Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01438/03.7BALSB-C
Data do Acordão:02/23/2023
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CA
Relator:ADRIANO CUNHA
Descritores:EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
DIREITO DE REVERSÃO
EXECUÇÃO DE JULGADO ANULATÓRIO
INEXISTÊNCIA DE CAUSA LEGÍTIMA DE INEXECUÇÃO
Sumário:A simples transmissão do prédio expropriado a terceiros não constitui, “ipso facto”, causa legítima de inexecução do julgado que anulou o indeferimento de pedido de reversão – enquanto o prédio continuar a existir, física e juridicamente, como objeto possível de direito de propriedade privada.
Nº Convencional:JSTA00071676
Nº do Documento:SAP2023022301438/03
Data de Entrada:01/17/2023
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:AA E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Legislação Nacional:ART. 10.º, n.º 2 CPTA;
ARTS. 166.º, 173.º e 178.º CPTA
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

1. O “MINISTÉRIO PÚBLICO (MP)”, vem interpor recurso para este Pleno do Acórdão proferido em 22/9/2022 pela Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo (cfr. fls. 1240 e segs. SITAF), que, em autos de execução de Acórdão deste Pleno de 20/1/2011, decidiu:

«A) fixar a indemnização devida aos Exequentes pelo facto de inexecução do acórdão do STA de 20.01.2011 in proc° n° 1438/03-11, fls. 943-958 e subsequente convolação assente em causa legítima de inexecução declarada nos presentes autos de execução por acórdão do STA de 17.01.2013 a fls. 312-315 dos presentes autos, no montante de 473.035,57 euros (quatrocentos e setenta e três mil e trinta e cinco euros e cinquenta e sete cêntimos);

B) determinar que no cumprimento unitário da obrigação indemnizatória devida pelo facto da inexecução do efeito repristinatório (art° 166° CPTA) são devedores solidários o Município da Batalha e o Estado através do Ministério competente segundo a orgânica governativa por reporte competencial referente à emissão da DUP/18.03.1980, nos termos expostos».

2. O Recorrente “MP” rematou as suas alegações com as seguintes conclusões (cfr. fls. 1287 e segs. SITAF):

«I – Recorre o Ministério Público em defesa da legalidade do douto Acórdão com data de 22.09.2022, na parte em que determinou a condenação do Estado através do Ministério competente em função da orgânica governativa com referencia à data da emissão da Declaração de Utilidade Pública (18.03.1980), como devedor solidário, a par do Município da Batalha, no pagamento de uma indemnização na importância de € 473.035,57, de acordo com o disposto no artigo 166º, do CPTA, pela inexecução do efeito repristinatório decorrente da anulação do ato que indeferira o pedido de reversão do prédio pertencente aos exequentes AA e Outros, e que fora objeto de expropriação.

II – Como se procurará demonstrar, e salvo o devido respeito, o douto Acórdão recorrido enferma de nulidade ao estabelecer a condenação do Estado através do Ministério competente, como devedor solidário nos termos indicados, isto sem que o mesmo quae tale tivesse tido intervenção como parte processual, ou seja, sem que tivesse sido citado ou notificado por qualquer forma, e na pessoa do seu legal representante em juízo, o Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal, para intervir no processo, designadamente para contradizer a pretensão formulada em juízo pelos Exequentes.

III – Sucede ainda que, e em função da natureza do processo, o de execução de julgado anulatório, o Estado sempre careceria de legitimidade processual (passiva) para intervir na lide por não ter sido parte no meio processual pré-executivo, no recurso contencioso de anulação, e nem na subsequente execução de julgado do Acórdão do Pleno deste Tribunal, com data de 20.01.2011, que confirmara o Acórdão de 10.09.2009, pelo qual fora anulado o despacho ministerial com data de 11.04.2003, que indeferira o pedido de reversão apresentado pelos Exequentes na data de 14.02.1994.

IV – E não fora também parte no incidente subsequente ao Acórdão proferido na presente instância, na data de 17.01.2013, pelo qual foi declarada a existência de causa legítima de inexecução da decisão anulatória, e determinada a notificação das partes nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 178º, nº 1, do CPTA, com a consequente modificação objetiva da instância.

V – Por outro lado, imputa-se ainda ao douto Acórdão recorrido, um outro vício, o de erro de julgamento de direito, por nele se ter considerado que a responsabilidade pelo cumprimento da obrigação de indemnizar os Exequentes, em função da inexecução do douto Acórdão anulatório, recaía em termos solidários quer sobre o Estado através do Ministério competente, e quer também sobre o Município da Batalha.

VI – É que, a nosso ver, será de considerar o Município da Batalha como o único e exclusivo responsável pela obrigação de indemnizar os Exequentes, por ser o mesmo o responsável pela inexecução da decisão anulatória, isto porque, enquanto entidade expropriante e beneficiário da expropriação, inviabilizou o regresso à posse e propriedade dos Exequentes do prédio que fora objeto de expropriação, ao proceder a uma operação urbanística da qual resultou a transformação do prédio em causa, tanto física como juridicamente, o que tornou impossível a reversão antes mesmo da apresentação do pedido pelos Exequentes.

VII – Ora, e quanto ao primeiro vicio que se imputa ao douto Acórdão recorrido, decorrente da condenação do Estado através do Ministério competente, cremos ser de precisar que muito embora a palavra Estado tenha várias aceções (cfr. Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, 2ª edição, Almedina, p. 211/213), desde uma aceção internacional a uma aceção constitucional, o certo é que em sede de contencioso administrativo a aceção Estado configura uma pessoa coletiva de direito público, de população e território, que se não confunde nem com o Governo e nem com os Ministérios.

VIII – Em sede de contencioso administrativo a designação Estado, reporta-se a uma pessoa coletiva pública, que dispõe de personalidade judiciária e é representado em juízo pelo Ministério Público, de acordo com o disposto nos artigos 3º, nº 1, alínea a), e 5º, nº 1, alínea a), ambos do Estatuto do Ministério Público (na versão aprovada pela Lei nº 47/86, de 15 de Outubro, e em vigor na data da declaração de justa causa de inexecução do acórdão anulatório), o que significa que a imposição pelo douto Acórdão recorrido da obrigação de pagamento de uma indemnização solidária em favor dos Exequentes pelo Estado, ainda que por reporte ao Ministério competente com referência à data da emissão da Declaração de Utilidade Pública, impunha que o mesmo tivesse tido intervenção no processo como parte processual, representado pelo Ministério Público, enquanto seu representante, o que não sucedeu, pelo que a sua condenação nesses termos constitui uma nulidade.

IX – A decisão de atribuir a responsabilidade solidária do Estado pelo pagamento da indemnização em favor dos Exequentes, com o que se não concorda, pressupõe a consideração do quadro factual dado por assente no probatório do douto Acórdão recorrido, muito em particular dos factos referenciados nas alíneas C, D, E, F e G, de que a seguir se sumariam os seguintes para melhor enquadramento do subsequente vicio que se coloca à douta consideração do tribunal ad quem.

É assim que temos que:

(D) da operação urbanística de loteamento efetuada pelo Município da Batalha na parcela 14 resultaram no sector B os lotes 5, 6, 7 e 8, e no sector C os lotes 4 e 5, que foram vendidos por escritura pública de 05.04.1990, e os lotes do sector C, vendidos por escrituras de 19.02.1992 e 21.08.1992, vendas essas efetuadas para o mercado privado de construção, para habitação e comércio.

(E) na data de 14.02.1994 os ora Exequentes requereram a reversão do prédio expropriado.

X – Ora, será de considerar que foi o Município da Batalha que inviabilizou a reversão pedida pelos Exequentes, isto porque deu um fim diverso ao prédio expropriado relativamente ao que presidira à Declaração de Utilidade Pública, ao proceder à implementação de uma operação urbanística e à venda para o mercado privado de vários lotes, o que foi concretizado pelas escrituras públicas outorgadas nas datas de 05.04.1990, 19.02.1992 e 21.08.1992, ou seja, no momento em que os Exequentes requereram a reversão do prédio expropriado, a 14.02.1994, ela já era então impossível, por impossibilidade objetiva, porque o prédio que fora expropriado inexistia física e juridicamente.

XI – Ou seja, o que inviabilizou a reversão da expropriação não foi o despacho com data de 22.10.1995, da autoria do Ministro do Planeamento e da Administração do Território, pelo qual foi arquivado o pedido de reversão, e nem também o posterior despacho com data de 11.04.2003, da autoria do Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, que indeferiu aquele pedido e que foi posteriormente anulado em sede contenciosa pelo Acórdão do STA, com data de 27.10.2004, com fundamento no efetivo desvio do fim público que presidira à expropriação.

XII – A indemnização arbitrada por inexecução legítima do julgado anulatório, como é o caso, não tem a natureza de uma indemnização por danos causados por uma atuação ilegal da Administração, que tem o seu assento em sede de responsabilidade civil por facto ilícito, à luz do disposto na Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro, mas antes num outro tipo conceptual.

XIII – É que, e como refere o Conselheiro António São Pedro [A execução das sentenças dos tribunais administrativos e fiscais na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (algumas questões práticas), Ebook Direito Administrativo, Edição CEJ, Agosto de 2014, p. 31], estamos aqui perante uma obrigação de indemnizar que resulta de uma causa legítima da inexecução da sentença, isto porque o dever de prestar correspondente à execução do julgado anulatório não é mais possível em função de uma razão de ordem pública, a causa legítima da inexecução.

XIV – Está em causa um tipo de responsabilidade para a qual se não exige culpa, porque é de considerar legítima a impossibilidade de cumprir com a obrigação natural, mas, em todo o caso é de exigir um nexo de causalidade. Neste tipo de responsabilidade a obrigação do Município da Batalha, que consistia na obrigação de restituir o prédio extinguiu-se, com o que ficou desonerado de o entregar, mas sujeito de outra obrigação, a de indemnizar os Exequentes.

XV – Como refere Diogo Freitas do Amaral (A Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos, 2ª edição, Almedina, p. 246), importa não confundir a indemnização por prejuízos causados pelo ato administrativo ilegal, que a sentença exequenda anulou, com a responsabilidade pelos prejuízos com a inexecução da sentença, pois trata-se de dois tipos de obrigação de indemnizar diferentes, desde logo com diferentes conteúdos, que têm diferentes pressupostos e que podem não recair necessariamente sobre o mesmo sujeito passivo.

