Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:038/23.0BEAVR
Data do Acordão:07/13/2023
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:PRESCRIÇÃO
OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO
Sumário:I - O problema da sucessão de leis no tempo colocado pela entrada em vigor da LGT tem de ser resolvido, em primeiro lugar, através das normas de direito transitório especial (normas da lei nova que disciplinem a sua aplicação no tempo), depois pelas normas de direito transitório sectorial (normas que regulam a aplicação no tempo das leis sobre certa matéria) e, finalmente, pelas normas de direito transitório geral (que definem o modo de aplicação no tempo da generalidade das leis) como é o caso da norma ínsita no artigo 12.º do C.Civil.
II - O diploma que aprovou a LGT (DL 398/98, de 17.12) contém nos seus artigos 3.º e 5.º normas de direito transitório que disciplinam a aplicação no tempo da LGT quanto às matérias aí concretamente especificadas, designadamente no que toca ao prazo de prescrição das obrigações tributárias, dispondo que quanto a este se aplica o preceituado no artigo 297.º do C.Civil.
III - Pelo que, quando se trata de saber qual a lei aplicável ao prazo de prescrição em curso à data da entrada em vigor da LGT, há que convocar, não a regra geral sobre a aplicação da lei no tempo prevista no artigo 12.º do C.Civil, mas a regra plasmada no artigo 297.º do mesmo Código.
IV - Já a sucessão no tempo das demais normas tributárias, designadamente daquelas que disciplinam os restantes aspectos do instituto da prescrição das obrigações tributárias, tem de ser resolvida pela aplicação da regra contida no artigo 12.º da LGT e, subsidiariamente, pela regra geral de direito firmado no nosso sistema jurídico e constante do artigo 12.º do C.Civil, das quais resulta que a lei nova apresenta, em regra, eficácia prospectiva.
V - Pelo que a solução do problema da aplicação da lei no tempo dessas normas tributárias não depende da aplicabilidade do regime do CPT ou da LGT no que concerne à duração do prazo de prescrição, não existindo qualquer regra ou princípio que determine a aplicação em bloco de um ou outro desses regimes, até porque não vigora no âmbito do direito obrigacional tributário o princípio da aplicação da lei mais favorável ao arguido.
VI - Por força daquela regra da aplicação prospectiva da nova lei, as normas tributárias contidas na LGT não se aplicam a factos e efeitos consumados no domínio da lei anterior; mas se essas normas definirem o conteúdo (ou efeitos) de relações jurídico-tributárias duradouras, sem referência ao facto que lhes deu origem, elas vão aplicar-se não só às relações e situações jurídicas que se constituírem após a sua entrada em vigor, como, também, a todas aquelas que, constituídas antes, protelem a sua vida para além do momento da entrada em vigor da nova regra.
VII - As normas da LGT que instituíram causas suspensivas e interruptivas do prazo de prescrição sem correspondência com as previstas na lei antiga (n.º 1 e 3 do art.º 49.º), não dispõem sobre as condições de validade formal ou substancial do facto tributário ou da respectiva obrigação, dispondo apenas sobre o conteúdo de situações jurídicas que, com base naqueles factos, se constituíram. Isto é, essas normas conexionam-se com o direito, sem referência aos factos geradores da obrigação e da respectiva prescrição, pelo que nada obsta à aplicação dessas normas da LGT às situações tributárias que subsistam à data da sua entrada em vigor.
VIII - Assim sendo, a LGT é a própria para determinar e reger os eventos interruptivos e suspensivos que ocorram na sua vigência, ainda que atinentes a prazos prescricionais iniciados na vigência do CPT, sem que isso represente um efeito retroactivo da lei nova ou uma ofensa aos princípios da legalidade e da separação de poderes.
IX - Ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição antes da entrada em vigor da actual redacção do n.º 3 do artigo 49.° da LGT, devem todas elas ser consideradas, desde que ocorram após a cessação do efeito interruptivo das anteriores.
X – In casu, tendo sido assacado à sentença um erro de julgamento de direito por não ter sido decretada a prescrição da dívida tributária, por ter considerado que a redacção do artigo 49º da LGT, introduzida pela Lei nº 53-A de 29/12, não tem aplicação nos presentes autos, devendo antes aplicar-se a lei em vigor ao tempo dos factos tributários, ou seja, a existente em 1995, tal não colhe porquanto, como resulta cristalino do discurso jurídico do aresto sob censura, o julgador não aplicou ao caso em apreço a mencionada redacção dada ao artigo 49º pela Lei 53-A de 29/12, antes a anterior, dada pela Lei n.º 100/99, de 26/07, que introduziu como facto capaz de desencadear a interrupção do prazo de prescrição, a citação.
Nº Convencional:JSTA000P31239
Nº do Documento:SA220230713038/23
Data de Entrada:06/19/2023
Recorrente:AA E OUTROS
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. – Relatório

Foi interposto recurso jurisdicional no Tribunal Central Administrativo Norte por AA, e BB, com os sinais dos autos, visando a revogação da sentença de 22-02-2023, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou totalmente improcedente a reclamação deduzida visando despacho do Chefe de Finanças, que não lhes reconheceu a prescrição da dívida exequenda relativa a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares do ano de 1995, na quantia exequenda de € 39.504,18.

Irresignados, nas suas alegações, formularam os recorrentes AA, e BB, as seguintes conclusões:

1) A Juiz do Tribunal a quo na Douta Sentença de que se recorre, decidiu que o despacho reclamado do órgão de execução fiscal não padece de ilegalidade, pois considera não assistir razão à reclamante quanto à invocada prescrição da divida exequenda, considerando que a dívida exequenda ainda não se encontra prescrita.
2) Ora, a recorrente não pode concordar, de forma alguma, com tal decisão, pois já operou a prescrição, uma vez que o facto tributário respeita ao ano de 1995, pelo que apresenta o presente recurso.
3) Pois, ao contrário do entendimento do Despacho proferido pelo Chefe de Finanças no processo de execução fiscal, e do entendimento da Juiz do Tribunal a quo na Douta Sentença de que se recorre, a prescrição da dívida exequenda objecto dos presentes autos já ocorreu.
4) Efetivamente, a divida objecto dos autos diz respeito a imposto de IRS do ano de 1995.
5) Ora, estamos em Março de 2023, pelo que é notório que a prescrição do imposto do ano de 1995 já ocorreu, pois já passaram 28 anos, quase 30 anos desde a ocorrência do facto tributário.
