a questão processual de saber se o tribunal deve, olhando rigidamente para o pedido formulado, proferir uma decisão de absolvição ou antes, se for o caso, condenar na cessação/abstenção de uso dos sinais a propósito dos quais pôde formular um concreto juízo de confundibilidade, porém, isto – esta questão processual – é outra e diversa questão processual, ou seja, não é a mesma configurável como uma ilegal formulação dum pedido genérico, configurando antes a outra questão processual suscitada pelas RR.: saber se e em que termos o tribunal pode, face ao modo como a A. formulou o pedido, condenar na cessação/abstenção do uso de sinais concretos.

Passemos pois à outra questão processual suscitada pelas RR., respeitante à nulidade do Acórdão consistente em, segundo as Recorrentes, este ter condenado em objeto diverso do pedido (incorrendo assim na previsão do artigo 615.º/1/e) do CPC).

Repete-se:

a A. pediu a condenação das RR. a “cessarem e absterem-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, a designação M, MFORCE, ou qualquer outro sinal confundível com as marcas M da Autora, no âmbito da sua atividade comercial (oficinas) de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos os serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes”; e

o Acórdão recorrido condenou as RR. a “cessarem e absterem-se de usar, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, no âmbito da sua atividade comercial de serviços (oficinas) de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos ou serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes, o uso da designação verbal MFORCE e dos seguintes sinais:



Sustentando as RR./Recorrentes que o acórdão recorrido “deu provimento a novos pedidos formulados pela A. em sede de recurso de apelação, mas que não têm correspondência e ultrapassam os pedidos que formulou na PI”, razão pela qual se verifica a nulidade previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º, pedindo-se que “este Supremo Tribunal (nos termos do artigo 684.º, n.º 1 do CPC) se digne suprir essa nulidade, suprimindo os sinais mistos acima reproduzidos (e as remissões para os mesmos), dos pontos I. a., b. e c. do dispositivo do acórdão recorrido”.

O princípio do pedido, consagrado expressamente no CPC (art. 3.º/1/1.ª parte do CPC), significa, no que aqui interessa (na 2.ª vertente de tal princípio), que o juiz não pode dar mais ou coisa diversa daquela que lhe é pedida, sob pena de a sentença padecer de nulidade (vício de ultra ou extra petitum): “a sentença – diz o art. 609.º/2 do CPC – não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir” e, em consonância, o art. 615.º/1/e) determina a nulidade de sentença sempre que “o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido”.

E para justificar a vinculação do tribunal ao pedido argumenta-se com a imparcialidade que o juiz deve manter (o processo é uma coisa de partes e é suposto que estas sabem, melhor que ninguém, cuidar deles), com a grave ofensa que representaria para o princípio do contraditório uma sentença que desse coisa diversa da pedida (que se pronunciasse sobre matérias que não foram objeto de discussão entre as partes e de uma efetiva defesa) e com a limitação para o objeto do processo que a formulação do pedido significa.

Mas, sem colocar em causa a validade de tais justificações, reconhece-se e adverte-se que a sacralização do princípio do pedido, impedindo o mínimo desvio, acaba não raras vezes por estar ao arrepio do princípio da economia processual, o que, aliado ao dever de gestão material concedido ao juiz (cfr. art. 6.º do CPC) – ao dever de o juiz intervir com a finalidade de alcançar um resultado materialmente justo e eficiente – conduz, hoje, a uma mitigação/suavização/flexibilização do princípio do pedido, admitindo-se que o juiz, em prol da efetividade do processo, possa, em face dos factos alegados e provados, decretar uma medida menos radical (que a pedida) e qualitativamente diferente.

É claro que o papel do juiz na “reformulação” do pedido levanta dúvidas, uma vez que, ao assim proceder, a linha de neutralidade do juiz pode parecer ultrapassada.

Em todo o caso, nas situações em que o autor deduz um “pedido radical”, se o juiz entender que pode resolver o litígio concedendo coisa qualitativamente diversa daquela que foi efetivamente pedida e este “aliud” puder ser extraído como pedido subsidiário não expresso, mas relacionado com o pedido formulado pelo autor, pode (deve, atendo o referido dever de tornar o processo mais eficaz e eficiente) o juiz, ouvidas as partes – notificadas as partes sobre o “aliud” que pretende conceder e convidadas a pronunciar-se sobre o mesmo, assim se respeitando-se os princípios da cooperação e do contraditório – operar a “reformulação” do pedido em nome da efetividade e eficiência da justiça, da economia processual e da justiça material do caso concreto.

O que significa que, caso a sentença da 1.ª Instância opere tal “reformulação” sem ouvir/convidar as partes, comete uma nulidade, a qual, porém, quer se configure como nulidade do art. 195.º do CPC, quer se configure como nulidade do art. 615.º/1/e), tem de ser arguida com o recurso de apelação e não apenas, como fazem as RR./Recorrentes, na revista.

Isto dito, regressando ao caso sub-judice, temos que, logo na sentença, o tribunal “reformulou” o pedido radical respeitante à parte em que se aludia à cessação e abstenção de usar “qualquer outro sinal confundível com as marcas M da Autora”, extraindo dele e interpretando-o como se mencionasse os 6 sinais mistos identificados pela A. na PI, passando a apreciar e a formular um concreto juízo de confundibilidade em relação a tais seis sinais mistos (juízo de confundibilidade esse invocado pela A. na PI e contraditado pelas RR. na contestação), acabando a decidir que três deles preenchiam o risco de confusão e que os restantes três não preenchiam tal risco de confusão, razão pela qual, como resulta do relato inicial, condenou as RR. a cessarem e absterem-se de usar três dos seis sinais mistos, “absolvendo as RR. do demais peticionado”.

Ora, como é evidente, até por o juízo de confundibilidade ter de ser formulado em relação a sinais concretos, o pedido de cessação e abstenção de uso em relação a tais seis sinais mistos (alegados pela A. na PI) era um óbvio pedido subsidiário não expresso (extraível do “pedido radical” formulado pela A. e consistente na condenação das RR. na cessação e abstenção de usar todo e “qualquer outro sinal confundível com as marcas M da Autora”), podendo/devendo o tribunal, após ouvir as partes, pronunciar-se sobre tais seis sinais mistos e condenar e absolver, conforme fosse o caso, em relação aos mesmos.

A “reformulação” do pedido feita pela 1.ª Instância era pois uma exigência imposta pela eficiência da justiça, pela economia processual e pela justiça material do caso concreto: uma postura rígida e inflexível relativamente ao pedido formulado pela A. conduziria à absolvição das RR., mas não impediria que a A. instaurasse um segundo processo em que formulasse o pedido de cessação e abstenção de uso em relação aos seis sinais mistos em questão, havendo pois razões para, neste processo, resolver definitivamente o litígio existente.

É claro que foi cometida pela 1.ª Instância a nulidade de não ouvir as partes sobre tal “reformulação” do pedido, mas, efetuada tal “reformulação” na sentença da 1.ª Instância, ficou tal nulidade sanada a partir do momento em que as partes a não arguiram por qualquer modo no recurso de apelação, podendo/devendo a Relação pronunciar-se sobre a “reformulação” do pedido operada pela 1.ª Instância sem que com isso esteja a condenar em objeto diverso do pedido e a incorrer na nulidade prevista no artigo 615.º/1/d) do CPC.

Concluindo, improcedem as duas questões processuais – nulidade do acórdão recorrido por, segundo as RR./recorrentes, este ter condenado em objeto diverso do pedido (incorrendo na previsão do artigo 615.º/1/e) do CPC); e violação da lei de processo por, segundo as RR./recorrentes, a A. ter formulado um pedido genérico não permitido pelo art. 556.º do CPC – suscitadas pelas RR./recorrentes.


