Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 02202/04.1BEPRT 01404/17 |
Data do Acordão: | 10/09/2019 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | NUNO BASTOS |
Descritores: | IRS MÉTODOS INDIRECTOS NOTIFICAÇÃO CONTABILIDADE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS HERANÇA INDIVISA |
Sumário: | I - No âmbito do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, em caso de falecimento do seu titular e na falta de partilha, são contitulares dos rendimentos dos bens a transmitir os seus sucessores, segundo a sua quota ideal nos referidos bens – artigo 64.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares; II - Na falta ou atraso da execução da contabilidade ou na escrituração dos livros de registo, devem ser notificados para a sua regularização ou apresentação no procedimento inspetivo os referidos contitulares, devendo a notificação ser feita preferencialmente na pessoa do contitular a quem pertença a respetiva administração; III - Não pode considerar-se regularmente efetuada a notificação mediante contacto pessoal com responsável pela contabilidade do estabelecimento, se não foi remetida carta registada com aviso de receção para a morada fiscal dos sucessores do falecido e não se comprova que estes tomaram conhecimento atempado do seu teor. |
Nº Convencional: | JSTA000P25005 |
Nº do Documento: | SA22019100902202/04 |
Data de Entrada: | 02/13/2017 |
Recorrente: | AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA |
Recorrido 1: | REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA E OUTROS |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. Relatório 1.1. O Representante da Fazenda Pública recorre da sentença proferida pela Mm.ª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou totalmente procedente a impugnação judicial da decisão proferida no recurso hierárquico da decisão que indeferiu a reclamação graciosa das liquidações de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares n.º 5323804726, relativa ao período de 1997, no valor de € 112.044,87, e n.º 5323805578, relativa ao período de 1998, no valor de € 8.334,19, e, além do mais, anulou estas liquidações. Impugnação esta que tinha sido deduzida por A……., N.I.F………., com domicílio indicado da Rua……, …., …., em Vila Nova de Gaia, e esposa B……., N.I.F………., com o mesmo domicílio. O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. Notificada da sua admissão, apresentou alegações, que rematou com as seguintes conclusões: «(…) A. A sentença recorrida considera que o impugnante não foi regularmente notificado da oportunidade legalmente prevista no artigo 38.º, n.º 3 e 4 do CIRS, considerando que a Administração Fiscal não podia ter efectuado a notificação do Técnico Oficial de Contas, nos termos dos art. 41.º, n.º 2 do CPPT e 40.º do RCPIT. B. Ora nos termos do art. 41.º n.º 2 do CPPT, aplicável ao caso em concreto, a lei admite que a notificação se possa fazer na pessoa de um qualquer empregado e, no caso concreto, quem recebeu a notificação e assinou a certidão de notificação foi o responsável pela contabilidade que foi encarregado de acompanhar e fornecer todos os elementos e servir de contacto entre a AT e a impugnante, que teve também a função de receber e dar seguimento às notificação da AT. C. Assim nunca poderiam ser exigidas as diligências constantes do art. 38.º n.º 3 e 4, na pessoa de um representante da herança indivisa, conforme sentença recorrida, uma vez que a entidade inspeccionada nunca forneceu à AT os elementos necessários para o efeito. D. No cumprimento da Ordem de Serviço n.º 27246, de 17/04/2000 os Serviço de Inspecção da Direcção de Finanças de Aveiro, efectuaram um procedimento inspectivo a actividade referida supra - "C…….. (Herdeiros)ʺ - NIPC………, sendo que a ordem de serviço foi assinada por D…….., na qualidade de TOC. E. E, para efeitos dos art. 77.º e 78.º do CIVA, do art. 38.º e 125.º do CIRS e 35.º de seguintes do CPPT, foi notificada a "C…….., Herdeiros" na pessoa de D………, na qualidade de Técnico Oficial de Contas. F. Embora o impugnante defenda que não foi cumprido o disposto no artigo 41.º, n.º 2 do CPPT, por não ter sido efectuada na pessoa de um administrador, a lei admite que a notificação possa ser realizada na pessoa de qualquer empregado e, além disso, a entidade inspeccionada indicou à administração tributária o responsável pela contabilidade D………. para os contactos, esclarecimentos e fornecimento de elementos, relativos à acção inspectiva a realizar. G. Assim, atendendo à factualidade constante dos autos, a administração tributária foi induzida pela própria entidade inspecionada, senão por ela, por quem fisicamente se encontrava na sua sede social e ao seu serviço, na convicção de que D………. se encontrava ao serviço da mesma, desempenhando tarefas como sendo o ponto de contacto com a empresa, e que, portanto, se tratava de um empregado com capacidade pessoal e funcional para receber e transmitir a notificação em causa. H. Para a AT estávamos perante uma entidade a inspecionar, cuja actividade comercial era exercida por uma empresa, que se fez representar desde a assinatura da ordem de serviço pelo seu Técnico Oficial de Contas, sem que fossem fornecidos dados que permitissem identificar os titulares ou representantes da entidade inspecionada. I. Assim nunca poderiam ser exigidas as diligências constantes do art. 38.º, n.º 3 e 4, sem que se recorresse ao regime previsto no artigo 41.º do CPPT. J. No caso em concreto e em cumprimento do art. 40.º do RCPIT e 41.º do CPPT, a Autoridade Tributária e Aduaneira, cumpriu todas as formalidades da notificação exigidas para a notificação em causa, considerando-se efectuada a notificação da impugnante na pessoa do seu TOC, não tendo sido alegado em momento algum que aquela não chegou ao seu conhecimento através de quem, mandatado para o efeito, acompanhava a acção inspectiva e fornecia todos os elementos e servia de contacto entre a AT e a impugnante. K. Face ao normativo legal e factos provados, há que considerar, assim errado o julgamento da sentença recorrida, na parte em que "...não tendo sido dada ao sujeito passivo inspecionado, na pessoa que o representa, a cabeça de casal, a oportunidade legalmente prevista no artigo 38.º, n.º 3 e 4 do CIRS e artigo 88.º, alínea c) da LGT, para regularizar a contabilidade daquele, .../...foi preterida formalidade legal essencial à avaliação indireta da matéria coletável, determinante da anulação das consequentes liquidações adicionais de IRS ..." L. O erro da sentença recorrida decorre da aplicação errada do direito, à análise dos factos provados e contextualização do procedimento inspectivo, exigindo por um lado o cumprimento do art. 38.º, n.º 3 e 4 do CIRS, sem que se permitisse à AT lançar mão da possibilidade conferida pelo n.º 2 do art. 41.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário». Concluiu dizendo que deve ser concedido provimento ao recurso e pedindo a revogação da douta sentença recorrida, com as legais consequências. A Recorrida não apresentou contra-alegações.