6) E, o Instituto da prescrição, tem como limite máximo 20 anos, pois a natureza deste instituto não se compadece com prazos ad eternum, pois a certeza, estabilidade e segurança do contribuinte na relação tributária, não se compadece com a cobrança de impostos cujos pressupostos, ou cujo vencimento, se situem em épocas muito remotas.
7) A Jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal Administrativo sustenta, mas só a partir do ano de 2007 (com a alteração introduzida ao art. 49.° da LGT, pela Lei n ° 53-A/2006, de 29/12), que ocorrendo causa de interrupção da prescrição (com a citação), inutiliza-se todo o tempo decorrido anteriormente e recomeça a contagem (do zero) do prazo de prescrição (efeito instantâneo) e, imediatamente, verifica-se também a suspensão da prescrição, até à extinção do processo de execução fiscal (efeito duradouro).
8) Contudo, a dívida fiscal objeto destes autos de execução fiscal respeita ao ano de 1995, pelo que, na lei tributária deve-se sempre aplicar a lei vigente ao tempo do facto tributário.
9) Ora, é notório que o processo executivo fiscal cujo objeto é imposto do ano de 1995 (facto tributário ocorrido em 1995) esteve parado por mais de um ano no Serviço de Finanças por facto não imputável ao executado, até porque conforme se verifica pela tramitação do processo n° ...99, o processo executivo só foi instaurado cinco anos após o facto tributário, designadamente, em 10-04-2000. Sendo certo que, conforme se verifica dos presentes autos de execução, a Impugnação Judicial só foi instaurada 10 anos depois, em 26-07-2005 (factos provados).
10) Pelo que, a Juiz do Tribunal a quo ao afirmar na página 6 da Douta Sentença que: “ Em congruência com a lei vigente ao referido tempo, o prazo e regime de prescrição aplicável era o decorrente do disposto no artigo 34. ° do CPT, ou seja, 10 anos, contado desde o início do ano seguinte, ou seja, desde 01.01.1996 (facto tributário). ”
11) Assim, a Juíza do Tribunal a quo aplica e bem ao caso sub judice a lei vigente ao tempo do facto tributário para a contagem do prazo de prescrição, pelo que por maioria de razão, também deveria ter aplicado a lei ao tempo do facto tributário para a questão da Suspensão e Interrupção da prescrição.
12) Ou seja, a alteração introduzida ao art. 49° da LGT, pela Lei n.° 53-A/2006, de 29/12), que ocorrendo causa de interrupção da prescrição inutiliza-se todo o tempo decorrido anteriormente e recomeça a contagem (do zero) do prazo de prescrição (efeito instantâneo) e, a suspensão da prescrição, até à extinção do processo de execução fiscal {efeito duradouro), não tem aplicação aos presentes autos, pois é norma que entrou em vigor muito posteriormente ao facto tributário (Ano de 1995).
13) Assim, ultrapassado o prazo de prescrição da divida exequenda objeto destes autos, tal quantia exequenda objecto do Processo Executivo N° ...99, referente a imposto do ano de 1995 prescreveu, pois deve- se aplicar o regime da Prescrição vigente ao tempo do facto tributário.
14) Ora, estamos em Março de 2023, pelo que, é notório que já se passaram quase 30 anos desde a ocorrência do facto tributário, pelo que a prescrição do imposto objeto destes autos já ocorreu.
15) Pelo que, incorreu em erro manifesto a Juiz do Tribunal a quo ao aplicar a nova redação da Lei n.° 53-A/2006, de 29/12, ao caso sub judice, considerando assim erradamente que ainda não operou a prescrição de um facto tributário ocorrido em 1995.
16) Reitera-se, a alteração introduzida ao art. 49.° da LGT, pela Lei n.° 53-A/2006, de 29/12), que ocorrendo causa de interrupção da prescrição inutiliza-se todo o tempo decorrido anteriormente e recomeça a contagem (do zero) do prazo de prescrição (efeito instantâneo) e, a suspensão da prescrição, até à extinção do processo de execução fiscal (efeito duradouro), não tem aplicação aos presentes autos, pois é norma que entrou em vigor muito posteriormente ao facto tributário (Ano de 1995).
17) Em Direito Administrativo e Fiscal aplica-se sempre a Lei vigente na data dos factos tributários, pelo que, no caso sub judice, aplica-se a lei ao tempo dos factos tributários, designadamente, a Lei em vigor no Ano de 1995.
18) Mais, é notório que o processo executivo fiscal aqui em causa esteve parado por mais de um ano no Serviço de Finanças de Águeda, conforme se verifica pela tramitação do processo n° ...43 (Pontos 3 a 11 dos factos provados).
19) Pelo que, notoriamente, ocorreu a prescrição da divida exequenda do ano de 1995.
20) Mais, com a nova redação da Lei n° 7/2021, de 26 de Fevereiro (Lei que reforça as garantias dos contribuintes), o regime de prescrição ínsito no artigo 49.° da Lei Geral Tributária não comporta, nem poderá comportar a interpretação da Jurisprudência quanto aos efeitos duradouros da citação previstos no número 1 do artigo 327.° do Código Civil, sob pena de ser contra a lei ( os Tribunais têm de aplicar a Lei e nada podem fazer contra a Lei), com todas consequências gravosas que daí resultam para os contribuintes e, in casu, para os aqui contribuintes, violando-se o princípio da Legalidade e os princípios da certeza e segurança jurídica ínsitos ao princípio do estado de direito consagrado no artigo 2.° da Constituição da República Portuguesa.
21) E, estando a matéria de prescrição sujeita ao princípio da legalidade, não é possível, nesta matéria, lançar mão de interpretações jurisprudenciais que, não tendo qualquer apoio no texto da lei administrativa-tributária, criem efeitos suspensivos ou interruptivos do prazo de prescrição das dividas tributárias, trazidos do direito civil, sem que para eles haja remissão expressa, ou se verifique qualquer lacuna a preencher (artigo 11°, n° 4), tal como resulta do número 2 do artigo 9o do Código Civil, falecendo assim, o entendimento de que a citação, para o processo de execução constitui um facto interruptivo e simultaneamente suspensivo do prazo de prescrição, pois, tal entendimento decorre apenas de um entendimento doutrinal, não tendo qualquer suporte legal, nem aplicação ao caso sub judice, pois o facto tributário remonta ao ano de 1995.