*

Passando às questões substantivas:

Na presente ação, invoca a A., em muito breve síntese, que é titular do registo de várias marcas da União Europeia e que as RR., em infração aos direitos exclusivos conferidos pelos registos de tais marcas, adotaram e utilizam sinais que imitam as marcas registadas da A..

As marcas comerciais, é sabido, constituem sinais que geram na mente do público a noção de que tal sinal está a identificar um produto ou serviço e, ao mesmo tempo, estabelecem a ligação entre tal produto ou serviço e a fonte de onde o mesmo provém – falando-se, a tal propósito, na função/capacidade distintiva ou indicativa da marca – razão pela qual o direito das marcas procura assegurar que estas distinguem adequadamente os produtos ou serviços a que respeitam e procura impedir a usurpação do seu poder apelativo.

É neste âmbito – da capacidade distintiva que uma marca tem de ter, permitindo a identificação do produto ou serviço e a sua diferenciação face aos produtos ou serviços do mesmo género – que se situa o centro do presente litígio.

Efetivamente, havendo marcas anteriores que gozem de prioridade, deve a “nova marca”, para cumprir a referia função indicativa ou distintiva, gozar da chamada “novidade relativa” (por referência às marcas anteriores, mas também em relação a outros sinais distintivos que lhe sejam prioritários, nomeadamente logótipos, firmas e denominações sociais, denominações de origem e indicações geográficas), o que não implica que a “nova marca” tenha de ser completamente nova ou original, mas exige que seja suficientemente diferente para afastar o risco de confusão ou de associação por parte dos consumidores, ou seja, pequenas diferenças de pormenor não chegam para prevenir esses riscos.

Ademais, identificando a marca produtos ou serviços, significa a “novidade relativa” que a “nova marca” apenas tem de distinguir-se das marcas existentes para produtos ou serviços do mesmo género ou espécie3: fala-se, a tal propósito, no princípio da especialidade das marcas, princípio que decorre da própria função da marca – individualiza produtos ou serviços e permitir a sua diferenciação de outros da mesma espécie, com vista à indicação da respetiva proveniência.

Daí o dizer-se que o risco de confusão ou associação que não pode ser causado pela “nova marca” é com produtos ou serviços idênticos ou semelhantes4: como afirmava Pinto Coelho5, “uma marca não tem de ser distinta de toda e qualquer outra marca já existente, seja qual for o produto para que tiver sido adotada e esteja sendo usada; tem de ser distinta, e portanto nova, no sentido de que não deve confundir-se com qualquer outra que tenha sido usada para produtos do mesmo género.”

Temos pois que a apreciação da “novidade relativa” de uma “marca nova” supõe a realização de uma dupla apreciação: sobre a identidade ou confundibilidade entre o “novo sinal” e os sinais que lhe sejam prioritários; e sobre a identidade ou afinidade/semelhança entre os produtos e serviços a que se destinam uns e outros (não havendo identidade ou afinidade/semelhança entre os produtos ou serviços em causa, a identidade ou semelhança dos sinais não constitui problema, atento o referido princípio da especialidade).

Devendo entender-se que se está perante produtos ou serviços afins/semelhantes quando os mesmos são concorrentes no mercado, quando permitem uma relação de concorrência, ainda que ténue, entre os agentes económicos que os ofereçam ao público, quando apresentem entre si um grau de semelhança ou proximidade suficiente para permitir, ainda que parcialmente, uma procura conjunta, para satisfação de idênticas necessidades dos consumidores, enfim, quando têm a mesma finalidade ou utilidade e quando, aos olhos do consumidor, há entre eles uma possibilidade de uso substitutivo.

Como refere Pedro Sousa e Silva, há, para apreciar tal afinidade/semelhança, uma variedade de fatores a ter em conta: “a natureza dos serviços e produtos, a composição destes, a sua finalidade, função, modo de uso, as suas diversas utilidades, os canais de distribuição usados e o género de estabelecimentos onde são comercializados, a sua eventual complementaridade, o respetivo preço, o grau de qualidade e, sobretudo, o tipo de consumidores. Importa assim ter em conta não só as caraterísticas intrínsecas dos produtos ou serviços em confronto, como também outros fatores envolventes, destinados a apurar se existem interseções ou áreas de sobreposição entre os respetivos mercados6; e mesmo o grau de notoriedade da “marca anterior” não pode deixar de ser tomado em conta na apreciação da afinidade/semelhança entre os produtos ou os serviços designados pelas duas marcas.

E devendo entender-se que há semelhança entre marcas quando haja o risco do público/consumidor poder crer que os produtos e serviços que a “nova marca” identifica provêm da empresa titular da “marca anterior” (ou, eventualmente, de uma empresa a ela economicamente ligada); quando a “nova marca” imite a “marca anterior” e isso gere risco de confusão no espírito de público/consumidor (quando, no fundo, a “nova marca” não cumpre a função distintiva atrás referida: não se distingue da “marca anterior”, dentro do universo de produtos ou serviços a que respeitam).

O que nos remete para o conceito/definição de “imitação”, constante do art. 238.º/1/c) do CPI, em que se refere que a marca registada se considera imitada ou usurpada por outrem quando “tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto”; ou seja, o que se pretende evitar é que as marcas gerem um risco de confusão entre os consumidores (destinatários finais da informação que o sinal distintivo pretende transmitir), podendo os traços de confundibilidade entre os sinais ter diversas origens: similitude gráfica, visual, fonética ou qualquer outra.

Sendo que a apreciação da existência de tais traços de confundibilidade – a comparação entre os sinais – deve fazer-se globalmente, através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores, uma vez que, como a jurisprudência europeia vem sublinhando, “o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo e não procede a uma análise das suas diferentes particularidades”, ou seja, na linha do que também vem sendo entendido por este Supremo, é por “intuição sintética e não por dissecação analítica que deve proceder-se à comparação das marcas, pois o que importa ter em conta é a impressão global, do conjunto, própria do publico consumidor, que desvalorizando pormenores, se concentra nos elementos fundamentais dotados de maior eficácia distintiva”.

Mais, interessará para a comparação aquilo que o consumidor retém de cada marca quando a não tem à sua frente, ou seja, a reminiscência que fica na sua memória e que lhe permite reconhecer o sinal quando o voltar a encontrar, pelo que a comparação deve fazer-se em condições análogas àquelas que o consumidor enfrenta no dia a dia: visualizando apenas uma das marcas e tendo como referência a memória que guardou da outra.

Pode, é certo, atender-se, em certos casos, mais ao elemento dominante de cada marca e desvalorizar-se os elementos genéricos ou descritivos dos sinais em confronto (até por não terem caráter distintivo próprio), mas como o TG referiu, no caso LIMONCHELO, “a apreciação da semelhança entre duas marcas não se pode limitar a ter em consideração apenas um componente da marca complexa e a compará-lo com outra marca. Pelo contrário, é necessário operar tal comparação mediante o exame das marcas em causa, cada uma delas considerada no seu conjunto, o que não exclui que a impressão de conjunto produzida na memória do público pertinente por uma marca complexa possa, em determinadas circunstâncias, ser dominada por um ou vários dos seus componentes.

Por outro lado, quanto mais forte (arbitrária) for a marca anterior – quanto mais importante for o carater distintivo da marca anterior – maior será o risco de confusão e maior a exigência que deve colocar-se na “novidade relativa” da “nova marca”.