1.2. Recebidos os autos neste tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público. A Ex.ma Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, que sumariamos do seguinte modo: a) Não tendo sido posta em causa a ilação da julgadora de que a atividade era exercida em nome de uma herança indivisa – e não de uma alegada “sociedade Irregular” – e não sendo uma herança indivisa uma pessoa coletiva ou sociedade, não pode considerar-se violado o artigo 41.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário; b) Não tendo sido dado como provado que o cabeça-de-casal do sujeito passivo, designou o seu Técnico Oficial de Contas como seu representante no procedimento, não pode a notificação deste para a apresentação da contabilidade organizada considerar-se efetuada em nome do sujeito passivo; c) Não tendo sido concedida ao sujeito passivo a possibilidade de suprir a lacuna da inexistência e irregularidades dos elementos de contabilidade, foi preterida uma formalidade legal essencial, em ordem à avaliação indireta da matéria coletável, que importa a anulação das consequentes liquidações adicionais, aqui impugnadas. Concluiu dizendo que deve ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e deve ser mantida inteiramente a sentença recorrida. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. ◇ 2. Do objeto do recurso e das questões a decidir O recurso abrange apenas a parte da sentença recorrida que apreciou a questão de saber se se foi – ou não – dada ao sujeito passivo inspecionado a oportunidade de organizar e regularizar a sua contabilidade. E se, em consequência, foi – ou não – preterida formalidade legal essencial na avaliação indireta da matéria tributável, determinante da sua anulação. A questão fundamental que vem colocada no recurso é a de saber se o sujeito passivo foi devidamente notificado para suprimento da inexistência ou insuficiência dos elementos da sua contabilidade. ◇ 3. Dos fundamentos de facto Foi o seguinte o julgamento de facto em primeira instância: «1. Em 22/04/1974, perante o Cartório Notarial do concelho de Penacova, foi outorgado documento denominado "Escritura de Trespasse", entre …….., ……… e…………., em representação da sociedade "………., Limitada", como primeira outorgante, e……….., ………e C………, como segundo outorgantes, no qual a primeira outorgante declarou, como dali se extrai, "(...) ser dona e legitima possuidora dum estabelecimento comercial de restaurante, café e actividades afins, instalado em prédio urbano (...) que esse estabelecimento o trespassam, em nome da sociedade que representam, para os segundos outorgantes - que dele ficam proprietários, em comum e partes iguais (...)” e que pelos segundos foi dito "(...) que aceitam o presente trespasse (…)", mais constando que "(...) o prédio onde fica instalado o estabelecimento objecto do presente trespasse fica situado no lugar de ........., freguesia de Barcouço, concelho da Mealhada (...)" - cfr. cópia da escritura pública junta como Doc. n.º 1 da petição inicial, de fls. 19 a 26 do processo físico. 2. Em 28/01/1980, perante o Cartório Notarial do concelho de Penacova, foi outorgado documento denominado "Escritura de Trespasse de metade de estabelecimento comercial”, entre ………. e C…….., em nome próprio e como procurador de………., como primeiros outorgantes, e ………. e ………., como segundos outorgantes, no qual os primeiros outorgantes declararam, como dali se extrai "(...) - Que lhes pertence, em comum e em partes iguais, o estabelecimento comercial de restaurante, café e actividades afins, conhecido por "E……….", instalado no prédio urbano sito no lugar de ........., freguesia de Barcouço, concelho de Mealhada (...) que pela presente escritura trespassam para os segundos outorgantes, que adquirem em partes iguais, metade desse estabelecimento (...)", e onde os segundos disseram "(...) que aceitam o exarado trespasse de metade do indicado estabelecimento (...)" - cfr. cópia da escritura pública junta como Doc. n.º 2 da petição inicial, de fls. 27 a 31 do processo físico. 3. O estabelecimento a que se refere em 1) e 2), para efeitos fiscais, era explorado em nome de C………., coletado para o efeito - facto admitido (cfr. ponto 10) da petição inicial). 4. Em 28/07/1988, faleceu C……., deixando como herdeiras, seu cônjuge, F…………., com quem era casado em regime de comunhão geral de bens, e sua filha, B…….., aqui Impugnante mulher - cfr. termo de declaração de óbito datada de 12/08/1988 exarado no Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 1, constante de fls. 198 a 200, do processo de Reclamação Graciosa anexo aos presentes autos. 5. Em 04/10/1988, compareceu no serviço de finanças de Vila Nova de Gaia 1, na qualidade de cabeça de casal, F……….., identificada no ponto que antecede, onde no âmbito do processo de liquidação de imposto sucessório com o n.º 36297, instaurado por óbito de C………., apresentou a relação de bens por este deixados, fazendo constar entre outros, como verba n.º 3, o "Direito e acção a um sexto de um estabelecimento comercial de Restaurante, café e actividades afins, conhecido por "E…….", instalado no prédio urbano sito no Lugar de ........., freguesia de Barcouço, concelho de Mealhada" - cfr. relação de bens anexa ao termo de apresentação, constante de fls. 201 a 208 verso, do processo de Reclamação Graciosa anexo aos presentes autos. 6. Após O falecimento de C………… a que se alude em 4), a atividade comercial para a qual se encontrava coletado, continuou a ser exercida em nome da herança indivisa, a que foi atribuído o n.º de identificação fiscal…………, com o CAE 55301 - restaurantes do tipo tradicional, cujo restaurante explorado tem como designação comercial "E……….." - cfr. capítulo" do relatório de inspeção tributária, a fls. 26 do Processo Administrativo apenso aos autos e facto admitido (cfr. artigo 11) da petição inicial. 7. Em 05/05/1997, perante o Primeiro Cartório Notarial de Coimbra, foi outorgado documento denominado "Constituição de Sociedade", entre ……, F…….. e ……. em representação de……….., no qual, entre si, constituíram uma sociedade comercial por quotas designada "E……… - Sociedade Hoteleira, Limitada", com sede em ........., freguesia de Barcouço, concelho de Mealhada - cfr. cópia da escritura pública junta como Doc. n.º 3 da petição inicial, de fls. 32 a 38 do processo físico. 