XVI – Em igual sentido se pronuncia Guilherme da Fonseca Teixeira (Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos contra a Administração Pública, Almedina, Almedina, 2022, p. 197/198), que acrescenta mesmo, para fazer a destrinça entre as duas formas de indemnização, que enquanto a indemnização por causa legitima de inexecução da sentença pode ser peticionada mas também atribuída oficiosamente ao Exequente no processo de execução, com a modificação objetiva da instância executiva anulatória, acrescentamos nós, já a indemnização por danos decorrentes do ato ilegal anulado terá de ser objeto de ação declarativa autónoma em sede de responsabilidade civil.

XVII – Acrescenta ainda Guilherme da Fonseca Teixeira (ob. cit., p. 199), cuja posição se acompanha, que a efetivação a indemnização pelo dano decorrente da inexecução legítima da sentença dispensa o preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil estabelecidos no regime geral da responsabilidade civil, que constam do disposto na Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro, mas em seu lugar importará convocar os pressupostos gerais da responsabilidade civil.

XVIII – No mesmo sentido se pronunciou o Acórdão do STA, com data de 06.02.2020 (relatado pela Conselheira Maria do Céu Neves, no processo nº 01656/13.0BESNT), ao referir que a par do estabelecimento da distinção entre a indemnização pela inexecução por causa legítima do julgado anulatório e a indemnização que é devida pelos danos causados pela prática do ato declarado ilegal, e de cuja distinção emerge a circunstância de que só a primeira pode ser arbitrada no âmbito do processo executivo, esclarece ainda esse aresto que a indemnização pela inexecução do julgado supõe a verificação, como pressupostos da correspondente obrigação de indemnizar: (i) a decisão judicial anulatória; (ii) a impossibilidade como causa legítima da inexecução; (iii) os prejuízos na esfera jurídica do exequente; (iv) o nexo de causalidade entre a inexecução e os prejuízos.

XIX - Ora, retomando o caso do presente recurso, e como já referido, o que se constata é que mesmo antes da apresentação pelos Exequentes do pedido de reversão do prédio expropriado já se verificava uma situação de impossibilidade objetiva da mesma porque a entidade expropriante, beneficiária da expropriação, implementara no prédio uma operação urbanística que conduzira a uma transformação física e jurídica que obstava à efetivação da reversão.

XX – Importa ainda concluir que o Estado através do Ministério competente, ao qual foi imposta a corresponsabilidade pelo pagamento da indemnização, foi de todo em todo alheio a essa transformação do prédio, desde logo porque à luz do princípio da autonomia das autarquias locais, com tutela constitucional, ou em função do regime jurídico da expropriação, não lhe era possível controlar ou sindicar a forma como a autarquia implementava as operações sobre o prédio expropriado, e que vieram a impossibilitar quer a reversão e quer a execução do julgado anulatório da decisão judicial que anulara o ato administrativo pelo qual fora indeferido o pedido de reversão da expropriação.

XXI - Neste condicionalismo, a nosso ver, e salvo melhor opinião, é de considerar o Município da Batalha como o único e exclusivo responsável pela indemnização a arbitrar aos Exequentes mercê da inexecução do Acórdão anulatório, pois não existe nexo de causalidade entre os prejuízos decorrentes dessa inexecução, que importam na consequente obrigação de indemnizar, e o ato administrativo anulado, com o que o douto Acórdão recorrido enferma do vicio de erro de julgamento de direito, por errada interpretação e aplicação das disposições do artigo 166º, do CPTA, e dos artigos 507º, nº 1, 512º, e 516º, todos do Código Civil, ao concluir e decidir pela imputação ao Estado, através do Ministério competente em função da orgânica governativa com referencia à data da emissão da Declaração de Utilidade Pública, da corresponsabilidade solidária pelo cumprimento daquela obrigação de indemnizar.

XXII – Assim, pelo exposto, e pelo mais que doutamente não deixará de ser suprido será de julgar procedente o presente recurso, e, em consequência, será de revogar a decisão de condenação do Estado no cumprimento da obrigação solidária de indemnizar os Exequentes pela inexecução do douto Acórdão anulatório, e, por via disso, de determinar a condenação única do Município da Batalha na obrigação do pagamento da indemnização em causa.

Porém, V.Exas. Venerandos Juízes Conselheiros, em alto e melhor critério decidirão como for de Direito!».

3. Os Autores, ora Recorridos, responderam (cfr. fls. 1321/1322 SITAF) afirmando que:

«(…) 2 - A posição aqui assumida pelo Digno Ministério Público vai ao arrepio do interesse das partes que intervieram no presente processo e que, assim, se conformaram com a decisão recorrida (…).

3 - Acresce que, o que se alega com o devido respeito, é contraditório, tanto quanto nos parece, a valer tal a rejeição do recurso, sustentar que se não recorre (e se aceita mesmo, se bem interpretamos) do valor indemnizatório (primeiro segmento decisório) e sustentar-se também que, por falta de citação, o processo tem de recuar a momento anterior à sua fixação (…).

5 - Aliás, esta posição do Digníssimo Ministério Público é de molde e em abstrato a adensar a limites perfeitos e únicos a indemnização pela demora na aplicação da justiça - os AA. estão no limite da sua esperança de vida (alguns com praticamente 90 anos e outros com uns frágeis setentas e oitentas anos), como já foi alegado e provado, o que, de alguma forma, fez valer a antecipação indemnizatória decidida por este Alto Tribunal (é de dor, incompreensão e revolta apreendida, dando assim voz aos AA., que falamos) – cfr. Acórdão do STA tirado no proc. n.º 1438/03.7BALSB-C-A e datado de 05/11/2020 [processo que correu termos por apenso ao presente].

6 - Ou seja, a discussão sobre quem tem de pagar (que aliás não está feita e pode a montante ser levada a efeito, diretamente ou no limite até por aplicação analógica), a levantar sérias dúvidas quanto à impropriedade do meio recursivo para atingir os externados objetivos que explicam o recurso, pode assim causar, a não ser conferido efeito devolutivo ao recurso como se sustentará, acrescidos e sérios danos patrimoniais e reputacionais ao interesse coletivo.

(…) 8 - Caso se entenda ser de admitir o recurso solicita-se, porque nada impede processualmente que se antecipe o pedido, a fixação de efeito devolutivo ao mesmo, sendo esta a única forma de evitar maiores danos para o Estado Português e de alguma forma fazer justiça na situação vertente, possibilitando, pois, que os AA. recebam desde já a indemnização que lhes é, alegadamente de forma pacifica, devida.

9 - Finalmente deixa-se consignado (requerimento da autarquia a fls…) que o montante fixado em antecipação indemnizatória foi efetivamente recebido pelos AA.

Termos em que, deve rejeitar-se o recurso, ou, quando assim se não entender, fixar-lhe efeito devolutivo».

4. O Contrainteressado “Município da Batalha” apresentou contra-alegações, tendo assim concluído:

«I. Se há segmento decisório que não merece censura no douto acórdão recorrido é exatamente o segmento identificado pela alínea b. do dispositivo.

II. A douta decisão recorrida não se limita a afirmar que a obrigação indemnizatória impende tout court sobre o Estado, afirmando ainda que tal responsabilidade o onera “através do Ministério competente segundo a orgânica governativa por reporte competencial referente à emissão da DUP/18.03.1980, nos termos expostos”.

III. Significa isto, afinal, que a responsabilidade solidária recai, do lado da Administração Central do Estado, sobre o Ministério que, na orgânica do atual Governo Constitucional, recolheu as atribuições que, à data, competiam ao Executado, Secretário do Estado da Administração Local e Reforma Administrativa, quando indeferiu o requerimento de reversão, que é também o mesmo que “herdou” as competências, atribuídas ao Ministro das Obras Públicas, para a emissão da declaração de utilidade pública de expropriação de 18/03/1980.

IV. Ainda que triunfasse a arguição da pretensa nulidade suscitada pelo Digníssimo recorrente - hipótese que, sem prescindir ou tergiversar, apenas se equaciona pelo desiderato de dissecar, mais exaustivamente, as razões que contrariam a pretensão recursória - o resultado seria a consagração da mesma corresponsabilidade, a impender não já nominalmente sobre o Estado, mas sim expressamente sobre o Executado Secretário do Estado da Administração Local e Reforma Administrativa ou quem lhe tiver sucedido nas competências que à data detinha.

V. Foi o Estado, na veste das entidades referidas nas alíneas A., F. e H. da matéria de facto provada, quem produziu os atos anulados. Tanto basta para que a natureza da responsabilidade (solidária) esteja corretamente ajuizada, pois, afinal, ambas as entidades deram causa à indemnização arbitrada nos autos.

VII. A douta decisão do Tribunal a quo veio, de resto, evitar a busca de uma outra que dirimisse a quem (ao Executado, ao Contrainteressado ou a ambos), no fim da linha, e em que medida, caberia suportar a indemnização arbitrada.

VII. É que, se o Tribunal a quo se não se tivesse pronunciado nos termos em que o fez, a responsabilidade pelo pagamento da indemnização teria de ser integralmente assacada a quem no processo assume a veste de único Executado.

VIII. Acresce que, em sede de processo cautelar apenso a estes autos, o Pleno deste Colendo Tribunal decidiu condenar os ali Requeridos, ora Executado/Recorrido e ora Contrainteressado Município, a pagar a quantia ali fixada, “a título de reparação provisória pela inexecução do direito que lhe foi reconhecido na ação principal à reversão dos bens que lhe foram expropriados”.

Atento este “precedente”, decidir-se agora, em sede de ação principal, em sentido diverso da corresponsabilidade, não abonaria a favor da coerência entre julgados.

IX. A douta decisão recorrida não viola quaisquer das normas invocadas pelo Recorrente.

X. A decisão de condenação solidária do Estado e do Município da Batalha no cumprimento da obrigação de indemnizar os Exequentes pela inexecução do acórdão anulatório não enferma de qualquer nulidade e/ou erro de julgamento de direito, destarte não merecendo qualquer censura.

Termos em que deve negar-se provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, mantendo-se integralmente o douto acórdão recorrido.

SÓ ASSIM SE FARÁ A TÃO ALMEJADA JUSTIÇA!».