E, na mesma linha de raciocínio, também a notoriedade da marca anterior aumenta a suscetibilidade de erro no espírito do público, que mais facilmente ligará a “nova marca” com a “marca anterior”.

Enfim, como acima já se referiu, a propósito da chamada “novidade relativa”, não basta mudar pequenos detalhes, em relação à “marca anterior”, para o “novo sinal” já não constituir imitação: o que interessa/releva é o risco de confusão e não é por os sinais não serem “totalmente idênticos” que fica afastado o risco de confusão.

“ (…) o TJ tem sublinhado repetidamente que a apreciação da existência de risco de confusão depende de numerosos fatores e nomeadamente do conhecimento da marca no mercado, da associação que pode ser feita com o sinal utilizado ou registado, do grau de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos ou serviços designados. O risco de confusão deve, portanto, ser apreciado globalmente, atentos todos os fatores relevantes do caso em apreço. Esta visão integrada exprime o chamado princípio da interdependência, enunciado pelo Tribunal no caso CANON: a apreciação global do risco de confusão implica uma certa interdependência entre os fatores tomados em conta, nomeadamente a semelhança das marcas e dos produtos ou serviços designados. Assim, um reduzido grau de semelhança entre os produtos ou serviços designados pode ser compensado por um elevado grau de semelhança entre as marcas, e inversamente.7

Podendo ainda acrescentar-se, sem prejuízo das especificidades colocadas por cada tipo de marca, que a comparação das marcas nominativas, tenham ou não significado conceptual, pode ser feita nos planos visual (o menos importante), fonético e ideográfico/concetual (dependendo da marca em concreto o grau de relevância de cada um); que a força distintiva das marcas exclusivamente figurativas se apoia, essencialmente, nos efeitos visuais ou gráficos que provoca na mente dos consumidores, abrangendo tanto a imagem constitutiva do sinal como o conceito concreto por ele evocado (não havendo assim que atender ao elemento fonético); e que, na marca mista (figurativa, com elementos verbais), a coexistência de elementos nominativos e figurativos coloca a questão de saber qual dos elementos é prevalecente, sendo que, por regra, o elemento nominativo deve ser considerado o elemento predominante.

Mas, na medida em que sejam percetíveis e relevantes, pode e deve atender-se a todos os elementos e fatores relevantes e relevantes do caso, tendo presente que:

- há que apreciar as marcas globalmente;

- não conferindo relevo à sua componente genérica e descritiva;

- privilegiando nas marcas complexas, sempre que possível, o elemento dominante;

- sendo que, quanto maior for a notoriedade da marca anterior, maior será o risco de confusão com uma marca posterior.

E é tudo isto, acabado de enunciar, que está consagrado no Reg. (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14/06/20178, ao caso aplicável, na medida em que estão em causa e são invocadas Marcas da União Europeia (MUE) e se dispõe, no art. 17.º/1/1.ª parte de tal RMUE, que os efeitos da marca da UE são exclusivamente determinados pelo disposto em tal RMUE; sendo que, de acordo com o art. 9.º de tal RMUE:

1. O registo de uma marca da UE confere ao seu titular direitos exclusivos.

2. Sem prejuízo dos direitos dos titulares adquiridos antes da data de depósito ou da data de prioridade da marca da UE, o titular dessa marca da UE fica habilitado a proibir que terceiros, sem o seu consentimento, façam uso, no decurso de operações comerciais, de qualquer sinal em relação aos produtos ou serviços caso o sinal seja:

a) Idêntico à marca da UE e seja utilizado para produtos ou serviços idênticos àqueles para os quais a marca da UE foi registada;

b) Idêntico ou semelhante à marca da UE e seja utilizado para produtos ou serviços idênticos ou afins àqueles para os quais a marca da UE foi registada, se existir risco de confusão no espírito do público; o risco de confusão compreende o risco de associação entre o sinal e a marca;

c) Idêntico ou semelhante à marca da UE, independentemente de ser utilizado para produtos ou serviços idênticos, ou afins àqueles para os quais a marca da UE foi registada, sempre que esta última goze de prestígio na União e que a utilização injustificada do sinal tire indevidamente partido do caráter distintivo ou do prestígio da marca da UE ou lhe cause prejuízo.

3.Ao abrigo do n.º 2, pode ser proibido, nomeadamente:

a) Apor o sinal nos produtos ou na embalagem desses produtos;

b) Oferecer os produtos, colocá-los no mercado ou armazená-los para esses fins, ou oferecer ou prestar serviços sob o sinal;

c) Importar ou exportar produtos sob o sinal;

d) Utilizar o sinal como designação comercial ou denominação social, ou como parte dessa designação ou denominação;

e) Utilizar o sinal em documentos comerciais e na publicidade;

f) Utilizar o sinal na publicidade comparativa, de forma contrária à Diretiva 2006/114/CE.

Temos pois que o registo de marca da UE, enquanto Direito da Propriedade Industrial (DPI) que é, proíbe que a generalidade das pessoas pratique atos reservados ao titular de tal DPI, nisto se traduzindo o seu carater exclusivo, sendo que, quando tal proibição não é respeitada, o titular do direito violado (ou ameaçado de violação) pode instaurar ação declarativa pedindo que o “infrator” seja impedido de prosseguir a conduta ilícita, ação que é exatamente aquela em que nos encontramos e para que, pese embora se invoquem e estejam em causa marcas da UE, têm competência exclusiva (cfr. arts. 123.º/1 e 124.º/a) do RMUE) os tribunais dos Estados-Membros 9.

Não sendo despiciendo mencionar que, antes da instauração da presente ação, funcionou, em sentido favorável à A., a tutela administrativa/preventiva dos DPI ora invocados, na medida em que, como resulta dos pontos 16 a 30 dos factos provados, o INPI recusou o registo (e a atribuição de novos DPI) de marcas nacionais pedidas pela 1.ª R.10, por risco de confusão com as marcas da UE da A. ora invocadas, porém, embora tal 1.ª R. não haja sujeito tais atos administrativos de recusa de registo de marcas por parte do INPI a escrutínio judicial, mediante recurso a interpor para o TPI (nos termos dos arts. 38.º e ss. do CPI), o certo é que, como resulta dos pontos 7 e 74 e ss. dos factos provados, passaram as RR. a utilizar os sinais aí identificados, assim se chegando à tutela judicial/repressiva que a presente ação representa.

O que passa a convocar a aplicação do transcrito art. 9.º do RMUE, segundo o qual o registo de uma marca da UE confere ao titular da marca o direito de impedir/proibir que terceiros, sem o seu consentimento, usem, no exercício de atividades económicas (no “decurso de operações comerciais” como ali se refere), qualquer sinal se:

- esse sinal for idêntico à marca e for usado em relação a produtos ou serviços idênticos aos produtos ou serviços abrangidos pelo registo (dupla identidade);

- esse sinal for idêntico à marca e for usado em relação a produtos ou serviços afins aos produtos ou serviços abrangidos pelo registo ou se esse sinal for semelhante à marca e for usado em relação a produtos ou serviços idênticos ou afins aos produtos ou serviços abrangidos pelo registo, caso existe um risco de confusão ou associação no espírito do consumidor;

- esse sinal for idêntico ou semelhante à marca e for usado em relação a produtos ou serviços abrangidos ou não pelo registo, caso a marca goze de prestígio na União Europeia e o uso do sinal tire partido indevido do caráter distintivo ou do prestígio da marca ou possa prejudicá-los.

