Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0124/18.8BEMDL
Data do Acordão:05/04/2023
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:JOSÉ VELOSO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
ADVOGADO
REFORMA
CONTRIBUIÇÕES
DÍVIDA
Sumário:Não é de admitir o recurso de revista se a questão suscitada desmerece por não se divisar a clara necessidade de melhor aplicação do direito, e por a invocação de inconstitucionalidade de normas e interpretações normativas não constituir objecto próprio do recurso excepcional de revista.
Nº Convencional:JSTA000P30956
Nº do Documento:SA1202305040124/18
Data de Entrada:04/21/2023
Recorrente:AA
Recorrido 1:CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS ADVOGADOS E SOLICITADORES
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em «apreciação preliminar», na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. AA - autor desta acção administrativa - vem, invocando o artigo 150º do CPTA, interpor recurso de revista do acórdão do TCAN - de 13.01.2023 - que concedeu provimento à apelação da CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS ADVOGADOS E SOLICITADORES [CPAS], revogou a sentença do TAF de Mirandela - de 28.04.2022 - e, em substituição, julgou a sua acção improcedente.

Alega que o recurso de revista deverá ser admitido em nome da «necessidade de uma melhor aplicação do direito».

A recorrida - CPAS - apresentou contra-alegações defendendo, para além do mais, a não admissão do recurso de revista por falta de verificação do invocado pressuposto - artigo 150º, nº1 «in fine», do CPTA.

2. Dispõe o nº1, do artigo 150º, do CPTA, que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Deste preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s, no uso dos poderes conferidos pelo artigo 149º do CPTA - conhecendo em segundo grau de jurisdição - não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar: i) Quando esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental; ou, ii) Quando o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

3. O advogado autor da acção - AA - impugnou judicialmente a decisão de 11.01.2018 da CPAS, que lhe indeferiu pedido de atribuição de pensão de reforma com base no disposto no artigo 40º, nº1 alínea c), do Regulamento da CPAS [DL nº119/2015, de 29.06], ou seja, com fundamento na existência de dívidas de contribuições.

O tribunal de 1ª instância - TAF de Mirandela - julgou procedente a sua pretensão, e, em conformidade, anulou o acto impugnado por ter indeferido o pedido do autor mediante uma interpretação inconstitucional da dita norma legal, condenando o CPAS a deferir o pedido de atribuição de reforma que lhe foi formulado. Entendeu a respectiva sentença que a «alínea c), do nº1, do artigo 40º do Regulamento da CPAS», não era impeditiva da atribuição de pensão de reforma estritamente proporcional às contribuições efectivamente asseguradas pelo beneficiário, ou, através da cobrança de contribuições em dívida mediante compensação da pensão de reforma a ser atribuída, com o respectivo cômputo no período e montante da pensão.

O tribunal de 2ª instância - TCAN - concedeu provimento à apelação da CPAS, revogou a sentença recorrida e julgou improcedente a acção, fazendo-o essencialmente com base na consideração de que estamos face a um sistema de previdência de base profissional não estadual, e que a exigência «cumulativa» das condições impostas pelas alíneas do nº1, do artigo 40º, do Regulamento da CPAS, não permitiam a interpretação efectuada na sentença de 1ª instância.

O autor da acção discorda e pede revista do assim decidido. Defende que o acórdão do tribunal de apelação «errou no seu julgamento de direito» já que a referida alínea c) - do nº1 do artigo 40º do RCPAS - deverá ser interpretada conforme fez a sentença do TAF. E sublinha que a interpretação efectuada no acórdão ora recorrido é inconstitucional, na medida em que viola os artigos 13º, 61º nº1, 62º nºs 1 e 2, 63º, e 277º, da CRP, e é, ainda, inconstitucional por violação dos princípios ínsitos na DUDH, nomeadamente o direito a uma vida digna [artigo 25º da DUDH]. Termina pedindo a revogação do acórdão recorrido e que se declare a inconstitucionalidade da alínea c) do nº1 do artigo 40º do Regulamento da CPAS na interpretação que nele se fez.

Compulsados os autos, importa apreciar «preliminar e sumariamente», como compete a esta Formação, se estão verificados os «pressupostos» de admissibilidade do recurso de revista - referidos no citado artigo 150º do CPTA - ou seja, se está em causa uma questão que «pela sua relevância jurídica ou social» assume «importância fundamental», ou se a sua apreciação por este Supremo Tribunal é «claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Feita a referida apreciação, resulta bastante claro que a presente revista não deve ser admitida, apesar da divergência verificada nas decisões dos tribunais de instância. Na verdade, a interpretação e aplicação da lei efectuada no acórdão recorrido é aceitável, porque coerente, dotada de lógica jurídica, sem erros de direito manifestos, e, no tipo de juízo que nos é pedido, aparentemente acertada. Aliás, no âmbito das alegações de revista o recorrente não apresenta razões jurídicas contundentes para divergir dessa mesma interpretação e aplicação da lei, para além, obviamente, daquelas que esgrime no sentido da inconstitucionalidade da alínea c), do nº1, do artigo 40º do Regulamento da CPAS.

Acontece que quanto à questão desta inconstitucionalidade a intervenção do STA não pode assegurar as finalidades inerentes à teleologia do recurso excepcional de revista, isto é, de, «em termos finais», decidir litígios e, ou, definir interpretações para futuras decisões de casos semelhantes. É que em sede de controlo da constitucionalidade das normas e interpretações normativas a última palavra caberá ao Tribunal Constitucional, pelo que as mesmas não constituem objecto próprio do recurso de revista pois podem ser separadamente colocadas ao Tribunal Constitucional. Este entendimento traduz a aplicação de jurisprudência que vem sendo - constantemente - reiterada por esta Formação de Apreciação Preliminar.

Assim, e sem mais delongas, impõe-se «não admitir a revista» por falta de verificação do único pressuposto para o efeito invocado, ou seja, o da «clara necessidade de uma melhor aplicação do direito».

Nestes termos, e de harmonia com o disposto no artigo 150º do CPTA, acordam os juízes desta formação em não admitir a revista.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 4 de Maio de 2023. – José Veloso (relator) – Teresa de Sousa – Fonseca da Paz.