Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01637/16.1BELRS |
Data do Acordão: | 06/05/2024 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | GUSTAVO LOPES COURINHA |
Descritores: | TAXA TAXA DE OCUPAÇÃO DO DOMÍNIO PÚBLICO DOMÍNIO PÚBLICO MUNICIPAL PUBLICIDADE |
Sumário: | |
Nº Convencional: | JSTA000P32348 |
Nº do Documento: | SA22024060501637/16 |
Recorrente: | A..., S.A. |
Recorrido 1: | JUNTA DE FREGUESIA DE LOURES |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 Alegações A..., S.A., melhor identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a presente impugnação judicial pela recorrente deduzida contra as taxas de ocupação do espaço público, referentes ao ano de 2016, liquidadas pela Junta de Freguesia de Loures, ora Recorrida, no valor de € 5.040. Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões a fls. 155 a 174 do SITAF: A. O presente recurso é interposto contra a Sentença do Tribunal Tributário de Lisboa de 3 de Maio de 2023 que considerou improcedente a impugnação judicial apresentada pela ora Recorrente contra as taxas de ocupação do espaço público liquidadas pela Junta de Freguesia de Loures, no período de 2016, no valor de €5.040,00. B. A referida Sentença considerou que a posição da Recorrente não tem qualquer apoio no texto regulamentar ou na teleologia normativa. C. Considerou ainda o Tribunal a quo que, para efeitos de determinação da taxa devida de ocupação do domínio municipal, pode a mesma incidir sobre a mesma área sob a qual incide a taxa devida pela publicidade, pelo que a taxa de ocupação do domínio municipal estaria correctamente liquidada. D. Contudo, a Recorrente não pode conformar-se com a referida Sentença, pelos argumentos apresentados na petição inicial, que ora se renovam e, ainda pelos seguintes: (i) pela natureza do conceito de taxas, (ii) pelos princípios constitucionais ligados ao seu conceito e aplicação pelos Municípios / Freguesia, (iii) e, ainda, sob pena de incorrer em duplicação de colecta. E. Conforme referido na petição inicial, a Recorrente foi notificada pela Recorrida da liquidação das taxas de publicidade e das de ocupação do espaço público. F. Não tendo nada a opor quanto às primeiras, mas quanto às segundas não pode concordar com a forma de cálculo utilizada. G. Ora, em 2016, a Recorrente tinha instalados, à data dos presentes autos, cinco painéis publicitários na área do domínio público da Junta de Freguesia de Loures. H. Cada um dos painéis publicitários tinha uma área de 24 m2, sendo três destes painéis suportados por quatro pilares fixados no solo e dois painéis suportados por dois pilares fixados no solo, estando todos inseridos em sapatas de cimento de 0,25 m2. I. Uma vez que a publicidade afixada verticalmente é já considerada para efeitos de cálculo da taxa de publicidade – sendo esta taxa a única em que se justifica que a área do painel seja um dos factores de cálculo –, não deve a taxa de ocupação de espaço público ser calculada igualmente sobre a referida área. J. Assim, entende a Recorrente que as taxas de ocupação do espaço público deveriam ser calculadas sobre a área ocupada pelos pilares que suportam os painéis publicitários, uma vez que esta é a área que efectivamente ocupa o domínio público, i.e., o solo. K. Se por mera hipótese se devesse considerar o espaço aéreo correspondente à superfície, então esse espaço não seria o da área do painel, mas sim o da sua projecção no solo (com uma área de 2,05 m2), e, neste caso, a taxa anual devida por cada painel sempre seria de €86,00 (2,05 m2 x €3,50 x 12 meses). L. No entanto, tal hipótese (área de projecção do painel no solo) não corresponde à área efectivamente ocupada no espaço público, uma vez que por debaixo do painel publicitário, a Freguesia de Loures pode ocupá-lo como bem entender (por exemplo, com bancos de jardim, lugares de estacionamento, caixotes de lixo, etc). M. Pelo que apenas faz sentido cobrar-se a taxa de ocupação de espaço público pelo espaço efectivamente ocupado pela Recorrente (para além do já tributado painel publicitário através da taxa de publicidade), ou seja, a área ocupada pelos pilares no solo. N. Tal decorre da própria natureza das taxas, determinando o n.º 2 do artigo 4.º da LGT que estas “assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares.”. O. Sendo que o artigo 75.