O que condiz e está em linha com os motivos/requisitos relativos de recusa (constantes do art. 8.º do RMUE11) dum pedido de registo de marca da UE, na medida em que se visa em ambos os casos salvaguardar direitos exclusivos do titular de uma marca da UE, os quais são violados quer venha a ser admitida e registada uma marca idêntica ou confundível quer seja usada uma marca idêntica ou confundível não registada.

Temos pois que as questões substantivas dos autos/revista se acabavam por reconduzir à realização da operação de “dupla apreciação” supra referida: à apreciação da identidade ou confundibilidade entre os “sinais” das RR. e as marcas prioritárias da A.; e à apreciação da identidade ou afinidade/semelhança entre os produtos e serviços a que se destinam uns e outras (a A. também invocou, nos artigos 43 e ss. da PI, ser a marca nominativa “M” uma “marca de prestígio”, mas verdadeiramente não alegou factos concretos nesse sentido, o que fez com que a apreciação se situasse, desde a 1.ª Instância, no perímetro do princípio da especialidade das marcas).

Sucedendo que, neste momento, já só está em causa a apreciação da identidade ou confundibilidade entre os “sinais” das RR. e as marcas prioritárias da A., uma vez que, tendo a sentença considerado verificada a similitude entre os produtos e serviços, tal não foi alvo da apelação das RR., estando assim consolidada nos autos a identidade e/ou afinidade/semelhança entre os produtos ou serviços a que se destinam os “sinais” das RR. e as marcas prioritárias da A..

De facto, como resulta dos factos provados,

Quanto às marcas da A.:

A Marca da União Europeia (nominativa) n.º 007134158 M assinala automóveis, peças para os mesmos e acessórios para veículos automóveis;

A Marca da União Europeia n.º 18001234, , assinalar, entre outros, veículos; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos;

A Marca de registo internacional n.º 1456163, , com designação da União Europeia, assinala “vehicles and conveyances; powertrains, including engines and motors, for land vehicles; parts and fittings for vehicles as well as wheels and tyres, and continuous tracks for vehicles, hub caps”;

A Marca da União Europeia n.º 18001222 , , assinala, entre outros, veículos; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos;

A Marca da União Europeia n.º 17955439 M Power, assinala, entre outros, veículos e meios de transporte; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos, na classe 12 e trabalhos de instalação, limpeza, reparação e manutenção de veículos e meios de transporte, componentes e acessórios para veículos, rodas, pneus, motores, dínamos para veículos terrestres, filtros para motores e máquinas, filtros de ar, filtros de óleo, sistemas, tubos e panelas de escape, catalisadores, motores de arranque, turbocompressores, radiadores de refrigeração para motores, dispositivos de comando para motores e máquinas, bombas, compressores e ventiladores, robôs, geradores de eletricidade, máquinas distribuidoras, aparelhos para mudanças e aparelhos de transporte;

A Marca da União Europeia n.º 15695133 M Sport, assinala automóveis e peças estruturais para os mesmos; acessórios para veículos motorizados;

A Marca de registo internacional n.º 1093414 M Performance, com designação da União Europeia como território de proteção, assinala, entre outros, motor vehicles and partsthereof;

A Marca da União Europeia n.º 1771468 M2 assinala, entre outros, veículos automóveis e respetivos componentes, aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água;

A Marca da União Europeia n.º 82883 M3, assinala, entre outros, automóveis e respetivas peças;

A Marca da União Europeia n.º 1951532 M4, assinala, entre outros, veículos automóveis e respetivos componentes, aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água;

A Marca da União Europeia n.º 82859 M5, assinala, entre outros, automóveis e respetivas peças;

A Marca da União Europeia n.º 1771492 M6 assinala, entre outros, veículos automóveis e respetivos componentes, aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água;

E quanto aos sinais das RR.:

As RR. usam os vários sinais MForce no território português para distinguir serviços de oficina de reparação automóvel;

Possuindo a Ré Topchallenge mais de 80 oficinas e dizendo ter uma nova solução integrada de serviços de reparação automóvel com a designação MForce.

As RR não usam a marca “mforce Mobility Force” na produção/comercialização de veículos, correspondendo antes a uma rede de oficinas que presta serviços na área da reparação: a mudança de óleo e filtros, substituição de pneus, travões, lâmpadas e amortecedores, a reparação de furos e outros serviços de reparação de automóveis.

Tendo, no dia 27 de outubro de 2020 sido publicitado o “nascimento” de uma nova rede de oficinas MFORCE.

Pelo que, em face de tais factos, havia que entender, como fez a 1.ª Instância, que se está perante produtos que apresentem entre si um grau de semelhança ou proximidade suficiente para permitir, ainda que parcialmente, uma procura conjunta, para satisfação de idênticas necessidades dos consumidores, devendo observar-se, como se fez na sentença, “que existem elos de identidade e afinidade, na medida em que visam serviços e produtos da mesma tipologia e de natureza complementar, podendo coincidir, por isso, quanto ao mercado de atuação, canais de distribuição e público-alvo relevante”; e concluir-se que se está perante produtos ou serviços afins/semelhantes.

Foquemo-nos pois sobre a apreciação da identidade ou confundibilidade entre os “sinais” utilizados pelas RR. e as marcas prioritárias da A..

Apreciação em que as Instâncias começaram por considerar, por razões idênticas, que a marca da União Europeia (nominativa) n.º 007134158 “M” é uma marca notória.

Como decorre do acima referido e do art. 9.º do RMUE, a notoriedade da marca anterior/prioritária não é um requisito de procedência dum “processo de infração” como o presente, porém, uma vez que, quanto maior for a notoriedade da marca anterior/prioritária, maior será o risco de confusão com uma marca posterior, é relevante examinar/apurar se a mesma é uma marca notória: como se refere no acórdão recorrido, a caraterização de uma marca como notória “altera os pressupostos de apreciação dos riscos de confusão e/ou associação”.

A tal propósito, sustentam as RR./recorrentes que, “(…) partindo da matéria de facto dada por provada, e colocando-nos na perspetiva do consumidor médio, a marca da União Europeia n.º 007134158, M (nominativa), não pode ser qualificada como marca notória”.

“Saltando” a questão decorrente das Instâncias terem classificado, por razões idênticas, a marca da União Europeia (nominativa) n.º 007134158 “M” como uma marca notória – ou seja, a questão de saber se é ou não admissível as RR./recorrentes ainda continuarem a discutir a classificação, como notória, da marca nominativa n.º 007134158 “M” (por causa do obstáculo da “dupla conforme” colocado pelo art. 671.º/3 do CPC) – diremos, antecipando desde já a conclusão, que acompanhamos a classificação das Instâncias.

Deve entender-se por marca notoriamente conhecida, a marca que é reconhecida pelo grande público consumidor como distinguindo de uma forma imediata um determinado produto ou serviço, costumando distinguir-se duas hipóteses: se o produto ou serviço for de grande consumo, a marca deve ser conhecida do grande público; se o produto ou serviço for de consumo específico, a marca deve ser conhecida do grande público interessado nesse produto ou serviço.

Marca notória é uma coisa/conceito diferente de marca de prestígio, sem prejuízo de ambas estarem ligada ao poder apelativo de uma marca (selling power), que, no caso da marca de prestígio, leva a que a tutela instituída vá para além do círculo de proteção definido pela regra da especialidade (como resulta dos arts. 8.º/5 e 9.º/2/c) do RMEU e dos correspondentes preceitos do CPI).

