Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0173/23.4BELRS
Data do Acordão:09/06/2023
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:REVISÃO
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Sumário:A revisão dos atos tributários pela entidade que os praticou, efetuada a pedido do sujeito passivo/contribuinte, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo estiver por pagar (portanto, fora do “prazo de reclamação administrativa”), com fundamento em erro imputável aos serviços, não detém a capacidade de suspender a execução fiscal, nos termos e para os efeitos dos artigos 52.º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) e 169.º n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Nº Convencional:JSTA000P31279
Nº do Documento:SA2202309060173/23
Data de Entrada:07/05/2023
Recorrente:A....LDA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;

1.

A..., S.A., …, recorre de sentença, emitida no Tribunal Tributário (TT) de Lisboa, em 6 de abril de 2023, que julgou improcedente reclamação de decisão (“proferida pela Directora Adjunta da Unidade dos Grandes Contribuintes em 28-11-2022, que indeferiu o pedido de manutenção do efeito suspensivo dos processos de execução fiscal n.º ...53 e ...56, contra si instaurados, pelo Serviço de Finanças de Lisboa – 11, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de Taxa de Segurança Alimentar Mais, no montante global de € 2.552.453,74”.) do órgão da execução fiscal.
A recorrente (rte) produziu alegação, onde conclui: «

A. A decisão de indeferimento do pedido de manutenção da suspensão do processo de execução subjacente à presente reclamação, bem como a decisão de executar a garantia bancária prestada nos autos, são ilegais, por violação do regime do artigo 169º do CPPT, uma vez que no caso vertente se encontram verificadas todas as condições previstas nesse regime para que essa suspensão se mantenha, designadamente a prestação de garantia e a contestação da legalidade da dívida exequenda através de um pedido de revisão do acto tributário que a titula, apresentado nos termos do artigo 78º da LGT.

B. Neste pedido invocam-se razões de direito que divergem das que serviram de base ao pedido arbitral previamente formulado. Por este motivo, desde logo, o pedido de revisão apresentado e o seu possível deferimento não ofendem o princípio do caso julgado.

C. Para além disso, o pedido de revisão é um meio próprio, típico e principal de contestação da legalidade de actos tributários. Daí que a jurisprudência venha há muito decidindo que se trata de um expediente normal, equiparável nos efeitos à reclamação (graciosa) administrativa de actos tributários.

D. Neste sentido, a dedução de um pedido de revisão de um acto tributário não pode deixar de ter o efeito de suspender o processo executivo instaurado para cobrança coerciva da dívida subjacente a tal acto, tal como a impugnação judicial ou a reclamação graciosa propriamente dita.

E. Com efeito, se o pedido de revisão do artigo 78º da LGT vale tanto quanto a reclamação graciosa – isto é: se, conforme a jurisprudência vem decidindo, serve para contestar a legalidade de dívidas tributárias (qualquer legalidade) e o seu indeferimento é contenciosamente impugnável –, não há nenhuma razão plausível para que não possa ter o efeito da suspensão do processo de execução das mesmas dívidas tributárias contestadas, com base num regime – o do artigo 169º do CPPT – cujo objectivo é precisamente garantir a suspensão das execuções quando a legalidade das dívidas se encontra a ser discutida em sede administrativa ou judicial.

F. Essa dualidade de efeitos relativamente a meios legais com a mesma razão de ser constituiria não só uma incongruência sistemática inexplicável, como uma violação dos princípios constitucionais da igualdade e da tutela jurisdicional efectiva.

G. De resto, diga-se de novo que em breve a Recorrente apresentará a impugnação judicial do indeferimento tácito do pedido de revisão da liquidação da TSAM de 2016. Na medida em que a impugnação judicial é um meio expressamente previsto no catálogo do artigo 169º, ficarão então cumpridos todos os requisitos para a suspensão do processo executivo.

H. Os actos reclamados devem, pois, ser anulados.

Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente, por provado, com todas as consequências legais, designadamente a anulação da Sentença recorrida. »


*

Não foi formalizada contra-alegação.