º, do Regulamento de Taxas do Município de Loures já abrange no seu cálculo para a taxa devida para a exibição de publicidade em espaço municipal, que corresponde à área total, por m2 de cada painel publicitário. P. Pelo que à ora Recorrente já está a ser cobrado um montante de taxa pela detenção dos referidos painéis publicitários. Q. Pois, o que diferencia a taxa do imposto é que a primeira tem subjacente uma característica de bilateralidade: o contribuinte paga uma taxa proporcional ao benefício usufruído (bilateralidade), já quanto ao imposto, este sinalagma não se verifica. R. Ora, na situação em apreço a Recorrida liquidou à Recorrente a taxa de publicidade por aplicação do Regulamento de Taxas do Município de Loures, tendo como base a área total de cada painel para o seu cálculo e tendo como contrapartida a exibição de publicidade. S. A aplicação de uma segunda taxa – in casu, a prevista no artigo 67.º do Regulamento, subordinado à epígrafe “Utilização e aproveitamento do domínio municipal com construções ou instalações especiais” – para o pagamento de uma prestação pela qual terá exactamente o mesmo benefício da taxa anteriormente referida, não pode suceder sob pena de uma dupla tributação, o que é manifestamente ilegal em matéria de taxas. T. Neste âmbito, sempre se dirá que os Municípios / Freguesias podem legalmente cobrar taxas uma vez que têm o “(…) direito de exigência de um determinado tributo em contrapartida de uma prestação efectivamente prestada ao sujeito passivo ou por este beneficiada.”, cf. NUNO DE OLIVEIRA GARCIA, in Contencioso de Taxas, liquidação, audição e fundamentação, Almedina, 2018, 3.ª edição, pág. 55 e seguintes (sublinhado nosso). U. Mais refere aquele Autor a necessidade da liquidação das taxas se “regular por princípios e regras que levem em linha de conta as particularidades da taxa, a fim de produzir segurança nas relações entre a administração e os particulares.” (sublinhado nosso). V. Este princípio da segurança jurídica nas relações entre a administração e os particulares tem por base a relação sinalagmática entre a equivalência do custo da taxa para o Município/ Freguesia e o benefício obtido pelo sujeito passivo e que veio a ser consagrado no artigo 3.º do RGTAL. W. E inclui igualmente o respeito pelo princípio da proporcionalidade, previsto no n.º 2 do artigo 266.º da CRP, uma vez que implica que “não pode ocorrer uma desproporção que, pela sua dimensão, demonstre com clareza que não existe entre aquele benefício e aquela quantia a correspectividade ínsita numa relação sinalagmática.”, cf. conclusão do STA no acórdão proferido em 18.02.2009, no âmbito do processo n.º 0947/08 (realce e sublinhado nossos). X. In casu, tal princípio obriga a Recorrida a abster-se da imposição à Recorrente de um cúmulo de taxas que visam possibilitar a esta última o benefício de instalar o painel publicitário no espaço público. Y. E, caso se mantenha em vigor o cúmulo de taxas em questão, estaremos perante uma dupla incidência / dupla tributação, a qual “(…) é, em geral, admitida, em matéria de impostos, quando o mesmo facto tributário se insere em mais que uma norma de incidência objectiva, mas não o é em matéria de taxas devidas pela ocupação de bens de domínio público, pois sendo aquelas a contrapartida do benefício obtido, não se pode justificar um duplo pagamento pelo mesmo benefício.”, cf. determinado pelo STA em 17.04.2013, no processo n.º 01154/12 (sublinhado nosso). Z. Na situação em apreço, o painel publicitário é já considerado para efeitos de cálculo da taxa de publicidade – a qual naturalmente já inclui a necessária ocupação do espaço público –, não podendo ser igualmente incluído para efeitos da taxa de ocupação do espaço público, sob pena de uma efectiva duplicação de colecta pela Freguesia de Loures. AA. Não podendo a Recorrente conformar-se com a conclusão tomada pelo Tribunal a quo de que não se trata de uma dupla tributação mas tão só do cálculo de duas taxas diferentes tomando por base o mesmo objecto, i.e., o painel publicitário. BB. Neste sentido, a Recorrente aceita que pela instalação de cada painel publicitário a Junta de Freguesia de Loures liquide as duas taxas em questão: a da publicidade e a da ocupação do espaço público. CC. No entanto, a Recorrente não se conforma que a Junta de Freguesia de Loures proceda ao cálculo das duas taxas pela área do painel publicitário, uma vez que a ocupação vertical do domínio público é já taxada pela taxa de publicidade, correspondendo a área ocupada no espaço público remanescente à dos pilares, no solo. DD. Ou seja, a taxa de ocupação do espaço público deve ser calculada unicamente tendo por base a área ocupada pelos pilares no solo; no limite, podendo equacionar-se a área de projecção do painel no solo, com a reserva acima apontada