22) Mais, no caso sub judice, já se passaram mais de 28 anos desde a ocorrência do facto tributário, pelo que sendo a prescrição ordinária prevista no Código Civil a estipular um prazo máximo de 20 anos para a Prescrição de uma dívida, é notoriamente patente, que a prescrição no caso sub judice já operou, sendo contra lege, qualquer Decisão do Órgão de Execução Fiscal ou dos Tribunais que não declare dividas exequendas com mais de 28 anos prescritas.
Termos em que, nos melhores de direito, deverá o presente Recurso ser considerado procedente, e em consequência, ser declarada a prescrição, procedendo-se à extinção da execução fiscal N° ...99, por prescrição da dívida exequenda, do ano de 1995, nos termos do artigo 175° do C.P.P.T., com as legais consequências, a bem da JUSTIÇA!

Não foram apresentadas contra-alegações.

Por Decisão Sumária do TCAN ficou decidido declarar-se incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso jurisdicional, para cujos termos declarou competente o Supremo Tribunal Administrativo – Secção do Contencioso Tributário.

Remetidos os autos a este STA, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação:

AA e BB vêem interpor recurso da sentença da Mmª Juiz do TAF de Aveiro que julgou improcedente a reclamação do acto do órgão de execução fiscal, deduzida nos termos do artigo 276º do CPPT.
Os ora recorrentes reclamaram do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Águeda, que lhes que indeferiu o requerimento de reconhecimento da prescrição da dívida tributárias, subjacentes ao processo de execução fiscal n.º ...99.
Invocam, em síntese, que o acto reclamado enferma de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, uma vez que, a dívida exequenda respeitante a IRS do ano de 1995, se encontra prescrita.
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É jurisprudência pacífica que o âmbito do recurso é definido pelas conclusões extraídas pela recorrente das respectivas alegações.
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Alegam, em resumo, que o julgador incorreu em erro de julgamento de direito, ao não julgar prescrita a dívida tributária, por quanto a redacção do artigo 49º da LGT, introduzida pela Lei nº 53-A de 29/12, não tem aplicação nos presentes autos, devendo antes aplicar-se a lei em vigor ao tempo dos factos tributários, ou seja, a existente em 1995.
Tudo como aduzem em sede conclusiva e que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.
Estando em causa um recurso que versa sobre matéria de direito, tal pressupõe que se considere assente e fixada a base factual da sentença.
Importa sindicar se a Mmª Juiz decidiu mal na aplicação do direito às questões a dirimir, supra mencionadas.
A resposta tem de ser negativa.
Como resulta do texto da decisão, o julgador não aplicou ao caso em apreço, a mencionada redacção dada ao artigo 49º pela Lei 53-A de 29/12, antes a anterior, dada pela Lei n.º 100/99, de 26/07, que introduziu como facto capaz de desencadear a interrupção do prazo de prescrição, a citação, pelo que, não colhem os argumentos dos recorrentes neste particular.
No que concerne à lei aplicável em relação à prescrição, á sucessão de leis no tempo e efeitos interruptivos, a sentença, que aqui se dá por reproduzida por todos os efeitos legais, conheceu de tal e pronunciou-se em termos que, em nosso entender, não merecem censura.
Ver, nesse sentido, entre outros, o Ac. do STA de 21/8/2013, no processo 01316/13, in www.dgsi.pt. e sobre a problemática da constitucionalidade, o Ac. N.º 592/2012, de 5/12/2012, do T. Constitucional.
Falecem assim as premissas dos recorrentes, no tocante ao eventual erro de julgamento em matéria de direito, sendo nosso parecer que se deve confirmar a bondade do decidido, atenta a fundamentação expedida, negando-se provimento ao recurso.
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Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos legais atenta a natureza urgente do processo.
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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:
Na sentença recorrida e com interesse para a decisão foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

1. O processo de execução fiscal (PEF) n.º ...99, foi instaurado em 10-04-2000, contra os Reclamantes, para cobrança coerciva da dívida de IRS referente ao ano de 1995, com data limite de pagamento voluntário até 19-01-2000 e na quantia exequenda de € 39.504,18 (cfr. doc. ... da PI e pág. 1 de fls. 24-108 do SITAF);
2. Após a instauração da execução, o executado AA, aqui Reclamante, foi citado pessoalmente por carta registada com aviso de receção, assinado pelo próprio em 18-05-2000, do PEF n.º ...99 (cfr. doc. ... da PI e pág. 5 a 8 de fls. 24-108 do SITAF)
3. Em 31-01-2001, os Reclamantes deduziram a reclamação graciosa n.º ...56, não tendo prestado garantia (cfr. pág. 1, 11-12 de fls. 24-108 do SITAF e fls. 109-112 do SITAF);
4. A 21-11-2001, por ofício com a referência ...97, os Reclamantes foram notificados para prestar garantia para que operasse a suspensão do PEF n.º ...99 (cfr. pág. 15 de fls. 24-108 do SITAF);
5. Em 24-03-2004 foi extraído mandado de penhora, para penhora dos bens necessários para pagamento da quantia de € 57.278,20 em dívida nos presentes autos (cfr. pág. 1, 16-19 de fls. 24-108 do SITAF; fls. 109-112 do SITAF);
6. Em 28-04-2004 o órgão de execução fiscal procedeu à penhora e efetiva apreensão do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia ... sob o art.º ...69 e com o valor patrimonial de € 42.701,08, inscrito em nome do executado, registada na conservatória do Registo Predial de Águeda sob a AP. ...04 (cfr. pág. 20-32 de fls. 24-108 do SITAF);
7. Em 28-05-2004 o órgão de execução fiscal extraiu mandado de penhora, para penhora dos bens necessários para pagamento da quantia de € 19.089,68, em dívida nos presentes autos (cfr. pág. 34-35 de fls. 24-108 do SITAF);
8. Em 27-01-2005 procedeu-se à penhora e efetiva apreensão de uma máquina fresadora para madeira, em razoável estado de conservação, à qual foi atribuído o valor de € 24.000,00 (cfr. pág. 36-37 de fls. 24-108 do SITAF);
9. Em 29-03-2005, foi suspensa a execução até à decisão do processo de reclamação graciosa, considerando que a dívida exequenda foi objeto de reclamação graciosa e que as penhoras efetuadas constituíam garantia bastante para a cobrança da dívida exequenda e acréscimos legais (cfr. pág. 1 e pág. 38-39 de fls. 24-108 do SITAF);
10. A 15-06-2005 a reclamação graciosa n.º ...56, foi indeferida (cfr. pág. 40-42 de fls. 24-108 do SITAF);
11. Em 26-07-2005 foi instaurada a impugnação n.º ...43 (Proc. n.º 1074/05.3BEVIS), cujo trânsito em julgado ocorreu em 17.09.2021 (cfr. pág. 54-59 de fls. 24-108 do SITAF);
12. A 04.11.2022, os Reclamantes requereram que fosse declarada prescrita a dívida exequenda, tendo o seu pedido sido indeferido através do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de 12.12.2022, que lhes foi notificado no dia 15/12/2022 (cfr. pág. 64-85 de fls. 24-108 do SITAF).
