Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01777/21.5BEPRT |
Data do Acordão: | 05/25/2023 |
Tribunal: | 1 SECÇÃO |
Relator: | JOSÉ VELOSO |
Descritores: | RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL APRECIAÇÃO PRELIMINAR RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL PRESCRIÇÃO |
Sumário: | Não é de admitir «revista» sobre alegado erro de julgamento da «questão» da prescrição do direito a indemnização se a mesma foi objecto de decisão unânime das instâncias que se mostra aparentemente correcta. |
Nº Convencional: | JSTA000P31052 |
Nº do Documento: | SA12023052501777/21 |
Data de Entrada: | 05/18/2023 |
Recorrente: | AA |
Recorrido 1: | CÂMARA MUNICIPAL DA PÓVOA DE VARZIM |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam, em «apreciação preliminar», na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. AA - autor desta acção administrativa - vem, invocando o artigo 150º do CPTA, interpor «recurso de revista» do acórdão do TCAN - de 10.02.2023 - que negou provimento à sua apelação e manteve o decidido em saneador-sentença do TAF do Porto - de 14.06.2022 - no sentido de absolver do pedido o réu MUNICÍPIO DA PÓVOA DE VARZIM [MPV] com fundamento no julgamento de procedência da prescrição do direito por si invocado - excepção peremptória suscitada pelo réu na contestação. Alega que o recurso de revista deverá ser admitido em nome da «necessidade de uma melhor aplicação do direito». O recorrido - MUNICÍPIO DA PÓVOA DE VARZIM - contra-alegou, defendendo - para além do mais - a «não admissão da revista» dada a correcção jurídica do julgado pelas instâncias. 2. Dispõe o nº1, do artigo 150º, do CPTA, que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Deste preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s, no uso dos poderes conferidos pelo artigo 149º do CPTA - conhecendo em segundo grau de jurisdição - não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar: i) Quando esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental; ou, ii) Quando o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito. 3. O autor desta acção administrativa - AA - demandou o réu - MUNICÍPIO DA PÓVOA DE VARZIM - exigindo-lhe responsabilidade civil extracontratual, e, nessa base, pediu ao tribunal a sua condenação a pagar-lhe uma «indemnização» - por alegados danos patrimoniais e não patrimoniais - no valor global de 210.411,80€. Alega que o réu, de forma repetida e reiterada, tem apreciado sem isenção e sem rigor os procedimentos de licenciamento de que é responsável, o que tem implicado dificuldades na obtenção dos licenciamentos de obras por si direccionadas e tem prejudicado o exercício da sua actividade profissional, nomeadamente afastando clientela. O tribunal de 1ª instância - TAF do Porto - em sede de saneador abordou duas questões: a caducidade da decisão de concessão de apoio judiciário, que o tribunal entendeu «não lhe competir a ele reconhecer, mas sim à Administração» - artigos 11º, nº1 alínea b), e 12º, da Lei nº34/2004, de 29.07 -, e a prescrição do direito a indemnização invocado pelo autor, que julgou procedente, absolvendo o réu do pedido. Apreciou a prescrição à luz dos artigos 498º e 323º, nº1 e nº3, do CC - ex vi artigo 5º do RCEEE - e das normas legais do regime do apoio judiciário invocadas pelo autor, tendo considerado - além do mais - que no caso não importava esgrimir com o artigo 33º, nº4, da Lei nº34/2004, de 29.07, por irrelevante. E concluiu que quando foi intentada a acção, a 15.07.2021, há mais de um ano que havia decorrido o prazo de prescrição contado desde o último facto invocado pelo autor como gerador de responsabilidade, ou seja, desde 13.04.2017, ou, pelo menos, da data da formulação do pedido de apoio judiciário por parte do autor, em 30.05.2017. O tribunal de 2ª instância - TCAN - negou provimento à apelação do autor, e confirmou o assim decidido no saneador-sentença recorrido, por ter apreciado correctamente a questão da prescrição, única matéria objecto de apelação. De novo o autor, e apelante, discorda, e pede «revista» do assim decidido agora pelo acórdão do tribunal de apelação por entender que se trata de um julgamento de direito errado. Alega que da aplicação conjugada dos «artigos 498º e 323º do CC, 24º, 33º e 34º, da Lei nº34/2004, de 29.07», facilmente se conclui que o seu invocado direito não se encontrava prescrito. Sublinha que a acção se deve ter como proposta a 30.05.2017 - apresentação do pedido de apoio judiciário -, que o prazo de prescrição esteve interrompido entre 30.05.2017 e 27.05.2019, e que, dada a existência de um processo-crime, desde 2017, o prazo de prescrição apenas voltará a correr com o termo do mesmo. Compulsados os autos, importa apreciar «preliminar e sumariamente», como compete a esta Formação, se estão verificados os «pressupostos» de admissibilidade do recurso de revista - referidos no citado artigo 150º do CPTA - ou seja, neste caso concreto, atento o que é alegado pelo recorrente, apenas se está em causa um claro erro de julgamento que induza a clara necessidade de admissão da revista para melhor aplicação do direito. Ora, cumprirá ressaltar, à cabeça, que as duas instâncias foram unânimes em «julgar» procedente a questão da prescrição do direito de indemnização invocado pelo autor, único julgamento de direito que vem posto em causa. O que, sem garantir a correcção do julgado, constitui sinal relevante do seu aparente acerto. E a verdade é que, feita a apreciação «preliminar e sumária» que nos compete o julgamento efectuado mostra-se alicerçado em interpretação coerente, e aparentemente acertada, das normas jurídicas chamadas a intervir. Não detectamos nele qualquer erro de direito que seja ostensivo, manifesto, a reclamar intervenção do tribunal de revista, sendo certo que a recorrente, nas suas «conclusões», invoca processo-crime, pendente, que nem sequer consta «da factualidade provada». Destarte, e sempre no âmbito da apreciação que nos é pedida, entendemos que a admissão da revista não se impõe em nome da «clara necessidade de uma melhor aplicação do direito», único pressuposto à luz do qual vem requerida. Admitir este recurso de revista seria abrir uma 3ª instância, o que não é permitido pela lei. Importa, pois, manter a regra da excepcionalidade dos recursos de revista, e recusar a admissão do aqui interposto por AA. Nestes termos, e de harmonia com o disposto no artigo 150º do CPTA, acordam os juízes desta formação em não admitir a revista. Custas pelo recorrente. Lisboa, 25 de Maio de 2023. – José Veloso (relator) – Teresa de Sousa – Fonseca da Paz. |