5. Concedidos vistos, cumpre apreciar e decidir em Conferência.


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II - DAS QUESTÕES A DECIDIR

6. Em consonância com as conclusões das alegações apresentadas pelo Recorrente “MP” – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito do presente recurso (ressalvando-se as eventuais questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua consideração), nos termos dos arts. 635º nº 4 do CPC, “ex vi” do art. 1º e 140º nº 3 do CPTA -, cumpre apreciar e decidir se, como vem alegado, o Acórdão recorrido sofre de nulidade ao ter condenado o “Estado” sem que este, como tal, tivesse tido qualquer intervenção processual, quer na fase pré-executiva, quer na presente ação executiva, não tendo para o efeito sido citado na pessoa do seu legal representante em juízo, o Ministério Público; e, por outro lado, se, como também vem alegado, incorreu o Acórdão recorrido em erro de julgamento de direito ao condenar, solidariamente, o “Estado”, através do Ministério competente, e o “Município da Batalha”, a indemnizar os Autores pela inexecução do julgado anulatório, em vez de condenar exclusivamente o “Município da Batalha”, por ter sido este o único responsável pela impossibilidade de execução desse julgado anulatório.


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III - FUNDAMENTAÇÃO

III. A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

7. Resulta dado como assente, na decisão recorrida, o seguinte quadro factual:

«A. Por despacho do Ministro da Habitação e Obras Públicas datado 18.03.1980 publicado no DR, II série de 14.05.1980 foi declarada a utilidade pública e atribuído caráter de urgência à expropriação dos terrenos destinados à implementação da Célula B da Zona Envolvente do Mosteiro da Batalha, sendo beneficiário da expropriação o Município da Batalha e a respetiva Câmara autorizada a tomar posse administrativa dos mesmos - cfr. factos constantes do acórdão de 17.01.2013, a fls. 312-315 dos presentes autos de execução (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

B. Entre os prédios expropriados figurava o imóvel que, tendo sido propriedade de BB, veio através de escritura de partilhas a pertencer aos ora Exequentes, identificado na planta anexa à DUP/18.03.1980 sob a designação de Parcela n° 14 com a área de 9150 m2, adjudicado ao beneficiário da expropriação, a Câmara Municipal da Batalha, pelo preço de 8.463.750S00 (na moeda atual 42.217,01€) acordado em transação que teve lugar em 14.03.1987 no processo de expropriação litigiosa que correu termos no Tribunal da Comarca de Porto de Mós - cfr. factos constantes do acórdão de 17.01.2013, a fls. 312-315, V-1 e fls. 608, V-111 dos presentes autos de execução (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

C. De acordo com o teor do relatório de vistoria ad perpetuam rei memoriam de 18.02.1981, à data da DUP/18.03.1980 a Parcela n° 14 tem a seguinte discriminação:

“(…) a área por nós medida sobre a Planta Parcelar também fornecida é de 9150 m2. Destaca-se do prédio inscrito na matriz predial rústica n° … e descrito na Conservatória do Registo Predial da Porto de Mós sob o n° … a fls. 61-v° do Lº B-33. Confrontando a Norte com CC e DD, do Sul com EE e Herd°s. de FF, do Nascente com o Rio Lena e do Poente com habitação do Expropriado.

Este terreno franco-argiloso, de boa profundidade e elevada percentagem de húmus, está em zona central ocupado com vinha, de cerca de 40 anos, não aramada, plantada ao compasso de 1,4 x 1,2m, abrangendo a área de 6820 m2. A área restante da parcela, de 2330 m2, é a soma de duas sub-parcelas, uma a nascente junto ao rio Lena, com a área de 1270 m2, e outra na extremidade poente, com a área de 1060 m2, é apenas de terreno de cultura hortícola.

Na parcela anotamos ainda a existência de uma nogueira de médio porte, uma macieira com cerca de 6 anos de idade e mais dezassete outras macieiras grandes. Leiria 18 de fevereiro de 1981, O PERITO, (…)” - cfr. fls. 603-604 dos presentes autos de execução (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

D. Da operação urbanística de loteamento da Parcela 14 inscrita na planta anexa à DUP/18.03.1980 resultaram no sector B os lotes 5, 6, 7 e 8 e no sector C os lotes 4 e 5, tendo sido os referidos lotes do sector 8 vendidos juntamente com os restantes lotes 3, 4, 9, 10 e 11 do sector B conforme deliberação da Câmara da Batalha de 29.11.1989, por escritura pública de 05.04.1990 pelo montante global de 140.000.050$00 (cento e quarenta milhões e cinquenta escudos) (certidão de fls. 99-105 dos autos) na moeda atual 698.317,31 € (seiscentos e noventa e oito mil e trezentos e dezassete euros e trinta e um cêntimos) e, conforme deliberações da Câmara da Batalha de 07.11.1991 e 13.02.1992, os lotes do sector C vendidos por escrituras públicas de 19.02.1992 e 21.08.1992 pelos montantes, respetivamente, de 25.800.000$00 e 22.100.000$00 (vinte e cinco milhões e oitocentos mil escudos e vinte e dois milhões e cem mil escudos) (certidão de fls. 106-109 e 110-113 dos autos) na moeda atual 128.689,86 € e 110.234,34 € (cento e vinte e oito mil, seiscentos e oitenta e nove euros e oitenta e seis cêntimos; cento e dez mil, duzentos e trinta e quatro euros e trinta e quatro cêntimos), vendas efetivadas para o mercado privado de construção (habitação e comércio) - cfr. factos 1 a 11 do probatório do acórdão exequendo de 20.01.2011 do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, a fls. 71-86 e certidão de escrituras a fls. 99-113 dos presentes autos de execução (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

E. Em 14.02.1994 os ora Exequentes requereram a reversão do prédio expropriado identificado como Parcela n° 14 na planta anexa à DUP/18.02.1980, com fundamento em lhe ter sido dado destino diferente ao que presidiu à expropriação, pedido que por despacho em 22.10.95 foi arquivado pelo Ministério do Planeamento e da Administração do Território, despacho anulado em sede de recurso contencioso no proc° n° 39.934 por acórdão do Pleno/1ª Secção do CA do STA de 22.03.2000 - cfr. acórdão de 22.03.2000 a fls. 55-62 do processo principal, recurso n° 1438/03-11, processo físico.

F. Na sequência do acórdão anulatório do STA de 22.03.2000 o pedido de reversão veio a ser indeferido por despacho de 11.04.2003 do Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, despacho anulado em sede de recurso contencioso, proc° n° 1438/03-11, por acórdão da Secção do CA do STA de 27.10.2004 com fundamento em “efetivo desvio do fim público que presidiu à expropriação” - cfr. acórdão de 27.10.2004 a fls. 177-191 do processo principal, recurso n° 1438/03-11, processo físico.

G. Provido o recurso de revisão do acórdão anulatório de 27.10.2004 pedido pelo Município da Batalha por falta de citação como contrainteressada e apresentada nova petição corrigida pelos ora Exequentes, por acórdão da Secção do CA do STA de 10.09.2009 foi anulado o despacho ministerial de 11.04.2003 de indeferimento da reversão pedida em 14.02.1994, declarando-se o desvio do fim determinante da expropriação da Parcela 14 e o direito dos ora Exequentes à reversão das partes destinadas a fins privados, pelos fundamentos de que se extrata, como segue:

“(…) certo é que não está legalmente previsto que aquela [a Administração] possa expropriar prédios para os lotear e vender para o mercado privado de habitação e que, com desrespeito das circunstâncias e pressupostos legalmente assinalados, se proceda a expropriação de prédios para a criação de aglomerados urbanos.

O que, de resto, se compreende visto que, por um lado, a intervenção da Administração no mercado da habitação tem caráter eminentemente social e, portanto, só se justifica quando se destine a suprir as carências dos mais necessitados e, por outro, se entende que certos terrenos devem destinar-se a construção de habitação cumpre-lhe integrá-los no PDM em zona de construção e deixar aos seus proprietários a prevista construção.

Ora, in casu, a expropriação do prédio em causa não foi justificada com a criação de um aglomerado urbano nem pela necessidade da construção de habitação social e, muito menos, como agora se invoca, “para colmatar as enormes carências da vila da Batalha no que concerne a terrenos destinados a construção, infraestruturas e equipamentos públicos, comerciais e de serviços e para prosseguir uma requalificação digna e com qualidade na zona envolvente ao Mosteiro de Santa Maria da Vitória, entretanto declarado pela UNESCO Património da Humanidade (...)” - cfr. acórdão de 10.09.2009 a fls. 719-739 do processo principal, recurso n° 1438/03-11, processo físico.

H. Julgamento confirmado por acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo de 20.01.2011 - cfr. acórdão exequendo de 20.01.2011 a fls. 943-957 do processo principal recurso 1438/03-11 e a fls. 71-96 dos presentes autos de execução (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

I. Face à invocação pela Entidade Requerida de causa legítima de inexecução, em 30.11.2011 os ora Exequentes promoveram a execução judicial do acórdão anulatório de 20.01.2011, dando origem ao processo de Execução de Julgados n° 1438/03.7BALSB-C, tendo por apenso a providência cautelar de regulação provisória de situação jurídica (art° 133° CPTA), proc° n° 1438/03.7BALSB-C-A.

J. Em sede de providência cautelar (proc° n° 143 8/03.7BALSB-C-A) por acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do STA de 05.11.2020 foi revogado o acórdão proferido pela Secção e, no deferimento da providência requerida “(…) condenados os Requeridos Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa e o Município da Batalha a pagarem aos Requerentes a quantia de 100.000,00 € (cem mil euros) a título de reparação provisória pela inexecução do direito que lhe foi reconhecido na ação principal à reversão dos bens que lhes foram expropriados (…)” - cfr. acórdão de 05.11.2020, proc° cautelar n° 1438/03.7BALSB-C-A, fls. 173/Sitaf.