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2.2.- Motivação de Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA e 2º, al. e) do CPPT.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pelos recorrentes, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença, a qual julgou totalmente improcedente a reclamação, padece de erro de julgamento, por ter considerado que a dívida não está prescrita, porquanto a alteração introduzida ao art. 49° da LGT, pela Lei n.°53-A/2006, de 29/12, a qual determina que ocorrendo causa de interrupção da prescrição, inutiliza-se todo o tempo decorrido anteriormente e recomeça a contagem (do zero) do prazo de prescrição (efeito instantâneo) e, a suspensão da prescrição, até à extinção do processo de execução fiscal (efeito duradouro), não tem aplicação aos presentes autos, pois é norma que entrou em vigor muito posteriormente ao facto tributário (Ano de 1995).
Como se expende na sentença recorrida, “… em congruência com a lei vigente ao referido tempo, o prazo e regime de prescrição aplicável era o decorrente do disposto no artigo 34.º do CPT, ou seja, 10 anos, contado desde o início do ano seguinte, ou seja, desde 01.01.1996 (facto tributário).
Não obstante, dado que em 01.01.1999 entrou em vigor a LGT (DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro) e com ela a redução do prazo de prescrição para 8 anos (cfr. artigo 48.º, n.º 1 LGT), verifica-se uma sucessão de leis no tempo no que concerne à determinação daquele prazo de prescrição, que torna imperioso o recurso às regras previstas no artigo 297.º, nº 1, do Código Civil, nos termos das quais “a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar. ” (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17.06.2020, proferido no âmbito do processo 0833/14.0BECBR).
Dito de outro modo, e na esteira da jurisprudência pacífica do STA, quando segundo a lei antiga faltar menos tempo do que o estabelecido na lei nova para o prazo se completar, aquela será aplicável; mas se faltar mais tempo para o prazo prescricional se completar, já será de aplicar, aos prazos em curso, o prazo e regime da lei nova, contando-se o prazo apenas a partir da entrada em vigor da nova lei, isto é de 01.01.1999 (entre outros, Acórdão do STA, de 12/11/2009, proferido no processo n.º 0568/09).
Aplicando esta solução ao caso dos autos, isto é, a uma dívida de IRS de 1995, temos que, à data da entrada em vigor da lei nova (em 01.01.1999), já tinham decorrido 3 anos do prazo de prescrição nos termos da lei antiga e faltavam apenas 7 anos para o termo do prazo prescricional, pelo que, faltando menos tempo para o termo da prescrição à luz da lei antiga, releva a aplicação do CPT, isto é, aplica-se o prazo prescricional de 10 anos.
Sendo assim, se nos abstrairmos da ocorrência de eventuais factos suspensivos ou interruptivos, a prescrição desta dívida tributária operaria, em abstrato, a 01.01.2006.
Sucede, porém, que, já na constância da LGT, eclodiram factos.
Nesse conspecto, a sentença recorrida chama a terreiro o acórdão do STA, de 13/01/2010, tirado no proc. n.º 01148/09 e que se apresenta como prototípico da jurisprudência que tem vigorado (e está consolidada) neste STA no que tange a saber se (i) o nosso sistema jurídico permite a aplicação de várias normas compreendidas em diferentes diplomas (lei antiga e a lei nova), nomeadamente de normas que não estavam em vigor à data da verificação do facto gerador de imposto, ou se impõe, antes, a aplicação em bloco de apenas uma dessas leis e se (ii) no caso de sucessão de várias causas interruptivas do prazo de prescrição, todas elas produzem esse efeito sobre o prazo prescricional ou se deve dar-se apenas relevância à que se verificar em primeiro lugar.
Excerta-se o jurídico discurso gizado no indicado aresto na parte que releva para o caso:
“(…)
Comecemos pela análise da primeira questão.
Como se sabe, o problema da sucessão de leis no tempo tem de ser resolvido, em primeiro lugar, através das normas de direito transitório especial (normas da lei nova que disciplinem a sua aplicação no tempo), depois pelas normas de direito transitório sectorial (normas que regulam a aplicação no tempo das leis sobre certa matéria) e, finalmente, pelas normas de direito transitório geral (que definem o modo de aplicação no tempo da generalidade das leis, independentemente da matéria sobre que versam) como é o caso da norma ínsita no artigo 12º do Código Civil.
O diploma que aprovou a Lei Geral Tributária (Dec.Lei n.º 398/98, de 17.12) indica a data da entrada em vigor dessa Lei (art.º 6.º) e contém nos seus artigos 3.º e 5.º algumas normas de direito transitório formal e material que disciplinam a aplicação no tempo da LGT quanto às matérias aí concretamente especificadas, designadamente no que toca ao prazo de prescrição (que a LGT encurtou para 8 anos), dispondo que a ele se aplica o preceituado no artigo 297.º do Código Civil (n.º 1 do art.º 5.º).
Por conseguinte, embora a lei aplicável ao prazo de prescrição seja, em regra, a fixada na lei vigente à data da constituição da respectiva obrigação tributária, quando esse prazo se encontra em curso à data da entrada em vigor da LGT há que aplicar a regra contida no artigo 297.º do C.Civil, que dispõe que a lei que estabelecer um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar (n.º 1); e que a lei que fixar um prazo mais longo é igualmente aplicável aos prazos que já estejam em curso, mas computar-se-á neles todo o tempo decorrido desde o seu momento inicial (n.º 2).