de que, neste caso, não corresponde à área que, na realidade, é ocupada pela Recorrente, uma vez que o espaço em causa pode ser utilizado pela Freguesia como bem entender. EE. Neste âmbito, o Tribunal a quo concluiu que que a área do painel publicitário, já considerada para aplicação da taxa relativa à publicidade, deverá novamente ser quantificada para efeitos de cálculo da taxa de ocupação do espaço público, contudo, salvo o devido respeito, é exactamente essa a razão justificativa do facto de o painel publicitário ter de ser excluído do cálculo da taxa de ocupação do espaço público, uma vez que este já é considerado para efeitos de cálculo da taxa de publicidade. FF. Entendimento este que tem vindo a ser adoptado pelas Juntas de Freguesia de Moscavide e Portela na liquidação das taxas em questão, GG. E, igualmente, pelos tribunais, que têm defendido um entendimento semelhante (Cf. Acórdão de 28.12.2020, proferido no âmbito do Processo n.º 349/18.6BELLE pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, no Acórdão de 28.12.2020 e, Acórdão de 28.12.2020, proferido no âmbito do Processo n.º 349/18.6BELLE pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé.), ou seja, o de que a área do painel publicitário deverá apenas ser considerada para efeitos de cálculo da taxa de publicidade, sendo que a taxa de ocupação do espaço público deverá incidir sobre a área ocupada pela Recorrente no espaço remanescente, ou seja, sobre a área ocupada pelos pilares no solo. HH. Devendo nos termos expostos ser revogada a Sentença e, consequentemente, anuladas as taxas de ocupação do espaço público. I.2 - Contra-alegações Foram proferidas contra alegações no âmbito da instância com o seguinte quadro conclusivo: A - O presente recurso tem por objeto as taxas previstas na alínea g) do art.°. 67.° do Regulamento de Taxas do Município de Loures, referentes à ocupação de espaço público. B - A Recorrente não impugnou as taxas referentes à publicidade, previstas no art°. 75.° do Regulamento de Taxas do Município de Loures. C - A douta Sentença do Tribunal Tributário de Lisboa julgou bem ao manter os atos de liquidação de taxas emitidos pela Junta de Freguesia de Loures, referentes a taxas de ocupação de espaço público, considerando improcedente a impugnação judicial. D - O Regulamento de Taxas do Município de Loures contempla paralelamente tanto o licenciamento da publicidade, no seu Capítulo VII, como o licenciamento da utilização e aproveitamento do espaço do domínio municipal, no seu Capítulo V, em capítulos diferentes com fins diferentes. E - Não há dupla tributação, pois que a taxa não impugnada, prevista no art.° 75.° do Regulamento de Taxas do Município de Loures, bem como a taxa impugnada, prevista no art.° 67.° do mesmo Regulamento, incidem, cada uma delas sobre benefícios e utilidades manifestamente distintas. F - O licenciamento da instalação dos painéis, bem como a exibição da publicidade que neles se apresente, relevam de autorizações diferenciadas pelo seu específico objeto. G - A taxa não impugnada é devida em função da remoção de um obstáculo jurídico a uma atividade relativamente proibida, a publicidade, em favor de terceiros, enquanto que a taxa impugnada, de ocupação do domínio público, tem a sua razão de ser, na ocupação efetiva de um espaço. H - A Recorrente colocou em crise o pagamento de taxas referentes à ocupação do espaço público não concordando com a forma de cálculo utilizada, considerando que as taxas de ocupação deveriam ser calculadas sobre a área ocupada pelos pilares que suportam os painéis. I - A alínea g) do art.° 67° do Regulamento de Taxas do Município de Loures especifica que os suportes publicitários são taxados por metro quadrado e não menciona que é a área dos pilares, ou a projeção no solo a ser taxado. J - Não deve ser taxada a área ocupada pelos pilares, uma vez que são o meio de suporte e sustentação dos painéis. K - Deve ser taxada toda a área do espaço do domínio público ocupado pelos painéis. L - O domínio público municipal, abrange o espaço aéreo sobrejacente ao solo. M - O domínio, público ou privado, municipal abrange o solo, o subsolo e o espaço aéreo, nos mesmos moldes que se encontra previsto para a propriedade privada, no artigo 1344° do Código Civil. N - Não se verifica qualquer erro no apuramento da base de incidência da taxa de ocupação da via pública, que foi feita pela Junta de Freguesia de Loures. O - É legal o apuramento do valor da taxa de ocupação da via pública devida pelos painéis publicitários afixados no domínio público municipal de Loures, uma vez que cumpre o previsto na alínea g) do art.