A marca de prestígio é normalmente caraterizada como uma marca que possui uma individualidade acentuada (é um sinal que não é normalmente adotado por terceiros noutros ramos da atividade económica) e que beneficia de considerável prestígio junto do público (é uma marca particularmente apreciada, pela elevada qualidade geralmente reconhecida aos produtos que assinala, ou pela imagem especialmente atrativa que lhe está associada), mas, além disto, tem de ser uma marca que goza de um elevado grau de notoriedade junto do publico – é uma marca supernotória – razão pela qual um sinal que gere confusão com uma “marca anterior”, seja de prestígio ou meramente notória, se “aproveita” da sua notoriedade, criando diluição e redução no poder apelativo quer da marca de prestígio quer da marca notória.

O RMUE (assim como o legislador nacional) não define o conceito de marca notória, porém, a propósito da proteção que confere às marcas notoriamente conhecidas (que mantém limitada pelo princípio da especialidade) remete, no art. 8.º/2/c) do RMUE, para a aceção do art. 6.º bis da CUP (Convenção da União de Paris para a proteção da Propriedade Industrial), sendo que a recomendação da CUP/OMPI estabelece, no seu art. 2.º/1/b, um conjunto de fatores indicativos para determinar se uma marca é notoriamente conhecida, designadamente:

a) o grau de conhecimento da marca junto dos meios interessados;

b) a duração, extensão e âmbito geográfico do uso da marca;

c) a duração, extensão e âmbito geográfico de promoção da marca, incluindo anúncio ou publicidade ou a apresentação em feiras ou exposições dos produtos ou serviços assinalados pela marca;

d) a duração e âmbito geográfico dos registos, e/ou pedidos de registos da marca, que reflitam a extensão do uso ou reconhecimento da marca;

e) o número de decisões favoráveis, em particular, ao reconhecimento da marca como notoriamente conhecida;

f) o valor associado à marca.

E são alguns destes fatores – e não é necessário que se verifiquem todos – que resultam dos factos provados em relação à marca da União Europeia (nominativa) n.º 007134158 “M”; não sendo o momento processual em que nos encontramos o momento próprio para discutir, como as RR./recorrentes parecem querer fazer, se os mesmos foram ou não bem dados como provados: de acordo com o art. 674.º/3 do CPC, “o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos provados materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa na lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova”, o que significa não cabem na reapreciação da matéria de facto por parte do STJ divergências relativamente ao julgamento da matéria de facto feito pelas Instâncias, agindo esta ao abrigo do princípio da livre apreciação de meios de prova, seja esta a prova testemunhal, documental ou pericial, atuação essa da Relação que, nos termos do referido art. 674.º/3/1.ªparte do CPC, é insindicável através do recurso de revista.

Assim, está definitivamente dado como provado que:

Num estudo em que foram inquiridos 8261 indivíduos (com idades a partir dos 16 ou 18 anos residentes na Áustria, Bélgica, França, Alemanha, Portugal, Espanha, Países Baixos e Reino Unido através de um questionário padronizado com a mesma redação traduzido para a língua de cada país) a marca M foi reconhecida como “marca de prestígio” (logo, dizemos/concluímos nós, com grande notoriedade); sendo que, relativamente aos 1002 inquéritos realizados em Portugal, resultou que 47% do total dos inquiridos afirmam estar familiarizados com a marca M;

A marca da União Europeia (n.º 007134158 M) é amplamente usada pela BMW para designar automóveis e suas peças componentes e acessórias, sendo disso exemplo os catálogos, anúncios publicitários e outras formas de comunicação comercial identificados nos factos;

A página oficial da “BMW M” na rede social Instagram conta com 8,4 milhões de seguidores;

A página oficial da “BMW M” na rede social Facebook tinha à data da propositura da ação mais de 5 milhões de seguidores;

A marca M da BMW é reconhecida na imprensa e em blogs relacionados com automóveis;

Num artigo do sítio de internet www.autoblog.pt dedicado à gama desportiva dos automóveis da BMW a marca M é referida como “a célebre letra M”;

Os 3 registos de marcas nacionais pedidos pela 1.ª R. foram recusados pelo INPI com fundamento no art. 235.º do CPI, ou seja, com fundamento em a marca M da A. ser marca de prestígio12;

A marca nominativa “M” está registada desde 05/08/2008 e tem como âmbito geográfico toda a União Europeia.

Factos estes que preenchem vários dos “fatores indicativos” referidos, pelo que, repete-se, concorda-se com a classificação da marca da União Europeia (nominativa) n.º 007134158 “M” como marca notória.

Não havendo qualquer dúvida, em face dos factos provados, que tal marca está a ser utilizada, ao contrário do que as RR./recorrentes agora invocam sobre “não existir nenhuma evidência de que marca da União Europeia n.º 007134158, M, ter sido sequer objeto de uso sério, nos últimos cinco anos anteriores à instauração da ação tramitada nos autos”; e sobre, “no caso da marca M, a Autora não logrou cumprir o ónus da prova previsto no n.º 1 do artigo 252.º do CPI”.

Efetivamente, dispõe-se no art. 252.º/1 do CPI que “o titular de um registo de marca só pode impedir a utilização de um sinal se, na data em que instaure a ação em que alegue a violação da sua marca, o seu direito não for suscetível de caducidade nos termos do n.º 1 do artigo 268.º”; acrescentando-se no 252.º/2 do CPI que, “caso o registo da marca invocada tenha completado cinco anos na data da instauração da ação, o alegado infrator pode requerer, na contestação, que o titular do registo apresente prova de que a sua marca satisfaz o requisito de uso sério, como previsto nos artigos 267.º e 268.º, ou de que existe um justo motivo para a falta desse uso”.

Sucede, como é sabido (e se extrai do art. 127.º/1 do RMUE), que um DPI, enquanto não se extinguir por efeito de uma decisão transitada em julgado, continua a produzir plenamente os seus efeitos, ou seja, a questão da extinção de um DPI não pode ser suscitada e conhecida a título meramente incidental (razão pela qual a lei – quer o RMUE quer o CPI – admite a dedução de pedidos reconvencionais em processos de infração como o presente – cfr. art. 124.º/d) do RMUE).

E, como já se referiu, estando em causa Marcas da União Europeia (MUE) é aplicável o RMUE, que admite, no seu art. 128.º/1, o pedido reconvencional de extinção (que corresponde à caducidade do art. 268.º do CPI), pedido que – por extinção da marca por não uso sério por 5 anos – não foi formulado pelas RR./recorrentes, dispondo, porém, o RMUE, no seu art. 127.º/3, que em processos de infração, como o presente, “(…) as exceções de extinção de uma marca da UE apresentadas por outra via que não seja um pedido reconvencional só são admissíveis caso o requerido alegue que a marca da UE poderia ser extinta por falta de utilização genuína no momento em que o processo de infração foi intentado”.

Ou seja, quer se entenda que a situação está diretamente contemplada em tal 127.º/3 do RMEU, quer se aplique subsidiariamente (ex vi art. 17.º/1 do RMEU) o que se dispõe no art. 252.º do CPI, deve entender-se que a questão ora suscitada – “não existir nenhuma evidência de que marca da União Europeia n.º 007134158, M, ter sido sequer objeto de uso sério, nos últimos cinco anos anteriores à instauração da ação tramitada nos autos” – configura defesa por exceção e que, por isso, devia ter sido suscitada logo na contestação, em obediência ao princípio da concentração da defesa constante do art. 573.º do CPC, pelo que, não tendo assim acontecido, ficou precludida a possibilidade da sua invocação, que as RR./recorrentes fazem, pela 1.ª vez, nas alegações do presente recurso de revista.

