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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0859/04.2BEPRT
Data do Acordão:12/11/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NEVES LEITÃO
Descritores:ACTO TRIBUTÁRIO
FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:A fundamentação do acto tributário deve ser contextual e contemporânea da sua prática, não sendo permitida a invocação superveniente de fundamentos que, embora objectivamente existentes, não constam da motivação expressa do acto.
Nº Convencional:JSTA000P25285
Nº do Documento:SA2201912110859/04
Data de Entrada:09/30/2019
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A... SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: 1. RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A…………., SA, contra decisão de indeferimento de reclamação graciosa e, consequentemente, anulou a liquidação adicional de IRC (exercício de 1995), no montante de € 39 347,31 (7 888 428$00)

1.2. O recorrente apresentou alegações que sintetizou com a formulação das seguintes conclusões:
A. Em causa está a correcção ao resultado tributável do exercício de 1995 para efeitos de IRC, que resultou num acréscimo de 14233 688$00 (€ 70 997,34) referente a reintegrações e amortizações não aceites como custo fiscal.
B. Toda a questão se reconduz ao período de utilidade esperada de tais obras, e dado que não se encontrando fixadas para as mesmas, taxas de reintegração e amortização nas tabelas anexas ao Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12/01, é este período determinante para aceitação como custo fiscal das amortizações e reintegrações resultantes da aplicação de uma taxa calculada em função dele, face à disciplina do art. 5.º do mesmo decreto.
C. A douta sentença entendeu que não se tratando de obras efectuadas em edifício alheio e não estando tais obras contempladas nas tabelas de codificação e classificação dos bens para efeitos de amortização anexas ao D. Reg. 2/90, de 12/01, não estava a impugnante obrigada a efectuar as referidas reintegrações nos termos do n.º 2 do art. 5.º do referido diploma.
D. Relativamente às referidas obras na via pública (obras de alargamento da faixa de rodagem e construção de um separador central, para melhoramento do acesso às instalações que ocupa como arrendatária), a impugnante estimou um período de utilidade esperada de 3 anos, o que conduz à aplicação de uma taxa de amortização e reintegração anual de 33,33%, tendo a AT considerado tal período excessivamente reduzido face ao período de 10 anos que se deduz como previsto para o mesmo tipo de imobilizações, nomeadamente da taxa anual de 10% constante da Tabela II, código 2195 - instalações não especificadas, anexa ao D. Regulamentar supra citado, efectuando a correcção das respectivas amortizações com base neste último período.
E. Não se encontrando fixadas taxas de reintegração e amortização para os respectivos elementos imobilizados, o cálculo das quotas de reintegração e amortização aceites como custo fiscal nos termos da alínea g) do n.º 1 do art. 23.º do CIRC, está sujeito ao critério de razoabilidade da Autoridade Tributária e Aduaneira, como decorre do disposto no n.º 2 do art. 29º, actual n.º 3 do art. 31.º do CIRC, e n.ºs 2 e 3 do art. 5.º do Dec. Regulamentar n.º 2/90, de 12/01.
F. O regime das amortizações e reintegrações prende-se com o deperecimento dos bens imobilizados, pois apenas estes podem ser objecto de amortização ou reintegração, nos termos do n.º 1 do referido Dec. Regulamentar, resultando este deperecimento do período de tempo durante o qual se espera que os bens possam ser utilizados em condições de funcionamento económico, a chamada vida útil ou vida económica.
G. Independentemente de se qualificarem ou não como obras em edifício alheio (neste caso abrangidas as respectivas amortizações pelo n.º 2 do art. 5.º do D.R. 2/90), nada consta dos autos no sentido de concluir que a duração económica ou, no caso concreto, o período de utilidade esperada das obras de infraestruturas em causa seja apenas de 3 anos, como considerou a impugnante, sem contudo apresentar causas justificativas para um deperecimento tão rápido.
H. Desta forma, contrariamente ao doutamente decidido, não estando as obras em referência contempladas nas tabelas de codificação e classificação dos bens para efeitos de amortização anexas ao D. Regulamentar n.º 2/90, de 12/01, deverá manter-se a correcção da Administração Tributária relativa às reintegrações e amortizações não aceites como custo fiscal, porquanto tal correcção assentou num critério de razoabilidade legalmente admitido, como decorre do disposto nos n.ºs 2 e 3 do art. 5.° do mesmo decreto, e ainda do disposto na alínea g) do n.º 1 do art. 23.° e art. 29.°, n.º 2 do CIRC, vigente ao tempo, não tendo a impugnante apresentado causas justificativas da depreciação anormal, por excessivamente rápida, correspondente ao período de utilidade esperada de tais obras por si estimado.
I. Destarte, decidindo da forma como decidiu e ao não decidir da forma exposta, a douta sentença recorrida violou as disposições legais supra citadas.
Termos em que,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