° 67.° do Regulamento de Taxas do Município de Loures, n°. 392/2009, publicado em D.R. – 2ª. Série - n°. 187 de 25/9/2009, inserido num Capítulo bem distinto. P - Não se encontra violado o princípio da proporcionalidade, previsto no art.° 266.° da CRP, uma vez que os valores das taxas a pagar estão devidamente fundamentados e justificados no Regulamento de Taxas do Município de Loures. Q - O valor da taxa prevista no art.° 67.° do Regulamento de Taxas do Município de Loures, aqui impugnada, é devida em função da ocupação e utilização do domínio público ou privado, municipal, por parte do particular e o valor da taxa prevista no art.° 75.° do mesmo Regulamento, não impugnada, é devida em função da remoção de um obstáculo jurídico a um determinado comportamento do particular. R - Razões pelas quais não restam dúvidas que a douta sentença recorrida deve ser confirmada. I.3 - Parecer do Ministério Público Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, veio o Ministério Público emitir parecer com o seguinte conteúdo: I. Objecto do Recurso. 1. O presente recurso vem interposto da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a ação de impugnação judicial intentada contra o ato de liquidação de taxa municipal que incidiu sobre suporte publicitário, no valor de € 5.007,00 euros. 1.1 A Recorrente insurge-se contra o assim decidido invocando erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação das normas do Regulamento Municipal de Loures. 1.2 Considera a Recorrente que «a taxa de ocupação do espaço público deve ser calculada unicamente tendo por base a área ocupada pelos pilares no solo; no limite, podendo equacionar-se a área de projecção do painel no solo». 1.3 Mais entende que «Na situação em apreço, o painel publicitário é já considerado para efeitos de cálculo da taxa de publicidade – a qual naturalmente já inclui a necessária ocupação do espaço público –, não podendo ser igualmente incluído para efeitos da taxa de ocupação do espaço público, sob pena de uma efectiva duplicação de colecta pela Freguesia de Loures». 1.4 E termina pedindo a revogação da sentença recorrida e a anulação da taxa impugnada. 2. FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA. 2.1 Na decisão recorrida deu-se como assente que a Recorrente no decurso do ano de 2016 tinha licenciado no espaço público da freguesia e concelho de Loures cinco painéis publicitários com 24 m2, sobre os quais a Junta de Freguesia de Loures emitiu uma taxa de publicidade, ao abrigo do disposto no artigo 75º do Regulamento de Taxas do Município de Loures, e uma taxa de ocupação do espaço público, ao abrigo do disposto no artigo 67º, alínea g) – (Na sentença faz-se menção ao artigo 76º, alínea g), mas certamente deve-se a lapso, provavelmente induzido pelo facto de este preceito corresponder no atual regulamento municipal à norma aplicável ao caso concreto ( ano de 2016). , do mesmo Regulamento, 2.1.1 Mais se deu como assente que no cálculo da taxa de ocupação do espaço público foi tido em consideração o valor de € 3,5 por mês e a área de 24m2 de cada painel publicitário. 2.2 Para se decidir pela improcedência da ação considerou o tribunal “a quo” que «a ocupação do espaço decorre da presença do objeto físico no seu todo, pelo seu impacto visual e estético, pela necessária limitação de outros usos desse mesmo espaço. Ou seja, a ocupação do espaço público ou municipal consentida refere-se ao objeto no seu todo, não à ― «ocupação» física do suporte desse objeto no solo». 2.2.1 Mais se entendeu que «surge sem qualquer apoio no texto regulamentar ou na teleologia normativa da instituição da taxa a posição da Impugnante, que entende a ocupação do espaço restrita à área ocupada no solo pelos suportes dos painéis, os pilares, no que erradamente assimila os termos de determinação e quantificação da taxa à sua razão de ser». II. ANÁLISE DE MÉRITO. 1. A QUESTÃO que vem suscitada pela Recorrente consiste em saber se a sentença incorreu em erro de julgamento na interpretação que fez da norma do regulamento municipal que prevê a APLICAÇÃO taxa impugnada – artigo 67º, alínea g), do Regulamento de Taxas do Município de Loures (Publicado no Diário da República, 2.ª série — N.º 187 — 25 de Setembro de 2009), na redação então em vigor - e mais precisamente os termos do cálculo da referida taxa. 1.1 Dispunha o artigo 67º do Regulamento Municipal de Loures: ― Artigo 67.