Em todo o caso, tendo a A. alegado na PI o uso da marca (nominativa) n.º 007134158 “M”, foi, nessa sequência, dado como provado, sem que tal tivesse sido impugnado no recurso de apelação, o seguinte:

- A marca M é usada para distinguir os veículos da BMW integralmente desportivos ou nas gamas mais desportivas dos diversos modelos, munidos de peças que permitem uma performance elevada na condução diária, inspiradas no desporto motorizado, que cumprem elevados padrões de funcionalidade, design, qualidade e vida útil.

Mais concretamente, a marca da União Europeia n.º 007134158M é amplamente usada pela BMW para designar automóveis e suas peças componentes e acessórias, sendo disso exemplo os catálogos, anúncios publicitários e outras formas de comunicação comercial abaixo identificados:

• Páginas 10, 11 e 12 do Catálogo do modelo “BMW M2 Competition”, publicado em julho de 2018 – cf. Doc. n.º 16 que se junta;

• Páginas 3, 4, 5, 7, 8, 9, 10e 11do Catálogo do modelo “BMW M5”, publicado em outubro de 2018 – cf. Doc. n.º 17 que se junta;

• Catálogo de 2016 dos modelos “BMW X5 M” e BMW X6 M” – cf. Doc. n.º 18 que se junta; • Print screens obtidos em outubro de 2019dalojaonline daBMWcom exemplos de várias peças e componentes automóveis vendidos com a marca M – cf. Doc. n.º 19 que se junta; • Exemplos de anúncios publicitários divulgados na imprensa nos anos de 2015 e 2016 fazendo a alusão a competições automóveis vencidas por pilotos da BMW com carros com equipamentos da gama M – cf. Doc. n.º 20 que se junta;

Além dos documentos apresentados especificamente para fazer prova do uso da marca da UE n.º 007134158 M e da marca internacional n.º 1093414 M Performance, a prova de que estas duas marcas são amplamente usadas pela BMW resulta também dos catálogos dos diversos modelos de automóveis juntos para prova do uso das demais marcas, os quais contêm exemplos de referências tanto a M como a M Performance para descrever os equipamentos e tecnologias aplicados nos automóveis designados com as marcas M2, M3, M4, M5 e M6.

Tal é o caso dos seguintes documentos:

• Doc. n.º 25, páginas 4, 9, 11, 13, 14, 18, 19;

• Doc. n.º 28, páginas 2, 12, 13, 18;

• Doc. n.º 31, páginas 3, 7, 11, 20, 22, 23, 24, 25, 27, 34, 35, 36, 40, 41 e 42; • Doc. n.º 37, páginas 7, 9, 13, 14 e 21.

Enfim, a questão em análise – “não existir nenhuma evidência de que marca da União Europeia n.º 007134158, M, tenha sido objeto de uso sério, nos últimos cinco anos anteriores à instauração da ação tramitada nos autos” – para além de ser intempestivamente suscitada, é em substância totalmente impertinente: está provado o uso sério da mesma nos últimos cinco anos anteriores à instauração da presente ação.


*

Debrucemo-nos pois sobre a identidade ou confundibilidade entre os “sinais” utilizados pelas RR. e as marcas prioritárias da A..

As marcas prioritárias da A., tal como resulta dos factos provados, são as seguintes:

- A Marca da União Europeia (nominativa) n.º 007134158 M, requerida em 05.08.2008 e registada em 24.11.2009, para assinalar automóveis, peças para os mesmos e acessórios para veículos automóveis:

- A Marca da União Europeia n.º 18001234, , requerida em 18.12.2018 e registada em 20.01.2021, para assinalar, entre outros, veículos; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos;

- A Marca de registo internacional n.º 1456163, , com designação da União Europeia, registada em 17.01.2019, com reivindicação de prioridade de 09.08.2018, e que assinala “vehicles and conveyances; powertrains, including engines and motors, for land vehicles; parts and fittings for vehicles as well as wheels and tyres, and continuous tracks for vehicles, hub caps”;

- A Marca da União Europeia n.º 18001222 , , requerida em 18.12.2018 e registada em 20.01.2021, para assinalar, entre outros, veículos; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos;

- A Marca da União Europeia n.º 17955439 M Power, requerida em 14.09.2018 e registada em 14.02.2019, para assinalar, entre outros, veículos e meios de transporte; motorizações, incluindo motores, para veículos terrestres; componentes e acessórios de veículos, assim como rodas, pneus e lagartas para veículos, na classe 12 e trabalhos de instalação, limpeza, reparação e manutenção de veículos e meios de transporte, componentes e acessórios para veículos, rodas, pneus, motores, dínamos para veículos terrestres, filtros para motores e máquinas, filtros de ar, filtros de óleo, sistemas, tubos e panelas de escape, catalisadores, motores de arranque, turbocompressores, radiadores de refrigeração para motores, dispositivos de comando para motores e máquinas, bombas, compressores e ventiladores, robôs, geradores de eletricidade, máquinas distribuidoras, aparelhos para mudanças e aparelhos de transporte;

- A Marca da União Europeia n.º 15695133 M Sport, requerida em 27.07.2016 registada em 02.10.2017, para assinalar automóveis e peças estruturais para os mesmos; e acessórios para veículos motorizados;

- A Marca de registo internacional n.º 1093414 M Performance, com designação da União Europeia como território de proteção, registada em 11.07.2011 e que reivindica prioridade de 07.02.2011, para assinalar, entre outros, motor vehicles and partsthereof;

- A Marca da União Europeia n.º 1771468 M2, requerida em 24.07.2000 e registada em 27.08.2001 para assinalar, entre outros, veículos automóveis e respetivos componentes; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água;

- A Marca da União Europeia n.º 82883 M3, requerida em 01.04.1996 e registada em 12.08.1999, para assinalar, entre outros, automóveis e respetivas peças;

- A Marca da União Europeia n.º 1951532 M4, requerida em 13.11.2000 e registada em 11.02.2002, para assinalar, entre outros, veículos automóveis e respetivos componentes; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água;

- A Marca da União Europeia n.º 82859 M5, requerida em 01.04.1996 e registada em 12.08.1999, para assinalar, entre outros, automóveis e respetivas peças;

- A Marca da União Europeia n.º 1771492 M6, requerida em 24.07.2000 e registada em 17.09.2001, para assinalar, entre outros, veículos automóveis e respetivos componentes; aparelhos de locomoção por terra, por ar ou por água;

Ou seja, a A. é titular das marcas nominativas “M”, “M Power”, “M Sport”, “M Performance”, “M2”, “M3”, “M4”, “M5” e “M6”; e das marcas figurativas


,  e  .

Sucedendo, como também está provado, que a designação MFORCE começou a ser usada, desde o final do mês de outubro de 2020, nas oficinas de reparação automóvel do Grupo Topchallenge; e as RR., além de referida designação MFORCE usam os seguintes sinais na sua atividade:
 e . e  (como foi considerado pelo Acórdão recorrido, pela conjugação do teor dos factos descritos em 7, 16, 24 e 25 da sentença).

Estando apenas sob revista, como se começou por restringir a propósito do objeto admissível do presente recurso, o que, em divergência com a sentença, foi decidido pelo Acórdão recorrido quanto a tais três últimos sinais.