Esta regra constitui um desvio à regra geral sobre a aplicação da lei no tempo prevista no artigo 12º do Código Civil, mas é explicado por evidentes razões de protecção das expectativas dos credores, pois que se trata, como refere o Ilustre Juiz Conselheiro JORGE LOPES DE SOUSA in “Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária - Notas Práticas”, Áreas Editora”., «de uma restrição explicada por evidentes razões de protecção das expectativas dos credores, pois o encurtamento do prazo, se fosse contado desde o momento que a lei nova indica como sendo o do início da prescrição, provocaria imediatamente a prescrição de todas as dívidas relativamente às quais já tivesse decorrido mais tempo do que o previsto na nova lei, frustrando as expectativas dos credores que sabiam ainda dispor de algum tempo para diligenciarem no sentido de cobrarem as suas dívidas».
Todavia, apesar de a escolha do prazo de prescrição aplicável a dívida tributária nascida na vigência do CPT e que persista à data da entrada em vigor da LGT, tenha de ser feita em harmonia com a regra do art.º 297.º nº 1 do C.Civil, já a sucessão no tempo das demais normas tributárias, designadamente daquelas que disciplinam os restantes aspectos do instituto da prescrição das obrigações tributárias, tem de ser resolvida pela aplicação da regra contida no artigo 12.º da LGT, que regula a aplicação no tempo das normas tributárias nos seguintes termos:
Artigo 12 °
Aplicação da lei tributária no tempo
1. As normas tributárias aplicam-se aos factos posteriores à sua entrada em vigor, não podendo ser criados quaisquer impostos retroactivos.
2. Se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor.
3. As normas sobre procedimento e processo são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes.
4. Não são abrangidas pelo disposto no número anterior as normas que, embora integradas no processo de determinação da matéria tributável, tenham por função o desenvolvimento das normas de incidência tributária.
Tal norma limita-se, ao fim e ao cabo, a reafirmar o princípio geral de direito firmado no nosso sistema jurídico e constante do artigo 12.º do C.Civil, de que as normas tributárias se aplicam aos factos posteriores à sua entrada em vigor, a explicitar o princípio constitucional da irretroactividade dos impostos constante do artigo 103.º da Constituição, e a renovar os princípios gerais da aplicação das leis relativas ao procedimento e ao processo. Mas porque essa norma não regula todas as hipóteses de direito transitório tributário, ter-se-á de convocar, para todas aquelas situações que não encontrem nela previsão, o princípio geral constante do artigo 12.º do C.Civil.
Deste modo, e sabido que normas tributárias não são apenas as que definem os factos tributários, mas também as que disciplinam o regime da prescrição das obrigações que emergem desses factos tributários, designadamente as que prevêem causas de interrupção e suspensão dessa prescrição, impõe-se aplicar a regra ínsita no art.º 12.º da LGT e, subsidiariamente, o princípio geral contido no art.º 12.º do CC, da aplicação prospectiva da lei – a lei só dispõe para o futuro.
Com efeito, o mencionado preceito do Código Civil dispõe do seguinte modo:
Artigo 12.º
Aplicação das leis no tempo. Princípio geral
1 - A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2 - Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.
Deste preceito, tal como do artigo 12º da LGT, retiram-se, pois, dois princípios basilares: o da não retroactividade da lei e o da sua aplicação imediata. Ou seja, a lei nova só tem, em princípio, eficácia para o futuro, apresentando, como regra, eficácia prospectiva.
Mas, como adverte ANTUNES VARELA in Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 120, pág.151., o princípio da aplicação prospectiva assume duas faces distintas, embora complementares: salvo disposição em contrário, a lei aplica-se a factos futuros, mas quanto às relações jurídicas duradouras a lei nova aplica-se não só às relações constituídas na sua vigência como às constituídas antes que se mantenham na vigência da lei nova.
E, como explicam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA in “Código Civil, Anotado”, Vol. I, pág. 61., «Previnem-se no n.º 2, em primeiro lugar, os princípios legais relativos às condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos, ou referentes aos seus efeitos. Assim, por exemplo, as condições de validade de um contrato (capacidade, vícios de consentimento, forma, etc.), bem como os efeitos da respectiva invalidade, têm de aferir-se pela lei vigente ao tempo em que o negócio foi celebrado. (...). Se, porém, tratando-se do conteúdo do direito, for indiferente o facto que lhe deu origem, a nova lei é já aplicável. Assim, para fixar o conteúdo do direito de propriedade, ou de qualquer outro direito real, é aplicável a lei nova e não a lei da data da sua constituição. Não interessa, na verdade, saber qual foi o título constitutivo, nem qual foi, por consequência, a data da formação do direito. (...)».
Dito de outro modo, e citando BAPTISTA MACHADO in “Sobre a aplicação no tempo do novo Código Civil”, Almedina, pág. 29 e 18 e 19., «no n.º 2 do art.º 12º do nosso Código estabelece-se a seguinte disjuntiva: a lei nova, ou regula a validade de certos factos ou os seus efeitos, e neste caso só se aplica a factos novos, ou define o conteúdo (os efeitos) de certa relação jurídica independentemente dos factos que a essa relação jurídica deram origem, e então é de aplicação imediata (quer dizer, aplica-se, de futuro, às relações jurídicas anteriormente constituídas e subsistentes à data da sua entrada em vigor)». E acrescenta, «(...) a lei nova relativa ao conteúdo (ou efeitos) de uma relação jurídica só não abstrai dos factos que a essa relação deram origem quando define ou modela intrinsecamente esse conteúdo em função de tais factos (...) isto é, quando os efeitos ou consequências jurídicas que ela determina são o produto da valoração legal de tais factos e variam consoante essa valoração, de tal modo que se possa dizer que a aplicação da lei nova aos efeitos duma relação constituída com base num facto passado representaria uma nova valoração desse facto passado e, consequentemente, teria carácter retroactivo.».
Sobre essa mesma norma, OLIVEIRA ASCENSÃO “O Direito, Introdução e Teoria Geral, Uma Perspectiva Luso-Brasileira”, 10.ª edição revista, Almedina, Coimbra, 1997, pág. 489. pronuncia-se em termos que se nos afiguram impressivos, estabelecendo a seguinte distinção: «1) A lei pode regular efeitos como expressão duma valoração dos factos que lhes deram origem: nesse caso aplica-se só aos novos factos. Assim, a lei que delimita a obrigação de indemnizar exprime uma valoração sobre o facto gerador de responsabilidade civil; (...); 2) pelo contrário, pode a lei atender directamente à situação, seja qual for o facto que a tiver originado. Se a lei estabelece os poderes vinculações do proprietário, pouco lhe interessa que a propriedade tenha sido adquirida por contrato, ocupação ou usucapião: pretende abranger todas as propriedades que subsistam. Aplica-se, então, imediatamente a lei nova.».