º Utilização e aproveitamento do domínio municipal com construções ou instalações especiais A utilização e aproveitamento do domínio municipal com construções ou instalações especiais, está sujeita ao pagamento, no momento da emissão da licença, pelo utilizador, das respectivas taxas: a) Construções ou instalações provisórias por motivos de festejos ou outras celebrações, por m2 de domínio municipal utilizado e por dia — 0,80€ b) Acampamentos ocasionais, por dia e por unidade de ocupação — 2,00€ c) Quiosques, por m2 de domínio municipal utilizado e por mês — ...,00€ d) Bancas e expositores, por m2 de domínio municipal utilizado e por dia — 0,15€ e) Pavilhões por m2 de domínio municipal utilizado e por dia — 0,30€ f) Agências ou postos de venda de bilhetes, m2 de domínio municipal utilizado e por mês — 10,00€ g) Suportes publicitários, por m2 e por mês — 3,50€ h) Recintos itinerantes, por m2 e por dia — 0,30€ i) Recintos improvisados, por m2 e por dia — 0,35€ j) Outras construções ou instalações não incluídas nas alíneas anteriores, por m2 de domínio municipal utilizado e por dia — 0,25€». Por sua vez dispunha o artigo 75º do mesmo regulamento municipal: Artigo 75.º Pela autorização de produção de publicidade em suporte publicitário, são devidas, pelo titular, no momento da emissão da autorização, as taxas que se seguem, a cobrar por m2 e por ano: Publicidade afecta a mobiliário urbano a) Anúncios não luminosos — 50,00€ b) Anúncios luminosos ou directamente iluminados — 300,00€ Quanto ao critério da medição o regulamento municipal prevê apenas no seu artigo 97º o seguinte: Artigo 97.º As fracções de metro linear e de m2 arredondam-se sempre por excesso e, conforme os casos, para metade ou para a unidade de metro. Quando a medição, estando prevista no Regulamento por metro linear, só pode ser feita em m2 ou vice- versa, as respectivas taxas aplicam-se segundo a equivalência de um metro linear, por dois m2. Unidades de medida 1.2 Decorre da sentença recorrida que em decorrência da exploração de cinco painéis publicitários instalados na freguesia de Loures foram liquidadas à impugnante duas taxas: (i) Uma taxa de publicidade, ao abrigo do disposto no artigo 75º do Regulamento de Taxas do Município de Loures, e (ii) uma taxa de ocupação do espaço público, ao abrigo do disposto no artigo 67º, alínea g), do mesmo Regulamento. Sendo que ambas as taxas foram calculadas tendo por base a área de cada painel publicitário (no caso 24m2) 1.3 A Recorrente insurgiu-se contra o cálculo da taxa cobrada ao abrigo do disposto no artigo 67º, alínea g), do regulamento municipal, por entender que neste caso esse cálculo devia ter em consideração a área do solo ocupada pelo suporte do painel, ou quando muito a área do solo correspondente à base do painel, por ser apenas esse espaço da via municipal que está a ser utilizada com a respetiva instalação e que impede a sua utilização para outros fins. 1.4 Este entendimento não foi acolhido pelo tribunal “a quo” que considerou que o domínio público municipal abrangia tanto o solo como o espaço aéreo, pelo que a área a atender, em conformidade com o regulamento municipal, devia ser a área do painel publicitário, motivo pelo qual conclui pela conformidade legal da taxa liquidada e impugnada. 1.5 No caso concreto não suscita controvérsia a existência de um domínio público municipal e a competência tributária do órgão autárquico sobre a utilização desse domínio, o qual abrange o solo, subsolo e espaço aéreo (Sobre o âmbito do domínio público municipal cfr. jurisprudência e doutrina citada no acórdão do TCA Norte de 26/03/2009, processo nº 00949/06.7BECBR.). 1.6 Resulta das normas do regulamento municipal supra transcritas que não foram especificados os termos de cálculo da unidade de medição (m2), ou seja, se referentes à volumetria do painel publicitário ou se referentes ao espaço do solo da via municipal ocupado pelo painel. Com efeito, seja no artigo 67º, referente à ocupação do domínio público, seja no artigo 75º, referente à exibição de publicidade, utilizou-se similar expressão para identificar a medida de medição: “m2 por mês” e “m2 por ano”. Decorre igualmente do Regulamento que para efeitos de determinação do valor das taxas, o legislador ora utiliza essa expressão ora utiliza a expressão “por m2 de domínio municipal utilizado…(Expressão esta que é utilizada no artigo 77º, alínea h), do atual regulamento municipal, e que corresponde ao artigo 67º, alínea g) do anterior regulamento.) Embora pareça que o legislador pretendeu diferenciar a área a que se reporta a medição – no primeiro caso por referência à instalação e no segundo caso por referência à parte do solo ocupado pela