K. Nos presentes autos de execução n° 1438/03.7BALSB-C por acórdão da Secção do Contencioso Administrativo do STA de 17.01.2013 foi declarada a existência de causa legítima de inexecução da reversão e, em consequência, ordenada a notificação das partes nos termos e para os fins do disposto no art° 178° n° 1 CPTA, pelos fundamentos de que se extrata o segmento que segue:

“C.) É sabido que, no âmbito da execução de sentenças anulatórias de atos administrativos, a Administração deve reconstituir a situação atual hipotética, isto é, deve repor a situação que existiria se o ato ilegal não tivesse sido praticado bem como cumprir os deveres que não cumpriu com fundamento no ato anulado, por forma a que a ordem jurídica seja reintegrada e o executado colocado na posição a que tem direito.

O que passa pela prática dos atos jurídicos e pelas operações materiais necessárias à referida reconstituição e pela eliminação da ordem jurídica de todos os efeitos positivos ou negativos que a contrariem - vd. art.° 173° do CPTA, F. do Amaral, A Execução das sentenças dos Tribunais Administrativos, pág.45 e Acórdãos do Pleno deste STA de 13/03/2003 (rec. 44140-A) e da Secção de 3/03/2005 (rec. 41794-A) e numerosa jurisprudência, neles citada.

Todavia, casos há em que essa forma de execução do julgado não pode ser realizada, quer porque a reconstituição da situação é impossível quer porque, atento o grave prejuízo para o interesse público que dela decorreria, não é exigível. Nesses casos, a Administração pode invocar essa impossibilidade ou essa inexigibilidade como fundamento da recusa da reconstituição da realidade nos termos mencionados, cumprindo ao Tribunal verificar a procedência dos fundamentos invocados e, sendo caso disso, desonerá-la da obrigação de executar a sentença dessa forma, dando início ao processo conducente à fixação de indemnização - vd. n° 2 do art° 175° e n° 1 do art° 163° e art° 178°, todos do CPTA e citada jurisprudência.

No caso sub judicio, está em causa a execução de decisão anulatória do indeferimento de um pedido de reversão de uma parcela expropriada pelo que essa execução deveria passar pela prolação de decisão que deferisse aquele pedido e fizesse regressar à propriedade dos Exequentes esse bem.

Todavia, como alega a Entidade Executada e decorre do probatório, essa parcela já não existe - nem física nem juridicamente - uma vez que após a sua expropriação parte dela foi aplicada em espaços públicos (ruas, estacionamentos, passeios e zonas verdes) e a parte restante foi vendida e nela foram construídos edifícios cujas frações vieram a ser vendidas para habitação e comércio (vd. pontos 3, 4, e 5 da matéria de facto).

O que significa que a reconstituição da situação atual hipotética é impossível visto não ser possível fazer regressar a propriedade daquele prédio à titularidade dos Exequentes.

É, pois, seguro existir causa legítima de inexecução do Acórdão anulatório.

A declaração da existência de causa legítima de inexecução determina que o processo executivo deixe de ser um processo dirigido à adoção das providências necessárias à execução do Julgado nos termos da reconstituição da situação atual hipotética para se transformar num processo para fixação de indemnização pelos danos causados em consequência da decisão ilegal.

Nestes termos os Juízes que compõem este Tribunal acordam em:

a) Declarar que existe causa legítima de inexecução.

b) Notificar as partes nos termos e para os fins do disposto no n° 1 do art° 178° do CPTA (…)” - cfr. acórdão de 17.01.2013 a fls.3 12-315 dos presentes autos de execução (1438/03 .7BALSB-C), processo físico.

L. Tendo as partes indicado os seus quesitos, por despacho de 06.02.20 14 foi ordenada a “peritagem dos terrenos em causa” mediante deprecada ao TAF de Leiria (proc° de carta precatória n° 381/14.9BELRA), como segue:

“Está em causa nesta execução a determinação do valor dos terrenos que foram expropriados e que não foram aplicados na finalidade prevista para a expropriação.

Valor, esse, que as partes não conseguiram encontrar por acordo e cujo cálculo é complexo.

A executada - Câmara Municipal da Batalha - sugere que na peritagem que, inevitavelmente, se seguirá o Tribunal solicite à Ordem dos Revisores Oficiais de Contas um perito. Sugestão que é acompanhada de uma outra: a de que também seja feita uma peritagem de natureza urbanística.

Sendo assim, e sendo que não nos parece que esta última perícia seja necessária, depreque ao Tribunal competente a peritagem dos terrenos em causa a qual será precedida pela nomeação dos respetivos peritos. Notifique. Lisboa, 06 de fevereiro de 2014”. - vd. fls. 337-338, 459-463, 496, 500-501 e 503 dos presentes autos de execução (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

M. Os dois laudos periciais em separado de novembro/2014 e janeiro/2015 e anexos mostram-se assinados, respetivamente, pelos peritos do Tribunal e do Município e pelo perito dos Exequentes, dando-se aqui o seu teor por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais - vd. fls. 512 a 974, (laudos fls. 579-600 e fls. 690-716, dos presentes autos de execução, V- III (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

N. Em 28.01.2016 realizou-se uma tentativa de conciliação, entretanto adiada para 25.02.2016, que resultou inconclusiva - vd. autos de fls. 1023-1024 do presente processo de execução, V-IV (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

O. Requerida pelos Exequentes segunda perícia, foi a mesma ordenada por despacho de 18.05.2017 mediante deprecada ao TAF de Leiria (proc° n° 1573/17.4BELRA) e enunciados quesitos, de cujo teor se extrata, como segue:

“C.) Resulta dos requerimentos apresentados pelos Exequentes e pela Câmara da Batalha (fls. 1031/1040 e fls. 1058 a 1072), na sequência do acordado na última tentativa de conciliação, que se verifica a existência de acordo em certas matérias relativas ao cálculo da indemnização a atribuir aos Exequentes e de divergência noutras.

Com efeito, existe acordo não só no tocante à área dos terrenos dos Exequentes que foram objeto das alienações em causa, como no valor da receita obtida na venda dos terrenos do Sector B (lotes 5, 6, 7 e 8), o qual foi identificado como sendo de 178.041,53 euros.

Todavia, as partes divergem no tocante à área que deve ser considerada para efeitos do cálculo indemnizatório no Sector C (lotes 4 e 5) e no valor das despesas de urbanização realizadas pela Câmara.

No primeiro caso, a Câmara sustenta que a área que deve ser considerada para efeitos do referido cálculo tem de ser restringida à área de implementação do edificado enquanto os Exequentes defendem que deve ser atendida a área total do lote - o que se traduz numa diferença entre 174 m2 e 628 m2 no lote 4 e 278 m2 e 626 m2 no lote 5 - daí resultando que a Câmara entende que só deve indemnizar os Exequentes pela quantia de 21.325,75 euros no tocante ao lote 4 e 32.775,56 euros para o lote 5 enquanto estes pretendem ser indemnizados pelas quantias de 76.967,68 euros e 76.722, 56 euros, respetivamente.

No tocante às despesas realizadas pela Câmara em função da expropriação e venda dos terrenos, existe uma significativa diferença entre os valores indicados pelas partes, uma vez que a Câmara calcula-as em 344.042,71 euros e os Exequentes consideram que não foram gastos mais de 211.067,99 euros.

No entanto, e apesar dessas diferenças, tanto os Exequentes como a Câmara manifestaram interesse em que essas divergências fossem superadas por via de acordo.

Só que sendo substanciais as diferenças entre elas não parece viável que as mesmas possam ser superadas por via de acordo em nova tentativa de conciliação.

No entanto, se as partes considerarem que existe a possibilidade de acordo e que a intervenção do Tribunal pode facilitá-lo devem fazer, nos próximos 15 dias, um requerimento conjunto nesse sentido identificando os avanços entretanto efetuados e as questões cuja resolução falta superar.


*

Para a hipótese desse requerimento não ser apresentado e tendo em atenção que as apontadas diferenças estão devidamente sinalizadas e que as mesmas são, no essencial, de natureza fáctica e técnica a sua superação pode ser facilitada com recurso a intervenção pericial.

Nesta conformidade, e para a hipótese de não ser possível alcançar acordo, ordena-se a realização de uma perícia para que - entre o mais que os Sr.s Peritos considerem relevante para a definição da indemnização a atribuir - se apure:

a) Qual foi, efetivamente, a área da parcela do Sector C onde foi implementada a construção nela existente?

b) Em que foi aplicada a parte restante dessa parcela que não foi ocupada por construção?

c) Qual o valor atualizado da totalidade dessa parcela?

d) Qual o valor atualizado da área ocupada por construção?

e) Qual o valor atualizado das despesas que a Câmara realizou para a venda do Sector B?

O Qual o valor atualizado das despesas que a Câmara realizou para a venda do Sector C?

g) Em que consistiram tais despesas?

h) Essas despesas foram realizadas antes ou depois da sua venda a particulares?

i) Qual a área expropriada aos Exequentes que foi ocupada por ruas, passeios, equipamentos públicos, sociais, etc.?

j) O valor de despesas indicado pela Câmara compreende tanto a urbanização dos terrenos dos Exequentes como dos restantes terrenos expropriados ou o mesmo respeita apenas às despesas com a urbanização dos terrenos dos Exequentes?