1.3. A recorrida não apresentou contra-alegações

1.4. O Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso (processo electrónico fls. 363)

1.4. Após os vistos dos juízes conselheiros adjuntos cumpre apreciar e decidir em conferência

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. DE FACTO
A sentença recorrida julgou provados os seguintes factos:
1. A sociedade Impugnante, A…………, S. A., com o CAE 51110, com actividade de comércio armazenista de produtos alimentares, foi sujeita a um exame à escrita, com extensão aos anos de 1995 e 1996, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, Imposto sobre o Valor Acrescentado e Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, no âmbito da credencial n.º 1032.98 de 3 de Fevereiro - cf. Relatório constante de fls. 19 e seguintes do apenso referente a Reclamação Graciosa;
2. As áreas sobre as quais incidiu a acção inspectiva, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, foram as amortizações e reintegrações, os custos financeiros, outros fornecimentos e serviços de terceiros e custos operacionais - cf. relatório de inspecção constante de fls. 19 e seguintes do apenso referente a Reclamação Graciosa;
3. Em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas de 1995, a Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária, em 31.03.1998, elaborou relatório fundamentando a liquidação emitida, do qual se destaca:
"3.1 Exercício de 1995
3.1.1. I.R.C.
3. 1. 1. 1. Amortizações e Reintegrações
Analisados os mapas das reintegrações e amortizações, verificámos que o Sujeito Passivo quantificou reintegrações no montante de 20334 712$00, expressas a pág. 6 dos referidos mapas, como respeitando a imobilizações corpóreas identificadas com o “código 2195 - Não especificadas - obras em propriedade alheia", as quais se revelam excessivas como de seguida explicamos:
I
O tratamento dado pelo Sujeito Passivo
As benfeitorias em apreciação, foram realizadas nos acessos viários às instalações ocupadas pela A…………, no Lugar do ………. - Maia, conforme documento que constitui o anexo I rendo para efeitos de manifestação contabilística sido consideradas obras em propriedade de alheia, por na verdade respeitarem a beneficiações em instalações que são propriedade de terceiros (Empresa do grupo ……..), que a A…….. ocupa na qualidade de arrendatária, e pelo uso das quais, na condição de locatária, paga respectiva renda.
As reintegrações em causa, quantificam aquilo que o Sujeito Passivo reputou de deperecimento do bem, e foram calculadas com base na taxa de 33.33% correspondente a um período de utilidade esperada que o Sujeito Passivo hipotisou, escassamente, por três anos. O valor que assim considerou como custo para efeitos fiscais, no exercício de 1993, foi de 20 334 712$00 conforme mapa mod. 32.1 que constitui o anexo II.

II
O enquadramento destes factos no plano tributário
As imobilizações referidas são consideradas obras em edifícios alheios, obedecendo a quantificação das respectivas reintegrações à disciplina prevista no n.º 2 do art. 5° do Decreto Regulamentar 2/90 de 12.01.
Até aqui, nenhuma anomalia no plano tributário teríamos constatado, não fosse o facto de se mostrar excessivamente reduzido o número de anos de utilidade esperada estimado para efeitos do cômputo das reintegrações.
Efectivamente, sendo as instalações arrendadas, e não dispondo o respectivo contrato de arrendamento sobre condições limitativas do prazo de utilização das mesmas por parte do Sujeito Passivo A………, considera-se por isso que o período estimado se revela excessivamente reduzido, se comparado com o número de anos que se deduz como previsto para o deperecimento do mesmo tipo de imobilizações, em função da taxa de 10% constante da “Tabela I - Grupo II - Código 2195 - Instalações não especificadas”, anexa ao Decreto Regulamentar 2.90 de 12.01.
Neste contexto, consideramos que a actuação do Sujeito Passivo não é justificada nem por razões de ordem económica, nem por imperativos de natureza contratual.
Por conseguinte, ter-se-ia como aceitável que as reintegrações tivessem sido calculadas com base num período de utilidade esperada de 10 anos, idêntico ao previsto para as imobilizações fisicamente semelhantes, previsto nas tabelas anexas ao Decreto Regulamentar 2.90 de 12.01.
Deste modo, com o fundamento de facto já apresentado, e no uso do quadro jurídico criado pelo número 2 e art. 5° do referido diploma, consideramos que o contribuinte praticou reintegrações excessivas no montante de 14 233 668$00 (...) como se expressa no seguinte quadro:

Mapa
Taxa
Taxa
Reintegração
Reintegração
Diferença
Praticada
Corrigida
Praticada
Corrigida
Anexo II
33.33%
10%
20.334.712$00
6.101.024$00
14.233.388$00

O facto de o Sujeito Passivo ter incluído esta parcela de custo no cômputo do resultado que declarou para efeitos fiscais, no exercício de 1995, evidencia um comportamento tributariamente anómalo, atento o quadro jurídico previsto no normativo do art. 32º do CIRC.
4. Conclusões
4.1. Exercício de 1995
4.1.1. Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas
Conforme detalhe desenvolvido no ponto 3.1.1.1 do presente relatório, o Sujeito Passivo considerou indevidamente como custo para efeitos fiscais, no exercício de 1995, o valor de 14 233 688$00 (...) proveniente de reintegrações praticadas sobre obras em propriedade alheia.
Em face da disciplina criada pela disposição do n.º 2 do art. 5° do Decreto-regulamentar 2.90 de 12.01, a anomalia tributária aqui evidenciada, resulta do facto de o Sujeito Passivo ter efectuado o cálculo das reintegrações praticadas com base num período de utilidade esperada de 3 anos, o que julgamos ser excessivamente reduzido quando comparado com o período de deperecimento previsto para o mesmo tipo de imobilizações (10 anos), conforme consta da "Tabela II - Código 2195 - Instalações não especificadas" anexa ao citado diploma.
5. Propostas
5.1. De rectificação ao Lucro Tributável declarado pelo Sujeito Passivo
5.1.1. IRC - Exercício de 1995: 14 233 688$00
Nesta conformidade, propomos que o lucro tributável declarado no exercício de 1995 pelo montante de 28 742 867$00 seja elevado para o valor de 42 976 555$00" - cf. relatório de inspecção tributária constante de fls. 19 e seguintes do apenso de Reclamação Graciosa;
4. Pelo ofício n.º 000780 de 04.03.1999 foi a sociedade Impugnante notificada para o exercício do direito de audição "sobre o projecto de conclusões do relatório de inspecção que se anexa, nos termos previstos no art. 60° da Lei Geral Tributária e art. 60° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária" - cf. ofício constante do Processo Administrativo apenso aos autos;
5. Por requerimento de 11.03.1999 a Impugnante dirigiu à Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária, solicitando a notificação dos fundamentos integrais das correcções efectuadas, por não dispor de elemento que reputa essencial ao exercício do direito de audição - cf. requerimento constante do Processo Administrativo apenso aos autos, para o qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
6. Pelo ofício n.º 001500 de 09.04.1999 a Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária, respondeu enviando as conclusões do relatório à escrita dos exercícios de 1995 e 1996, concluído em 31.03.1999, onde, relativamente às amortizações e reintegrações do exercício de 1995, consta:
"Considerou indevidamente como custo para efeitos fiscais do exercício de 1995, o montante de 14 233 688$00 respeitante a reintegrações praticadas sobre as obras eu efectuou em edifícios alheios.
As referidas reintegrações foram quantificadas a uma taxa de 33.33% que calculou com base no período de utilidade esperada de três anos, o que, atenta a disciplina criada pela disposição do n.º 2 do art. 5° do Decreto Regulamentar 2.90 de 12.01, se revela excessivamente reduzido quando comparado com o período de deperecimento previsto para o mesmo tipo de imobilizações (10 anos) conforme consta da Tabela II - Código 2195 - Instalações não especificadas, anexa ao diploma.
No quadro a seguir, explicita-se o cômputo das reintegrações excessivas:
Mapa
Taxa
Taxa
Reintegração
Reintegração
Diferença
Praticada
Corrigida
Praticada
Corrigida
Anexo II
    33.33%
    10%
    20.334.712$00
    6.101.024$00
    14.233.388$00

- cf. ofício e informação anexa, constantes de fls. 18 a 20 dos autos, numeração referente ao processo físico;

7. Em 22.04.1999 a Impugnante exerceu o seu direito de audição, sobre o projecto de conclusões do relatório de inspecção referente aos exercícios de 1995 e 1996, nos termos do requerimento constante do Processo Administrativo, para cujo teor se remete e o qual se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;

8. Em 30.04.1999 foi aditado ao Relatório identificado em 3., o ponto 6., referente ao direito de audição, do qual consta:
“(...)
Sobre os factos relatados no projecto de conclusões do relatório, Ponto I. - Amortizações e Reintegrações, consideramos que o Sujeito Passivo não carreia matéria de facto e de direito suficiente para alterar a rectificação por nós proposta no presente relatório de inspecção.
(...)”
- cf. Relatório de inspecção constante do apenso referente a Reclamação Graciosa;
9. Sobre este relatório, recaiu parecer de 03.05.1999, com o seguinte teor: "Confirmo o teor da presente informação. A matéria relatada tem pertinência no plano tributário, pelo que somos de opinião revelar-se fundada a proposta de rectificação do lucro tributável. Nesta circunstância, o lucro tributável declarado no exercício de 1995, carece de rectificação no montante de 14 233 688$00" - cf. parecer constante de fls. 19 do apenso referente a Reclamação Graciosa;
10. Em 28.06.1999, recaiu sobre aquele parecer despacho de concordância do Director de Serviços - cf. despacho constante de fls. 19 do apenso referente a Reclamação Graciosa;
11. Com base nas correcções efectuadas, em 08.07.1999 a Administração Tributária emitiu a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas com o n.º 8310011628, determinando o montante a pagar de 7 888 428$00 (€39 347.31) com data limite de pagamento voluntário em 13.09.1999 - cf. liquidação constante de fls. 16 dos autos, numeração referente ao processo físico;
12. Em 29.11.1999 deu entrada no Serviço de Finanças da Maia - 1 Reclamação Graciosa instaurada pela Sociedade Impugnante, incidindo sobre a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas melhor identificada em 11 - cf. requerimento de Reclamação Graciosa constante de fls. 2 do respectivo apenso;
13. Para decisão da Reclamação Graciosa, pelo Serviço de Finanças da Maia - 1 foi elaborada informação, da qual se extrai:
“(...) a Administração Tributária julga aquelas obras como obras realizadas em edifício alheio e portanto passíveis de reintegração e amortização no prazo de 10 anos.
(...)
De acordo com o relatório da DSPIT, não assiste razão à reclamante, pelo que será de indeferir a presente reclamação na sua totalidade” - cf. informação constante de fls. 63 e 64 do apenso referente a Reclamação Graciosa;
14. Em 04.11.2003 o Chefe do Serviço de Finanças emitiu a proposta de decisão:
"Concordo.
Face à informação infra, e demais elementos no processo proponho que a reclamação apresentada seja indeferida" - cf. despacho de fls. 63 do apenso de Reclamação Graciosa;
15. Ainda no âmbito da Reclamação Graciosa, em 04.12.2003, na Direcção de Finanças do Porto, foi elaborado Projecto de Despacho, de que se realça:
“(...)
2. Igual correcção foi efectuada nos mesmos termos e com os mesmos fundamentos, ao exercício de 1993, dando origem à liquidação adicional n.º 8310026914 de 30.12.1997;
3. Contra essa liquidação adicional, foi apresentada Reclamação Graciosa, registada sob o n.º 1805-98/400085.4, na qual foi exarado o projecto de despacho, em 13 de Novembro no sentido do indeferimento.
4. Os Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária pronunciaram-se sobre os factos alegados nessa reclamação, (…)
5. O indeferimento proposto baseia-se no ponto 4.1 e 5.1, resumidamente e, mais relevante, o exposto neste último ponto: (...) “a actuação do S.P. não é justificada, nem por razões de ordem económica, nem por imperativos de ordem contratual".
6. Do referido projecto de despacho e da respectiva informação prestada pela DSPIT, foi notificado o reclamante, estando a decorrer o período para o exercício do direito de audição
Com os mesmos fundamentos invocados na informação prestada pela (DSPIT), para o exercício de 1993 e, concordando com a proposta de decisão do Chefe do Serviço de Finanças (…), indefiro a pretensão do reclamante" - cf. projecto de despacho constante de fls. 69 do apenso de Reclamação Graciosa;
16. Naquele despacho, id. a 15., foi determinada a notificação do Reclamante para efeito do exercício do direito de audição, a qual se efectivou em 23.12.2003, pelo ofício n.º 6348 de 19.11.2003, onde consta que, se nada for dito o projecto de despacho se converte em decisão definitiva - cf. fls. 69 a 72 do apenso referente a Reclamação Graciosa;
17. Em 03.03.2004 sobre a Reclamação Graciosa em causa recaiu o despacho: "Face à ausência de resposta, em exercício do direito de audição prévia, indefiro a pretensão do reclamante, nos termos e com os fundamentos constantes do projecto de decisão, oportunamente notificado, tornando-se definitiva a decisão ínsita no projecto de despacho" - cf. despacho constante de fls. 76 do apenso referente a Reclamação Graciosa;
18. Deste despacho foi o Reclamante notificado pelo ofício n.º 1079 de 12.03.2004 em 17.03.2004 - cf. fls. 77 a 79 do apenso de Reclamação Graciosa;
19. Em 30.03.2004 foi instaurada a presente Impugnação Judicial - cf. carimbo aposto no rosto da Petição Inicial constante de fls. 2 dos autos, numeração referente ao processo físico;
20. As amortizações no valor de 14 233 668$00 correspondem a obras realizadas na Estrada - Via Norte - com vista a melhorar a acessibilidade aos armazéns da Impugnante ali situados - facto que resulta dos depoimentos das testemunhas, cf. acta da inquirição realizada no processo de impugnação 2.03 constante de fls. 146 dos autos, prova aqui aproveitada;
21. Tais obras consistiram na colocação de separadores centrais que permitissem que os camiões ao saírem das instalações da impugnante atravessassem primeiro uma faixa de rodagem, parassem no meio da via e depois atravessassem a outra faixa - facto que resulta dos depoimentos das testemunhas, cf. acta de inquirição realizadas no âmbito do processo de impugnação 2.03 e que consta de fls. 146 dos autos, numeração do processo físico, prova aqui aproveitada;
22. Em 16.04.2001 a Impugnante prestou garantia bancária, no montante de 11 500 000$00, destinada a constituir a caução fixada no Processo de Execução Fiscal 00/100114.0, nos termos do disposto nos artigos 255° e 282 do Código de Procedimento e Processo Tributário, para efeitos de suspensão da execução - cf. garantia n.º 01/101/80136, datada de 11.04.2001, constante de fls. 71 dos autos, numeração referente ao processo físico, documento para o qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
23. Por despacho de 26.02.2003, do Chefe de Finanças adjunto, foi decidido o levantamento da garantia identificada em 22. - cf. despacho constante de fls. 74 dos autos, numeração referente ao processo físico;
24. Com a prestação e manutenção da garantia a Impugnante suportou custos, designadamente de emissão, Imposto Selo, comissões e outros encargos, no montante de €669, 32 - facto alegado na Petição Inicial e que não foi contestado pela Fazenda Pública, foi ainda corroborado pelo depoimento da testemunha ………...

2.2. DE DIREITO
2.2.1. Questão decidenda: legalidade da liquidação adicional de IRC resultante da não aceitação parcial como custo fiscal de reintegração praticada no montante de 20 334 712$00, corrigida para o montante de 6 101 024$00

2.2.2. Apreciação jurídica
2.2.2.1. Com interesse para a solução da questão enunciam-se as seguintes componentes do regime jurídico das reintegrações e amortizações para efeitos de IRC (Decreto Regulamentar nº 2/90, 12 janeiro):
- os elementos do activo imobilizado sujeitos a deperecimento podem ser objecto de reintegração (imóveis) e de amortização (elementos do activo imobilizado incorpóreo) (art.1º nº1);
- as reintegrações e amortizações são aceites como custos fiscais quando contabilizados como custos e perdas do exercício a que respeitam (art.1º nº3);
- as taxas de reintegração e de amortização quantificam o deperecimento do bem reintegrável e amortizável durante o período de utilidade esperada, correspondente àquele em que desempenha regularmente a função que justifica a sua utilização;
- a quota anual de reintegração e de amortização calcula-se mediante aplicação aos valores relevantes do activo imobilizado das taxas específicas fixadas na Tabela I ou das taxas genéricas mencionadas na Tabela II anexas ao Decreto Regulamentar (art.5º nº1);
- tratando-se de bens para os quais não estejam fixadas taxas de reintegração e de amortização naquelas tabelas, são aceites pela administração tributária as correspondentes ao período de utilidade esperada, determinado segundo um critério de razoabilidade (art.5º nº3)
2.2.2.2. A administração tributária fundamentou a liquidação adicional de IRC na circunstância de as obras que geraram as amortizações terem sido efectuadas em edifício alheio (prédio arrendado ocupado pelo sujeito passivo como arrendatário), sendo o período de utilidade esperada considerado pela impugnante (3 anos, determinante da aplicação da taxa de 33%), excessivamente reduzido por comparação com o período previsto para o mesmo tipo de imobilizações, determinante da aplicação da taxa de 10% (factos provados nº 3; art.5º nº 2 e Tabela II anexa ao Decreto Regulamentar nº 2/90,12 janeiro código 2195-instalações não especificadas)
A correção da taxa enferma de pressuposto de facto erróneo, na medida em que o imobilizado objecto de reintegração não respeita a obras em prédio arrendado; antes em obras realizadas na via pública, nos acessos às instalações do sujeito passivo (factos provados nºs 20/21)
A recorrente aceita o erro no pressuposto de facto da taxa de reintegração aplicada (10%) e admite que as obras em referência não estão contempladas nas tabelas de codificação e classificação dos bens para efeitos de reintegração e amortização anexas ao Decreto Regulamentar nº 2/90, 12 janeiro
No entanto, pretende que seja mantida a correção efectuada e a taxa aplicada com base num critério de razoabilidade legalmente admitido, em face da omissão de apresentação pelo sujeito passivo de causas justificativas da depreciação anormal, excessivamente rápida por comparação com o período de utilidade esperada das obras (art.5º nº3 Decreto Regulamentar nº 2/90, 12 janeiro)
Neste contexto a recorrente invoca fundamentação substancial (de facto e de direito) distinta da subjacente ao acto tributário impugnado
2.2.2.2. No contencioso tributário, a impugnação é judicial é um processo impugnatório de mera anulação, no qual o tribunal aprecia a legalidade da actuação da administração tributária à luz da fundamentação contextual integrante do próprio acto, sendo irrelevantes quaisquer outros fundamentos não oportunamente expressos com a sua emissão.
A exigência da fundamentação contextual é indispensável a um exercício informado e esclarecido do direito de impugnação graciosa ou contenciosa pelo interessado, o qual não deve ser confrontado com novos fundamentos surpresa não expressamente aduzidos no acto impugnado, que ignorava na apresentação dos meios de defesa.
No sentido propugnado é pacífica e abundante a jurisprudência do STA (entre outros os seguintes acórdãos:
- STA-SCT 19.12.2007 processo nº 874/04; 2.03.2011 processo nº 49/10; 26.03.2014 processo nº 1674/13; 23.04.2014 processo nº 1690/13; 9.09.2015 processo nº 115/15;
- STA – SCA 6.11.processo nº 371/11,com citação de abundante jurisprudência e doutrina)
Doutrina qualificada pronuncia-se no mesmo sentido:
- Marcello Caetano Direito Administrativo Volume I 10ª edição p.479 afirma ser «irrelevante que a Administração venha, já na pendência do recurso contencioso, invocar como motivos determinantes outros motivos, não exarados no acto», e Volume II, 9.ª edição, pág. 1329, onde que diz que «não pode (...) a autoridade recorrida, na resposta ao recurso, justificar a prática do acto recorrido por razões diferentes daquelas que constam da sua motivação expressa»; - Mário Esteves de Oliveira, Direito Administrativo, Volume I, pág. 472, sustenta que «as razões objectivamente existentes mas que não forem expressamente aduzidas, como fundamentos do acto, não podem ser tomadas em conta na aferição da sua legalidade».).
Das considerações antecedentes resulta a impossibilidade de o tribunal de recurso apreciar a legalidade do acto à luz de outros fundamentos que, sendo objectivamente existentes, não foram expressos na sua motivação.
Neste contexto nenhuma censura merece a sentença anulatória do acto tributário impugnado, ancorado em pressuposto fáctico-jurídico errado que o inquinou de vício de violação de lei.

3. DECISÃO
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar na ordem jurídica a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 11 de Dezembro de 2019. – Neves Leitão (relator) – Nuno Bastos – Ascensão Lopes.