E, tendo presente os critérios atrás referidos para apreciar a existência de traços de confundibilidade entre as marcas da A. e tais 3 sinais usados pelas RR. importa observar, de mais saliente, o seguinte:

A marca nominativa “M” da A. é, como se considerou, uma marca notória – o que no caso significa que é amplamente conhecida pelo público/consumidor para distinguir automóveis, peças, acessórios e componentes de automóveis – e quando assim é, quando a comparação é com uma marca prioritária que é notória, aumenta a suscetibilidade de erro por parte do público, que mais facilmente ligará a nova marca com o sinal preexistente, pelo que um grau mínimo de semelhança entre os sinais é suscetível de gerar risco de confusão no espírito do público/consumidor; e apreciados todos os fatores relevantes do caso em apreço existe tal grau de semelhança quer ao nível fonético quer ao nível concetual.

De facto:

A A. é titular de várias marcas nominativas em que a letra “M” é o único elemento ou em que tal letra é o elemento dominante, sendo que também nas 3 marcas mistas utilizadas pelas RR. (e sob revista) está presente a letra “M” e de modo dominante, ou seja, há semelhança fonética (em que releva o som da leitura dos sinais) entre o elemento verbal dominante de tais 3 marcas mistas e o elemento dominante das marcas nominativas da A.; e quando uma marca é composta de elementos nominativos e figurativos, os primeiros devem ser considerados mais distintivos que os segundos, pois o consumidor médio fará mais facilmente referência ao produto em causa citando o nome desse produto do que descrevendo o elemento figurativo da marca.

A A. é titular de várias marcas nominativas em que sempre a letra/elemento “M” é seguida por uma palavra ou algarismo, razão pela qual as tais 3 marcas mistas das RR. geram uma certa similitude concetual com as várias marcas nominativas da A., na medida em que também o “M” dos sinais das RR. é seguido de uma letra ou de uma palavra, podendo fazer acreditar o público/consumidor que os serviços ou produtos identificados por tais 3 marcas mistas são provenientes da mesma fonte de que provêm os produtos identificados pelas marcas da A..

Importando neste ponto do raciocínio não esquecer que aquilo que se deve comparar, como acima se referiu, é a reminiscência que fica na memória do público/consumidor, ou seja, em face de tais similitudes fonética e concetual, há o significativo risco do público/consumidor poder acreditar que tais 3 marcas mistas das RR. não são mais do que mais uma marca “M” da A., até porque, como decorre do conceito de imitação atrás referido, não se exige que o público/consumidor empreenda um “exame atento ou confronto” entre os sinais; risco este agravado pelo chamado “princípio da interdependência”, pelo grau de semelhança entre os produtos ou serviços assinalados, isto é, um ainda que reduzido grau de semelhança entre as marcas pode ser compensado por um elevado grau de semelhança entre os produtos ou serviços assinalados (como será o caso, em que estão em causa, em todas as marcas da A. e RR., peças, acessórios e componentes para automóveis).

Como se refere na parte final do art. 9.º/2/b) do RMEU (e também no conceito de imitação do art. 238.º do CPI), “o risco de confusão compreende o risco de associação entre o sinal e a marca”, ou seja, o risco de confusão compreende as situações que o público/consumidor, até admitindo que os produtos ou serviços possam ter origem diferente, incorre no risco de pensar que existe alguma ligação, seja meramente económica e/ou comercial, entre as fontes dos produtos ou serviços assinalados (a proteção da marca registada estende-se à prevenção de qualquer associação indevida que possa prejudicar o valor distintivo e o selling power da marca registada).

É certo que não existe semelhança visual entre as marcas da A. e os 3 sinais sob análise das RR. – não existe semelhança entre a “mancha” resultante das letras, palavras, desenhos ou cores de umas e outras – mas em relação às marcas nominativas, como é o caso de nove das marcas prioritárias da A., é menos importante a comparação/semelhança do elemento visual, antes se devendo atribuir, na comparação com marcas nominativas, especial relevo ao elemento fonético (na medida em que a sonoridade da marca é mais fácil de reter na memória do público do que os elementos visuais ou concetuais).

Sendo irrelevante o que as RR/recorrentes agora argumentam a partir e com base no estarem registadas as marcas figurativas e/ou com representação estilizadas da letra “M” mencionadas nos pontos 34 e 36 a 40 dos factos provados13, desde logo por, na generalidade desses casos, não dizerem sequer respeito a produtos ou serviços idênticos ou afins dos que as marcas da A. indicam e distinguem, sendo certo que o registo de marcas na UE (como em Portugal) é um registo por produtos ou serviços (não é um registo por classes, sendo irrelevante que os produtos ou serviços pertençam à mesma classe) e que concede proteção apenas em relação aos produtos ou serviços obrigatoriamente indicados pelo requerente do registo e aos produtos idênticos ou afins, ou seja, o registo de tais marcas não torna “fracas” as marcas da A., não dilui a sua capacidade distintiva, nem as faz gozar de um “diâmetro” de proteção reduzido (e não é caso para se invocar a denominada “teoria da distância”, segundo a qual o titular de uma marca, no caso a A., não pode exigir que as marcas posteriores se diferenciem da sua marca num grau superior àquele em que esta se diferencia das marcas que a precederam e/ou que existem no mercado).

Enfim, colocando num “prato da balança” os fatores de semelhança ao nível fonético e concetual e, no outro “prato”, os fatores de diferenciação ao nível visual/figurativo, temos que os fatores de semelhança ultrapassam e desvalorizam os de dissemelhança no contexto dos demais, pelo que a impressão global do conjunto – que desvaloriza pormenores e se concentra nos elementos dotados de maior eficácia distintiva – não pode deixar de ir, na comparação dos sinais, no sentido de existir risco de confusão: importa não esquecer que a lei rejeita não só os sinais “idênticos”, mas também os “semelhantes”, desde que haja um risco sério de confusão (pelo que pequenas alterações ou aditamentos são inócuos para efeitos de comparação).

Acompanha-se pois o Acórdão recorrido quando, divergindo da sentença, entendeu:

- que a inclusão da expressão “Mobility Force” em dois dos sinais “ocupa uma localização secundária nos sinais que a torna irrelevante na imagem de conjunto”; e que “apenas uma análise mais cuidada por parte do consumidor permitiria identificar a expressão “mobility” com a letra “M” nos sinais”;

- que, “no sinal , o desenho estilizado de um carro não afasta os riscos assinalados, na medida em que tal elemento assume um carácter genérico e desprovido de distintividade no contexto de oficinas automóveis”; e

- que, quanto ao sinal , “(…) para além do uso do “M” remete para uma associação com os restantes sinais das rés, os quais apresentam risco de confusão e associação, no sentido estrito, com as marcas prioritárias da autora. O “MF” do sinal misto mais não representa que as iniciais do sinal “MForce” cujo uso proibimos às rés”.


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Concluindo, os factos provados preenchem integralmente a previsão do art. 9.º/2/b) do RMUE, mais exatamente, as RR. usam, no exercício da sua atividade económica, sinais semelhantes a marcas registadas anteriores da UE da A., fazem-no em relação a produtos ou serviços afins aos produtos ou serviços abrangidos pelos registos da A. e tal uso é suscetível de gerar um risco de confusão ou associação no espírito do público/consumidor.

Bem andou pois o Acórdão recorrido – face ao direito, conferido por tal art. 9.º/2 do RMUE, de impedir/proibir terceiros de tal uso – ao condenar as RR.:

- na cessação e abstenção do uso de tais sinais, por qualquer meio e sob qualquer forma, em todo o território da União Europeia, no âmbito da sua atividade comercial de serviços (oficinas) de reparação automóvel ou para distinguir quaisquer produtos ou serviços semelhantes ou afins a automóveis, suas peças e componentes;

- na remoção e destruição, a expensas suas, de todos os suportes físicos e materiais na sua posse donde constem tais sinais (nomeadamente fachadas das oficinas, expositores, móveis, materiais impressos ou institucionais e qualquer outro suporte físico exposto ou usado no interior das oficinas);

- na remoção de todas as referências aos sinais, designadamente, a referência a OFICINASMFORCE dos sítios de internet das Rés, nas redes sociais Facebook, Instagram, Youtube, Linkedin ou outras ou em qualquer outro formato ou plataforma digital de comunicação comercial; e

- no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor de € 500,00 (quinhentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento da sentença.