Convida-se as partes a indicarem os quesitos circunscritos às apontadas divergências a que querem que os sr.s Peritos respondam. (..)” - fls. 1131-1132, V-IV e 1158-1159 V-5° dos presentes autos de execução (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

P. Os Exequentes indicaram os seus quesitos - vd. fls. 1146-1147, V-5° dos presentes autos de execução (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

Q. Relativamente aos lotes 5, 6, 7 e 8 do Sector 8 vendidos no mercado privado de construção em 05.04.1990, o acordo sobre o valor indemnizatório, não atualizado por coeficiente de correção monetária, referido no despacho de 18.05.2017 (al. O) entre Exequentes e Município da Batalha, é o seguinte:

Set. B área total venda (escudos)/(euros) implantação afeta valor imputável

Lote 5 299 m2 153 16507$48 - 76.398,42 28,0 m2 7.154,37€

Lote 6 345,0 17672893$35 - 88.152,02 320,0 81.764,19

Lote7 299,0 15316507$48 - 76.398,42 298,8 76.347,31

Lote 8 299,0 15316507$48 - 76.398,42 50,0 12.775,66

Soma 1242,0 63622415$70 - 317.347,27€ 696,8 178 041,53€ - vd. articulado

do Município da Batalha fls.1035 e dos Exequentes fls. 1061-1062 dos presentes autos de execução, V- 40 (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

R. O relatório pericial e anexos referente à segunda perícia, datado de 18.03.2019 e assinado pelos três peritos nomeados, é do teor que se transcreve:

“(..) Objeto da Perícia:

Quesitos fixados no despacho de 23 de novembro de 2017 (TAF de Leiria)

10, 2°, 3°, 40, 5°, 6°, 7º, 8º, 9º, 10°, 11º a) e b) e 12° a) e b).,

Pressupostos e Bases de Trabalho

Nas respostas aos Quesitos, os Peritos signatários utilizaram as seguintes bases de trabalho, bem como os pressupostos que são enunciados abaixo:

a) Os documentos remetidos pelo TAF de Leiria aos peritos.

b) A informação e os documentos com interesse para a perícia que figuram no processo judicial (TAF de Leiria).

c) O acervo documental fornecido pela Câmara Municipal da Batalha, por via oficiosa e oficial, designadamente os que fazem parte da lista a que corresponde o ANEXO 1.

d) Os peritos realizaram medições de áreas e/ou verificação de áreas com base em cartografia georreferenciada e cartografia vetorial - ANEXO II.

e) A delimitação - para efeitos de realização de cálculos técnicos para resposta aos Quesitos 5.5 e 6.5 - dos Sectores A, B e C da Célula B realizada pelos peritos é que figura no ANEXO III.

f) O(s) valor(es) atualizado(s) corresponde(m) à atualização de montantes financeiros com base na Portaria n° 317/2018, de 11 de dezembro, relativa aos designados “coeficientes de desvalorização da moeda”, (também conhecidos por “coeficientes de correção monetária”), atualização reportada a dezembro de 2018.

g) Os peritos utilizaram os Quadros que figuram como ANEXOS IV, V e VI do presente Relatório, considerando-os como contendo “informação rigorosa e fidedigna”, mas sublinham que, obviamente, não analisaram o conteúdo dos documentos originais (e restantes dados) que constam dos Quadros elaborados pelos serviços da Câmara Municipal da Batalha.

h) Como a peça desenhada do Plano de Pormenor da Célula B, solicitado pelos peritos à CM da Batalha (através do TAF Leiria), não apresenta o Quadro das áreas de construção previstas, utilizou-se a informação (e os Quadros) elaborada pela C M da Batalha, que figura nos documentos do processo judicial.

Resposta aos Quesitos

Qual foi efetivamente a área da parcela do Sector C onde foi implementada a construção nele existente?

Resposta - Com base na análise das peças escritas e desenhadas e nas medições/verificações de áreas, obteve-se a seguinte informação a respeito de áreas:

a) Área da parcela 14 (Sector C) ocupada pelos lotes:

Lote 4- 709,19 m2

Lote 5 - 565,65 m2

b) Área da parcela 14 (Sector C) ocupada pela implantação de edificações:

Lote 4 - 229,50 m2

Lote 5 - 289,29 m2

Pelo que a área total da Parcela 14 (Sector C) ocupada pela implantação dos edifícios é

(229,50+289,29=) 518,79 m2.

Nota - Não se consideraram as áreas ocupadas com edifícios públicos e equipamentos técnicos.

2.°

Em que foi aplicada a parte restante dessa parcela que não foi ocupada por construção?

Resposta - Os peritos pressupõem que se trata das áreas físicas que integram o Lote 4 e o Lote 5 e que são envolventes dos edifícios. Em termos de configuração e utilização, correspondem a passeios, zonas de estacionamento, acessos aos edifícios e logradouros dos mesmos.

Qual o valor atualizado da totalidade dessa parcela?

Resposta - Os peritos entendem que o valor das áreas livres, (referidas no Quesito 2°), com utilização pública ou com utilização “de serviço”, está incluído no valor de cada um dos lotes em causa, uma vez que faziam parte dos mesmos à data das Hastas Públicas.

Qual o valor atualizado da área ocupada por construção?

Resposta - Para obter o valor atualizado da área proveniente da Parcela 14, integrante dos lotes 4 e 5, os peritos apresentam os seguintes cálculos:

Valor de venda dos lotes nas Hastas Públicas:

Lote 4 (22/06/1992) - 25.800.000$00 (128.689,86 €)

Lote 5(20/12/1991) -22.100.000$00 (110.234,34 €).

Atualização dos valores indicados com base na Portaria n° 317/2018:

Lote 4 (1992) - 128.689,86 € x 1,85 = 238.076,24 €

Lote 5 (1991) -110.234,34 € x 2,01 221.571,02 €

Quociente (ou percentagem) entre as áreas provenientes da Parcela 14 (que integram o Lote 4 e o Lote 5) e a totalidade área do respetivo lote:

a) Considerando as áreas dos lotes provenientes da Parcela 14:

Lote 4 (Parcela 14) -709,19 m2

Lote 5 (Parcela 14) -565,65 m2

Área (total) do Lote 4-985,19 m2

Área (total) do Lote 5 - 902,55 m2

NB Os peritos, nas medições efetuadas, não conseguiram reestabelecer as áreas indicadas pela Câmara Municipal da Batalha para os Lotes 4 e 5, (ou seja, 1040,00 m2 e 935/00 m2, respetivamente), pelo que utilizam as áreas obtidas por levantamento topográfico no local.

Quociente entre as áreas respetivas de cada lote:

L4 - 709,19 m2 / 985,19 m2 = 0,720

L5 - 565,65 m2 / 902,55 m2 = 0,627

Calculando os valores atualizados respetivos:

L4 - 238.076,24 € x 0,720 = 178.557,18 €

L5 -221.571,02€ x 0,627 = 138.925,03€

b) Considerando as áreas de construção decorrentes das áreas de implantação dos edifícios:

Lote 4 (Parcela 14) - 229,50 m2

Lote 5 (Parcela 14) - 289,29 m2

Área de construção (total) do Lote 4 - 688,54 m2

Área de construção (total) do Lote 5 - 734,40 m2

Área de implantação (total) do edifício do Lote 4 - 342,59 m2

Área de implantação (total) do edifício do Lote 5 - 360,85 m2

Quociente entre as áreas de implantação respetivas de cada lote:

L4 - 229,50 m2 / 342,59 m2 = 0,670

L5 - 289,29 m2 / 360,85 m2 = 0,802

NB - Estes quocientes têm correspondência com as respetivas áreas de construção. Logo, considerando o valor atualizados dos lotes 4 e 5, teremos:

L4 -238.076,24€ x 0,670 = 159.511,09€

L5 -221.571,02€ x 0,802 = 177.699,96€

Na opinião dos peritos, a “linha de trabalho” tecnicamente mais correta é a da alínea b), atendendo ao facto de que o valor imobiliário dos lotes é função da área de construção prevista (ou permitida) para os mesmos, (sendo esta a variável principal, além da exposição/orientação solar e qualidade da envolvente urbana e proximidade a equipamentos, por exemplo).

Deste modo, consideram que o valor atualizado da área ocupada com construção, proveniente da Parcela 14, é (159.511,09€ + 177.699,96 €=) 337.211,05€.

Qual o valor atualizado das despesas que a Câmara realizou com a venda do Sector B?

Resposta - Não foi fornecida aos peritos informação desagregada por sectores, já que os Quadros analisados dizem respeito à totalidade da Célula B (Sectores A, B e C).

Os peritos pressupõem que as despesas em causa se reportam à totalidade das despesas apresentadas pela CM da Batalha e que figuram no acervo documental consultado, cujos Quadros respetivos constituem os ANEXOS IV, V e VI.

A atualização das despesas desses Quadros é apresentada nos ANEXOS VII, VIII e IX.

Na opinião dos peritos, são possíveis duas hipóteses de cálculo:

a) Considerar o somatório das despesas (despesa total atualizada), as áreas de cada um dos sectores e realizar uma proporção em relação à totalidade da área da Célula II.

b) Ou considerar essa mesma despesa total, as áreas de construção de cada um dos Sectores e realizar uma proporção em relação à totalidade da área de construção da Célula B.

Para concretizar a resposta ao presente Quesito, os peritos tiveram de realizar uma “delimitação operativa’ dos Sectores A, B e C (ver ANEXO III).

Nota - Esta operação técnica tornou-se necessária por existirem espaços físicos inseridos na Célula B, (designadamente arruamentos e outros espaços livres), que não estavam integrados nos Sectores A, B ou C, na delimitação das peças desenhadas fornecidas pela Câmara Municipal da Batalha e que figuram no processo judicial.

Assim, com base nos dados recolhidos e nas medições efetuadas, temos a seguinte informação base de trabalho:

Área da Célula B (total) -52.688,00 m2

Área do Sector A -24.297,30 m2

Área do Sector B -6.532,10 m2

Área do Sector C -21.858,60 m2

Área de construção da Célula B (total) -27.165,81 m2

Área de construção do Sector A -5.914,51 m2

Área de construção do Sector B -11.324,50 m2

Área de construção do Sector C - 9.926,80 m2

Despesa total atualizada - (1.383.901,70+409.757,50+1.643.253,68=) 3.436.912,88 €

Hipótese de cálculo a):

Quociente entre a área do Sector B e a área da Célula B -(6.532,10 / 52.688,00=) 0,124

Total das despesas imputável ao Sector B - (3.436.912,88 x 0,124=) 426.177,20€

Hipótese de cálculo b):

Quociente entre a área de construção do Sector B e a área de construção da Célula B -

(11.324,50 /27.165,81=) 0,417

Total das despesas imputável ao Sector B -(3.436.912,88 x 0,417=) 1.433.192,67€

Na opinião dos peritos, porque os cálculos em função da área de construção correspondem ao critério técnico mais ajustado, entendem mais defensável a hipótese da alínea b), considerando poder imputar-se ao Sector B a quota-parte de despesas de 1.433.192,67 €.

Qual o valor atualizado das despesas que a Câmara realizou com a venda do Sector C?

Resposta - Com base nos dados respetivos e utilizando os procedimentos técnicos apresentados na resposta ao Quesito anterior, temos então:

Hipótese de cálculo a):

Quociente entre a área do Sector C e a área da Célula B -(21.858,60 / 52.688,00=) 0,415

Total das despesas imputável ao Sector C- (3.436.912,88 x 0,415=) 1.426.318,85 €

Hipótese de cálculo b):

Quociente entre a área de construção do Sector C e a área de construção da Célula B -

(9.926,80 / 27.165,81=) 0,365

Total das despesas imputável ao Sector C - (3.436.912,88 x 0,365=) 1.254.473,20 €

Na opinião dos peritos, porque os cálculos em função da área de construção correspondem ao critério técnico mais ajustado, entendem mais defensável a hipótese da alínea b), considerando poder imputar-se ao Sector C a quota-parte de despesas de 1.254.473,20 €.

Em que consistiram tais despesas?

Resposta - A natureza e tipo de despesas estão referenciadas nos Quadros que figuram como ANEXOS IV, V e VI do presente Relatório. Tal como decorre da respetiva análise dos Quadros, trata-se de despesas relativas às expropriações, à elaboração dos estudos/planos urbanísticos, indemnizações a terceiros, despesas com emolumentos e similares, infraestruturas urbanísticas (arruamentos e restantes redes públicas), arranjos exteriores (incluindo o parque verde e seus equipamentos de estadia, lazer e recreio).

Essas despesas foram realizadas antes ou depois da sua venda a particulares?

Resposta - Analisando o Quadro (ANEXO X) relativo a venda de lotes elaborado pelos serviços da Câmara Municipal, verifica-se que as vendas dos lotes (escrituras) decorreram entre maio de 1989 e junho de 1998, com maior incidência nos anos 1992 e 1995.

Analisando os Quadros respetivos (ANEXOS IV, V e VI), constata-se que as despesas indicadas decorreram:

- no caso das despesas “Expropriações/Aquisição de Terrenos”, de abril de 1983 a março de 1992, com maior incidência entre 1983 e 1987.

- no caso das despesas Outras Despesas”, de junho de 1982 a outubro de 1994, com maior incidência entre 1983 e 1986.

- no caso das despesas “Infraestruturas e Arranjos Urbanísticos - Célula B” de fevereiro de 1988 e abril de 2007, podendo afirmar-se que a maior parte dos trabalhos de construção das infraestruturas urbanísticas deverá ter decorrido no período de 1988 e 1996. A construção de parque verde e outros arranjos exteriores terá decorrido a partir do ano de 1996.

Qual a área expropriada aos Exequentes que foi ocupada por ruas, passeios, equipamentos públicos, sociais, etc.?

Resposta - A área expropriada da Parcela 14 «que foi ocupada por ruas, passeios, equipamentos públicos, sociais, etc.», no conjunto da Célula B (Sectores A, B e C) totaliza cerca de 7.415,74 m2.

10º

O valor de despesas indicado pela Câmara compreende tanto a urbanização dos terrenos dos Exequentes, como dos restantes terrenos expropriados ou o mesmo respeita apenas às despesas com a urbanização dos terrenos dos Exequentes?

Resposta - O valor das despesas indicadas pela Câmara Municipal da Batalha corresponde à urbanização de todas parcelas objeto de expropriação, ou seja, todas as parcelas de terreno situadas dentro do limite da Célula B (Sectores A, B e C).

11º

Quanto ao Sector C:

a) Que espaços existem nos lotes 4 e 5 que não estão ocupados com a implantação das construções - isto é, a que utilização estão afetos esses espaços e qual a sua área?

b) Que parte desses espaços está inserida na parcela expropriada - qual a sua área?

Resposta - Com base nos elementos disponíveis, a visita ao local e as medições efetuadas, os peritos informam o seguinte:

a) Os espaços existentes nos lotes 4 e 5 que não estão ocupados com a implantação das edificações, em termos de configuração e utilização, correspondem a passeios, zonas de estacionamento, acessos aos edifícios e logradouros destes últimos. A respetiva área é de 1.184,30 m2.

b) A área total dos espaços referenciados na alínea anterior, provenientes da Parcela 14, é de 756,05 m2.

12°

No tocante às despesas referenciadas pelo Município da Batalha (de ambos os Sectores C e B):

a) Pela sua natureza e destinação ou função que assumem, quais as despesas em infraestruturas que podem dizer-se imprescindíveis à urbanização do solo para a construção urbana destinada a habitação/comércio e serviços - isto é, para a constituição dos lotes urbanos?

b) Pela sua natureza, destinação e inserção urbana (considerando determinantemente que se situam os Paços do Concelho), quais as infraestruturas e equipamentos que detêm função social e de interesse público coletivo ou geral (de todos os Munícipes)? Devendo especificar-se, de entre as diversas infraestruturas e equipamentos quais o que se subsumem a cada uma dessas situações e qual o seu valor - a) ou b)?

Resposta - Os Quadros a que os peritos tiveram acesso, que constam do processo judicial, e designadamente os já referenciados nas respostas a Quesitos anteriores (ver ANEXOS IV, V e VI), não habilitam os peritos a elaborar uma resposta com o rigor indispensável, (em especial no que diz respeito ao que é solicitado na alínea b) do Quesito), já que a descrição de uma boa parte das despesas está enunciada de forma genérica e não está agregada nem por sectores nem por especialidades. Ainda assim, e procurando colaborar com o Tribunal, podem referir o seguinte:

a) As despesas em infraestruturação urbanística para urbanização do solo são as relativas à construção dos arruamentos, faixas de rodagem e passeios, redes públicas de abastecimento de água, de esgotos de águas residuais e pluviais, de energia elétrica (incluindo iluminação pública), telefones e gás, além dos arranjos exteriores de espaços livres residuais.

b) Podem considerar-se englobadas nesta alínea do Quesito, uma percentagem das despesas relativas aos estudos urbanísticos/plano de urbanização, a percentagem das infraestruturas urbanísticas para serviço do edifício dos Paços do Município e outros equipamentos públicos que foram construídos e espaços exteriores envolventes, (incluindo estacionamento público de apoio), o parque verde adjacente ao Rio Lena e seus equipamentos de estar, lazer e recreio, (incluindo estacionamento de apoio).

Como referiram acima, com a informação disponível não é possível determinar os valores das despesas relativas às alíneas a) e b).

Leiria, 18 de março de 2019

Os Peritos (três assinaturas manuscritas) (…)” — cfr. fls. 1158 a 1278 (relatório - fls. 1244-1255) dos presentes autos de execução, V-50 (1438/03.7BALSB-C), processo físico.

S. A diligência de audiência de conciliação sugerida pelos Exequentes em 03.06.2019 (1045/Sitaf) e reiterada em 03.03.2020 (1143/Sitaf) “para dilucidar a questão das despesas a descontar” foi objecto de desistência expressa e pedido de prolação de decisão por requerimento de 25.03.2020 (1161/Sitaf), prolação de decisão reiterada nos requerimentos de 15.09.2021 (1209/Sitaf) e 24.06.2022 (1230/Sitaf), dando-se aqui por integralmente reproduzidos os respetivos conteúdos - cfr. V-5° dos presentes autos de execução (143 8/03.7BALSB-C), processo físico».


*

III. B – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

8. O Recorrente “MP” começa por assacar ao Acórdão recorrido vício de nulidade ao ter condenado o “Estado” sem que este, como tal, tivesse tido qualquer intervenção processual, quer na fase pré-executiva, quer na presente ação executiva, não tendo para o efeito alguma vez sido citado na pessoa do seu legal representante em juízo, o Ministério Público.

Quanto a esta parte, alega o Recorrente que (cfr. conclusões II, III e IV das suas alegações):

«(…) o douto Acórdão recorrido enferma de nulidade ao estabelecer a condenação do Estado através do Ministério competente, como devedor solidário nos termos indicados, isto sem que o mesmo “quae tale” tivesse tido intervenção como parte processual, ou seja, sem que tivesse sido citado ou notificado por qualquer forma, e na pessoa do seu legal representante em juízo, o Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal, para intervir no processo, designadamente para contradizer a pretensão formulada em juízo pelos Exequentes.

Sucede ainda que, e em função da natureza do processo, o de execução de julgado anulatório, o Estado sempre careceria de legitimidade processual (passiva) para intervir na lide por não ter sido parte no meio processual pré-executivo, no recurso contencioso de anulação, e nem na subsequente execução de julgado do Acórdão do Pleno deste Tribunal, com data de 20.01.2011, que confirmara o Acórdão de 10.09.2009, pelo qual fora anulado o despacho ministerial com data de 11.04.2003, que indeferira o pedido de reversão apresentado pelos Exequentes na data de 14.02.1994.

E não fora também parte no incidente subsequente ao Acórdão proferido na presente instância, na data de 17.01.2013, pelo qual foi declarada a existência de causa legítima de inexecução da decisão anulatória, e determinada a notificação das partes nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 178º, nº 1, do CPTA, com a consequente modificação objetiva da instância».

No despacho que admitiu o presente recurso, foi emitida, nos termos do art. 145º nº 1 do CPTA, pronúncia sobre a arguição desta nulidade, considerando-a improcedente, já que resultaria claro do Acórdão – e, relevantemente do seu segmento decisório – que não se condenou (solidariamente com o “Município da Batalha”) a pessoa jurídica coletiva “Estado”, mas sim o “Estado-Administração, através do Ministério competente”. Aí se referiu, designadamente (cfr. fls. 1356 e segs. SITAF):

«(…) quando no segmento decisório do acórdão recorrido se determina o regime da solidariedade no cumprimento da obrigação indemnizatória entre o Município da Batalha “(…) e o Estado através do Ministério competente segundo a orgânica governativa por reporte competencial referente à emissão da DUP/18.03.1980 (...)”, a expressão “Estado através do Ministério competente” é usada no sentido de Estado-Administração, isto é, reportado ao quadro legal que regula o desempenho da função administrativa pelo próprio Estado respeitante à administração estadual direta dirigida pelo Governo.

Exatamente por isso no segmento decisório sob a alínea b. do acórdão sob recurso se faz referência expressa ao Ministério que, nos temos da lei orgânica do Governo Constitucional atualmente em exercício de funções, tenha sucedido no complexo de atribuições do ministério dirigido pelo Ministro da Habitação e Obras Públicas que emitiu a DUP/18.03.1980 (al. A do probatório).

Departamento ministerial que, no tocante ao despacho de indeferimento de 11.04.2003 da reversão pedida em 14.02.1994 pelos ora Exequentes, era naquela data dirigido pelo Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, coadjuvado pelo secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa (als. E e F do probatório).

