Texto Integral: | Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 151/07.0BECTB
1. RELATÓRIO
O acima identificado Recorrente, inconformado com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul (fls. 387 a 420 do processo físico) que, negando provimento ao recurso por ele interposto da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, manteve a sentença que julgou improcedente a oposição que ele deduzira à execução fiscal que, instaurada contra uma sociedade para cobrança de dívidas de IRC e de IVA, reverteu contra ele, veio apresentar requerimento em que i) invocou a nulidade e requereu a reforma do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, subsidiariamente, «caso não proceda» o pedido de reforma, ii) interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo por oposição de acórdãos e iii) «sub-subsidiariamente, caso nada do atrás requerido proceda», interpôs recurso de revista excepcional, nos termos do art. 150.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA).
Por acórdão de 9 de Junho de 2016 (fls. 451 a 454 do processo físico) o Tribunal Central Administrativo Sul desatendeu a arguição de nulidade e o pedido de reforma do acórdão.
Por acórdão de 3 de Abril de 2019 (fls. 516 a 526 do processo físico) o Supremo Tribunal Administrativo julgou findo o recurso por oposição de acórdãos.
O recurso de revista foi admitido por despacho da Desembargadora relatora no Tribunal Central Administrativo Sul (fls. 567 do processo físico).
O Recorrente apresentou as alegações de recurso, das quais resulta que pretende ver apreciadas três questões, que enunciou nos seguintes termos:
«A) Não tendo sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou não existindo qualquer penhora que garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o prazo de prescrição legal suspende-se ou não enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição? Ou seja, o prazo de prescrição legal suspende-se ou não com a citação relativa à execução?
B) A interrupção da prescrição tem lugar ou não uma única vez?
C) Pode ou não dizer-se que o ano de liquidação dos tributos corresponde à data do seu pagamento voluntário?».
Alega tratar-se de «questões de importância fundamental e que resultam da sua relevância jurídica e social: aquela entendida não num plano meramente teórico mas prático em termos de utilidade jurídica da revista; e esta, em termos da capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular».
Pretende também o Recorrente que seja apreciada em sede de recurso excepcional de revista a questão que denominou «Inconstitucionalidade/nulidade», que enunciou nos seguintes termos: «Insiste-se que se pretende ainda ver apreciada a inconstitucionalidade da norma contida no artigo art. 204.º do CPPT quando interpretada com o sentido de que, não contendo a citação a fundamentação das liquidações nomeadamente não contendo “os relatórios completos dos serviços de fiscalização, acompanhados de todos os documentos que lhe foram anexos e de todas as notas de liquidação respectivas e dos processos de aplicação de coimas; nem contendo o processo de execução movido contra a sociedade executada (LGT, art. 23.º, n.º 2), que contivesse o resultado da execução do património da sociedade, para que o oponente pudesse demonstrar que nenhum acto praticou que contribuísse para a diminuição do património da sociedade,” tal citação não é nula, apesar de desrespeitar o direito à fundamentação, o direito de defesa, o direito a um processo equitativo como corolário do direito à tutela jurisdicional efectiva, do acesso ao direito em todas as instâncias, da prevalência da justiça material sobre a justiça formal, do respeito pelo Estado de Direito Democrático, tudo consagrado nos artigos 2.º, 18.º, 20.º, 26.º, 52.º, 260.º e 268.º da CRP.
Efectivamente, nenhuma decisão se pronunciou ainda sobre esta inconstitucionalidade que foi alegada logo na 1.ª instância e também nas alegações de recurso para o TCAS, o que constitui uma nulidade que se invoca – art. 615.º, n.º 1, al. b) do CPC».
Terminou as alegações de recurso formulando conclusões do seguinte teor:
«A) Pelo que, pelos fundamentos invocados, já ocorreu a prescrição de todos os tributos em causa nestes autos, nomeadamente
b) Porque o prazo de prescrição só se suspende com uma citação nos casos de ter sido deduzida uma oposição (ou uma reclamação, impugnação judicial ou recurso) e enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, se tiver sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º do CPPT, ou existindo qualquer penhora que garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido;
c) Se a citação (assim como os restantes actos interruptivos da prescrição) tivesse também um efeito duradouro ou suspensivo da prescrição, como se afirma no Acórdão recorrido, deixariam de ter sentido as específicas normas tributárias que dizem respeito expressamente ao instituto da suspensão da prescrição, nomeadamente com a dedução de oposição que ocorre necessariamente em data posterior à citação (nomeadamente art. 49.º da LGT, n.º 4 e art. 169.º, n.ºs 1 e 10 do CPPT);
d) E o ano de liquidação dos tributos não é a mesma coisa que a data do seu pagamento voluntário».
1.2 Não foram apresentadas contra-alegações.
1.3 O Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer (fls. 581 a 583 do processo físico) no sentido de que o recurso não deve ser admitido. Isto, após enunciar os pressupostos legais do recurso excepcional de revista e de resumir os termos do presente recurso, com a seguinte fundamentação: «[…]
Com todo o, sempre, devido respeito por opinião contrária, afigura-se que o recurso não deve ser admitido.
O reexame da 1.ª questão referida não pode ser admitido.
De facto, por força do disposto no artigo 49.º/3 da LGT, na redacção introduzida pela Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro (LOE 2007) a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.
Todavia, a LOE de 2007 entrou em vigor 1 de Janeiro de 2007, e, sendo uma norma sobre os efeitos dos factos, ela só se aplica após a sua entrada em vigor, por força do estatuído no artigo 12.º/2 do CC (Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas práticas, página 65, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa), pelo que não poderia ter aplicação ao caso em análise.
Ora, a jurisprudência consolidada do STA vai no sentido de que, antes de 01/01/2007, cada facto interruptivo da prescrição tem a virtualidade de interromper o prazo prescricional, ainda que ocorra quando a anterior ainda está a produzir efeitos (Entre outros, acórdão do PLENO da SCT do STA, de 03/04/2019-P. 02369/15.3BEPNF 0983716, disponível em www.dgsi.pt).
Também não deve ser admitido o reexame da 2.ª questão referida, pois que a jurisprudência consolidada do STA (nomeadamente, o já citado acórdão), vai no sentido de o prazo de prescrição interrompido por via da citação do devedor não correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro).
A 3.ª referida questão não tem qualquer relevância para a aferição da prescrição, uma vez que a citação que impede o decurso do prazo da prescrição é a citação do próprio recorrido revertido, ocorrida em 26/09/2006, e não a citação da devedora originária, pelo que nunca haveria que convocar o normativo do artigo 48.º/3 da LGT.
Acresce que, em nosso entendimento, o acórdão recorrido não confunde o ano em que os tributos são liquidados, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 48.º/3, com o prazo de pagamento voluntário, sendo que este elemento, apenas, terá sido referido para encontrar o ano da liquidação.
A alegada desconformidade constitucional também não constitui fundamento do recurso excepcional de revista, uma vez que as questões de constitucionalidade podem discutir-se (e só podem discutir-se definitivamente) em recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade (acórdãos do STA, de 10/09/2014-P. 0659/14 e de 25/06/2015-P. 0567/15, disponíveis em www.dgsi.pt).
Acresce que a apreciação da alegada inconstitucionalidade não tem o menor relevo para a economia dos autos, pois é ponto assente na jurisprudência do STA que a nulidade de citação não é fundamento de oposição judicial (entre muitos outros acórdão de 03/10/2018-P. 0392/10, disponível em www.dgsi.pt)».
1.6 Cumpre apreciar e decidir da admissibilidade do recurso, nos termos do disposto no n.º 6 do art. 150.º do CPTA (Após a alteração introduzida no regime de recursos da jurisdição tributária pela Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro, o recurso de revista excepcional passou a ter previsão no art. 285.º do CPPT, que decalca o regime do art. 150.º do CPTA. No entanto, o novo regime apenas será aplicável «[a]os recursos interpostos de decisões proferidas a partir da entrada em vigor da presente lei em acções instauradas antes [leia-se depois] de 1 de Janeiro de 2012», nos termos da alínea c) do n.º 1 do art. 13.º da referida Lei.).
* * *
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO
Nos termos do disposto nos arts. 663.º, n.º 6, e 679.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi do art. 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), remete-se para a matéria de facto constante do acórdão recorrido.
2.2 DE FACTO E DE DIREITO
2.2.1 DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
2.2.1.1 Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do art. 150.º do CPTA a excepcionalidade do recurso de revista. Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos tribunais centrais administrativos não são susceptíveis de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo; mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: i) quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental ou ii) quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
No caso sub judice o Recorrente pretende que este Supremo Tribunal se pronuncie sobre as três questões e a “inconstitucionalidade/nulidade” acima enunciadas.
2.2.1.2 Começando por esta última, diremos que, atento o carácter extraordinário da revista excepcional prevista no art. 150.º do CPTA, não pode este recurso ser utilizado para arguir nulidades do acórdão recorrido, devendo tais nulidades ser arguidas perante o tribunal recorrido mediante reclamação, nos termos do art. 615.º, n.º 4 do CPC (Cfr., entre muitos outros proferidos pela formação a que alude o n.º 6 do art. 150.º do CPTA e por mais recentes, os seguintes acórdãos:
- de 28 de Fevereiro de 2018, proferido no processo com o n.º 23/18, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/30914b349eaa330880258244003b6f55;
- de 7 de Março de 2018, proferido no processo com o n.º 55/18, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/77eff930ae87754b8025826b00544235;
- de 13 de Março de 2019, proferido no processo com o n.º 815/16.8BEBRG (707/18), disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/06715016b2e5f18a802583c100406d85.).
Em todo o caso, sempre será de notar que a nulidade foi suscitada pelo Recorrente junto do Tribunal Central Administrativo Sul, que lhe deu resposta pelo acórdão proferido em 9 de Junho de 2016 (fls. 451 a 454).
Já quanto à questão relacionada com a inconstitucionalidade suscitada pelo Recorrente, a mesma não justifica a admissão do recurso na medida em que a apreciação dessa questão é da competência do Tribunal Constitucional, que é o órgão judicial especialmente vocacionado para conhecer as questões de constitucionalidade e a quem cabe sempre a última palavra nessa matéria, nada impedindo que o Recorrente, se entender que estão reunidos os pressupostos para o efeito (designadamente, que suscitou a questão oportunamente), dirija directamente recurso para esse Tribunal referente às questão de constitucionalidade aqui suscitadas.
Como o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar, reiterada e uniformemente, não é de admitir o recurso de revista excepcional relativamente a estritas questões de inconstitucionalidade normativa, que podem discutir-se em recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade (Neste sentido, os seguintes acórdãos da formação a que alude o n.º 6 do art. 150.º do CPTA:
- de 10 de Setembro de 2014, proferido no processo com o n.º 659/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/fb83b8adb5b0229880257d560039724b;
- de 25 de Junho de 2015, proferido no processo com o n.º 567/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/6fdfd939cf54102d80257e7400496fe1;
- de 28 de Fevereiro de 2018, proferido no processo com o n.º 23/18, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/30914b349eaa330880258244003b6f55.).
2.2.1.3 Quanto às três questões enunciadas pelo Recorrente como sendo as que justificam a admissão da revista, todas elas se referem à prescrição.
Acontece que nem todas as três questões foram objecto de apreciação expressa pelo Tribunal Central Administrativo Sul no acórdão recorrido. O que, relativamente às que o não foram, por si só, afasta a admissibilidade do recurso, uma vez que este não visa a apreciação de questões novas, mas apenas a reapreciação de questões apreciadas pelo tribunal de hierarquia inferior. Vejamos mais detalhadamente:
No acórdão recorrido apreciou-se a prescrição das obrigações tributárias correspondentes às dívidas exequendas, mas nele não encontramos referência alguma à 1.ª e 3.ª questões ora suscitadas pelo Recorrente. Aliás, como bem ficou salientado naquele aresto, nas alegações de recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul afirma-se singelamente que a dívida se encontrava prescrita, «sem se alegar em concreto um único facto, ou um único fundamento de direito para sustentar a afirmação», o que, se não obstou à que aquele Tribunal apreciasse a questão – por ser do conhecimento oficioso (cfr. art. 175.º do CPPT) –, deixou essa apreciação circunscrita aos termos em que o Tribunal entendeu fazê-lo.
Assim, após referir a origem das dívidas exequendas, o acórdão começou por determinar qual o prazo prescricional aplicável às dívidas originadas antes da entrada em vigor da Lei Geral Tributária (LGT), tendo em conta a sucessão no tempo de prazos (o primeiro, de 10 anos, fixado pelo art. 34.º do Código de Processo Tributário, e o segundo, de 8 anos, fixado pelo art. 48.º da LGT) e o disposto no art. 297.º do Código Civil (CC), concluindo pela aplicação deste último, a contar desde 1 de Janeiro de 1999, data em que entrou em vigor a LGT.
Depois tendo em conta que a todas as dívidas de 1998, 1999 e 2000 se aplica o prazo de prescrição da LGT, cujo dies a quo é, respectivamente, 1 de Janeiro de 1999, 1 de Janeiro de 2000 e 1 de Janeiro de 2001, concluiu que o dies ad quem, caso não se se verifiquem causas de interrupção ou suspensão do prazo, é, também respectivamente, 31 de Dezembro de 2006, 31 de Dezembro de 2007 e 31 de Dezembro de 2008.
De seguida, considerou que os prazos de prescrição se interromperam, nos termos do disposto no art. 49.º, n.º 1, da LGT com a citação da sociedade originária devedora, em 4 de Março de 2002 e em 30 de Abril de 2004, inutilizando os prazos até então decorridos.
Mais considerou que, porque o ora Recorrente foi citado em 26 de Setembro de 2006, antes de decorridos 5 anos sobre as liquidações que deram origem às dívidas exequendas, essa interrupção também produz efeitos relativamente a ele, atento o disposto nos n.ºs 2 e 3 do art. 48.º da LGT.
Prosseguiu o acórdão referindo que o processo de execução fiscal esteve parado por mais de um ano (entre 30 de Março de 2005 até 28 de Maio de 2006) por causa não imputável à Executada, o que converteu (“degradou”) o efeito interruptivo em efeito suspensivo, ao abrigo do n.º 2 do art 49.º da LGT, então em vigor (O n.º 2 do art. 49.º da LGT, foi revogado pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2007), que entrou em 1 de Janeiro de 2007 (cfr. art 163.º).).
Reiterando que o dies ad quem dos prazos prescricionais em causa ocorreria em 31 de Dezembro de 2006, 31 de Dezembro de 2007 e 31 de Dezembro de 2008, respectivamente em relação às dívidas de 1998, 1999 e 2000, salientou que, antes que se completasse qualquer um desses prazos, ocorreu uma outra interrupção do prazo de prescrição, com a citação do Oponente, em 26 de Setembro de 2006.
Assim, concluiu que não se verificava a prescrição, uma vez que com a interrupção do prazo, não só ficou inutilizado todo o tempo ocorrido anteriormente, nos termos do n.º 1 do art. 326.º do CC, como também não se começa a contar novo prazo enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo, de acordo com o disposto no n.º 1 do art. 327.º do CC, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Sul e do Supremo Tribunal Administrativo, em interpretação cuja constitucionalidade passou o crivo da apreciação do Tribunal Constitucional.
Ou seja, como resulta da leitura do acórdão recorrido, nele nunca se equacionou – e, muito menos, decidiu – nem a 1.ª nem a 3.ª questões pelo Recorrente no presente recurso, quais sejam as de saber se «[n]ão tendo sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou não existindo qualquer penhora que garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o prazo de prescrição legal suspende-se ou não enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição? Ou seja, o prazo de prescrição legal suspende-se ou não com a citação relativa à execução?» e a de saber se «[p]ode ou não dizer-se que o ano de liquidação dos tributos corresponde à data do seu pagamento voluntário?».
Na verdade, o acórdão recorrido não abordou essas questões: por um lado, não ponderou qualquer causa de suspensão do prazo prescricional; por outro lado, contrariamente ao que parece supor o Recorrente, também não fez corresponder o ano da liquidação dos tributos à data do seu pagamento voluntário e, como bem salientou o Procurador-Geral-Adjunto, apenas usou este elemento para encontrar o ano da liquidação.
Já no que respeita à segunda questão enunciada pelo Recorrente – a de saber se «[a] interrupção da prescrição tem lugar ou não uma única vez?» –, o acórdão tratou-a e deu-lhe resposta, admitindo a relevância da segunda causa de interrupção.
No entanto, há que ter em conta que a segunda causa de interrupção (a citação do ora Recorrente) ocorreu em 26 de Setembro de 1996, ou seja, antes da entrada em vigor da nova redacção dada ao n.º 3 do art. 49.º da LGT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2007), que veio estabelecer que «a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que ocorrer em primeiro lugar». Ora, como bem salientou o Procurador-Geral-Adjunto, «a LOE de 2007 entrou em vigor 1 de Janeiro de 2007, e, sendo uma norma sobre os efeitos dos factos, ela só se aplica após a sua entrada em vigor, por força do estatuído no artigo 12.º/2 do CC (Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas práticas, página 65, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa), pelo que não poderia ter aplicação ao caso em análise».
Assim, o acórdão recorrido, ao relevar a segunda causa de interrupção, decidiu a questão em harmonia com a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, que é no sentido de que, antes de 1 de Janeiro de 2007, cada facto interruptivo da prescrição tem a virtualidade de interromper o prazo prescricional, ainda que ocorra quando a anterior ainda está a produzir efeitos ( Entre muitos outros, por mais recente, o seguinte acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 3 de Abril de 2019, proferido no processo com o n.º 2369/15.3BEPNF (983/16), disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/7b14cdcd04745321802583d80036df6d.), dispensando a intervenção deste Supremo Tribunal em termos de revista.
Ou seja, também em relação à 2.ª questão suscitada pelo Recorrente não se verificam os pressupostos da admissibilidade do recurso.
2.2.2 CONCLUSÕES
Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - Atento o carácter extraordinário da revista excepcional prevista no art. 150.º do CPTA, não pode este recurso ser utilizado para arguir nulidades do acórdão recorrido, devendo as mesmas ser arguidas em reclamação para o tribunal a quo, nos termos do art. 615.º, n.º 4, do CPC.
II - Este recurso também não serve para apreciar questões sobre a constitucionalidade das normas que não hajam sido suscitadas ou apreciadas no acórdão recorrido.
III - Se as questões que o recorrente erigiu em objecto da revista ou não foram tratadas pelo tribunal a quo ou seguem a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, não se justifica a intervenção deste Supremo Tribunal em sede de revista, que está prevista como “válvula de segurança” do sistema, para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade de, nos termos previstos no n.º 1 do art. 150.º do CPTA, reponderar as decisões proferidas por um tribunal central administrativo em segundo grau de jurisdição.
* * *
3. DECISÃO
Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência da formação prevista no n.º 6 do art. 150.º do CPTA, em não admitir o presente recurso, por se julgar não estarem preenchidos os pressupostos do recurso de revista excepcional previstos no n.º 1 do mesmo artigo.
Custas pelo Recorrente. *
Lisboa, 16 de Janeiro de 2020. - Francisco Rothes (relator) - Isabel Marques da Silva – José Gomes Correia. |