Efetivamente, instaurando o titular dum DPI violado uma ação declarativa, como a presente, e pedindo que as RR. sejam impedidas de prosseguir a conduta ilícita, tal ação (ação inibitória) conduz, no essencial, a uma condenação em factos negativos (não fazer algo), o que coloca sérias dificuldades na execução de tal condenação, razão pela qual a A. pediu que a sentença incluísse a condenação das aqui RR. no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória (destinada a reforçar a eficácia da sentença), situação/condenação expressamente prevista no art. 349.º/4 do CPI..

E bem andou também o Acórdão recorrido ao determinar o cancelamento do nome de domínio “oficinasmforce.pt”, mediante ordem a dirigir à Associação DNS.PT..

Como consta do ponto 81 dos factos, “as Recorridas usam o nome de domínio “oficinasmforce.pt” para comunicar comercialmente os seus serviços (oficinas) de reparação automóvel com a designação “MForce”.

Estando as RR./Recorrentes condenadas a abster-se e a cessar o uso de tal designação, tal significa que o nome de domínio “oficinasmforce.pt” infringe as marcas da A., na medida em que a expressão “oficinas” é descritiva da atividade desenvolvida pelas Recorridas e que é publicitada e comunicada comercialmente ao público através do nome de domínio “oficinasmforce.pt” – como se refere no Acórdão recorrido, “a expressão “oficinas” não tem qualquer caracter distintivo, mais não sendo do que a indicação da atividade desenvolvida pelas rés” – não sendo tal nome de domínio mais do que a combinação da designação “mforce”, que as Recorrentes estão proibidas de usar, com tal termo descritivo e sem distintividade “oficinas”, existindo assim um risco de confusão do público/consumidor quanto à natureza e à proveniência dos serviços de reparação automóvel prestados pelas RR./Recorrentes e divulgados através do sítio da internet alojado no nome de domínio “oficinasMforce.pt”.

Ademais, dispõe-se no artigo 6.º/2 das “Regras de Registo de .PT” 202114, que o nome de domínio não deve corresponder à reprodução de uma marca de terceiro de conhecimento amplo e generalizado; e segundo o art. 27.º, n. 3, alíneas i) e ii) das referidas “Regras”, para efeitos do previsto no art. 6.º/ entende-se por:

I – reprodução de uma marca, nome ou designação, as situações em que o nome de domínio coincida com o elemento nominativo de qualquer um destes sinais, devendo para esse efeito ser considerada a totalidade da sua composição gráfica, ou, não se verificando essa coincidência, dele resulte um aditamento ou obliteração de um ou mais carateres que, alterando a grafia da marca, do nome ou da designação, não alteram por completo a sua fonia. No caso em que se verifique que o site associado ao nome de domínio comercializa bens ou produtos iguais ou similares àqueles que estão protegidos pelo registo do sinal em conflito, o conceito de reprodução fica também preenchido se o nome do domínio coincidir ainda que apenas parcialmente com a composição gráfica deste sinal;

II – conhecimento amplo e generalizado, quando a marca, nome ou designação tiverem projeção pública relevante no mercado ao qual se dirigem, comprovada designadamente pelo nível de implantação no mercado; referências na imprensa da especialidade; volume de negócios; quando aplicáveis, magnitude e alcance geográfico de canais de venda e distribuição e apresentação pública, conhecimento, posicionamento e perceção de qualidade e credibilidade do produto; tempo de presença no mercado. Incluem-se aqui todas as marcas notórias e de prestígio (…)”

Prevendo-se, no art. 22.º de tais “Regras”. que o nome de domínio é removido de imediato quando o .PT tenha conhecimento, designadamente, da perda do direito ao nome de domínio por força de decisão judicial.

Pelo que não podia deixar de se interditar o uso do nome de domínio “oficinasmforce.pt” e de se determinar o cancelamento do nome de domínio “oficinasmforce.pt”.


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É quanto basta para julgar a presente revista, na parte admissível e de que se toma conhecimento, totalmente improcedente.

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V - Decisão

Nos termos expostos, ao abrigo do art. 652.º/1/b) do CPC (ex vi 679.º do CPC), não se toma conhecimento do recurso na parte em que o seu objeto versa sobre a parte em que o Acórdão recorrido confirmou a sentença da 1.ª Instância; e, quanto à parte restante, de que se conhece, nega-se a revista.

Custas, da Revista, pelas RR./Recorrentes.


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Cumpra-se o disposto no artigo 34.º/5 do CPI (ex vi art. 46.º do CPI).

Lisboa, 14/11/2024

António Barateiro Martins (relator)

Maria de Deus Correia

Oliveira Abreu

_______



1. Sendo que, para ultrapassar o obstáctulo da “Dupla Conforme” e da correspondente inadmissibilidade da revista, não indicaram – ou sequer invocaram – razões para a admissibilidade da revista excecional (cfr. art. 672.º, n.º 1 e n.º 2 do CPC).

2. Alberto dos Reis, Comentário, Vol. 3.º, pág. 170.

3. Com a ressalva, claro, da marca anterior ser uma “marca de prestígio”.

4. Com a ressalva, repete-se, da marca anterior ser uma “marca de prestígio”.

5. Lições de Direito Comercial, pág. 379.

6. Pedro Sousa e Silva, Direito Industrial, Noções Fundamentais, pág. 271.

7. Pedro Sousa e Silva, local citado, 283

8. Assim como no CPI, nos 208.º e ss.

9. Assim como têm competência para conhecer de pedidos reconvencionais de extinção (o equivalente à caducidade do art. 268.º do CPI) e de declaração de nulidade das MUE (cfr. arts. 124.º/d) e 128.º do RMUE), em desvio ao regime constante dos artigos 63.º e ss do RMUE, segundo o qual os pedidos de extinção ou de declaração de nulidade das MUE são apresentados e julgados no EUIPO, nos termos dos arts. 63.º e ss do RMUE, podendo depois haver recurso para a Câmara de Recurso, TG e TJUE (cfr. arts. 66.º e ss do RMUE).

10. Das marcas nominativas “MForce”, “MExpert” e da marca nominativa referida no ponto 25 dos factos.

11. O que também existe na relação entre os arts. 232.º, 235.º e 249.º do CPI, quanto às marcas nacionais; tendo sido exatamente com base em tais normas que foram recusados os registos referidos por parte do INPI.

12. Assim como se encontram juntas aos autos diversas certidões (doc. 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62) contendo recusas de registo do INPI, do EUPIO, do IEPM e do Instituto Italiano, com fundamento no risco de confusão com a marca “M” da A., considerada como prestigiada (o que significa grande notoriedade) por tais Institutos.

13. Sendo que, quanto às marcas nominativas da NISSAN, referidas no ponto 35 dos factos, está provado, no ponto 86 dos factos, que “o uso no comércio de marcas M da Nissan encontram-se regulados por um acordo global celebrado entre aquela empresa e a BMW, em 2007, nos termos do qual os direitos da BMW sobre M foram reconhecidos e respeitados pela Nissan”.

14. Disponível in Regras de Registo de .pt