*

O Exmo. Procurador-geral-adjunto emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso, em suma, porque “A tese da recorrente é contrariada pela jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo”.

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Cumpridas as formalidades legais, compete-nos decidir.

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2.

Na sentença recorrida, consta: «

Com relevância para a decisão, considera-se provada a seguinte factualidade constante dos autos:

1. Em 01-06-2016, foi emitida pelo Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais, em nome da Reclamante, a factura n.º ...39, no valor de € 990.000,00, referente à 1.ª prestação do ano de 2016, da Taxa de Segurança Alimentar Mais (cfr. documento junto com a petição inicial, a fls. 3 a 87 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

2. Em 01-06-2016, foi emitida pelo Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais, em nome da Reclamante, a factura n.º ...40, no valor de € 286.226,87, referente à 1.ª prestação do ano de 2016, da Taxa de Segurança Alimentar Mais (cfr. documento junto com a petição inicial, a fls. 3 a 87 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

3. Em 01-06-2016, foi emitida pelo Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais, em nome da Reclamante, a factura n.º ...41, no valor de € 286.226,87, referente à 2.ª prestação do ano de 2016, da Taxa de Segurança Alimentar Mais (cfr. documento junto com a petição inicial, a fls. 3 a 87 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

4. Em 01-06-2016, foi emitida pelo Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais, em nome da Reclamante, a factura n.º ...42, no valor de € 990.000,00, referente à 2.ª prestação do ano de 2016, da Taxa de Segurança Alimentar Mais (cfr. documento junto com a petição inicial, a fls. 3 a 87 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

5. Em 07-10-2016, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa – 11, em nome da Reclamante, o processo de execução fiscal n.º ...53, para cobrança de dívida proveniente de taxa de segurança Alimentar Mais do ano de 2016, no valor de € 1.276.226,87 (cfr. fls. 1 do processo de execução fiscal – PEF - n.º ...53 apenso a fls. 441 a 584 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

6. Em 09-10-2016, foi emitido em nome da Reclamante, e dirigido a esta, documento de citação para o processo de execução fiscal identificado no número antecedente (cfr. fls. 5 do PEF n.º ...53 apenso a fls. 441 a 584 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

7. Em 02-11-2016, a Reclamante apresentou junto do Serviço de Finanças de Lisboa – 11, a Garantia Bancária n.º ...59, emitida pela sociedade «Banco 1..., S.A.», para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal n.º ...53 (cfr. fls. 4 do PEF n.º ...53 apenso a fls. 441 a 584 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

8. Em 08-11-2016, por despacho proferido pelo Director Adjunto da Unidade dos Grandes Contribuintes, foi aceite a garantia bancária identificada no número antecedente (cfr. fls. 11 a 13 do PEF n.º ...53 apenso a fls. 441 a 584 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

9. Por despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa – 11 em 08-11-2016 foi determinada a suspensão do processo de execução fiscal n.º ...53 (cfr. fls. 17 do PEF n.º ...53 apenso a fls. 441 a 584 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

10. Em 22-11-2016, foi instaurado, pelo Serviço de Finanças de Lisboa – 11, em nome da Reclamante, o processo de execução fiscal n.º ...56, para cobrança de dívida proveniente de taxa de segurança Alimentar Mais do ano de 2016, no valor de € 1.276.226,87 (cfr. fls. 1 do PEF n.º ...56 apenso a fls. 334 a 337, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

11. Em 22-11-2016, foi emitido em nome da Reclamante, e dirigido a esta, documento de citação para o processo de execução fiscal identificado no número antecedente (cfr. fls. 6 do PEF n.º ...56 apenso a fls. 334 a 439 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

12. Em 28-11-2016, a Reclamante apresentou junto do Tribunal Tributário de Lisboa, impugnação judicial dos actos de liquidação da Taxa de Segurança Alimentar Mais, referentes ao ano de 2016, no montante global de € 2.552.453,74, à qual foi atribuída o número 3180/16.0BELRS (cfr. fls. 19 a 21 do PEF n.º ...53 apenso a fls. 441 a 584 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, em conjugação com consulta do processo de impugnação n.º 3180/16.0BELRS, através da plataforma SITAF);