Em conclusão, no segmento decisório sob a al. b. do acórdão sob recurso o regime da solidariedade quanto à indemnização arbitrada é estabelecido entre (i) a Administração central do Estado, o que inclui o Governo na sua condição de órgão administrativo, concretizado no Ministério competente segundo a Lei Orgânica do Governo Constitucional em exercício de funções, o que significa que a pessoa coletiva de direito público Estado é aqui aplicada no sentido funcional de Estado-Administração, e (ii) a Administração autónoma territorial, as autarquias locais (municípios e freguesias), concretizada no Município da Batalha».

Julgamos que, na lógica desta pronúncia, não procede a nulidade invocada, já que resulta inequívoco do Acórdão recorrido que não foi a pessoa jurídica coletiva de direito público “Estado Português” alvo de condenação (em termos solidários com o “Município da Batalha”), mas sim o “Ministério” – departamento governamental a que se refere o nº 2 do art. 10º do CPTA – concretamente, o Ministério competente, segundo a atual orgânica governativa, por reporte à emissão da DUP/18.03.1980.

Assim, não tendo sido alvo de condenação a pessoa jurídica “Estado”, não tinha esta que ter, enquanto tal, intervenção no processo – seja na fase declarativa seja na fase executiva, incluindo nos inerentes incidentes -, como na realidade não teve, pelo que também não teria que ser citado, como não foi, na pessoa do “Ministério Público”, seu representante legal em juízo.

Sendo certo que o Ministério Público representa o “Estado”, como bem refere o Recorrente, mas não representa o “Ministério” condenado.

Desta forma, uma vez que se nos afigura resultar claro e inequívoco que, ao lado do “Município da Batalha”, foi o Departamento governamental “Ministério” o condenado a indemnizar os Autores e não o “Estado” enquanto pessoa jurídica coletiva representado em juízo pelo Ministério Público, improcede a arguida nulidade.

9. Alega, também, o Recorrente “MP” que o Acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento de direito ao condenar o “Estado, através do Ministério competente”, solidariamente com o “Município da Batalha”, a indemnizar os Autores pela inexecução do julgado anulatório, em vez de condenar exclusivamente o “Município da Batalha”, por ter sido este o único responsável pela impossibilidade de execução desse julgado anulatório.

Para tanto, expõe o Recorrente que (cfr. conclusões X e XI das suas alegações):

«(…) será de considerar que foi o Município da Batalha que inviabilizou a reversão pedida pelos Exequentes, isto porque deu um fim diverso ao prédio expropriado relativamente ao que presidira à Declaração de Utilidade Pública, ao proceder à implementação de uma operação urbanística e à venda para o mercado privado de vários lotes, o que foi concretizado pelas escrituras públicas outorgadas nas datas de 05.04.1990, 19.02.1992 e 21.08.1992, ou seja, no momento em que os Exequentes requereram a reversão do prédio expropriado, a 14.02.1994, ela já era então impossível, por impossibilidade objetiva, porque o prédio que fora expropriado inexistia física e juridicamente.

Ou seja, o que inviabilizou a reversão da expropriação não foi o despacho com data de 22.10.1995, da autoria do Ministro do Planeamento e da Administração do Território, pelo qual foi arquivado o pedido de reversão, e nem também o posterior despacho com data de 11.04.2003, da autoria do Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, que indeferiu aquele pedido e que foi posteriormente anulado em sede contenciosa pelo Acórdão do STA, com data de 27.10.2004, com fundamento no efetivo desvio do fim público que presidira à expropriação».

Isto é, o Recorrente argumenta que, embora estejamos perante uma execução de julgado anulatório dos despachos de 22/10/95 e de 11/4/2003 (que indeferiram a reversão pedida pelos Autores), os quais foram anulados, com fundamento na sua ilegalidade, por Acórdãos deste STA (Pleno), respetivamente, de 22/3/2000 (facto provado E) e de 20/1/2011 (facto provado H), a impossibilidade de execução - reconhecida pelo Acórdão deste STA de 17/1/2013, que declarou a existência de causa legítima de inexecução da reversão (facto provado K) – se ficou a dever, exclusivamente, ao “Município da Batalha”, por ter alienado ilicitamente os terrenos em causa (entre 1990 e 1992), antes do pedido de reversão apresentado pelos Autores (em 14/2/1994) e antes do proferimento dos consequentes despachos de indeferimento (em 1995 e em 2003), contenciosamente anulados por ilegalidade.

A questão colocada pelo Recorrente, no presente recurso, é pois a de saber se, estando perante uma execução de julgado de dois despachos contenciosamente anulados, com fundamento em ilegalidade, a indemnização a atribuir aos Autores pela legítima inexecução desses julgados, deve ser paga pelos responsáveis por tais despachos anulados, solidariamente com o “Município da Batalha” (que alienou os terrenos que já não foi possível reverter aos Autores) - como julgou o Acórdão recorrido -, ou se, diversamente, devia ter sido condenado a esse pagamento exclusivamente o “Município” – como alega o Recorrente -, por ter sido apenas este que, ao alienar ilicitamente os terrenos, causou a impossibilidade objetiva da reversão desses terrenos, fazendo-o, aliás, em momentos anteriores (em 1990/1992) ao do próprio pedido de reversão (em 1994) e do proferimento dos dois despachos de indeferimento (em 1995 e em 2003), contenciosamente anulados.

Vejamos.

O Acórdão recorrido fundamentou da seguinte forma a condenação solidária do “Ministério competente” e o “Município da Batalha”:

«(…) a) impossibilidade de executar - imputabilidade

No caso presente, a impossibilidade de executar o direito de reversão pela situação ilegal que se gerou e que entretanto se tornou impossível remover, é imputável a ambas as entidades públicas, a saber,

(i) a entidade beneficiária da expropriação (designada no CE por entidade expropriante), o Município da Batalha, atenta a ilegítima disposição da Parcela 14 para fim diverso do interesse e utilidade pública expressos na DUP/l8.03.1980 que presidiu à expropriação, fim diverso traduzido na venda para o mercado privado da construção por deliberações camarárias de 29.11.1989, 07.11.1991 e 13.02.1992 e escrituras públicas de 05.04.1990, 19.02.1992 e 21.08.1992 - vd. alínea D do probatório.

(ii) a entidade titular do poder expropriativo, no caso, o Estado através do Ministério competente para a emissão da DUP/18.03.1980, à data o Ministério da Habitação e Obras Públicas e que nas orgânicas governativas subsequentes tomou a designação de Ministério do Planeamento e da Administração do Território relativamente ao despacho de arquivamento de 22.10.95 e de Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente relativamente ao despacho de indeferimento de 11.04.2003, ambos por reporte ao pedido de reversão de 14.02.1994 (cfr. art°s. 14° n° 1 e 74° CE/99) e anulados por acórdãos do STA de 22.03.2000 e 20.01.2011 (Pleno) - vd. alíneas A, E, F, G e H do probatório, na exata medida em que o Município interveio autonomamente por atos administrativos de 1989, 1991 e 1992 na conformação da situação antijurídica de desvio do fim de interesse e utilidade pública da expropriação da Parcela 14 e o Ministério ao recusar a reversão requerida em 1994 mediante decisões de autoridade de 1995 (arquivamento) e 2003 (indeferimento) deu assentimento jurídico ao desvio do fim expropriatório e, simultaneamente, fundamento jurídico à materialização e consolidação das modificações fundiárias e vocacionais introduzidas na Parcela 14 posteriormente à data da expropriação, v.g. com as operações urbanísticas de edificação nos lotes vendidos ao mercado privado da construção e aquisição, por terceiros de boa-fé, do direito de propriedade das frações em propriedade horizontal».

E, coerentemente, decidiu, a final, o Acórdão recorrido:

«Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Conselheiros da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo em:

a. fixar a indemnização devida aos Exequentes pelo facto de inexecução do acórdão do STA de 20.01.2011 in proc° n° 1438/03-11, fls. 943-958 e subsequente convolação assente em causa legítima de inexecução declarada nos presentes autos de execução por acórdão do STA de 17.01.2013 a fls. 312-315 dos presentes autos, no montante de 473.035,57 euros (quatrocentos e setenta e três mil e trinta e cinco euros e cinquenta e sete cêntimos);

b. determinar que no cumprimento unitário da obrigação indemnizatória devida pelo facto da inexecução do efeito repristinatório (art° 166° CPTA) são devedores solidários o Município da Batalha e o Estado através do Ministério competente segundo a orgânica governativa por reporte competencial referente à emissão da DUP/18.03.1980, nos termos expostos».

Entendemos que, contrariamente ao alegado no presente recurso, este julgamento do Acórdão recorrido, no que se refere à condenação solidária do “Ministério competente” e o “Município da Batalha”, está correto.

Trata-se de uma condenação solidária no pagamento de indemnização devida por inexecução legítima de julgado anulatório, a qual, como bem refere o Recorrente, e bem se explicita no Acórdão recorrido, difere de indemnização devida pelos danos causados pela prática de ato ilícito, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual.

Como se diz no Acórdão recorrido:

«(…) Cabe pois, distinguir neste domínio, entre a “indemnização devida pelo facto da inexecução” e aquela que se destine a reparar os eventuais danos causados pela atuação ilegal da Administração que sempre ficariam por reparar, ainda que não se tivesse verificado a ocorrência de causa legítima de inexecução, doutrina e jurisprudência uniformes, afirmada no acórdão do STA de 04.02.2021, in proc° 47693/01.8BALSB-A em sede de indemnização por causa legítima de inexecução repristinatória de anulação da DUP».

«(…) Regime legal donde se extraem duas consequências.

Primeira, que a indemnização consagrada no art° 166° ex vi 178° CPTA se cinge ao facto da inexecução dos efeitos repristinatórios da sentença anulatória, ou seja, ao facto da inexecução da remoção da situação ilegal constituída.

(i) pelas deliberações de 29.11.1989, 07.11.1991 e 13.02.1992 do Município da Batalha de venda ao mercado privado da construção por escrituras públicas de 05.04.1990, 21.08.92 e 19.02.1992, bem como,

(ii) pela persistência de manutenção dessa situação ilegal pelos despachos ministeriais, a saber, o despacho de arquivamento de 22.10.1995 do Ministério da Habitação e Obras Públicas e o despacho de indeferimento de 11.04.2003 do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, ambos em decisão do pedido de reversão de 14.02.1994 dos Exequentes, atos administrativos anulados por acórdãos do STA de 22.03.2000 e 20.01.2011 (Pleno) — vd. alíneas A, D, E, F, G e H do probatório».

10. Ora, a argumentação do Recorrente, de que o “Município” deve ser o único condenado por, a seu ver, resultar dos factos provados ter sido ele o único culpado na alienação dos terrenos em questão, ainda antes dos despachos ilegais anulados, parece-nos mostrar-se demasiado simplista, não elaborando um devido enquadramento dos factos provados e das responsabilidades assacáveis quer à Administração Central quer ao Município da Batalha, como melhor fez o Acórdão recorrido.

10.1. Desde logo, não podemos olvidar que nos encontramos em fase executiva de julgados anulatórios que, declarativamente, julgaram ilegais, e anularam, dois despachos da Administração Central que indeferiram - ilicitamente – o pedido de reversão formulado pelos Autores, ora Exequentes.

E que, posteriormente, por Acórdão deste STA de 17/1/2013 (facto provado K), foi judicialmente declarada a verificação de causa legítima de inexecução e ordenada a notificação das partes – Exequentes, Executado (Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa) e Contrainteressado (Município da Batalha) – para acordarem no montante da indemnização devida pelo facto dessa inexecução, nos termos do art. 178º nº 1 do CPTA.

E esta decisão judicial define, por si, os implicados no cumprimento indemnizatório sucedâneo da execução, não efetivada, do julgado anulatório (referente aos dois despachos da Administração Central tidos por ilegais e por isso anulados): os Exequentes enquanto credores e o Executado e o Contrainteressado enquanto devedores.

Aliás, foi dentro desta lógica e segundo este pressuposto que o Executado (Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa) e o Contrainteressado (Município da Batalha) foram já condenados, solidariamente, por Acórdão deste STA (Pleno) de 5/11/2020, em apenso de providência cautelar, a pagarem aos Exequentes “a quantia de 100.000,00 € (cem mil euros), a título de reparação provisória pela inexecução do direito que lhe foi reconhecido na ação principal à reversão dos bens que lhes foram expropriados”.

E, não havendo acordo, como “in casu” não houve, quanto à quantia indemnizatória final, deve seguir-se a tramitação prevista no art. 166º do CPTA – isto é, a fixação judicial do montante da indemnização devida, após eventual realização de diligências instrutórias que se considerem necessárias para tal fim (cfr. arts. 178º nº 2 e 166º nº 2 do CPTA).

Foi, rigorosamente, o cumprido pelo Acórdão recorrido.

10.2. Mas ainda que assim não fosse – ou seja, ainda que se olvidasse a posição da Administração Central (Secretário de Estado) como parte Executada, na sequência da sua Autoria dos dois despachos ilegais anulados, em julgados que se pretendem executar, ainda que por sucedâneo indemnizatório -, não teria razão o Recorrente quando retira dos factos provados uma “responsabilidade” exclusiva do Contrainteressado (“Município da Batalha”) que devesse levar à sua exclusiva condenação, em desresponsabilização do Executado (“Ministério”).

É que a causa legítima de inexecução foi judicialmente verificada e declarada em 2013, como já vimos (por Acórdão deste STA de 17/1/2013). Isto significa, em rigor, que esta declaração judicial de existência de causa legítima de inexecução se refere, como é lógico, a 17/1/2013 – pois é nesse momento que foi judicialmente declarado que «(…) como alega a Entidade Executada e decorre do probatório, essa parcela já não existe - nem física nem juridicamente». Conclusão que ali decorreu das posições das partes, nomeadamente de que «por ofício de 26/05/2011, a Secretaria de Estado da Administração Local comunicou aos Exequentes que não iriam executar a referida decisão por ocorrer causa legítima de inexecução, uma vez que a parcela expropriada já não existia».

Mas tal não significa que, em 1994/1995, aquando do pedido de reversão ou do primeiro despacho de indeferimento, julgado ilegal e anulado – ou, sequer, aquando do segundo despacho de indeferimento, em 2003 (também julgado ilegal e anulado) -, se verificasse já impossibilidade de reversão, acaso a Administração Central tivesse atuado legalmente (deferindo a reversão, em 1994/95, como devia ter feito, em vez de ilegalmente a ter indeferido).

É que o simples facto de o Município da Batalha ter alienado até 1992 os terrenos em questão, por contrato de compra e venda a particulares, não significa que tal fosse já irreversível em 1994/95, isto é, que a reversão aos Autores fosse já impossível nesta data, nada em contrário resultando provado dos autos.

Toda a alegação do Recorrente parte do pressuposto de que, uma vez transferida para terceiros a propriedade dos terrenos, teria, “ipso facto”, ficado inviabilizada a reversão dos mesmos para os Autores, aqui Exequentes. Mas não é assim, como este STA tem repetidamente decidido:

«A simples transmissão do prédio expropriado a terceiro não constitui causa legítima de inexecução da sentença que anulou o indeferimento do pedido de reversão” – Ac.STA de 11/4/2002, proc. 37646A.

No mesmo sentido, o Ac.STA (Pleno) de 19/1/2000, proc. 037646:

«As transmissões do imóvel (…) não podem ser opostas ao expropriado em vista da efetivação do direito de reversão».

Neste se explicitando:

«(…) não tendo a autoridade requerida que assegurar a colaboração de quem quer que seja para materializar física ou juridicamente a transferência do prédio para o domínio do requerente da reversão - designadamente do expropriante ou do detentor atual do bem expropriado, seja o próprio Estado, qualquer outra pessoa coletiva pública, ou uma pessoa jurídica de direito privado -, do mesmo modo que não o teria se se tratasse de um pedido de declaração de utilidade pública de expropriação, não procede a questão da impossibilidade da execução nos termos em que a autoridade recorrida a coloca, que é a de não deter poderes que lhe assegurem a disponibilidade sobre a coisa, em termos de fazê-la regressar ao património das requerentes.

O prédio continua a existir como objeto possível de direito de propriedade privada e não ocorreu nova declaração de utilidade pública da expropriação (…) pelo que não há impossibilidade, física ou jurídica, de execução da sentença anulatória.

Aliás, a questão de saber se a transmissão do prédio a terceiro impede ou extingue o direito de reversão foi suscitada pela recorrida particular no recurso contencioso e encontra-se já decidido em sentido negativo no acórdão recorrido. Só poderia relevar nesta fase se a evicção do atual proprietário materializasse ou fosse suscetível de gerar grave lesão do interesse público. O que não foi invocado (…)».

Ainda no mesmo sentido, o Ac.STA de 12/12/2002, proc. 30230A:

«(…) se o ato impugnado foi anulado por, indevidamente, se ter indeferido o pedido de reversão (…) então, haverá de praticar-se um novo ato, a notificar aos interessados e a publicar nos termos legais, que aprecie o pedido de reversão formulado no pressuposto de que tal direito existe efetivamente na esfera jurídica das requerentes e de que a transferência da propriedade dos bens expropriados para terceiro não constitui qualquer óbice».

Assim, de acordo com esta jurisprudência firme deste STA, só quando o prédio deixa de “continuar a existir como objeto possível de direito de propriedade privado” é que se tem de considerar impossibilitada a sua reversão, o que, no caso dos presentes autos, foi judicialmente verificado pelo Ac.STA de 17/1/2013, mas não antes – não em 2003, e não, seguramente, em 1994/1995, no seguimento do pedido de reversão formulado pelos Autores, que deveria ter sido, então, deferido pela Administração (em vez de ilegalmente indeferido, como julgado).

Nestes termos, contrariamente ao alegado pelo Recorrente, a corresponsabilidade da Administração Central no dever de indemnização pela impossibilidade de execução do julgado anulatório afigura-se manifesta.

10.3. Acresce que, se não fora por tudo o antecedentemente explanado, e ainda que a impossibilidade de execução se tivesse verificado logo em 1994, aquando do pedido de reversão formulado pelos Autores, aqui Exequentes (o que não resulta comprovado dos autos, como se disse), sempre a corresponsabilização da Administração Central se fundamentaria na sua responsabilidade pela manutenção da ilícita situação de omissão de compensação sucedânea (por indemnização) aos Autores lesados, o que não ocorreria caso a Administração Central tivesse reconhecido, logo em 1994/95 o direito dos mesmos à reversão (ou ao seu sucedâneo), o que, ilegalmente, não fez.

Como, a este propósito, bem se nota no Acórdão recorrido, referentemente à fundamentação da corresponsabilização do “Ministério”:

«(…) (ii) pela persistência de manutenção dessa situação ilegal pelos despachos ministeriais, a saber, o despacho de arquivamento de 22.10.1995 do Ministério da Habitação e Obras Públicas e o despacho de indeferimento de 11.04.2003 do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, ambos em decisão do pedido de reversão de 14.02.1994 dos Exequentes, atos administrativos anulados por acórdãos do STA de 22.03.2000 e 20.01.2011 (Pleno) – vd. alíneas A, D, E, F, G e H do probatório».

E como explica Mário Aroso de Almeida in “A anulação de atos administrativos no contexto das relações jurídico-administrativas”, Almedina, 2021, a pág.749, o dever de indemnizar como um sucedâneo da execução da sentença anulatória (da tutela primária) cumpre-se «realizando uma prestação destinada a compensar o prejuízo que para o impugnante representa a existência e manutenção da situação ilegalmente constituída (ou mantida) pelo ato anulado» (sublinhados nossos).

11. Face a tudo o exposto, improcede a arguição de erro de julgamento de direito assacado, no presente recurso, ao Acórdão recorrido.


*

IV - DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, em formação Plena, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em:

- Negar provimento ao recurso jurisdicionalsub specie” deduzido pelo Recorrente “Ministério Público (MP)”, mantendo-se o acórdão recorrido.

Sem custas, atenta a isenção prevista no art. 4º nº 1 a) do RCP.

D.N.

Lisboa, 23 de fevereiro de 2023 – Adriano Fraxenet de Chuquere Gonçalves da Cunha (relator) - Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa - José Francisco Fonseca da Paz - Ana Paula Soares Leite Martins Portela - Maria do Céu Dias Rosa das Neves - Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva - Cláudio Ramos Monteiro.