Em consonância com o que acaba de se expor, podemos fixar o seguinte entendimento: se a nova regulamentação legal se prende com qualquer facto produtor de certo efeito, ela tem, tão só, aplicação aos factos novos; já se a nova regulamentação se conexiona apenas ao direito, sem referência ao facto que lhe deu origem, então a lei nova aplica-se às relações jurídicas já constituídas que subsistam à data da sua entrada em vigor.
Nesta conformidade, as normas de natureza substantiva contidas na LGT não se aplicam a factos e efeitos já consumados no domínio da lei anterior; mas se essas normas definirem o conteúdo (ou efeitos) de relações jurídico-tributárias duradouras, como é o caso da maior parte das obrigações tributárias, sem referência ao facto que lhes deu origem, elas vão aplicar-se não só às relações e situações jurídicas que se constituírem após a sua entrada em vigor, como, também, a todas aquelas que, constituídas antes, protelem a sua vida para além do momento da entrada em vigor da nova regra.
Donde decorre que é perfeitamente possível, no nosso sistema jurídico, aplicar normas tributárias compreendidas em diferentes diplomas (lei antiga e a lei nova) a uma relação ou situação jurídica de natureza tributária duradoura, não podendo o efeito imediato da lei nova ser considerado, em tais situações, como representando um efeito retroactivo. Advoga, porém, a Recorrente que a sentença recorrida, ao aplicar as causas interruptivas e suspensivas da prescrição previstas na LGT a factos tributários ocorridos em 1994, isto é, ocorridos antes da sua entrada em vigor, está a atribuir eficácia retroactiva a essas normas. Pelo que, na sua perspectiva, se deveriam aplicar somente as causas de interrupção e suspensão previstas na lei em vigor à data do facto tributário gerador das dívidas exequendas.
Todavia, não lhe assiste razão.
É certo que a LGT veio criar novas causas suspensivas do prazo de prescrição das obrigações tributárias (n.º 3 do art.º 49º) e fixar causas interruptivas sem correspondência com as previstas na lei antiga (como acontece com o acto da citação - n.º 1 do art.º 49.º), mas fê-lo abstraindo do facto tributário que gerou a dívida sujeita a extinção por prescrição, abstraindo dos elementos constitutivos da obrigação tributária, e abstraindo do facto que despoletou o efeito jurídico inicialmente pretendido (cumprimento da obrigação tributária) e do facto gerador da prescrição (inércia do titular do direito obrigacional).
Pode, pois, dizer-se, na busca do enquadramento dessas normas entre as hipóteses previstas no n.º 2 do art.º 12.º do CC, que elas se limitam a determinar os actos que acarretam a suspensão e a interrupção do prazo de extinção (por prescrição) de uma obrigação tributária, não dispondo sobre as condições de validade formal ou substancial do facto tributário ou da respectiva obrigação tributária, e que, por isso, só podem qualificar-se como normas que dispõem sobre o conteúdo de situações jurídicas que, com base naqueles factos, se constituíram.
Neste cenário, essas normas conexionam-se apenas com o direito, sem referência aos factos que lhes deram origem, pelo que nada obsta, face aos princípios gerais que acima deixámos enunciados, à aplicação dessas normas da LGT às relações tributárias de natureza obrigacional que subsistam à data da sua entrada em vigor.
E assim sendo, a LGT é competente para determinar os eventos interruptivos e suspensivos que ocorram na sua vigência, ainda que atinentes a prazos prescricionais iniciados na vigência do CPT, e para determinar os efeitos que sobre esse prazo têm esses eventos, não podendo esse efeito imediato da lei nova ser considerado como representando um efeito retroactivo.
Por outro lado, como também tem sido repetidamente afirmado por este Supremo Tribunal, a aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais, em face da previsão normativa do art.º 297.° do CC, não determina a aplicação de um ou outro regime em bloco, pois só se refere à lei que altere o prazo, à sua medida, e não aos termos em que se conta e a tudo o mais que releva para o seu curso – cfr., entre outros, os acórdão proferidos em 28/05/2008, no recurso n.º 154/08 e em 21/05/2008, no recurso n.º 7/08.
Por conseguinte, não há que comparar os regimes de suspensão e interrupção do prazo de prescrição adoptados pela lei antiga e pela lei nova, para determinar qual é o mais favorável e escolher a lei aplicável segundo o juízo assim atingido, já que o princípio da aplicação da lei mais favorável ao arguido só tem emprego no âmbito do direito sancionatório, não sendo aplicável ao direito obrigacional de natureza tributária. Como se deixou dito no acórdão do STA proferido em 6/02/2002, no recurso n.º 26296, «O princípio da aplicação da lei mais favorável ao arguido só tem emprego no âmbito do direito sancionatório, explicando-se pela razão de a lei reflectir o sentir coevo da sociedade, pelo que deixa de fazer sentido aplicar a lei antiga sempre que o legislador, interpretando esse sentir, a alterou de modo a beneficiar o agente. Aqui, na execução fiscal, estamos fora do campo sancionatório, tratando-se, apenas, do direito do Estado a cobrar o seu crédito de imposto, e da correspondente obrigação do devedor de satisfazer a prestação.».
Em conclusão, a solução do problema da aplicação da lei no tempo depende do momento em que o facto interruptivo ou suspensivo ocorreu e não da eventualidade de, à face das regras do art. 297.º do Código Civil, ser aplicável o regime do CPT ou da LGT no que concerne à duração do prazo de prescrição.
Neste contexto, cai por terra toda a tese construída pela Recorrente, no sentido de que a aplicação de normas da LGT implica uma retroactividade, bem como toda a sua argumentação no sentido de que ocorreu uma violação do disposto no artigo 103.° da CRP, uma violação do princípio de separação de poderes e do princípio da legalidade, pois que o julgador se limitou a observar e aplicar as regras e princípios de direito vigentes no nosso ordenamento jurídico-fiscal, não se tendo transformado em legislador nem ido buscar causas interruptivas e suspensivas sem previsão na lei aplicável ao caso vertente.
Retornando ao caso dos autos, e aplicando a doutrina exposta, nada obsta a que se atribua a devida e legal relevância à suspensão da execução fiscal decretada por despacho de 25/02/2000 (motivada pela interposição de recurso contencioso que tinha por objecto a legalidade da liquidação donde provém a dívida exequenda, associada à penhora de bens necessários para garantir o seu pagamento), a qual determina a suspensão do prazo de prescrição nos termos previstos no n.º 3 do art.º 49.º da LGT, na redacção dada pela Lei n.º 100/99. Na verdade, e face à aplicabilidade do referido preceito da LGT, na medida em que o acto de citação ocorreu já na sua vigência, mostra-se concretizada a suspensão do prazo de prescrição nele prevista.
E o mesmo se diga da relevância do acto interruptivo constituído pela citação do sujeito passivo em 10/12/1999, ocorrido antes que tivesse decorrido o prazo prescricional de 10 anos previsto no art.º 34.º do CPT (aplicável por força do disposto no art.º 297.º do C.Civil), pois que nessa altura a citação no processo de execução fiscal constituía já facto interruptivo da prescrição à luz do n.º 1 do art.º 49.º da LGT, na redacção dada pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho.
Finalmente, importa abordar a segunda questão colocada neste recurso, e que se traduz em saber se tendo havido várias causas interruptivas do prazo de prescrição (instauração de Recurso Hierárquico e citação para a execução fiscal) todas elas produzem esse efeito sobre o prazo prescricional ou se deve dar-se apenas relevância à que se verificar em primeiro lugar.
Durante algum tempo a jurisprudência dominante defendeu que o prazo de prescrição se interrompia uma única vez com a ocorrência do primeiro acto interruptivo e que uma vez cessado o seu efeito não havia que relevar factos posteriores, capazes, em abstracto, de actuar como factor de interrupção da prescrição Cfr. a título exemplificativo, o acórdão do STA proferido em 12/12/2006, no recurso n.º 955/06., enquanto uma posição minoritária defendia que perante uma sucessão de diversas causas interruptivas o prazo de prescrição se devia contar a partir do acto interruptivo ocorrido em último lugar Cfr. o acórdão do TCA Norte proferido em 03.02.2005, no recurso n.º 136/04..
Todavia, após os acórdãos proferidos pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA em 24/10/2007, no recurso n.º 244/07 e em 28/05/2008 no recurso n.º 840/07, a posição jurisprudencial firmou-se e pacificou-se no sentido de que ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição antes da entrada em vigor da actual redacção do n.º 3 do artigo 49.° da LGT (introduzida pelo art.º 89.° da Lei 53-A/2006, de 29/12), devem todas elas ser consideradas, desde que ocorram após a cessação do efeito interruptivo das anteriores.
Assim, e como sobressai da doutrina espelhada no primeiro desses acórdãos, caso se sucedam no tempo vários factos interruptivos da prescrição, não se pode atender apenas ao segundo, ignorando o primeiro, como seria o caso de, deduzida reclamação graciosa após a instauração de execução fiscal, se considerar interrompido o prazo só a partir da dedução daquela. Mas achando-se interrompido o prazo prescricional, pela ocorrência de algum daqueles factos, a posterior eclosão de outro, embora em abstracto capaz de interromper o prazo, é inócua, pela impossibilidade de interromper o que já está interrompido. Porém, se, após a cessação do efeito interruptivo, ocorrer nova causa de interrupção da prescrição, não pode deixar de se lhe atribuir esse efeito.
Pela nossa parte não vemos razão para nos afastarmos dessa corrente jurisprudencial, que actualmente é pacífica neste Supremo Tribunal, até porque a redacção actual do n.º 3 do artigo 49.° da LGT, estabelecendo expressamente que a interrupção opera uma única vez, só se aplica aos factos interruptivos verificados após o início da vigência do diploma que introduziu a alteração da norma.
Sufragamos, pois, inteiramente, a doutrina acolhida nesses acórdãos e em todos aqueles que se lhe seguiram Cfr., a título exemplificativo, os acórdãos proferidos pelo STA em 7/05/2008 e em 12/08/2009, nos recursos n.º 57/08 e 748/09, respectivamente, e que encontra apoio na posição expressa por JORGE LOPES DE SOUSA no seu “Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado”, ano 2007, II Vol. pág. 198, quando afirma que “se for praticado um novo acto interruptivo…, será com base em qualquer destes actos que se apreciará, autonomamente se decorreu o prazo de prescrição, não se podendo considerar decorrido esse prazo se, à face de qualquer dos actos interruptivos, ele não se puder considerar esgotado. Esta é uma conclusão que se extrai com alguma segurança, pois se a lei atribui a vários actos efeito interruptivo autónomo e não afasta a possibilidade da sua cumulação, a ilação lógica a retirar é reconhecer o efeito que cada um tem (inclusivamente o suspensivo quando é este aquele que acaba por ter) quando o seu âmbito de aplicação não se sobreponha”.
Seguindo esta jurisprudência consolidada foi ponderado na sentença que, “… no caso vertente, conforme o facto 2, os aqui Reclamantes foram citados para a execução em 18-05-2000 facto que, à luz do estabelecido no artigo 49 .º, n.º 1 da LGT (Lei n.º 100/99, de 26/07), determina a interrupção da prescrição. Pelo que, o prazo de prescrição começou a correr em 01-01-1996 e foi interrompido em 18-05-2000.
Como é sabido, a interrupção da prescrição tem como efeito a inutilização do tempo decorrido anteriormente (artigo 326.º, n.º 1 do CC) e se o efeito interruptivo decorrer da citação, por força do disposto no artigo 327.º, n.º 1 do CC, tal efeito é duradouro e não meramente instantâneo, obstando ao decurso da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo.
Não obstante, há que ponderar o disposto no artigo 49.º, n.º 2 da LGT, na redação dada pela Lei 100/99, de 26/07, aplicável ao caso sub judice (pois só veio a ser revogado em 2007, cfr. a Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro) e que determinava que “a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”.
Importa, por isso, aquilatar se o processo de execução fiscal esteve ou não parado por mais de um ano, desde a citação, em 18-05-2000, por facto não imputável ao executado.
A resposta é afirmativa, conforme passaremos a explicar.
Antes de mais, cumpre esclarecer que “o processo é havido por parado em caso da realização de diligências meramente internas dos órgãos de execução fiscal não notificadas ao executado” (cfr. Lima Guerreiro in LGT Anotada, Rei dos Livros, 2000, Pág. 231), ou, como refere o Acórdão do STA de 07.02.1996, no processo 19872, o processo deve considerar-se parado quando nele não são praticados actos impostos por lei ou por ela permitidos afectando tal paragem a normal finalidade do processo.
E por outro lado, cumpre também esclarecer que, apesar do disposto no n.º 3 do artigo 49º da LGT, diz também Lima Guerreiro, na obra citada, que, não é toda a reclamação, impugnação ou recurso que tem eficácia interruptiva da prescrição, mas apenas a reclamação, impugnação ou recurso com eficácia suspensiva da execução fiscal, nos termos do artigo 255° do C.P.T. (agora 169° do C.P.P.T) e apenas enquanto a suspensão se mantiver. Assim, é apenas, a partir da prestação efetiva da garantia que ocorre o aludido efeito suspensivo, já que apenas esta tem aptidão para parar do processo.
Posto isto, verifica-se que os aqui Reclamantes apresentaram reclamação graciosa a 31-01-2001, mas não prestaram garantia. E tanto assim é que foram notificados, a em 21-11-2001 (Ofício n.º ...97), para prestar garantia (cfr. factos 3 e 4).
Verifica-se também, pela factualidade provada, que apenas volta a haver tramitação no PEF a 24-03-2004, precisamente para extrair mandado de penhora, ainda antes da decisão da reclamação graciosa, que apenas foi indeferida a 15.06.2005 (cfr. factos 5 a 10), o que denota bem que o PEF não estava suspenso pela reclamação, nem podia estar, não tendo sido apresentada garantia. Pelo que nada obstava a que o órgão de execução fiscal prosseguisse com a execução, não estando este legalmente impossibilitado de providenciar no sentido da cobrança.
Como refere Jorge Lopes de Sousa em “Notas sobre a aplicação no tempo das normas sobre prescrição da obrigação tributária”, Braga, 2008, pág. 12-13, “(…) compreende-se que o efeito interruptivo cesse por paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, pois essa paragem será imputável aos serviços estaduais que devem fazer tramitar atempadamente os processos administrações e judiciais. Mas, também se compreende que, sendo o fundamento da prescrição das obrigações a negligência do credor em cobrar a dívida, não se deixe correr o prazo de prescrição enquanto este credor está legalmente impossibilitado de providenciar no sentido de a cobrança seja efectuada.”
Ora, verifica-se, pelo exposto, que entre 21/11/2001 e 24/03/2004, efetivamente, o processo de execução fiscal esteve parado mais de um ano, por causa não imputável ao sujeito passivo, fazendo operar o disposto no n.º 2 do artigo 49º da LGT, na versão aplicável.
Sendo assim, esta paragem do processo fez cessar o efeito interruptivo a partir de 22/11/2002, já que o reinício desse prazo não pode deixar de ser contado a partir do termo do ano em que o processo ficou parado, ou seja, o momento temporal que releva, no caso em apreço, para determinar a cessação do efeito interruptivo do prazo de prescrição ocorreu apenas em 22.11.2002, data em que o termo do período de um ano ocorre e em que tal período de tempo passa a relevar para efeitos de interrupção da prescrição, sendo a partir desse momento que se reinicia a contagem do tempo da prescrição, tendo em consideração o tempo já decorrido até à data da autuação (cfr. Acórdão do STA de 09-11-2016, proferido no âmbito do processo 01189/16).
Sendo assim, cessando o efeito interruptivo decorrente da paragem superior a um ano, teremos de contar quatro anos, três meses e 9 dias, desde o início do prazo (01-01-1996) até à data da autuação do PEF (10-04-2000, cfr. facto 1) e retomar a contagem a partir de 22-11-2002 até 29-03-2005, data do despacho onde se atesta que a garantia prestada é suficiente para suspender a execução (cfr. facto 9), o que soma mais dois anos, quatro meses e sete dias.
Sendo assim, até ao trânsito em julgado da impugnação no dia 17-09-2021 (cfr. facto 11), evento que pôs termo à suspensão da contagem que tinha operado em virtude da prestação de garantia (cfr. facto 9), apenas tinham corrido seis anos, sete meses e dezasseis dias, faltando ainda três anos, quatro meses e 14 dias para o decurso do prazo de prescrição de 10 anos que vimos acima ser o aplicável.
Sendo assim, a dívida exequenda em causa nestes autos nunca prescreverá antes de 31-01-2025.
Isto posto, consideramos que o despacho reclamado não enferma de qualquer ilegalidade pois que a dívida exequenda não se encontra ainda prescrita.”
É por demais manifesto que, tendo os recorrentes, assacado à sentença um erro de julgamento de direito por não ter sido decretada a prescrição da dívida tributária, por ter considerado que a redacção do artigo 49º da LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006 de 29/12, não tem aplicação nos presentes autos, devendo antes aplicar-se a lei em vigor ao tempo dos factos tributários, ou seja, a existente em 1995, como resulta cristalino do discurso jurídico do aresto sob censura, o julgador não aplicou ao caso em apreço a mencionada redacção dada ao artigo 49º pela Lei 53-A/2006 de 29/12, antes a anterior, dada pela Lei n.º 100/99, de 26/07, que introduziu como facto capaz de desencadear a interrupção do prazo de prescrição, a citação, pelo que, não colhem os argumentos dos recorrentes neste particular.
Por último, sempre se dirá que a factualidade identificada no nº.9 do probatório supra operou a suspensão do prazo de prescrição, nos termos do artº.49, nº.3, da L.G.T., na redacção em vigor em 29/03/2005, a da Lei 55- B/2004, de 30/12.
Isso em conformidade com a jurisprudência consolidada do STA no que respeita à lei aplicável em relação à prescrição, à sucessão de leis no tempo e efeitos interruptivos, como ex abundantis acima demonstrado por referência a vários acórdãos, sendo que sobre a problemática da constitucionalidade, se remete para o Ac. N.º 592/2012, de 5/12/2012, do T. Constitucional.
Destarte, estão votados ao malogro todos os fundamentos recursórios, sendo de negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

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3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pelos Recorrentes (cfr.artº.527, do C. P. Civil).
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Lisboa, 13 de Julho de 2023. - José Gomes Correia (relator) - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Gustavo André Simões Lopes Courinha.