13. Em 06-12-2016, a Reclamante apresentou junto do Serviço de Finanças de Lisboa – 11, a Garantia Bancária n.º ...82, emitida pela sociedade «Banco 1..., S.A.», para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal n.º ...56 (cfr. fls. 4 do PEF n.º ...56 apenso a fls. 334 a 439 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

14. Em 12-12-20216, por despacho proferido pelo Director Adjunto da Unidade dos Grandes Contribuintes, foi aceite a garantia bancária identificada no número antecedente (cfr. fls. 10 a 12 do PEF n.º ...56 apenso a fls. 334 a 439 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

15. Por despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa – 11 em 13-12-2016 foi determinada a suspensão do processo de execução fiscal n.º ...56 (cfr. fls. 18 do PEF n.º ...56 apenso a fls. 334 a 439 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

16. Por sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa em 28-08-2020, foi julgada improcedente a impugnação judicial identificada em 12), no processo n.º 3180/16.0BELRS (cfr. sentença de fls. 162 a 193 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

17. Na sequência de recurso interposto pela Reclamante da sentença identificada no número antecedente, em 14-10-2021 foi proferido acórdão pelo Tribunal Central Administrativo Sul a negar provimento ao recurso e confirmar a sentença (cfr. sentença a fls. 194 a 252 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

18. Na sequência de recurso interposto pela Reclamante do acórdão identificado no número antecedente, em 20-10-2022 foi proferida decisão sumária pelo Tribunal Constitucional a negar provimento ao recurso (cfr. sentença a fls. 253 a 266 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

19. Em 14-11-2022, a Reclamante apresentou, junto da Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária, pedido de revisão do acto tributário, contra os actos de liquidação da Taxa de Segurança Alimentar Mais, no valor global de € 2.552.453,74, referentes às facturas identificadas em 1), 2), 3) e 4) (cfr. fls. 23 a 48 e 57 a 87 dos autos em suporte digital, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

20. Na mesma data – 14-11-2022 –, a Reclamante apresentou requerimento, dirigido ao Director-Geral da Unidade dos Grandes Contribuintes e ao Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa – 11, a solicitar a suspensão dos processos de execução fiscal n.º ...53 e ...56, até decisão definitiva do pedido de revisão identificado no número antecedente (cfr. fls. 22 a 25 do PEF n.º ...53 apenso a fls. 44 a 584 aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

21. Com referência ao requerimento apresentado pela Reclamante, identificado no número antecedente, em 25-11-2022, foi elaborada informação pela Unidade dos Contribuintes, da qual se extrai o seguinte teor

«(…) II.1 PEF ...53

Em 2016-10-07 foi instaurado o PEF ...53, em nome da sociedade A... SA NIPC ..., na sequência da extração da certidão de dívida ...75 emitida pelo Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais NIPC ..., no montante de € 1.276.226,87, decorrente de dívida de taxa de Segurança Alimentar Mais, relativa ao ano de 2016.

Para efeitos da sua suspensão, nos termos do artigo 169.º do CPPT, foi apresentado, pela sociedade executada, os seguintes elementos:

a) Instrumento legal de garantia, sob a forma de Garantia bancária emitida pelo Banco 1..., SA NIPC ..., pelo montante de € 1.621.408,14, que após análise da suficiência e idoneidade por parte da Equipa GDE (à data), atual ..., foi aceite para efeitos de suspensão da execução (Informação 120-GDE/2016 de 2016-11-07). De referir que a garantia foi registada na aplicação informática SEFWEB sob o nº ...44.2016.241, para efeitos de associação ao PEF.

b) Meio judicial de contestação, apresentado sob a forma de Impugnação Judicial (SICJUT ...30), que correu termos no Tribunal Tributário de Lisboa sob o n.º 3180/16.0BELRS.

Na sequência da apresentação dos elementos anteriormente referidos o presente PEF em crise evoluiu para a fase suspensiva F100 – Suspensão do Processo.

No âmbito do auto de impugnação judicial supra identificado, foi proferida, pelo Tribunal Tributário de Lisboa, sentença por improcedência, tendo a mesma já transitado em julgado em 2021-10-18 (fim prazo para recurso – trânsito em julgado).