8. Em 02/02/1998, em nome da sociedade a que se alude no ponto que antecede, foi apresentada no serviço de finanças da Mealhada, declaração de início de atividade reportado à data, como ali se indicou, de 01/02/1998 - cfr. cópia do rosto da declaração constante de fls. 184 do processo de Reclamação Graciosa anexo aos presentes autos. 9. Em 22/04/1998, os aqui Impugnantes apresentaram junto da Direção de Finanças de Coimbra, declaração de substituição de rendimentos - modelo 3, relativa ao ano de 1997, onde fizeram constar do anexo C1, relativo a imputação de rendimentos de transparência fiscal/herança indivisa, no campo adstrito a "rendimento imputado proveniente de herança indivisa”; O lucro fiscal imputável à titular do rendimento, aqui Impugnante mulher, no montante de 503.279$00 - cfr. cópia da declaração de fls. 185 a 187 do processo de Reclamação Graciosa anexo aos presentes autos. 10. Em 26/04/1999, os aqui Impugnantes apresentaram junto da Direção de Finanças de Coimbra, declaração de substituição de rendimentos - modelo 3, relativa ao ano de 1998, onde fizeram constar do anexo C1, relativo a imputação de rendimentos de transparência fiscal/herança indivisa, no campo adstrito a "rendimento imputado proveniente de herança indivisa", O prejuízo fiscal imputável à titular do rendimento, aqui Impugnante mulher, no montante de (56.244$00) - cfr. cópia da declaração de fls. 189 a 191 do processo de Reclamação Graciosa anexo aos presentes autos. 11. No cumprimento da Ordem de Serviço n.º 27246, de 17/04/2000, os Serviços da Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Aveiro, desencadearam procedimento inspetivo à atividade prosseguida pela Herança Indivisa de C…….., denominada, "C……… (Herdeiros)", com o NIPC:……….., no âmbito do IRS e IVA, com incidência sobre os exercícios de 1997 e 1998 - cfr. relatório de inspeção tributária, de fls. 22 a 140 do Processo Administrativo apenso aos autos. 12. A ordem de Serviço n.º 27246 a que se alude no ponto que antecede, encontra-se assinada por "D………..", na qualidade de "TOC …….", com indicação da data de 27/10/2000 - cfr. cópia da ordem de serviço constante de fls. 108 do processo físico. 13. Em 02/11/2000, foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Aveiro, documento denominado "Notificação", que se encontra assinado pelo "notificado" "D………" e pelo "funcionário" "………..", do qual se extrai, entre o demais o seguinte: "(...) Para efeitos do disposto nos artigos 77.º e 78.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e n.º 3 e 4 do artigo 38.º e 125.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e nos termos dos artigos 35.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, eu ……….., Inspector Tributário (...) tendo presente o disposto no n.º 4 do artigo 36.º do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não aduaneiras, notifico, hoje, (...) C……, Herdeiros, NIF…….., com sede em ......... - Barcouço - Mealhada, na pessoa de D………, na qualidade de Técnico Oficial de Contas (...) para no dia 30/11/2000 (trinta), pelas 9.30horas, apresentar na sua sede, os elementos que de seguida se apresentam, os quais resultam do facto de o empresário ter realizado um volume de negócios nos três exercícios que antecederam o ano de 1996 (1993 a 1995), cuja média é superior a 30.000 contos: contabilidade organizada de acordo com as normas reguladas pelos artigos 28.º e 44.º, ambos do Código do IVA, artigos 109.º e 133.º, ambos do Código do IRS e artigo 98.º do Código do IRC, para os exercícios de 1996, 1997 e 1998. (...) Não dando cumprimento ao disposto na presente notificação, tal acto será considerado como "recusa de entrega, exibição ou apresentação de escrita", ficando sujeito à aplicação de métodos indirectos (...)" - cfr. Anexo 1 do relatório de inspeção tributária, constante de fls. 62 do Processo Administrativo apenso aos autos. 14. Em 30/11/2000, foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Aveiro, "Auto de Declarações", nas instalações de "C………, Herdeiros", sitas em ......... - Barcouço - Mealhada, o qual se encontra assinado pelo "representante do contribuinte" "D………." e pelo "funcionário" "………..': e onde consta, entre o demais o seguinte: "(...) eu, …………, com a categoria de Inspector Tributário, no exercício das minhas funções (...) ouvimos em "Auto de Declarações perante a entidade que em representação do contribuinte, na qualidade de Técnico Oficial de Contas, a seguir se identifica: (Nome) D………." (...) 1 - Depois de ter sido notificado em 2/11/00 para apresentara contabilidade organizada da entidade acima identificada, confirma que não a efectuou? - Confirmo. Apesar de assumir que a contabilidade não está elaborada de acordo com os métodos que a levam a considerar como organizada, mas sim não organizada, não tive oportunidade (tempo) no período que me foi concedido para proceder à regularização legalmente exigida. (...) " - cfr. Anexo 2 do relatório de inspeção tributária, constante de fls. 63 a 65, do Processo Administrativo apenso aos autos. 15. Em 12/12/2000, foi expedido via postal por carta registada, o ofício n.º 8314269 datado de 11/12/2000 da Direção de Finanças de Aveiro, dirigido a "C……., Herdeiros - ......... - Barcouço - 3050 Mealhada", dando conta do prazo de 15 dias para querendo, exercer o direito de audição prévia sobre o projeto de conclusões do relatório de inspeção elaborado no âmbito da Ordem de Serviço n.º 27246, a que se alude em 11) - cfr. cópia do ofício e registo postal constante de fls. 109 e 110 do processo físico. 16. Em 08/01/2001, na sequência do procedimento inspetivo referido em 11), foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária, relatório de inspeção tributária, onde foram efetuadas correções, com recurso a métodos indiretos, à matéria tributável em sede de IRS dos exercícios de 1997 e 1998 de "C……., Herdeiros", no montante de 59.169.012$00 (€295.133,79) e 6.878.708$00 (€34.310,85), respetivamente, a ser, como se extrai do parecer incidente sobre as correções propostas que mereceu despacho de concordância pelo Chefe de Divisão, "confirma-se a aplicação dos métodos indiretos, bem como a quantificação, que conduziu às seguintes propostas de correcção: *IRS (matéria tributável) 66.047.721$00 (...) repartido pelos contitulares da herança indivisa: F……… (75%) e B………… (25%)." - cfr. fls. relatório de inspeção tributária, de fls. 32 a 49 do Processo Administrativo apenso aos autos. 17. A correção referida no ponto que antecede, resultou da seguinte fundamentação inclusa no relatório, que dali se extrai:
Na verdade, concluiu-se que o sujeito passivo tinha organizado os elementos da sua actividade nos termos do artigo 111.º do Código do IRS, isto é, dispunha dos livros de escrita de comerciantes e industriais a que se refere o artigo 50.º do Código do IVA. (...) nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 109.º do Código do IRS, são obrigados a possuir contabilidade organizada nos termos da lei comercial (...) "os sujeitos passivos que exerçam qualquer actividade comercial, industrial ou agrícola e que na média dos últimos três anos, hajam realizado um volume de negócios superior a 30.000 contos". De seguida apresenta-se o volume de negócios declarado desde 1993 até 1996 (...) Nos termos expostos, sendo-lhe aplicável o artigo 98.º do CIRC, o sujeito passivo deveria organizar a sua contabilidade (...) obedecendo às regras de normalização contabilística estabelecidas pelo Plano oficial de Contabilidade (...). Com efeito, fomos levados a concluir que os elementos contabilísticos do sujeito passivo não se encontram organizados (...) o que significa que a execução da mesma se encontra atrasada, sendo esta infracção enquadrada no disposto no n.º 1 do artigo 36.º do RJIFNA. Em consequência, e ao abrigo do n.º 4 daquele artigo 36.º, o sujeito passivo foi notificado em 2 de Novembro de 2000 (fotocópia da notificação em anexo 1) para regularizar a escrita, tendo-lhe sido concedidos 28 dias. Na data limite fixada na notificação, constatou-se que o sujeito passivo não supriu a falta que tinha sido verificada na sua contabilidade, facto que foi confirmado em auto de declarações (anexo 2). Com efeito, a infracção praticada passou a ser considerada como recusa de entrega, exibição ou apresentação de escrita e de documentos fiscalmente relevantes (...) Assim, a recusa de exibição da contabilidade dos livros de registo e demais documentos legalmente exigidos, implica, desde logo, a determinação do lucro tributável por métodos indiretos para efeitos de IRS. IV.1. AVALIAÇÃO ECONÓMICA DA EMPRESA Em resultado da deficiente informação contabilística fornecida pelo sujeito passivo, temos que a avaliação económica e financeira que se poderá fazer, se encontra condicionada à escassez dos elementos que foi possível recolher. (...) IV. 2.2. Rentabilidade Fiscal das Vendas Agora, importa fazer uma breve apresentação do volume de negócios, resultado fiscal e rentabilidade fiscal das vendas no período 1993 a 1998 (Janeiro). Assim temos: (...) IV. 2.3. Conclusões Gerais (...) Apesar de pouco aprofundada, a apreciação económica e financeira dos elementos contabilísticos do sujeito passivo, importava analisar os factos que teriam justificado a evolução descrita para os factos de 1997 e de 1998 (...). Não nos foi possível avaliar alguns indicadores pelo facto de o sujeito passivo não nos ter apresentado as peças contabilísticas a que estava legalmente obrigado, limitando objectivamente a avaliação e o controlo que poderíamos efectuar se munidos desses elementos. (...) IV. 4. ABORDAGEM AOS APUROS Note-se que, independentemente da natureza dos apuros, eles deviam estar apoiados em documentos adequados, (...) De acordo com a análise efectuada não foi possível observar que existem vendas a dinheiro emitidas, relativamente às quais não existe qualquer registo nos apuros diários. (...) Note-se que apesar de se admitir empiricamente que qualquer destes argumentos pudesse avalizar alguns dos valores apontados como irregularmente relevados na contabilidade, estamos em crer que não isentaria a totalidade (...) Sobre esta matéria, tem os que a forma com o as operações são relevadas não permitem o controlo claro e inequívoco do apuramento do resultado fiscal. Um outro factor que representa um desvio relativamente às disposições fiscais, nomeadamente ao n.º 2 do artigo 46.º do Código do IVA, prende-se com o facto de os registos deverem constituir um elemento com indicação inequívoca de um único total diário (...). IV. 5. ABORDAGEM AOS REGISTOS MONETÁRIOS - CAIXA E BANCOS Mais uma vez, em resultado da organização contabilística ilegitimamente adoptada pelo sujeito passivo, temos a nossa capacidade de análise condicionada aos elementos disponibilizados. Na verdade, o tipo de registos efectuados pelo sujeito passivo não incluiu qualquer referência a operações monetárias-caixa e bancos. IV. 6. ABORDAGEM AO NÍVEL DOS INVENTÁRIOS Ao nível dos inventários (anexo 47), foi ainda possível verificar diversos indícios que revelam falta de rigor na sua elaboração: (...) Podemos concluir que os inventários apresentados pelo sujeito passivo enfermam de falta de consistência e objectividade de produtos, com as respectivas quantidades e valores, pelo que constituem um factor impeditivo do correcto apuramento do resultado da actividade da empresa para efeitos de tributação (...) (...) IV. 9. CONCLUSÃO Temos então que no seguimento dos procedimentos de inspecção se verificaram irregularidades na organização ou execução da contabilidade, erros e inexactidões na contabilização das operações e indícios fundados de que a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido. Em função das irregularidades, inexactidões e erros que acabaram de se apresentar, torna-se evidente que não é viável a determinação da matéria tributável, proporcionada pelas irregularidades, inexactidões e erros descritos, nos termos da alínea c) do artigo 88.º da LGT. Estão, pois, reunidos os pressupostos estabelecidos pelas alíneas b) e c) do artigo 87.º da Lei Geral Tributária (LGT) para que a determinação da matéria tributável possa ser efectuada através da avaliação indirecta. De acordo com os factos expostos, temos ainda que, por se verificarem os pressupostos previstos nas alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 75.º da LGT, as declarações apresentadas pelo contribuinte não se presumem verdadeiras e de boa-fé. Assim, verificados erros e inexactidões no registo das operações ou indícios seguros de que a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 51.º do Código do IRC, por remissão do artigo 38.º do Código do IRS, propõe-se a determinação da matéria tributável por recurso à aplicação de métodos indirectos, uma vez que não se mostra possível a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável (n.º 2 do artigo 51.