instalação -, certo é que a expressão “domínio municipal utilizado” tanto pode abranger o espaço do solo, do subsolo ou aéreo, pelo que não será tão precisa como se poderá subentender. De todas as formas, se se entender que a medida (m2) está referenciada á área do painel publicitário (como se entendeu na sentença recorrida), estaríamos então a entender que a tributação incidiria sobre a utilização e aproveitamento do domínio municipal aéreo, uma vez que o painel está erguido ou suportado por um pilar ou estaca que o sustenta no ar. Ora, nesse caso a tributação deste equipamento devia estar integrada no artigo 65º do regulamento municipal que prevê a “utilização e aproveitamento do domínio municipal aéreo” e não no artigo 67º. E com se alcança deste último preceito do regulamento municipal, nos demais casos das “construções ou instalações especiais” ali previstas a medida (m2) tem por referência a área do solo ocupada por essas construções ou instalações. Daí que se nos afigure que em razão da sua inserção sistemática no regulamento municipal, o legislador deu prevalência à ocupação do solo por este equipamento para efeitos de avaliação da utilização e aproveitamento do domínio público municipal, servindo de elemento aferidor a área do solo que lhe está afeta. E assim sendo, a área a atender para este efeito será a área delimitada no solo pela projeção do painel, que impede a utilização desse espaço para outros fins. Entendemos, assim, que assiste razão à Recorrente na censura que faz à sentença recorrida, por ter incorrido em erro de julgamento por errónea interpretação e aplicação das normas do regulamento municipal, designadamente do disposto na alínea g) do artigo 67º do Regulamento de Taxas do Município de Loures, na redação então em vigor. 2. Em face do exposto afigura-se-nos que a sentença recorrida padece do vício de erro de julgamento que lhe é assacado pela Recorrente, motivo pelo qual se impõe a sua revogação e em sua substituição julgar procedente a ação de impugnação judicial e determinar a anulação do ato tributário impugnado.” I.4 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. II – FUNDAMENTAÇÃO II.1. - De facto A sentença efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: 1. A Impugnante, A..., S. A., no ano de 2016 tinha licenciada a exposição, no espaço público, de painéis de publicidade no território da Freguesia de Loures, no concelho do mesmo nome, cinco deles implantados no espaço público, os demais em espaços privados, sendo aqueles: a. painel luminoso [24m2] junto à saída da Autoestrada ..., na rotunda do ... – licença de publicidade 2006-4; licença de ocupação do espaço público 2006-1; b. painel [24m2] junto à Estrada Nacional ..., à saída da Autoestrada ..., no ... – licença de publicidade 2006-5; licença de ocupação do espaço público 2006-2; c. painel [24m2] na rua de ..., junto à Estrada Nacional ..., em Loures – licença de publicidade 2006-13; licença de ocupação do espaço público 2006-...; d. painel [24m2] na rotunda do Parque ..., em Loures, junto à Autoestrada ... – licença de publicidade 2006-14; licença de ocupação do espaço público 2006-9; e e. painel [24m2] em ..., Montemor, junto à entrada na Circular ... – licença de publicidade 2006-16, licença de ocupação do espaço público 2006-10. 2. A Junta de Freguesia de Loures, pela renovação de tais licenciamentos e relativamente àquele ano de 2016, liquidou à Impugnante taxas de publicidade e, outrossim, taxas de ocupação do espaço público, invocando o art.67º corpo e alínea g) do Regulamento de Taxas do Município de Loures [DR II de 25 de setembro de 2009], Regulamento 392/2009, bem como o seu art.75º. 3. As taxas de ocupação do espaço público fixadas resultam do produto do valor base regulamentar de €3,50 por mês [multiplicado pelos 12 meses do ano] pela superfície de cada um dos painéis [24m2]: (3,50x12) x 24 = €1.080,00. 4. As taxas de publicidade fixadas têm também base, no seu cálculo, na superfície dos painéis onde é inserida a publicidade visual. 5. Tendo recebido a comunicação dos atos, por missiva de 18 de janeiro de 2016, que lhe assinalava um prazo de 10 dias para proceder ao pagamento, no dia 4 de fevereiro de 2016 a Impugnante reclamou graciosamente de tais atos, na parte respeitante às taxas de ocupação do espaço público, invocando violação das norma do art.67º acima aludido, com consequente erro na determinação da taxa, entendendo que apenas a área de implantação no solo dos pilares [sapatas de 50cmx50cm no solo, 4 pilares em três painéis e 2 nos demais] dos painéis publicitários releva para tal efeito, ou seja, a área de implantação relevante da taxa seria de 0,25cm2 por pilar. 6. Decorrido o lapso de tempo que a lei fixa para ser proferida uma decisão num procedimento daquela tipologia e temática, não tendo tal tido lugar, a Impugnante prevalecendo-se da faculdade de presumir o seu indeferimento, apresentando no dia 11 de abril seguinte a petição na origem dos presentes autos. II.2 – De Direito I. Vem o presente recurso interposto pela impugnante, ora Recorrente A..., S.A., da decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida, visando as taxas de ocupação do espaço público aplicadas aos cinco painéis publicitários com 24 m2 cada um, referentes ao ano de 2016, liquidadas pela Junta de Freguesia de Loures, entidade ora Recorrida, no valor de €5.040. Para decidir pela improcedência da acção, considerou o Tribunal a quo, em resumo, que as taxas aplicadas sobre os cinco painéis publicitários com 24 m2 cada um, instalados na área do domínio público da Junta de Freguesia de Loures foram aplicadas duas taxas, uma taxa de publicidade ao abrigo do artigo 75.º do Regulamento de Taxas do Município de Loures (in DR II de 25 de setembro de 2009) e outra taxa de ocupação do espaço público, ao abrigo do artigo 67.º, alínea g) do referido regulamento. Argumenta ainda que “…a intenção do Regulamento é a de que a taxa traduza a remoção do obstáculo jurídico à utilização, para um fim privado de um espaço comum, que obviamente se não restringe ao espaço aéreo nem terrestre, mas engloba ambos nessa sua destinação temporária a um específico fim privado. Deste modo, surge sem qualquer apoio no texto regulamentar ou na teleologia normativa da instituição da taxa a posição da Impugnante, que entende a ocupação do espaço restrita à área ocupada no solo pelos suportes dos painéis, os pilares, no que erradamente assimila os termos de determinação e quantificação da taxa à sua razão de ser.” - cf. p. 7 da sentença sob recurso. II. Do assim decidido, vem a ora Recorrente interpor recurso para este Supremo Tribunal, alegando que “…as taxas de ocupação do espaço público deveriam ser calculadas sobre a área ocupada pelos pilares que suportam os painéis publicitários, uma vez que esta é a área que efectivamente ocupa o domínio público.”, devendo por isso ser aplicado a taxa de publicidade prevista no artigo 75.º do Regulamento de Taxas do Município de Loures na medida em que esta também comtempla a ocupação do espaço público. Sustenta, ainda, a Recorrente que a aplicação da segunda taxa prevista no artigo 67.º do citado Regulamento sob a epígrafe - “Utilização e aproveitamento do domínio municipal com construções ou instalações especiais” o benefício obtido é o mesmo da taxa anteriormente referida uma vez que “…não pode suceder sob pena de uma dupla tributação, o que é manifestamente ilegal em matéria de taxas.” - cfr. conclusão S da alegação de recurso. E termina peticionando a anulação do ato tributário impugnado. III. Portanto, e de acordo com o teor das Conclusões apresentadas – as quais delimitam o objecto do recurso – a questão a apreciar consiste em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de Direito por errónea interpretação e aplicação das normas do regulamento municipal, designadamente do disposto na alínea g) do artigo 67º do Regulamento de Taxas do Município de Loures, na redação em vigor na altura dos factos. Vejamos, então. IV. Comecemos por reconhecer que, apesar de incomum, e como bem sublinha a Recorrida, nem sempre existem obstáculos a que duas distintas taxas partilhem da mesma base de incidência e cálculo, conquanto o desiderato que pretendem prosseguir – portanto, o interesse em que se estriba o sinalagma de cada uma delas – seja devidamente autónomo e determinável por referência a uma tal base. E importa reconhecer, igualmente, que o domínio público municipal abrange o espaço aéreo sobrejacente ao solo, nos termos do artigo 1344.° do Código Civil – o que viabilizaria a posição proposta pelo município in casu – assim, entre outros, vd. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, lavrado em 26 de Março de 2009, no processo n.º 949/06, onde se conclui: “III. Não se pode concluir, todavia, que os municípios não sejam detentores de espaço aéreo sobrejacente ao seu domínio público, mormente, ao domínio público rodoviário e que sobre esse espaço os mesmos não possam ou não devam exercer seus poderes de administração, efectivando dessa forma seus direitos e interesses.” – disponível em www.dgsi.pt. V. Todavia, quando se confronta a factualidade dos autos com a regulamentação elaborada pelo município para o efeito – o Regulamento de Taxas do Município de Loures, Publicado no Diário da República, 2.