II.2 PEF ...56

Em 2016-11-22 foi instaurado o PEF ...56 em nome da sociedade A... SA NIPC ..., na sequência da extração da certidão de dívida ...05 emitida pelo Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais NIPC ..., no montante de € 1.276.226,87, decorrente de dívida de taxa de Segurança Alimentar Mais, relativa ao ano 2016.

Para efeitos da sua suspensão, nos termos do artigo 169.º do CPPT, foi apresentado, pela sociedade executada, os seguintes elementos:

a) Instrumento legal de garantia, sob a forma de Garantia bancária emitida pelo Banco 1..., SA NIPC ..., pelo montante de € 1.621.438,89, que após análise da suficiência e idoneidade por parte da Equipa GDE (à data), atual GCTrib 1 desta Divisão, foi aceite para efeitos de suspensão da execução. (Informação 136-GDE/2016 de 2016-12-09). De referir que a garantia foi registada na aplicação informática SEFWEB sob o nº ...44.2016.258, para efeitos de associação ao PEF.

b) Meio judicial de contestação, apresentado sob a forma de Impugnação Judicial (SICJUT ...30), que correu termos no Tribunal Tributário de Lisboa sob o n.º 3180/16.0BELRS.

Na sequência da apresentação dos elementos anteriormente referidos o presente PEF em crise evoluiu para a fase suspensiva F100 – Suspensão do Processo.

No âmbito do auto de impugnação judicial supra identificado, foi proferida, pelo Tribunal Tributário de Lisboa, sentença por improcedência, tendo a mesma já transitado em julgado em 2021-10-18 (fim prazo para recurso – trânsito em julgado).

II.3. Outros – Do Requerimento Atípico de Manutenção Suspensão dos PEF

Face ao exposto o PEF ...53 e o PEF ...56, passaram a não reunir os requisitos necessários para se manterem suspensos, pelo que foi estabelecido contacto telefónico com a interlocutora da sociedade executada junto da UGC (Dra. AA), informando-se que os autos de execução já não se encontravam associados a contencioso judicial pendente de decisão.

A empresa, então, respondeu que tinha interposto recurso para o Tribunal Constitucional (Processo 1235/21), uma vez que o Acórdão em causa aplicou normas cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo. Acresceu que desta forma, ainda não se tinha efetivado o trânsito em julgado de todo o contencioso judicial, associado aos autos de execução em crise.

Em 2022-10-20, o Tribunal Constitucional proferiu o Acórdão 681/2022 nos Autos de Recurso 1235/21, mediante o qual indeferiu a reclamação apresentada e confirmou a decisão sumária reclamada.

Verificando-se que já se encontrava consolidada na esfera jurídica a decisão do meio contencioso que tinha por objeto a discussão da legalidade da dívida exequenda instaurada nos PEF ...53 e ...56, constatou-se que já não subsistiam os pressupostos legais necessários para a manutenção da suspensão das referidas execuções fiscais. Neste contexto, foi submetido e-mail para o executado e estabelecido mais uma vez contacto telefónico com a sociedade executada (Dra. AA), informando-se que todo o contencioso judicial, com decisões totalmente desfavoráveis à impugnante, já teriam transitado em julgado, pelo que a empresa deveria pagar os montantes em dívida nos referidos autos de execução.

Em 2022-11-14, no âmbito dos PEF em crise, veio a B..., C... & Associados, através do Dr. BB, mandatário da sociedade A..., S.A., via correio eletrónico, solicitar que se desse entrada a requerimento para que seja mantido o efeito suspensivo na execução até decisão definitiva do pedido de revisão do ato tributário entretanto apresentado junto da entidade que o praticou (A Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária do Ministério da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural), de acordo com o artigo 78.º da Lei Geral Tributária (LGT).