º do Código do IRC), relativamente aos exercícios de 1997 e de 1998. (...) V. CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRECTOS (...) V.6 APRESENTAÇÃO DOS VALORES APURADOS Em anexo 13 apresenta-se um mapa que resume o apuramento que resultou da análise efectuada. Donde se obtêm correcções ao resultado fiscal com efeitos em sede de IRS, no montante de: • Em 1997 - 59.169.012$00 • Em 1998 - 6.878.708$00 Estes valores serão repartidos pelos contitulares da herança indivisa de acordo com o mapa que se apresenta de seguida: Os factos relevados em IRS com recurso a métodos indirectos, nos termos da alínea a) do n.º 1 e n.º 3 do artigo 51.º e 52.º do Código do Imposto sobre o rendimento das pessoas Colectivas, por remissão do artigo 38° do Código do IRS, pressupõem uma infração aos artigos 17.º e 20.º do mesmo Código, sendo que esta infracção está prevista e punível nos termos do artigo 34.º do Regime Jurídico das Infracções Não Aduaneiras. (...) VIII. DIREITO DE AUDIÇÃO-FUNDAMENTAÇÃO O sujeito passivo não exerceu o direito de audição previsto no artigo 60.º da lei Geral Tributária e no artigo 60.º do regime Complementar do Procedimento de Inspecção tributária, depois de ter sido notificado para o efeito em 15 de Dezembro de 2000, através do ofício n.º 8344269 de 11 de Dezembro (...)" - cfr. fls. relatório de inspeção tributária, de fls. 32 a 49 do Processo Administrativo apenso aos autos. 18. Em resultado das correções aritméticas efetuadas em sede de IRS a "C………, Herdeiros", descritas no ponto que antecede, foi emitida pelo Diretor Distrital de Finanças do Porto, por delegação, "Nota de Fixação/Alteração" dos rendimentos líquidos em sede de IRS, referente ao ano de 1997 e aos sujeitos passivos A……. (Sujeito Passivo A) e B……….. (Sujeito Passivo B), onde consta o apuramento dos rendimentos brutos da categoria B pelo sujeito passivo B no montante de €15.295.282$00, e a fixação do conjunto dos rendimentos líquidos do agregado no montante total de 24.502.716$00 - cfr. Doc. de fls. 194 e 194 verso, do Processo de Reclamação Graciosa junto aos autos. 19. Em resultado das correções aritméticas efetuadas em sede de IRS a "C………., Herdeiros", descritas no ponto 17), foi emitida pelo Diretor Distrital de Finanças do Porto, por delegação, "Nota de Fixação/Alteração" dos rendimentos líquidos em sede de IRS, referente ao ano de 1998 e aos sujeitos passivos A……. (Sujeito Passivo A) e B…………… (Sujeito Passivo B), onde consta o apuramento dos rendimentos brutos da categoria B pelo sujeito passivo B no montante de €1.663.653$00, e a fixação do conjunto dos rendimentos líquidos do agregado no montante total de 11.788.888$00 - cfr. Doc. de fls. 195 e 195 verso, do Processo de Reclamação Graciosa junto aos autos. 20. Em 17/08/2001, foi expedido via carta registada com aviso de receção, pelo Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 4, o ofício n.º 4892, dirigido aos aqui impugnantes, cujo aviso de receção se mostra assinado por terceira pessoa em 21/08/2001, do qual consta, entre o demais, o seguinte: “(...) Assunto: NOTIFICAÇÃO DAS FIXAÇÕES - cfr. cópia do oficio e aviso de receção, de fls. 196 e 197, do Processo de Reclamação Graciosa junto aos autos. 21. Na sequência dos atos de alteração de rendimentos líquidos de IRS resultantes das correções efetuadas, a que se alude nos pontos 17) a 20), foram em 08/11/2001, emitidas as liquidações adicionais de IRS relativas aos anos de 1997 e 1998, em nome dos aqui Impugnantes, com os n.ºs 5323804726 e 5323805578, no montante a pagar de 7.317.396$00 (€36.499,02) e 64.282$00 (€3.263,54), respetivamente - cfr. cópias das liquidações, de fls. 5 e 6 do processo de Reclamação Graciosa anexo aos presentes autos. 22. Em 18/03/2002, foi autuado pelo Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 4, o processo de execução fiscal (PEF) com o n.º 3964200201004050, em que são executados os aqui Impugnantes, para cobrança coerciva do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) relativas aos anos de 1997 e 1998, resultante das liquidações a que se alude em 21) - cfr. fls. 1 a 3 da cópia certificada do processo de execução fiscal apenso aos presentes autos. 23. Em 26/03/2002, contra as liquidações de IRS referidas em 21), foi apresentada pelos Impugnantes reclamação graciosa - cfr. fls. 1 do processo de reclamação graciosa apenso aos presentes autos. 24. Remetida citação no âmbito do PEF, dirigida ao executado A………, aqui Impugnante marido, mostra-se o aviso de receção assinado por terceiro em 17/04/2002 - cfr. fls. 3-A da cópia certificada do processo de execução fiscal apenso aos presentes autos. 25. Em 13/05/2002, o aqui Impugnante marido, dirigiu requerimento ao chefe do serviço de finanças de Vila Nova de Gaia 4 no âmbito do PEF referido em 22), solicitando na sequência da sua citação para pagamento do IRS em dívida, a suspensão da execução por ter deduzido reclamação graciosa, oferecendo para garantia da dívida exequenda a penhora de uma fração autónoma do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Mafamude, concelho de Vila Nova de Gaia, sob o artigo n.º 5694-H - cfr. Doc. de fls. 4 da cópia certificada do processo de execução fiscal apenso aos presentes autos. 26. Em 02/10/2002, no âmbito do PEF referido em 22), foi pelo serviço de finanças de Vila Nova de Gaia 4, efetuada a penhora do bem imóvel identificado em 25), com a elaboração do competente "Auto de Penhora" e respetivo registo na Conservatória do Registo Predial - cfr. Docs. de fls. 12 a 26 da cópia certificada do processo de execução fiscal apenso aos presentes autos. 27. Em 12/03/2004, foi proferido despacho de projeto de indeferimento da reclamação graciosa a que se alude em 23) e determinada a notificação dos reclamantes, aqui Impugnantes, para o exercício do direito de audição prévia, expedido via postal para o domicílio daqueles pelo ofício n.º 1283 de 19/03/2004, cujo aviso de receção se encontra assinado em 23/03/2004, tendo os mesmos exercido o respetivo direito de audição - cfr. Docs. de fls. 105 a 111 do Processo de Reclamação Graciosa apenso aos autos. 28. Em 19/05/2004, na sequência da decisão de indeferimento da reclamação graciosa a que se alude em 23), datada de 13/04/2004, os aqui Impugnantes apresentaram recurso hierárquico, o qual foi indeferido por despacho de 18/08/2004, remetido via postal ao Impugnante marido pelo ofício n.º 4222 de 22/09/2004, cujo aviso de receção se mostra assinado em 27/09/2004 - cfr. Processo de Recurso Hierárquico apenso aos autos. 29. Em 13/10/2004, foi apresentada no Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 4, a petição inicial que deu origem aos presentes autos após remessa a este Tribunal em 25/10/2004, sendo que a mesma apenas foi liminarmente admitida por despacho de 15/02/2008 - cfr. fls. 1 a 44 do processo físico. 30. Em 12/01/2005, foram aplicados, via compensação de créditos, no PEF referido em 22), para pagamento das dívidas em causa, o reembolso do IRS dos executados dos anos de 2001 e 2002, no montante de € 4.564,27 - cfr. fls. 27 a 34 da cópia certificada do processo de execução fiscal apenso aos presentes autos. 31. Por despacho de 30/01/2006, foi designada a data da venda do prédio penhorado em 02/10/2002 a que se alude em 26) e ordenada a convocação dos credores, com a consequente notificação destes e dos executados - cfr. fls. 36 a 41 da cópia certificada do processo de execução fiscal apenso aos presentes autos. 32. Em 27/03/2006, na sequência de requerimento apresentado pelo Impugnante marido no sentido de avaliação da suspensão dos autos de execução face à penhora do imóvel e a pendência de impugnação judicial que corre termos contra as liquidações em dívida no PEF, foi por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 4, determinada a suspensão dos autos de execução fiscal a que alude em 22), face à garantia do imóvel penhorado, até decisão da presente impugnação - cfr. Docs. de fls. 43 a 45 da cópia certificada do processo de execução fiscal apenso aos presentes autos. * * Inexistem quaisquer factos relevantes para a decisão a proferir que se tenham considerado não provados. (…)». ◇ 4. Do Direito 4.1. Vem o presente recurso interposto da sentença da Mm.ª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou totalmente procedente a impugnação das liquidações de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares supra identificadas por o sujeito passivo não ter sido devidamente notificado para suprir o atraso na execução da sua contabilidade antes de se ter recorrido a métodos indiretos. Com o assim decidido não se conforma o Recorrente, por entender, desde logo, que foram cumpridas as formalidades previstas na lei para a notificação do sujeito passivo para este efeito. E que, no seu entendimento, derivam do artigo 41.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, conjugado com o artigo 40.º, do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de dezembro [diploma a que, doravante, aludiremos com o acrónimo “RCPIT”]. Para a resolução desta questão importa responder a três problemas: o primeiro problema é o de saber quem é o sujeito passivo no procedimento em causa; o segundo é o de saber qual a lei aplicável à notificação do sujeito passivo no procedimento em causa; o terceiro é o de saber se foram, no caso, cumpridas as formalidades da notificação do sujeito passivo no procedimento em causa. Comecemos, então, pelo primeiro problema: o de saber qual é o sujeito passivo no procedimento em causa. Que, de acordo com a factualidade dada como provada, é o procedimento de inspeção tributária realizado a coberto da ordem de serviço n.º 27.246, de 17/04/2000, com o código PNAIT 221.43 e que tinha por objetivo a análise da escrita referente à atividade prosseguida no estabelecimento comercial “E………” em 1997 e em janeiro de 1998. No relatório de inspeção tributária foi identificado como titular dos rendimentos «C………. (Herdeiros)», N.I.P.C………... Rendimentos que, todavia, foram imputados a F………, N.I.F. …….. e a B……….., N.I.F………., na qualidade de herdeiros de na proporção de 75% para a primeira e de 25% para a segunda. Proporção que corresponde às respetivas quotas ideais na herança. A referida entidade [« C……….(Herdeiros)», N.I.P.C ………] seria, por isso, a herança indivisa (como tal se entendendo a herança aceite e ainda não partilhada) aberta por óbito de C……….. Sendo que, nestes casos, eram contitulares dos rendimentos os próprios herdeiros de acordo com a respetiva quota ideal, face ao que dispunham os artigos 18.º e 64.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, na redação então em vigor. Ou seja, eram estes os (verdadeiros) sujeitos passivos do imposto. E o cumprimento das obrigações acessórias, como a obrigação de escrituração dos livros de registo e de possuir contabilidade organizada também cabia a estes contitulares, visto que tais atribuições recaíam, nos termos do Código, sobre os sujeitos passivos do imposto. Mais concretamente, a obrigação de apresentar os elementos contabilísticos exigidos nos termos da lei incumbia ao titular a quem pertencia a administração da herança, como derivava, então, do artigo 57.º, n.º 2, do mesmo Código. E era, de resto, também o este o entendimento seguido pela Administração Tributária no ofício circulado n.º 16/89, de 25 de setembro, relativo ao «tratamento em imposto sobre o rendimento das heranças indivisas». Onde ficou consignado que, tratando-se de categorias C ou D, «[c]umpre ao cabeça-de-casal ou administrador contitular da herança indivisa apresentar, na sua declaração anual de rendimentos, ainda que em anexo autónomo, a demonstração dos lucros ou prejuízos apurados no património comum, identificado os restantes contitulares e a respetiva quota-parte nesses mesmos lucros ou prejuízos». Sublinhe-se que o cabeça-de-casal ou administrador da herança assumia essa incumbência em nome próprio (e não em representação da herança), como derivava do facto de estar obrigado a apresentar dos elementos contabilísticos na sua própria declaração de rendimentos. É certo que, nos termos da Portaria n.º 19/99, de 14 de janeiro, se consignou também que o administrador ou cabeça-de-casal de herança indivisa que produza rendimento das categorias C e ou D, ao apresentar o anexo I, devia também indicar no quadro 4, campo 04, o número de equiparado a pessoal coletiva atribuído pelo Ministério da Justiça à herança indivisa. Tratava-se, em todo o caso, de uma informação destinada a identificar o património contitulado e não os titulares do rendimento. Ora, os sujeitos passivos titulares dos rendimentos tributados são também os sujeitos passivos do procedimento tributário respetivo. É o que deriva do artigo 65.º da Lei Geral Tributária. Ou seja – e respondendo agora ao primeiro problema supra identificado – os sujeitos passivos eram, para os efeitos do procedimento de inspeção tributária em causa, F………., N.I.F. ………. e a B………., N.I.F………...
4.2. Analisemos agora o segundo problema: o de saber qual a lei aplicável à notificação do sujeito passivo no procedimento em causa. Adiantamos desde já que a regra que dispõe sobre a obrigatoriedade da notificação do sujeito passivo para regularização da sua situação tributária antes de se proceder à determinação da matéria tributável por métodos indiretos tem natureza substantiva [assumindo a «natureza essencialmente substantiva» das regras que consagram os pressupostos do recurso à avaliação indireta, ver João Sérgio Ribeiro, in «Tributação Presuntiva do Rendimento…», Almedina 2010, págs. 201 e 203]. Porque se trata de uma regra que, embora integrada no âmbito de um procedimento de determinação da matéria tributável e na medida em que dispõe sobre um pressuposto da tributação por métodos indiretos, concorre diretamente para a definição do quantum da obrigação tributária e, neste sentido, constitui o desenvolvimento de uma norma de incidência tributária ou uma norma de incidência «em sentido amplo» [ver Ana Paula Dourado, in «Direito Fiscal – Lições», Almedina 2016, pág., 139]. Assim sendo, tendo em conta que estava em causa o dever do sujeito passivo de organizar a sua escrita e apresentar os elementos da sua contabilidade referentes a 1997 e janeiro de 1998, era aplicável ao caso a regra correspondente que vigorava à data do facto tributário (solução que agora consagra expressamente o artigo 12.º, n.º 4, da Lei Geral Tributária). Ou seja, era aplicável ao caso o artigo 38.º, n.º 3, do CIRS, na redação anterior à que lhe foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de novembro. Este dispositivo densificava um dos pressupostos da «aplicação de métodos indiciários» (a falta de colaboração do contribuinte) quando fosse integrada pelo atraso na execução da contabilidade ou na escrituração dos livros de registo, ou ainda pela não exibição imediata de uns ou de outros. Ao impor que essa falta de colaboração fosse confirmada dentro do próprio procedimento, através da fixação de um prazo para a execução ou apresentação desses elementos. Pelo seu lado, a regra que dispõe sobre as formalidades da notificação do sujeito passivo para regularização da sua situação tributária no procedimento tributário tem natureza adjetiva. Porque tem como função principal formatar a atividade administrativa no procedimento, impor-lhe as formalidades que o legislador considera adequadas a assegurar as suas finalidades e a salvaguardar as garantias dos contribuintes nesse procedimento. Assim sendo, tendo em conta que estava em causa um procedimento de inspeção externa que decorreu em 2000, eram-lhe aplicáveis as normas sobre procedimento e processo vigentes nessa altura (solução que dimana do artigo 12.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária). Ou seja, eram aplicáveis as regras das notificações inseridas nos artigos 37.º e seguintes do RCPIT. Poderia contrapor-se que à notificação em causa não seriam aplicáveis estas regras, por não se tratar de uma notificação efetuada para os efeitos deste diploma, mas perante uma notificação ordenada pelo CIRS e para os efeitos previstos neste Código. Sendo que este diploma também contém regras procedimentais, nomeadamente regras relativas à forma das notificações, como o artigo 139.º do CIRS (na redação de então que era a anterior à que lhe foi introduzida pela Lei n.º 17/2001). Mas é de notar que também são reguladas pelo RCPIT as notificações ordenadas por outras leis fiscais quando tenham em vista o cumprimento pelo sujeito passivo do seu dever de colaboração e este deva ser realizado no procedimento de inspeção tributária. É o que resulta da parte final do n.º 1 do seu artigo 37.º [neste sentido, Martins Alfaro, in «Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária Comentado e Anotado», Áreas Editora 2003, pág. 301, 4.º cometário]. Era o caso: a notificação para execução da contabilidade e sua apresentação foi efetuada no âmbito do procedimento de inspeção tributária e, consequentemente, o dever correspondente de cooperação dos sujeitos passivos com a Administração Tributária deveria ser também concretizado no próprio procedimento de inspeção, a coberto dos artigos 10.º e 58.º do RCPIT. Quanto às regras relativas às notificações inseridas no Código de Procedimento e de Processo Tributário, deve adiantar-se também que, por terem um âmbito de aplicação genérico (isto é, por serem aplicáveis genericamente aos procedimentos tributários) não se devem sobrepor às normas especiais da notificação no procedimento de inspeção tributária. O que significa que não lhe são diretamente aplicáveis, mas subsidiariamente, a coberto do artigo 4.º, alínea b), do RCPIT. Delimitado o quadro normativo aplicável, importa agora saber se, estando previstas no RCPIT regras diferentes para a notificação de pessoas singulares e para a notificação de pessoas coletivas, deveriam ser aplicadas umas ou outras. A resposta é simples: deviam ser aplicadas as regras previstas para a notificação das pessoas singulares. Pela razão que já acima assinalamos: os sujeitos passivos da relação tributária (e, por conseguinte, também da relação procedimental) eram pessoas singulares. Isso significa desde já que – ao contrário do que pretende o Recorrente – não é aplicável ao caso o disposto no artigo 40.º do RCPIT. Porque este é o dispositivo aplicável à notificação de pessoas coletivas no procedimento de inspeção tributária. E a(s) entidade(s) a notificar para os efeitos sobreditos não era(m) pessoa(s) coletiva(s).
4.3. Passemos ao terceiro e último dos problemas supra identificados: o de saber se foram, no caso, cumpridas as formalidades da notificação do sujeito passivo no procedimento em causa. A resposta é negativa. Porque a notificação para apresentação dos elementos da escrita não foi efetuada na pessoa de nenhum dos sujeitos passivos. No caso, os herdeiros de C……….. Que foram devidamente identificados no próprio procedimento como sendo……….., N.I.F. ………… e a B………, N.I.F…….. Não diz a lei qual dos herdeiros deve ser notificado, quando sejam mais do que um. Mas deriva de regra equivalente instituída para outras situações de comunhão, que a notificação poderia ser feita, em princípio, em qualquer um deles – cfr. o artigo 39.º, alínea b), do RCPIT. No entanto, e tendo em conta que incumbia ab initio ao contitular a quem pertencia a administração da herança apresentar os elementos contabilísticos exigidos nos termos da lei, a notificação deveria ser feita, preferencialmente, na sua pessoa – por interpretação extensiva da regra inserida na alínea c) do mesmo artigo 39.º do RCPIT. E o contacto deveria ter sido feito por carta registada com aviso de receção, porque a notificação para regularização ou apresentação da contabilidade ou da escrituração dos livros de registo equivale à notificação para participação em atos ou diligências, a que alude a parte final do n.º 1 do artigo 38.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário. É verdade que o sujeito passivo deve designar um representante para as relações com a Administração Tributária – artigo 52.º do RCPIT. No entanto, a função deste representante é a de assegurar o cumprimento das obrigações legais que derivam do próprio regulamento, como a de facultar o acesso às instalações ou o de esclarecer as dúvidas suscitadas no âmbito do procedimento de inspeção. E não olvida o dever de entrar em contracto com o sujeito passivo sempre que deva ser convocado para praticar atos ou realizar diligências, como o ato de apresentar os elementos da contabilidade ou escrituração ou as diligências tendentes à sua regularização. Assim, na comunicação a que aludia o artigo 38.º, n.º 3, do CIRS, na redação anterior à alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de novembro, e não se tendo logrado o contacto pessoal com o sujeito passivo, a Administração Tributária deveria ter enviado carta registada com aviso de receção para o seu domicílio fiscal. E deveria tê-lo feito ainda que tivesse entrado em contacto, para o efeito, com algum empregado ou colaborador ou representante designado deste, porque é também o regime prescrito na alínea a) do artigo 39.º do RCPIT. Não foi o que sucedeu no caso: a notificação foi efetuada mediante contacto pessoal com um Técnico Oficial de Contas encontrado nas instalações do estabelecimento comercial, desconhecendo-se se foi indicado como representante ou sequer se esteva presente nas instalações alguma das herdeiras. A este respeito, o Recorrente contrapõe que a entidade inspecionada indicou à Administração Tributária o responsável pela contabilidade para os contactos, esclarecimentos e fornecimento dos elementos, relativos à ação inspetiva a realizar. E que a Administração Tributária foi induzida pela própria entidade inspecionada de que se encontrava ao serviço da mesma, para receber e transmitir a notificação em causa. Mas não se sabe onde a Recorrente se apoia para chegar a tal conclusão. A ordem de serviço foi assinada pelo Técnico Oficial de Contas nessa mesma qualidade e dos autos não consta a sua designação como representante em lado nenhum. Só no auto de declarações, posterior à notificação em causa, é que assina como «representante do contribuinte». E ainda assim, sem que alguma vez isso tivesse sido confirmado pelo imputado representado. E o facto de se encontrar nas instalações a receber a fiscalização não permite concluir que lhe foram atribuídas essas funções, porque o mesmo pode suceder com qualquer empregado ou colaborador que ali se encontre. E, ainda que tal tivesse sucedido, não deveria ter-se dispensado o envio de uma carta registada com aviso de receção para a morada fiscal dos sujeitos passivos, a avisa-los para o cumprimento dos seus deveres e para as consequências da sua inobservância. «A não observância da forma da notificação exigida constituirá uma irregularidade que não afetará o valor da notificação, desde que se comprove que ela foi efetivamente efetuada» [cit. Jorge Lopes de Sousa, in «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», Volume I, Áreas Editora, 6.ª edição 2001, pág. 375] ou que a comunicação foi recebida. Mas essa comprovação não foi efetuada nos autos. Razão porque não pode, no caso, considerar-se efetuada essa notificação. Pelo que não se verifica um dos pressupostos da tributação por métodos indiciários. No caso a comprovação no próprio procedimento da falta de colaboração do sujeito passivo. Procedimento este que, em consequência, deve ser anulado. Pelo que o recurso não merece provimento e a sentença que assim entendeu deve ser confirmada no segmento recorrido, com a presente fundamentação. ◇ 5. Conclusões I. No âmbito do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, em caso de falecimento do seu titular e na falta de partilha, são contitulares dos rendimentos dos bens a transmitir os seus sucessores, segundo a sua quota ideal nos referidos bens – artigo 64.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares; II. Na falta ou atraso da execução da contabilidade ou na escrituração dos livros de registo, devem ser notificados para a sua regularização ou apresentação no procedimento inspetivo os referidos contitulares, devendo a notificação ser feita preferencialmente na pessoa do contitular a quem pertença a respetiva administração; III. Não pode considerar-se regularmente efetuada a notificação mediante contacto pessoal com responsável pela contabilidade do estabelecimento, se não foi remetida carta registada com aviso de receção para a morada fiscal dos sucessores do falecido e não se comprova que estes tomaram conhecimento atempado do seu teor. ◇ 6. Decisão Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Tribunal em negar provimento ao recurso. Custas pelo Recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 9 de outubro de 2019. - Nuno Bastos (relator) – Ascensão Lopes – Isabel Marques da Silva. |