Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01935/14.9BEPRT 01056/16 |
Data do Acordão: | 11/07/2018 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | ASCENSÃO LOPES |
Descritores: | TERRENO PARA CONSTRUÇÃO IMPOSTO DE SELO TABELA DO IMPOSTO DE SELO CONDENAÇÃO OBJECTO PEDIDO |
Sumário: | I - A norma de incidência contida na referida verba nº 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo, na sua redacção inicial (anterior à redacção conferida pela Lei de Orçamento de Estado do ano de 2014) não engloba os terrenos para construção. II - Se do conjunto da Petição Inicial resulta claro que em termos substanciais, a intenção da recorrida foi impugnar a liquidação anual do IS do ano de 2013, e não apenas os montantes constantes das duas primeiras notas de cobrança (em prestações) que já tinham sido notificados à impugnante, então a sentença que anulou na totalidade a liquidação não incorre no vício de condenação em objecto diverso do pedido. |
Nº Convencional: | JSTA000P23807 |
Nº do Documento: | SA22018110701935/14 |
Data de Entrada: | 09/23/2016 |
Recorrente: | AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Recorrido 1: | A............, LDA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 - RELATÓRIO A representante da Fazenda Pública vem recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do TAF do Porto que julgou procedente a impugnação deduzida pela A…………, Ldª, melhor identificada nos autos, contra a liquidação de imposto de selo do ano de 2013 relativa à aplicação da verba 28.1 da TGIS ao prédio com o artigo matricial U-006125, da freguesia de Santa Marinha, concelho de Vila Nova de Gaia. Inconformada com o assim decidido, apresentou as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões: «A. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nos autos supra identificados, que julgou procedente a impugnação deduzida contra a primeira e segunda prestação da liquidação de Imposto de Selo n.º 2013 000288249, do ano de 2013, nos montantes de €4.901,78 e de €4.901,77, a que correspondem as notas de cobranças n.º 2014 004227559 e 2014 004227560, referentes ao terreno para construção inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Santa Marinha sob o artigo 82292, emitida com base na norma do artigo 1.º do CIS, conjugada com a Verba n.º 28.1 da respetiva Tabela Geral e artigo 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro. B. Ressalvado o sempre devido respeito, com o desta forma decidido, não se conforma a Fazenda Pública, porquanto considera que o Tribunal a quo condenou em objeto diverso do pedido de ação, enfermando por isso de nulidade, bem como incorreu em erro de julgamento na aplicação do direito. Materializando, C. Conforme o disposto na al. e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, é nula a sentença quando condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. D. Devendo esta norma ser lida em conjugação com o consignado no n.º 1 do artigo 609.º do CPC, de acordo com o qual a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir. E. Resultando assim indubitável que, a decisão que ultrapasse o pedido formulado, sem modificação objetiva da instância, passando a abranger pedido qualitativamente e/ou quantitativamente diferente, está ferida da nulidade. F. Ora, in casu, como se retira do teor da petição inicial, a presente impugnação veio deduzida contra a primeira e segunda liquidação de Imposto de Selo (Verba 28 da TGIS) n.º 2013 000288249, do ano de 2013, nos montantes de € 4.901,78 e de € 4.901,77, a que correspondem as notas de cobranças n.º 2014 004227559 e 2014 004227560, referentes ao terreno para construção inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Santa Marinha sob o artigo 8229. G. Sendo que a final a Impugnante formula, com toda a clareza e simplicidade, um pedido muito concreto, que é o da anulação da primeira e segunda prestação da liquidação de Imposto de Selo n° 2013 000288249, do ano de 2013. H. Ou seja, a Impetrante não impugnou na sua totalidade o ato de liquidação objeto dos presentes autos, mas apenas uma sua parte. I. Aliás, o valor da causa indicado na petição inicial corresponde à soma da primeira e segunda prestação da referida liquidação de Imposto de Selo (Verba 28 da TGIS), designadamente € 9.803,55. J. Sucede que, na decisão recorrida se ordenou a anulação de toda a liquidação de Imposto de Selo n.º 2013 000288249, do ano de 2013, no montante de €14.705,32. K. Verifica-se, assim, que o Tribunal a quo, proferiu uma sentença ultra petitum, posto que condena a Administração Tributária e Aduaneira para além do pedido formulado pela Impugnante. Pois, a decisão que se impunha proferir em face do pedido formulado pela Impugnante e da procedência da ação era, na melhor das hipóteses, a de anular tão somente a primeira e segunda prestação da liquidação a liquidação de Imposto de Selo (Verba 28 da TGIS) n.º 2013 000288249, do ano de 2013, no montante de €9.803,55. L. Devendo assim se concluir que a sentença sindicada enferma de nulidade por condenação em quantia superior do pedido na ação (cfr. al. e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi al. e) do artigo 2.º do CPPT). M. Ademais, sem prescindir, afigura-se-nos ainda que a sentença sob análise incorre em erro de julgamento na aplicação do direito, porquanto os atos impugnados não são autonomamente sindicáveis, pois a liquidação de Imposto de Selo (Verba 28 da TGIS) n.º 2013000288249, relativa ao ano de 2013, é um ato de liquidação uno e indivisível. N. Logo, qualquer uma das respetivas prestações de pagamento não é autonomamente sindicável, mas apenas o ato de liquidação a que elas se reportam. O. E não obstante o envio de três documentos de cobrança relativos a três prestações de cada uma das liquidações, o certo é que se trata de uma única liquidação. P. Assim, atentos ao disposto nos artigos 23.º n.º 7, 44.º n.º 5 e 46.º n.º 5 do CIS, 119.º n.º 1 e 120.º n.º 1, al. c) do CIMI, a liquidação de imposto a que se refere a verba 28 da Tabela Geral é liquidada anualmente, devendo ser paga em três prestações (nomeadamente, em abril, julho e novembro), enviando a administração tributária a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, os respetivos documentos de cobrança (isto é, três documentos, relativos a cada uma das três prestações). Tal como ocorreu no caso em apreço, em que a Autoridade Tributária e Aduaneira remeteu à Impugnante três documentos de cobrança relativos à liquidação de Imposto de Selo (verba 28 da TGIS) n.º 2013 000288249, do ano de 2013, referente ao terreno para construção inscrito na matriz predial urbana das freguesias da Santa Marinha sob o artigo 8229, no montante total de € 14.705,32, a pagar em três prestações de €4.901,78 e de €4.901,77, cujas notas de cobrança têm os n.ºs 2014 004227559, 2014 004227560 e 2014 004227561. Q. Consequentemente, face aos normativos citados, à natureza indivisível do ato de liquidação aqui em causa, bem como por forma a evitar que sejam proferidas decisões administrativas ou judiciais contraditórias sobre a mesma questão, resulta evidente que a primeira e segunda prestação da liquidação de Imposto de Selo n.º 2013000288249, relativa ao ano de 2013, do prédio em apreço, não são autonomamente sindicáveis. R. Em suma, ao decidir-se como se decidiu, sempre com o devido respeito pelo labor do Tribunal a quo, é nossa convicção que a douta sentença enferma de nulidade por condenação em objeto diverso do pedido, bem como incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito ao não julgar verificada a exceção dilatória inominada de inimpugnabilidade dos atos sindicados, determinante da absolvição da Fazenda Pública da instância (cfr. artigos 278.° n.º 1 al e), 576.º n.º 2, 577.º al. f) e 578.º do CPC, aplicáveis ex vi al. e) do artigo 2.º do CPPT). Termos em que, nos mais de Direito aplicável deve ser dado provimento ao presente recurso, e, em consequência, deve a sentença recorrida ser declarada nula e substituída por douto Acórdão que absolva a Fazenda Pública da instância.» A sociedade recorrida não apresentou contra alegações. O Ministério Público a fls. 85 emitiu extenso parecer que se apresenta por extracto: «A recorrente, FAZENDA PÚBLICA, vem sindicar a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, exarada a fls. 46/53, em 25 de Fevereiro de 2016, que julgou procedente impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação do Imposto do Selo de 2013, no entendimento de que os terrenos para construção (à data do facto tributário) não estão abrangidos pela norma de incidência da verba 28.1 da TGIS. A recorrente termina as suas alegações com as conclusões de fls. 76/77, que, como é sabido, salvo questões de conhecimento oficioso e desde que dos autos constem todos os elementos necessários à sua integração, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 635.º/4 e 639º/1 do CPC. A recorrida, A............, LDA, não contra-alegou. A recorrente assaca à sentença recorrida vício formal por condenação em objecto diverso do pedido. Vejamos. O excesso de condenação está excluído da lista de nulidades da sentença constante do artigo 125.º do CPPT, pelo que deverá aplicar-se o regime jurídico dos erros de julgamento (Código de Procedimento de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição 2011, II volume, páginas 367/368, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa). Como resulta da PI, que faz fls. 6/8 dos autos, entrada em 16/10/2014, a recorrida impugna os actos de liquidação n.º 2014 004227559 e n.º 2014004227560 das 1ª e 2ª prestações do IMI do ano de 2013, relativamente ao artigo matricial urbano da freguesia de Santa Marinha, Município de Vila Nova de Gaia e pede a anulação das respectivas liquidações. A sentença recorrida identifica como objeto de impugnação a liquidação do Imposto do Selo de 2013, n.º 2013 000288249, de 18/03/2015, com a colecta de € 14.705,32, que deu origem aos documentos de cobrança que a recorrida trata por liquidações, e, a final, anula a referida liquidação. A nosso ver, substancialmente, não ocorre condenação em objecto diverso do pedido. É certo que, como ensina António Braz Teixeira em “Princípios de Direito Fiscal”, volume I, 3ª edição, Almedina, Coimbra, páginas 243/244 “É necessário não confundir as prestações periódicas que, embora realizando-se por atos sucessivos, e, momentos diversos, têm origem numa mesma obrigação e constituem as várias parcelas de uma mesma prestação que se cindiu, com as prestações que devem efectuar-se periodicamente, não devido a uma divisão da prestação global, mas sim ao nascimento, também periódico, de novas obrigações, pela permanência dos pressupostos de facto da tributação”. É certo, também, que as prestações em que se divide uma liquidação do imposto do selo estão na primeira situação referida pelo mencionado autor. Efectivamente, resulta das disposições conjugadas dos artigos 113.º/1 e 120.º do CCivil 23.º/7 do CIS, que nas situações referidas na verba 28.º da TGIS, é efectuada uma liquidação anual e o pagamento em prestações consubstancia uma técnica de arrecadação do imposto e não um pagamento parcial. Todavia, a nosso ver, em termos substanciais, resulta claro que a intenção da recorrida foi impugnar a liquidação anual do IS, no montante de € 14.705,32 e não as notas/documentos de cobrança das 1ª e 2ª prestações, no montante de €9.803,55. (…) Que assim é, resulta, a nosso ver, da posição assumida pela própria Fazenda Pública, na sua contestação, onde nem sequer aflora a questão que, agora, coloca em sede de recurso e, bem assim, do MP junto da 1ª instância e tribunal recorrido que nenhuma dúvida tiveram quanto ao objecto da impugnação judicial deduzida pela recorrida, embora se reconheça que em termos, estritamente, formais, a recorrida impugnante poderia ter sido mais clara na identificação do acto impugnado. A sentença recorrida não merece, assim, censura. Termos em que deve negar-se provimento ao recurso e manter-se a sentença recorrida na ordem jurídica.» 2 - Fundamentação O Tribunal a quo deu como provada a seguinte matéria de facto: A) Foi emitida a liquidação de IS. n.º 2013 000288249, de 18/03/2014 que deu origem aos documentos de cobrança n.ºs 2014 004227559 (1.ª prestação) e 2014 004227560 (2.ª prestação), dos quais consta o seguinte: - Ano de imposto: 2013 - Identificação do prédio: 131730 Santa Marinha — U — 006125 - Valor patrimonial (€): 1.470.532,40 -Taxa (%): 1,00 - Colecta (€): 14.705,32 - Valor a pagar: € 4.901,77 ______________________________________________________ Fls 9 e 10 e P.A. junto aos autos. B) Na caderneta predial urbana do prédio referido na alínea A), consta o seguinte: - Descrição do prédio: Tipo de prédio: Terreno para Construção; - Valor patrimonial actual (CIM): € 1.470.532,40 Determinado no ano: 2012. ______________________________________________________ DECIDINDO NESTE STA A FAZENDA PÚBLICA, questiona a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 25 de Fevereiro de 2016, que julgou procedente impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação do Imposto do Selo de 2013, no entendimento de que os terrenos para construção (à data do facto tributário) não estavam abrangidos pela norma de incidência da verba 28.1 da TGIS. A recorrente começa por assacar à sentença recorrida vício formal por condenação em objecto diverso do pedido. Vejamos. É verdade que o excesso de condenação não está contemplado na lista de nulidades da sentença constante do artigo 125.º do CPPT. Ainda assim a ocorrer, determina erro de julgamento. Vejamos se ocorre tal erro uma vez que a sentença anulou na totalidade a liquidação anual do IS, (2013), no montante de € 14.705,32. Ora, patenteia-se que foram impugnados expressamente os documentos de cobrança n.º 2014 004227559 e n.º 2014004227560 das 1ª e 2ª prestações do IMI do ano de 2013, relativamente ao artigo matricial urbano da freguesia de Santa Marinha, Município de Vila Nova de Gaia e pedida a anulação das respectivas liquidações. E, é certo que a sentença recorrida identifica como objecto de impugnação a liquidação do Imposto do Selo de 2013, n.º 2013 000288249, de 18/03/2015, com a colecta de € 14.705,32, que deu origem àqueles documentos de cobrança que a recorrida tratou como se fossem liquidações e, acabou por anular o IMI liquidado do ano de 2013. Ainda assim, concordamos, com o supra destacado parecer quando ali se expressa que, não ocorre condenação em objecto diverso do pedido. De facto, a indicação de tal montante por banda da recorrida explica-se pelo facto de, à data da interposição da impugnação judicial, a AT ainda não se ter procedido à notificação do documento de cobrança relativo à 3ª prestação, que só ocorreu em 16/10/2014, como resulta dos autos. O acto que a recorrida, realmente, pretendeu impugnar e impugnou, foi em primeiro lugar o acto de liquidação do IMI do ano de 2013, descrito e quantificado (no montante de 14,705,32 Euros), na primeira alínea do probatório, acto, claramente lesivo e, como tal impugnável. A recorrente defende nas suas conclusões de recurso que tal acto de liquidação é uno e indivisível pois que se trata de uma única liquidação cujo pagamento é “facilitado com a emissão de três documentos de cobrança correspondentes a outras tantas prestações. E concordando que assim é de facto, na interpretação que fazemos do pedido contido na petição inicial temos de atender sempre à referida natureza indivisível da liquidação que não se confunde com a facilitação do seu pagamento em prestações. Assim a impugnante questionou primordialmente o acto de liquidação do imposto de selo do ano de 2013 referente ao terreno para construção inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Santa Marinha sob o artº 8229 (Actual artigo 6125 da matriz predial urbana da União de Freguesias de Santa Marinha e São Pedro da Afurada). A própria Fazenda Pública assim o entendeu como resulta do articulado 2º da sua contestação onde expressou: “ Entende pois a Impetrante que o acto de liquidação em crise está ferido de ilegalidade, peticionando por isso a anulação do mesmo, com base nos fundamentos que podem sintetizar-se como: Inexistência de facto tributário Ora, a sua expressão menos feliz do pedido formulado resulta da confusão em que terá incorrido ao considerar os documentos de cobrança que recebeu como contendo liquidações parcelares quando se tratavam de prestações para pagamento da única liquidação que foi efectuada. Mas, a montante sempre se expressou contra a liquidação do imposto de selo do ano de 2013 que teve por referência o referido na alínea A) do probatório por inexistência de facto tributário. Também por isso, concordamos com o Senhor Procurador Geral Adjunto neste STA quando expressa que, em termos substanciais, resulta claro que a intenção da recorrida foi impugnar a liquidação anual do IS, no montante de € 14.705,32 Aqui chegados e uma vez que a sentença recorrida seguiu a jurisprudência reiterada do STA quanto a esta matéria, que aliás cita, consistente em que “a norma de incidência contida na referida verba nº 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo, na sua redacção inicial (anterior à redacção conferida pela Lei de Orçamento de Estado do ano de 2014) não engloba os terrenos para construção (qualidade do terrenos em causa nos autos); somos levados a concluir que não ocorre o vício de condenação em objecto diverso do pedido, sendo de manter a sentença recorrida. 4- DECISÃO: Pelo exposto, acordam os Juízes deste STA em negar provimento ao recurso e em confirmar a decisão recorrida. Custas a cargo da recorrente. Lisboa, 7 de Novembro de 2018. – Ascensão Lopes (relator) – Ana Paula Lobo – Dulce Neto. |