Afigura-se, porém que o pedido de revisão oficiosa formulado ao abrigo da segunda parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, tal como o aqui em apreço, não tem o efeito suspensivo da cobrança da prestação tributária a que se refere o n.º 1 do artigo 52.º do mesmo diploma legal e o artigo 196.º do CPPT, ainda que o pagamento da dívida exequenda e do acrescido se encontre garantido, como é o caso. Tal efeito pretendido só seria alcançado, se o pedido de revisão tivesse sido apresentado no prazo da reclamação graciosa (o que não se verifica no caso concreto, em que o pedido foi apresentado manifestamente para além desse prazo), situação em que equivaleria a esta, podendo por isso ser considerado como reclamação para efeitos de suspensão da execução fiscal.

É de resto este o entendimento que decorre da jurisprudência dos Tribunais Superiores, plasmada por exemplo nos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 2019-01-09, proferidos nos autos de recurso 0258/18.9BEVIS e 0260/18.0BEVIS. Para demonstração disso, cita-se o primeiro dos acórdãos referidos:

“I – O pedido de revisão oficiosa efetuado ao abrigo do disposto no art. 78.º, n.º 1, 2ª parte, da LGT, não tem o efeito suspensivo da cobrança da prestação tributária a que se refere o art. 52.º, n.º 1, da mesma lei e o art. 196.º do CPPT, ainda que o pagamento da dívida exequenda e do acrescido se encontre garantido, a menos que seja apresentado no prazo da reclamação graciosa, caso em que equivale a esta e, por isso, pode ser considerado como “reclamação” para efeitos de suspensão da execução fiscal. II – Esta solução legislativa – de não conferir efeito suspensivo ao pedido de revisão efetuado para além do referido prazo, mesmo que o pagamento da dívida exequenda e do acrescido esteja garantido -, não só resulta da falta de previsão do pedido de revisão oficiosa no texto da lei (art. 52.º, n.º 1, da LGT e art. 196.º, n.º 1, do CPPT), como também se mostra conforme a outras soluções legislativas, designadamente a que resulta da conjugação dos n.ºs 1 e 4, alínea b), do art. 49.º da LGT. III – Por outro lado, essa solução não se mostra desajustada, na medida em que, enquanto os meios impugnatórios indicados no art. 52.º da LGT e no art. 196.º do CPPT têm de ser deduzidos dentro de prazos relativamente curtos, o pedido de revisão oficiosa pode ser apresentado até quatro anos após a liquidação ou até a qualquer momento, se não tiver havido pagamento do tributo (cfr. 2ª parte do n.º 1 do art. 78.º da LGT), o que significa que, a ser-lhe concedido efeito suspensivo da execução fiscal, existiriam consequências negativas relevantes ao nível da segurança jurídica e da celeridade na cobrança das receitas tributárias prosseguida pela execução fiscal.”

«III. CONCLUSÃO

Atendendo ao supra exposto e verificando-se, nesta data, que:

a) já não subsiste um dos requisitos necessários à manutenção da suspensão das execuções. fiscais, nos termos do artigo 169.º do CPPT, porquanto, sobre a impugnação judicial que visou discutir a legalidade dos atos de liquidação que subjazem às dividas instauradas nos PEF em crise, já incidiu decisão transitada em julgado.

b) O pedido de revisão oficiosa apresentado em 2022-11-14 pela sociedade executada junto da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária, formulado ao abrigo da segunda parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, foi interposto manifestamente para além do prazo de reclamação graciosa, motivo pelo qual, não confere qualquer efeito suspensivo da cobrança da prestação tributária.

Salvo melhor opinião, propõe-se:

a) O indeferimento do requerimento apresentado pelo mandatário da sociedade executada no qual é solicitada a manutenção do efeito suspensivo que impende sobre os Processos de Execução Fiscal ...53 e ...56;

b) O prosseguimento dos autos das execuções fiscais com vista à cobrança dos valores das quantias exequendas e acrescidos em divida; e

c) Notificação, em conformidade, do mandatário da executada.»