ª série — N.º 187 — 25 de Setembro de 2009 (doravante, o Regulamento) – não deixamos de nos surpreender pela particular redacção dada ao artigo 67.º de tal Regulamento, onde se pode ler: “Artigo 67.º A utilização e aproveitamento do domínio municipal com construções ou instalações especiais, está sujeita ao pagamento, no momento da emissão da licença, pelo utilizador, das respectivas taxas: Utilização e aproveitamento do domínio municipal com construções ou instalações especiais a) Construções ou instalações provisórias por motivos de festejos ou outras celebrações, por m2 de domínio municipal utilizado e por dia — 0,80€ b) Acampamentos ocasionais, por dia e por unidade de ocupação — 2,00€ c) Quiosques, por m2 de domínio municipal utilizado e por mês — ...,00€ d) Bancas e expositores, por m2 de domínio municipal utilizado e por dia — 0,15€ e) Pavilhões por m2 de domínio municipal utilizado e por dia — 0,30€ f) Agências ou postos de venda de bilhetes, m2 de domínio municipal utilizado e por mês — 10,00€ g) Suportes publicitários, por m2 e por mês — 3,50€ h) Recintos itinerantes, por m2 e por dia — 0,30€ i) Recintos improvisados, por m2 e por dia — 0,35€ j) Outras construções ou instalações não incluídas nas alíneas anteriores, por m2 de domínio municipal utilizado e por dia — 0,25€.” Quer dizer, todas as situações elencadas pelo normativo de incidência municipal se referem à implantação de várias modalidades de “construções” no solo, tomando, por isso mesmo, por referência o espaço ocupado por tais construções na superfície deste. E, em simultâneo, a própria fixação do evento tributário se reporta aos “suportes publicitários”, parecendo abstrair da área dos cartazes ou painéis para se focar, uma vez mais, na implantação ou ligação destes ao solo. VI. Esta conclusão sai ainda reforçada pelo contraste notório de tal norma regulamentar com aquela outra constante do artigo 75.º do mesmo diploma, onde, sob a epígrafe “Publicidade afecta a mobiliário urbano”, se pode ler: “Pela autorização de produção de publicidade em suporte publicitário, são devidas, pelo titular, no momento da emissão da autorização, as taxas que se seguem, a cobrar por m2 e por ano: a) Anúncios não luminosos — 50,00€ b) Anúncios luminosos ou directamente iluminados — 300,00€”. Aqui, não só o desiderato sinalagmático expressamente identificado é a “publicidade”, como a base de incidência são os “anúncios”, por contraste com os “suportes publicitários” que definiam o tributo anteriormente referido e cuja legalidade da arrecadação surge aqui questionada. Quer dizer, a própria utilização de distintas expressões, assim como a diversidade de modelação das taxas e, por fim, já deixa entender que foi distinto o critério de cálculo de uma e de outra taxa. VII. Acresce que o mencionado regulamento já possui no respectivo artigo 65.º a tributação associada, precisamente e como a epígrafe logo salienta, à “Utilização e aproveitamento do domínio municipal aéreo”, o que dificulta ainda mais a correção da leitura propalada pela Recorrida, devendo a mencionada tributação dos “suportes publicitários” encontrar-se aqui localizada para fundamentar o cálculo do mesmo, tal como ocorrido in casu. VIII. Assim, entendemos como inevitável concluir que assiste plena razão à Recorrente quando contesta a liquidação da taxa aqui sindicada por referência ao espaço aéreo ocupado pelos suportes publicitários. Como bem se sintetiza no Parecer do Ministério Público junto aos autos, “Daí que se nos afigure que em razão da sua inserção sistemática no regulamento municipal, o legislador deu prevalência à ocupação do solo por este equipamento para efeitos de avaliação da utilização e aproveitamento do domínio público municipal, servindo de elemento aferidor a área do solo que lhe está afeta. E assim sendo, a área a atender para este efeito será a área delimitada no solo pela projeção do painel, que impede a utilização desse espaço para outros fins.” III. DECISÃO Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Supremo Tribunal em conceder provimento ao presente recurso, revogar a decisão recorrida e anular a liquidação das taxas de ocupação do espaço público aplicadas aos cinco painéis publicitários, referentes ao ano de 2016. Custas pela Recorrida. Lisboa, 5 de junho de 2024. – Gustavo André Simões Lopes Courinha (relator) - José Gomes Correia – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia. |