(cfr. fls. 42 a 45 do PEF n.º ...53 apenso a fls. 44 a 584 aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

22. Sobre a informação identificada no número antecedente recaiu despacho concordante proferido pela Directora Adjunta da Unidade dos Grandes Contribuintes em 28-11-2022, nos termos do qual foi indeferido o requerimento identificado em 20) (cfr. fls. 42 do PEF n.º ...53 apenso a fls. 441 a 584 aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

23. A informação e despacho identificados em 21) e 22) foram comunicados através do ofício n.º ...35, remetido por carta registada com aviso de recepção, o qual foi assinado em 29-11-2022 (cfr. fls. 42 a 47 do PEF n.º ...53 apenso a fls. 441 a 584 aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

24. A presente Reclamação foi remetida por correio registado ao Serviço de Finanças de Lisboa – 11 em 05-12-2022, tendo dado entrada neste Tribunal em 07-02-2023 (cfr. fls. 3 e 87 dos autos); »


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A sentença recorrida identificou como única questão a decidir nos autos a de “saber se o órgão de execução fiscal deveria ter mantido o efeito suspensivo do processo de execução fiscal, por força do pedido de revisão do acto tributário apresentado pela Reclamante contra os actos de liquidação na origem da dívida exequenda” e solucionou-a, com apelo a contributos doutrinais e jurisprudenciais, em particular, diversos, oriundos deste STA, defendendo, resumidamente, que “(…), o pedido de revisão do acto tributário apresentado dentro do prazo de reclamação, previsto na 1.ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, na medida em que configura uma verdadeira reclamação, deve integrar o conceito de reclamação a que é feita alusão no artigo 52.º, n.º 1, da LGT, e, como tal, tem a virtualidade de suspender o processo de execução fiscal, verificados que estejam os demais requisitos prescritos pelo artigo 169.º do CPPT.

Situação distinta é a que se encontra prevista na 2.ª parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT que, embora possa ser despoletada a requerimento do contribuinte após esgotado o prazo de reclamação (cfr. artigo 78.º, n.º 1 e n.º 7, da LGT), consubstancia uma verdadeira revisão oficiosa, por iniciativa da Administração tributária, não configurando, pois, uma reclamação ou um meio impugnatório. Revisão oficiosa esta, por iniciativa da Administração tributária (ainda que despoletada pelo sujeito passivo), que pode ser realizada no prazo de 4 anos a contar da data da liquidação ou a todo o tempo se o tributo não tiver sido pago, com fundamento no erro imputável aos serviços.

Em tal situação, o pedido de revisão não se assume como um verdadeiro meio impugnatório, com efeito de destruição retroactiva dos efeitos do acto, mas antes um meio que a Administração tributária tem ao seu alcance para rever os seus próprios actos.

(…).

Sucede que, contrariamente ao alegado pela Reclamante, na esteira daquilo que já acima dissemos, a apresentação do referido pedido de revisão do acto tributário, apesar das garantias prestadas em momento anterior, não tem efeito suspensivo sobre os processos de execução fiscal, na medida em que foi apresentado para além do prazo de reclamação graciosa.”.

Outrossim, por apelo a pertinente jurisprudência do Tribunal Constitucional (TC), assumiu que, esta forma de entender o regime legal disputado, não viola os princípios da igualdade, nem o da tutela jurisdicional efetiva.

Na medida em que o conjunto de argumentos expendidos, pela 1.ª instância, não nos merece qualquer tipo de crítica/reparo, só resta desatender a pretensão da rte (De, no fundo, declararmos a ilegalidade do ato reclamado, praticado pelo órgão da execução fiscal.) e reiterar (uma vez mais) que a revisão dos atos tributários pela entidade que os praticou, efetuada a pedido do sujeito passivo/contribuinte, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo estiver por pagar (portanto, fora do “prazo de reclamação administrativa (Cf., artigo 78.º n.º 1 da LGT.)), com fundamento em erro imputável aos serviços, não detém a capacidade de suspender a execução fiscal, nos termos e para os efeitos dos artigos 52.º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) e 169.º n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).


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3.

Destarte, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, concordamos negar provimento ao recurso.


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Custas pela recorrente, com dispensa do remanescente da taxa de justiça, em função da simplicidade do julgamento, aqui, produzido.

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[texto redigido em meio informático e revisto]


Lisboa, 6 de setembro de 2023. - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro.